SAULO MEDEIROS DA COSTA SILVA[1] ARTHUR CESAR DE MOURA PEREIRA[2] (Coordenadores)
CURSO AVANÇADO DE DIREITO TRIBUTÁRIO MUNICIPAL
PREFÁCIO O Curso Avançado de Direito Tributário Municipal surgiu da necessidade profissional e acadêmica de sistematizar os tributos municipais em um manual e, principalmente, aprofundar os seus contornos constitucionais, legais e jurisprudenciais, bem como analisá-los, interdisciplinarmente, com as demais ciências sociais, em diálogo constante com a Sociologia, Economia, Ciências Políticas etc. O livro divide-se em três partes: 1. Na primeira, estuda-se o DIREITO CONSTITUCIONAL APLICADO AO DIREITO TRIBUTÁRIO MUNICIPAL enfocando o “Federalismo brasileiro com viés municipal”, passando pelo “Controle de constitucionalidade das leis tributárias e atos normativos municipais”, pela “Percepção crítica da competência tributária e os tributos municipais”, pelas limitações constitucionais ao poder de tributar dos
Municípios, além das isenções heterônomas etc. 2. Na segunda, abordam-se os ASPECTOS GERAIS DO DIREITO TRIBUTÁRIO COM VIÉS NO DIREITO TRIBUTÁRIO MUNICIPAL, começando pela “Hermenêutica tributária” e “Aspectos da hipótese de incidência tributária”, em seguida percorre-se o campo da “Extrafiscalidade dos tributos municipais como instrumento político de promoção da melhoria do meio ambiente urbano”, destacando a “Prescrição e decadência dos tributos municipais”, entre outros. 3. Na terceira parte, intitulada de DIREITO TRIBUTÁRIO MUNICIPAL, introduzem-se as espécies de tributos municipais e, em seguida, trata-se do Imposto sobre serviços de Qualquer Natureza – ISSQN, com ênfase na incidência sobre planos de saúde, leasing e sociedade de advogados. Após aborda-se o Imposto sobre propriedade predial territorial urbana – IPTU, do ponto de vista fiscal e extrafiscal, além de introduzi-lo numa discussão desenvolvimentista, urbanística, ambiental e sociológica. Exaure-se o Imposto sobre a transmissão de
bens imóveis – ITBI, além da Contribuição de Melhoria e Contribuição de Iluminação Pública. E, por fim, concluise com as taxas e Contribuições Previdenciárias Municipais. Buscando a interação entre as formas como o Direito Tributário é manejado e aplicado, os organizadores selecionaram Advogados, Professores, Magistrados, Promotores de Justiça, Procuradores da Fazenda Nacional, Auditores Fiscais, Doutrinadores etc, como colaboradores deste livro. Sinto-me honrado em prefaciar esta obra porque estive presente, representando o Centro de Ciência Jurídica da UEPB, no I Simpósio de Direito Tributário Municipal de Campina Grande, célula embrionária deste projeto ambicioso que interpretou a Tributação Municipal com olhar interdisciplinar; bem como pela forte ligação que tenho com os organizadores e coautores, muitos deles meus ex-alunos, ex-professores, demonstrando o encontro de gerações, valorizando a experiência e sabedoria, bem como a jovialidade e força da modernidade.
Sem a menor dúvida, é um livro original e singular em sua proposta. CLÁUDIO SIMÃO DE LUCENA NETO, Diretor do Centro de Ciências Jurídicas, Faculdade de Direito da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB); Membro do Instituto Brasileiro de Direito Eletrônico – IBDE; Pós-Graduado pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE); Consultor Externo para o Centro Europeu do Consumidor (European Consumer Centre - ECC) para a elaboração do Relatório ECommerce Report (2002, Estocolmo, Suécia).
Estudos realizados pelos autores: AMANDA LUECENA LIRA, Advogada Tributarista, Especialista em Direito Processual Civil pela Faculdade De Direito Damásio de Jesus (FDDJ). Cursos de Extensão em: Introdução ao direito norteamericano pela George Washignton University (GWU, DC); Planejamento Tributário pelo Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBET).Bacharela em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB). ALEX MUNIZ BARRETO, Doutorando em Ciências Jurídicas; Pós-graduado em Direito Constitucional,
Processo Civil; Graduado em Direito e Filosofia. Palestrante e conferencista. Autor dos livros Direito Constitucional e Direito Administrativo Positivo. Professor da Escola Superior da Magistratura e da Universidade Estadual da Paraíba. Juiz de Direito. ALEXANDRE
HENRIQUE
SALEMA
FERREIRA,
Doutor em Direito pela UFPE; Mestre em Ciências da Sociedade pela UEPB; Especialista em Auditoria Fiscalcontábil pela UFPB; Professor da UEPB e Auditor Fiscal do Estado da Paraíba. ANA ROSA DE BRITO MEDEIROS, Mestre em Direito Econômico pela UFPB; Graduada em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba - UEPB; Professora Universitária. ANA PAULA BASSO, Doutora em Direito Tributário Europeu pela “Universidad de Castilla-La Mancha”, na Espanha, e pela “Università di Bologna”, na Itália. Professora titular de Direito Tributário do
CESED/FACISA e UNIPÊ. Coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas de Direito Tributário e Financeiro (NEPDTF) do CESED. ANDRÉ NÓBREGA QUINTAS COLARES, Pósgraduado em Direito Tributário pelo UNIPÊ; Vicepresidente da Comissão de Estudos Tributários da OAB/PB - Subseção de Campina Grande, Professor e Advogado. ÂNGELO BOREGGIO NETO, Mestre em Direito pela PUC/SP. Mestre em Educação pela UFMT. Especialista em Direito Tributário e Processo Tributário. Professor Titular de Direito Tributário da FRB e UNIME. Professor em diversos cursos de pós-graduação em direito tributário pelo país. Coordenador da Pós-graduação de Direito Tributário da ATAME/MT. Professor do Curso Preparatório para Concurso JUSPODIVM. Autor do livro: Manual Prático de Direito Processual Tributário. Autor de diversos artigos jurídicos.
ARTHUR CESAR DE MOURA PEREIRA, Graduado em Direito pela UFPB e pela University of Leeds – UK (Programa Piani). Especialista em Direito Tributário pela UNISUL. Pós-graduação em Gestão Tributária pela ESAF. Aprovado nos concursos para Técnico da Justiça Federal (1998), Analista do IBGE (1999), Agente do Banco do Brasil (2000), Agente da Caixa Econômica Federal, (2000), Procurador da Fazenda Nacional (2002) e Analista Previdenciário do INSS (2003). Procurador da Fazenda Nacional desde dezembro de 2003, com exercício na PSFN de Passo Fundo (RS), na Coordenação de Representação Judicial -CRJ em Brasília, perante o STJ, e na PSFN Campina Grande (PB), com ampla atuação nas áreas de execução fiscal, cautelar fiscal, grandes devedores, e defesa da União. Professor de Direito Tributário e de Direito Financeiro, com passagens pela UNESC, FESMIP, ESMA, e IESP, na graduação e na especialização. Professor de curso preparatório para carreiras jurídicas da AGU, com passagens pelo LEXUS, pela EBEJI e com atuação com coaching desde 2012.
DANIEL FERREIRA DE LIRA, Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado do Ceará. Ex-Advogado militante. Professor Universitário. Ex-diretor da Escola Superior de Advocacia - ESA/CG, Ex- Conciliador Cível do Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba, Especialista em Direito Processual Civil e Especialista em Direito Tributário pela Universidade do Sul de Santa Catarina, Civilista e Ex-Professor de Teoria Geral do Processo, Juizados Especiais e Direito Processual Civil na União de Ensino Superior de Campina Grande (UNESC) e do Centro de Ensino Superior Reinaldo Ramos (CESREI), do Roma Cursos Jurídicos, do Lexus e do Meritvs preparatório para concursos. Professor da FACISA e da Especialização da ESMA (Escola Superior da Magistratura) sobre prática cível. Mestre em Desenvolvimento Regional pela UEPB/UFCG. Mestrando em Direito Econômico pela UFPB. Doutorando em Direito pela PUC/Buenos Aires.Palestrante em eventos jurídicos e articulista em diversas revistas jurídicas. Autor do livro Sinopses de Juizados Especiais Cíveis e Criminais pela Edijur/Leme-SP. É colunista quinzenal da
revista jurídica jus vigilantibus com sede no Espírito Santo e da Revista A Barriguda. DIEGO FERNANDES GUIMARÃES, Juiz de Direito do Tribunal de Justiça da Paraíba – TJPB, Ex - Procurador Chefe da Procuradoria Federal junto ao Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Paraíba. Professor da Faculdade de Ciências Sociais e Aplicadas do Centro de Ensino Superior e Desenvolvimento (CESED/FACISA). Bacharel em Ciências Jurídicas pela Universidade Estadual da Paraíba. Pós-Graduado em Direito Tributário. DIRCEU GALDINO BARBOSA DUARTE, Mestre em Direito Público pela Universidade Estácio de Sá UNESA/Rio de Janeiro. Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad del Museu Social Argentino - UMSA/AR. Graduado em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba - UEPB. Pós-graduado em Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho - ESMAT 13ª Região. Ex Diretor-Geral da Escola
Superior de Advocacia (ESA), OAB - Subseção Campina Grande - Paraíba. Professor Substituto da Universidade Federal de Campina Grande (Departamento de Direito Público)- CCJS/Sousa. Professor em Direito da Faculdade União de Ensino Superior de Campina Grande - UNESC. Advogado Trabalhista militante - Dirceu Duarte Advocacia. EDMILSON EWERTON RAMOS DE ALMEIDA, Bacharel em Direito e bacharelando em Administração Pública pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB). Pós-graduando em Direito Público pela Universidade Anhanguera-Uniderp. Membro atuante das Comissões de Sociedade de Advogado da OAB/PB e de Estudos Tributários da Subseção de Campina Grande/PB. Membro fundador da Associação de Jovens Advogados/PB. Advogado associado ao escritório Rocha, Marinho e Sales advogados. EDUARDO COELHO, Advogado. Sócio do Coelho & Dalle Advogados. Graduado pela Faculdade de Direito
do Recife, da Universidade Federal de Pernambuco – UFPE. Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET. EDUARDO J. DOS S. P. DE HOLLANDA CAVALCANTI, Graduado pela Universidade Católica de Pernambuco. Pós-Graduado em Direito Tributário pelo Instituto Pernambucano de Direito Tributário. Advogado. Sócio fundador de Hollanda Cavalcanti Advogados, em Pernambuco e sócio, na Paraíba, da Advocacia David Diniz – ADD. EZILDA MELO, Mestra em Direito Público pelo Programação de Pós-Graduação em Direito da UFBA. Especialista em Direito Público pelo JusPodivm. Graduada em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba (2002) e Graduada em História pela Universidade Federal da Paraíba (2002). Tem experiência no Magistério Superior desde o ano de 2003 e em Coordenações de Curso de Direito. Professora de Graduação e Pós-Graduações. Palestrante. Autora de
diversos artigos jurídicos. Pesquisadora vinculada ao Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito - CONPEDI. FERNANDO LUCENA PEREIRA DOS SANTOS JÚNIOR, Advogado. Mestre em Direito Constitucional pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Advogado com atuação expressiva na área de Direito Tributário, Imobiliário e Empresarial. Membro da Comissão de Defesa do Contribuinte na Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional do Rio Grande do Norte. Membro da APET - Associação Paulista de Estudos Tributários. FRANCISCO LEITE DUARTE, Auditor-fiscal da Receita Federal do Brasil. Mestre e Doutorando em Direito. Professor de Teoria Geral do Estado, Direito Administrativo e Direito Tributário da Universidade Estadual da Paraíba ( UEPB), do Centro Universitário de João Pessoa e da Escola Superior da Magistratura ( ESMA - PB). Palestrante em temas de Direito e legislação
tributária. É autor de Direito Tributário: Teoria e prática, Revista dos Tribunais, 864, 2015. ITALO DOMINIQUE DA ROCHA JUVINO. Graduado em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba – UEPB; Pós-graduando em Direito Tributário pela Escola Paulista de Direito; Membro do Instituto Paraibano de Estudos Tributários – IPBET; Autor de artigos jurídicos e Advogado. JÚLIA DE ARRUDA RODRIGUES, Mestranda em Serviço Social pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), com pesquisa na linha de Gênero, Diversidade Sexual e Relações de Poder. Bacharela em Direito pela UEPB; Advogada. JOHN TENÓRIO GOMES, Advogado; Graduado em Direito pela Faculdade Reinaldo Ramos - FARR/CESREI. Pós-graduando em Direito Constitucional pela Universidade Estadual da Paraíba - UEPB e em Direito Imobiliário pela Escola Paulista de Direito - EPD. Tem
experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Constitucional, Direito Processual Civil e Direito Imobiliário. JOSÉ EGBERTO ALVES DE SOUSA, Pós-graduado em Direito Previdenciário pela Escola Superior da Advocacia – ESA/PB e Faculdade Maurício de Nassau e pós-graduando em Gestão Pública pela Universidade Estadual da Paraíba. Possui graduação em Direito e Geografia pela Universidade Estadual da Paraíba (2012). Tem experiência na área de Direito e Geografia, atuando principalmente nos seguintes temas: princípios e direitos fundamentais-constitucionais, organização sócio-espacial, democracia participativa e desenvolvimento regional e social. É assessor especial de gabinete da Prefeitura Municipal de Caraúbas/PB e advogado inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil / Seccional da Paraíba. LUCIARA LIMA SIMEÃO MOURA, Promotora de Justiça, graduada pela UFPB e Universitè de Poitiers, Especialista em Ciências Penais e em Criminologia
Segurança Pública. MASSILLANIA GOMES MEDEIROS, Mestra pela UFCG, graduada em Letras pela UFCG e Direito pela UEPB; Especialista em Direito Público; Membro do Instituto Paraibano de Direito Tributário; Professora da UNESC Faculdades e Advogada. MORGANA ROSA GURJÃO, Advogada Tributarista, Especialista em Direito Processual Civil pela Faculdade De Direito Damásio de Jesus (FDDJ). Cursos de Extensão em: Planejamento Tributário pelo Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBET). Bacharela em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB). PAULO ANTÔNIO CALIENDO VELLOSO DA SILVEIRA, Graduado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1992), mestrado em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1996) e doutorado em Direito pela
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2002), Doutorado Sandwich na Ludwig-Maximilians Universität em Munique (Alemanha) (2001). Participou do Program of Instruction for Lawyers da Harward Law School (2001). Árbitro da Lista brasileira do Sistema de Controvérsias do Mercosul. Atualmente, é professor permanente da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Autor da obra finalista do Prêmio Jabuti Direito Tributário e Análise Econômica do Direito; e da obra Direito Tributário: três modos de pensar a tributação. RACHEL NOGUEIRA DE SOUZA, Procuradora da Fazenda Nacional, lotada na PFN/AP e chefe da SECDAU. Atuou na CRJ/PGFN, no consultivo e junto ao Superior Tribunal de Justiça, e na DIAEJ. Bacharel em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba e especialista em Direito Processual pela UNAMA e em Direito Tributário pelo IBET. Membro do Instituto Paraíba de Estudos Tributário –IPBET.
RAPHAEL ALEXANDER ROSA ROMERO, Graduado em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba UEPB, Especialista em Direito Público pela Universidade Anhanguera-UNIDERP. Especialista em Língua e Literatura espanholas pela Universidade Estadual da Paraíba. Coordenador de Benefícios Previdenciários do Instituto de Previdência dos Servidores Públicos Municipais de Campina Grande-PB e exerce a função de Presidente da Comissão Permanente de Licitação no mesmo órgão. Advogado previdenciarista. Autor da Sinopse de Direito Previdenciário da Ed. Edijur. É Coautor do livro Reflexões sobre o Direito Contemporâneo - Estudos em Homenagem ao Professor Ricardo Rabinovick - Berkman Ed. Nossa Livraria. Lecionou, na qualidade de Professor Substituto, no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Paraíba - IFPB (2008/2010) e na Universidade Estadual da Paraíba - UEPB (2009/2010). Foi professor na Faculdade Reinaldo Ramos - FAAR/CESREI (2010). Atualmente leciona na Faculdade Maurício de Nassau.Campus Campina Grande, além de ministrar aulas em
cursos preparatórios para OAB e Concursos Públicos. É palestrante e autor de artigos científicos. RODRIGO SILVEIRA RABELLO DE AZEVEDO, Advogado, Graduado pela Universidade Estadual da Paraíba. Mestre em Constituição e Garantia de Direitos pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN e Professor Universitário. SAULO MEDEIROS DA COSTA SILVA,
Mestre pela UEPB;
Presidente do Instituto Paraibano de Estudos Tributários – IPBET; Membro da Comissão de Estudos Tributários da OAB/PB; Professor de Direito Tributário da FRR/CESREI, da Pós-graduação em Direito Tributário da Escola Superior da Advocacia – ESA/PB, da Escola Superior da Magistratura – ESMA/CG e dos Cursos Jurídicos Misael Montenegro – PE; Sócio e Diretor Jurídico do Escritório Advocacia David Diniz – ADD.
TALDEN QUEIROZ FARIAS, Advogado, consultor jurídico e professor universitário. Graduou-se em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba (2000) e fez especialização em Direito Processual Civil pela
Universidade Federal de Pernambuco (2002) e em Gestão e Controle Ambiental pela Universidade Estadual de Pernambuco (2003). Cursou mestrado em Direito pela Universidade Federal da Paraíba (2006) e doutorado em Recursos Naturais pela Universidade Federal de Campina Grande (2011), com estágio de pesquisa realizado junto à Universidade de Salamanca/Espanha. Atualmente é doutorando em Direito da Cidade pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro. É professor da Universidade Federal de Campina Grande, tendo sido anteriormente professor adjunto IV da Universidade Estadual da Paraíba. É autor dos livros - Introdução ao direito ambiental (Del Rey, 2009), Licenciamento ambiental: aspectos teóricos e práticos (3. ed. Fórum, 2011) e Direito ambiental: tópicos especiais (UFPB, 2007). ExChefe da Assessoria Jurídica da Secretaria do Meio Ambiente da Prefeitura de João Pessoa e Coordenador do Meio Ambiente da Prefeitura de Campina Grande. É membro da Câmara Técnica de Assuntos Jurídicos do Conselho Nacional do Meio Ambiente e ex-membro do Conselho de Proteção Ambiental do Estado da Paraíba.
THIAGO BENTO QUIRINO HERCULANO, Graduado em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba (2012). Atuou, no escritório Advocacia David Diniz – ADD, em Tributário, Civil, Imobiliário, Administrativo (licitações e contratos administrativos) e Constitucional; Ex-Membro da Comissão de Estudos Tributário da OAB/PB – Subseção de Campina Grande; Atualmente é Assessor Jurídico do Ministério Público Federal. WILSON SALES BELCHIOR, Pós-graduado em Direito Processual Civil pela Escola Superior do Ministério Público do Estado do Ceará; Bacharel em Direito pela Universidade de Fortaleza (Unifor); Conselheiro Federal da OAB/PB; Sócio e Diretor Jurídico do escritório Rocha, Marinho e Sales advogados.
Em homenagem ao professor e advogado David Farias Diniz Sousa (in memoriam). Agradecemos a Cássio Lira Braga, Jurandi Ferreira de Souza Neto, Leonardo Cordeiro Brasil e Lucas Menezes de Souza pelo apoio na conclusão deste livro.
Em matéria de impostos, é função de um bom pastor tosar suas ovelhas, mas não tirar o seu couro. Tibério – Imperador Romano Não é pela quantidade dos tributos que se deve medir o ônus, mas sim pelo caminho que tem de fazer para voltar às mãos dos que saíram. Quando esta circulação é rápida e bem estabelecida, não importa que se pague muito ou pouco, pois o povo será sempre rico e as finanças andarão sempre bem. Jean Jacques Rousseau.
ÍNDICE 1ª PARTE DIREITO CONSTITUCIONAL APLICADO AO DIREITO TRIBUTÁRIO MUNICIPAL. Capítulo 1 A POSIÇÃO DOS MUNICÍPIOS NO FEDERALISMO BRASILEIRO Por Raphael Alexander Rosa Romero
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS............................................................................... 2. SURGIMENTO DOS ESTADOS MODERNOS ............................................................... 3. CONCEITO DE ESTADO .............................................................................................. 4. FORMAS DE ESTADO E O SURGIMENTO DO FEDERALISMO .............................. 5. SURGIMENTO DO
FEDERALISMO................................................................... 6. ESTADO FEDERAL
BRASILEIRO........................................................................ 7. EVOLUÇÃO DA AUTONOMIA MUNICIPAL NA FEDERAÇÃO BRASILEIRA: DA CONSTITUIÇÃO DE 1891 À CONSTITUIÇÃO DE 1988...................................................
8. AUTONOMIAS MUNICIPAIS......................................................................... 8.1 Capacidade de AutoOrganização........................................................................... 8.2 Capacidade de Autoadministração................................................................. 8.3 Autonomia Financeira.............................................................................. 9. CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................. Capítulo 2 CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DAS LEIS TRIBUTÁRIAS E ATOS NORMATIVOS MUNICIPAIS.
Por Alex Muniz Barreto
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS........................................................................... 2. SISTEMAS DO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE.................................... 2.1 Controle
político................................................................................. 2.3 Controle jurisdicional...................................................................... 2.3 Controle misto...................................................................................... 2.4 Sistema brasileiro de controle de constitucionalidade....................................................... 3. OS MUNICÍPIOS E SUA COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA............................................. 3.1 Competência tributária municipal........................................................................... 3.2 Os Municípios no sistema de repartição de receitas tributárias......................................... 4. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DA
NORMA TRIBUTÁRIA MUNICIPAL..........................................................................
4.1 A competência para o controle de normas municipais....................................................... 4.1.1 Controle Concentrado.......................................................................... 4.1.2 Controle
Difuso.................................................................................... 5. A PROGRESSIVIDADE DO IPTU................................................................................... 6. O PROBLEMA DAS TAXAS MUNICIPAIS.................................................................. 7. O PAPEL DOS TRIBUNAIS DE CONTAS NO CONTROLE DAS NORMAS MUNICIPAIS......................................................................... 8. A OMISSÃO NORMATIVA TRIBUTÁRIA DOS MUNICÍPIOS.................................... Capítulo 3 COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA MUNICIPAL. Por Saulo Medeiros da Costa Silva
1.
CONSIDERAÇÕES
INICIAIS............................................................................... 2. COMENTÁRIOS INICIAIS SOBRE O FEDERALISMO................................................. 3. FEDERALISMO BRASILEIRO........................................................................
4. PODER TRIBUTÁRIO....................................................................... 5. COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA....................................................................... 5.1 Competência tributária municipal............................................................................... 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................. Capítulo 4 OS MUNICÍPIOS E AS LIMITAÇÕES CONSTITUCIONAIS AO PODER DE TRIBUTAR: PRINCÍPIOS E IMUNIDADES. Por Rachel Nogueira Souza
1.
ESTABELECENDO
PREMISSAS
INICIAIS.................................................................... 2. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS TRIBUTÁRIOS: UMA ANÁLISE SOB A ÓTICA DO DIREITO TRIBUTÁRIO MUNICIPAL..........................................................................
3. IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS E A COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA DOS MUNICÍPIOS........................................................................ 3.1 Imunidades Genéricas e Impostos Municipais................................................................... 3.2 A imunidade do art. 156, II, in fine, da CF......................................................................... 3.3 Imunidade do art. 156, §2o, I, da CF.................................................................................. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................. Capítulo 5 ESTUDO SOBRE A POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO
DE ISENÇÃO DE TRIBUTOS MUNICIPAIS, PELA UNIÃO, ATRAVÉS DE TRATADOS INTERNACIONAIS. Por Ana Rosa de Brito Medeiros
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS...............................................................................
2. A UNIÃO COMO PESSOA JURÍDICA DE DIREITO INTERNO .................................. 3. A GLOBALIZAÇÃO, A COMPETÊNCIA PARA LEGISLAR SOBRE DIREITO TRIBUTÁRIO DA UNIÃO E A TRIBUTAÇÃO NO COMÉRCIO INTERNACIONAL.... 4. O DIREITO INTERNACIONAL E O SISTEMA TRIBUTÁRIO BRASILEIRO............. 5. A INTEGRAÇÃO REGIONAL E O DIREITO TRIBUTÁRIO........................................ 6. ISENÇÃO HETERÔNOMA ATRAVÉS DE TRATADOS INTERNACIONAIS............. 7. CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................
2ª PARTE ASPECTOS GERAIS DO DIREITO TRIBUTÁRIO COM VIÉS NO DIREITO TRIBUTÁRIO MUNICIPAL. Capítulo 6 HERMENÊUTICA TRIBUTÁRIA: USO DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS, DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS E DO MÉTODO SISTEMÁTICO DE INTERPRETAÇÃO. Por Ângelo Boreggio Neto e Ezila Melo Calazans
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS............................................................................... 2. HERMENÊUTICA JURÍDICA............................................................................. 3. INTERPRETAÇÃO NO DIREITO TRIBUTÁRIO............................................................ 4. REFORMA TRIBUTÁRIA E HERMENÊUTICA............................................................. 5. PRINCÍPIO DA UNIDADE DA CONSTITUIÇÃO E
DA PROPORCIONALIDADE..... 6. HERMENÊUTICA TRIBUTÁRIA E OS DIREITOS
FUNDAMENTAIS........................ 7. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO........................................................................ CONSIDERAÇÕES
FINAIS.................................................................................. Capítulo 7 ENSAIO SOBRE A HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA Por Arthur Cesar de Moura Pereira
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS............................................................................... 2. NORMAS TRIBUTÁRIAS..................................................................... 3. A HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA E O FATO GERADOR........................ 4. ASPECTOS DA HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA
TRIBUTÁRIA....................................... 4.1
Aspecto
Material................................................................................. 4.2 Aspecto Espacial................................................................................. 4.3 Aspecto Temporal...............................................................................
4.4 Aspecto Pessoal.................................................................................. 4.5 Aspecto Quantitativo...........................................................................
Capítulo 8 A EXTRAFISCALIDADE DOS TRIBUTOS MUNICIPAIS COMO INSTRUMENTO POLÍTICO DE PROMOÇÃO DA MELHORIA DO MEIO AMBIENTE URBANO. Por Ana Paula Basso 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS............................................................................... 2. PARÂMETROS CONSTITUCIONAIS E LEGAIS
PARA A ORGANIZAÇÃO MUNICIPAL COM FINS DE PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE.................................... 3. TRIBUTOS MUNICIPAIS E A EXTRAFISCALIDADE COMO INSTRUMENTO POLÍTICO DE PROMOÇÃO DE MELHORIA DO MEIO AMBIENTE URBANO............
3.1 Imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana – IPTU....................................... 3.2 Imposto sobre serviços de qualquer natureza (ISS/ISSQN)............................................... 3.3 Imposto sobre a transmissão “inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como a concessão de direitos a sua aquisição (ITBI)........................................ 3.4 Taxa....................................................................................... 3.5 Contribuição de melhoria................................................................................ 3.6 Contribuição para o custeio de serviço de iluminação
pública.......................................... 4.
CONSIDERAÇÕES
FINAIS.................................................................................. Capítulo 9 ESTUDO SOBRE A POSSIBILIDADE DE OS MUNICÍPIOS SEREM CONDENADOS POR DANOS MORAIS E MATERIAIS DECORRENTES DO AJUIZAMENTO DE EXECUÇÕES FISCAIS INDEVIDAS. Por Dirceu Galdino Barbosa Duarte 1.
CONSIDERAÇÕES
INICIAIS............................................................................... 2. DO ACESSO À JUSTIÇA............................................................................... 3. OS PRINCÍPIOS VIOLADOS PELA ADMINISTRAÇÃO AO AJUIZAR EXECUÇÕES FISCAIS INDEVIDAS.......................................................................... 4. A EXECUÇÃO FISCAL INDEVIDA COMO
CARACTERIZAÇÃO DO ABUSO DE DIREITO...............................................................................
5. DANO MORAL DECORRENTE DA EXECUÇÃO FISCAL INDEVIDA....................... 6. AS CONDIÇÕES DA AÇÃO COMO FREIO A PROPOSITURA DE AÇÕES INDEVIDAS..........................................................................
7. CONSEQUÊNCIAS PARA O CONTRIBUINTE............................................................... 8. CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................. . Capítulo 10 PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA DOS TRIBUTOS MUNICIPAIS. Por André Nóbrega Quintas Colares
4. 1. INTRODUÇÃO..................................................................... 5. 2. NASCIMENTO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO
– LANÇAMENTO .................... 6.
3.
DECADÊNCIA
.............................................................................................. 7. 4. PRESCRIÇÃO – MORTE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO ..................................... 8. 5. MODALIDADES DE LANÇAMENTO DOS TRIBUTOS MUNICIPAIS ........... 9. 6. AS REGRAS DE PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA............................................ 10. 6.1 Regra geral da decadência e prescrição do direito do município, aplicável aos tributos com lançamento de ofício ou por declaração..................................................... 11. a) Quando o município notifica o contribuinte acerca de ato preparatório ao lançamento (lançamento por declaração ou de ofício) ................................................... 12. b) Quando a administração tributária não notifica o contribuinte................................... 13. 6.2 Contagem dos prazos decadenciais para o sujeito ativo de tributos sujeitos ao lançamento por homologação (ITR e
ISS)..................................................................... 14. a) Quando o contribuinte informa a menor, paga o
valor declarado integralmente....... 15. b) Quando o contribuinte informa o valor corretamente, mas paga a menor ou nada paga....................................................................................... 16. c) Quando o contribuinte informa a menor e paga a
menor o valor declarado............... 17. 6.4.1. Tributos sujeitos ao lançamento de ofício e declaração........................................ 18. a) Quando há decisão administrativa ou judicial que reforme decisão condenatória anterior.................................................................................. 19. b) Prazo para o contribuinte discutir o débito judicialmente quando há decisão administrativa que denega a restituição........................................................................... 20. 6.4.2. Tributos sujeitos ao lançamento por homologação............................................... 21. a) Antes da Lei Complementar 118 de 2005..................................................................
22. b) Após a Lei Complementar 118 de 2005..................................................................... 6.5 Suspensão e Interrupção dos Prazos Decadenciais................................................. 6.5.1 Suspensão dos Prazos Decadenciais............................................................. 6.5.2 Interrupção dos prazos decadenciais (art. 173, II do
CTN)................................ 23. a) Sujeito passivo notificado de ato preparatório ao lançamento apresenta defesa administrativa........................................................................ 24. b) Sujeito passivo notificado de ato preparatório ao lançamento não apresenta defesa administrativa .............................................................................................. 6.6 Suspensão e Interrupção dos Prazos Prescricionais............................................... 6.6.1 Suspensão dos prazos prescricionais................................................................. 6.6.1.1 Negociação de dívidas tributárias e a suspensão dos prazos............................. 6.6.2 Interrupção do prazo
prescricional............................................................... 25. 7. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE 26. 7.1. No processo Administrativo Fiscal.............................................................. 27. 8. A suspensão fática do prazo decadencial............................................................... 28. 9. Considerações
Finais..................................................................................... 29. 10. Bibliografia........................................................................... 3ª PARTE DIREITO TRIBUTÁRIO MUNICIPAL. Capítulo 11 ESPÉCIES DE TRIBUTOS MUNICIPAIS: IMPOSTOS (ISS, IPTU, ITBI), TAXAS, CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA, CONTRIBUIÇÃO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA – COSIP E CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. Por Alexandre Henrique Salema Ferreira
1.
INTRODUÇÃO..................................................................... 2. CLASSIFICAÇÃO DOS TRIBUTOS ................................................................................ 2.1 Classificação econômica dos tributos ................................................................................
3. ESPÉCIES DE TRIBUTOS............................................................................ 4. ESPÉCIES DE TRIBUTOS MUNICIPAIS......................................................................... 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................. IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS DE QUALQUER NATUREZA – ISS Capítulo 12 INCIDÊNCIA DO ISS SOBRE O ARRENDAMENTO MERCANTIL DE BENS MÓVEIS E IMÓVEIS LEASING
Por Eduardo Coelho 1.
INTRODUÇÃO..................................................................... 2. DEFINIÇÃO DE ARRENDAMENTO MERCANTIL....................................................... 3. COMPETÊNCIA...................................................................
3.1 Conceito................................................................................ 3.2 Características....................................................................... 3.3 Dos impostos................................................................................ 3.4 Dos impostos municipais............................................................................. 4. IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS DE QUALQUER NATUREZA. REGRA MATRIZ DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA....................................................................... 4.1 Análise da “regra matriz de incidência tributária” do ISS sobre as operações de leasing. 4.1.1 Da adequação do aspecto
material................................................................................. 4.1.2 Da adequação do aspecto espacial .................................................................................. 5. ENTENDIMENTO PESSOAL SOBRE A MATÉRIA....................................................... 6. POSIÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. LEADING CASE. RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº
592.905 – SANTA CATARINA.................................................... 7. CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................
Capítulo 13 ANÁLISE DA INCIDÊNCIA DO ISS NOS PLANOS DE SAÚDE. Por Eduardo J. dos S. P. de Hollanda Cavalcanti 1. FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL DO IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS................... 2. A SIMETRIA DO ISS NOS CÓDIGOS TRIBUTÁRIOS
MUNICIPAIS. REPERCUSSÃO NACIONAL DO TEMA............................................................................ 3. DA NÃO-INCIDÊNCIA DO IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS – ISS SOBRE EVENTOS NÃO INDENIZÁVEIS. IMPOSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO DE CONCEITOS E FORMAS DE DIREITO PRIVADO.............................................................
4. UMA BREVE ANÁLISE DA REGRA-MATRIZ DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA. NÃO SATISFAÇÃO DE TODOS OS SEUS ELEMENTOS. IMPOSSIBILIDADE DE TRIBUTAÇÃO PELO ISS......................................................................................... 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................
Capítulo 14 ESTUDO SOBRE A INCIDÊNCIA E BASE DE CÁLCULO DO ISS NAS SOCIEDADES DE ADVOGADOS. Por Wilson Sales Belchior e Edmilson Ewerton Ramos
De Almeida
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS............................................................................... 2. FUNDAMENTAÇÃO NORMATIVA E JURÍDICA DO ISS............................................ 3. ATUAL CONCEPÇÃO PRÓ-ADMINISTRAÇÃO
PÚBLICA......................................... 4. BASE DE CÁLCULO DO ISS PARA AS SOCIEDADES PROFISSIONAIS.................. 5. ATUAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL ORGANIZADA..................................................... 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................
Capítulo 15 O ISSQN NA BASE DE CÁLCULO DO IRPJ, PIS, COFINS E CSLL Por Renato Cesar Guedes Grilo
1. INTRODUÇÃO.............................................................. 2. O ISSQN NA BASE DE CÁLCULO DO IMPOSTO SOBRE RENDA E PROVENTOS DE QUALQUER NATUREZA DE PESSOA JURÍDICA – IRPJ 1. Aspectos Constitucionais – base econômica do tributo 2. Fato Gerador (Aspecto Material) e Base de Cálculo do tributo 3. Peculiaridade da apuração mediante o lucro real e a jurisprudência sobre o tema 30. 3. O ISSQN NA BASE DE CÁLCULO DAS CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS 1. Breves comentários sobre as contribuições na Constituição Federal de 1988 2. O ISSQN na Base de Cálculo da Contribuição Sobre o Lucro Líquido – CSLL 3. O ISSQN na Base de Cálculo do PIS/PASEP e da COFINS
3.3.1 A regulação jurídica do PIS e da COFINS 3.3.2 A inclusão do ISSQN no conceito de receita ou faturamento para fins de incidência do PIS/COFINS
4. CONCLUSÃO................................................................ Capítulo 16 PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO E ISSQN Por Cássio Nunes de Lira Braga 1. INTRODUÇÃO. 2. O ISSQN E SUAS CARACTERÍSTICAS FUNDAMENTAIS NA LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA E NA JURISPRUDÊNCIA DOS TRIBUNAIS SUPERIORES 3. 3. A REGRA DE INCIDÊNCIA DO ISSQN EM RELAÇÃO AO ICMS (ART. 1º, § 2º DA LC 116/03) 4. ELISÃO FISCAL RELACIONADA ÀS EMPRESAS DE SERVIÇOS DE STREAMING
5. AMUSEMENT TAX RULING 5 DE JUNHO DE 2015 EM CHICAGO: TRIBUTAÇÃO SOBRE O ENTRETENIMENTO 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS E REFLEXÃO SOBRE A NATUREZA DO SERVIÇO DE STREAMING DE VÍDEOS IMPOSTO SOBRE A PROPRIEDADE E TERRITORIAL – IPTU Capítulo 17 ANÁLISE DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE URBANA E O IMPOSTO PREDIAL TERRITORIAL URBANO – IPTU, PROGRESSIVO NO TEMPO Por Thiago Bento Quirino Herculano
1. INTRODUÇÃO..................................................................... 2. BREVE CONTEXTO DOS PROBLEMAS URBANOS NO BRASIL.............................. 3. A FUNÇÃO SOCIAL DA
PROPRIEDADE.................................................................... 3.1 A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE NA CONSTITUIÇÃO DE 1988................ 3.2 FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE URBANA ...................................................... 4. O IPTU PROGRESSIVO NO TEMPO COMO INSTRUMENTO DE ATUAÇÃO
URBANÍSTICA................................................................. 4.1 FISCALIDADE E EXTRAFISCALIDADE........................................................ 4.2 O IPTU EXTRAFICAL E O REGRAMENTO CONFERIDO PELO ESTATUTO DA CIDADE – LEI Nº 10.257/2001 ............................................................................................. 4.3 DIFERENCIAÇÃO ENTRE “SANÇÃO DE ATO ILÍCITO” E O “CARÁTER SANCIONATÓRIO” DO IPTU PROGRESSIVO ................................................................. 4.4 O PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO DO CONFISCO E A PROGRESSIVIDADE EXTRAFISCAL....................................................................
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................. Capítulo 18 RURAIS NO BRASIL: DA ZONA CINZENTA ENTRE O IPTU E O ITR À CONSTRUÇÃO DE UMA POLÍTICA FISCAL ADEQUADA À REALIDADE RURAL BRASILEIRA. Por Daniel Ferreira de Lira
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS............................................................................... 2. DA RELEVÂNCIA DOS NÚMEROS RELACIONADOS À QUESTÃO DOS PEQUENOS MUNICÍPIOS RURAIS BRASILEIROS.......................................................... 3. O IMBRICAMENTO TRIBUTÁRIO DO IPTU E DO ITR À LUZ DA REALIDADE RURAL E REGIONAL BRASILEIRA........................................................................ 4. CRÍTICA AO CRITÉRIO DA LOCALIZAÇÃO – UMA FICÇÃO INADEQUADA COMO TODA
FICÇÃO................................................................................ 5. MAIS DUAS BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE ESSE IMBRICAMENTO............. 5.1 O imóvel por acessão física e o ITR................................................................................... 5.2 Áreas urbanizáveis ou de expansão urbana........................................................................
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................. Capítulo 19 TRIBUTAÇÃO INDUTORA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS: O BENEFÍCIO FISCAL DE IPTU PARA ADOÇÃO DE CRIANÇAS CARENTES E OS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE Por Fernando Lucena Pereira dos S. Junior e Rodrigo Silveira Rabello de Azevedo
1. INTRODUÇÃO.....................................................................
2. A PROBLEMÁTICA DA EFICÁCIA DOS DIREITOS SOCIAIS....................................
3. DIREITOS FUNDAMENTAIS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE.......................... 4. NORMAS TRIBUTÁRIAS INDUTORAS........................................................................ 5. ANÁLISE DA LEGISLAÇÃO: LEI MUNICIPAL Nº.
117/98 DA CIDADE DE NATAL.................................................................................. 5.1. Da inconstitucionalidade da norma................................................................................... 6. CONSTITUCIONALIDADE EM FACE DOS PRINCÍPIOS TRIBUTÁRIOS E DA ORDEM ECONÔMICA....................................................................... 7. A POSIÇÃO DOS TRIBUNAIS ACERCA DA LEI ANALISADA.................................. 8. CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................
IMPOSTO SOBRE A TRANSMISSÃO DE BENS
IMÓVEIS – ITBI Capítulo 20 O REGIME JURÍDICO DO IMPOSTO SOBRE A TRANSMISSÃO DE BENS IMÓVEIS E DIREITOS A ELE RELATIVOS Por Diego Fernandes Guimarães
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS............................................................................... 2. HISTÓRICO DO ITBI....................................................................................... 3. ANÁLISE DA REGRA-MATRIZ DE INCIDÊNCIA DO ITBI............................................. 3.1 ELEMENTO OBJETIVO: TRANSMISSÃO “INTER VIVOS”, POR ATO ONEROSO.... 3.1.1 Elemento objetivo: transmissão de bens imóveis e de direitos reais a estes relativos......... 3.1.1.1 A questão que merece reflexão se refere ao compromisso de compra e venda e de sua natureza jurídica.................................................................................. 3.1.2 Elemento objetivo: cessão de direitos à aquisição de
bens imóveis.................................... 3.1.3 Elemento objetivo: bens imóveis por natureza ou acessão física........................................ 3.2 ASPECTO TEMPORAL DA HIPÓTESE INCIDÊNCIA DO ITBI............................... 3.3 ASPECTO PESSOAL DA HIPÓTESE INCIDÊNCIA DO ITBI....................................
DE DE
3.3 ASPECTO QUANTITATIVO DA HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA DO ITBI....................... 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................. Capítulo 21 O ITBI, SUA (NÃO) INCIDÊNCIA E O PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO NAS SUCESSÕES Por Amanda Lucena Lira 31. INTRODUÇÃO. 32. EMPRESA FAMILIAR. 33. HOLDING 34. SUCESSÃO PATRIMONIAL 35. ITBI: IMUNIDADE E ISENÇÃO
36. UM
HOLDING PATRIMONIAL FAMILIAR: MEIO PARA REALIZAÇÃO DE
PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO NA SUCESSÃO. 37.
CONCLUSÃO.
CONTRIBUIÇÃO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA – CIP Capítulo 22 DESDOBRAMENTOS DA CONTRIBUIÇÃO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA SOB O VIÉS CONSTITUCIONAL Por Saulo Medeiros da Costa Silva e Italo Dominique da Rocha Juvino
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS............................................................................... 2. ASPECTOS HISTÓRICOS DA CONTRIBUIÇÃO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA – CIP... 2.1 Taxa de iluminação pública..................................................................................
2.1.1 Taxa de polícia...................................................................................
2.1.2 Taxa de serviços................................................................................. 2.1.3 Da inconstitucionalidade da Taxa de iluminação pública.................................................... 3. DO SURGIMENTO DA CONTRIBUIÇÃO DE
ILUMINAÇÃO PÚBLICA........................ 4. TERMINOLOGIA E CONCEITO DA CONTRIBUIÇÃO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA.. 5. NATUREZA JURIDICA DA CONTRIBUIÇÃO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA................. 6. DA (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA CONTRIBUIÇÃO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA.............................................................................. 6.1 PELA CONSTITUCIONALIDADE DA COSIP................................................................... 6.2 PELA INCONSTITUCIONALIDADE DA COSIP............................................................... 7. DAS PECULIARIDADES DA CONTRIBUIÇÃO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA – CIP....
