J O E . Pg 11

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  • Words: 913
  • Pages: 1
novembro, 2009

OLHAR ESPÍRITA

Departamento Doutrinario CANTO DE LIBERTAÇÃO I Oh tu que fechaste a doutrina na concha isolada do teu Centro e rezas, rezas, rezas espargindo passes e água-fluida como um sacerdote de hissope em punho

Oh tu que convertes os espíritos em santos e só queres milagres, milagres, milagres, olha um pouco à janela e vê o rio da vida borbulhando na planície, os astros da noite cavalgando a montanha, as flores do campo aromando o vale, a dor como uma aurora noturna avermelhando a terra e o mar, o mar e o céu. Oh tu que pregas a caridade da doutrinação e da esmola, ouve a advertência de Paulo, escuta a lição de Kardec, aprende que a humanidade sangra na ferida de um mendigo, e no choro de um órfão no arrabalde esquecido é o cantochão universal do choro de todos os órfãos do mundo reunidos.

Tua justiça não floresce no chão negro do ódio, teu pão não é feito do trigo vermelho empapado de sangue e de lágrimas, teu fuzil é a verdade disparando relâmpagos em vez de balas, tua baioneta é a palavra tersa e lúcida como lâmina. III Não penses, porém, que ensinar é o bastante. A doutrina que possues não é máquina é vida. Não podes conhecê-la e distribui-la através de engrenagens, de pinos, de alavancas de roelas. Tens de lançar-te de corpo inteiro a esse mar salgado e revolto, tens de dominá-lo com teus braços e tuas pernas, tens de senti-lo em todo o corpo, de beber a espuma e a salsugem, de ir ao fundo em mergulhos de escafandro buscar a pérola escondida.

Oh tu que recorres ao médium-curador e confias teus males ao poder misterioso de Hanhemann, não te esqueças de que há provas sangrando em hemoptises fratícidas, não te esqueças da fome que devora teus irmãos agonizando entre riquezas, não te esqueças dos abutres guerreiros que dividem o tempo em guerra e paz para o banquete metálico dos lucros.

Não, não te enganes. Não penses que o mundo te espera como a um doutor. Deixa aos fariseus o protocolo, a rabugice, a sapiência, o mistério. Atira-te ao mar de peito nu, de braços nus, de pernas nuas, e como um nadador oferece aos homens na ponta dos dedos gotejantes a rosa dos ventos colhida num golpe entre as espumas com suas pontas vibráteis e límpidas, sem a lama teológica nem o liquem dos rituais.

Ergue os olhos do livro de preces, espírita, arranca do silêncio a flor de sangue do teu coração recorda ao Mestre no caminho de Golgota e marcha, marcha, marcha de braços abertos e de fronte sangrando para a nova aurora da ressurreição.

IV O mundo te espera, anseia pela aurora que fechaste na concha da mão, pede um dilúvio da água que arrolhaste em tuas garrafas sobre a mesa.

II Não serás o que empunha o fuzil ou a baioneta porque já decifraste o mistério descobriste a chave doirada e frágil da enigmática porta do amanhã. Mas empunha o teu coração como um archote, rompe as trevas do egoísmo e da avareza e marcha, marcha, marcha além do círculo das mesas e dos grupos semeando estrelas para o amanhecer.

Rompe a casca sectária do medo, quebra, espatifa as tuas garrafas egoístas abre de par em par as portas e as janelas deixa a estola, a pia, o altar, o incenso, a imagem, a exegese e o terço para os sacerdotes e os beatos. Tua tarefa é outra, teu caminho é outro, teu destino é outro. A reencarnação não te ensina a esperar, mas a lutar!

página 11

Teu dever é rasgar as estradas do amanhã atravessando a carne densa da noite como a flecha da estrela matutina. V Que fazes do poder dialético da constelação de causas e efeitos que puseram em tuas mãos como um colar de estrelas e de sóis? Que fazes espírita, do mistério revelado erguendo a lápide como Lázaro? Queres dormir ao som de rezas e promessas? Queres sonhar com fadas e gnomos revividos em guias e protetores quando o combate é teu, a luta é tua, é tua a experiência e ninguém pode abrir o desvão de pedra que te compete que pertence às tuas mãos e aos teus ombros? Ouve, ouve ao longe, sacudindo continentes e oceanos o soluço do mundo, ouve o coro, não dos anjos celestes nimbados de luz, mas dos anjos terrenos famintos e sujos fenecendo como flores na lama, ouve o clamor dos povos esgotados, ouve o urro dos irmãos convertidos em chacais, e atira-te, atira-te, atira-te a construir sobre o sangue e as lágrimas, certo, sereno, firme, seguro, confiante, como o ferreiro que conhece o poder do martelo e o ritmo da forja. Caminha para a frente! Não mais o crucifixo, a morte, o luto, o desespero a câmara fúnebre, não mais a paixão e as trevas, a lança e os cravos, mas a ressurreição, a vida, o espírito, a alvorada fremindo em teus olhos como um pássaro na vertigem do vôo para que a terra se eleve estrela e sol, grito e clarão, sonho e aroma, flor e fruto, relâmpago e trovão, na escala dos mundos. Essa a tua missão oleiro esquecido no barro da terra. Esse o teu dever. Ergue o planeta nas mãos, vaso modelado por ti mesmo amassado em teu sangue e em tuas lágrimas. Ergue-o nos dedos, ardente e sonoro como um cântaro fresco. Trecho retirado do Livro: “Poesias” de Herculano Pires

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