7.1 Da efetiva utilização dos recursos da contribuição de iluminação pública............................. 7.2 Análise da cobrança da COSIP na fatura de energia elétrica.................................................. 7.3 Progressividade das alíquotas da COSIP................................................................................ 8. CONSIDERAÇÕES
FINAIS.................................................................................. TAXAS Capítulo 23 TAXAS MUNICIPAIS Por Massillania Gomes Medeiros
1. INTRODUÇÃO..................................................................... 2. HISTÓRIA DAS TAXAS.................................................................................. 2.1 História das taxas no Brasil.....................................................................................
3. NATUREZA JURÍDICA DOS TRIBUTOS............................................................................
4. DAS TAXAS.................................................................................. 4.1 Diferença entre Taxa e Tarifa (preço público)........................................................................ 4.2 Competência tributária para instituir as
taxas......................................................................... 4.3 Fatos geradores das taxas...................................................................................... 4.4 Base de cálculo e caráter contraprestacional das taxas........................................................... 4.5 Espécies de taxas...................................................................................... 4.5.1 Taxa de polícia................................................................................... 4.5.2 Taxa de serviços................................................................................. 5. (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA TAXA DE REMOÇÃO DE LIXO............................. 6. CONSIDERAÇÕES
FINAIS.................................................................................. Capítulo 24 A COBRANÇA DA TAXA DE LICENCIAMENTO AMBIENTAL PELOS MUNICÍPIOS Por Talden Farias e Geórgia Karênia Martins de Melo
1. INTRODUÇÃO..................................................................... 2. ASPECTOS GERAIS DO LICENCIAMENTO AMBIENTAL.............................................. 2.1 Licenciamento Ambiental.............................................................................. 2.2 Fases do licenciamento ambiental............................................................................... 2.3 Atividades sujeitas ao licenciamento ambiental..................................................................... 3. COMPETÊNCIA DO MUNICÍPIO PARA REALIZAR O LICENCIAMENTO AMBIENTAL........................................................................ 4. A TAXA DE LICENCIAMENTO
AMBIENTAL................................................................... 5. CONSIDERAÇÕES
FINAIS..................................................................................
CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA Capítulo 25 CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA MUNICIPAL Por Paulo A. Caliendo Velloso da Silveira
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS............................................................................... 2. DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO DA CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA NO DIREITO ESTRANGEIRO................................................................... 3. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA NO DIREITO BRASILEIRO........................................................................ 3.1 A contribuição de melhoria na Constituição Federal de 1988................................................
4. NATUREZA E ELEMENTOS DAS CONTRIBUIÇÕES DE MELHORIA NO DIREITO
BRASILEIRO........................................................................ 5. DISTINÇÃO ENTRE IMPOSTOS, TAXAS E CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA............ 6. DA NATUREZA DE CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA TIPO BENEFÍCIO NO DIREITO
BRASILEIRO........................................................................ 6.1 Regime da contribuição de melhoria no direito brasileiro...................................................... 7. ELEMENTOS DA CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA NO DIREITO BRASILEIRO........ 7.1 Aspecto material................................................................................. 7.2 Aspecto pessoal.................................................................................. 7.3 Aspecto espacial................................................................................. 7.4 Aspecto quantitativo............................................................................ 7.4.1 Base de
cálculo................................................................................... 7.4.2 Da forma do
cálculo................................................................................... 7.5 Aspecto temporal................................................................................ 7.6 Lançamento............................................................................
8. ANÁLISE DE CASOS CONTROVERSOS................................................................ CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA Capítulo 26 CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA MUNICIPAL Por José Egberto Alves de Sousa, Julia Rodrigues Alves e John Tenório Gomes
1. INTRODUÇÃO..................................................................... 2. ANÁLISE HISTÓRICO-JURÍDICA DO SISTEMA PREVIDENCIÁRIO BRASILEIRO....
3. NATUREZA TRIBUTÁRIA DAS CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS.....................
4. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE E A INSTITUIÇÃO DAS CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS............................................................ 5. VIABILIDADE DOS REGIMES PRÓPRIOS DE PREVIDÊNCIA NOS MUNICÍPIOS......
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................
TEMAS ESPECIAIS Capítulo 27 ANÁLISE DOS TRIBUTOS RECOLHIDOS PELO MUNICÍPIO À UNIÃO E AOS ESTADOS Por Arthur Moura e Leonardo Cordeiro Brasil
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS........................................................................ 2. IMUNIDADE RECÍPROCA E SUA
ABRANGÊNCIA.............................................. 3. DAS CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS DOS MUNICÍPIOS.......................................... 4. DAS TAXAS DEVIDAS PELOS MUNICÍPIOS....................................................... 5. AS CONTRIBUIÇÕES DE MELHORIA NO TERRITÓRIO MUNICIPAL DECORRENTES DE
OBRAS EFETUADAS POR OUTRO ENTE PÚBLICO......... 6. DA INSCRIÇÃO DOS MUNICÍPIOS EM DÍVIDA ATIVA DE OUTROS ENTES E O AJUIZAMENTO DE EXECUÇÕES FISCAIS CONTRA A FAZENDA PÚBLICA MUNICIPAL.................................................................. Cap í tulo 28 FPM – FUNDO DE PARTICIPA Ç AO DOS MUNIC Í PIOS E OS REFLEXOS DA ISEN ÇÃ O DO IPI Por Morgana Rosa 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS
2. REPARTIÇÃO CONSTITUCIONAL DE RECEITAS 2.1 Federalismo e repartição de competências tributárias 2.2 Transferência de receita da União para os Municípios e o Fundo de Participação dos Municípios 3
EXTRAFISCALIDADE DO IPI
4 IMPACTO DAS DESONERAÇÕES TRIBUTÁRIAS NO FPM 4.1 Correção do procedimento de cálculo adotado pelo TCU 4.2 Repartição do ônus econômico financeiro na Federação
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS..............................................................................
Capítulo 29 DOS CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA MUNICIPAL
Por Luciara Lima Simeão Moura
1. INTRODUÇÃO ....................................................................................... 2. OS CRIMES CONTRA ORDEM TRIBUTÁRIA E OS PRINCIPAIS ASPECTOS PENAIS E
PROCESSUAIS............................................................. 1. OS TIPOS PENAIS DA LEI N. 8.137/90........................................................ 2. CONSEQUENCIAS DO PAGAMENTO OU PARCELAMENTO DOS TRIBUTOS............................................................. 3. O PRÉVIO EXAURIMENTO DA VIA ADMINISTRATIVA ANTES DA INSTAURAÇÃO DE PROCESSO PENAL...................................................... 3. OS CRIMES CONTRA ORDEM TRIBUTÁRIA MUNICIPAL. ISSQN...................... 1. BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE O ISSQN...................................................
2. OS CRIMES RELATIVOS AO ISSQN....................................................................
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................... 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..........................................................................
38.
Capítulo 30 TRIBUTOS MUNICIPAIS NO CONTEXTO DO SIMPLES NACIONAL Francisco Leite Duarte
1. INTRODUÇÃO ....................................................................................... 2. COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA MUNICIPAL E IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS DE QUALQUER NATUREZA (ISSQN) .................................................................. 3. O SIMPLES NACIONAL
....................................................................................... 4. O ISSQN NO ÂMBITO DO SIMPLES NACIONAL ................................................
1ª PARTE DIREITO CONSTITUCIONAL APLICADO AO DIREITO TRIBUTÁRIO MUNICIPAL.
Capítulo 1 A POSIÇÃO DOS MUNICÍPIOS NO FEDERALISMO BRASILEIRO. Raphael Alexander Rosa Romero[3] 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS. O presente estudo pretende revelar, diante da forma de Estado alvitrada pela Constituição de 1988, qual posição os Municípios ocupam dentro do federalismo brasileiro. Para tanto, será analisada a formação dos Estados Modernos e, em seguida, será indicada a conceituação das mencionadas entidades. Além disso, bem como serão observadas as diferentes formas de Estado, ou seja, as distintas maneiras sob as quais um Estado aparelha o poder político dentro do seu território. Umas das formas de Estado existentes é o
Estado Federal. Esse modelo de organização estatal tem imensa relevância no desenvolvimento deste trabalho, já que a Carta Constitucional brasileira de 1988 adota a federação para assentar sua organização políticoadministrativa. Assim, necessário se faz identificar a origem do Federalismo, em 1787 nos Estados Unidos e, a seguir, considerar o surgimento do Estado Federal brasileiro. Ato contínuo, será realizada uma abordagem sobre a evolução histórica dos municípios diante das Constituições federalistas brasileiras, com destaque para o exame de quais tipos de autonomias foram conferidas às municipalidades pelo constituinte de 1988. Por fim, trataremos de responder qual o verdadeiro lugar ocupado pelas municipalidades na atual Carta Constitucional brasileira. 2. SURGIMENTO DOS ESTADOS MODERNOS. O surgimento dos Estados Modernos nos remete a meados do século XVI quando monarcas,
idealizando a detenção completa do poder político, unificaram os feudos através de guerras e tratados. Como consequência das unificações surge, através do tempo, o sentimento de nação e o referencial de território entre seus habitantes, o que possibilitou o nascimento dos primeiros Estados Modernos (Espanha, França, Inglaterra, Portugal, etc.). De acordo com Carvalho (2009, p. 89), os Estados evoluíram através de fases como: Estados Estamentais, em que os direitos eram conferidos à classe (nobreza, clero e povo) a qual o indivíduo pertencia e não a ele próprio; Estados Absolutistas, nos quais o monarca concentrava o poder político e jurisdicional e interferia em todos os setores da sociedade e a ele próprio era conferido a soberania e não ao Estado; e Estado de Direito ou Estado Constitucional, que emerge com a Revolução Francesa, em 1789, e tem como principal característica o surgimento da Soberania do Estado, fato que tornou-se possível após o poder político ser retirado, por meio de movimentos revolucionários, das mãos do monarca e transferido para a nação.
3. CONCEITO DE ESTADO. A partir do século XVI o mundo inseriu-se em um contexto em que os Estados Modernos surgiram e estavam em pleno desenvolvimento. Era um cenário de evolução político-administrativa sem volta. Considerando o exposto, conceituar Estado tornou-se um verdadeiro desafio doutrinário e teórico para as várias correntes do pensamento político. Entre outros autores e teóricos, Azambuja (1996, p. 3) dispõe que “o Estado é obra da inteligência e da vontade dos membros do grupo social, ou dos que nele exercem o governo e influência”. Kelsen (1998, p. 261) leciona, ainda, que o Estado “é a personificação da ordem jurídica nacional”. De forma sucinta, utilizaremos a conceituação geral fornecida pela máxima de que Estado é um povo, um governo, um território, ou seja, Estado é a afluência de determinadas pessoas que povoam determinado território, sob determinada forma de governo.
4. FORMAS DE ESTADO E O SURGIMENTO DO FEDERALISMO. Estado Unitário, Federação e Confederação são expressões contemporâneas que classificam os estados de acordo com a capacidade de distribuição do poder político dentro de seus territórios. Compreende-se, com tais expressões, os estágios que vão da maior à menor centralização do poder político em cada estado, estando a federação em um estágio intermediário nesta classificação. Antes de adentrarmos nos conceitos e características básicas de cada forma de estado, é importante apreendermos os conceitos de soberania e autonomia. A percepção de tais conceitos é o marco inicial na compreensão e distinção do que vêm a ser o Estado Unitário, a Federação e a Confederação. Soberania nos remete à ideia de independência e de igualdade entre os estados. O estado soberano detém total controle sobre seu território e
população frente aos demais estados do plano internacional e, além disso, é superior aos seus entes internos. De acordo com o filósofo e jurista francês Bodin (2011) estado soberano é aquele “que não conhece superior na ordem externa, nem igual na ordem interna”. A autonomia é conferida aos entes internos de um Estado. Trata-se do exercício de poderes próprios por parte de entes infranacionais, porém sempre limitados e determinados pela soberania nacional. Assim, de maneira geral, uma confederação é caracterizada pela soberania dos seus componentes. Já a federação, embora soberana, é formada por componentes autônomos infranacionais (Estados-membros, em regra). O estado unitário, por sua vez, é soberano e não confere autonomia a nenhuma de suas partes constitutivas. De modo abrangente, no estado unitário o poder central é a cúpula do poder político e o único poder dentro do seu território. Quando desconcentra-se, o faz apenas em âmbito administrativo, porém sempre subordinando hierarquicamente a parcela descentralizada à administração central. Em seu território possui apenas
uma pessoa jurídica dotada de poder legislativo próprio. Assim, em um estado unitário, apenas uma espécie de lei regula as relações entre pessoas e pessoas e bens. Como supracitado, é característica intrínseca das confederações, o fato de suas unidades formadoras serem dotadas de soberania. Porém, sua formação é fruto da subscrição, por essas unidades soberanas, de um tratado internacional que as compromete a perseguir um objetivo comum, sem, acima de tudo, destituírem-se da própria soberania. Desse modo, é garantido o direito de secessão e se estabelece a igualdade entre suas unidades constitutivas. Citamos a União Europeia como exemplo atual de confederação. De modo distinto da forma de estado acima descrita, o estado federativo deriva da elaboração de uma constituição que fornecerá a legitimidade para a junção dos Estados-membros. Estas entidades infraconstitucionais unem-se sob um laço de inseparabilidade, ou seja, neste modelo de estado não há direito de secessão. No entanto, a característica fundamental de um
estado federal (aos moldes do federalismo clássico – EUA) é a imputação de autonomia aos estados componentes, atribuindo-se o poder soberano ao estado completo. Reputa-se também às federações o fato de os Estados-membros terem representação no Senado Federal. Um detalhe a ser percebido neste ponto é o fato de que como todos os componentes da federação são dotados de autonomia, a representação no Senado se dá de forma igualitária entre eles. Outro predicado marcante em um cenário federativo é o fato de que a Constituição Federal é incumbida da missão de repartir as competências entre as entidades que formam o estado composto. Por fim, caracteriza ainda a federação, o fato de haver uma Corte Suprema no poder judiciário responsável por manter a integridade da federação, assim como a guarda da Constituição Federal. Tais características retiram seu fundamento do federalismo clássico surgido em 1787, nos Estados Unidos. 5. SURGIMENTO DO FEDERALISMO.
Após a independência das treze colônias americanas do domínio inglês, em 1776, o cenário encontrado na América do Norte era montado através de treze Estados soberanos que compartilhavam pontos similares em sua existência, como: história, língua, cultura, leis e religião. Além disso, tais Estados visavam os mesmos objetivos: primeiramente, o de eliminar a possibilidade de guerras entre eles (já que eram vizinhos, soberanos e não dispunham de um órgão apropriado para intermediar suas diferenças) e, em segundo lugar, o de proteger seus territórios, pois temiam uma possível retaliação por parte da coroa inglesa. Outrossim, os Estados preocupavam-se com o protecionismo individual de suas capacidades produtivas, pois aspiravam a livre circulação de produtos entre eles. Enfim, almejavam uma estabilidade política e econômica. Diante desse panorama, em 1777, os treze Estados da América do Norte decidiram se unir segundo o formato de uma confederação e, como é peculiar a esta
forma de estado, mantiveram individualmente a soberania e o direito de separação a qualquer tempo. No entanto, tal modelo de união estatal não prosperou, já que os Estados enfrentaram dificuldades justamente por manterem a soberania e, ao contrário do que ambicionavam, a confederação não lhes trouxe estabilidade, mas sim, dissenso de ideias. É neste contexto que dez anos mais tarde, em 1787, surge o federalismo. Uma saída centralizadora para a resolução de problemas políticos e econômicos enfrentados pelos Estados norte-americanos enquanto formadores de uma confederação. Assim, os treze Estados uniram-se em torno de um governo central – a União – porém, individualmente mantiveram as autonomias legislativa, financeira e administrativa, conferindo, então, soberania à federação. É importante frisar que esse processo resultou em uma guerra civil durante a segunda metade do século XIX (1861-1865), a guerra de secessão. Nesse conflito, os estados do sul que compunham a federação, fundamentados em ideais escravagistas, manifestaram-se a
favor da dissolução do Estado Federal, em detrimento do anseio pela manutenção da união exprimido pelos estados do norte, que eram industrializados e a favor da abolição da escravidão. Em suma, os estados do norte saíram vitoriosos, com uma economia fortificada e com seu ideal político consolidado. Aos estados do sul restou o reconhecimento de uma integração indissolúvel ao Estado Federal, firmando-se, então, os Estados Unidos da América. Historicamente, os Estados Unidos formaram a primeira federação da história, convertendo-se em uma fonte inspiradora aos demais Estados Federativos atualmente existentes. Conhecido como Estado Federal clássico, o federalismo norte-americano lega o exemplo da formação de um Estado Federativo aos estados contemporâneos através das seguintes características: 1. Formação centrípeta, pelo fato de a federação ter sido formada a partir da centralização de Estados independentes que abriram mão da soberania individual, transferindo-a para o Estado Federal,
restando-lhes o poder autônomo, formando assim, todos unidos, um só Estado; 2. Auto-organização dos Entes que compõem a Federação, no sentido de que cabe a cada um dos Estados-membros elaborarem sua Lei Maior, porém, evidentemente, com limites traçados pela Constituição Federal; 3. Federalismo Dual, onde duas são as fontes do poder normativo, a União e os Estados-membros. Ambos exercem poder político sobre o mesmo território e, consequentemente, sobre as mesmas pessoas, porém, de forma coordenada pela Constituição Federal; 4. A proibição de separação (indissolubilidade do vínculo federativo) por parte estados componentes da federação; 5. Repartição de competências exclusivas distribuídas por uma Constituição Federal rígida entre a União e os Estados-membros; 6. Participação dos Estados-membros na vontade federal, através de uma casa legislativa exclusiva (Senado Federal), em que os estados componentes da
federação são representados de forma igualitária e atribui-se o mesmo peso aos votos de todos, não importando o tamanho, a população ou economia de cada um; 7. A existência de um Tribunal Supremo, responsável por dirimir eventuais conflitos entre os Estados-membros e por guardar a Constituição Federal; e 8. Possibilidade de intervenção de um Ente Federado em outro, porém em casos excepcionais, com a finalidade de resguardar o pacto federativo e a autoridade da Constituição Federal. É saudável exaltar que a existência dos Estados Federativos contemporâneos não está condicionada a implementação de todas as características supramencionadas, porém, revelam-se em uma realidade predominante nos modelos federalistas de Estado ao redor do globo. 6. ESTADO FEDERAL BRASILEIRO. A forma federativa de estado foi implantada
no Brasil a partir da Constituição Republicana de 1891. Antes disso, sob a égide da Constituição Monárquica de 1824, o Brasil organizava-se político-administrativamente sob os auspícios de um Estado Unitário, por meio do qual, centralizava o governo de todas as suas províncias. Assim sendo, a federação brasileira formou-se através da desagregação do Estado Unitário, transformando as províncias do império em Estados-membros da Federação. As Constituições brasileiras seguintes (1934, 1937, 1946, 1967, 1988) asseveraram a forma federativa, contudo, em razão de ter sofrido golpes políticos, o Estado Federal brasileiro enfrentou variações entre a centralização e a descentralização do poder conferido aos Estados-membros. A Constituição de 1891 adotou o modelo federativo dualista norte-americano. Desse modo conferiu maior autonomia aos Estados-membros. Paralelamente, a primeira constituição federativa trouxe também a forma republicana de governo e em seu corpo, o sistema presidencialista de governo, uma novidade que propiciou
a abertura política para a democratização do Estado. Porém, o período seguinte, sob a égide da Constituição de 1934, e tendo como pano de fundo uma crise econômica mundial, é caracterizado por uma forte centralização administrativa. Sob os auspícios de Getúlio Vargas, os Estados-membros viram escorrer de seu poder a grande parcela de autonomia a eles conferida pela Constituição de 1891. O regime autoritário do Estado Novo, estabelecido por Vargas, após outorgar a Constituição de 1937, apenas reforçou a centralização administrativa instituída pela Carta de 1934, mitigando ainda mais as vantagens já alcançadas pelos Estados-membros após a instauração do Estado Federal. Uma descentralização político-administrativa, em benefício dos Estados federados, ocorreu de modo concreto com a Constituição de 1946. Porém, acabou por ser um processo interrompido pelo Golpe Militar de 1964, que instituiu a ditadura no Brasil. Durante o período ditatorial – Constituições de 1967/1969 (em verdade, trata-se esta última, da
Emenda Constitucional n.º1 à Constituição de 1967, outorgada em 17 de outubro de 1969, considerada majoritariamente pela doutrina constitucional brasileira como uma Constituição por ter modificado duramente o texto da Constituição de 1967) – as competências político-administrativas centralizaram-se sob o poder da União de modo tão veemente que aos Estados-membros restaram participar de um Estado Federativo nominal, apenas. O centralismo autoritário, enfrentado pelos componentes da Federação no último período ditatorial, chega ao fim com a promulgação da Constituição de 1988. A atual Carta Constitucional resgata o espírito do Estado Federativo através de um sistema de repartição de competências que, comparado aos anteriores, traz um maior equilíbrio entre União, Estados-membros e Municípios, sem, contudo, deixar de conferir ainda à União a parcela mais elástica das competências legislativas e administrativas. Sendo assim, a Constituição Federal de 1988, incluiu os Municípios como entes integrantes da
federação. Novidade não só na história da federação brasileira, mas também mundial. Com essa iniciativa, o Estado Federal brasileiro consagra-se como sendo a primeira federação de terceiro grau dentre todas existentes, em detrimento do federalismo clássico estadunidense, que é de segundo grau e pautou nosso modelo federalista brasileiro até a penúltima Constituição Federal. Essa inovação será discutida no item a seguir. 7. EVOLUÇÃO DA AUTONOMIA MUNICIPAL NA FEDERAÇÃO BRASILEIRA: DA CONSTITUIÇÃO DE 1891 À CONSTITUIÇÃO DE 1988. Conforme afirmado anteriormente, a primeira Constituição Federal brasileira (1891) foi elaborada e vigorou sob os padrões da Constituição dos Estados Unidos da América do Norte de 1787. Naturalmente, trazendo as principais características daquela Carta Constitucional. Como não poderia deixar de ser, no texto
constitucional de 1891, o federalismo clássico ou de segundo grau estava enraizado, pautando a única relação de descentralização político-administrativa existente: entre a União e os, então criados, Estados-membros. Desse modo, o tratamento aforado às municipalidades não ultrapassava à realidade de serem uma extensão do território dos Estados-membros. Desta feita, incumbiam aos citados entes federativos assegurar aos municípios autonomia para que tratassem de interesses locais, escolhendo, para tanto, os seus prefeitos. Nesse sentido, prescrevia a Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 1891 (Título III): “Art 68 - Os Estados organizar-se-ão de forma que fique assegurada a autonomia dos Municípios em tudo quanto respeite ao seu peculiar interesse.” Cabe ressaltar que sob a égide da mencionada Carta Constitucional, vigorava no País a “Política do Coronelismo”, que ficou historicamente conhecida pelo fato de os coronéis (grandes latifundiários dotados de forte influência sob a região e o povo que deles
dependiam) tratarem dos assuntos políticos com ânimo eminentemente particular, articulando as eleições estaduais e municipais (quando havia) de forma despotista e fraudulenta, o que determinou que se perpetuasse o caráter unicamente formal da pouca autonomia conferida aos municípios, afiançada pela Constituição Federal. O professor Meirelles (1996. p. 38), descrevendo os municípios sob a vigência da Constituição de 1891, revela a crítica situação de um ente desprovido de autonomia material quando registra: (...) o Município viveu quatro décadas, sem recurso, sem liberdade, sem progresso, sem autonomia. Os prefeitos eram eleitos ou nomeados ao sabor do governo estadual, representado pelo "chefe" todo poderoso da "zona". As eleições eram de antemão preparadas, arranjadas, falseadas ao desejo do "coronel".
E ainda: Durante os 40 anos em que vigorou a Constituição de 1891, não houve autonomia municipal no Brasil. O hábito do centralismo, a opressão do coronelismo e a incultura do povo transformaram os Municípios em feudos de políticos truculentos, que mandavam e desmandavam nos ‘seus’ distritos de influencia, como se o Município fosse
propriedade particular e o eleitorado um rebanho dócil ao seu poder. (MEIRELLES, 1996, p. 39)
Deste modo, não há margem de erro quando se afirma que, sob a égide da primeira Constituição Federal do Brasil, não apenas a autonomia municipal, mas também os poderes instituídos reprimiam-se ao poder, de fato, dos coronéis e, assim, manobravam-se as garantias reservadas pela Constituição às municipalidades, à vontade dos Estados-membros. Por outro lado, a segunda Constituição Federal brasileira, promulgada em 1934 sob os auspícios do primeiro governo de Getúlio Vargas, trouxe em seu texto, forte influência de ideologias que ascendiam à melhoria das questões socioeconômicas do país. Tais ideologias respingam diretamente nas municipalidades, uma vez que, logicamente, não havia ninguém melhor do que os prefeitos para compreender as necessidades urgentes da sociedade. Neste contexto, o constituinte de 1934 percebeu que era necessário avançar na questão da autonomia dos municípios e, além do mais, que deveria
possibilitá-los prestar os serviços públicos de maneira independente e, para tanto, seria necessário renda própria. Assim, a Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 1934 (Título I, Capítulo I), ampliou, em muito, as prerrogativas conferidas às municipalidades em detrimento da Carta anterior, dispondo em seu texto que: Art 13 - Os Municípios serão organizados de forma que lhes fique assegurada a autonomia em tudo quanto respeite ao seu peculiar interesse; e especialmente: I - a eletividade do Prefeito e dos Vereadores da Câmara Municipal, podendo aquele ser eleito por esta; II - a decretação dos seus impostos e taxas, a arrecadação e aplicação das suas rendas; III - A organização dos serviços de sua competência.
Sobre a ânsia de alargar as prerrogativas dos municípios para melhor satisfazer as necessidades da sociedade, Meirelles (2007, p.40) narra: A experiência do regime anterior demonstrou que não bastava a preservação do principio autonômico na Carta Magna para sua fiel execução. Era necessário muito mais. Precisavam as Municipalidades não só de governo próprio mas – antes e acima de tudo – de rendas próprias, que assegurassem a realização de seus serviços públicos e
possibilitassem o progresso material do Município.
Em detrimento das aplaudidas melhorias conferidas aos municípios, a Carta de 1934 vigeu por apenas três anos. Por conseguinte, eclodiram em países europeus regimes totalitários que desaguaram no Brasil, influenciando fortemente ao presidente Getúlio Vargas que acabam por ensejar o primeiro golpe ditatorial brasileiro ao outorgar a Constituição de 1937 que era, manifestadamente, inspirada na Constituição ditatorial da Polônia (1935), fato que a fez ficar popularmente conhecida pela alcunha de “Constituição Polaca”. Com ela, estava instituído o Estado Novo que duraria até 1945. Durante a vigência da Constituição de 1937 o país retrocedeu, em muito, no quesito descentralização político-administrativa e democracia. Todo o poder político se concentrou na União. Os Estados-membros perderam absurdamente suas autonomias, o que ocorreu de ainda mais avassalador aos municípios. Segundo a Carta de 1937, cabia ao presidente a nomeação de Interventores (Governadores) que
administrariam os Estados-membros e estes seriam os responsáveis por nomear os Prefeitos. Vide texto da Constituição de 1937: “Art. 27 - O Prefeito será de livre nomeação do Governador do Estado.” O ingresso do Brasil na segunda guerra mundial ao lado dos “aliados” na luta contra os regimes nazi-facistas determinou a queda de Getúlio Vargas e o fim do Estado Novo no Brasil. Assim, restou como saldo da primeira ditadura brasileira; o trauma sofrido pelo regime democrático e a ânsia dos entes federativos por uma nova ordem jurídica. A Constituição de 1946 foi promulgada em um cenário de manifesta necessidade de descentralização político-administrativa entre os entes federados. Desse modo, tal Constituinte garantiu, mesmo que de forma limitada, autonomia política, administrativa e financeira aos municípios privilegiando-os no sistema de repartição de competências, instituído em seu art. 30. Foi assegurada ainda aos municípios a administração de renda própria através de tributos, de acordo com o art. 28, II, “a” da Constituição de 1946,
vejamos: Art 28 - A autonomia dos Municípios será assegurada: (...) II - pela administração própria, no que concerne ao seu peculiar interesse e, especialmente, a) à decretação e arrecadação dos tributos de sua competência e à aplicação das suas rendas.
Sobre a descentralização políticoadministrativa e financeira concebida pela Corte de 1946 aos municípios, o mestre Meirelles (2007, p. 40) registra, in verbis: Na Constituinte, o Municipalismo ganhou corpo e veio a refletir-se na Constituição de 1946 sob o tríplice aspecto político, administrativo e financeiro. Impressionados com a hipertrofia do Executivo no regime anterior, os novos legisladores promoveram equitativa distribuição dos poderes e descentralizaram a administração, repartindo-a entre a União, os Estados-membros e os Municípios, de modo a não comprometer a Federação, nem ferir a autonomia estadual e municipal.
Bons ventos sopraram a favor da autonomia municipal por pouco mais de vinte anos, isso porque, no ano de 1964, o Brasil sofreu com mais um golpe ditatorial, dessa vez, inteiramente militar, que novamente
fez retroceder o processo de descentralização e democracia entre os entes da federação e, especialmente, a autonomia das municipalidades, isto é, o histórico Golpe Militar de 1964. Sob o comando presidencial do Marechal Castelo Branco, o Congresso Nacional foi extraordinariamente convocado com a finalidade de elaborar a Constituição que seria promulgada em 15 de março de 1967. Em decorrência dessa Carta, a autonomia dos municípios foi formalmente mantida, porém em muito limitada. Apenas a título de exemplo, a capacidade de auto-organização dos municípios novamente sucumbiu, quando expressamente o art. 16 da Constituição ditatorial estabeleceu que os Prefeitos dos principais municípios seriam nomeados pelos Governadores dos Estadosmembros. A Constituição Federal de 1967 sofreu ainda uma alteração que em muito diminuiu a já pouca autonomia que detinha. Trata-se da Emenda Constitucional nº 01 de 17 de outubro de 1969. As mudanças trazidas
pela citada emenda foram tão drásticas que inúmeros doutrinadores a consideram como a sétima constituição brasileira. Nesse sentido, declara José Afonso da Silva (2007, p. 87), in verbis: Teórica e tecnicamente, não se tratou de emenda, mas de nova constituição. A emenda só serviu como mecanismo de outorga, uma vez que verdadeiramente se promulgou texto integralmente reformado, a começar pela denominação que se lhe deu: Constituição da República Federativa do Brasil, enquanto a de 1967 se chamava apenas Constituição do Brasil.
Tal emenda tolheu a autonomia das municipalidades em muitos quesitos, dentre os quais se pode citar, a diminuição do número de vereadores de acordo com a proporção dos eleitores e o alargamento dos casos de intervenção dos Estados-membros nos municípios. Em face de tais restrições à democracia, o povo brasileiro ansiava o fim de uma época que ficou historicamente conhecida com “anti-federalismo” e queria a redemocratização do país. Assim, após o enfraquecimento do regime militar, é aprovada a Emenda
Constitucional nº 26, em 27 de novembro de 1985, convocando a Assembleia Nacional Constituinte com o objetivo de elaborar uma nova Carta Constitucional, desta vez, pautada no regime democrático de governo. Após todo o processo de elaboração do texto, em 05 de outubro de 1988, o então Deputado Federal constituinte, Ulisses Guimarães, promulga a Constituição da República Federativa do Brasil, que, por seu ideal democrático e garantista, foi popularmente denominada de Constituição Cidadã. Nesta Carta, os municípios alcançam um nível de descentralização inovador, ao ponto de serem qualificados como entidades da federação. Não obstante alguns doutrinadores, como por exemplo, José Afonso da Silva (2007, p. 475), José Alfredo Baracho Junior (2000) e José Nilo de Castro (2001, p. 46), afirmam ser impossível um município ser entidade federativa, por justificativas como: o fato de não dispor de Poder Judiciário próprio; de estarem inseridos no território dos Estados-membros; pelo fato de não terem voz no Congresso Nacional, ou ainda; pelo fato de o
federalismo clássico (União e Estados-membros) a molde estadounidense, não admitir um federalismo de terceiro grau (União, Estados-membros e Municípios) a parte majoritária da doutrina brasileira - Paulo Bonavides (2000, p. 379), Pontes de Miranda (apud MEIRELELES, 1996. p.45), Coelho (2005) - o reconhece como tal. Neste sentido: A federação dessarte, não é de Municípios e sim de Estados, cuja caracterização se perfaz com o exercitamento de suas leis fundamentais, a saber, a autonomia e a da participação. Não se vê, então, participação dos Municípios na formação da Federação. Os Municípios não têm representação no Senado Federal, como possuem os Estados federados, não podem propor emendas a Constituição Federal, como podem os Estados, nem possuem Poder Judiciário, Tribunais de Contas e suas leis ou atos normativos não se sujeitam ao controle de concentrado do STF. Ainda, o parecer prévio do Tribunal de Contas ou órgão equivalente só pode ser rejeitado por 2/3 dos Vereadores. Esse quorum qualificado não é exigido, na Carta Magna, para os entes federativos. Sem Estados-membros, não há que se falar em Federação. Sem municípios, não se pode afirmar o mesmo, evidentemente. (CASTRO, 2001, p. 46)
E ainda, opostamente:
A Constituição Federal inclui no pacto federativo os municípios e o distrito federal, petrificando a fórmula de maneira inusitada, porquanto o federalismo, em sua formação clássica, envolve apenas a união dos EstadosMembros (federalismo dual). Entre nós, o município ostenta dignidade constitucional, mormente em matéria tributária. Cada Estado Federal tem feições próprias. Uma das nossas acabou de ser exposta no que tange aos partícipes do pacto federal. (CASTRO, 2001, p. 65)
A parte das discussões doutrinárias, fato é que a Constituição Federal de 1988 (Título I), tanto em seu art. 1º, caput, quanto o art. 18, caput, declaram a qualificação dos municípios como entidade federativa. Senão vejamos: “Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...)”; e: “Art. 18 A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição” (Título III). Reforçando os artigos supramencionados, a atual Carta Política, com coerência, outorga aos municípios ampla gama de autonomias que, até então,
apenas haviam sido conferidas à União e aos Estadosmembros. Falamos aqui das capacidades de autoorganização (Autonomia Política), autogoverno, autolegislação, autoadministração, e ainda da autonomia financeira, que serão conceituadas no item seguinte. 8. AUTONOMIAS MUNICIPAIS. 8.1 Capacidade de Auto-Organização. A autonomia política, jamais conferida aos municípios, está expressa na Constituição de 1988, em seu art. 29, caput. Esta capacidade é de suma importância para o reconhecimento dos municípios como entidades da federação, vez que ao ser conferida, traz consigo duas outras capacidades: a de eleger seu Prefeito e vice, além dos seus Vereadores (autogoverno), e a de se autolegislar, pois acaba de eleger agentes políticos para esse intuito (Vereadores).
Assim, de acordo com o art. 29 da Constituição Federal, os Municípios se auto-organizam através de suas Leis Orgânicas. Sobre essa afirmativa, ensina Ferrari (1993, p. 66) que “dentro do aspecto político da autonomia municipal se encontra a capacidade de organizar e constituir o seu próprio governo, isto é, a capacidade de estruturar os Poderes Legislativo e Executivo, bem como seu inter-relacionamento.” 8.2 Capacidade de Autoadministração. A autonomia administrativa do município subsume-se no mister de gerir, de per si, os interesses locais. A Constituição expressa a capacidade de autoadministração municipal ao elencar, em seu art. 30, o rol de competências conferidas aos municípios em detrimento de interferências, tanto dos Estados-membros, quanto da União. 8.3 Autonomia Financeira.
É
nítida
a
importância
da
autonomia
financeira, conferida aos Municípios pela Constituição Federal, pois pouco adiantaria um município poder elaborar sua Lei Orgânica, ou mesmo eleger seu administrador ou legisladores, sem que lhe fosse concedida a autonomia financeira. O Art. 30. III dispõe que: “Compete ao Município, instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei”. Desta feita, as municipalidades detêm por completo as condições para realizar uma satisfatória prestação dos serviços públicos que lhe são ordenados pela Carta Constitucional, estando, verdadeiramente, em pé de igualdade com as demais entidades da Federação. 9. CONSIDERAÇÕES FINAIS. O objetivo deste estudo foi analisar, a partir
do surgimento do federalismo brasileiro, o percurso da capacidade autônoma dos municípios e, por fim, identificar se as autonomias concedidas pelo texto de 1988 os garante na posição de entidade federativa ao lado da União e dos Estados-membros, o que demonstraria ser a federação brasileira inovadora dentre os Estados federados no cenário internacional. O primeiro passo foi compreender o surgimento dos Estados Modernos, considerando sua evolução desde os Estados Estamentais até o Estado Constitucional, que se revelou um ambiente propício ao aparecimento dos Estados Federais. Ato contínuo, extraiuse da doutrina os elementos mais aptos à formação do conceito de Estado, e concluiu-se ser um povo organizado através de um governo no interior de seu território. A formação histórica dos Estados Modernos decidiu como se deu a organização dos governos no interior dos seus territórios, surgindo daí as diferentes formas de Estado analisadas no Capítulo 4. A partir desta análise chegou-se ao nascimento do federalismo, em 1787, em decorrência da
reunião das treze ex-colônias inglesas que formaram os Estados Unidos da América do Norte. A organização dessa forma de estado (federalismo clássico) foi modelo para as federações futuras. Este estudo foi a base para o exame da origem do federalismo no Brasil que, em 1891, apenas reproduziu a forma estadounidense até a penúltima Constituição (1967/69), o que não se deu com a Carta de 1988 que se desapegou do modelo clássico de federalismo ao inovar nas matérias atinentes às autonomias municipais. Formados os alicerces, verificou-se, no Capítulo 6º, a evolução pelo qual as municipalidades percorreram a partir da Constituição Federal de 1891 até a atual (1988), tendo sido demonstrado que hodiernamente, a posição do município, no pacto federativo brasileiro, é mesmo a de uma entidade federativa autônoma. Os caminhos trilhados pelos municípios foram desde a impossibilidade de eleger seus governantes à possibilidade de elaborar sua norma angular e instituir tributos próprios, objetivando arrecadar verbas
suficientes para a prestação dos serviços que lhes foram conferidos pela Constituição. Neste traçado, a Constituição de 1988 concedeu às municipalidades as autonomias políticoadministrativas e financeiras, estando com isso, solidificada a posição dos municípios como entidades da federação ao lado da União e dos Estados-membros. Por tanto, verificou-se que a atual federação brasileira é inovadora, por ser de terceiro grau e que a afirmação de que os municípios não dispõem de Poder Judiciário ou de que estão inseridos no território dos Estados-membros e ainda de que não participam diretamente do Congresso Nacional, não os desqualificam enquanto entidades integrantes da federação, pois esta posição está sustentada, já que dispõem das autonomias política, administrativa e financeira para se autoorganizarem e cumprirem com liberdade o múnus da prestação dos interesses locais. REFERÊNCIAS.
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MONTESQUIEU. O espírito das leis. Apresentação Renato Janine Ribeiro; tradução Cristina Murachco. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2005. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2007.
Capítulo 2 CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DAS NORMAS TRIBUTÁRIAS MUNICIPAIS Alex Muniz Barreto[4] 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS. O controle de constitucionalidade representa o mais relevante instrumento de defesa e preservação dos valores essenciais da ordem jurídica de um país, o qual se opera mediante o confronto e a conformação das normas de grau inferior com os ditames da Lei Fundamental. Por meio desse processo analítico de confrontação, fiscalizase não só o ajustamento constitucional da atividade de produção normativa do Poder Público, mas também eventuais omissões deste ao não editar atos legislativos que propiciem a efetividade da Constituição. Em face da hierarquização do ordenamento jurídico, tem-se que a Constituição ocupa o ápice do
escalonamento positivo e, por essa razão, funciona como vetor supralegal que fundamenta e condiciona a própria validade das demais normas, inclusive daquelas editadas pelos entes municipais. A composição piramidal do sistema jurídico, onde a Constituição ocupa o topo ou vértice normativo, é uma característica presente nos países que adotam a rigidez constitucional.[5] Isso é assim, porque, ao se estabelecer um conjunto de regras mais solenes e complexas para que se opere a mudança do texto da Constituição, em comparação com as previstas ordinariamente para a alteração das outras normas, evidencia-se a ascendência hierárquica da Lex Mater. Caso não fosse dessa maneira, ou seja, inexistindo esse processo diferenciado de modificação, ao se aprovar uma lei antagônica à Constituição, tal fato seria interpretado como uma alteração superveniente desta última, posto que a nova norma editada, estando num grau idêntico de formação, implicaria na revogação da anterior naquilo em que esta dispusesse de modo contrário. Ademais, além da superioridade formal-
hierárquica da Constituição, fundada no modo especial de composição de suas normas, como mencionado acima, não se pode deixar de ressaltar a sua supremacia materialaxiológica, tendo em vista que os preceitos constitucionais congregam, por sua própria essência, os valores sociais e políticos fundamentais de um povo (a exemplo da dignidade humana e da cidadania), o que produz inúmeras repercussões em toda a ordem jurídica. Por força dessa anteposição hierárquica e axiológica, surge o princípio da supremacia da Constituição, o qual exige a plena compatibilidade formal e material dos atos normativos inferiores com os ditames da Carta Magna, sob pena de se produzir o denominado vício de inconstitucionalidade. 2. SISTEMAS DO CONSTITUCIONALIDADE.
CONTROLE
DE
No direito brasileiro, o controle de constitucionalidade é conferido com primazia aos órgãos do Poder Judiciário, que o realizam através: a) dos
tribunais e juízes que integram a magistratura, ao que se denomina controle difuso, concreto ou, ainda, incidental; [6] b) das intituladas ações diretas, cuja propositura é normativamente restringida, pois está concentrada apenas nos tribunais de justiça dos Estados-membros ou do Distrito Federal (quando a questão da constitucionalidade se referir à eventual violação da Constituição estadual ou da Lei Orgânica distrital), assim como no Supremo Tribunal Federal (se o vício de inconstitucionalidade afetar diretamente os preceitos da Constituição Federal), caso em que será designado de controle concentrado ou abstrato.[7] Inobstante essa atribuição precípua confiada aos órgãos do Poder Judiciário, também se admite, em certos casos, que os demais Poderes apreciem a compatibilidade vertical das normas com a Lei Maior. Assim, o Poder Executivo pode realizar o controle de constitucionalidade na fase final do processo legislativo, vetando o projeto de lei que entenda contrário à Carta Magna. Por sua vez, os parlamentares poderão rejeitar propostas legislativas que atentem contra a
Constituição, isto através das Comissões de Constituição e Justiça, existentes em cada uma das Casas Legislativas, ou mediante as deliberações plenárias proferidas nas sessões ordinárias de votação. Considerando que as legislações dos diversos países adotam critérios distintos para a realização do controle de constitucionalidade, no direito comparado verifica-se a existência de três sistemas diferenciados para se apreciar a compatibilidade vertical das normas em face da Constituição, quais sejam: 2.1 Controle político. A verificação da constitucionalidade é feita por um ente de natureza política ou conferida a um órgão especial distinto dos demais Poderes do Estado, como ocorre na França, através do Conselho Constitucional. Tal sistema, ao atribuir o controle de constitucionalidade a um ente estranho ao Poder Judiciário, permite a aferição de compatibilidade da norma a partir de aspectos políticos ou metajurídicos, já que a análise da lei
infraconstitucional não exclusivamente jurídica.
se
limitará
à
dimensão
2.2 Controle jurisdicional. É o sistema no qual a Constituição outorga o controle, em regra, aos órgãos do Poder Judiciário, os quais passam a ter a competência para aferir, em caráter definitivo, a compatibilidade vertical do ordenamento infraconstitucional e, assim, valorar juridicamente a sua validade normativa, a exemplo do que ocorre nos EUA e no Brasil. 2.3 Controle misto. Neste sistema, certas categorias de normas se submetem inteiramente ao controle político ou parlamentar e outras constituem objeto de apreciação do Poder Judiciário, tal como se dá na Suíça.[8] Dessa forma, surge uma competência simultânea para a apreciação da constitucionalidade das leis, cuja
repartição entre os dois órgãos distintos (o político e o judiciário) é fundada na natureza da norma a ser controlada. 2.4 Sistema brasileiro de controle de constitucionalidade. Embora se afirme que a legislação nacional adotou o sistema do controle jurisdicional, não se pode olvidar que esse modelo não é absoluto, haja vista que, em certas situações, os órgãos dos demais Poderes também efetuam o controle de constitucionalidade, como acontece: a) no veto do Chefe do Poder Executivo em projetos de lei tidos como inconstitucionais; b) nas votações e deliberações parlamentares, onde o Poder Legislativo terá a ampla prerrogativa de rejeitar propostas normativas que transgridam a Carta Política. Destarte, no direito brasileiro há uma nítida predominância do sistema jurisdicional sobre os demais, mas isso não importa na total exclusão de institutos inerentes a outros sistemas de controle, notadamente o de natureza política.
3.
OS
MUNICÍPIOS
E
SUA
COMPETÊNCIA
TRIBUTÁRIA. A Carta Magna de 1988 adotou o Federalismo como forma de Estado, refletindo uma cláusula pétrea que, como tal, está inserida no núcleo irredutível da Constituição da República (art. 60, § 4º, I). Esse modelo é o que resulta da associação de vários entes com o objetivo de formar um novo Estado, cujas atribuições são constitucionalmente repartidas entre os que passam a integrá-lo. Além do Brasil, vários outros países adotam a forma federativa de Estado, tais como os Estados Unidos da América, o México e a Argentina. No sistema federativo brasileiro, os Municípios são pessoas jurídicas de direito público interno e, por extensão do texto constitucional, são considerados entes da Federação (arts. 1° e 18 da Constituição Federal). Em decorrência de sua tríplice autonomia constitucional, possuem autogoverno, autoorganização e de autoadministração,[9] com competência
para disciplinar as matérias de interesse local, conforme o art. 30, I, da Lei Maior. Os Municípios são entidades políticoadministrativas regidas por Lei Orgânica e, nas suas estruturas internas, são encontrados os órgãos do Poder Legislativo (Câmara Municipal) e do Executivo (Prefeitura Municipal e Secretarias). Já a chefia do Poder Executivo municipal é exercida pelo Prefeito, que será eleito para mandato de quatro anos, permitida uma reeleição subsequente para o mandato posterior. Caberá a este a direção central da administração direta municipal, sendo auxiliado pelo Vice-Prefeito e pelos Secretários por ele nomeados. No âmbito normativo, a Lei Orgânica constitui o estatuto jurídico fundamental dos Municípios e deve ser votada em dois turnos na Câmara de Vereadores, com interstício mínimo de dez dias entre eles e com aprovação de dois terços dos parlamentares. A par desses aspectos, tem-se que, na conjuntura política brasileira, os membros que compõem a Federação abdicam de sua soberania individual, mas
preservam uma autonomia política limitada pela Lei Maior. Em consequência, tem-se o pacto federativo, instrumento originário do consenso político das entidades federativas e que reflete a distribuição de suas respectivas competências, nos limites estabelecidos pela Constituição Federal. De forma geral, o critério comumente escolhido para efetuar a distribuição de atribuições entre os diversos entes da Federação baseia-se no princípio da predominância do interesse. Assim, a União detém competência reservada às matérias que a própria Constituição Federal expressamente lhe atribui (competência enumerada), nas quais predomina o interesse nacional.[10] Os Estados-membros, por sua vez, são dotados de competência remanescente (residual), com base no interesse regional, cabendo-lhes todas as atribuições não destinadas à União ou ao interesse local dos Municípios. A definição do chamado interesse local dos Municípios passa, necessariamente, por três âmbitos de competência: a) a competência administrativa para a
execução de atividades e serviços públicos; b) a competência legislativa geral para a edição de atos normativos de seu interesse; c) a competência legislativa tributária, a qual se destinará à regência da matéria atinente aos tributos municipais, garantindo aos entes a composição e captação de recursos financeiros próprios para financiar seus serviços e atividades institucionais. Assim, a competência administrativa dos Municípios é fixada conforme o interesse local e encontra-se prevista no art. 30, da Lei Maior. São atividades de competência municipal exclusiva: a) o uso e o parcelamento do solo urbano; b) a instituição e a arrecadação de tributos municipais; c) a criação, a organização e a supressão de distritos; d) o transporte coletivo no âmbito local; e) em cooperação com a União e os Estados, os serviços de saúde e educação na préescola e no ensino fundamental; f) a proteção ao patrimônio histórico-cultural; g) a guarda municipal. Já no que tange à competência legislativa geral, incumbe ao Município editar a sua Lei Orgânica e dispor sobre determinadas matérias, como a política de
desenvolvimento urbano, o plano diretor, o horário de funcionamento do comércio, a coleta de lixo e a limpeza urbana. Por fim, a competência tributária dos Municípios é exercida através do poder juridicamente delimitado para a edição de atos de status legal, sendo diretamente atribuída pela Constituição a estes entes federativos. 3.1 Competência tributária municipal. Como ressaltado acima, a competência tributária reflete o poder constitucionalmente fixado para que os entes municipais criem, modifiquem ou suprimam tributos, bem como concedam as respectivas anistias e isenções. Desse modo, como decorrência do próprio pacto federativo, a competência tributária representa a preordenação e distribuição da titularidade do poder de tributar. Além disso, deve-se pôr em relevo que a competência tributária é de natureza indelegável (art. 7º do Código Tributário Nacional), não se admitindo,
destarte, a transferência de sua titularidade. No Sistema Tributário Nacional,
as
competências são classificadas em três espécies distintas: privativa, residual e comum. Privativa é a competência para criar impostos, atribuída com exclusividade a determinado ente político (como o Imposto de Importação – II, de competência privativa da União; o ICMS, de competência privativa dos Estados e do Distrito Federal; o ISS, de competência dos Municípios etc.). Residual[11] é a competência atribuída à União para criar novos impostos não descritos no texto constitucional, observados os parâmetros gerais previamente estabelecidos. Comum é a competência, referente às taxas e contribuições de melhoria, como tal conferida a todos os entes políticos (União, Estados, Distrito Federal e Municípios). Como adverte Luciano Amaro (2003, p. 9596), falta rigor científico nessa classificação, haja vista que: [...] não se pode contrapor a competência privativa à residual. A ideia de competência residual opor-se-ia à de
competência arrolada, descrita, partilhada, identificada: as situações que não tenham sido nomeadamente atribuídas a ninguém formam o resíduo, o resto, o campo remanescente ou residual. Ora, se esse campo remanescente (de situações idôneas a servir de suporte à incidência de imposto) pertence com exclusividade à União, a competência aí exercida poderia dizer-se privativa da União, adjetivação que a faria confundir-se com a outra ‘espécie’ de competência, de que deveria diferenciar-se.
Nesse aspecto, é importante ressaltar que os impostos de competência dos Estados-membros e Municípios são taxativos, ao passo que, à União, cabe instituir e cobrar não só os tributos já previstos na Lei Maior, mas também criar, por lei complementar, outras modalidades de impostos não indicadas no texto constitucional, ao que se chama competência federal tributária residual ou remanescente (art. 154, I, da Carta Política).[12] No quadro geral das competências tributárias, compete aos Municípios a instituição das seguintes modalidades de tributos: a) Imposto sobre a Transmissão Inter Vivos de Bens Imóveis – ITBI; b) Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISS; c) Imposto sobre a
Propriedade Territorial Urbana – IPTU; d) contribuições sociais (art. 149, §1º, CF), a exemplo da contribuição para o custeio dos regimes próprios de previdência; e) taxas; f) contribuição para o custeio do serviço de iluminação pública.[13] 3.2 Os Municípios no sistema de repartição de receitas tributárias. Tendo adotado o modelo do federalismo cooperativo, a norma constitucional estabelece que parte do produto da arrecadação de alguns impostos seja repartida com os demais entes federativos, como forma de auxiliar o custeio das atividades das entidades beneficiadas. Assim, a Lei Maior, ao passo em que atribui competência privativa para cada ente estatal, determina, igualmente, a participação nas receitas tributárias de uns em favor de outros. Como decorrência do sistema de repartição de receitas tributárias, surgem os seguintes preceitos constitucionais: a) o valor de 50% da arrecadação do
IPVA será devido aos Municípios onde os veículos forem licenciados; b) o montante de 25% da arrecadação total do ICMS caberá aos Municípios nos quais se consumaram os fatos geradores; c) aos Estados pertence o valor de 10% da arrecadação total do IPI; d) do produto da arrecadação do IR e do IPI, 21,5% serão destinados ao Fundo de Participação dos Estados e 22,5% ao Fundo de Participação dos Municípios.[14] Todavia, há impostos que não sofrem qualquer tipo de repartição do produto de sua arrecadação, cujas receitas caberão, exclusivamente, aos entes federados competentes. São eles: a) os impostos municipais (ISS, IPTU e ITBI); b) os impostos arrecadados pelo Distrito Federal, já que este não pode ser subdividido em Municípios; c) o imposto estadual sobre transmissão causa mortis e doações; d) o imposto de importação; e) o imposto de exportação; f) o imposto sobre grandes fortunas; g) o imposto extraordinário de guerra. 4. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DA NORMA TRIBUTÁRIA MUNICIPAL.
Fixadas
as
premissas
necessárias
à
compreensão dos aspectos gerais do Controle de Constitucionalidade e do papel federativo reservado aos Municípios no modelo nacional, tem-se a problemática referente aos meios de controle das normas tributárias municipais quando confrontadas com a Constituição Federal ou Estadual. Tais situações críticas envolvem não só a edição de atos normativos locais que colidam com os comandos constitucionais, mas também a inobservância do dever de legislar por parte do Poder Público municipal, conduzindo à inefetividade dos preceitos constitucionais obrigatórios para os entes da Federação. 4.1 A competência para o controle de normas municipais. 4.1.1 Controle Concentrado. O controle concentrado traduz uma centralização da competência para a apreciação da
matéria da constitucionalidade. Trata-se do método de controle preconizado pelo positivismo kelseniano, onde se reforça a ideia de segurança jurídica a partir da seguinte constatação: dificilmente surgiria uma norma que fosse capaz de vincular os cidadãos e os órgãos estatais, caso a Constituição, indiscriminadamente, conferisse a todo e qualquer ente o poder de aferir a constitucionalidade das leis (KELSEN, 1999, p. 189). Na ordem jurídica nacional, o controle concentrado vem ganhando nítida primazia em relação ao critério difuso, sobretudo após a adoção da Ação Declaratória de Constitucionalidade – ADECON e da inegável força normativa das súmulas vinculantes do STF, instrumentos que realçam a centralização da discussão constitucional no órgão de cúpula do Judiciário. Assim, no Brasil, o controle concentrado é reservado a somente duas categorias de órgãos jurisdicionais, ou seja, o Supremo Tribunal Federal e, no âmbito local, os tribunais de justiça dos Estados ou do Distrito Federal. Esse método de controle também é denominado de abstrato, porque independe da existência
de um processo judicial anterior, sendo que o seu objeto se restringe à discussão formal da constitucionalidade de uma norma por meio de ações diretas (ADI, ADECON e ADPF), independentemente da existência de um prévio caso concreto. Nesse aspecto, qualquer que seja o resultado da decisão, seus efeitos são erga omnes e, portanto, possuem eficácia contra todos, mesmo para aqueles que não figurem como partes do processo. Segundo entendimento consolidado na jurisprudência nacional, não é admissível a propositura de ação direta de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal quando se tratar de norma municipal impugnada diretamente em face da Constituição Federal, haja vista que o controle concentrado, em tais casos, deve se realizar em face da Constituição Estadual e no âmbito do respectivo tribunal de justiça estadual. Conforme jurisprudência do Supremo Tribunal Federal: CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DE LEIS OU ATOS NORMATIVOS MUNICIPAIS. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO. Os Tribunais de Justiça dos Estados, ao realizarem o controle abstrato
de constitucionalidade, somente podem utilizar, como parâmetro, a Constituição do Estado. Em ação direta de inconstitucionalidade, aos Tribunais de Justiça, e até mesmo ao Supremo Tribunal Federal, é defeso analisar leis ou atos normativos municipais em face da Constituição Federal.[15]
Nessa linha de raciocínio, caso a norma municipal viole tão somente a Constituição Federal – e não transgrida, de nenhum modo, a Constituição Estadual – restará apenas: a) de forma incidental, o controle difuso mediante a arguição de inconstitucionalidade da norma municipal em face da Carta Magna, em um determinado caso concreto, situação em que a discussão da constitucionalidade da norma municipal chegará ao STF mediante a interposição do Recurso Extraordinário - RE; b) de forma direta, o controle concentrado por meio da propositura de arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF), hipótese em que esta caberá de modo subsidiário à ADI por ação, como será analisado adiante. A Carta Magna inovou ao prever a arguição de descumprimento de preceito fundamental – ADPF
como um instrumento processual auxiliar do controle de constitucionalidade concentrado. Na verdade, a inovação se fazia necessária para preencher os hiatos deixados em virtude das restrições existentes quanto ao cabimento da ação direta de inconstitucionalidade – ADI. Isso se verificava, por exemplo, nos casos de incompatibilidade vertical de normas anteriores à Constituição Federal e no controle de atos normativos municipais, hipóteses nas quais impera o entendimento contrário à admissibilidade da ADI perante o Supremo Tribunal Federal. Atualmente, todas as situações acima narradas podem ser resolvidas com o ajuizamento da arguição perante a Corte Suprema, a qual caberá, também, definir o que se entende como preceito fundamental.[16] Assim, a ADPF tem natureza claramente subsidiária,[17] haja vista que quando a controvérsia puder ser solucionada por outra modalidade de controle concentrado ou por medidas judiciais ordinárias, não caberá a arguição, conforme dispõe o art. 4°, §1°, da Lei n ° 9.882/99. Essa norma regulamenta o disposto no art. 102, §1º, da Constituição Federal[18] e disciplina essa
modalidade de controle abstrato das normas.[19] Em razão dessa natureza subsidiária, se ajuizada a ADPF para combater ato ordinariamente sujeito às outras modalidades de controle concentrado, é possível converter a arguição em ação direta de inconstitucionalidade, desde que presentes os requisitos normativos desta última espécie processual, como a legitimação, o objeto, os fundamentos e o pedido da ação. [20] Registre-se que a competência para o processo e julgamento da ADPF é exclusiva do Supremo Tribunal Federal, posto que não há previsão de criação deste instituto no âmbito dos demais entes federativos. Em conclusão, tem-se que as normas tributárias municipais que colidam diretamente com a Constituição Federal – e não com a Constituição Estadual – poderão ser objeto apenas de arguição de descumprimento de preceito fundamental ou de controle difuso, o qual poderá ser arguido em quaisquer ações em que a matéria da inconstitucionalidade seja arguida incidentalmente, chegando essa discussão até o STF por
meio de Recurso Extraordinário – RE. De outro modo, caso a norma viole a Constituição Estadual, ela tanto poderá ser combatida através de ação direta de inconstitucionalidade – ADI no tribunal de justiça estadual, como também por meio do controle difuso, hipótese em que a matéria poderá ser suscitada em quaisquer processos judiciais e em todos os graus de jurisdição, podendo, inclusive, chegar até o próprio STF, mediante a interposição do Recurso Extraordinário, como ressaltado acima. 4.1.2 Controle Difuso. O controle difuso (ou concreto) de constitucionalidade é assim denominado por ser exercido por todos os órgãos judicantes que integram a estrutura do Poder Judiciário, atribuindo-se a estes, de forma ampla, a possibilidade de apreciar a constitucionalidade das normas jurídicas. O controle difuso realiza-se sempre de forma incidental, haja vista que é suscitado no transcurso de
processos ainda pendentes de julgamento. Nestes feitos, embora o objeto principal da lide não seja o controle de constitucionalidade, os debates acabam envolvendo a matéria constitucional para que o litígio seja decidido da forma mais justa possível. Assim, em uma situação concreta que constitua o tema central da controvérsia existente em uma ação judicial, o interessado pode requerer ao juízo processante a declaração incidental de constitucionalidade ou inconstitucionalidade da norma aplicável ao caso, com o objetivo de salvaguardar os seus interesses individuais. Nesta forma de controle, todos os interessados poderão suscitar a questão da (in)constitucionalidade em qualquer processo e perante qualquer juízo ou tribunal, ainda que em grau de recurso. O controle de natureza difusa (distributiva ou disseminada, expressões empregadas com o sentido de indicar que a competência de fiscalizar a compatibilidade das normas se propaga para todos os órgãos judiciais), foi inspirado no judicial review do direito norte-americano,
tendo sido incorporado ao ordenamento nacional com o advento da Constituição de 1891. No controle difuso, a declaração judicial de inconstitucionalidade do ato gera efeitos apenas para as partes do processo (inter pars), pois a norma permanece plenamente válida em relação a terceiros estranhos à causa discutida. Por essa forma, em regra, a decisão judicial proferida nesta forma incidental de controle não produz efeitos erga omnes e nem é dotada de eficácia retroativa (efeitos ex nunc), ou seja, a declaração de inconstitucionalidade é válida apenas para os litigantes e a norma questionada é anulada somente a partir dessa declaração. Assim, caso a norma tributária municipal viole a Constituição – Federal ou Estadual –, a arguição de sua inconstitucionalidade poderá ser feita por qualquer interessado e em qualquer grau de jurisdição, isto por meio de ações judiciais, como o mandado de segurança e as ações ordinárias. Todavia, os efeitos da decisão atingirão apenas as partes do processo em que a discussão
foi suscitada, dadas as restrições típicas do controle difuso. 5. A PROGRESSIVIDADE DO IPTU. O Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana – IPTU é um tributo municipal incidente sobre a propriedade imobiliária, tendo como fato gerador não só a propriedade em si, mas também o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana (art. 32 do CTN). Trata-se de tributo que, além de possuir uma função preponderantemente fiscal e arrecadatória, também se destina a fins extrafiscais, no sentido de estimular a ocupação e a efetiva utilização do solo urbano em determinadas áreas, visando ao atendimento do Plano Diretor do Município.[21] Cabe ao Município, assim, a execução da política de desenvolvimento urbano,[22] a qual tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções
sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes, conforme as diretrizes gerais fixadas em lei. Essas diretrizes gerais, a que se refere o texto da Carta Política, bem como outros relevantes preceitos urbanísticos, foram objeto da Lei nº 10.257/2001 – Estatuto da Cidade, norma que regulamentou as disposições constitucionais relativas à matéria. A partir dessa perspectiva, vários Municípios brasileiros passaram a se valer da cobrança do IPTU mediante a imposição de alíquotas progressivas em razão do valor do imóvel e de sua localização em certa área urbana. Tal postura veio a ser combatida através de um grande volume de demandas judiciais, nas quais se alegava que a progressividade das alíquotas do IPTU, nesses casos, gerava uma flagrante inconstitucionalidade, posto que a Constituição Federal somente autorizava a progressividade do imposto para os casos de descumprimento da função social da propriedade.[23] A matéria foi objeto de súmula no STF, o qual se pronunciou nos seguintes termos: Súmula 668 - É inconstitucional a Lei Municipal que tenha estabelecido, antes da Emenda Constitucional 29/2000,
alíquotas progressivas para o IPTU, salvo se destinada a assegurar o cumprimento da função social da propriedade urbana.
Desse modo, antes da Emenda Constitucional nº 29/2000, a progressividade do IPTU somente era admitida nos casos de comprovado descumprimento da função social da propriedade urbana (como nas hipóteses de terreno urbano não edificado), tendo sido consideradas inconstitucionais, a partir da jurisprudência dos tribunais e da posição adotada pelo STF, as leis tributárias municipais que fixaram tal progressividade para outras situações. Com a edição da Emenda Constitucional nº 29/2000, a matéria veio a ser pacificada, porquanto o texto constitucional alterado reforçou a função extrafiscal do IPTU. A partir da mudança realizada na Carta Magna, passou-se a admitir a cobrança de alíquotas progressivas do tributo também em razão do valor do bem ou de acordo com a localização e o próprio uso do imóvel urbano. 6. O PROBLEMA DAS TAXAS MUNICIPAIS.
A taxa representa um tributo de natureza vinculada, porquanto resulta: a) do exercício do poder polícia estatal; b) da utilização, efetiva ou potencial, serviços públicos específicos e divisíveis, prestados contribuinte ou postos a sua disposição. No desempenho das atribuições do poder
de de ao de
polícia administrativa,[24] é possível a imposição de regras (atos de alcance geral) ou medidas concretas (atos específicos), cuja natureza imperativa as torna obrigatórias aos cidadãos, sob pena de incidirem nas penalidades legais pelo seu descumprimento. É o que ocorre, por exemplo, na interdição de um estabelecimento comercial em virtude do desrespeito às normas de higiene e segurança das instalações. Nos casos de medidas concretas, o exercício do poder de polícia poderá implicar na cobrança de taxas, como fonte de custeio da própria atividade fiscalizatória.[25] Com relação aos chamados serviços públicos específicos ou divisíveis (também chamados de individuais ou uti singuli), estes são prestados de forma
fracionada a cada indivíduo, podendo-se, inclusive, mensurar a sua real utilização por cada usuário, como ocorre no transporte coletivo e no fornecimento de energia elétrica domiciliar.[26] O fato é que muitos Municípios, de modo contrário ao estabelecido nos parâmetros constitucionais, passaram a instituir taxas de modo genérico, isto é, desvinculando-a da efetiva prestação ou disponibilização do serviço público ao contribuinte, o que vem ensejando uma série de ações judiciais que visam a combater tais cobranças contrárias ao Direito. A título de exemplo, alguns Municípios instituíram a Taxa de Iluminação Pública (TIP)[27] e a Taxa de Coleta de Lixo e Limpeza Pública (TCLLP), isto de modo genérico para todos os cidadãos da localidade e sem a demonstração da efetiva disponibilização dos serviços públicos respectivos.[28] Ainda mais: em alguns casos, tais taxas foram criadas tendo como base de cálculo o próprio IPTU, de forma progressiva, fato que também mereceu o crivo da inconstitucionalidade em numerosas decisões judiciais
proferidas em sede de controle difuso. Evidentemente, a competência tributária dos Municípios abrange a instituição e cobrança de taxas para o exercício do poder de polícia local ou para se estabelecer uma forma de remuneração justa[29] dos serviços públicos prestados pela Edilidade, como visto anteriormente. Contudo, essa competência tributária há de ser exercida nos moldes preconizados pela ordem jurídica nacional, sob pena de se incidir em grave comprometimento da validade da norma tributária municipal, diante da presença do vício da inconstitucionalidade. 7. O PAPEL DOS TRIBUNAIS DE CONTAS NO CONTROLE DAS NORMAS MUNICIPAIS. Os Tribunais de Contas possuem origem remota e vêm sendo instituídos nos sistemas jurídicos de diversos países. O primeiro precedente histórico de sua criação se deu propriamente na Grécia, onde os legisperitos, cidadãos escolhidos pelo povo, compunham
a denominada Corte de Contas, órgão com atuação sobre todos os que exerciam funções estatais, sendo-lhe vedadas, entretanto, as atividades jurisdicionais ínsitas à magistratura. No século XIX, vários países implantaram essa instituição de controle do erário, a exemplo da França que, em 1807, criou um dos primeiros entes dessa natureza, com os contornos que são verificados contemporaneamente (LOPES, 1947, p. 213). Os demais membros da comunidade internacional seguiram a mesma esteira do direito francês, como Portugal, Espanha, Itália, Brasil e até mesmo a União Europeia, dentre tantos outros. No modelo nacional, os Tribunais de Contas são os órgãos técnicos e de orientação que auxiliam o Legislativo, integrando a estrutura desse Poder, no desempenho da função de apreciar e fiscalizar os atos, contratos e contas das entidades públicas. No Brasil, essa análise se perfaz mediante decisões, inspeções e outras medidas fiscalizatórias legalmente previstas, todas de natureza fiscalizatória e meramente administrativa (GOMES JÚNIOR, 2003).
As Cortes de Contas admitidas pela Constituição Federal são o Tribunal de Contas da União e os Tribunais de Contas dos Estados-membros. No que se refere ao âmbito municipal, há vedação expressa quanto à criação desses órgãos (art. 31, § 4°, da Lei Maior),[30] embora tenham sido mantidos os que já existiam à época da promulgação da Carta Magna, a exemplo do Tribunal de Contas do Município de São Paulo. Além das competências expressamente arroladas pela Lei Maior, os Tribunais de Contas podem apreciar a constitucionalidade das leis e atos do Poder Público (Súmula n° 347 do STF), o que não deixa de ser um modo de exercer o controle difuso e repressivo sobre a atuação estatal, visando a conformá-la aos ditames da Lex Mater. Tal prerrogativa autoriza as Cortes de Contas não só a deixar de aplicar as regras tidas como inconstitucionais, mas também a não homologar os atos ou contratos nelas fundados. Assim, no sistema jurídico nacional, cabe aos Tribunais de Contas estaduais – e municipais, onde houver – o relevante papel de realizar o controle de
constitucionalidade de normas municipais, inclusive as que possuam conteúdo tributário. As Cortes de Contas poderão, nesse sentido, adotar medidas que combatam posturas contrárias aos preceitos da Lei Maior, podendo resultar na declaração de inconstitucionalidade de tributos instituídos ou cobrados de modo dissonante aos ditames constitucionais que regem a tributação municipal. 8. A OMISSÃO NORMATIVA TRIBUTÁRIA DOS MUNICÍPIOS. No exercício de suas competências federativas, o Município passa a deter a prerrogativa irrenunciável de exigir que os indivíduos lhe forneçam os recursos econômicos necessários ao custeio das atividades voltadas ao atendimento dos interesses da população, razão por que a Carta Magna lhe outorga o poder de tributar. Tal poder representa a capacidade constitucional que impõe ao Poder Público municipal estabelecer valores econômicos compulsórios, visando ao custeio de suas atividades primárias e secundárias, como
um modo de cooperação financeira coletiva para a manutenção de suas atividades institucionais. Assim, as receitas tributárias municipais são os recursos financeiros obtidos em caráter permanente por esses entes públicos, os quais são capazes de gerar um acréscimo patrimonial durável ao erário, constituindo, portanto, obrigações constitucionalmente impostas aos Municípios a efetiva instituição e cobrança dos tributos de sua titularidade. Apesar disso, um fato contingente já se tornou praxe na realidade gerencial de muitos Municípios brasileiros: a ausência de instituição e cobrança de tributos municipais por falta de norma local, produzindo a chamada inconstitucionalidade por omissão. A inconstitucionalidade por omissão ocorre quando não são editados os atos legislativos ou administrativos normativos necessários para que se tornem plenamente aplicáveis os ditames constitucionais. Isso resulta na indesejada ineficácia dos institutos e valores da Constituição, assim causada pela omissão normativa do Poder Público, ao que se denomina
síndrome da inefetividade. Cabe ressaltar que essa inefetividade ocorre em certa matéria cujo disciplinamento normativo deveria ter se dado pelo legislador infraconstitucional, por exemplo, através de uma lei ordinária ou complementar instituindo certo tributo. Desse modo, considera-se que a omissão normativa se refere a um instituto ou direito previsto constitucionalmente, mas cujo exercício encontra-se obstado pela inércia do legislador, incumbido de produzir a norma infraconstitucional regulamentadora. É justamente essa a situação de vários Municípios brasileiros, os quais deixam de instituir e cobrar tributos de sua competência, resultando, tal omissão normativa, na antijuridicidade não só de âmbito constitucional, mas também na transgressão do preceito infraconstitucional que veda a renúncia de receita, expressamente previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal. De fato, como os valores das receitas e despesas da Administração municipal se encontram estimados e autorizados pela Constituição e pela lei
orçamentária anual, ao Poder Público local se imputa o dever de arrecadar todos os recursos de que necessita, efetuando, por outro lado, os gastos permitidos, visando à consecução do bem comum. Assim, é obrigação legal do Município angariar, de forma efetiva, todos os recursos tributários previstos na Constituição, combatendo a evasão fiscal e evitando os atos de renúncia de receita (arts. 11 e 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal).[31] Apesar disso, uma parcela significativa dos Municípios brasileiros vem deixando de instituir e cobrar os tributos de sua competência, muitos dos quais sequer editaram normas instituidoras de impostos de absoluta relevância para o custeio de suas atividades, como é o caso do ISS[32] e IPTU.[33] Além de constituir espécie improbidade administrativa que causa manifestos prejuízos ao erário público, como tal capitulado na Lei nº 8.429/92,[34] tais omissões contribuem para enfraquecimento do papel constitucional das entidades municipais, as quais, em boa parte dos casos, passam a sobreviver exclusivamente dos
recursos oriundos das transferências de receitas de outros entes federados e do Fundo de Participação dos Municípios, caracterizando, assim, uma inegável situação de mendicância federativa. Para combater tais omissões inconstitucionais – além das medidas sancionatórias previstas na Lei de Improbidade Administrativa e na Lei de Responsabilidade Fiscal –, a ordem jurídica admite a propositura de três ações judiciais específicas: a ação civil pública, a ação popular e a ação direta de inconstitucionalidade por omissão. Todas terão, como fundamento comum, a prova da existência de um preceito constitucionalmente assegurado, cuja efetividade esteja dependendo de uma atividade legislativa municipal subsequente. A ação popular (movida por qualquer cidadão)[35] e a ação civil pública (movida pelo Ministério Público ou por outras entidades)[36] se prestam, nessa hipótese, a combater a omissão do ente municipal em editar a norma instituidora do tributo ou a conduta negligente da autoridade local em não realizar a efetiva cobrança dos tributos. Ambas representam
importantes mecanismos processuais de realização do controle difuso de constitucionalidade na esfera de primeiro grau do Poder Judiciário. Por último, a ação direta de inconstitucionalidade por omissão só poderá ser ajuizada pelos entes expressamente legitimados (art. 103 da CF), tendo como juízos competentes apenas o STF (omissão de norma federal) ou os tribunais de justiça dos Estados, estes para o caso de omissão normativa de norma municipal, como acontece na situação aqui analisada. Em todos os casos, a atuação do Ministério Público e dos Tribunais de Contas, aliada à participação do cidadão na fiscalização da Administração Pública, espelham instrumentos imprescindíveis ao controle da eficiência na gestão fiscal dos Municípios. REFERÊNCIAS. APPIO, Eduardo. Controle de Constitucionalidade no Brasil: De acordo com a Emenda à Constituição 45, de 08.12.2004 - Reforma do Poder Judiciário. Curitiba: Juruá, 2007.
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Capítulo 3 COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA MUNICIPAL Saulo Medeiros da Costa Silva[37] 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS. Entende-se por Estado “a ordem jurídica soberana que tem por fim o bem comum de um povo situado em determinado território” (DALLARI, 2000, p. 72). Neste sentido, não pairam dúvidas de que o Estado, enquanto entidade estrutural, dotado de personalidade jurídica, corporificado na máquina administrativo-estatal, instrumentalizada por meio de pessoas físicas, gera custos altíssimos para a sociedade, que efetivamente arca com essas despesas. É inegável que para manter a máquina administrativa e prestar serviços públicos, em busca de garantir o bem comum, o Estado precisa arrecadar recursos financeiros para custear as aludidas despesas, e
por isso, pode explorar uma atividade econômica, bem como o seu patrimônio imobiliário, sendo estas receitas denominadas de originárias, cuja característica marcante é a não utilização do poder de império. Essas receitas, hodiernamente, são insignificantes para fazer frente as despesas dos entes federados. A principal receita pública dos entes políticos são as receitas tributárias, ou derivadas, que derivam do patrimônio dos particulares, compulsoriamente. Neste sentido, não pairam dúvidas de que o Estado pode utilizar o poder de tributar para instituir e arrecadar tributos objetivando a prestação dos serviços públicos. Todavia, se por um lado o Estado precisa tributar para custear as suas despesas, por outro não poderá fazê-lo de forma ilimitada, pelo contrário, deverá observar, obrigatoriamente, as “Limitações do Poder de Tributar”[38], que são: os princípios, as imunidades e a competência tributária. O objeto de estudo deste capítulo limitar-se-á a competência tributária com ênfase na municipalidade, sendo as demais espécies de limitações estudadas
separadamente noutro capítulo deste livro. Antes de abordarmos a competência tributária faz-se mister tecer breves considerações sobre o federalismo brasileiro, considerando a correlação e interdependência existente entre eles. 2.
COMENTÁRIOS
INICIAIS
SOBRE
O
FEDERALISMO. O Estado, de acordo com a divisão clássica, poderá ser unitário ou federal. O Estado unitário é aquele em que existe um poder central detentor do poder político que pode, por questão operacional, desconcentrar-se administrativamente, todavia, sempre subordinado hierarquicamente à administração central – como foi o Brasil Imperial e ainda é a França; ou federal quando conjugam vários centros autônomos de poder político. Neste momento, já podemos externar que o Brasil é um Estado Federal, fazendo a devida advertência de Dallari (2000, p. 254) de que o “Estado Federal indica, antes de tudo, uma forma de Estado, não de
governo”. De
forma
introdutória,
ainda
cumpre
esclarecer que não existe um federalismo único e insofismável, pelo contrário, cada Estado plasma o seu modelo de federalismo pautado na sua experiência histórica, cultural e empírica. E não poderia ser de outra forma, já que “o Direito é produto da cultura humana” (TORRES, 2011, p. 350) e cada sociedade, por questões históricas e culturais, produz ou declara o direito para regular as suas necessidades. Nessa mesma linha, assevera o professor Feitosa (2006) que uma das maiores dificuldades ao abordar o estudo de uma estrutura federal determinada é a inexistência de um padrão, modelo, ou standard de federalismo. Razão pela qual entende que seria melhor falar de federalismos em que cada modelo reflete sua própria experiência histórica e os limites e políticas conjuntas que estabelecem seu marco institucional. Bem como, Gadelha (2010, p. 32) acrescenta que “cada modelo federativo possui “flexibilidade” necessária a se adaptar ao contexto circundante, de modo que não haja
regra teorética precisa e aplicável a cada Estado Federal formado”. Etimologicamente, federação (do latim foedus) quer dizer pacto, aliança. Ressalve-se que não se trata de mera aliança efêmera e transitória e sim de uma união duradoura, como bem explicita Gadelha (2010, p. 28) como “elos inquebráveis de união”. Nesta linha diz-se Estado Federal aquele formado pela união permanente de estados-membros. Avançando no estudo da Federação, Mangueira (apud BONAVIDES, 2010, p. 200) leciona que: [...] onde a tutela constitucional garante a autonomia dos Estados, onde estes participam de competência constitucional própria, onde a Constituição não se reforma sem a audiência e o consentimento dos Estados-membros, onde, por último, acima da vontade dos componentes da organização política, paira uma instância judiciária superior, tribunal supremo, com poderes para dirimir conflitos porventura suscitados entre a União e os referidos Estados.
É consenso na doutrina que o marco temporal inaugural do federalismo é a Constituição Norte
Americana de 1787, que transformou os Estados Confederados em Estado Federal, com uma única soberania, e poder político compartilhado pelas unidades federadas. A federação norte-americana formou-se a partir de um processo centrípeto em que Estados soberanos abdicaram de sua soberania para formar um Estado Federal tornando-se mais resistentes e competitivos em relação às nações estrangeiras. 3. FEDERALISMO BRASILEIRO. Com a revolução republicana Rui Barbosa implantou, no Brasil, no Governo Provisório e através de decreto, o sistema federativo. Esse sistema implantado, e de certa forma, o próprio Rui Barbosa, foi criticado por Bonavides (2010, p. 208), por entender que recebemos “instituições segundo o espírito e a letra das ideias que haviam medrado cem anos antes, entre os constituintes de Filadélfia”, com “esquema de organização política do País descendente do federalismo clássico.” E “essa imitação configurou invariavelmente ausência de
originalidade contributiva da parte do elemento nacional politizado”. Tal crítica é asseverada por Gadelha (2010, p. 50) ao lembrar que em 1891 o Estado brasileiro passou a adotar a forma federativa dual, passando a dispor da limitada e restrita autonomia dos Estados-membros. Houve, portanto, a importação do modelo norteamericano, com uma negação, em grande medida, da autonomia estatal. Em linhas gerais, para entender o surgimento do Estado Federal Brasileiro, e a sua tradição centralizadora e autoritária, faz-se mister retroagir no tempo para alcançar o período do “descobrimento/achamento” do Brasil pelos europeus e lembrar que o processo de colonização foi fortemente exploratório, fazendo surgir pontualidade/nodularidade de exploração de riquezas em determinadas regionais, com pólos separados e tendentes à autosuficiência. A partir de então, como embrião ou vocação federalista, o território nacional foi dividido em 12 (doze) capitanias hereditárias, que, de certa forma, possuíam autonomia,
mesmo dentro de um Estado unitário, chegando ao ponto de ser afirmado que a consolidação da estrutura federal na República como mera formalização ou declaração daquela federação materialmente já existente, com suas incoerências e vícios. Para não nos perdemos nos contornos históricos, todavia sem desprestigiar a importância do estudo das Constituições do Brasil, saltaremos para a Constituição Federal de 1988 analisando, de forma sucinta, os traços do federalismo atual brasileiro. A Constituição de 1988 modifica profundamente a posição do Município na Federação, considerando-o componente da estrutura federativa. [...] Acolhe-se assim a reivindicação de municipalistas clássicos, como Hely Lopes Meirelles e Lordelo de Melo, que pleitearam com insistência e veemência a inclusão dos Municípios no conceito de nossa Federação (SILVA, 1992, p. 544). Mesmo sendo regra, a distribuição de competência dual, formada por duas órbitas de governo: a central e as regionais (União e Estados federados), no
Brasil, o sistema constitucional eleva os Municípios à categoria de entidades autônomas, isto é, entidades dotadas de organização e governos próprios e competências exclusivas. Com isso, a Federação brasileira adquire peculiaridade, configurando-se, nela, realmente três esferas governamentais: a da União (governo federal), a dos Estados Federados (governos estaduais) e a dos Municípios (governos municipais), além do Distrito Federal, a que a Constituição agora conferiu autonomia. O município brasileiro, diferentemente de outras nações, é reconhecido, constitucionalmente, como “ente estatal integrante[39] da Federação, como entidade política-administrativa, dotada de autonomia política, administrativa e financeira” (MARTINS, 2001, p. 677). A autonomia política decorre da eleição direta dos Prefeitos, Vice-Prefeito e Vereadores; a autonomia administrativa é perceptível pela auto-organização dos serviços administrativos municipais; e por fim, a autonomia financeira pela arrecadação dos tributos de sua competência, bem como pela participação nas receitas
tributárias da União e dos Estados-membros. Ressalve-se ainda que, no Brasil, a segurança jurídica das autonomias de competência coincidentes com a preservação do federalismo encontra-se dentre as matérias excluídas de reforma da Constituição. O federalismo, ao ser protegido por cláusula pétrea, confunde-se com uma espécie de princípio de proibição de retrocesso ao centralismo ou ao Estado unitário (TORRES, 2011, p. 354). Essas considerações sobre o federalismo são suficientes para adentrarmos no campo do estudo das competências tributárias. 4. PODER TRIBUTÁRIO. A priori, antes de aprofundar o tema, cumpre asseverar que o poder tributário pertence ao Direito Constitucional e não ao Tributário. Diz-se isso porque a estruturação do poder de tributar do Estado, como manifestação da soberania Estatal, ocorre com a implantação do seu sistema tributário (SOUZA, 2010, p.
55), que, no caso do Brasil, foi calcificado na Carta Magna, no Título VI, Capítulo I, sob a denominação “DO SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL”, nos arts. 145 ao 156 que dispõem sobre os princípios gerais; as limitações do poder de tributar; dos impostos da União, Estados e Distrito Federal, Municípios[40]. Esse entendimento é precioso para compreendermos que “esgota-se a relação de poder a partir do momento em que o Estado exerce, no âmbito da Constituição, o seu poder tributário” (BORGES, 2001, p. 25). E não é outra a posição de Rubens Gomes de Sousa (apud BORGES, 2001, p. 25) que adverte: “a atuação do Estado, no setor tributário, se faz através de relações de direito e não de simples relações de poder ou de soberania”. No mesmo sentido, com olhar crítico e apurado, Carrazza (2002, p. 428) exaure o assunto dispondo que: [...] cada uma das pessoas políticas não possui, em nosso País, poder Tributário (manifestação do ius imperium do Estado), mas competência tributária (manifestação da autonomia da pessoa política e, assim, sujeita ao ordenamento jurídico-constitucional)”. […] “Em boa
técnica, não se deve dizer que as pessoas políticas tem, no Brasil, poder Tributário. Poder Tributário tinha a Assembléia Nacional Constituinte, que era soberana. Ela, realmente, tudo podia, inclusive em matéria tributária. A partir do momento, porém, em que foi promulgada a Constituição Federal, o poder Tributário retornou ao povo (detentor da soberania). O que passou a existir, em seu lugar, foram as competências tributárias, que a mesma Constituição Federal repartiu entre a União, os Estadosmembros, os Municípios e o Distrito Federal.
O poder tributário é expressão do poder político e manifestação da soberania estatal que, originariamente era ilimitado e encontrava-se nas mãos da Assembleia Nacional Constituinte que “tudo” podia criar. Uma vez definida a organização jurídica do Estado, o poder tributário, até então ilimitado, passa a sujeitar-se a normas definidoras de seu exercício: nasce, assim, a competência tributária, que se traduz no poder tributário juridicamente delimitado (COSTA, 2001, p. 56). Hensel (apud Borges, 2001, p. 30) entende que: “Potere tributário e competenza tributaria dunque non coincidono. Possono essere attribuite competenze tributarie anche ad Entiche in si non hanno poteri derivanti da um diritto di sovanità statale”. Carnellutti (apud
SOLER, 2003, p. 21) entende que o Estado pode assumir duas posições no Direito a dependendo da sua situação, podendo ser sujeito de uma relação jurídica ou figurar como soberano: “se ha reparado en la doble posición que el Estado puede asumir en el derecho, distinguiendo la situación en la que el Estado es sujeto de una relación jurídica de aquella otra en la que es soberano”. Percebemos três fases no processo de penetração jurídica no campo tributário. A primeira seria decorrente do poder tributário soberano do Estado em estruturar e distribuir as competências tributárias entre as pessoas políticas da federação. Nessa fase, pode-se falar em poder soberano, já que a Assembleia Nacional Constituinte possui amplo poder para estruturar o sistema tributário, somente limitado pelos direitos naturais que antecedem a própria norma fundamental, como o direito de propriedade que inibe o tributo confiscatório da propriedade privada etc. Na segunda fase, deixa de existir o poder soberano tributário cedendo a uma relação jurídica tributária na qual não existe mais poder e sim direitos e
obrigações entre o ente político e o contribuinte ou responsável tributário. Nessa fase, os entes devem instituir os tributos com observância aos limites estruturais constitucionais da competência tributária, dos princípios constitucionais e das imunidades tributárias, logo, possuem o direito de tributar e o contribuinte tem o dever de pagar os tributos, todavia, também possui o direito de só pagá-lo se estiver em estrita observância ao processo legislativo, se tiver sido instituído pelo ente da federação competente, se tiver sido instituído em observância aos princípios constitucionais da capacidade contributiva e não-confisco, da irretroatividade, anterioridade, segurança jurídica etc. O contribuinte só tem o dever de pagar o tributo justo, ou seja, aquela porção da sua riqueza que não comprometa o mínimo existencial, bem como apenas o indispensável para que o Estado possa garantir o bem comum. A terceira fase, denominada arrecadação tributária, reveste-se, também de dever-direito e não poder tributário, já que a administração tributária deverá lançar ou homologar os lançamentos tributários – bem
como cobrá-los, em estrita observância ao princípio da legalidade – não lhe existindo discricionariedade para tributar ou não, aplicar multa ou não, e, principalmente, aos direitos constitucionais dos contribuintes insculpidos nos arts. 150 e seguintes da Carta Magna. Por essas razões, entendemos que o Estado, na segunda e terceira fase, desvincula-se da ideia de poder fazendo surgir relação jurídica em que figura como sujeito de direitos e obrigações. Em que pese a distinção do poder tributário da competência tributária a doutrina e o próprio legislador utilizam tais termos como sinônimos, o que, ao nosso entender, deve ser evitado como forma de limitar a atuação feroz do Estado que se utiliza do poder de império para massacrar o contribuinte com uma carga tributária sufocante e obrigações tributárias acessórias desmedidas. Por fim, frise-se que essa confusão terminológica não ocorre apenas no Brasil. O jurista argentino Fantin (2010, p. 01) leciona que “El poder tributario, o poder de imperio, o potestad tributaria, es la
facultad que tiene el Estado de crear unilateralmente tributos a su favor, cuyo pago serán exigidos a aquellos que se encuentran bajo su competencia tributaria territorial”. Na verdade a faculdade que o ente tributante tem para criar o tributo decorre do exercício da competência tributária e não do poder tributário. 5. COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA. Agora já podemos tratar a competência tributária como um direito do ente político de instituir os seus tributos, previamente delineados na Constituição, e não como mera relação tributária de força. Além disso, também já incluímos a competência tributária como limitação constitucional ao direito de tributar, que também sofre limitação dos princípios constitucionais e da imunidade. As imunidades denegam a própria competência, inibindo o seu exercício em relação a certas hipóteses, ao passo que os princípios orientam o adequado exercício da competência tributária. Neste sentido, Costa (2001, p. 36 e 37) sintetiza que ”A
competência tributária é o resultado de regras positivas e negativas que a delineiam e demarcam”. Pois bem, a repartição constitucional de competência tributária, também conhecida por discriminação de rendas, é requisito indispensável para garantir, in abstrato, a autonomia financeira dos entes federados. Como visto, a repartição de competência tributária está prevista na Constituição Federal e, apenas ela, através de Emenda Constitucional, poderá alterá-la, com a ressalva de que tal alteração não pode comprometer a forma federativa de Estado que é cláusula pétrea. De forma diversa, Carraza (2002, p. 144) entende que “a autonomia municipal não é uma cláusula pétrea. O Congresso Nacional, no exercício de seu poder constituinte derivado, pode, querendo, aprovar emenda constitucional que venha a diminuir ou, mesmo, a eliminar a autonomia dos Municípios”. Apenas tem competência tributária, no Brasil, as pessoas políticas, pois, apenas elas possuem Poder Legislativo e apenas a lei pode instituir tributo. Apenas a
União, Estados, Distrito Federal e Municípios podem tributar, logo, encontram-se excluídas do rol de competentes, o Território (que não existe na atualidade, mas pode, a qualquer momento, ser criado), as autarquias etc. O Brasil outorga competência tributária impositiva aos municípios em nível constitucional, “outros países outorgaram-na, por legislação ordinária, mas tal delegação do poder central ou dos entes federados é excepcional." (MARTINS, 1990, p. 522). A competência tributária é aptidão, constitucionalmente qualificada, para as pessoas políticas (entes federados) criarem tributos. Inclui a faculdade de criar, ou não, modificar, alterar, remir, anistiar e isentar. Acrescenta Gadelha (2010, p. 69), que “a competência tributária constitui o alfa e o ômega da tarefa tributante, estabelecendo o início e o fim de exercício do ente federado”. Importante destacar que a Constituição Federal de 1988 não criou tributos, preferiu introduzir um manual de competências tributárias para que os entes
políticos instituam os seus tributos. Dentre as principiais característica da competência tributária podemos citar a indelegabilidade (não poderá ser delegada para outrem), irrenunciabilidade (a pessoa política não goza da faculdade de dispor dos tributos, não lhe sendo constitucional renunciar ao direito de instituí-los), incaducabilidade (a competência tributária não está vinculada a qualquer prazo fatal, podendo ser exercida a qualquer momento), privativa (somente o ente político definido constitucionalmente pode exercer a competência, implicando vedação expressa do seu exercício por pessoa diversa da prevista na Constituição) e inalterável por lei infraconstitucional (a competência tributária só pode ser alterada por Emenda Constitucional). 5.1 Competência tributária municipal. A Assembleia Nacional Constituinte, utilizando o seu poder de tributar, outorgou competência tributária para que os municípios possam instituir, além das taxas, contribuição de melhoria, contribuição
previdência dos seus servidores, 03 (três) impostos. São eles: Art. 156. [...] I - propriedade predial e territorial urbana; II - transmissão "inter vivos", a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição; III - serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar;
Ou seja, os Municípios podem instituir o Imposto sobre propriedade predial e territorial urbana – IPTU; Imposto sobre transmissão, inter vivos, de bens imóveis – ITBI; e o Imposto sobre serviços de qualquer natureza – ISSQN. Ressalve-se que competência tributária municipal é originária, conferida diretamente pela Constituição. Assim como os Municípios, os Estadosmembros também possuem apenas três impostos, no caso do último seria o ICMS, ITCMD e IPVA. Ao passo que a União possui nove impostos (IR, IOF, II, IE, IPI, ITR, Imposto sobre Grandes Fortunas, Impostos da competência residual da União e Impostos extraordinários
de guerra). Pois bem, graficamente[41], no que tange a arrecadação dos entes tributantes, teríamos:
Percebe-se
que
aos
Municípios
foram
atribuídos tributos de pouca representatividade econômica, inviabilizando o self-government. E isso ocorre, principalmente, porque “sua base de tributação está bastante ligada ao meio urbano, quando se sabe que pequena parte dos Municípios brasileiros pode ser considerados como efetivamente urbanos” (BREMAEKER, apud Gadelha, 2010, p. 73). Analisando de forma pontual, percebemos que nos municípios menores não existe arrecadação tributária, pelas seguintes razões: 1. As prestações de serviços ocorrem de
forma precária e na informalidade, o que já elimina/reduz a incidência do ISS; 2. A quase integralidade dos imóveis não são registrados na Prefeitura, eliminando a incidência do IPTU; 3. Partindo da premissa de que os imóveis não são escriturados, também não são transferidos por escritura pública e sim contrato particular, eliminando a incidência do ITBI; e, ainda 4. Quanto aos imóveis registrados no banco de dados das Prefeituras, os gestores preferem não arrecadar o IPTU destes contribuintes para não se desagradar com os eleitores. Objetivando minimizar esta distorção do pacto federativo, a Constituinte, além da arrecadação dos impostos, previu que os Municípios teriam direito ao Fundo de Participação dos Municípios, composto por 22,5% da arrecadação do IPI e do IR, com uma distribuição proporcional à população de cada unidade, sendo 10% do fundo reservados para os Municípios das Capitais[42]; além da repartição dos impostos dos
Estados-membros e da União, da seguinte forma: 1. 100% (cem por cento) do produto da arrecadação do IR- Fonte (IRPF), incidente na fonte pagadora, sobre rendimentos pagos a qualquer título, por eles (municípios), suas autarquias e fundações que instituírem e mantiverem; 2. 50% (cinquenta por cento) do produto de arrecadação do ITR, relativamente aos imóveis nela situados. O limite pode atingir 100% (cem por cento) para os Municípios, caso estes se dediquem às atividades de fiscalização e cobrança de tributos, desde que dessa atividade não resulte redução de imposto ou qualquer forma de renúncia fiscal; 3. 50% (cinquenta por cento) do produto da arrecadação do IPVA, relativo aos veículos automotores licenciados em seus territórios; 4. 25% (vinte e cinco por cento) do montante entregue pela União, a título de IPI, aos Estados e DF, proporcionalmente ao valor das exportações de produtos industrializados. Como o montante referido é de 10% (dez por cento), o
percentual aqui repartido será de 2,5% (25% X 10%= 2,5 %); 5. 25% (vinte e cinco por cento) do produto de arrecadação do ICMS (3/4, no mínimo, na proporção do valor adicionado nas operações realizadas em seus territórios e até ¼ de acordo com a lei estadual, desde que não exclua, por completo, a participação do município; 6. 70% (setenta por cento) do produto de arrecadação do IOF-Ouro, quando definido em lei como ativo financeiro ou instrumento cambial, para o Município de origem, no qual houver extração de ouro; 7. 25% (vinte e cinco por cento) entregue pela União ao Estado (em que se situe o município), a título de CIDE - Combustível. Como o montante referido é de 29% (vinte e nove por cento), o percentual aqui repartido será de 7,25% (25% X 29%=7,25%) (MAILER, 2011). Em que pese a repartição das receitas tributárias dos demais entes, com exceção do Distrito
Federal, com os municípios as receitas deste integrante da federação são insuficientes para custear as suas despesas. A centralização das competências, inclusive tributárias, no governo central, indubitavelmente, causa um forte desequilíbrio do pacto federativo tornando os Municípios “parasitas” dos recursos da União. Nesse sentido, Gadelha (2010, p. 81) acrescenta que “a maciça proliferação de Municípios, despidos de qualquer espécie de estrutura, mas que passam a significar mais “parasitas” dos recursos dos Municípios”. Acrescentando, Carrazza (2002, p. 596/597) adverte que “hoje é público e notório que os Estados, os Municípios e o Distrito Federal estão – uns mais, outros menos – sucumbindo à míngua, sendo obrigados a pedinchar as benesses da União”. Existe no Brasil, mais de 5.500 municípios, número assustador que deve ser repensado objetivando diminuir os gastos públicos. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS. Por
fim,
reiteramos
e
filiamo-nos
ao
entendimento de que nas relações jurídico-tributárias o Estado não exerce sobre o sujeito passivo (contribuinte e/ou responsável) o Poder Tributário, sendo apenas detentor de Direitos e obrigações. Se, por um lado possui o Direito de instituir, através de lei, os tributos previstos no seu campo de competência constitucional tributária, por outro, deverá observar as limitações constitucionais ao exercício desta competência, que são os princípios, as imunidades e as competências do outros entes que também servem de limite para aquele direito. Marins (2009, p. 23) ainda acrescenta que “nos sistemas constitucionais, “o poder tributário”, enquanto poder juridicizado está necessariamente subordinado, limitado, condicionado e restringindo pela prevalência de garantias”. Não é por outra razão que Borges (2001, p. 25) ratifica que “esgota-se a relação de poder a partir do momento em que o Estado exerce, no âmbito da Constituição, o seu poder tributário”. Partindo de um silogismo, que tem como premissa menor que o Estado exerce o seu poder de império fundamentado na sua soberania, e como premissa
maior que a soberania estatal, do ponto de vista tributário, se exaure no âmbito constitucional, podemos concluir que, após o desenho constitucional do sistema tributário – com parte imutável para o Constituinte Derivado, não há mais o poder de império para tributar e sim Direito a exercer a sua competência tributária de instituir os seus tributos previstos na Carta Magna. Reforçamos que o contribuinte não é súdito dos entes tributantes e sim detentor de Direitos e obrigações, dentre eles o de pagar tributos dentro da sua capacidade contributiva e com a preservação do mínimo existencial. Ademais, se outrora prevaleceu no Direito Pátrio o legalismo e o constitucionalismo, atrelados ao positivismo exacerbado de Hans Kelsen, hoje, prepondera o pós-positivismo e o neoconstitucionalismo, devendo todas as normas serem analisadas sob à luz da Constituição Federal. Frise-se que os princípios constitucionais (capacidade contributiva, legalidade, não confisco, segurança jurídica etc.) deixaram de ser normas pragmáticas para serem princípios constitucionais com força normativa e de observância obrigatória por todos os
representantes dos três Poderes do Estado, seja como horizonte/limites na elaboração das normas, seja como fim a ser alcançado pelo Estado-Julgador na aplicação das normas. Em decorrência do neoconstitucionalismo, devem-se efetivar os direitos fundamentais, entre eles o da tributação justa, colocando o contribuinte no centro da tributação e não a arrecadação como núcleo daquela. Isso por que a simples arrecadação não é mais o fim último do direito tributário. A finalidade do direito tributário é fazer da arrecadação um ato de justiça social, com limites, com proteções ao contribuinte diante da força e da voracidade do Estado. O contribuinte, posto no centro do direito tributário, exige que a tributação não seja uma mera técnica, mas que seja um ato do Estado que respeite os valores que dão dignidade ao homem. Exige, também, um fim mais elevado: a arrecadação com respeito ao ser humano, não um simples ato de força estatal, em benefício apenas dos detentores do poder (BECHO, 2009). O Direito Tributário não existe para confirmar o poder político-econômico, mas sim para conformá-lo;
não existe para criar invencíveis prerrogativas fiscalizatórias e arrecadatórias, mas sim para disciplinálas. O Direito Tributário não existe para ampliar, inflar e agigantar ainda mais o poder arrecadatório do Estado nem tampouco para reduzir, diminuir, amesquinhar o cidadãocontribuinte; mas existe, sim, para promover o equilíbrio material, formal e processual da relação tributária (MARINS, p. 2009, p. 22) Noutro giro, enfatizamos que o Federalismo adotado pela Constituição brasileira de 1988 acolhe os Municípios como entidades autônomas, igualmente aos Estados, o Distrito Federal e a União[43], fundadas na descentralização, enquanto medida de aproximação dos entes estatais às necessidades das pessoas e eficiência administrativa. Todavia, em que pese a intenção da constituinte em conferir autonomia aos Municípios, concentraram os tributos com maior arrecadação para a União e os de menor expressividade para os Municípios. Ademais, os impostos municipais possuem nítido viés urbano, quando a maioria dos Municípios brasileiros tem feições rurais dificultando ainda mais a
obtenção de recursos próprios e tornando-os parasitas dos repasses de recursos dos demais entes da federação. Por fim, mostra-se indispensável para o desenvolvimento dos Municípios uma Reforma Tributária, com a distribuição de competências tributárias observando as suas particularidades, bem como desconcentrando a arrecadação da União, fracionando-a para os Estados e os Municípios que são os entes mais próximos da realidade fático-social da população. REFERÊNCIAS. BECHO, Renato Lopes. Filosofia do Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 25. ed. São Paulo: Malheiros, 2010. BORGES, José Souto Maior. Teoria Geral da Isenção Tributária. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2001.
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Sistema e Administração Tributária - Uma Visão Geral. Secretaria Da Receita Federal, Coordenação-Geral De Política Tributária. Brasília: Agosto, 2002. Disponível em:
SOUZA, Edino Cezar Franzio de. O Poder de Tributar e o Estado brasileiro no cenário econômico atual. São Paulo: MP Ed., 2010. TORRES, Heleno Taveira. Direito constitucional tributário e segurança jurídica: metódica da segurança jurídica do Sistema Constitucional Tributário. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.
Capítulo 4 OS MUNICÍPIOS E AS LIMITAÇÕES CONSTITUCIONAIS AO PODER DE TRIBUTAR: PRINCÍPIOS E IMUNIDADES Rachel Nogueira de Souza[44] 1. ESTABELECENDO PREMISSAS INICIAIS. De acordo com a doutrina de Robert Alexy, sendo o sistema um conjunto formado por elementos, o sistema jurídico tem como seus elementos as normas jurídicas, que podem ser divididas em princípios e regras. Estas últimas prescrevem imperativamente uma exigência – impõem, proíbem ou permitem, não se admitindo a coexistência simultânea de regras contraditórias, enquanto que o conflito de princípios se resolve pela técnica da ponderação, não havendo hierarquia entre eles. Entretanto, deparando-se o operador do direito com um conflito entre uma regra e um princípio,
qual deverá prevalecer? Para solucionar a questão, importante analisar o voto do Min. Cesar Peluso proferido na Medida Cautelar em Ação Cautelar n. 1657. Naquela oportunidade, a Indústria de Cigarros pretendia que fossem anulados os atos da administração tributária que interditou seu estabelecimento e cancelou o registro especial para industrialização de cigarros, em virtude do não adimplemento de obrigações tributárias. O posicionamento foi no sentido de que, não obstante exista jurisprudência da Corte pela impossibilidade de sanções políticas por parte do Fisco, tal não seria o caso, tendo em vista o princípio da extrafiscalidade, que inclui todos os casos não vinculados à arrecadação, mas sim tem por fundamento estimular determinado comportamento nos indivíduos. In casu, buscou-se o desestímulo a fabricação de cigarros. Assim como no caso concreto, toda vez que o aplicador do direito se deparar com regra que, mesmo razoável de forma genérica, se mostra incompatível com princípio no caso concreto, este último deve prevalecer como meio de dar harmonia ao sistema.
Como dito anteriormente, as normas jurídicas podem ser divididas em princípios e regras, sendo que estes primeiros são o ponto de partida para a compreensão do sistema. Os princípios são normas jurídicas de otimização, de acordo com Canotilho, servindo de fundamento para aplicação prática do direito de modo a harmonizar o sistema para que haja um balanceamento de valores e interesses. Na seara tributária, sendo o Estado uma instituição administrativa e política que precisa captar recursos para manter sua estrutura e disponibilizar serviços públicos, ele o faz mediante a cobrança de tributos. E para que esta cobrança aconteça, a Carta Magna previu princípios para o equilíbrio da relação jurídica entre o Fisco e o Contribuinte. O termo “limitações constitucionais ao poder de tributar” corresponde ao termo que foi popularizado sob a égide da Constituição de 1946 por Aliomar Baleeiro, que o associou às imunidades fiscais. No entanto, evoluiu-se nesse conceito para abarcar também vedações de privilégios odiosos, de discriminações e os
princípios constitucionais tributários. A Constituição atual estabeleceu as limitações ao poder de tributar através de princípios e regras que visam proteger o cidadão contra os abusos dessa competência do Estado, ou seja, são normas que impõem condutas negativas às pessoas competentes para exercer o poder tributário. Vale transcrever as palavras de Cruz (2006, p. 34): A rigidez e a forma escrita de nosso modelo constitucional, desde 1824 até os tempos atuais, se traduziu numa forma de limitação ao poder tributário, sendo que no caso da Carta da Primavera de 1988, o formato analítico e exaustivo escolhido pela Assembleia Constituinte de 1987 apenas acentuou tais limitações, reforçadas por um regime federativo e republicano único no mundo, erigindo à cláusulas pétreas a grande massa das imunidades e dos princípios limitadores ao poder tributário, posto que especializações dos direitos e garantias individuais.
Tendo as palavras do referido doutrinador em mente, passa-se a análise das limitações constitucionais ao poder tributar sob a ótica do Direito Tributário Municipal, traçando os principais pontos que devem ser de atenção para o estudioso da área.
2. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS TRIBUTÁRIOS: UMA ANÁLISE SOB A ÓTICA DO TRIBUTÁRIO MUNICIPAL.
DIREITO
Analisando especificamente os princípios, Carvalho (2010, p. 191) afirma que: [...] em Direito, utiliza-se o termo 'princípio' para denotar as regras de que falamos, mas também se emprega a palavra para apontar normas que fixam importantes critérios objetivos, além de ser usada, igualmente, para significar o próprio valor, independentemente da estrutura a que está agregado e, do mesmo modo, o limite objetivo sem consideração da norma.
Desta forma, utilizando-se da ótica de que os princípios podem significar tanto critérios objetivos quanto um valor, analisar-se-ão, a seguir, alguns princípios tributários e seu reflexo no âmbito municipal: a) princípio da capacidade contributiva - “a capacidade contributiva do sujeito passivo foi o padrão de referência básico para aferir-se o imposto da carga tributária e o critério comum dos juízos de valor sobre o
cabimento e a proporção do expediente” (CARVALHO, 2010, p. 213). Dessa definição, observe-se que, à medida que se considera a possibilidade econômica como critério para instituição do tributo, tem-se um limite objetivo, ligado ao princípio da igualdade. No entanto, havendo impossibilidade de mensuração no caso concreto, conforme estabelece o §1º do art. 145 da CF[45], tem-se um valor. No âmbito do Direito Tributário Municipal, há que se verificar a relação do princípio da capacidade contributiva com a possibilidade de alíquotas progressivas no ITBI e no IPTU. Sabe-se que ambos os tributos são denominados pela doutrina tradicional como impostos reais, ou seja, aqueles que apenas levam em consideração a matéria tributária, abstraindo condições individuais de cada contribuinte. A expressão “sempre que possível”, expressa no texto constitucional se justificaria pela dificuldade na aplicação do princípio da capacidade contributiva nos impostos ditos reais, onde, supostamente, não deveria ser levada em conta a capacidade econômica
do sujeito passivo. Assim, estes impostos não poderiam possuir caráter extrafiscal, muito menos representar veículo para aferir a capacidade contributiva. Ocorre que a Constituição Federal de 1988, ao tratar da competência dos municípios para instituir o IPTU, previu, desde logo, que este poderia ser progressivo no tempo, de forma a assegurar o cumprimento da função social da propriedade. Mesmo com tal previsão, o STF entendia que o IPTU não poderia ser graduado segundo a capacidade contributiva por ser imposto de natureza real (RREE 153.771; 192.732; 193.997; 194.036;197.676; 204.827). A jurisprudência daquela Corte apenas passou a considerar a possibilidade da progressividade do IPTU após a Emenda Constitucional n. 29/00, possibilitando a aplicação do princípio da capacidade contributiva neste imposto dito real. A partir de então, passou a revisar a premissa de que o princípio da capacidade contributiva autorizava a progressividade nos impostos pessoais e a vedava nos impostos reais. Contudo, não se afastou totalmente os
fundamentos desta distinção. Neste sentido, observa-se o enunciado n. 668 de Súmula do STF: “É inconstitucional a lei municipal que tenha estabelecido, antes da EC 29/2000, alíquotas progressivas para o IPTU, salvo se destinada a assegurar o cumprimento da função social da propriedade urbana”. Ora, o IPTU tem natureza real, porque não leva em conta as condições pessoais do contribuinte na apuração do valor venal, base de cálculo do imposto, o que implica em concluir que a sua progressividade será aferida em função do próprio imóvel (sua localização, dimensões, luxo, características, etc). Na verdade, se considerou duas hipóteses de progressividade do IPTU: a) a progressividade fiscal; b) a progressividade extrafiscal. Esta última, todavia, nada tem a ver com a capacidade contributiva, volta-se apenas a fazer valer a função social da propriedade, como bem leciona Roque Antonio Carrazza (2006, p. 108): Estamos tentando significar que o princípio da capacidade contributiva, no IPTU, não se revela no inciso II do §1o do art. 156 da Carta Magna. O princípio da capacidade contributiva, também no IPTU, revela-se no já
mencionado art. 145, §1o (cuja aplicação a este imposto é declarada no inciso I do §1o do art. 156 da CF) da CF. O IPTU não depende da edição de qualquer plano diretor do Município (art. 182, §§1o e 2o, da CF) para poder ter caráter pessoal e ser graduado de acordo com a capacidade econômica do contribuinte.
Com relação à progressividade fiscal, observa-se que a sua dimensão se verifica quando o imposto é cobrado por alíquotas maiores, na medida em que se amplia a base de cálculo de modo a satisfazer a Justiça Fiscal. É de observância obrigatória, posto que decorre da capacidade contributiva e, consequentemente, é um corolário do princípio da isonomia. Contudo, longe ser considerado um princípio implícito, a progressividade é tratada como mera regra, que apenas após a EC n. 29 foi autorizada para fins de cobrança de IPTU, conforme se observa nos precedentes da Corte Suprema: Imposto Predial e Territorial Urbano. (...) Surge legítima, sob o ângulo constitucional, lei a prever alíquotas diversas presentes imóveis residenciais e comerciais, uma vez editada após a EC 29/2000.” (RE 423.768, Rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 1º-12-2010, Plenário, DJE de 10-5-2011.) No mesmo sentido: RE 586.693, Rel. Min.
Marco Aurélio, julgamento em 25-5-2011, Plenário, DJE de 22-6-2011, com repercussão geral. Vide: RE 437.107AgR, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 6-42010, Segunda Turma, DJE de 23-4-2010. IPTU. (...) Antes da EC 29/2000, a utilização da técnica de tributação progressiva somente era admitida para assegurar a função social da propriedade (art. 156, § 1º, da Constituição), condicionada nos termos do art. 182, § 2º e § 4º, da Constituição. Era, portanto, inconstitucional a tributação progressiva, com fins extrafiscais, baseada na capacidade contributiva ou na seletividade. Súmula 668/STF.” (RE 437.107-AgR, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 6-4-2010, Segunda Turma, DJE de 23-42010.) No mesmo sentido: RE 543.023-AgR, Rel. Min. Ayres Britto, julgamento em 16-8-2011, Segunda Turma, DJE de 19-10-2011. Vide: RE 423.768, Rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 1º-12-2010, Plenário, DJE de 10-52011; AI 582.467-AgR, Rel. Min. Ellen Gracie, julgamento em 22-6-2010, Segunda Turma, DJE de 6-8-2010; AI 583.636-AgR, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 6-4-2010, Segunda Turma, DJE de 30-4-2010; AI 573.560-AgR, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 27-32007, Segunda Turma, DJE de 4-5-2007; AI 468.801AgR, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 21-9-2004, Primeira Turma, DJE de 15-10-2004.
Dessa forma, não obstante se verifique que com a EC n. 29/00 ficou claro que todo imposto pode ser real e pessoal ao mesmo tempo, porque sempre será devido por um sujeito de direito em razão do seu
patrimônio, o STF mantém a distinção entre impostos reais e pessoais bem como a premissa de que o art. 145, §1º, da CF, apenas se referiu a impostos pessoais, tanto que ainda mantém e aplica o enunciado de Súmula n. 656, que diz:“É inconstitucional a lei que estabelece alíquotas progressivas para o imposto de transmissão inter vivos de bens imóveis – ITBI com base no valor venal do imóvel”[46]. Esperava-se que com a atribuição de repercussão geral sobre a matéria progressividade do IPTU antes e após a EC n. 29/2000 a Corte revisse o seu posicionamento e afirmasse o caráter declaratório e realizador de princípios fundamentais do sistema constitucional tributário. Contudo, o STF se limitou apenas a ratificar o entendimento anteriormente esposado. Neste sentido: NULIDADE – JULGAMENTO DE FUNDO – ARTIGO 249, § 2º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. Quando for possível decidir a causa em favor da parte a quem beneficiaria a declaração de nulidade, cumpre fazê-lo, em atenção ao disposto no artigo 249, § 2º, do Código de Processo Civil, homenageando-se a economia e a celeridade processuais, ou seja, alcançar-se
o máximo de eficácia da lei com o mínimo de atividade judicante, sobrepondo-se à forma a realidade. IMPOSTO PREDIAL E TERRITORIAL URBANO – PROGRESSIVIDADE – FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE – EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 29/2000 – LEI POSTERIOR. Surge legítima, sob o ângulo constitucional, lei a prever alíquotas diversas, presentes imóveis residenciais e comerciais, uma vez editada após a Emenda Constitucional nº 29/2000.[47]
Com a devida vênia, seria mais coerente que a Corte Suprema tivesse declarado a inconstitucionalidade da referida emenda constitucional, posto que considerar a impossibilidade de progressividade do IPTU antes da referida emenda é o mesmo que torná-la ilegítima. A EC n. 29/00 alterou por via reflexa o art. 145, §1°, da CF, por facultar o legislador municipal a graduar progressivamente impostos de caráter inequivocamente real – que seria inalterável, em virtude do que dispõe o art. 60, §4º, da CF. b) princípio da legalidade – o artigo 150, inciso I, da Constituição Federal prevê o Princípio da Legalidade, por meio do qual é vedado aos entes políticos instituir ou majorar tributos senão por meio de lei, ou
seja, não é possível ao Poder Executivo criar tributos, sem a atuação do Poder Legislativo na produção da lei respectiva. Fácil estabelecer esse princípio como limite objetivo, já que, conforme o que também dispõe o inciso II do art. 5º da CF, não é possível pensar no surgimento de direitos subjetivos e de deveres correlatos sem que a lei os estipule. Considerando o estabelecimento de deveres, há que se destacar no âmbito municipal a questão da possibilidade de utilização de planta genérica de valores para determinar a base de cálculo do IPTU. O cerne da questão está na análise da base de cálculo do IPTU, que consiste, de acordo com o art. 33 do CTN[48], no valor venal do imóvel, cabendo à legislação municipal determinar os critérios avaliadores dos imóveis e fixar parâmetros a serem adotados pela autoridade lançadora para a aferição do referido valor venal. Na prática, conforme aponta Cintia Estefania Fernandes (2005, p. 336), o valor venal do imóvel “trata-se de valor apurado anualmente, através de lançamento individual ou por presunções relativas, estas efetuadas através das
Plantas Genéricas de Valores”. A adoção como critério das referidas Plantas tem como objetivo facilitar e racionalizar o trabalho do Fisco, já que contêm plantas, tabelas, listas, fatores e índices determinantes dos valores médios unitários de metro quadrado. A doutrina é pacífica no sentido de que as referidas Plantas têm apenas presunção relativa. Parte da doutrina, no entanto, se posiciona no sentido de que não contraria o CTN a sua elaboração periódica. “A Planta Genérica de Valores deve ser feita ano a ano, não necessitando constar de edição legislativa, ainda que ultrapasse o índice da correção monetária, e será elaborada com base no preço corrente de mercado” (FERNANDES, 2005, p. 343). Ocorre que, no entanto, esse não é o entendimento do STJ. De acordo com esta Corte, a Planta Genérica de Valores deve ser publicada por lei (Resp 31.022/RS). No mesmo sentido se posiciona o STF, entendendo pela obrigatoriedade da veiculação da planta por meio de lei formal, uma vez que se trata da fixação da base de cálculo do tributo, sujeita ao princípio da
legalidade estrita. Tendo em vista que a fixação ou majoração decorre de lei, imprescindível a publicação. Nesse sentido: EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IPTU. VALOR VENAL DO IMÓVEL. ATUALIZAÇÃO. NECESSIDADE DE LEI EM SENTIDO FORMAL. I. - É vedado ao Poder Executivo Municipal, por simples decreto, alterar o valor venal dos imóveis para fins de base de cálculo do IPTU. Precedentes. II. - Agravo não provido.[49]
A alteração da planta de valores nada mais é do que a alteração da base de cálculo. Correspondendo a um dos critérios da regra-matriz, entende-se que não cabe ao executivo, por ato próprio disciplinar, a matéria sem que a Constituição faça qualquer ressalva. Concluindo, considerando que aumento é diferente de atualização, o acréscimo da base de cálculo (valor venal), deve se dar por lei, em hipótese alguma por Decreto, em observância ao princípio da legalidade. c) princípio da anterioridade – este princípio também é predominantemente limitativo, uma vez que estabelece que a vigência da lei que institui ou aumenta
tributo deve ficar protraída para o ano seguinte ao de sua publicação, momento em que o ato se insere no contexto comunicacional do direito. A Emenda Constitucional n. 42/2003, que vedou, em regra, a cobrança de tributo antes de decorridos noventa dias da lei que o instituiu ou aumentou, reitera o rol de exceções relativo ao art. 153, III, b, e acrescenta, como situação não sujeita ao lapso temporal de que trata a alínea c do mesmo dispositivo, a fixação da base de cálculo dos impostos previstos nos arts. 155, III, e 156, I (IPVA e IPTU). Isso não quer dizer, no entanto, que este princípio não seja considerado direito fundamental, mas apenas que se autorizou que, no âmbito do IPTU, assim como no do IPVA, não há a necessidade de se aguardar noventa dias para os seus efeitos. Segue trecho do entendimento do STF: O princípio da anterioridade da lei tributária - imune, até mesmo, ao próprio poder de reforma constitucional titularizado pelo Congresso Nacional (RTJ 151/755-756) representa um dos direitos fundamentais mais relevantes outorgados ao universo dos contribuintes pela Carta da
República, além de traduzir, na concreção do seu alcance, uma expressiva limitação ao poder impositivo do Estado. Por tal motivo, não constitui demasia insistir na asserção de que o princípio da anterioridade das leis tributárias que se aplica, por inteiro, ao IPTU (RT 278/556) - reflete, em seus aspectos essenciais, uma das expressões fundamentais em que se apóiam os direitos básicos proclamados em favor dos contribuintes.
Em suma, instituída a lei que aumentou a base de cálculo do imposto em questão, esse poderá ser cobrado, efetivamente, no primeiro dia do exercício seguinte, independentemente de verificação do princípio da anterioridade, pois a base de cálculo do IPTU constitui exceção ao princípio da anterioridade mínima de 90 dias. A indelegabilidade da competência tributária suscita questionamentos sobretudo no que diz respeito ao ISS. A Constituição Federal no seu art. 156, III, estabeleceu a competência dos Municípios para estabelecer impostos sobre prestação de serviços, cabendo à Lei Complementar definir, além da hipótese de incidência, quais os serviços se sujeitam a esta incidência. De acordo com Barreto (2005, p. 31), apenas
é tributável o serviço humano que possua valor econômico, complementando este raciocínio afirma o autor que: [...] só a prestação do serviço é tributável, porque o conteúdo econômico indica o prestador como o verdadeiro beneficiário da retribuição que, de alguma maneira, é o modo objetivo de mensuração desse mesmo conteúdo econômico. O consumo, a fruição e a utilização do serviço não podem ser postos ou entendidos como compreendidos nessa materialidade na hipótese de incidência porque os sujeitos das ações consumir, fruir e utilizar são, necessariamente, diferentes do prestador do serviço.
Observe-se que a legislação estadual apenas excepcionalmente pode estabelecer quais os serviços suscetíveis de tributação por parte dos Estados, e que a regra é que os Municípios tributem os serviços. No entanto, de acordo com a doutrina e a jurisprudência dominante, isso não quer dizer que a lista prevista na Lei Complementar n. 116/03 seja meramente exemplificativa. Este é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, que antes mesmo da referida lei, já se posicionava sobre a taxatividade da previsão dos serviços no Decreto-Lei n. 406, conforme se depreende da ementa abaixo:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. ISS. SERVIÇOS BANCÁRIOS.LISTA DE SERVIÇOS ANEXA AO DECRETO 406/68. TAXATIVIDADE. LEITURA EXTENSIVA DE CADA ITEM. INTERPRETAÇÃO AMPLA. POSSIBILIDADE. DECISÃO AGRAVADA ALINHADA COM A JURISPRUDÊNCIA ASSENTE NESTA CORTE. PRECEDENTES. CONFRONTO ANALÍTICO. FALTA DE DEMONSTRAÇÃO. 1. Agravo regimental contra decisão que não proveu agravo de instrumento por o acórdão recorrido encontrar-se alinhado com a jurisprudência desta Corte Superior no sentido de que a lista de serviços anexa ao Decreto-lei n. 406/68, para fins de incidência do ISS sobre serviços bancários, é taxativa, admitindo-se, contudo, uma leitura extensiva de cada item, a fim de enquadrar-se serviços correlatos àqueles previstos expressamente, uma vez que, se assim não fosse, ter-se-ia, pela simples mudança de nomenclatura de um serviço, a incidência ou não do ISS. 2. Precedentes: AgRg no Ag 746.276/BA, Rel. Min. Herman Benjamim, DJ 06.09.2007; AgRg no REsp 763.958/MG, Rel. Min. Luiz Fux, DJ 31.05.2007; AgRg no Ag 577.068/GO, Rel. Min. Humberto Martins, DJ 28.08.2006; AgRg no REsp 659.522/GO, Rel. Min. Denise Arruda, DJ 28.05.2007. 3. A alegação de suposta divergência jurisprudencial não merece prosperar, visto que não houve confronto analítico. 4. Agravo regimental não-provido.[50]
3. IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS E A COMPETÊNCIA
TRIBUTÁRIA DOS MUNICÍPIOS. De acordo com Carvalho (2010, p. 267), “a competência tributária, em síntese, é uma das parcelas entre as prerrogativas legiferantes de que são portadoras as pessoas políticas, consubstanciadas na possibilidade de legislar para a produção de normas jurídicas sobre tributos”. A Constituição Federal é a fonte de delimitação da competência tributária, uma vez que a atribuição de tributar decorre da própria organização jurídica do Estado. Sabe-se que a Constituição da República Federativa do Brasil promulgada em 1988 constitui fundamento de validade das demais normas, ou seja, ela é a lei fundamental do Estado. Ao afirmar que as competências tributárias são outorgadas pelas pessoas políticas pela Carta Magna, está a se dizer que os parâmetros definidores das competências tributárias não podem ser buscados em outra norma que não o texto constitucional. E não poderia ser diferente no âmbito
Municipal. A Constituição Federal no seu art. 156 estabeleceu a competência tributária dos Municípios. Ao lado do estabelecimento de competência para tributar, também está delimitado no texto constitucional as hipóteses de imunidades tributárias que constituem as normas negativas que desenham o âmbito da competência. De acordo com Carrazza (2006, p. 469), “a competência tributária se traduz numa autorização ou legitimação para criação de tributos (aspecto positivo) e num limite para fazê-lo (aspeto negativo)”. Assim, a imunidade seria o aspecto negativo para a definição da competência tributária. Imunidade tributária consiste em expressão que comporta várias definições. Conforme o mesmo doutrinador, imunidade tributária tem um significado amplo, representando todas as limitações ao poder de tributar previstas no texto constitucional, como a necessidade de observância dos princípios que formam o estatuto do contribuinte (princípio da legalidade, anterioridade, noventena, vedação ao confisco, irretroatividade, etc.). O autor ainda aponta para um
significado restrito, consistindo imunidade tributária nas normas constitucionais que preveem expressamente a não possibilidade de tributar determinadas pessoas. Por sua vez, Carvalho (2010, p. 234), ao criticar a definição normalmente estabelecida pela doutrina, qual seja, que a imunidade é uma limitação constitucional às competências tributárias, excluindo ou suprimindo o poder de tributar de forma ampla e indivisível, consistindo em hipótese de não incidência constitucionalmente qualificada aplicável somente aos tributos vinculados, propôs nova definição no sentido de que a imunidade tributária corresponda à: [...] classe finita e imediatamente determinável de normas jurídicas, contidas no texto da Constituição Federal, e que estabelecem, de modo expresso, a incompetência das pessoas políticas de direito constitucional interno para expedir regras instituidoras de tributos que alcancem situações específicas e suficientemente caracterizadas.
Vale ainda relembrar a sua completa distinção com a isenção. O Min. Maurício Corrêa já afirmou que: [...] a isenção fiscal decorre do implemento da política
fiscal e econômica, pelo Estado, tendo em vista o interesse social. É ato discricionário que escapa ao controle do Poder Judiciário e envolve o juízo de conveniência e oportunidade do Poder Executivo. O termo inicial de vigência da isenção, fixada a partir da data da expedição da guia de importação, não infringe o princípio da isonomia tributária, nem desloca a data da ocorrência do fato gerador do tributo, porque a isenção diz respeito à exclusão do crédito tributário, enquanto o fato gerador tem pertinência com o nascimento da obrigação tributária.
[51] A doutrina ao tratar do fenômeno o faz sempre buscando semelhanças com a imunidade, uma vez que, de acordo com Coelho (2005, p. 533): “a isenção, como também a imunidade, não exclui o crédito, obsta a própria incidência, impedindo que se instaure a obrigação. No entanto, Carvalho (2010) afirma que tal aproximação consiste em equívoco, posto que a imunidade e a isenção não possuem quase nenhum ponto de contato, a não ser quanto ao fato de serem normas jurídicas válidas no sistema e integrarem regras de estrutura. Observe-se o seguinte gráfico que ilustra bem a diferença entre os dois institutos:
Assiste razão o eminente doutrinador, pois a imunidade corresponde à norma constitucional, não cuidando da problemática da incidência, mas sim atuando no momento antecedente da criação das leis que disciplinam a incidência tributária, sendo norma de estrutura. Já a isenção, por sua vez, é norma da legislação ordinária, operando como redutor do campo de abrangência dos critérios da regra-matriz do tributo, “uma limitação ao âmbito de abrangência de critério do antecedente ou do consequente da norma jurídica tributária, que impede que o tributo nasça (naquele caso abrangido pela norma jurídica isentiva)” (CARRAZZA,
2006, p. 737). Assim,
estando
prevista
no
texto
constitucional, não importa qual a expressão que se utilize para desenhar o âmbito de incidência tributária do ente federativo competente para legislar, estar-se-á diante de imunidade. Doutrinadores, como Hugo de Brito Machado, entendem que as imunidades são decorrentes de cláusulas pétreas, não podendo ser suprimidas por alterações posteriores do texto constitucional. Nas palavras do referido autor (2009, p.287), “a regra da imunidade está protegida no art. 60, § 4º, inciso I, da Constituição Federal de 1988, segundo o qual ‘não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir (...) a forma federativa de Estado'”. As cláusulas pétreas consistem no núcleo constitucional intangível, de modo a preservar os valores considerados essenciais, quais sejam: a) a forma federativa de Estado; b) o voto direto, secreto, universal e periódico; c) a separação dos poderes; d) os direitos e garantias individuais. Desta forma, qualquer imunidade
que esteja ligada a esses valores não pode ser suprimida pelo exercício do poder constituinte derivado. Exemplo disso, é a imunidade recíproca que decorre da forma federativa de Estado, pois quando o inciso VI, alínea a, do art. 150 diz ser proibido aos Entes da Federação instituir imposto sobre patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros, nada mais faz do que tornar explícita uma consequência do pacto federativo. Outro exemplo é a alínea b, sobre a vedação de imposto sobre “templos de qualquer culto”, que busca resguardar a liberdade de crença insculpida nos incisos V e VIII do artigo 5º (direitos e garantias individuais). Para aqueles que acreditam que toda imunidade está ligada a uma garantia constitucional, não há como emenda constitucional revogar imunidade. No entanto, nem todas as imunidades se referem a garantias constitucionalmente estabelecidas. Assim, verificando-se que determinada imunidade não está atrelada ao núcleo intangível do texto constitucional, é possível emenda constitucional restringindo ou eliminando a imunidade. A Carta Magna traz, em seu texto, trinta e três
hipóteses de imunidades tributárias[52], sendo sete hipóteses de imunidades genéricas, que dizem respeito apenas aos impostos, e vinte e seis específicas. Neste trabalho, tratar-se-á das imunidades genéricas em relação a alguns aspectos atinentes aos impostos municipais e das imunidades específicas ao âmbito municipal, quais sejam: a) a imunidade do art. 156, II, in fine, da CF e b) a imunidade do art. 156, §2o, I, da CF. 3.1 Imunidades Genéricas e Impostos Municipais. Inicialmente, é necessário observar a redação do art. 150, VI, da CF, in verbis: Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...) VI - instituir impostos sobre: a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros; b) templos de qualquer culto; c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos,
inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei; d) livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão. e) fonogramas e videofonogramas musicais produzidos no Brasil contendo obras musicais ou literomusicais de autores brasileiros e/ou obras em geral interpretadas por artistas brasileiros bem como os suportes materiais ou arquivos digitais que os contenham, salvo na etapa de replicação industrial de mídias ópticas de leitura a laser.
Analisando estas imunidades genéricas sob a ótica da competência tributária dos Municípios, há que se dar destaque, inicialmente, a imunidade recíproca. Sabese que, de modo a não comprometer o equilíbrio federativo e a autonomia dos entes federativos, a imunidade recíproca surge como uma necessidade de manter a forma federativa de Estado, posto que impede que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituam impostos sobre o patrimônio, a renda e os serviços uns dos outros. Utilizando-se desta mesma premissa, o texto constitucional previu, no §2º do
art. 150, a imunidade tributária recíproca extensiva, conforme se observa da sua redação que dispõe que “a vedação do inciso VI, "a", é extensiva às autarquias e às fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, no que se refere ao patrimônio, à renda e aos serviços, vinculados a suas finalidades essenciais ou às delas decorrentes”. Ocorre que há uma diferença fundamental nessa extensão, já que, de acordo com o texto constitucional, para gozar da imunidade, as autarquias e fundações precisam manter seu patrimônio, renda e serviços vinculados às suas finalidades essenciais ou às delas decorrentes. Assim, não é possível a cobrança do IPTU sobre quaisquer terrenos e edifícios da União, dos Estados e dos demais Municípios. No entanto, com relação às entidades autárquicas deve-se acrescentar o requisito da “afetação à destinação específica” para a não incidência do IPTU. Em outras palavras, os imóveis das autarquias não ligados às suas atividades são passíveis de tributação pelo IPTU. Neste sentido, observe-se o
precedente do STF[53]: IPTU. Imunidade tributária recíproca dos entes políticos. Extensão às autarquias. (...) A imunidade tributária recíproca dos entes políticos, prevista na alínea a do inciso VI do art. 150 da Magna Carta, ‘é extensiva às autarquias, no que se refere ao patrimônio, à renda e aos serviços vinculados a suas finalidades essenciais ou às delas decorrentes’. Precedentes: AI 495.774-AgR, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, RE 212.370-AgR, Rel. Min. Sepúlveda Pertence; e RE 220.201, Rel. Min. Moreira Alves.[54]
Ainda com relação à imunidade recíproca, vale mencionar a questão dos serviços notariais. Neste âmbito, há que se verificar o que dispõe o art. 236 da Constituição: “Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público”. Tendo em vista essa redação, há quem afirme que, por serem tais serviços exercidos em caráter privado, deveria haver a incidência do ISS. No entanto, a parte final diz que haverá delegação do Poder Público, o que demonstra o regime de direito público destes serviços, tanto que o STF já plasmou que o valor cobrados na sua execução é taxa. Neste sentido:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE CUSTAS JUDICIAIS E EMOLUMENTOS EXTRAJUDICIAIS - NATUREZA TRIBUTÁRIA (TAXA) - A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou orientação no sentido de que as custas judiciais e os emolumentos concernentes aos serviços notariais e registrais possuem natureza tributária, qualificando-se como taxas remuneratórias de serviços públicos, sujeitando-se, em conseqüência, quer no que concerne à sua instituição e majoração, quer no que se refere à sua exigibilidade, ao regime jurídico-constitucional pertinente a essa especial modalidade de tributo vinculado, notadamente aos princípios fundamentais que proclamam, dentre outras, as garantias essenciais (a) da reserva de competência impositiva, (b) da legalidade, (c) da isonomia e (d) da anterioridade. Precedentes. Doutrina.[55]
Portanto, não haveria como incidir ISS nestes serviços. Contudo, o STF entendeu ser possível a tributação do ISS no presente caso, afirmando na ADI 3089 que: [...] as pessoas que exercem atividade notarial não são imunes à tributação, porquanto a circunstância de desenvolverem os respectivos serviços com intuito lucrativo invoca a exceção prevista no art. 150, § 3º da Constituição. O recebimento de remuneração pela prestação dos serviços confirma, ainda, capacidade contributiva. A imunidade recíproca é uma garantia ou
prerrogativa imediata de entidades políticas federativas, e não de particulares que executem, com inequívoco intuito lucrativo, serviços públicos mediante concessão ou delegação, devidamente remunerados. Não há diferenciação que justifique a tributação dos serviços públicos concedidos e a não-tributação das atividades delegadas”.
Com todo o respeito quanto à decisão do Tribunal Supremo, não parece ser esse o melhor entendimento, pois não se está afirmando pela imunidade recíproca, já que esta, de fato, não existe, mas pela impossibilidade de incidência do ISS em atividades que estejam sujeitas ao regime jurídico de direito público. Outro ponto importante envolve a imunidade tributária religiosa, que está prevista no art. 150, VI, b, da CF e tem por finalidade o não embaraço do funcionamento das entidades religiosas. Essa imunidade não deve ser interpretada extensivamente de forma irrestrita, devendo abranger apenas o patrimônio, a renda e os serviços essencialmente vinculados à atividade fim do ente imune, a não-incidência não deve alcançar atividades desvinculadas do culto (art. 150, §4º, da CF). Assim, por exemplo, o estacionamento da Igreja pode ser tributado
por ISS, IPTU, IR, etc. Entretanto, o que é comercializado dentro do templo esta a salvo da tributação, pois faz parte do culto. Observe-se que, não obstante o texto constitucional tenha se referido apenas a templo ou entidade religiosa, não pretendendo que esta benesse se restringisse à propriedade do imóvel em que está instalado, o objetivo da norma foi impedir a cobrança de qualquer imposto, de modo a proteger todo o patrimônio, a renda e os serviços da entidade religiosa. Ocorre que o §4º do art. 150 da CF afirma que a referida imunidade compreende somente o patrimônio, a renda e os serviços relacionados com as finalidades essenciais das referidas entidades. Não é cabível, portanto, afirmar que há imunidade, não incidindo ISS, com relação aos serviços de guarda e estacionamento de veículos automotores prestados por entidades religiosas. No entanto, com relação ao IPTU, haverá imunidade caso haja imóvel destinado à locação pertencente a mesma entidade. A única exigência, nesta hipótese, é que os rendimentos obtidos revertam para as
finalidades essenciais da instituição. Foi este posicionamento[56] adotado pela Corte Suprema[57]:
o
Instituição religiosa. IPTU sobre imóveis de sua propriedade que se encontram alugados. A imunidade prevista no art. 150, VI, b, CF, deve abranger não somente os prédios destinados ao culto, mas, também, o patrimônio, a renda e os serviços ‘relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas’. O § 4º do dispositivo constitucional serve de vetor interpretativo das alíneas b e c do inciso VI do art. 150 da CF. Equiparação entre as hipóteses das alíneas referidas. [58]
Com relação aos cemitérios particulares é necessário fazer uma ponderação. Os cemitérios são locais utilizados para o sepultamento de pessoas, e podem ser explorados tanto por pessoas jurídicas de natureza pública quanto de natureza privada. Quando se trata de cemitérios explorados por pessoas jurídicas privadas, estas podem deter caráter religioso ou não, o que pode implicar ou não na utilização desses espaços com objetivo de lucro. Discute-se, portanto, a possibilidade de se estabelecer tais estabelecimentos como imunes. Neste ponto, vale
mencionar o entendimento da 14ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que na Apelação Cível Sem Revisão nº 693.904-5/4-00, negou provimento ao recurso do contribuinte sob a justificativa de que "imunidade não se estende a cemitério particular, cujos lotes são vendidos e há cobrança para sua manutenção". Distinta, no entanto, é a hipótese em que o cemitério é explorado por entidade religiosa. Servindo o cemitério como meio de expressar a fé, é plenamente possível afirmar pela incidência da imunidade. Neste sentido, observe-se o posicionamento do STF[59]: Recurso extraordinário. Constitucional. Imunidade Tributária. IPTU. Art. 150, VI, b, CF/1988. Cemitério. Extensão de entidade de cunho religioso. Os cemitérios que consubstanciam extensões de entidades de cunho religioso estão abrangidos pela garantia contemplada no art. 150 da Constituição do Brasil. Impossibilidade da incidência de IPTU em relação a eles. A imunidade aos tributos de que gozam os templos de qualquer culto é projetada a partir da interpretação da totalidade que o texto da Constituição é, sobretudo do disposto nos arts. 5º, VI, 19, I, e 150, VI, b. As áreas da incidência e da imunidade tributária são antípodas.
Outra imunidade genérica que merece destaque é a que diz respeito à imunidade das entidades beneficentes de assistência social. A imunidade prevista na Constituição que tem como destinatárias as entidades de assistência social e de ensino deve abranger os imóveis relacionados com a sua finalidade e funcionamento. Neste sentido, observe-se precedente do STF: Agravo regimental no agravo de instrumento. Imunidade tributária da entidade beneficente de assistência social. Alegação de imprescindibilidade de o imóvel estar relacionado às finalidades essenciais da instituição. Interpretação teleológica das normas de imunidade tributária, de modo a maximizar o seu potencial de efetividade. 1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal vem flexibilizando as regras atinentes à imunidade, de modo a estender o alcance axiológico dos dispositivos imunitórios, em homenagem aos intentos protetivos pretendidos pelo constituinte originário.
2. Esta Corte já reconhece a imunidade do IPTU para imóveis locados e lotes não edificados. Nesse esteio, cumpre reconhecer a imunidade ao caso em apreço, sobretudo em face do reconhecimento, pelo Tribunal de origem, do caráter assistencial da entidade. 3. Agravo regimental não provido. (STF, Agravo Regimental nº 746.263/MG, 1ª Turma, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe nº 34, div. 20.02.2013, pub. 21.02.2013) Por fim, há que se falar da imunidade prevista na alínea “e”. Em 15 de outubro de 2013, foi promulgada a Emenda Constitucional n. 75, trazendo uma nova espécie de imunidade genérica: a imunidade musical. Assim, os CDs e DVDs produzidos no Brasil com obras musicais ou literomusicais de autores nacionais gozarão de imunidade. De acordo com a justificativa da Proposta de Emenda (98 de 2007, Câmara dos Deputados[60]): “É urgente a implantação de medidas que fortaleçam a produção brasileira, diante da
avalanche cruel de pirataria e da realidade inexorável da rede mundial de computadores (internet). A proposta de emenda constitucional em apreço cuida de estabelecer imunidade tributária para a produção musical brasileira bem como a comercialização de seus suportes físicos e digitais tendo como única restrição para sua imunidade que estes contenham músicas compostas ou gravadas por autores ou artistas brasileiros, medida que nos parece poder vir a contribuir para reverter o atual quadro de favorecimento da indústria da pirataria (...)” Assim, no âmbito municipal, há que se destacar o item 13 da Lista de serviços da Lei Complementar n. 116[61], que prevê os Serviços relativos a fonografia, fotografia, cinematografia e reprografia como fato gerador do ISS. A imunidade genérica aqui analisada alcança este item, de modo a possibilitar a redução dos preços destes produtos. Atente-se para o fato
de que a referida imunidade não alcança o processo de replicação industrial. 3.2 A imunidade do art. 156, II, in fine, da CF. O art. 156, II, da CF dispõe que: Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: (...) II - transmissão "inter vivos", a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição;
O ITBI - imposto sobre a transmissão de bens imóveis e direitos a eles relativos, que antes de 1988 era da competência dos Estados (CTN, art. 35), passou a ser de competência dos Municípios para fins de incrementar a arrecadação destes entes federativos (e, assim, contribuir para sua autonomia), bem como para tornar possível a geração de um cadastro imobiliário para fins de fiscalização tributária tanto com relação a este imposto quanto com relação ao IPTU – que também é de
competência municipal. O ITBI tem como fato gerador a transmissão onerosa a qualquer título de bens imóveis e direitos a eles relativos, sendo: a) a transmissão onerosa, a qualquer título, da propriedade ou do domínio útil de bens imóveis, por natureza ou acessão física, como definido na lei civil; b) a transmissão onerosa, a qualquer título, de direitos reais sobre imóveis, exceto os direitos de garantia; c) a cessão onerosa de direitos relativos às transmissão citadas, ou seja: - a cessão onerosa, a qualquer título, da propriedade ou do domínio útil de bens imóveis, por natureza ou acessão física, como definido na lei civil; - a cessão onerosa, a qualquer título, de direitos reais sobre imóveis, exceto os direitos de garantia. No entanto, como foi destacado acima, não se poderá exigir o ITBI na hipótese de hipoteca, penhor e anticrese, já que esses institutos, não obstante envolverem o poder de disposição do imóvel, não correspondem a sua efetiva transmissão. A hipoteca, penhor e a anticrese são direitos reais conforme o art. 1.225 do Código Civil, sendo a
hipoteca uma garantia real extrajudicial e incide sobre bens imóveis ou equiparados que pertençam ao devedor ou a terceiros. O penhor, por sua vez, consiste em direito real de garantia vinculado a uma coisa móvel ou mobilizável e a anticrese é direito real de garantia, no qual o devedor entrega um bem imóvel ao credor, para que os frutos deste bem compensem a dívida. 3.3 Imunidade do art. 156, §2o, I, da CF. Esta imunidade específica também está ligada ao ITBI e diz respeito à “transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil” (inciso I, §2o, do art. 156, da CF). O sua regulamentação infraconstitucional é
verificada na leitura dos artigos 36 e 37 do CTN, in verbis: Art. 36. Ressalvado o disposto no artigo seguinte, o imposto não incide sobre a transmissão dos bens ou direitos referidos no artigo anterior: I - quando efetuada para sua incorporação ao patrimônio de pessoa jurídica em pagamento de capital nela subscrito; II - quando decorrente da incorporação ou da fusão de uma pessoa jurídica por outra ou com outra. Parágrafo único. O imposto não incide sobre a transmissão aos mesmos alienantes, dos bens e direitos adquiridos na forma do inciso I deste artigo, em decorrência da sua desincorporação do patrimônio da pessoa jurídica a que foram conferidos. Art. 37. O disposto no artigo anterior não se aplica quando a pessoa jurídica adquirente tenha como atividade preponderante a venda ou locação de propriedade imobiliária ou a cessão de direitos relativos à sua aquisição. § 1º Considera-se caracterizada a atividade preponderante referida neste artigo quando mais de 50% (cinqüenta por cento) da receita operacional da pessoa jurídica adquirente, nos 2 (dois) anos anteriores e nos 2 (dois) anos subseqüentes à aquisição, decorrer de transações mencionadas neste artigo. § 2º Se a pessoa jurídica adquirente iniciar suas atividades após a aquisição, ou menos de 2 (dois) anos antes dela, apurar-se-á a preponderância referida no parágrafo anterior levando em conta os 3 (três) primeiros anos seguintes à data da aquisição. § 3º Verificada a preponderância referida neste artigo,
tornar-se-á devido o imposto, nos termos da lei vigente à data da aquisição, sobre o valor do bem ou direito nessa data. § 4º O disposto neste artigo não se aplica à transmissão de bens ou direitos, quando realizada em conjunto com a da totalidade do patrimônio da pessoa jurídica alienante.
No entanto, como a disposição destes artigos está fundada na Emenda n. 18/65, sua interpretação deve ser compatibilizada com o texto constitucional, já que estabelece requisito condicional para o gozo da imunidade para todas as hipóteses. A Constituição de 1988 instituiu a imunidade do ITBI de forma mais ampla, abrangendo as hipóteses de cisão ou extinção de pessoa jurídica. O dispositivo constitucional prevê duas modalidades de imunidade: a) transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital; b) transmissão de bens ou direitos decorrentes de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica. Essas imunidades foram incorporadas ao ordenamento jurídico pátrio com a finalidade de “facilitar a formação, a extinção e a modificação de empresas, ou
seja, visou a livre iniciativa, o progresso das empresas e o consequente desenvolvimento econômico, colocando-as a salvo do imposto de transmissão, com a outorga da imunidade tributária” (RODRIGUES, 2002, p. 284-286). Mas, para a sua aplicação a situação deve considerar o imóvel como "moeda de troca", e não como um bem em si. Pode-se afirmar que a imunidade não pode ser aplicada quando a pessoa jurídica tenha como atividade preponderante a compra e venda de bens ou direitos imobiliários, assim como, a locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil. A questão de definir o que seja atividade preponderante está bem detalhada no CTN, conforme bem ensina Roque Antonio Carrazza (2006, p. 793): [...] a atividade é considerada preponderante sempre que a receita operacional da pessoa jurídica adquirente, nos dois anos anteriores e posteriores à aquisição, decorrer de tais transações (art. 37, §1º, do CTN). Quando a pessoa jurídica adquirente iniciar suas atividades após a aquisição, ou menos de dois anos antes de ela se efetivar, a preponderância será aferida tomando-se por base os três primeiros anos seguintes à data da aquisição (art. 37, §2º, do CTN).
Mesmo com a clareza redacional do dispositivo constitucional e das regras estabelecidas pela legislação complementar, dúvidas ainda surgem com relação integralização do capital social com bens imóveis, uma vez que o CTN exige receita operacional “não imobiliária” nos dois anos anteriores e, cumuladamente, nos dois anos subsequentes. Assim, se a pessoa jurídica tiver iniciado suas atividades após a aquisição dos imóveis, gozará do benefício fiscal, sujeitando-se, porém, a perdê-lo e ser compelida ao pagamento do imposto, caso nos dois anos posteriores à aquisição verificar-se a preponderância dos negócios imobiliários. A imunidade quando da integralização inicial depende da demonstração de que não houve o exercício da atividade predominantemente imobiliária. Sobre a questão, infelizmente, não há precedentes significativos nos Tribunais Superiores. Há, no entanto, uma decisão monocrática proferida pelo Ministro Humberto Martins no Agravo em Recurso Especial 55.873 – RS (29 de novembro de 2011) que
esclarece a questão, conforme trecho a seguir: […] o constituinte, ao mesmo tempo em que concedeu poder e competência às pessoas políticas para a instituição de impostos sobre a transmissão de bens imóveis, por exemplo, também vedou o exercício dessas mesmas competências sobre certas transmissões imobiliárias, no caso, sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital e sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica.
A regra colima facilitar a mobilização dos bens de raiz e a sua posterior desmobilização, de modo a facilitar a formação, a transformação, a fusão, a cisão e a extinção de sociedades civis e comerciais, não embaraçando com o ITBI a movimentação dos imóveis, quando comprometidos com tais situações. Em todos esses casos os bens imóveis são transmitidos sem a incidência do ITBI, salvo se os adquirentes tiverem por atividade preponderante – conceito fixado em lei complementar – a compra e venda de bens imóveis ou de direitos a eles relativos ou a locação de bens imóveis lato sensu. Caso, por alguma razão, não se possa
verificar a predominância da atividade desenvolvida, não haverá o benefício constitucional. É o que ocorre quando do encerramento da pessoa jurídica em menos de três anos da sua constituição. Tal postura se justifica pela finalidade de evitar a constituição de empresas com a finalidade exclusiva de afastar a incidência tributária. A verificação da preponderância da atividade deve observar o princípio da razoabilidade. Com o mesmo entendimento, se posiciona Harada (2010): Se a pessoa jurídica adquirente teve a sua existência por um período inferior ao mencionado nesses parágrafos o princípio da razoabilidade impõe que a verificação da atividade preponderante deve ser feita pelo período em que for possível a verificação de suas atividades. Não é possível exigir a verificação da receita operacional da pessoa jurídica nos dois anos anteriores e nos dois anos posteriores à aquisição imobiliária se a empresa promoveu a operação imobiliária imune no primeiro ano de sua fundação, ou foi extinta antes de três anos após a operação.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS. Iniciou-se este trabalho demonstrando a
importância dos princípios e das regras para a formação do ordenamento jurídico e de como esses se apresentam no âmbito do Sistema Tributário Nacional previsto constitucionalmente. Considerando os princípios tributários constitucionalmente estabelecidos como Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar, passou-se a analisálos sob a ótica municipal, traçando considerações somente com relação aqueles que possuíam alguma peculiaridade com relação ao ISS, ao IPTU e ao ITBI. Quanto às imunidades tributárias, estabeleceram-se premissas básicas quanto à sua definição, traçando, em um segundo momento, quais são as suas peculiaridades no âmbito das municipalidades. Destacaram-se algumas questões nas imunidades genéricas e as suas implicações com relação ao imposto previstos no art. 156 da CF, finalizando com as imunidades específicas também ali previstas. As considerações aqui tecidas correspondem a uma análise preliminar e genérica das limitações constitucionais ao poder de tributar no âmbito do direito
tributário municipal, de modo a facilitar a análise de questões que são pouco discutidas seja doutrinária ou jurisprudencialmente. Todo o estudo desenvolvido neste trabalho teve como parâmetro o fato de que, hodiernamente, a lei não vale mais por si mesma. O princípio da legalidade não pode mais ser enxergado como àquele que foi fruto da criação do Estado Liberal, uma vez que atualmente se exige uma nova concepção de modo a resgatar a substância da lei. A lei não vale mais por si! Na seara tributária, essa observação é patente, pois o Sistema Tributário Nacional encontra-se regulado pormenorizadamente na Constituição de 1988, com destaque para os princípios formais e materiais fundamentais e as imunidades. Para ingressar no estudo de qualquer exação tributária, deverá o estudioso do direito ter sempre em mente que as normas tributárias são o corolário dos princípios fundamentais consagrados na Lei Maior. Com isso em mente, é que se buscou abordar o estudo aqui proposto, partindo sempre do texto
constitucional, abordagem esta que deve ser necessariamente efetuada pelo intérprete em qualquer vertente do direito tributário municipal. REFERÊNCIAS. BARRETO, Aires Fernandino. ISS na Constituição e na Lei. 2. ed. Dialética: São Paulo, 2005. CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 22. ed. São Paulo: Malheiros editores. 2006. CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 22. ed. São Paulo, Saraiva, 2010. COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. CRUZ, André Luiz Vinhas da. A natureza jurídica da limitação constitucional ao poder de tributar as entidades sindicais de trabalhadores. Revista de Direito Tributário da APET. São Paulo: MP Editora, 2006. v. 10.
FERNANDES, Cíntia Estefania. IPTU: Texto e Contexto. São Paulo: Quartier Latin, 2005. HARADA, Kiyoshi. Imunidade do ITBI. Jus Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2521, 27 maio 2010. Disponível em: . Acesso em: 3 fevereiro 2012. MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 30. ed. São Paulo: Malheiros, 2009. MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria Geral do Processo. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. RODRIGUES, Marilene Talarico Martins, In: Comentários ao Código Tributário Nacional, coordenador: Ives Gandra da Silva Martins, Editora Saraiva, Edição 2002.
Capítulo 5 ESTUDO SOBRE A POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE ISENÇÃO DE TRIBUTOS MUNICIPAIS, PELA UNIÃO, ATRAVÉS DE TRATADOS INTERNACIONAIS Ana Rosa de Brito Medeiros[62] 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS. A globalização provocou no mundo a formação de blocos econômicos ou comunitários, como é o caso da União Europeia e do Mercosul, diante desse contexto passou a existir a necessidade de tratar internacionalmente de tributos sobre bens e serviços. Assim, neste estudo tratar-se-á sobre a possibilidade da isenção de tributos municipais, pela União, através de tratados celebrados internacionalmente. 2. A UNIÃO COMO PESSOA JURÍDICA DE DIREITO INTERNO
A União é pessoa jurídica-política de direito público interno, entidade federativa autônoma em relação aos Estados-membros, Municípios e Distrito Federal, possuindo competências administrativas e legislativas determinadas constitucionalmente. Internamente, a União compõe as entidades da federação brasileira, que se caracterizam pela autonomia organizacional, na administração, legislação e governo. Dentro do território brasileiro ela coopera com a feitura de leis e tributos, realiza serviços e obras públicas etc. seu domicílio é em Brasília, de acordo com o artigo 18, da Constituição Federal, além de sujeitar-se às normas constitucionais de competência estabelecidas no artigo 109 (BULOS, 2011, p. 904). Entretanto, a União não se confunde com a República Federativa do Brasil (Estado Federal), uma vez que a integra. Deste modo, a República Federativa é o todo, pessoa jurídica de direito público internacional, integrada pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios.
Apenas o Estado brasileiro possui competência para representar o Brasil em questões internacionais, nenhum Estado, Município, ou o Distrito Federal pode atuar nesse campo. Exemplo da competência do Estado brasileiro em âmbito internacional é o Decreto n° 7.030/2009 - que promulga a Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados, realizada em 1969 – quando afirma no artigo 2°[63], que uma pessoa só pode representar um Estado, para assinar ou autenticar um tratado, caso disponha de uma carta de plenos poderes, ou documento semelhante, assim, é um indivíduo que representa o Estado, nunca a União. Todavia, dentro do território nacional a competência da União encontra-se estabelecida pela Constituição Federal, por exemplo, quando tem o poder de instituir impostos estaduais em Território Federal e, se o Território não for dividido em Municípios, cumulativamente, os impostos municipais (art. 147). 3. A GLOBALIZAÇÃO, A COMPETÊNCIA PARA
LEGISLAR SOBRE DIREITO TRIBUTÁRIO DA UNIÃO E A TRIBUTAÇÃO NO COMÉRCIO INTERNACIONAL. Diante do fenômeno da globalização, o mundo percebeu que havia poucas fronteiras para a comunicação, a informação, e a tecnologia. Notou-se que as decisões econômicas e políticas que um Estado tomava afetavam diretamente o outro. Estávamos diante de uma ordem mundial interconectada, onde a transnacionalização econômica impulsionava processos de integração, seja em acordos bilaterais ou em pactos econômicos sub-regionais (GARCIA JUNIOR, 2005, p. 11). O processo de globalização impõe ao mundo contemporâneo medidas de ajustes estruturais, para adaptarem-se às exigências e à competição internacional (VALADÃO, 2009). A necessidade de reunir os Estados e as empresas e blocos econômicos torna-se crescente, assim as empresas fazem megafusões, as pessoas físicas entregam seu patrimônio para ser gerido por megacoorporações e os países unem-se em blocos como
Mercosul, União Europeia, etc. Os Estados, que participam desses processos, criam espaços econômicos integrados, onde podem relacionar intergovernamentalmete ou transferindo parte desse poder para estruturas supranacionais, certamente resguardando integralmente sua soberania, uma vez que todas as decisões e tratados, só são obedecidos pelos Estados, quando concordam com o ordenamento jurídico interno dos países. Esse fato acontece porque em relação a algumas matérias, como a circulação de mercadorias, a competência para regular não pertence mais exclusivamente a um Estado, mas ao conjunto que participa do mesmo processo de integração. Quando olhamos para a tributação, nos processos de integração, nos deparamos com um problema, pois para investir nas funções básicas, a União, Estados, Municípios e Distrito Federal (artigo 145, da Constituição Federal), necessitam de dinheiro e arrecadam do contribuinte valores, normalmente, crescentes. Todavia, dentro da economia transnacionaliada à carga excessiva de tributos sufoca o
povo, principalmente o empresário e industrial, provocando aumento do preço dos produtos e perda de competitividade internacional, causada pelo encarecimento dos bens devido às altas tributações (GARCIA JUNIOR, 2005, p. 13). No sistema tributário brasileiro, a globalização provocou alterações tanto na Constituição, como no Código Tributário Nacional, alterações na legislação tributária via decretos e instruções normativas e outros atos infra-legais. Devido aos compromissos internacionais dos países, como pagamento de empréstimos internacionais, por exemplo, a União cumulou receitas tributárias administrativas. Primeiro, porque foram instituídas contribuições (sociais e de intervenção no domínio econômico), fato que aumentou a carga tributária não compartilhada com Estados e Municípios, e, segundo, porque foram feitas alterações constitucionais, que permitiram a concentração de recursos nas mãos da União (VALADÃO, 2009).
4. O DIREITO INTERNACIONAL E O SISTEMA TRIBUTÁRIO BRASILEIRO. Apesar de o Estado ser soberano, hoje tal soberania possui limites[64] dentro do seu próprio território. Limites que permeiam a obrigação que possui o Estado de garantir os direitos fundamentais do indivíduo e que advém de obrigações internacionais. Todavia, o Estado toma para si o monopólio da produção e aplicação do direito (MEDEIROS, 2011, p. 33), uma vez que a aplicar o direito significa legitimar o poder estatal e de quem o governa, seja através do Poder Executivo, Legislativo ou Judiciário. A União é responsável por representar a Federação brasileira para manter relações com Estados estrangeiros e participar de organizações internacionais (artigo 21, da Constituição de 1988), apesar de ser constitucionalmente pessoa jurídica de direito internacional público. Assim quem negocia o tratado internacional é o Estado brasileiro, através da União (SARAIVA FILHO, 2007).
Após o Chefe do Estado brasileiro assinar o tratado internacional (artigo 84, da Constituição, de 1988), ele deve ser referenciado pelo Congresso Nacional a fim de ratificá-lo em território nacional. Observe que esses tratados estão sujeitos a adequações com o ordenamento jurídico brasileiro, e não são sempre aceitos e promulgados integralmente. Especificamente sobre os tratados de direito tributário, eles devem: 1) ser assinados pelo Presidente da República (CF, art. 84, VII e VIII); 2) passar por referendo do Congresso Nacional, através de decreto legislativo (CF, art. 49, I); 3) pela ratificação que obriga o país no exterior; e, por fim 4) pela internalização do tratado, que acontece com promulgação do Presidente da República (CF, art. 84, IV e VIII). Assim, o ordenamento jurídico brasileiro não consagra a teoria da recepção plena ou direta dos tratados, mesmo os que tratem de direitos humanos, esses tratados podem ter hierarquia de lei constitucional, mas devem passar pelo referendo do Congresso Nacional.
5. A INTEGRAÇÃO REGIONAL E O DIREITO TRIBUTÁRIO. Com a globalização, os Estados passaram a unir-se formando blocos econômicos e/ou comunitários, a exemplo da União Europeia e do Mercosul, caracterizados pelo espaço interestatal comum, com interesses, circunstancias, fatores sócio-políticos, culturais e ambientais convergentes (BORGES, 2009, p. 294). Assim, regulamentar tributos dentro desses fenômenos comunitários é um dos maiores desafios da atualidade. A maior dificuldade é entender que para os mercados comuns devem vigorar o direito comum, e o direito comunitário não se confunde com direito internacional, deriva-se dele, todavia, é regido pelos princípios: a) da livre circulação de pessoas; b) liberdade de circulação de bens, não apenas simples união alfandegária; e c) liberdade de circulação de capitais[65]. Anteriormente, falamos das competências constitucionais para tributar, e percebemos que a
tributação indiscriminada poderá abalar as liberdades fundamentais dos blocos comunitários, daí a necessidade de observar o tratado constitutivo do bloco, os princípios fundamentais e a harmonização das políticas tributárias internas. Os blocos econômicos ou comunitários são um campo próprio para a edição das normas gerais de direito tributário, assim o princípio fundamental do direto tributário internacional é a isonomia tributária, uma vez que o crescimento no mercado, nas importações e exportações depende dele, da mesma forma que dos incentivos fiscais. Todavia, o direito comunitário é, geralmente, regido pela reciprocidade, assim, as isenções, os incentivos fiscais concedidos aos produtos, estão fundados na reciprocidade, conforme o artigo 2º do Tratado de Assunção. A isenção no direito comunitário trata-se de um procedimento com o propósito de evitar a dupla ou pluritributação (BORGES, 2009, p. 315) ou para conseguir competitividade frente à concorrência internacional.
6.
ISENÇÃO
HETERÔNOMA
ATRAVÉS
DE
TRATADOS INTERNACIONAIS. A isenção tributária derivada de tratados internacionais ainda é tema bastante discutido, vez que, ele serviria, dentro do bloco econômico, para evitar a bi ou pluritributação e favorecer a concorrência diante dos valores dos bens e serviços internacionais (SARAIVA FILHO, 2007). O processo de transnacionalização da economia é irreversível, assim como é irreversível o processo de constituição de espaços economicamente integrados (GARCIA JUNIOR, 2005, p. 13). Sendo assim, é inevitável que se diminua tributos ou aja isenção tributária, a fim de incentivar o crescimento dos blocos econômicos ou comunitários. A controvérsia existente é se a União, através de tratados internacionais, poderia isentar ou reduzir tributos estaduais, distritais e municipais, pois os artigos 150 e 151, caput e inciso III veda este fato:
Art. 150 - Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...) § 6º - Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no Art. 155, § 2.º, XII, g. Art. 151 - É vedado à União: III - instituir isenções de tributos da competência dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios.
Entretanto, a maior questão é de que nos artigos supracitados, a União não pode instituir isenção de tributos municipais, então surge a dúvida, como realizar integração econômica nos blocos econômicos, com a necessária harmonização da legislação tributária, se a União não pode representar a República Federativa? Existem doutrinadores que afirmam que a União só poderia isentar tributos dos demais entes da federação, através dos tratados internacionais, se houvesse emenda constitucional que autorizasse
(SARAIVA FILHO, 2007, p. 118). O principal argumento contra a isenção através dos tratados é o fundamento de flagrante usurpação da competência tributária dos mesmos, ofendendo, diretamente, o princípio federativo. Acrescentam ainda que o art. 151, inc. III, proíbe a União de decretar isenções de tributos estaduais e municipais, logo, não está o Presidente da República autorizado a desconsiderar dispositivo constitucional para firmar Tratados veiculares de isenções que só as entidades federativas com competência impositiva poderiam conceder. Deste modo, admitir-se-ia a interferência da União, apenas para tratar dos tributos de competência estadual ou municipal nas taxativas hipóteses previstas na própria Constituição da República, excluindo qualquer análise do artigo 4°, parágrafo único, da Constituição Federal, que afirma que: “A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações.” Ou seja, ignorando a integração econômica que já existe na
comunidade latino-americana. Outros afirmam que poderia haver esta isenção, desde que com prévia autorização dos entes da Federação relacionados com esses atos internacionais, ou seja, se os Estados, Distrito Federal ou Municípios autorizassem. Contudo, a doutrina dominante e já ratificada pelo Supremo Tribunal Federal é que: Essas atribuições e competências e as vedações retro se dirigem às isenções ou a outros benefícios fiscais heterônomos, ou seja, concedidos internamente. Sendo assim, tratados internacionais já podem conceder tais benefícios, sem a necessidade de emenda constitucional, tendo em vista que, quem concede os mesmos é a própria República Federativa do Brasil (SARAIVA FILHO, 2007, p.119).
A Constituição Federal introduziu profundas e estruturais modificações no sistema constitucional, dentre as quais ressalta-se a adoção de princípios especificamente direcionados à proteção da autonomia dos entes federativos. Assim, objetivando exatamente preservar
aquela autonomia, estabeleceu o legislador constituinte, nos incisos I a III do art. 151, limitações constitucionais ao poder de tributar, vedando à União, relativamente aos impostos de competência dos entes federados, que institua, no âmbito de sua competência interna federal, isenções de tributos estaduais ou municipais. Assim os artigos não se aplicam às hipóteses em que a União atua como sujeito de direito na ordem internacional. O âmbito de aplicação do art. 151, da CF, em todos os seus incisos, é o das relações das entidades federadas, entre si, e não tem por objeto a União Federal quando esta se apresenta como a República Federativa do Brasil, na ordem externa. Como afirma Reale (1998, p. 239), a União não é o Estado brasileiro ela é um dos aspectos interno deste Estado. No aspecto internacional, não existem Estados, Municípios, nem União, existe apenas a República Federativa do Brasil, o Estado, pessoa jurídica unitária. Assim, nada impede que o Estado assine tratados internacionais que versem sobre cláusulas de exoneração tributária municipais, uma vez que a
República Federativa do Brasil estará praticando ato legítimo que se inclui na esfera de suas prerrogativas como pessoa jurídica de direito internacional público, que detém a soberania e a personalidade jurídica internacional. Confirmando a teoria acima, o Supremo Tribunal Federal publicou a Súmula n. 575 confirmando a isenção de impostos para mercadorias importadas aos membros signatários do GATT e ALALC. Apesar da súmula ter como referência a Constituição de 1969, não se pode negar que a tendência do STF é seguir a leitura da súmula, ou seja, pela permissão da isenção heterônoma, quando efetuada por intermédio de tratados internacionais. Percebe-se assim que não existe incompatibilidade alguma entre o artigo 151, da Constituição Federal e a possibilidade de isenção de tributos através de tratado internacional ( SILVA, 2002, p. 138.). 7. CONSIDERAÇÕES FINAIS.
Estudou-se que a União é pessoa jurídicapolítica de direito público interno, entidade federativa autônoma em relação aos Estados-membros, Municípios e Distrito Federal, todavia ela não se confunde com a Estado brasileiro, posto que visto internacionalmente, só existe o Estado e não a União, os Estados membros, Municípios e Distrito Federal. Assim, diante do fenômeno da globalização, o mundo percebeu a diminuição das fronteiras, percebeu também que as decisões econômicas e políticas que um Estado tomava afetavam diretamente o outro, fato que impulsionou os processos de integração, seja em acordos bilaterais ou em pactos econômicos sub-regionais. A existência dos blocos de integração, sejam eles econômicos ou comunitários, exigiu ajustes estruturais, para adaptarem-se as exigências e a competição internacional. Os Estados que participam desses processos, criando espaços econômicos integrados, perceberam a necessidade de harmonizar suas legislações em diversos setores, entre eles o tributário, o econômico e o penal.
Esse fato aconteceu porque, em relação a algumas matérias - como a circulação de mercadorias, por exemplo - a competência para regular não pertencem mais exclusivamente a um Estado, mas ao conjunto que participa do mesmo processo de integração. Dentro desses blocos/mercados comuns devem vigorar o direito comum, e o direito comunitário não se confunde com direito internacional, deriva-se dele, todavia, é regido pelos princípios: a) da livre circulação de pessoas; b) liberdade de circulação de bens, não apenas simples união alfandegária; e c) liberdade de circulação de capitais. A maior preocupação nesse campo é a existência de doutrinadores que são contra a isenção de tributos através de tratados internacionais, ignorando o artigo 4°, parágrafo único, da Constituição Federal, que afirma que o Brasil buscará a “integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações.” Deste modo, diante de algumas decisões do
Supremo Tribunal Federal e seguindo a maioria dos doutrinadores, aceita-se plenamente a possibilidade da União isentar tributos estaduais e municipais por intermédio de tratado internacional, sob o fundamento de que, na ordem jurídica internacional, a República Federativa do Brasil é representada pela União, não encontrando, assim, limitação no artigo 151, inciso III, da Constituição da República, uma vez que este artigo trata das isenções entre os entes da federação, no plano interno, e não no plane externo. REFERÊNCIAS. ALEXANDRE, Ricardo. Direito Esquematizado. São Paulo: Método, 2008.
Tributário
BORGES, José Souto Maior. Teoria Geral da Isenção Tributária. São Paulo: Malheiros, 2009. BULOS, Uadi Lammego. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2011.
GARCIA JUNIOR, Armando Alvares. Tributação no Comércio Internacional. São Paulo: Lex Editora, 2005. MEDEIROS, Oriene Dantas de. Mercosul e Estado de Direito Integração Econômica e Solução de controvérsias. Natal/Campina Grande: Edufrn/Eduepb, 2011. REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. 24 ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 239. SARAIVA FILHO, Oswaldo Othon de Pontes. O Direito Internacional e o sistema tributário brasileiro. In: Revista Internacional de Direito Tributário. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. v.7. SILVA, Felipe Ferreira. Tributário: a relação entre a ordem jurídica interna e os tratados internacionais. Curitiba: Juruá, 2002, p. 138.
VALADÃO, Marcos Aurélio Pereira. Uma visão ampliada dos efeitos da globalização no sistema tributário brasileiro. In: Revista de Direito Tributário Internacional.
PANZARINI FILHO, Clóvis. TONANNI, Fernando. BEHRNAT, Marcos Antônio. RIBEIRO, Ricardo Pereira. VASCONCELOS, Roberto Franco de. (organizadores). São Paulo: Quartier Latin, 2009. Ano 4. N° 11.
2ª PARTE ASPECTOS GERAIS DO DIREITO TRIBUTÁRIO COM VIÉS NO DIREITO TRIBUTÁRIO MUNICIPAL.
Capítulo 6 HERMENÊUTICA TRIBUTÁRIA: USO DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS, DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS E DO MÉTODO SISTEMÁTICO DE INTERPRETAÇÃO. Ângelo Boreggio Neto[66]
Ezilda Claudia de Melo Calazans[67]
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS. A partir da matéria enfocada, Hermenêutica Tributária Municipal, pretende-se empreender um estudo sobre a Hermenêutica Jurídica e seus métodos de interpretação; em seguida, verificar a importância da interpretação no Direito Tributário; noutro desdobramento, far-se-á uma análise sobre a necessidade da Reforma Tributária, para, na sequência, demonstrar a importância dos princípios constitucionais e dos direitos fundamentais para a Hermenêutica Tributária; por fim, desagua-se, à luz de ensinamentos constitucionaistributários, no método sistemático de interpretação. Em meio a todas essas questões, faz-se uso de jurisprudências, tanto do Supremo Tribunal Federal, quanto do Superior Tribunal de Justiça, apontando a tendência hermenêutica destes Tribunais, bem como analisando os valores que norteiam as Cortes superiores
do país no que tange a interpretação da norma tributária. 2. HERMENÊUTICA JURÍDICA. Na Antiguidade Clássica, recorria-se a Hermes, o mensageiro dos Deuses, pela busca da verdade escondida. Hermes foi retratado por Homero (no livro "Odisseia") e Hesíodo (na obra "Os trabalhos e os dias") por suas habilidades e considerado benfeitor dos mortais, portador da boa sorte e também das fraudes. Autores clássicos também adornaram o mito com novos acontecimentos. Ésquilo incentivou Hermes a ajudar Orestes na morte de Clitemnestra sob uma identidade falsa e outros estratagemas, e disse também que ele era o deus das buscas, e daqueles que procuram coisas perdidas ou roubadas. Seu atributo característico era a ambiguidade, pois ao mesmo tempo em que era mensageiro dos deuses, era também fiel mensageiro do mundo das trevas. Não é de se estranhar que a palavra "hermenêutica" encontre consentâneos nas palavras "hermeneuein" (interpretar), "hermeneia" (interpretação), "hermeios" (sacerdote do
oráculo de Delfos) e "Hermes" (o mensageiro, na mitologia antiga ocidental). A interpretação que se faz do mundo é uma atividade de compreensão. O jurista deve considerar o ordenamento jurídico dinamicamente, pois a interpretação é que mantém a vida da lei e das outras fontes do Direito. O intérprete é o renovador inteligente e cauto, o sociólogo do Direito. O seu trabalho rejuvenesce e fecunda a fórmula prematuramente decrépita, e atua como elemento integrador e complementar da própria lei escrita. Maximiliano (1999, p.30) preceitua que a atividade do exegeta é uma só, na essência, embora desdobrada em uma infinidade de formas diferentes. Da impossibilidade de se desvincular a interpretação do caso concreto, percebe-se claramente que em toda a interpretação existe criação de Direito. Portanto, a interpretação é uma escolha entre múltiplas opções. O ponto de vista prevalecente ou que decide a questão debatida. Para tudo, há sempre os dois lados. Bastos (1999, p. 112) entende que a aplicação do Direito como uma atividade puramente mecânica de
subsunção do fato à norma jurídica correspondente, implica em admitir que os juízes não passem de meros fantoches manipulados por um ente supostamente dotado de vontade própria: a lei. Essa formulação doutrinária, conhecida como teoria da subsunção, ou enquadramento perfeito da norma ao fato, está baseada na necessidade existente da segurança jurídica, que é o prévio conhecimento das regras que irão dispor às diversas relações que surgem na sociedade. Mesmo que a lei seja incerta, injusta, errônea, para a teoria da subsunção, essa lei deverá ser aplicada, pois assim evita-se que os juízes possam cometer erros, além dos já presentes nas leis humanas. A interpretação de uma lei pode se realizar de vários modos. Pode-se interpretar a lei, quanto: à fonte (a interpretação pode ser autêntica, jurisprudencial e doutrinária), aos meios adequados para sua exegese (gramatical, lógica, histórica, teleológica e sistemática) e aos resultados da exegese (declarativa, extensiva ou restritiva). Não se pode ser nem ser subjetivista, nem
objetivista demais. Nesta perspectiva Ferraz Júnior (2007, p. 295), esclarece que o objetivismo levado ao extremo é o que decide os tribunais. Desloca a responsabilidade do legislador, na elaboração do direito, para os intérpretes. O subjetivismo levado ao extremo favorece ao autoritarismo ao privilegiar a figura do legislador, pondo sua vontade em relevo. Por exemplo, a exigência na época do nazismo de que as normas fossem interpretadas, em última análise, de acordo com a vontade de Hitler é bastante significativa. Quando se diz que interpretar é compreender outra interpretação (a fixada na norma), afirma-se a existência de dois atos doadores de sentido: um que se positiva na norma e outro que procura identificá-lo. Ora, para que possa haver uma interpretação verdadeira, é preciso que ao menos um ato doador de sentido prevaleça (pressuposto dogmático). Como reconhecê-lo e fundá-lo? Está-se, de novo, diante do desafio kelseniano. 3. INTERPRETAÇÃO NO DIREITO TRIBUTÁRIO.
Vislumbra-se que o legislador do Código Tributário Nacional preocupou-se com a forma de interpretação de matéria tributária, visto as peculiaridades da disciplina, e logrou êxito em trazer ao mundo jurídico as próprias normas de hermenêutica do Direito Tributário. Os artigos 107 a 112, assim como o artigo 118, são as normas gerais de Direito Tributário em que o legislador tratou do tema da interpretação tributária. Em que pese a determinação legal, não se atém ao hermeneuta tributário apenas a letra fria da lei, pelo contrário, é necessário que sinta o caso fático e observe a pertinência de cada método de interpretação, conforme a aplicação de casos semelhantes e valores envolvidos, para a construção de uma solução (PAULSEN, 2008, p. 124). Evidente que por se tratar de matéria que regula as relações contribuinte e Estado, as peculiaridades da disciplina se fazem gritar, já que o tratamento não será igual para as relações entre dois particulares ou ainda entre dois entes públicos, denotando, portanto vulnerabilidade do contribuinte. É
claro que não significa ser interpretado diversamente dos outros ramos do direito, todavia, a interpretação será pautada pelas especialidades da matéria tributária. No ramo do direito tributário, há que atentar o hermeneuta para não confundir princípio com conceitos jurídicos e não jurídicos, como por exemplo, econômicos e financeiros, posto que são imprestáveis no plano jurídico (BECKER, 2007, p. 337). Com isso, o arcabouço principiológico tributário deve ser respeitado e levado sempre em consideração no ato hermenêutico, observando então os princípios da legalidade, anterioridade, capacidade contributiva, isonomia, uniformidade geográfica, irretroatividade de lei tributária, vedação do confisco e liberdade de tráfego. É notório que o objetivo do direito tributário é a regulamentação de tributos, que tem por finalidade essencial a manutenção dos cofres públicos, no sentido de dar condições financeiras ao Estado de praticar a gestão pública, com ênfase em atender as necessidades sociais. Contudo, necessário observar e equalizar o direito do
contribuinte em sua propriedade privada e a observância dos princípios supramencionados. Nesse sentido, Ataliba (2002, p. 127) expressa, de modo preciso, que as diversas situações préjurídicas trazem, apesar de não justificar, situações das mais diversas, que produzem decisões disparatadas de nossos Tribunais. Portanto, o que se busca na interpretação tributária é a justeza da decisão, a humanização da norma, a aproximação da letra fria da Constituição ao calor da sociedade. Isso porque, em determinados casos, ocorrem divergências de pensamentos direcionando para soluções diversas. Isso porque, o valor do direito é a justiça, cuja essência vai muito além da mera matemática ou simples ações humanas, e sim como a junção efetiva desses atos, proporcionando, assim, o bem comum (REALE, 2000, p. 272). Ainda, não se pode desprezar no ato hermeneuta a tradição do intérprete, seus conceitos e preconceitos, pois seus valores influenciam
indubitavelmente sua compreensão, assim como não se pode fechar os olhos para a dimensão histórica do processo, sendo assim utópica a atividade axiologia neutra (PIMENTA, 2005, p. 184-185). Uma boa proposta de solução a tal impasse hermeneuta é a participação social de modo mais constante nas decisões polêmicas, como o convite mais constante ao amicus curiae, representando a vontade de parte da população e seus argumentos, de modo que possa ser analisado e levado em consideração pelo interprete. 4. REFORMA TRIBUTÁRIA E HERMENÊUTICA. É notório que o arcabouço jurisprudencial da Suprema Corte Brasileira, após a nova ordem jurídica humanística apresentada pela Constituição de 1988, bem como pela sucessiva alteração no corpo humano do órgão, denota a evidente alteração nos padrões sociais, bem como a aproximação do direito ao calor popular. Neste contexto, é imperioso asseverar que o Direito Tributário carece de profundas reformas desde há
muito, e o que existe são apenas projetos infindáveis que nunca conseguiram ser aprovados, talvez até por falta de vontade política, ou por não existir consenso, ou ainda pela ausência de oportunidade e conveniência. Independente da razão fundante, o fato é que a ausência de reforma na estrutura da lei tributária deixa à hermenêutica dos julgadores superiores aplicar a principiologia constitucional, de modo a melhor proteger o contribuinte. Importante asseverar que o hermeneuta deve ter a sensibilidade de observar a norma interpretada com uma postura de dinamismo, já que a renovação e interação se faz patente na mesma, em razão da mutação dos acontecimentos sociais. (MELO, 2008, p. 228). Ocorre que, em diversas ocasiões, verifica-se que não recebem a melhor interpretação por parte do STF, por tal razão é imperiosa uma releitura das normas tributárias, de modo a alargar a sua aplicação em razão da importância de uma proteção mais forte ao contribuinte. 5. PRINCÍPIO DA UNIDADE DA CONSTITUIÇÃO E
DA PROPORCIONALIDADE. Sobre o princípio da unidade da constituição Canotilho (1998, p.1097) preceitua: [...] o princípio da unidade da constituição ganha relevo autônomo como princípio interpretativo quando com ele se quer significar que a constituição deve ser interpretada de forma a evitar contradições (antinomias, antagonismos) entre as suas normas. Como ponto de orientação, guia de discussão e fator hermenêutico de decisão, o princípio da unidade obriga a considerar a constituição na sua globalidade e a procurar harmonizar os espaços de tensão existentes entre as normas constitucionais a concretizar (...). Daí que o intérprete deva sempre considerar as normas constitucionais não como normas isoladas e dispersas, mas sim como preceitos integrados num sistema interno unitário de normas e princípios.
Portanto, diante do princípio da unidade da constituição, percebe-se que é um moderno princípio de interpretação constitucional. O princípio da proporcionalidade, por sua vez, é o grande propulsor da hermenêutica constitucional aplicada nas decisões recentes do Supremo Tribunal Federal. Em matéria tributária, o STF pauta-se pela organização de suas decisões sempre fundadas na
principiologia constitucional, não apenas nos princípios específicos tributários como legalidade, anterioridade, capacidade contributiva, irretroatividade, mas também e de modo enfático, os princípios gerais como razoabilidade, proporcionalidade e segurança jurídica. Neste viés, é sempre importante lembrar que segurança jurídica é a alma do próprio direito, fundamenta-se nos ideais de igualdade e certeza, bem como deriva do estado democrático de direito (ATALIBA, 1985, p. 145 a 155). A aplicação do princípio da proporcionalidade em aplicação da norma tributária traz a ideia de compor os conflitos de interesses sociais com a observância dos meios adequados e não lesivos sobremaneira a uma das partes. O Estado que figura na lide exacional como parte autora, deve utilizar de meios comedidos e legais no ato da cobrança de tributos, por outro lado, a lei deve ser interpretada de modo que garanta ao contribuinte não ser vilipendiado em seu direito de propriedade e dignidade. Assim, o princípio da proporcionalidade,
enquanto instrumento de hermenêutica, visa solucionar a lide, reverenciando mais um dos princípios gerais, buscando desobedecer o menos possível dos demais, harmonizando com isso os princípios constitucionais em conflito, em nome da paz social. A aplicação da proporcionalidade em matéria tributária tem ainda que observar as questões que se referem à dicotomia, interesses públicos versus interesses privados. Durante muito tempo, toda a doutrina brasileira foi uníssona em afirmar a supremacia do interesse público sobre o interesse privado. Modernamente, vozes dissonantes dão mostra de que o princípio da supremacia do interesse público sobre o particular tem que ser reanalisado, tendo como base os direitos fundamentais. Um paradigma, portanto, questionável. Sarmento (2005, p. 97) acha difícil pensar numa limitação mais vaga e indeterminada aos direitos fundamentais do que a proteção do interesse público. Segundo o mesmo autor (2005, p. 99), a supremacia elimina qualquer possibilidade de sopesamento, premiando de antemão o interesse público
envolvido, e impondo o consequente sacrifício do interesse privado contraposto. Portanto, totalmente incompatível com o princípio da hermenêutica constitucional, que obriga o intérprete a buscar, em casos de conflitos, solução jurídica que harmonize, na medida do possível, os bens jurídicos constitucionalmente protegidos, sem optar pela realização integral de um, em prejuízo do outro. Sendo assim, a supremacia do interesse público sobre o privado está em total descompasso com a ordem constitucional brasileira. Portanto, o que fazer? Uma possível solução já foi proposta por Sarmento (2005, p. 101) ao afirmar que se deve procurar uma solução racional e equilibrada entre o interesse público e privado implicados no caso. E, ao invés de uma supremacia a priori e absoluta do interesse público sobre o particular, ter-se-ia apenas uma regra de precedência prima facie. Do contrário, fragiliza-se demais os direitos fundamentais, que não são dádivas do poder público, mas a projeção normativa de valores morais superiores ao próprio Estado. Sendo assim, fica evidente que os direitos fundamentais despotam com absoluto destaque e
centralidade no atual Estado Democrático de Direito. Como bem assevera Costa (2009, p. 59-60), a aplicação do princípio da proporcionalidade tem como objetivo a harmonia entre a arrecadação fiscal e a pontual observância dos princípios constitucionais tributários, representando os direitos dos contribuintes. Desta feita, a proporcionalidade traz uma nova visão de hermeneuta, solucionando conforme os direitos humanos os conflitos capciosos enfrentados em tribunais espalhados pelo país, com ênfase nas questões tributárias, que tradicionalmente eram julgadas pelo poderio Estatal. Mister ressaltar que o princípio da proporcionalidade é princípio fundamental em nosso ordenamento jurídico aplicável a todas as áreas, apontado como divisor de águas no direito moderno. Nota-se que o juiz, ao aplicar a norma tributária constitucional, deverá verificar o reflexo social da mesma a ser atingida e observando o interesse coletivo (COSTA, 2009, p. 157). É sempre possível aplicá-lo de modo paralelo
com outro especial princípio que é o da razoabilidade. Tal princípio visa evitar ações arbitrárias, assim socialmente inaceitáveis. É de importância extrema em face da validade das medidas do estado que ferem exercício de direitos individuais. (PONTES, 2000, p. 78 a 80). Sua aplicação conjunta na hermenêutica de normas tributárias propicia o ideal do estado democrático de direito, com ótica social, respeitados os direitos individuais, coletivos e difusos. 6. HERMENÊUTICA TRIBUTÁRIA E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS. O processo de alteração, no “pensar” o direito, teve como marco histórico basilar a necessidade da observância dos direitos e garantias fundamentais, previstos no artigo 5º da Constituição Federal como o centro de qualquer discussão jurídica no país, assim, a constitucionalização do direito é irreversível. Nessa vereda, o princípio-mãe da Constituição Federal de 1988, que revolucionou a ordem
jurídica definitivamente no Brasil, especialmente no que tange a hermenêutica, é o princípio da dignidade humana. Com esta nova diretriz, os tribunais, especialmente os superiores, passaram a pautar suas decisões na essência desse princípio, resvalando em todos os ramos do direito, portanto também no direito tributário. Nesse ínterim, imperioso destacar que o Supremo Tribunal Federal possui várias decisões com inclinação a equiparar os princípios tributários a direitos fundamentais. Dentre as decisões, destaca-se a ADI 9397/DF, que imputa ao princípio constitucional da anterioridade, a força intransponível de cláusula pétrea, e com isso apenas permitindo sua modificação com a própria revogação da Constituição como um todo, já que vivemos em um sistema rígido de modificações do texto constitucional: [...] 2. A Emenda Constitucional n. 3, de 17.03.1993, que, no art. 2º, autorizou a União a instituir o I.P.M.F., incidiu em vício de inconstitucionalidade, ao dispor, no parágrafo 2° desse dispositivo, que, quanto a tal tributo, não se aplica "o art. 150, III, b e VI", da Constituição, porque, desse
modo, violou os seguintes princípios e normas imutáveis (somente eles, não outros): 1. - o princípio da anterioridade, que e garantia individual do contribuinte (art. 5º, art. 60, §4°, inciso IV e art. 150, III, “b” da Constituição); 2. - o princípio da imunidade tributária recíproca (que veda a União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios a instituição de impostos sobre o patrimônio, rendas ou serviços uns dos outros) e que e garantia da Federação (art. 60, par.4., inciso I,e art. 150, VI, a, da C.F.);
Tal entendimento amplia o rol do artigo 60, §4º, da CF/88, todavia percebe-se o ideal da hermenêutica do STF, pois a realidade é que os princípios constitucionais tributários, apesar de não estarem expressos como cláusulas pétreas, em sua essência protegem sempre algum elemento pétreo, assim sua revogação enfraqueceria o direito protegido pelo manto pétreo. No caso em debate, verifica-se que o princípio da anterioridade visa proteger o contribuinte da fúria arrecadatória fiscal, especialmente concedendo ao contribuinte o mínimo de aviso antecedente pela criação ou majoração de carga tributária, com isso o princípio da segurança jurídica, ou da não-surpresa, está veladamente
assegurado. Conforme abalizada posição de Carrazza (apud MARTINS, 2006, p.111) por trás do simples princípio da anterioridade, encontramos a noção de segurança jurídica, evitando que, do dia para a noite, o contribuinte seja surpreendido por mais uma exigência fiscal, sem tempo hábil de preparação Quanto à evolução da hermenêutica tributária no órgão máximo do judiciário brasileiro é patente. Outra situação que o STF demonstrou está atento à principiologia fundamental da Constituição, foi no caso do processo administrativo fiscal, em que sempre foi obrigatório no Brasil o pagamento de 30% para a admissibilidade de recurso administrativo. Tal entendimento, em razão da repetição da administração, transformou-se na Súmula Vinculante nº 21, in verbis: “É inconstitucional a exigência de depósito ou arrolamento prévios de dinheiro ou bens para admissibilidade de recurso administrativo”. Ocorre que o constituinte traz como direito fundamental claro, o direito de petição, o livre acesso ao judiciário e o duplo grau de jurisdição. Ainda, a
Constituição Federal de 1988 equipara o processo judicial ao processo administrativo, aplicando a ambos a mesma base principiológica. Portanto, a exigência de 30% do valor para ingressar com recurso administrativo, segundo a hermenêutica do STF, fere o direito de petição, o livre acesso à justiça e impede o duplo grau de jurisdição, declarando a Suprema Corte a inconstitucionalidade da referida cobrança. Nesta seara, tantas outras decisões superiores de importância, que deixamos para discutir em outros trabalhos, porém necessário aceitar que precisamos avançar muito ainda, especialmente para o direito alcançar a evolução social.
7. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO.
NO
Neste último ponto do artigo usa-se o método de interpretação sistemático como forma de demonstrar a
importância da interpretação constitucional para o direito tributário. O texto constitucional que se faz interpretação é o art.151, III: “é vedado à União instituir isenções de tributos da competência dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios”. Doutrinariamente, encontra-se, por exemplo, em Coelho (1999, p. 548), uma análise interpretativa sobre o art. 151, III, CF, no sentido de esclarecer que o Constituinte de 1988 não está limitando à competência do Estado brasileiro, para concluir acordos tributários que envolvam gravames estaduais e municipais, mas apenas proibindo, na ordem jurídica interna, a isenção heterônoma e ditatorial que já existiu na Constituição de 1967. Jurisprudencialmente, trazemos julgado do Superior Tribunal de Justiça, oriundo do Recurso Especial nº 90.781-PE, com o seguinte posicionamento: Tributário. Isenção. ICMS. Tratado Internacional. 1. O sistema tributário instituído pela CF/88 vedou a União Federal de conceder isenção a tributos de competência dos Estados, do Distrito Federal e Municípios (art. 151, III). 2. Em consequência, não pode a União firmar
tratados internacionais isentando o ICMS de determinados fatos geradores, se inexiste lei estadual em tal sentido. 3. A amplitude da competência outorgada à União para celebrar tratados sofre os limites impostos pela própria Carta Magna. 4. O art. 98, do CTN, há de ser interpretado com base no panorama jurídico imposto pelo novo Sistema Tributário Nacional. 5. Recurso Especial improvido. (DOU 20/10/97, p.52.977, rel. Min. José Delgado).
Portanto, percebe-se que há um entrechoque de interpretações, sejam doutrinárias ou jurisprudenciais, privilegiando a importância de dispositivos constitucionais sempre em detrimento de outros mandamentos também de natureza constitucional. Se, de um lado, há a possibilidade de a União conceder isenções heterônomas pela via dos tratados, baseando-se na disposição contida no artigo 21, inciso I. Por outro, é também juridicamente defensável a ideia de que a vedação imposta à União aplica-se a situações indistintas, portanto tanto internamente, quanto externamente, ou seja, tanto na ótica nacional, quanto na internacional. Na tentativa de resolver as antinomias, a questão deve ser enfocada sob o aspecto material da competência outorgada às entidades componentes do
Sistema Federativo brasileiro. Posto isto, sem ser de outra forma, no aspecto material da competência atribuída pelo inciso I, do artigo 21, tem-se que a vedação imposta pela letra da Constituição, no artigo ora analisado, ocorre no sentido de proibir que seja instituída norma isentiva de tributos estaduais ou municipais pela União. E assim sendo, afasta-se possíveis antinomias surgidas da interpretação/aplicação das normas constitucionais. Reforça-se, neste sentido, a corrente hermenêutica que considera que a União pode veicular isenção de tributos estaduais e municipais através de tratados, porém, considerando como indispensável a participação dos demais entes federados. Sendo assim, está-se diante de um estudo hermenêutico tributário que faz vir a lume o método de interpretação sistemático como forma de dirimir a questão. A decidibilidade é uma necessidade no Direito e os métodos de interpretação são necessários na interpretação tributária, juntamente com o uso da doutrina, da jurisprudência e dos princípios gerais do Direito.
8. CONSIDERAÇÕES FINAIS. A Hermenêutica Tributária deve ter por base a Constituição Federal e seus princípios, seja quanto a tributos federais, estaduais, distritais ou municipais. A iluminação da essência do Estado Democrático de Direito e a preocupação com a evolução do padrão de pensamento da sociedade também são nortes interpretativos fundamentais. Diante do explanado, insta frisar que se defende o uso do pluralismo metodológico, da hermenêutica constitucional, da tópica, da retórica e da jurisprudência dos valores, que são hodiernamente fundamentais para a doutrina do Direito Tributário Nacional, contrariamente ao estrito positivismo jurídico na Hermenêutica Jurídica. A importância do Direito reside no objetivo maior da lei, que é buscar o justo. A partir dessas colocações, parte-se para constatações importantes: inexiste uma Hermenêutica Tributária, como ramo autônomo da Hermenêutica Jurídica, e neste sentido,
inexiste também uma Hermenêutica Tributária Municipal; e na resolução dos casos que envolvem Tributos Municipais é essencial que se faça uso da mais moderna Hermenêutica Constitucional. Desta forma, surge no âmbito jurídico a plena necessidade da aplicação dos princípios constitucionais da razoabilidade, proporcionalidade, bem como dos direitos fundamentais como ponto de partida da Hermenêutica Tributária, que surge como tendência de interpretação do STF. Isso porque busca a Corte Suprema Brasileira humanizar a letra fria da lei tributária, concedendo na interpretação da mesma, um caráter social, ainda que seja em seu reflexo. A interpretação da lei tributária pelos tribunais superiores, sob a ótica dos direitos fundamentais, também ocorre pela busca da plenitude do Estado Democrático de Direito, conquistado apenas com o respeito a integridade principiológica e axiológica da Constituição. Ainda, a necessidade da Reforma Tributária se faz presente para atualizar a legislação, com vistas aos
anseios sociais e ao impacto da legislação tributária na sociedade, tendo como norte o arcabouço jurisprudencial superior. REFERÊNCIAS. ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008. ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária. São Paulo: Malheiros editores. 2002. ______________ República e Constituição. São Paulo: Malheiros editores. 1985. ÁVILA, Humberto Bergmann. Repensando o “princípio da supremacia do interesse público sobre o particular”. In: Sarmento, Daniel (org). Interesses públicos versus interesses privados: desconstruindo o princípio de supremacia do interesse público. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005.
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Capítulo 7 ENSAIO SOBRE A HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA. Arthur Cesar de Moura Pereira[68] 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS. O presente capítulo aborda a Hipótese de Incidência Tributária, tema essencial para a compreensão da fenomenologia da incidência tributária. Com efeito, a análise dos tributos municipais em espécie – IPTU, ISSQN, ITBI e COSIP – atinge a profundidade desejada apenas a partir do estudo daquela teoria. Como o título do capítulo deixa entrever, trata-se de abordagem preliminar, sem qualquer outra pretensão que não a de introduzir o tema como subsídio para o exame dos tributos municipais. Continua indispensável, hoje e sempre, consultar a fonte primária desse assunto, a lapidar obra Hipótese de Incidência
Tributária[69]. 2. NORMAS TRIBUTÁRIAS. O Direito Tributário Positivo, como de resto ocorre com os demais ramos do Direito, é formado por um conjunto de regras postas pelo Estado. Umas das muitas singularidades da estrutura tributária brasileira é que aquelas regras são veiculadas por meio de todas as formas que compõem, da base ao cume, a pirâmide normativa de Kelsen. Há regras tributárias estampadas na Constituição Federal, em leis complementares, em leis ordinárias, em medidas provisórias que teimam em permanecer em vigor, e numa miríade de atos infralegais (decretos, portarias, instruções normativas, pareceres). Some-se à ânsia legislativa o espaço, cada mais relevante, ocupado pelas decisões judiciais em matéria tributária emitidas por diversos Tribunais e Cortes espalhados pelo país, e o que se tem é um universo de regras que, como o Universo em si, continua se expandindo.
Cabe ao exegeta extrair, do inconstante e mutável emaranhado de regras esculpidas em diversos diplomas e editados por diferentes fontes, as normas tributárias, aqui entendidas como comandos normativos que impõem obrigações, estruturas, sanções e procedimentos na seara tributária. Muitas são as classificações das normas tributárias, sempre ao gosto de cada autor. Para os limitados efeitos deste capítulo, as seguintes categorias podem ser exemplificadas: 1. normas estruturais: destinam-se a instituir os órgãos administrativos tributários. Um bom exemplo é a Lei 11.457/2007, que criou a chamada Super Receita Federal, fazendo com que o Fisco Federal absorvesse as funções de fiscalização e lançamento de contribuições previdenciárias antes a cargo do INSS; 2. normas procedimentais: cuidam do rito, da realização de atos sucessivos e logicamente encadeados com vistas a atingir a finalidade tributária. Aqui se encontram as
normas que tratam do processo administrativo fiscal e, verbi gratia, da execução fiscal; 3. normas que tratam de obrigações acessórias: são aquelas que estatuem comandos não diretamente relacionados ao dever fundamental de pagar tributos, traduzido na obrigação principal. Entre elas se incluem as normas que prevêem obrigação de prestar informações ao Fisco e de declarar, a tempo e a modo, a ocorrência do fato gerador. São deveres instrumentais voltados a permitir a fiscalização por parte da Administração Tributária[70]; 4. normas impositivas: são aquelas efetivamente relacionadas à Hipótese de Incidência Tributária, pois descrevem in abstracto o fato gerador e relacionam sua ocorrência aos aspectos fundamentais para a fenomenologia da incidência tributária: aspecto material, aspecto subjetivo, aspecto temporal, aspecto espacial e aspecto quantitativo;
5. normas isentivas e de imunidade: são normas que afastam a incidência das normas impositivas (no caso das imunidades) ou impedem os efeitos da incidência (no caso da isenção); 6. normas indutoras: são aquelas que estimulam o contribuinte a tomar determinadas atitudes desejadas pela administração tributária. Assim se dá com as normas que oferecem redução na multa e nos juros para pagamento à vista de tributos. 7. Importa abordar as normas impositivas, já que é nelas que se visualiza em toda a sua pujança a teoria da Hipótese de Incidência Tributária. Uma boa forma de analisar a estrutura da norma tributária impositiva é enxergá-la dentro da estrutura mencionada por Miguel Reale (1998), in verbis: Alguns autores, sob a influência de Hans Kelsen, que efetivamente trouxe uma preciosa contribuição ao esclarecimento do assunto, começam por dizer que a norma jurídica é sempre redutível a um juízo ou proposição
hipotética, na qual se prevê um fato (F) ao qual se liga uma conseqüência (C), de conformidade com o seguinte esquema: Se F é, deve ser C. [...] Segundo essa concepção, toda regra de direito contém a previsão genérica de um fato, com a indicação de que, toda vez que um comportamento corresponder a esse enunciado, deverá advir uma conseqüência [...].
O próprio autor ressalva a inadequação daquele modelo para “normas de organização, às dirigidas aos órgãos do Estado ou às que fixam atribuições, na ordem pública ou privada” (REALE, 1998, p. 94). Com efeito, a proposição hipotética que relaciona um fato a uma consequência jurídica não tem aplicação no caso das normas estruturais ou procedimentais; eventualmente explica a incidência de normas indutoras ou isentivas; mas encaixa à perfeição no modelo de Hipótese de Incidência Tributária que se pretende abordar. 3. A HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA E O FATO GERADOR. Com efeito, a ocorrência in concreto da
tributação depende da verificação, no mundo fenomênico, da Hipótese de Incidência Tributária. Vale dizer: o tributo será devido se a situação complexa prevista in abstracto pela lei tributária acontecer de fato. Dá-se coisa semelhante na seara penal. A previsão hipotética do art. 121 do Código Penal não autoriza o exercício, pelo Estado, do ius puniendi senão após ocorrido o homicídio. Assim é que a União não pode cobrar imposto de renda antes de verificado o acréscimo patrimonial. Ainda socorrendo-se do direito penal, a imposição da pena cominada pelo art. 121 depende da presença de inúmeros fatores, elementares e circunstanciais. Para imposição do tributo, a Hipótese de Incidência Tributária abstratamente prevista na lei tributária precisa se materializar em todos os seus cinco aspectos: material, espacial, temporal, subjetivo e quantitativo. Continuando no campo das analogias com o direito penal, da regra esculpida no art. 121 é possível extrair a seguinte norma: é proibido cometer homicídio; quem o cometer se sujeita a pena entre seis e vinte anos. As normas tributárias impositivas seguem esquema
semelhante: há um antecedente (os aspectos material, espacial e temporal) e um consequente (os aspectos subjetivo e quantitativo). O princípio da legalidade estrita exige que toda a Hipótese de Incidência Tributária esteja minuciosamente prevista em lei. O tipo tributário[71], portanto, deve conter[72] todos os cinco aspectos da Hipótese de Incidência Tributária, embora não necessariamente no mesmo artigo, não sendo incomum algum esforço hermenêutico para localizar, no texto legal, todos aqueles aspectos. O essencial é que a lei que institui determinado tributo contenha regras que permitam a identificação dos aspectos material, espacial, temporal, subjetivo e quantitativo, a fim de que possa haver subsunção do fato à Hipótese de Incidência Tributária, sem a qual não há que se falar em obrigação tributária principal. Antes de abordar cada um dos aspectos da Hipótese de Incidência Tributária, convém esclarecer a distinção entre Hipótese de Incidência Tributária e fato gerador, expressão utilizada pelo próprio Código
Tributário Nacional (CTN) e consagrada pelo reiterado uso, embora muito desagrade à parte da doutrina. Bastante esclarecedor, a respeito, é o escólio de Eduardo Marcial Ferreira Jardim (2007, p. 242-243): Entrementes, a terminologia ‘fato gerador’ recebeu reiteradas críticas de nossa melhor doutrina. Alfredo Augusto Becker alinhou-se entre os primeiros a denunciar a vaguidade da expressão. Para tanto, demonstrou que a nomenclatura indica, a um só tempo, a descrição legislativa de um fato e a ocorrência do próprio fato no plano da realidade física. Contundente e incisivo, Becker ironizou a denominação questionada, ao dizer que o fato gerador não gera nada, a não ser confusão.
No mesmo rumo, Souto Maior, Geraldo Ataliba e Paulo de Barros Carvalho, dentre outros, teceram veementes críticas àquela esquipática construção terminológica. O mau vezo do enunciado ‘fato gerador’, calha notar, não se exaure em sua duplicidade semântica, pois o nosso direito positivo o emprega, por vezes, com o significado de critério temporal da norma tributária, como bem grifa Paulo de Barros Carvalho. É o caso, por exemplo, do art.46, II, do Código Tributário Nacional, ao
dispor que o IPI tem como fato gerador, dentre outras situações, a saída do produto do estabelecimento industrial. Por tais motivos, a boa doutrina retrocitada gizou que seria mister o estabelecimento de uma distinção entre a descrição abstrata de um fato e a concretização do próprio fato no mundo fenomênico. De conseguinte, os cultores da ciência jurídica adotaram a designação ‘hipótese de incidência’ ou ‘hipótese tributária’ para aludir à descrição legislativa de um comportamento, enquanto, de outra parte, pronunciaram-se pela dicção ‘fato jurídico tributário’ ou ‘fato imponível’ ou ainda ‘hipótese de incidência realizada’ para efeito de indicar a verificação do fato no mundo físico.” Conquanto as expressões fato jurídico tributário e fato imponível ostentem maior rigor científico, a práxis forense e a jurisprudência jamais abandonaram o termo fato gerador. Em todo caso, independentemente de debates terminológicos, o fundamental é distinguir o fato gerador (ou imponível) da Hipótese de Incidência Tributária.
Deveras, enquanto a Hipótese de Incidência Tributária encontra-se no plano abstrato da previsão legislativa, utiliza-se a expressão que designa fato gerador para o acontecimento (que pode ser um fato isolado, singular, como uma compra e venda de imóvel urbano, cuja ocorrência pode ensejar a incidência do ITBI; ou complexivo, isto é, formado por diversos fatos, como se dá no Imposto de Renda), no plano concreto, que se amolda à proposição abstratamente prevista na norma impositiva. Assim, doutrina Kiyoshi Harada (2010, p. 478): “O importante é ter sempre em mente a existência de duas realidades distintas: uma descrevendo a situação em que é devido o tributo e outra referente à concretização daquela situação descrita na lei, que gera a obrigação tributária. ” 4. ASPECTOS DA HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA. Na concisa lição de Vittorio Cassone (2007, p. 144), podem-se definir os cinco aspectos da Hipótese
de Incidência Tributária da seguinte maneira: 1. Pessoal – é composto pelo Sujeito Ativo (o credor da obrigação tributária: União, Estado, Distrito Federal ou Município) e Sujeito Passivo (o devedor da obrigação tributária). O CTN/66 faz expressa referência a esses dois sujeitos; 2. Temporal – determina o exato momento em que se considera ocorrido o fato gerador. Por exemplo, a legislação tributária diz que é fato gerador do ICMS a saída da mercadoria do estabelecimento comercial. Logo, o exato momento da saída é o aspecto temporal do fato gerador tributário. É o momento que o legislador escolheu para fazer nascer a obrigação tributária, momento em que se estabeleceu o vínculo jurídico entre o sujeito ativo e o sujeito passivo; 3. Espacial – indica o lugar em que terá que ocorrer o fato gerador, que deverá situar-se dentro dos limites territoriais
a que a Pessoa Política tem a competência tributária. Por exemplo, se for tributo da União, o elemento espacial, isto é, o local onde terá que ocorrer o fato gerador, será todo o território nacional. Se for tributo dos Estados, o fato gerador deverá ocorrer no território do Estado. Se for tributo municipal, o fato gerador deverá ocorrer nos limites do território do Município. Por exemplo, a prefeitura de São Paulo só poderá exigir ISS quando o serviço for prestado dentro dos limites de seu território, aspecto ligado ao Princípio da Territorialidade tributária; 4. Material – consiste na descrição que a lei faz do núcleo da HI. É o aspecto mais importante, pois determina o tipo tributário, e é comumente representado por um verbo e complemento. Exemplo: industrializar produtos, auferir rendas, exportar produtos nacionais, importar produtos estrangeiros, prestar serviços etc. É
aspecto constitucional; 5. Quantificativo – se divide em Base de cálculo e Alíquota. Base de cálculo é a expressão de grandeza do aspecto material da HI escolhida pela lei dentre aquelas inerentes ao fato gerador, sobre a qual incidirá a alíquota. Deve ser estabelecida pela lei, pois não terá nenhum efeito se estabelecida pelo Decreto sem base legal. Alíquota é uma percentagem que incide sobre a base de cálculo para determinação do montante do tributo e que também está sujeita ao princípio da estrita legalidade tributária. Fixadas as devidas premissas, passa-se à abordagem dos aspectos da Hipótese de Incidência Tributária. 4.1 Aspecto Material. Conforme já mencionado acima, citando Vittorio Cassone (2007), o aspecto material é o núcleo da
Hipótese de Incidência Tributária, em torno do qual gravitam os demais aspectos. É a descrição da conduta relacionada ao fato gerador. O aspecto material das Hipóteses de Incidência Tributária do IPTU, do ISS e do ITBI estão previstas na própria Constituição Federal de 1988: Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: I - propriedade predial e territorial urbana; II - transmissão "inter vivos", a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição; III - serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar.
Dito de outra forma: 1. ser proprietário de imóvel urbano, corresponde ao aspecto material do IPTU; 2. a realização de negócio jurídico oneroso entre pessoas, que importe na transmissão da propriedade de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos
reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição, representa o aspecto material do ITBI. Observese que, no IPTU, o aspecto material é ser proprietário; no ITBI, por seu turno, é adquirir a propriedade. Ou seja, o ITBI incide apenas quando da aquisição; já o IPTU deverá incidir enquanto perdurar a situação de proprietário; 3. a prestação de serviços, excluídos aqueles pertinentes ao ICMS[73], corresponde ao aspecto material do ISS. Atente-se que as três situações descritas na Constituição Federal apresentam condutas não relacionadas a qualquer atuação do Estado, característica própria dos impostos. Situação diversa ocorre com a taxa de lixo: o aspecto material daquele tributo está diretamente relacionado a uma prestação realizada pelo Poder Público municipal[74]. Percebe-se, portanto, que a análise do aspecto material facilita a identificação da espécie do tributo[75].
4.2 Aspecto Espacial. Como visto, o aspecto material é aquele que descreve a conduta ou estado do sujeito, na feliz definição de Regina Helena Costa (2009, p. 187). Continua a ilustre autora afirmando que “Essa conduta ou estado há de ocorrer em determinado lugar. Daí o aspecto espacial, territorial ou geográfico, indicativo do local onde se considera ocorrido o nascimento da obrigação tributária”. A importância da fixação do local, onde ocorrido o aspecto material, decorre da necessidade de determinar o sujeito ativo do aspecto subjetivo, ou seja, quem tem a competência para cobrar o tributo decorrente do surgimento da obrigação tributária. Assim, a localização do imóvel, se em área urbana ou em área rural, define se é o município ou a União o ente responsável pela tributação do IPTU, no primeiro caso, e do ITR, no segundo. Para o ISS, o aspecto espacial avulta em importância, pois “o serviço considera-se prestado e o imposto devido no local do estabelecimento prestador ou,
na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador, exceto nas hipóteses previstas nos incisos I a XXII”, nos termos da Lei Complementar 116/2003. 4.3 Aspecto Temporal. 39.
O aspecto temporal define o momento
exato da consumação do fato gerador do tributo, que é o exato instante em que ocorrido, no mundo dos fatos, a conduta prevista pela Hipótese de Incidência Tributária[76]. A importância em se fixar aquele instante reside, entre outros fatores, em possibilitar: (i) definir a legislação aplicável à obrigação tributária[77]. Com efeito, se determinada materialidade ocorreu em 25 de janeiro de 2012, a legislação então vigente será a aplicável à obrigação tributária surgida naquele momento, ainda que lei posterior a modifique[78], conforme o art. 144 do CTN. Os arts. 116 e 117 daquele
diploma estabelecem critérios para definição do aspecto temporal; (ii) ii. a demarcação do início do prazo prescricional para homologação do lançamento (CTN, art. 150, §4º). Para o ITBI, o aspecto temporal se identifica com o momento da transmissão inter vivos do bem imóvel. No caso do ISS, o aspecto temporal é o momento da prestação do serviço, sendo certo que, como adverte Barreto (2009, p. 337), “o nosso sistema tributário não tolera a exigência de tributo antes da ocorrência do fato gerador. Normas legais que prevejam a incidência do ISS antes de concretizada a prestação de serviços são inválidas”. 4.4 Aspecto Pessoal[79]. Definidos os aspectos materiais (que fato?), espacial (onde ocorreu?) e temporal (quando ocorreu?), cumpre agora examinar quem deve cobrar e quem deve pagar o tributo devido. Deveras, o aspecto pessoal ou
subjetivo se desdobra em sujeito ativo e sujeito passivo. O sujeito ativo da Hipótese de Incidência Tributária traduz o ente público com capacidade tributária ativa para realizar a fiscalização e cobrança da exação[80]. Como regra, o ente tributante competente para a instituição do tributo detém a capacidade tributária para sua fiscalização e arrecadação. Há exceções, a mais relevante delas, na seara do direito tributário municipal, diz com o ITR. Segundo a Norma Ápice, em seu art. 153, §4º, inc. III, o ITR “será fiscalizado e cobrado pelos Municípios que assim optarem, na forma da lei[81], desde que não implique redução do imposto ou qualquer outra forma de renúncia fiscal”. Seria um caso de parafiscalidade: há um ente tributante competente para instituição do tributo, porém outro pessoa jurídica, diversa da primeira, é responsável pela cobrança, arrecadação e administração dos valores envolvidos. Não há incidência do fenômeno da parafiscalidade nos casos do IPTU, do ITBI, do ISS e da COSIP: o município em que verificado o aspecto espacial será o sujeito ativo da relação tributária. Completa Aires
Barreto (2009, p. 132.): [...] o conceito normativo só pode ser veiculado por lei do ente constitucional competente, flui, naturalmente, o sujeito ativo, seja em relação ao aspecto pessoal, abstratamente considerado, seja no pertinente à concreção de fato previsto na hipótese tributária.
O aspecto pessoal ativo, para todos os tributos, está previsto pela Constituição Federal[82]. A previsão do sujeito passivo no aspecto pessoal da Hipótese de Incidência Tributária, por seu turno designa, regra geral, aquela(s) pessoa(s), física(s) ou jurídica(as), diretamente envolvida no cometimento da conduta prevista no aspecto material. Assim, para o IPTU, o sujeito passivo é aquele que está na condição de proprietário de imóvel urbano[83]; para o ISS, é o prestador de serviços; no caso do ITBI, a lei municipal que institui o tributo pode apontar qualquer das partes envolvidas na transmissão da propriedade[84], sendo mais comum que o adquirente figure como contribuinte do imposto devido. O CTN amplia bastante os horizontes da
sujeição tributária passiva. Observe-se a redação do art. 121: Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária. Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz-se: I - contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador; II - responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei.
Assim, o sujeito passivo direto é o contribuinte, aquele que possui relação pessoal e direta com o fato. Nas palavras de Eduardo Marcial Ferreira Jardim (2007, p. 266), “aquele que realiza o fato jurídico previsto em lei tributária (fato gerador)”. Já o sujeito passivo indireto é o responsável, um terceiro em relação ao evento descrito na hipótese de incidência, o qual é escolhido, ex lege, para responder pela obrigação tributária. Esse terceiro assume, por imposição legal, a condição de sujeito passivo por extensão[85] ou por
substituição. Três são os casos de transferência: solidariedade, sucessão e responsabilidade. Para Vittorio Cassone (2007, p.171), “a solidariedade é instituto que implica uma corresponsabilidade, segundo a qual a obrigação é satisfeita, em sua totalidade, ou por um dos devedores, ou por alguns, ou por todos, de conformidade com o disposto em lei, a teor dos arts. 124 e 125 do CTN”. Há severas críticas, a exemplo de Jardim (2007, p. 268) em relação ao art. 124, mas é inegável sua utilidade nos casos de responsabilização de grupos econômicos. A sujeição passiva por substituição parte do pressuposto que o sujeito passivo direto já não pode arcar com a responsabilidade pelo pagamento, como claramente se percebe nos casos dos arts. 131, 132 e 133. A interessante previsão do art. 130 será abordada nos capítulos referentes ao ITBI e ao IPTU. O art. 134, embora fale em solidariedade, trata de hipótese de responsabilidade subsidiária de terceiros, decorrente de “atos em que intervierem ou pelas omissões de que forem responsáveis”.
O art. 135, por seu turno, responsabiliza o terceiro por “atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos”, fazendo com que passe a integrar o polo passivo da relação jurídica tributária. Já na responsabilidade por substituição, desde o nascedouro, a sujeição passiva é indireta, dirigida a pessoa diversa daquela que protagonizou a situação descrita na hipótese de incidência. Subdivide-se em: substituição tributária regressiva e progressiva, tomandose como referência o ponto de vista do substituído. De seguinte, observa-se que a substituição tributária regressiva leva também as denominações de para trás ou antecedente, isso, porque ela ocorre sempre que o pagamento do tributo é diferido. Já a substituição tributária progressiva, também chamada de para frente ou subsequente, acontece nos casos de pessoas ocupantes de posições posteriores em relação àquela a qual seria o sujeito passivo natural, tornarem-se responsáveis pelo cumprimento da obrigação principal.
É de se ressaltar que o CTN aborda a capacidade tributária passiva de forma diversa da prevista pelo Código Civil. A fim de evitar fraudes e outras formas de evasão fiscal, a legislação tributária considera que qualquer pessoa pode ser sujeito passivo da obrigação tributária, ainda que incapaz civilmente ou, para as pessoas jurídicas, irregularmente constituídas. Sacha Calmon (2007, p. 688) assim leciona: Há que atentar, isto sim, para a praticidade das disposições do art. 126. O ato jurídico, como regido no Código Covil, exige sujeito capaz, objeto lícito e forma prescrita ou não defesa em lei. Faltando quaisquer desses requisitos, o ato não produz efeitos jurídicos. Dá-se que, em matéria tributária, ocorrem certas especificações a exigir temperamentos na teoria dos atos jurídicos.
O dever fundamental de pagar impostos[86] se impõe de tal maneira que, face ao disposto no art. 126 do CTN, o apartamento registrado em nome do filho menor de idade e o serviço prestado por sociedade de fato se sujeitam, respectivamente, à incidência do IPTU e do ISS. 4.5 Aspecto Quantitativo.
A norma impositiva tributária, abstratamente prevista como hipótese, precisa de elementos que permitam quantificar, mensurar, auferir o valor do tributo devido. O aspecto quantitativo (ou quantificativo) aponta os critérios para atribuir valor econômico ao fato gerador e, a partir dali, fazer incidir sobre ele uma alíquota, a fim de que seja determinado o quantum devido. A lei que institui um tributo precisa conter todos os elementos que permitam identificar com precisão a base de cálculo e mensurá-la na moeda corrente. Deve também conter a alíquota que incidirá sobre a base de cálculo. Para o ISS, segundo a Lei Complementar 116/2003, art. 7º, a base de cálculo é o preço do serviço. A mesma lei define a alíquota máxima em 5%, cabendo à lei municipal, a fixação de outras alíquotas, desde que inferiores àquele patamar. O CTN, nos arts. 33 e 38, define a base de cálculo do IPTU e do ITBI como sendo o valor venal dos imóveis, cuja fixação e alteração depende de lei do município[87]. A mera correção monetária da base de cálculo, contudo, pode ser realizada por decreto
municipal[88]. O aspecto
quantitativo
pode
comportar
alíquotas fixas, progressivas, ou regressivas. No entanto, para o IPTU e para o ITBI, a questão foi assim sumulada pelo STF: Súmula 656: É inconstitucional a lei que estabelece alíquotas progressivas para o imposto de transmissão inter vivos de bens imóveis - ITBI com base no valor venal do imóvel. Súmula 668: É inconstitucional a lei municipal que tenha estabelecido, antes da Emenda Constitucional 29/2000, alíquotas progressivas para o IPTU, salvo se destinada a assegurar o cumprimento da função social da propriedade urbana. Por fim, cumpre esclarecer que não se cuidou, aqui, do exaurimento da matéria e sim da fixação das premissas básicas para a compreensão da estrutura das normas tributárias impositivas municipais. REFERÊNCIAS.
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Capítulo 8 A EXTRAFISCALIDADE DOS TRIBUTOS MUNICIPAIS COMO INSTRUMENTO POLÍTICO DE PROMOÇÃO DE MELHORIA DO MEIO AMBIENTE URBANO Ana Paula Basso[89] 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS. As diversas campanhas cuja vertente volta-se para a preservação do meio ambiente, têm sido reflexo das várias mobilizações sociais promovidas, em especial, pela preocupação com os níveis alarmantes de degradação ambiental, ocorridos nas últimas décadas. O principal fator que gera esta preocupação, no âmbito municipal, é a ocupação humana, principalmente pela forma desorganizada que ela se apresenta. Isso é revelado pela inflação da população nas cidades, a falta de cuidado com a ocupação irregular de determinados territórios, a
produção excessiva de resíduos, a exploração irresponsável dos recursos da natureza e a infraestrutura precária, e que, por consequência, aportam calamidades seriamente tristes, justamente ocasionadas pelo desequilíbrio ambiental. O direito ao meio ambiente equilibrado emerge do próprio direito à sobrevivência humana, considerando que a carência de condições ambientais satisfatórias e saudáveis torna difícil a manutenção da vida no planeta. Trabalhar na organização de uma esfera política, partindo de ações de crescimento urbano calcadas em ideais de aumento de índices de desenvolvimento predatório, visando somente elementos de incremento econômico, e olvidando o equilíbrio do sistema natural que dá suporte à qualidade de vida sustentável, é extremamente arriscado à população. A política urbana deve pautar-se no conceito de desenvolvimento sustentável. O crescimento urbano deve se adequar ao seu crescimento econômico e produtivo ao meio ambiente preservado, que garanta à sociedade qualidade de vida e a própria garantia da
manutenção de sua sobrevivência. Essa despreocupação com questões ambientais nas políticas públicas municipais provoca inúmeras situações caóticas, que refletem em problemas estruturais, sociais e ambientais. Como exemplo disso, é rotineiro no contexto nacional, ter notícia em época de grandes pluviosidades,, problemas com desabamentos e enchentes, em que miríades de famílias são afligidas. Nesse contexto, é necessário que haja uma mudança de postura, na medida em que as ações não sejam simplesmente paliativas ou resultem em apenas abrandar os resultados dos incidentes naturais, mas importante seria implantar políticas preventivas na organização dos municípios e frente a isso, valendo-se da tributação ambiental, em que governo e sociedade podem atuar, conjuntamente, na estruturação de uma sociedade ambientalmente sustentável. Para tanto, serão vistos os tributos de competência dos municípios, destacando seus principais aspectos no que diz respeito à autorização ou restrições para o implemento da extrafiscalidade em suas estruturas, visando o alcance da melhoria do meio
ambiente urbano. 2. PARÂMETROS CONSTITUCIONAIS E LEGAIS PARA A ORGANIZAÇÃO MUNICIPAL COM FINS DE PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE. A Constituição Federal compõe de forma sistêmica o Estado Federado Brasileiro, pelo que, em seu artigo 18, tem-se que a República Federativa do Brasil é formada pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, entes políticos autônomos e harmônicos entre si. Referida autonomia de que são dotados aludidos entes políticos pressupõe, na sua base territorial, a capacidade de estabelecer comandos normativos. Detentores de competências próprias, divididas pelo legislador constituinte conforme o Princípio da Predominância de Interesse (artigos 20 a 32, da CF), segundo o qual a União deve ocupar-se de matérias de interesse geral, nacional, ao passo que aos Estados cabem as matérias de predominante interesse regional, e aos Municípios concernem os assuntos de interesse local, quanto ao
Distrito Federal, considerando a proibição da sua divisão em municípios, resta-lhe as competências legislativas reservadas aos Estados e Municípios. No particular, pertinente aos municípios, estes podem se organizar política, administrativa e financeiramente por meio de sua Lei Orgânica, ademais de poderem suplementar as legislações estaduais e federais, e inclusive, nos termos do artigo 23, VI e VII, conjuntamente com os demais entes políticos, engendrar políticas de defesa do meio ambiente, de combate à poluição e de preservação de florestas, fauna e flora. Por sua vez, o artigo 24, da CF, trata em seus incisos VI, VII e VIII, da competência concorrente dos Municípios para legislar, respectivamente, sobre florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição; proteção do patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico; responsabilidade por dano ao meio ambiente e aos bens acima citados. A Constituição Federal cuidou da Política Urbana no Capítulo II, do Título VII, em que trata da
ordem econômica e financeira. Contudo, esta posição constitucional não deve afastar a questão urbana dos fatores sociais, como os problemas relativos a assentamentos urbanos, processos demográficos, exclusões sociais e estruturação da cidade que atenda as condições mínimas de equilíbrio ambiental. Nesse sentido, a União editou o Estatuto da Cidade, lei nacional de n. 10.257/01, que, como norma geral, ordena o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana. O planejamento urbano com vistas à tutela do meio ambiente, conforme explica Édis Milaré (2009) é no sentido de que a Constituição deve ser analisada de forma finalística e sistemática em seu conjunto, ou seja, o meio ambiente equilibrado previsto no art. 225, da CF, deve pautar as relações econômicas e a vida na cidade, já que assim se poderá falar acerca da qualidade do meio ambiente urbano. Assim orienta o referido autor (2009, p. 541): O desenvolvimento sustentável, explicitado no art. 225 da Constituição e nos princípios inscritos no caput do art. 170 (valorização do trabalho humano e livre iniciativa) e nos incisos II (propriedade privada), III (função social da
propriedade), VI (defesa do meio ambiente) e VII (redução das desigualdades sociais), enseja claramente a necessidade de se procurar um equilíbrio ou harmonia entre os fatores sociais, ambientais e econômicos, ao exigir-lhes a proporção adequada e racional, sempre em busca da qualidade de vida, principalmente no ambiente urbano, que o homem moderno escolheu para viver.
Por sua vez, o artigo 30, inciso VII, da CF, confere aos municípios “promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano”. Com efeito, o Estatuto da Cidade regulamentou os artigos da Constituição Federal concernentes à ordem urbana (artigos 182 e 183), estabelecendo que compete aos municípios a realização da política de desenvolvimento urbano, introduzindo aspectos da qualidade ambiental urbana[90]. Especificamente no artigo 1º, parágrafo único, da Lei 10.257/01, o Estatuto da Cidade se configura como norma de ordem pública e interesse social que regula o uso da propriedade visando o bem coletivo, a segurança, o bem estar e o equilibro ambiental. Aludido propósito se dimensiona no meio urbano na medida em que se verificam constantes
problemas relativos ao meio ambiente, a exemplo de resíduos, áreas verdes e poluição do solo. Nessa linha, e considerando o artigo 182, § 2º, da CF, tem-se o Plano Diretor da Cidade[91], instrumento de política do desenvolvimento das funções sociais da cidade na orientação do poder público e da iniciativa privada na garantia de melhores condições de vida para a população, podendo, então, já nele, serem incluídas as ações de efetivação da tutela ambiental nas suas políticas locais. Em 1992, foi celebrada no Rio de Janeiro a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (CNUMAD), evento este que oficializou a Programa Agenda 21 que apresenta estratégias de concretização de políticas de sustentabilidade ambiental, social e econômica, pautando ações de interesse global, nacional e local. No citado documento se ressaltou a importância de implantação de políticas que visem, em âmbito local e com apoio da sociedade, a sustentabilidade. Ao atender os interesses locais, essas políticas podem melhor apresentar os resultados de sustentabilidade almejados, já que no
ambiente urbano é mais propício criar normativas de identidade econômica, social e política em seu território, justamente pelo caráter local. O fator local se revela importante para a tomada de decisões enquanto se pode contar com a participação social, tanto na elaboração quanto na fiscalização das políticas públicas. Nesse conjunto, explica Édis Milaré (2009, p. 557): As peculiaridades locais constituirão objeto do planejamento municipal, como explicita o inciso III, do art. 4º do Estatuto. No que concerne ao interesse da gestão ambiental, em particular, tomamos como principal referência o Plano Diretor e o zoneamento ambiental. O inciso IV, dos institutos tributários e financeiros, fala de “incentivos e benefícios fiscais e financeiros” que, sem dúvida, poderão ser propostos em benefício do meio ambiente urbano, além de outras destinações.
Conforme indicado pelo Estatuto da Cidade, como instrumento de melhoria do meio ambiente se pode valer de instrumento de natureza tributária, incluindo, então, a tributação ambiental. Para tanto, é importante analisar a competência municipal nas áreas da tributação e do meio ambiente. Nessa seara, importa analisar os tributos que competem aos municípios e a inserção aos
mesmos do caráter extrafiscal de promoção de condutas a favor da melhoria do meio ambiente. 3. TRIBUTOS MUNICIPAIS E A EXTRAFISCALIDADE COMO INSTRUMENTO POLÍTICO DE PROMOÇÃO DE MELHORIA DO MEIO AMBIENTE URBANO. O tributo, em sua visão clássica, é forma de arrecadação de receita derivada para os cofres públicos, destacando-se por este atributo o seu caráter fiscal. O tributo nessa definição relevante ao direito financeiro se apresenta como ônus atribuído aos contribuintes na arrecadação de receita para assegurar o regular desempenho da máquina pública, possibilitando como contrapartida aos indivíduos, benefícios com bens e serviços públicos a estes postos à disposição. Entretanto, além de arrecadar recursos, é ajustada ao sistema tributário a função extrafiscal do tributo, isto é, este atuando também como mecanismo de intervenção estatal no meio social e na economia privada. Dessa forma, a distinção entre as funções fiscais e
extrafiscais do tributo reside na sua finalidade, ao passo que a primeira visa a atividade financeira do Estado de prover receita aos cofres públicos, a segunda, perquire finalidade diversa de meramente arrecadar recursos, indicando tendências econômicas e comportamentais através da variação da carga tributária incidente. Esses objetivos, ainda que pareçam distintos, convivem harmonicamente, diferenciando-se apenas preponderância de um ou de outro. Dessa forma:
pela
Com efeito, um tributo instituído com efeitos arrecadatórios não se presta apenas a ser receita para cobrir gastos ao alvitre do administrador da máquina estatal. Não ao menos em um Estado Democrático de Direito, em que o Estado existe segundo e como o seu povo, para a busca de uma sociedade justa, livre e igualitária [...]. Nesse passo é importante lembrar que é dever constitucional do Estado corrigir ou mitigar as desigualdades socioeconômicas existentes, valendo-se, para tanto, de diversos instrumentos que lhe foram conferidos pela Constituição. (CAMARGO, 2008, p. 107)
A essência da tributação ambiental é o seu caráter extrafiscal. A implantação da tributação ambiental pode ocorrer tanto na criação de um tributo novo quanto
na introdução da finalidade extrafiscal de tutela ambiental em tributo já existente. A tributação ambiental implica na majoração ou redução/extinção da carga tributária de modo que comportamentos danosos ao meio ambiente podem ser tributados com gravames maiores, ao passo que condutas menos nocivas à natureza sofrem uma tributação menor, ou resta desobrigado a prestá-la. A tributação ambiental tem o caráter preventivo, pois a pretensão não é penalizar o agente que prejudica o meio ambiente, e sim, evitar tal prejuízo na medida em que proporciona ao indivíduo a escolha de se submeter ou não à tributação mais gravosa (NUNES, 2010; MODÉ, 2005). A tributação ambiental veicula instrumentos ao poder público para ter ingerência na sociedade, enquanto mecanismo de indução de comportamentos na sociedade, na graduação do seu gravame, na medida em que se atendem os requisitos de tutela ambiental regulados pela norma, poderá haver a redução/extinção do respectivo ônus tributário. Ressalta-se que, essa ingerência não influi, autoritariamente, sobre o sujeito passivo, cabendo-lhe, ainda, a escolha quanto a atender ao
posto para a preservação ambiental ou suportar o encargo econômico do tributo. A tributação ambiental projeta instrumentos ao poder público que proporcionam a “preservação ambiental através de um desenvolvimento sustentável, visto que não pretende barrar o crescimento econômico, apenas induzi-lo a acontecer da maneira menos danosa possível para a natureza” (BASSO; RODRIGUES, 2011, p. 48-49). A graduação do tributo pode influenciar nos modos de uso, e exploração do meio ambiente urbano, de maneira que a sua carga tributária interfere na indução de comportamentos. Visto isso, como instrumento de melhoria do meio ambiente urbano se pode valer da tributação ambiental, para tanto é importante analisar a competência municipal nas áreas da tributação e do meio ambiente. Nessa seara, importa analisar os tributos que competem aos municípios e a inserção aos mesmos do caráter extrafiscal de promoção de condutas a favor da melhoria do meio ambiente. 3.1 Imposto sobre a propriedade predial e territorial
urbana – IPTU. A Constituição Federal em seu artigo 156, II, e no seu artigo 147, autoriza, respectivamente, os Municípios e o Distrito Federal a instituírem o imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana (IPTU). Da análise do artigo 32, do Código Tributário Nacional, veiculando normas gerais sobre este imposto, tem-se que o seu fato gerador pode ocorrer pela verificação da propriedade imobiliária; do domínio útil ou da posse[92] de bem imóvel por natureza; ou por meio de acessão física; conforme definição na Lei Civil, de imóvel situado na zona urbana, urbanizável ou de expansão urbana da cidade. O imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana (IPTU) tem sua função predominantemente fiscal, sendo fonte de importante arrecadação ao município. Sem embargo, também apresenta o caráter extrafiscal na medida em que pode ser utilizado como instrumento de alcance à finalidade de atendimento à função social da propriedade.
O IPTU é classificado como imposto real, o que significa que o tributo considera características objetivas para sua incidência. Quer dizer que a sua tributação observa os critérios objetivos relativos ao imóvel tributado e não características pessoais do contribuinte. No que tange a se caracterizar um tributo real quer dizer que incide sobre o bem e são as características deste bem que orientam a graduação do imposto. Por se apresentar como imposto real, a progressividade só pode existir com expressa previsão constitucional o que se verifica no artigo 156, §1º, da CF, relativamente à progressividade fiscal do imposto conforme o valor venal do imóvel, conhecida como progressividade fiscal do IPTU, e que só foi possível após a introdução da sua autorização no texto da Constituição, pela Emenda Constitucional n. 29/2000[93]; ademais da progressividade extrafiscal prevista no artigo 182, §4º, da CF, conhecida como IPTU progressivo no tempo, em que haverá o aumento do tributo para que seja atendida a função social da propriedade. Tendo em vista a progressividade extrafiscal
do IPTU, prevista no artigo 182, §4º, da CF, o imposto se apresenta como instrumento propício na organização das cidades em respeito ao meio ambiente, ponderando que segundo este dispositivo, a propriedade imobiliária urbana deve atender a sua função social[94]. A orientação da função social da propriedade é posta pelo Plano Diretor da Cidade. Em outras palavras, é dizer que a propriedade cumpre a sua função social quando atende os requisitos fundamentais de ordenação da cidade expressas neste instrumento[95]. Nomeada função social da cidade é promover o adequado aproveitamento urbano da propriedade submetido no padrão jurídico do município, que pode ser traduzido na “destinação ocupável ao terreno, torná-lo produtivo em algo lícito, gerador de riqueza, edificar algo e destiná-lo ao uso” (MIRANDA, 2002, p. 333). Com base nessa conjuntura em que parte-se da organização da cidade pelo plano diretor, embasados pelas normas gerais da lei federal (Lei 10.257/01), que visam uma melhor política urbana, de segurança, do bemestar das pessoas e do equilíbrio ambiental, o IPTU
auxilia no controle da efetivação da função social da propriedade. Nesse sentido, a Constituição Federal outorga em seu artigo 182, §4º, instrumentos para o Município na organização de seu território sujeitar os seus cidadãos a atender a função social da propriedade. A Constituição Federal autoriza que o Poder Público possa, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento. Caso o particular não atenda às exigências do poder público, a Constituição Federal prevê providências sucessivas que podem ser tomadas. A primeira é o parcelamento ou edificação compulsórios, a próxima, e a que interessa ao presente estudo, é o IPTU progressivo no tempo. A possibilidade de progressividade extrafiscal do IPTU para assegurar o cumprimento da função social da propriedade urbana está prevista na Constituição Federal desde o seu texto originário promulgado em 1988. O IPTU progressivo no tempo é o
agravamento da carga tributária que será suportada ao proprietário de área que não promova o seu adequado aproveitamento. A graduação do imposto se dará pelo passar do tempo sem o adequado aproveitamento do solo urbano, ou seja, quanto mais tempo passar e mantida a situação que não atende à finalidade social da propriedade, maior será a alíquota aplicável no lançamento do IPTU. Diante do avaliado, importa destacar que, a Constituição Federal ao estabelecer o não atendimento da função social da propriedade como critério definidor da aplicação do IPTU progressivo, assegura no artigo 182, §2º, que existam conceitos normativos estáveis e objetivos que definam o regime jurídico da propriedade imobiliária postos em diretrizes de lei que defina a política de desenvolvimento e expansão urbana. O contexto social que se quer aplicar à propriedade não é no sentido de socialização do direito de propriedade, e sim de possibilidade ao poder público direcionar a destinação e o uso da propriedade de forma mais adequada aos anseios conscientes da sociedade. Adaptá-la da melhor
maneira à realidade a que ela é contextualizada. Contudo, convém alertar que o interesse público da função social, em especial neste caso, ao meio ambiente sadio, não pode sobrepujar direitos e garantias dos contribuintes, não podendo a tributação restar como mecanismo de coação ao indivíduo. O IPTU progressivo no tempo, embora seja posto para induzir comportamentos, não poderá ter efeitos confiscatórios e essa preocupação se fez presente no seu regulamento. Segundo o Estatuto da Cidade, a majoração da alíquota no IPTU progressivo no tempo, ocorrerá durante o prazo de cinco anos consecutivos, como aumento da alíquota a cada ano em que ainda persista a situação que não atende a função social da propriedade, sendo que a alíquota majorada não exceda a duas vezes o valor referente ao ano anterior, e, além disso, preocupou-se em estabelecer um limite máximo para a fixação da alíquota em quinze por cento. Além do IPTU extrafiscal progressivo no tempo, para atender a função social da propriedade, há de se notar que, com a finalidade de resguardar os recursos
naturais, o município pode condicionar ou incentivar condutas do particular, via tributação ambiental incidente sobre a propriedade. A legislação urbanística do município pode estimular os munícipes a conservar, criar e manter áreas verdes e outros elementos naturais existentes em sua propriedade. Referida orientação, que será estimulada pela tributação ambiental, pode ocorrer por meio de redução ou majoração da carga tributária no IPTU. Nesse contexto, também é possível aos municípios induzirem comportamentos preservacionistas com a oscilação da carga tributária. Um bom modelo é o IPTU Verde implantado no município paulista de São Carlos que visou conceder benefícios no IPTU a quem plantar árvores ou manter áreas permeáveis em imóveis edificados[96]. Outro exemplo é o município de Guarulhos, São Paulo, onde também se estabeleceu um desconto, de até vinte por cento, para os munícipes que implantarem em suas residências duas ou mais das seguintes medidas: uso de aquecimento solar, captação de água de chuva, reuso da água, coleta seletiva de lixo,
sistema natural de iluminação, construção com materiais sustentáveis e telhado verde (gramado).[97] 3.2 Imposto sobre serviços de qualquer natureza (ISS/ISSQN). A Constituição Federal atribui aos Municípios e ao Distrito Federal o poder de tributar relativamente a serviços de qualquer natureza (ISS), descritos em lei, e que não estejam compreendidos na competência dos Estados - concernentes aos serviços tributados pelo imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias - e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação (ICMS). A hipótese de incidência do tributo, nos termos do art. 1º. da Lei Complementar 116/2003, consiste na prestação de serviços constantes em sua lista anexa. Conforme o atual sistema, a Lei Complementar 116/2003 não conceitua serviço, apenas aporta uma lista taxativa de serviços que podem ser tributados pelos municípios e pelo Distrito Federal por meio de suas leis
próprias. O imposto sobre serviços também pode servir, ainda que de forma mais restrita, como instrumento de orientação de uso, desenvolvimento e expansão da sociedade, respaldado no equilíbrio ambiental. Atendendo à necessidade de se delimitar o critério de qual município será o sujeito ativo para cobrar o imposto sobre serviço, a Lei Complementar n. 116/2003 determinou em seu artigo 3º que o serviço considera-se prestado no local do estabelecimento prestador ou, não havendo estabelecimento, no local do domicílio prestador, trazendo exceções em seus incisos I a XXI. Importa definir de forma objetiva o critério em que local será cobrado o ISS, de modo que não haja fixação arbitrária do local do estabelecimento, com vistas a pagar menos imposto e burlando o sistema tributário em prejuízo de alguns municípios. Nesse sentido, o importante é considerar o problema da guerra fiscal entre os municípios no que concerne à tributação municipal sobre os serviços. Ponderando tal condição, a Constituição
Federal em seu artigo 156, §3º, atribui à lei complementar fixar as alíquotas máximas e mínimas do imposto sobre serviços. A Lei Complementar 116/2003 tratou apenas de fixar a alíquota máxima de cinco por cento, em seu artigo 8º, inciso II, silenciando quanto à fixação da alíquota mínima. Entretanto, aplica-se como alíquota mínima a prevista pelos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), especificamente em seu artigo 88. Este dispositivo do ADCT fixa a alíquota mínima de dois por cento, excluindo esta alíquota mínima para os serviços de execução de obras descritas nos itens 32, 33 e 34 da antiga lista de serviços posta no Decreto-Lei 406/68, correspondendo aos itens 7.02, 7.04 e 7.05 da atual lista de serviços anexa à LC 116/2003. Os citados serviços de execução de obra são devidos no local da efetiva execução do serviço, o que possibilita afirmar, que evita o problema da guerra fiscal. Além disso, com o intuito de impedir subterfúgios para redução da carga tributária aquém do limite de dois por cento, o inciso II, do art. 88, do ADCT impede, expressamente, benefícios fiscais que, direta ou
indiretamente, tenham o efeito de redução da alíquota estabelecida em dois por cento. Diante da restrição posta pelo ADCT, inferese que os incentivos fiscais relativos ao ISS devem se limitar ao patamar da alíquota mínima de dois por cento. Porém, poderia se falar de incentivo no imposto sobre serviço com a redução dessa alíquota mínima de dois por cento para os serviços em que são cobrados no local da sua execução. Tal concepção tem por base a finalidade desta restrição que é propriamente evitar a guerra fiscal entre os municípios, logo, se a prestação do serviço só pode ser executada propriamente no local em que será cobrado o imposto, é indiferente aos demais municípios os incentivos fiscais do ISS quanto à respectiva prestação de serviço. Nesse diapasão, pode-se citar como exemplo de tributação ambiental no imposto sobre serviços de qualquer natureza, a concessão de benefício fiscal no caso de prestação de serviços relativos a obras atinentes a construções novas e para reformas, que envolvam sistemas de captação de água da chuva, de aquecimento
hidráulico, elétrico solar e capaz de reduzir parcial ou integralmente o consumo de energia elétrica, e edificações com material sustentável certificado. Outra sugestão está na possibilidade do município, incentivar serviços relacionados ao turismo ecológico, produzindo renda e empregos, e ao mesmo tempo, proporcionando uma exploração sustentável à biodiversidade existente em áreas de preservação permanente. 3.3 Imposto sobre a transmissão “inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como a concessão de direitos a sua aquisição (ITBI). Os municípios e o Distrito Federal, por força dos artigos 156, II e 147, da Constituição Federal, estão autorizados a tributarem a transmissão “inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como a concessão de
direitos a sua aquisição. Imposto este, comumente conhecido pela sigla ITBI. A alíquota do ITBI não tem limite máximo e mínimo. A restrição está na impossibilidade de se estabelecer alíquotas progressivas ao ITBI, pois por se tratar de tributo real, a progressividade conforme a capacidade contributiva só pode existir com manifesta autorização constitucional, o que não ocorre com a atual regulamentação constitucional do ITBI. Corroborando com o dito, o STF editou a Súmula 656 afirmando que “é inconstitucional a lei que estabelece alíquotas progressivas para o imposto de transmissão inter vivos de bens imóveis – ITBI com base no valor venal do imóvel”. Na presente análise, acredita-se que este imposto, por incidir sobre um fato tido como instantâneo, ou seja, incide no momento de transferência de direito real, poderia não ser o mais adequado instrumento de melhoria ambiental. Isso porque se entende que a tutela ambiental deve ser eficaz e objetiva. Eficaz, enquanto se constata que o instrumento dirigido à tutela ambiental permite efetivamente atingir referida finalidade, e
objetiva, ao passo que a norma aponte detalhadamente os seus desígnios. Ressalta-se que, pretende-se nesse estudo defender que os incentivos fiscais para a tutela ambiental não resultem meramente em benefícios/favores fiscais aos contribuintes, frente a uma medida ambiental simplesmente transitória. Nesse sentido, corrobora que a tributação ambiental quando implementada deve ser efetiva, o seguinte argumento: [...] as normas motivadoras devem se apresentar sobre a base de um sistema com critérios delimitadores, quer dizer, devem-se determinar os parâmetros de sua abrangência essencialmente ambiental, bem como os critérios relacionados às técnicas renováveis que devem ser implantadas. A norma não pode ser posta de modo que possibilite a dissimulação de seus objetivos que perquire a concreção da política de preservação ambiental no desenvolvimento econômico. (BASSO, 2010, p. 50-51)
Além do mais, protesta-se que a medida tributária proporcione que a conduta estimulada pela tributação seja sustentada de modo que decorra efetivo benefício ao meio ambiente, implicando, ainda que indiretamente, num resultado duradouro e positivo ao entorno urbano. É dizer, que o benefício ambiental para o
município com a implantação da medida tributária extrafiscal, prolongue-se após a transferência do direito real, aportando efetivo resultado de salvaguarda do meio ambiente. 3.4 Taxa. Diferente dos impostos, as taxas são tributos vinculados, o que quer dizer que estão aderidas a determinada atividade estatal relacionada ao contribuinte. Conforme o artigo 145, II, da Constituição Federal, as taxas têm como fato gerador a prestação de serviço público específico e divisível, prestado ou posto à disposição do contribuinte, ou o exercício regular do poder de polícia. A competência tributária das taxas é definida como comum, já que será competente aquele ente que realizar a atividade estatal conforme atribuição constitucional. Poderia se falar em taxa ambiental em caso de prestação ou colocação à disposição do contribuinte de serviço público específico e divisível de natureza
ambiental, assim como quando o município exercer o regular poder de polícia sobre determinada atividade que afete o meio ambiente. Poder-se-ia mencionar como exemplo a taxa municipal de esgoto industrial, cobrada sobre o lançamento de resíduos poluentes, ou sob a forma de taxas de polícia, como no caso de fiscalização e controle de atividades dos contribuintes, principalmente das que possam ocasionar poluição ambiental. Nesse caso, poder-se-ia falar de tributo propriamente ambiental, aproveitando o exemplo já exposto da taxa de esgoto industrial cobrada sobre o lançamento de resíduos poluentes, em que a imposição tributária é auferida em conformidade direta com a quantidade de poluição produzida, mas que consequentemente deve aumentar na proporção em que é utilizada a atividade estatal, sendo, portanto, maior o seu custo. Destaca-se nessa situação que não se trata de um aumento da taxa conforme o índice poluidor. Por se tratar de um tributo contraprestacional, não poderá considerar exclusivamente o caráter pernicioso ao meio ambiente relativo à conduta do contribuinte no agravamento do
tributo, já que tem de se ponderar como limite deste tributo o custo da atividade estatal. O mencionado exemplo não se trataria propriamente de um tributo extrafiscal, já que quando se fala desta característica se está referindo à oscilação do elemento econômico do tributo assentada pela norma tributária para estimular ou reprimir comportamentos, possibilitando assim, o alcance do valor protegido constitucionalmente. Logo, essa taxa, para se revestir do caráter extrafiscal de tutela ambiental, deve ter o caráter indutor para o contribuinte deixar de suportá-la e tomar medidas que afastem o caráter poluidor a que se sujeita a tributação e não, meramente, por se tratar de um serviço com característica ambiental prestado pelo Estado ao contribuinte. Entende-se por se vincular propriamente a atividade estatal (serviço público específico e divisível, e exercício regular do poder de polícia), podendo-se falar do caráter extrafiscal da taxa no caso de se estabelecer isenção ou redução na carga tributária para fomentar determinada conduta que seja ambientalmente desejável.
3.5 Contribuição de melhoria. A contribuição de melhoria também se refere a um tributo vinculado, uma vez que seu fato gerador consiste em uma atividade estatal. Nesse tributo, a atividade estatal é específica - a realização de uma obra pública - e dela deve, necessariamente, decorrer melhoria, que se representa na valorização do imóvel do contribuinte. A contribuição de melhoria tem grande importância no planejamento urbano e realização de obras. Assim, para a qualidade do meio ambiente seria propício que estas obras se refiram a sua melhoria ambiental, como a construção de um parque, por exemplo. Entretanto, não se deve esquecer que se tratando dessa espécie tributária, necessariamente, deve decorrer valorização ao bem do contribuinte que se sujeita ao seu pagamento. Contudo, mais uma vez aqui se adverte que não se trataria propriamente de tributo com finalidades extrafiscais em que se quer induzir comportamentos ambientalmente desejáveis. Acompanha-se aqui os
mesmos argumentos já expostos em relação à figura tributária taxa, só que de forma adequada a este tributo. Na cobrança da contribuição de melhoria se deve observar, necessariamente, o limite total que é o custo da obra, e o limite individual, que é a valorização do imóvel do contribuinte decorrente da obra pública. Considerando o limite individual correspondente à valorização imobiliária e não diretamente o custo da obra, já se restringiria a manifestação extrafiscal nessa espécie tributária. 3.6 Contribuição para o custeio de serviço de iluminação pública. A emenda constitucional n. 39, de 2002, introduziu no texto constitucional o artigo 149-A, autorizando os municípios e o Distrito Federal a instituir a contribuição para custeio do serviço de iluminação pública. Preliminarmente, não se verifica características propriamente ambientais nessa espécie tributária, considerando que a sua arrecadação tem a finalidade
específica de munir o município de recursos financeiros para suportar o custo do serviço de iluminação pública. Tampouco se verifica o caráter de ingerência de melhoria urbanística. Todavia, pode o município trazer uma finalidade extrafiscal de tutela do meio ambiente por meio deste tributo. Assim, contemplando que a Constituição Federal autoriza no parágrafo único, do artigo 149-A, que a cobrança desse tributo pode ser feita na fatura de energia elétrica, considerando o seu consumo, pode-se propor a finalidade extrafiscal de reduzir o tributo na proporção de quanto menor for o consumo de energia elétrica pelo contribuinte ou for adotada forma de produção de energia elétrica mais limpa[98]. Aqui a finalidade extrafiscal estaria em reduzir o consumo de eletricidade ou estimular a adoção de técnicas de produção de energia renovável, o que deve ser estimulado, pois, embora a eletricidade se trate de um produto final limpo, não se pode esquecer que suas diversas formas de produção, ainda que no momento de sua instalação, acarretam danos ambientais.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS. No presente estudo se analisou formas de tributação municipal dirigidas a assegurar o direito fundamental ao meio ambiente sadio. Consagrado direito fundamental, conforme dispõe o próprio texto constitucional, deve ser assegurado tanto pelo poder público municipal quanto pela sociedade, e isso se mostrou possível pela extrafiscalidade ambiental nos tributos de competência do município. Perquiriu-se demonstrar que no município se encontra instrumentos aptos a adoção de medidas de melhoria do meio ambiente urbano, considerando que é no seu território que se pode identificar o perfil econômico, social e político na instrução da legislação que melhor atende os seus interesses sociais. Dentro desta perspectiva, as políticas municipais devem pautar-se nos anseios constitucionais, orientando o legislador na eleição de valores considerados imprescindíveis à manutenção da sociedade, importando visualizar que bens tidos com caráter
exclusivamente individual, a exemplo da propriedade imobiliária, atualmente pela Constituição Federal, na seara do Estado social, já não são considerados de tal forma. Tratou-se de diversos instrumentos dentro da competência tributária do município que proporcionam a solução dos problemas ambientais, buscando, ainda que de forma sucinta, demonstrar o perfil de cada tributo municipal apresentando os limites e as possibilidades de sua aplicação na finalidade indutora de se impetrar comportamentos preservacionistas. Observou-se que existem formas de indução do comportamento do munícipe no sentido de auxiliar o ente político local em organizar de forma adequada ao meio ambiente a sua cidade, evitando posteriores e gravíssimos incidentes ocasionados pelo desequilíbrio ambiental. Percebe-se que, na verdade, carecem políticas organizadas para a implantação do instrumento tributário ambiental, que se configuram importantíssimas, já que atuam na problemática de forma preventiva, e que a ação do contribuinte ao atender a finalidade ambiental será de
retirar ou suavizar a causa do dano ambiental. REFERÊNCIAS. BARRETO, Aires Fernandino. Curso de direito tributário municipal. São Paulo: Saraiva, 2009. BASSO, Ana Paula. Os benefícios fiscais em favor do desenvolvimento sustentável. Revista Direito e Desenvolvimento. João Pessoa, Ano 1, n. 2, 2010. BASSO, Ana Paula; RODRIGUES, Jackson Duarte. Caráter extrafiscal da tributação na implementação do direito ao meio ambiente saudável. Revista Direito e Desenvolvimento. João Pessoa, Ano 2, n. 3, 2011. CAMARGO, Juliana Wernek de. O IPTU como instrumento de atuação urbanística. Belo Horizonte: Fórum, 2008. FOLMANN, M. IPTU e tributação ambiental: uma visão sob o enfoque constitucional e tributário. In: PEIXTO, M. M. (Org.). IPTU, aspectos jurídicos relevantes. São
Paulo: Quartier Latin, 2002. MACHADO, Paulo Afonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 18. ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2010. MILARÉ, Édis. Direito do ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência, glossário. 6.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. MIRANDA, J. D. B., A regra-matriz do IPTU e sua constitucionalidade. In: PEIXTO, M. M. (Org.), IPTU, aspectos jurídicos relevantes. São Paulo: Quartier Latin, 2002. MODÉ, Fernando Magalhães. Tributação ambiental: a função do tributo na proteção do meio ambiente. Curitiba: Juruá, 2005. NUNES, Cleucio Santos. Direito tributário e meio ambiente. São Paulo: Dialética, 2005. RIBEIRO, M. F.; FERREIRA, J. S. A. B. N. O papel do Estado no desenvolvimento econômico sustentável:
reflexões sobre a tributação ambiental como instrumento de políticas públicas. In: TÔRRES, H. T. (Org.). Direito tributário ambiental. São Paulo: Malheiros, 2005. SEBASTIÃO, Simone Martins. Tributo ambiental: extrafiscalidade e função promocional do direito. Curitiba: Juruá, 2008.
Capítulo 9 ESTUDO SOBRE A POSSIBILIDADE DOS MUNICÍPIOS SEREM CONDENADOS POR DANOS MORAIS E MATERIAIS DECORRENTES DO AJUIZAMENTO DE EXECUÇÕES FISCAIS INDEVIDAS. Dirceu Galdino Barbosa Duarte[99] 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS. A prática forense tem demonstrado que os entes Federados, principalmente os pequenos Municípios – talvez pelo menor investimento em tecnologia e capacitação dos seus servidores (Agentes Fiscais e Procuradores), ou pela voracidade em arrecadar recursos públicos, ajuízam Execuções Fiscais infundadas cobrando créditos tributários decaídos ou prescritos (ambos extintos); já adimplidos ou em fase de parcelamento (com a exigibilidade suspensa); em face de pessoa sem
qualquer vínculo jurídico com o fato gerador do tributo, logo, sem legitimidade para figurar no polo passivo; crédito tributário “constituído” sem notificação do lançamento tributário etc. Neste sentido, iremos analisar os malefícios e prejuízos causados aos Executados, expondo a fundamentação do porquê de a administração pública dever indenizar os executados por danos morais, quando realiza cobranças de dívidas tributárias manifestamente indevidas. Para tanto, inicialmente iremos analisar o acesso à justiça, passando pela teoria do abuso de direito e pelos deveres das partes num processo, para que o leitor tenha a exata noção de como e quando o direito dos municípios cobrarem as suas “dívidas” passam a ser abusivo e violador dos direitos da personalidade. Analisar-se-á, detidamente, os princípios violados pela Administração que age de maneira antiética, ilegal, inconstitucional e arbitrária e os conjugamos com outros institutos do Direito Civil e do Direito Tributário, sempre propugnando por uma solução que afete o mínimo possível a esfera individual e valorize ao máximo a
eficiência administrativa. 2. DO ACESSO À JUSTIÇA. Fruto de verdadeira conquista histórica, o acesso à justiça, hoje, além de um Direito é também uma garantia que o indivíduo possui, para fazer valer a defesa dos seus direitos em face de outrem, sob a tutela de um órgão imparcial, como bem se constata do conceito de jurisdição de Fredie Didier Junior (2009, p. 67): A jurisdição é a função atribuída a terceiro imparcial de realizar o Direito de modo imperativo e criativo, reconhecendo/efetivando/protegendo situações jurídicas concretamente deduzidas e, em decisão insuscetível de controle externo e com aptidão para tornar-se imutável.
O Constituinte originário agiu bem em resguardar essa garantia, no rol dos direitos fundamentais previsto no art. 5º da Constituição Federal, ao dispor que: “Art. 5º XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Tal prerrogativa, devido a sua incontestável
importância, não limitou o acesso à justiça a quem quer que fosse, como se depreende do próprio texto constitucional, ou seja, o judiciário não furtará a analisar ameaça ou lesão a direito. Portanto, qualquer um, seja pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, que entenda ter quaisquer dos seus direitos violados, pode fazer valer do seu direito acionário constitucional, já que se trata de uma garantia universal. Neste sentido Ferreira Filho (1995, p.279) leciona: O Direito à tutela jurisdicional é o direito que toda pessoa tem de exigir que se faça justiça, quando pretenda algo de outra, sendo que a pretensão deve ser atendida por um órgão jurisdicional, através de processo onde são reconhecidas as garantias mínimas. O acesso aos cidadãos aos tribunais de justiça, à procura de uma resposta jurídica fundamentada a uma pretensão ou interesse determinado, realiza-se pela interposição perante órgãos jurisdicionais, cuja missão exclusiva é conhecer e decidir as pretensões que são submetidas ao conhecimento do órgão judicante, tendo em vista, os direitos fundamentais da pessoa.
Acontece que, mesmo sendo um direito fundamental e com status de cláusula pétrea, seu exercício e seus dizeres, não são absolutos, pois, devem ser
ponderados em conjunto com todo o ordenamento constitucional. Em outras palavras, tal direito deve ser exercido de forma coerente, objetiva e razoável, sob pena de que sejam contrariados princípios importantes como a segurança jurídica, a dignidade da pessoa humana e, principalmente, uma de suas deduções lógicas que é a boa-fé objetiva processual. Calha trazer à tona as lições de Castilho (2006, p. 13) ao discorrer sobre o acesso à justiça: [...] não se pode usá-lo sem antes verificar se o direito substancial é ou não justo, ou seja, se atende ou não às necessidades da realidade social. [...] Pode-se simplesmente dizer que justiça vem de jus dicere e que, portanto, é justo aquilo que o Direito diz.
Convém-se a um cidadão comum fazer um juízo de valor sobre o custo-benefício de ativar uma demanda judicial contra outra pessoa, ponderando se o seu pleito é legítimo, tornando-se tal exigência ainda mais marcante para o ente público, devendo a Administração Pública estar convencida de que o direito pleiteado possui amparo legal e encontra-se devidamente
fundamentado, pois, do contrário estaria utilizando-se das “máquinas” administrativa e judiciária para perpetuar a injustiça com cobranças indevidas, onde não haveria direito e sim imposição de sua vontade pela arbitrariedade. Pontuais são as palavras de Watanabe (2004, p. 129) que assevera que “para aplicação de um direito substancial discriminatório e injusto, melhor seria dificultar o acesso à Justiça”. 3. OS PRINCÍPIOS VIOLADOS PELA ADMINISTRAÇÃO AO AJUIZAR EXECUÇÕES FISCAIS INDEVIDAS. No atuar da Administração Pública, além dos princípios administrativos insculpidos na Carta Magna, dentre os quais salta aos olhos o princípio da Moralidade, deve o ente zelar e manobrar esforços para uma atuação legal e constitucional. Adentrando especificamente nas Execuções Fiscais, a Administração Fazendária deve agir amparada
pela legalidade e respaldada pela razoabilidade, economia e precipuamente pela boa fé objetiva, por se tratar de um agir dentro do direito processual. O que está evidenciado pelo art. 14, inciso II, do Código de Processo Civil, o qual merece a devida transcrição. Art. 14 - São deveres das partes e de todos aqueles que de qualquer forma participam do processo: I - expor os fatos em juízo conforme a verdade; II - proceder com lealdade e boa-fé; III - não formular pretensões, nem alegar defesa, cientes de que são destituídas de fundamento; IV - não produzir provas, nem praticar atos inúteis ou desnecessários à declaração ou defesa do direito; V - cumprir com exatidão os provimentos mandamentais e não criar embaraços à efetivação de provimentos judiciais, de natureza antecipatória ou final.
Calha destacar que hoje é consenso na doutrina e na jurisprudência, que o dever de agir com lealdade e boa-fé, foi erigido a status de princípio. Como bem preceitua o mestre Miguel Reale (2003, p.76) ao discorrer sobre a boa-fé: [...] A boa-fé não constitui um imperativo ético abstrato, mas sim uma norma que condiciona e legitima toda a experiência jurídica, desde a interpretação dos
mandamentos legais e das cláusulas contratuais até as suas últimas consequências. Daí a necessidade de ser ela analisada como conditio sine qua non da realização da justiça ao longo da aplicação dos dispositivos emanados das fontes do direito, legislativa, consuetudinária, jurisdicional e negocial. (...) Nada mais incompatível com a idéia de boa-fé do que a interpretação atômica das regras jurídicas, ou seja, destacadas de seu contexto. Com o advento, em suma, do pressuposto geral da boa-fé na estrutura do ordenamento jurídico, adquire maior força e alcance do antigo ensinamento de Portalis de que as disposições legais devem ser interpretadas umas pelas outras.
Portanto, agindo em dissonância com o legal, a Administração pública não fere somente a Legislação propriamente dita, mas também os princípios que a norteiam e lhe dão legitimidade.
4. A EXECUÇÃO FISCAL INDEVIDA COMO CARACTERIZAÇÃO DO ABUSO DE DIREITO. Quando a lei 6830/80 estabeleceu o processo de execução fiscal, trouxe para o texto normativo uma série de privilégios e prerrogativas que teria a
administração tributária, para fazer valer o seu direito de receber o crédito tributário. Ter um procedimento específico célere e dinâmico tem suas vantagens, ainda mais pelo fato de que o que se está em jogo é em última analise o patrimônio público. Acontece que, o administrador, por vezes, seja por ineficiência, retardo, excesso de trabalho ou qualquer outro motivo, verifica a impossibilidade de efetuar a cobrança de determinada dívida, mas mesmo assim o faz, como no caso de cobrança de dívida prescrita ou quando suspensa sua exigibilidade em função de parcelamento efetuado pelo contribuinte e devidamente concedido pelo Ente Público. Em ambos os casos, o administrador não deveria ajuizar tal ação, mas ele parece não se importar com as nuances do caso e valendo-se do seu direito constitucional de ação, propicia a execução fiscal em flagrante abuso de direito, pois caberá ao executado provar sua situação, pouco importando para a administração se a cobrança é indevida ou não.
Ora, o exequente assim agindo, disfarça sua inépcia com uma ação de execução que sabe perfeitamente ser incabível, mas deixa nos braços do judiciário resolver algo que sob o prisma da lei já deveria estar resolvido, inflando assim o número de processo nos órgãos judiciários. Atuar dessa forma é entrar em flagrante desrespeito à essência das normas e, principalmente, agir em total abuso de direito, sem lealdade com a parte adversa. Quando a Administração Pública Municipal ajuíza Execuções Fiscais objetivando a cobrança de crédito tributário parcelado, já pago, prescrito, decaído, ou indevido por qualquer outro motivo, seja pela inobservância dos procedimentos legais do processo administrativo tributário, seja por se valer de sua posição de superioridade na execução fiscal, ela viola além da boa-fé objetiva processual, outros deveres inerentes às partes que também estão presentes no art. 14 do CPC, transcrito acima, tais como, não expor os fatos conforme a verdade e deduzir pretensões destituídas de fundamento.
Esse agir antiético, mascarado por uma possível “legalidade”, colide com o princípio da eficiência, pois a administração estará concentrando esforços que se mostrarão inúteis ao final de um processo, lembrando ainda que quando isso acontece esta deve arcar com as custas processuais, trazendo prejuízos aos cofres públicos, e ainda obriga o jurisdicionado a contratar um advogado, muitas vezes sem a mínima condição de fazêlo, causando-lhe, assim, inúmeros transtornos, já não bastando o fato de ser hipossuficiente perante a administração pública. Assim sendo, tal comportamento eivado de nulidade, torna-se adjetivado pelo abuso de direito, ao utilizar-se indevidamente do acesso à justiça que é um direito constitucional e cívico, para constranger alguém a lhe pagar o que não deve. 5. DANO MORAL DECORRENTE DA EXECUÇÃO FISCAL INDEVIDA. Fato que deve ficar claro, antes de se adentrar
no tema proposto neste capítulo é que não se propugna aqui que toda e qualquer execução fiscal que ao final do processo, seja declara improcedente, deva caracterizar dano moral. Não é a vertente devida, pois se assim o fosse estaríamos impondo ao Ente Público um ônus que não lhe é próprio, mas entendemos que naquelas ações manifestamente improcedentes e/ou descabidas de fundamento jurídico, ou seja, ações forçadas ao judiciário e que caracterizam ineficiência do administrador, aí sim, deveríamos pensar em reparação dos danos causados, uma vez o “fisco” age em nítido abuso de direito. O abuso de direito além de ser um ato ilícito, gera consequentemente o direito à reparação de dano moral e material, sendo fundamento para tais pedidos a litigância de má-fé da Administração Pública pelo evidente abuso de direito e os prejuízos morais e materiais sofridos pelo demandado. É o próprio Código Civil que preceitua a atitude ilícita de quem age em abuso de direito ao ditar em seu artigo 187 o seu conceito e ao reprimi-lo no art. 927, convém trazer a baila a redação de ambos os artigos.
Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Leitura clara e induvidosa as dos dois artigos supracitados, pois demonstra inequivocamente que, quando a administração dá causa a um processo de execução indevido, o qual irá ferir a “esfera de conforto” do individuo demandado, deve responder pelos seus atos e consequentemente indeniza-lo moral e materialmente, em decorrência de sua atitude abusiva. Como bem lembrado por Cavalieri Filho (2008, p. 155) “o que efetivamente caracteriza o abuso do direito – repita-se – é o seu anormal exercício, assim entendido aquele que se afasta da ética e da finalidade social ou econômica, do direito.”
O que justamente ocorre quando a administração move uma ação que não tem fundamentos legais e/ou legítimos, é a efetivação do abuso de direito em duas situações distintas, primeiro, a administração age deliberadamente com o intuito de prejudicar alguém e locupletar-se, e em segundo lugar pode-se esclarecer que ela está no uso anormal ou antifuncional do Direito. Como salientado por Cavalieri (2008, p. 152) “caracteriza-se pela existência de conflito entre a finalidade própria do direito e a sua atuação no caso concreto”. Exemplo clássico que se pode extrair de tal vergastada prática, é a cobrança de multas ambientais, depois de vários anos, ou até décadas, de cometido o ilícito. O transcorrer do tempo solidifica as relações pessoais e a confiança das partes, é uma questão de segurança jurídica, mas a administração pública por diversas vezes entendeu que poderia ajuizar a ação de cobrança mesmo depois de passados tantos anos, onde, obviamente, os prejudicados sentiram-se no dever de procurar a tutela judicial, por entenderem que um prazo longo já havia se transcorrido.
Mesmo não havendo legislação específica sobre o assunto, o Superior Tribunal de Justiça solidificou o entendimento de que a cobrança de tais multas deve ser feita no prazo de cinco anos[100]. A edição da súmula inibiu muitas das ações desprovidas de razoabilidade, impedindo cobranças prescritas de tais multas, no entanto ainda persistem em situações diferentes. Convém mencionar ainda que, até na seara recursal, os tribunais têm entendido pela proibição do abuso de recorrer, como bem preceitua novamente o STJ: “Processual Civil – Embargos de declaração – Rejeição – Multa. Atua com abuso de direito de recorrer a parte que investe contra assunto já pacificado nos Tribunais, especialmente quando já sumulado”[101]. Uma última palavra deve ser mencionada sobre o abuso de direito, nas lições de Cavalieri (2008, p. 153): [...] A conclusão que se tira da redação do art. 187 é a de que o abuso do direito, que não era estranho ao Código Civil de 1916, foi agora erigido a princípio geral, podendo ocorrer em todas as áreas do Direito, pois a expressão o titular de um direito abrange todo e qualquer direito
subjetivo cujos limites foram excedidos. Importa dizer que qualquer titular de direito subjetivo ( pessoa natural ou jurídica), em qualquer área do direito ( público ou privado), poderá praticar esse ato ilícito e, se causar dano, terá que indenizar. Esta é a amplitude da norma em comento.
Ou seja, a administração pública municipal tem o dever de indenizar o demandado quando àquela agir em abuso de direito. É o que vem entendendo ainda o Tribunal de Alçada do Rio Grande do Sul, in verbis: TRIBUTÁRIO/CRÉDITO TRIBUTÁRIO/LANÇAMENTO INDEVIDO DE TRIBUTO/ DANO MORAL. A exigência indevida de tributo constitui ilícito que viola a esfera jurídica do contribuinte. E isto lhe resulta em dano moral, em virtude da perturbação na sua paz, com o recebimento de correspondência cobrando impostos indevidos, com o seu nome associado a pecha de contribuinte inadimplente e com inevitável constrição de parte de seu patrimônio - por meio de execução fiscal ou depósitos suspensivos da exigibilidade do crédito tributário. Dito lançamento indevido também inviabiliza eventual alienação do imóvel, na medida em que obstaculiza a obtenção de certidão negativa municipal, necessária para lavrar-se escritura. O litígio judicial enseja dano moral. E isto o autor não escapa de vivenciar, pelo só fato de ser advogado. É presumido o resultado danoso do desgaste emocional, do incômodo e do estresse porque tais perturbações são sentidas no íntimo do indivíduo, não se podendo observá-las no plano material, e qualquer "homos medius" sofreria tais emoções
negativas frente ao caso concreto. Este dano moral foi causado pelo indevido lançamento tributário que, por conseqüência, resultou no ajuizamento da demanda. O litígio, na verdade, é um dos efeitos gerados pelo ilícito e não causa dos danos. Constitui um desvio de perspectiva ver no ajuizamento da ação a causa do respectivo dano moral para afastar a sua indenizabilidade, quando, na verdade, a causa de tal dano repousa no indevido lançamento tributário. A inscrição do débito como dívida ativa e o ajuizamento da execução fiscal são atos que só agravariam os danos que já estavam consolidados para o contribuinte.
6. AS CONDIÇÕES DA AÇÃO COMO FREIO A PROPOSITURA DE AÇÕES INDEVIDAS. Outro fato que não se pode esquecer é o de que o legislador também não ficou indiferente à possibilidade de ocorrer um abuso no direito de acesso à justiça, criando, assim, as condições da ação, para que tal direito seja efetivado de forma eficaz, palpável e concretizável. Inclusive, o próprio Supremo Tribunal Federal[102] e a doutrina já se manifestaram sobre esse assunto senão veja-se:
Os princípios constitucionais que garantem o livre acesso ao Poder Judiciário, o contraditório e a ampla defesa, não são absolutos e hão de ser exercidos, pelos jurisdicionados, por meio das normas processuais que regem a matéria. Não se constituindo negativa da prestação jurisdicional e cerceamento e defesa a inadmissão de ações e recursos quando não observados os procedimentos estatuídos nas normas instrumentais.
Consolidando o entendimento da Corte Suprema, Nelson Nery e Rosa Maria Andrade (2009, p. 136) entendem de forma semelhante: Todos têm acesso à justiça para postular tutela jurisdicional preventiva ou reparatória de um direito individual, coletivo ou difuso. Ter direito constitucional de ação significa poder deduzir pretensão em juízo e também poder dela defender-se.(...)É preciso, contudo, que a parte preencha as condições da ação, para que possa obter aa sentença de mérito.
As condições da ação estão estampadas no próprio Código de Processo Civil em vários artigos, mas de forma específica no art. 267 inciso VI: “Extingue-se o processo, sem resolução de mérito: VI - quando não concorrer qualquer das condições da ação, como a
possibilidade jurídica, a legitimidade das partes e o interesse processual”. Dentre as três condições da ação, nos interessa no presente estudo a figura do “interesse processual”. Segundo o saudoso professor Liebman (1986, p. 154): Interesse de agir é um interesse processual secundário e instrumental com relação ao interesse substancial primário: tem por objeto o provimento que se pede ao juiz como meio de para obter a satisfação de um interesse primário lesado pelo comportamento da parte contrária, ou, mais genericamente, pela situação de fato objetivamente existente.
A Doutrina majoritária entende que o interesse de agir ou interesse processual, é uma condição da ação que deve ser examinada em duas dimensões: 1. Interesse-utilidade: haverá interesse se a demanda puder propiciar algum tipo de proveito ao demandante. “Há utilidade da jurisdição toda vez que o processo puder propiciar ao demandante o resultado pretendido” (DIDIER, 2009, p. 196);
2. Interesse-necessidade: é preciso que o demandante demonstre que o processo é necessário à obtenção daquela utilidade, sob pena de a conduta ser considerada abusiva. A divisão que nos interessa é exatamente a primeira, ou seja, o interesse utilidade, pois ao propor uma ação de execução fiscal em que o Município sabe ser indevida, seja porque está prescrita ou por qualquer outro motivo, esta ação em si já se encontra carente de objeto. O ordenamento jurídico não pode processar regularmente uma demanda judicial sem tal interesse utilidade, e por esse mesmo motivo previu que o juiz pode extinguir de ofício a ação quando prescrita[103]. Dinamarco (2000, p. 402) esclarece pontualmente o papel da utilidade no interesse de agir: Sem antever no provimento pretendido a capacidade de oferecer essa espécie de vantagem a quem o postula, nega-se a ordem jurídica a emití-lo e, mais que isso, negase a desenvolver aquelas atividades ordinariamente predispostas à sua emissão (processo, procedimento, atividade jurisdicional).
Ocorre, não raro, que alguns juízes sob a tutela da teoria da asserção, a qual prediz estarem presentes as condições da ação porque o autor da causa assim se manifestou, recebe e desenvolve regularmente o processo de execução fiscal, para descobrir ao final que a parte ré tinha razão em sua argumentação e que assim a cobrança estava prescrita, era indevida, ou havia sido realizada fora dos ditames da lei. 7. CONSEQUÊNCIAS PARA O CONTRIBUINTE. Além dos inúmeros motivos elencados acima, nos parece ainda ser o mais forte argumento legal para que o contribuinte processado indevidamente pelo Município seja indenizado moral e materialmente, inclusive com os gastos com a contratação de advogado, a figura do erro judiciário, expressamente previsto no art. 5 da Constituição Federal, inciso LXXV: “o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença”.
Saliente-se que a palavra condenado no dispositivo legal acima explicitado, não se remete apenas ao condenado na esfera penal, mas em qualquer esfera, seja ela tributária, civil, trabalhista, ou em qualquer outro ramo do Direito. Acrescentando ao erro judiciário, pode-se enfatizar que, por exemplo, além dos típicos constrangimentos da execução, como a penhora de bens, o nome do contribuinte é incluído em banco de dados negativos, lhe imputando ainda mais prejuízos, pois fica impedido de praticar diversos atos necessários à vida cotidiana social, como a impossibilidade de efetuar empréstimos em bancos públicos. 8. CONSIDERAÇÕES FINAIS. Este estudo não teve por escopo incentivar a inadimplência ou defender que o pagamento dos tributos deve ser elidido pelo contribuinte, mas sim, objetivou-se o desiderato de demonstrar que a cobrança feita por Municípios (valendo o mesmo para os outros entes
estatais), de tributos que sabem ou deviam saber ser indevidos, viola vários princípios do Direito e deve consequentemente gerar a responsabilidade do Estado. Todo administrado espera que a administração atue de forma ética e eficiente. O lançamento de tributo feito de forma indevida, demonstra ineficiência do ente público, pois gera para o Estado uma série de procedimentos e gastos que seriam desnecessários se o procedimento de lançamento e constituição do crédito tributário fosse feito de forma correta e de acordo com os parâmetro legais. Para além da órbita fiscal, temos a esfera do individuo, o qual se vê preso a uma cobrança que sabe ser indevida, mas que desde a sua notificação gera efeitos funestos, tendo a sua suposta dívida lançada na Dívida Ativa do Munícipio, além de gerar uma serie de contratempos, como gastos processuais e administrativos. Por isso, se espera que, ao realizar execuções fiscais, a administração tenha ouvido o contribuinte em um processo administrativo legal, que garanta todos os seus direitos processuais, tais como a ampla defesa, o contraditório e
observe institutos do direito civil e do direito tributário, a exemplo da prescrição, das causas que suspendem a exigência do crédito tributário entre outros. Agindo assim de forma clara, objetiva, econômica e eficiente. Por fim, entendemos que a solução para os problemas apontados ao longo destas páginas está em se tornar eficiente e justo o processo de lançamento, pois, do contrário, o que sempre resultará será a indenização ao particular pelos erros cometidos por execução de dívida infundada, indenizações que ultrapassam a esfera material e alcançam a seara moral, pois o administrado muitas vezes se encontra impossibilitado de fazer valer alguns direitos específicos, já que o seu nome encontra-se na dívida ativa do município, restando-lhe apenas as alternativas de pagar e ver-se livre de tal encargo ou militar em um processo judicial, que muitas vezes, além de caro é extremamente lento, o que perpetuará a sua condição de devedor por anos. Destarte, é necessário que com base na boa-fé objetiva, na proibição do abuso de direito e também na falta de interesse de agir em um processo, o juiz atue de
forma mais ativa ao receber ações de execuções fiscais, para que ao final de um longo processo não tenha que se manifestar pela improcedência do pedido e dar azo ao ajuizamento de mais uma ação, dessa vez pelo particular, o que acarretará em mais trabalho para o judiciário, inflando-o e tornando mais ineficiente. Salientando que, caso o contribuinte sinta-se esbulhado nos seus direitos como contribuinte, deve recorrer ao judiciário para reparação justa pelos prejuízos sofridos em decorrência dos atos arbitrários praticados pela Administração Pública. REFERÊNCIAS CASTILHO, Ricardo. Acesso à Justiça. São Paulo: Atlas, 2006. CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2008. DIDIER, Fredie, Curso de Direito Processual Civil: Teoria Geral do Processo e Processo de Conhecimento.
11. ed. Salvador: Juspodivm, 2009. DINAMARCO, Cândido Rangel. Execução Civil. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2000. FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Direitos Humanos Fundamentais. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1995. LIEBMAN, Enrico Tulio. Manual de Direito Processo Civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1986. v-1. NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria. Princípios do processo civil na Constituição Federal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994. REALE, Miguel. A boa-fé no Código Civil. Disponível em: Acesso em: 29 agosto 2012. WATANABE, Kazuo, Acesso à justiça e sociedade moderna. In: GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel; WATANABE, Kazuo. (coord). Participação e processo. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1988.
Capítulo 10 A PRESCRIÇÃO E A DECADÊNCIA APLICADA AOS TRIBUTOS MUNICIPAIS.
“Dormientibus non succurrit jus”[104] André Nóbrega Quintas Colares[105]
1.
Introdução
A prescrição e a decadência são parcelas de direito material previstas no Código Tributário Nacional[106] -CTN- como hipóteses de extinção do crédito tributário, e posteriormente tratadas em nossa Constituição Federal de 1988, em que se deu reserva à Lei Complementar aplicando-se a todos os tributos, sem exceção, in casu, os tributos municipais, e antes de o contribuinte exigir o que não deveria ter pagado, ou de o
município exigir falta em pagamento, devem ser observados os prazos para a cobrança, sendo matéria de ataque ou defesa dentro do processo judicial ou administrativo, deve ser entendida pelos integrantes da relação processual, incluindo o Juiz e o julgador administrativo que poderá declará-las de ofício. A percepção completa do tema somente é possível com a compreensão de toda a existência temporal do tributo, desde o fato gerador até o respectivo executivo fiscal ou repetição do indébito. As regras são diversas e misturam a decadência com a prescrição, e diante da quantidade de possibilidades aplicáveis aos casos concretos, esse estudo trará as fórmulas que devem ser aplicadas à decadência e posteriormente à prescrição. Por uma questão didática analisaremos os institutos por meio de uma cronologia crescente, da prática do fato gerador à ação de cobrança pelo Sujeito Ativo, começando pela decadência, e por último, a prescrição. Em que pesem os inconformismos buscamos a aplicação que fará o leitor entender como o judiciário percebe a devida aplicação dos institutos.
2.
Nascimento do Crédito Tributário – Lançamento.
Previsão do artigo 173[107], parágrafo único do CTN, o crédito tributário surge com a notificação ao sujeito passivo de ato preparatório ao lançamento, quando a administração tributária comunica alguém acerca de um suposto débito fiscal que, via de regra, será apurado em esfera administrativa. Essa constituição é a formalização desse direito abstrato, que, agora deverá ser transformado em um título executivo hábil à cobrança judicial (líquido, certo e exigível), só então viável propositura de demanda perante o judiciário para executar o valor pretendido (normalmente a execução fiscal).
3.
Decadência.
A decadência se opera quando há um direito potestativo que deve ser exercido em um determinado prazo, ou seja, quando alguém precisa praticar um “ato”
para constituir um direito em determinada quantidade de tempo. No Direito Tributário localiza-se antes da constituição do crédito tributário, e cessa com ela, sua existência implica na perda do Crédito Tributário, que fica impedido de existir[108]. Exercido o “ato” potestativo, no direito tributário temos a transformação imediata de um direito abstrato em direito subjetivo que agora incorpora o patrimônio do Estado, esse “ato” resulta de um procedimento, e notificado o contribuinte acerca do ato preparatório ao lançamento, sua consequência imediata é encerrar o prazo decadencial e constituir o crédito tributário. Para a decadência não há que se falar em ato do judiciário, mas meramente administrativo unilateral e vinculado que o Sujeito Ativo tem obrigação de praticar, embora sujeito ao controle jurisdicional. A comunicação do contribuinte por meio do ato preparatório ao lançamento jamais poderá ser ilegal já que sua regularidade será necessariamente aferida em âmbito
administrativo com possibilidade de defesa nas esferas administrativa e judicial.
4.
Prescrição – Morte do Crédito Tributário.
Hipótese clara de extinção, quando o Sujeito Ativo perde o direito de usufruir da jurisdição. Com o início da prescrição a fase decadencial já se extinguiu ou foi suprimida, conforme o caso; e em vez de um direito potestativo, teremos a perda da força de jurisdição para coagir o Sujeito Passivo a entregar um crédito, ou para que o Sujeito Ativo entregue ao contribuinte o que pagou em erro, ou seja, quem detinha um direito subjetivo perdeu de usufruir da força do Estado prestada pelo judiciário para forçar outrem ao cumprimento. A Prescrição não pode ser confundida com a “perda do direito de ação”, já que o Sujeito Ativo pode pretender em juízo um crédito prescrito, e a demanda terá o trágico fim de improcedência com resolução de mérito. Afirmar que prescrição é a “perda do direito de ação”, é
erro fundamental que não deve ser cometido. O direito constitucional de ação sempre existirá, mesmo que o pleito seja impossível. Eis a diferença: a prescrição se opõe à cobrança do crédito tributário enquanto a decadência é oposição ao próprio crédito. Notificado o Sujeito Passivo acerca do ato preparatório ao lançamento, a partir dessa data a Administração terá um prazo determinado para transformar esse direito subjetivo em um título executivo extrajudicial dotado de liquidez e certeza (CDA) e propor uma demanda judicial que transformará o que antes era um direito subjetivo em algo concreto de valor pecuniário, observadas as regras, suspensões e interrupções de prazos de serão tratados posteriormente.
5. Modalidades de Lançamento dos Tributos Municipais. Tributo Imposto
Sigla predial
territorial IPTU
Lançamento De ofício
urbano Contribuição de Melhoria Contribuição Social Iluminação Publica Taxas
CM
De ofício
de COSIP De ofício Taxa
Imposto de transmissão de bens ITBI
De ofício Declaração
imóveis Imposto sobre serviços qualquer natureza Imposto territorial rural[109]
de ISS
Homologação
ITR
Homologação
A principal determinante que estabelece a que regra prescricional ou decadencial se sujeita um tributo será sua modalidade de lançamento, então partiremos dos tributos sujeitos ao lançamento de ofício ou por declaração, e entraremos no lançamento por homologação.
6. 6.1.
As Regras de Prescrição e Decadência. Regra geral da decadência e prescrição do direito
do município, aplicável aos tributos com lançamento de ofício ou por declaração: 40. 41. Nesse tópico 6.1. serão explanados os prazos que correm contra a administração tributária municipal, até quando poderá notificar o Sujeito Passivo de ato preparatório ao lançamento, e posteriormente ajuizar o executivo fiscal. 42. A decadência ao direito notificar o Sujeito Passivo de ato preparatório lançamento decorre da previsão expressa do art. 173 CTN que abaixo citamos com redação diversa original[110] para um melhor entendimento:
de ao do da
Art. 173. A Fazenda Pública tem o prazo de 05 anos para constituir o crédito tributário, contados: I – do primeiro dia do exercício seguinte ao qual o lançamento poderia ter sido efetuado;
II – da data que se tornar definitiva a decisão que houver anulado o lançamento tributário por vício formal (hipótese de interrupção). Parágrafo único. O prazo previsto nesse artigo se inicia da data em que tenha iniciado a constituição do crédito tributário pela notificação ao sujeito passivo, de qualquer medida preparatória indispensável ao lançamento.
São dois os pontos iniciais da contagem do prazo decadencial: (1) o primeiro dia do exercício fiscal seguinte; (2) da data que se tornar definitiva a decisão que houver anulado o crédito tributário por vício formal. Esse prazo é de cinco anos e termina com a notificação ao sujeito passivo de qualquer medida preparatória indispensável ao lançamento, vamos às regras.
1.
Quando o município notifica o contribuinte
acerca de ato preparatório ao lançamento (lançamento por declaração ou de ofício). Quando o Sujeito Ativo notifica o contribuinte acerca do lançamento após o primeiro dia do exercício fiscal seguinte. Onde SP significa sujeito passivo e CT crédito tributário - utilizando como exemplo o ITBI.
-------------*--------------------------*-----------*---------10/02/2010
01/01/2011
-----------*-------
01/01/2016 01/01/2021
1° dia do Fato Gerador exercício Último dia Último dia para prescricional. Transferência fiscal seguinte. notificar SP da propriedade
SP notificado
Primeiro dia CT decadencial Constituído. para
notificar
o
SP de ato preparatório ao lançamento.
43. Notificado o sujeito passivo, findase o prazo decadencial de 05 anos, iniciado no primeiro dia do exercício fiscal seguinte, desse modo entende-se devidamente constituído o crédito tributário. Normalmente o ITBI é pago de forma antecipada (antes do fato gerador), já que exigência dos cartórios apesar de ilegal. 44. Noutra hipótese, o Sujeito Ativo se antecipa e notifica o contribuinte acerca de um suposto débito, antes mesmo do primeiro dia do exercício fiscal seguinte, de imediato constituindo o crédito tributário. 45. --------------*-----------------------------*-----------------------------*-----------
10/02/2010 Fato Gerador. Transferência propriedade.
03/10/2010 03/10/2015 Notificação Último do prescricional. da lançamento ao SP. Antes do primeiro dia do exercício legal seguinte. Crédito Tributário Constituído. Inicia-se a prescrição.
dia
A situação fática envolvendo o devedor é a mesma, mas a ação do Sujeito Ativo alterou os prazos. No segundo exemplo, o município antecipa-se notificando o contribuinte, então não se fala em decadência, essa se encerrou antes mesmo de iniciar, surgindo, de logo, o crédito tributário e o prazo inicial para a propositura da demanda judicial será em 03/10/2010 e finda em 05 anos no dia 03/10/2015, último dia para ajuizar a execução fiscal, enquanto no primeiro exemplo vemos que o Sujeito Ativo possui um prazo bem mais alargado para a propositura da ação de execução fiscal, mas deixemos as discussões prescricionais para mais a diante.
2. Quando a administração tributária não notifica o contribuinte.
--------------*-------------------------------*-----------------------------*--------10/02/2010 Fato Gerador
01/01/2011 01/01/2016 Último
Transferência propriedade
decadencial. Primeiro do O fisco não notifica da dia exercício o contribuinte do fiscal ato preparatório ao seguinte. lançamento. Opera-se decadência.
a
Primeiro dia do CT impedido de prazo existir. decadencial
Nesse caso o sujeito ativo perdeu o prazo decadencial, e a consequência será a extinção do crédito tributário, pondo termo final ao direito de obter qualquer vantagem do sujeito passivo, administrativamente ou judicialmente.
6.2. Contagem dos prazos decadenciais para o sujeito ativo de tributos sujeitos ao lançamento por homologação (ITR e ISS).
Art. 150. O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa. § 1º O pagamento antecipado pelo obrigado nos termos deste artigo extingue o crédito, sob condição resolutória da ulterior homologação ao lançamento. § 2º Não influem sobre a obrigação tributária quaisquer atos anteriores à homologação, praticados pelo sujeito passivo ou por terceiro, visando à extinção total ou parcial do crédito. § 3º Os atos a que se refere o parágrafo
anterior serão, porém, considerados na apuração do saldo porventura devido e, sendo o caso, na imposição de penalidade, ou sua graduação. § 4º Se a lei não fixar prazo a homologação, será ele de cinco anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considerase homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação.
Com regra distinta aos demais, o lançamento por homologação se rege pelo artigo 150, §1° e §4° do CTN. Quando o contribuinte paga tributo a menor, o crédito tributário será extinto com a homologação expressa ou tácita, ou constituído pela notificação do sujeito passivo de ato preparatório ao lançamento.
O Crédito tributário somente estará constituído quando a administração lançar o tributo, mas deverá fazê-lo num prazo de cinco anos, (art. 150 §4º), sob pena aceitação tácita do pagamento ou não pagamento. Essa regra visa não postergar ad eternum a obrigação de retificar ou ratificar o pagamento ou não de um tributo, pondo termo final na obrigação unilateral da fazenda fiscalizar o contribuinte, extinguindo aquela possibilidade de relação jurídica. Esse prazo de cinco anos é contado de formas diferentes dependendo das circunstâncias que estão envolvidas como demonstraremos a seguir.
1. Quando o contribuinte informa a menor, paga o valor declarado integralmente. Essa é a exceção prevista no final no §4º do art. 150 do CTN, quando há lesão ao erário pelo não recolhimento de tributo em decorrência de dolo, fraude ou simulação, se lhe aplicará regra mais gravosa do art. 173, I do CTN, e o prazo para o Sujeito Passivo constituir o crédito tributário
será contado do primeiro dia do exercício legal seguinte ao que poderia ter sido efetuado, e não mais do fato gerador ou do pagamento[111]. -------------*----------------------------*------------10/02/2010
01/01/2016
Data do pagamento
SA não notifica o SP.
Devia ter declarado R$ Homologação tácita. 200,00 Decaiu o direito do Declarou: R$ 100,00
AS.
Pagou R$ 100,00
Extinção do CT.
Talvez seja o caso mais comum. Quando o contribuinte deveria informar determinada quantidade de serviço prestado (ISS) em valores e omite parte não emitindo Nota Fiscal de Serviço, ou em sua declaração. Havendo omissão de valores, o valor remanescente, R$ 100,00 deve ser lançado de ofício no prazo decadencial de 05 anos contados do exercício
seguinte ao fato gerador, e não da data da declaração do débito[112]. Então o município terá até 01/01/2016 para constituir o crédito tributário pela notificação do sujeito passivo do ato preparatório ao lançamento.
2. Quando
o
contribuinte
informa
o
valor
corretamente, mas paga a menor ou nada paga[113]. Doutro modo, quando o contribuinte declara o valor correto, mas recolhe a menor ou nada, a jurisprudência entende que não há prazo decadencial aplicável à diferença entre o valor declarado e o valor do pagamento, mas que o crédito tributário poderá ser constituído automaticamente por mero despacho da autoridade competente, correndo, de logo, da data do “não pagamento” o lustro prescricional para constituir a CDA e ajuizar demanda judicial.
-----------------*-------------------------------------------*-
----------------------10/02/2010
10/02/2010
Data do pagamento
Crédito Tributário Constituído
Devia ter declarado R$ 200,00
Início da prescrição
Declarou: R$ 200,00 Pagou R$ 100,00
3. Quando o contribuinte informa a menor e paga a menor o valor declarado. Nesse caso possuímos duas decadenciais aplicadas a um mesmo pagamento.
regras
------*---------------------------*-----------------------------------*--------------10/02/2010 10/02/2010 Data do R$ 20,00 pagamento Fato Gerador Primeiro
10/02/2016 Ultimo dia para o fisco notificar o dia SP sob pena de
extinção do Devia ter decadencial. declarado À diferença entre o crédito tributário R$ 120,00 declarado e o que pela decadência. deveria ter sido Declarou: R$ 100,00
declarado se submete ao regime normal de decadência (art. 150, Pagou R$ §4º). 70,00 R$ 30,00 O crédito tributário quanto à diferença entre o declarado e o que foi pago é considerado automaticamente constituído iniciando imediatamente a prescrição para a cobrança judicial. Crédito constituído em 10/02/2010. Decadência não se opera[114]. Início da prescrição em 10/02/2010
Esse entendimento corresponde a melhor e mais atual jurisprudência do STJ, e é tratado por
Sabbag[115] que o valor remanescente entre o declarado e o pago está definitivamente constituído, e a diferença entre o valor devido e o declarado se submete ao regime normal. Mas se houver dolo, fraude ou simulação aplicarse-á o regime do artigo 173, I do CTN.
-------------*------------*-------------------- ----------*----*------------------10/02/2010 01/01/2011
01/01/2017
01/01/2022
Data do R$ 20,00 Último dia Se o SP for pagamento Primeiro dia para o fisco notificado decadencial. notificar o no último Devia ter À diferença SP sob pena dia declarado entre o de extinção 01/01/2017, R$ 120,00 declarado e o do crédito a prescrição que deveria tributário terá fim em sido pela Declarou: ter R$ 100,00 declarado em decadência. 01/01/2022. caso de dolo ou Pagou R$ fraude
70,00
simulação. R$ 30,00 O crédito tributário quanto à diferença entre o declarado e o que foi pago é considerado automaticamente constituído iniciando imediatamente a prescrição para a cobrança judicial. Crédito constituído em 10/02/2010. Decadência não se opera[116]. Início da prescrição em 10/02/2010. Fim da prescrição em 10/02/2015.
O fato de haver comprovação de dolo fraude ou simulação poderá estender por muito mais os prazos do sujeito ativo, uma consequência da atitude do sujeito passivo.
6.3. Prescrição do Direito do Sujeito Ativo Cobrar do Contribuinte.
Art. 174. A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva.
A expressão do artigo 174 do CTN é um tanto óbvia, pois para a cobrança de um crédito, se deve pressupor a existência do mesmo, ou seja, antes da cobrança, o crédito tributário deve estar devidamente constituído, desde que não haja uma ou mais hipóteses impeditivas. Desse modo as regras de prescrição sempre estarão condicionadas à constituição do crédito tributário.
------*-------------------*----------------------------------*-----------------------30/11/2015 01/12/2015 02/12/2020 CT Início da Último dia para constituído prescrição execução fiscal.
ajuizar
1º dia após Execução fiscal ajuizada em a data posterior será extinta constituição com resolução de mérito do CT pela prescrição
6.4. Prescrição da Cobrança do Contribuinte Contra o Município – art. 165 do CTN[117] 6.4.1. Tributos sujeitos ao lançamento de ofício e declaração. Quando alguém paga tributo que não devia, seja a maior ou porque não era contribuinte daquele, surge o direito à devolução que deve ser exercida em um determinado lapso temporal conforme previsão do artigo 168 do CTN: 46. 47. Art. 168. O direito de pleitear a restituição extingue-se com o decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contados: 48.
I - nas hipótese dos incisos I e II do
artigo 165, da data da extinção do crédito tributário; 49. II - na hipótese do inciso III do artigo 165, da data em que se tornar definitiva a decisão administrativa ou passar em julgado a decisão judicial que tenha reformado, anulado, revogado ou rescindido a decisão condenatória.
Desse modo, a prescrição para a propositura da demanda judicial que visa a restituição de determinado crédito tributário é de 05 anos contados 1) da extinção do crédito tributário, e 2) da data em que se tornar definitiva a decisão administrativa ou judicial que tenha modificado decisão condenatória anterior. Lançamento de ofício: da data prevista para o pagamento do IPTU, normalmente tratada por decreto legislativo é que se conta o prazo de cinco anos para o contribuinte requerer o que pagou em erro. No caso de tributos sujeitos ao lançamento por declaração, teremos a constituição do crédito tributário por meio do lançamento, quando o município,
por sua adminsitração entrega a guia para o contribuinte pagar, e houver pagamento em excesso ou erro, deve o contribuinte, da data do pagamento, requerer a repetição do indébito em cinco anos. Talvez aparente incomum o pagamento em erro dos tributos sujeitos ao lançamento por declaração, mas não o é, pois erro é fato humano. Pode ocorrer porque o imóvel não se sujeitava a ITBI, casos de pessoas jurídicas em incorporação, etc.
1. Quando há decisão administrativa ou judicial que reforme decisão condenatória anterior. Houve decisão administrativa ou judicial que condenou o contribuinte ao pagamento de determinada quantia, e posteriormente, o contribuinte conseguiu reformar essa decisão, seja por que meio for, conta-se da data do transito em julgado da decisão que anulou o crédito tributário anteriormente formado a pretensão de o contribuinte ajuizar demanda contra o sujeito ativo para
requerer a restituição do valor que não deveria ter pago. Exemplo: contribuinte condenado na esfera administrativa ao pagamento de R$ 100,00, paga o tributo e recorre ao judiciário, ao final consegue anular a decisão anterior em parte, reduzindo o valor da dívida para R$ 50,00. Do transito em julgado dessa decisão de forma, contam-se 05 anos para requerer R$ 50,00 pagos em excesso. Igualmente se o contribuinte condenado na esfera administrativa e judicial, paga R$ 100,00, aciona o judiciário com ação rescisória reformando a decisão anterior, reduz a dívida para R$ 50,00.
2. Prazo para o contribuinte discutir o débito judicialmente quando há decisão administrativa que denega a restituição: Nesse caso tratamos da ação que visa anular decisão administrativa condenatória anterior, esse direito prescreve em 02 anos contados da notificação do sujeito
passivo do transito em julgado da decisão administrativa (art. 169 do CTN).
6.4.2. Tributos sujeitos ao lançamento por homologação. Entendimento conforme o Superior Tribunal de Justiça e abarcada pelo STF, em que a prescrição para o contribuinte conta-se do dia em que está extinto o crédito tributário. Teorias à parte, a lei é clara em afirmar que a extinção do crédito se dá conforme o art. 150, §4° (homologação tácita) ou 150, §1° (homologação expressa). Intimamente interligada com a decadência, explicaremos a extinção do crédito tributário dos tributos sujeitos ao lançamento por homologação em dois períodos, antes de 09 de julho de 2005 e depois.
1. Antes da Lei Complementar 118 de 2005. Regra válida apenas para ações ajuizadas até 09 de julho de 2005, conforme o entendimento do STF no
RE 566621[118], em que pese não concordarmos com esse entendimento que deveria ser aplicável a fatos geradores até essa data, e não às ações ajuizadas até esse tempo, acabou-se por convalidar lei retroativa. A extinção do crédito tributário, nesses casos, é contada do dia em que a administração homologa tacitamente o tributo (05 anos do fato gerador) ou expressamente (até 05 anos do fato gerador). Então, extinto o crédito pela homologação tácita ou expressa conta-se daí cinco anos para o contribuinte ajuizar repetição de indébito. Ex. fato gerador em 01/01/1990, fisco homologa tacitamente em 01/01/1995, o contribuinte tem até o dia 01/01/2000 para ajuizar repetição de indébito, essa é famosa regra dos “cinco mais cinco”, que não se aplica às ações mais atuais, conforme o STF. No caso abaixo o tributo foi homologado tacitamente ou expressamente ou lançado de ofício no último dia do prazo que se deu em 01/01/1995.
----------*---------------------*---------------------------*----
-----------01/01/1990
01/01/1995
Data do fato Término
02/01/2000 do Último
dia para o gerador prazo para contribuinte ajuizar a Início do homologar ou repetição do indébito para lançar o reaver valor pago em prazo decadencial tributo erro. para homologar ou lançar
Nesse caso o tributo foi homologado tacitamente ou expressamente ou lançado de ofício no último dia do prazo que se deu em 01/01/1995.
2. Após a Lei Complementar 118 de 2005 Regra válida apenas para ações ajuizadas do dia 10 de julho de 2005 em diante, (RE 566621), pago o
tributo, conta-se daí o prazo de 05 anos para a repetição de indébito, e ponto. Essa regra simplificou o emaranhado legislativo, mas prejudicou o contribuinte, desequilibrando, mais uma vez, a balança em favor da administração. Veja que o prazo do contribuinte foi reduzido.
---------*-----------------------*-------------------------------*-------------------10/02/2010 10/02/2010
10/02/2015
Pagamento
Primeiro dia Último dia para o prazo contribuinte ajuizar ação Extingue-se do o crédito prescricional. com repetição de indébito. tributário 50. 6.5. Suspensão e Interrupção dos Prazos Decadenciais. 6.5.1. Suspensão dos Prazos Decadenciais. A suspensão do prazo decadencial, ou seja, os
impedimentos dos efeitos do tempo sobre o Crédito Tributário é previsão do artigo 173, I do CTN:
Art. 173. O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco) anos, contados: I – do primeiro dia do exercício seguinte ao qual o lançamento poderia ter sido efetuado;
Então o prazo é impedido de começar até o primeiro dia do exercício seguinte, salvo quando o lançamento for realizado antes dessa data, quando o prazo decadencial sequer começará a correr, abrindo, de logo, a prescrição. ---------*---------------------------------*------------------*-----------10/02/2010 Data
do
Lapso de tempo 01/01/2011 01/01/ o fato Início do Último fato entre
gerador/pagamento gerador/pagamento prazo para o e o primeiro dia decadencial notific do exercício fiscal (primeiro contrib seguinte. dia do de exercício prepar ao Suspensão do fiscal lançam prazo decadencial. seguinte)
6.5.2. Interrupção dos prazos decadenciais (art. 173, II do CTN). Interromper um prazo significa recomeçar, o que é diferente de suspender. Quando um prazo é interrompido ele é reiniciado, e quando é suspenso, somente impede sua continuidade, portanto hipóteses completamente distintas, conforme o art. 173, II do CTN:
51. II - da data em que se tornar definitiva a decisão que houver anulado, por vício formal, o lançamento anteriormente efetuado.
Essa é a hipótese interruptiva do prazo decadencial prevista no CTN, e quer dizer que, se a administração, ou o judiciário, de ofício, ou a requerimento do sujeito passivo, anular um lançamento anterior por vício formal, o prazo será reiniciado, para a Fazenda efetuar novo lançamento, denominado “lançamento complementar”.
normalmente
Qual seria o prazo para a fazenda efetuar esse lançamento complementar? São duas formas distintas (a) quando o contribuinte apresenta defesa administrativa ou recurso (b) quando o contribuinte não apresenta defesa administrativa. A hipótese “a” representa a suspensão do crédito tributário, que trataremos aqui apenas da mais comum, e as demais previstas no art. 151, poderão ser deduzidas.
1. preparatório ao administrativa.
Sujeito passivo notificado de ato lançamento apresenta defesa
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01
Fato Início do SP Gerador / prazo notificado pagamento decadencial Prescrição (primeiro iniciada.
Tr ju D ad qu
SP oferece defesa administrativa no prazo legal.
dia do exercício Fim da Prescrição fiscal decadência. suspensa. seguinte)
la po fo
R pr fi
A prescrição está suspensa, segundo a atual jurisprudência, desde a data da notificação ao sujeito passivo do ato preparatório ao lançamento até a data em que o contribuinte foi notificado da última decisão que pôs fim ao processo administrativo, essa decisão anulou o
lançamento anterior. Podemos extrair duas consequências graves da disposição legal, a primeira é que a jurisprudência não aceita a prescrição intercorrente em processo administrativo por falta de previsão legal, então a fazenda pública poderá demorar o tempo que lhe convier para a solução do processo administrativo e a prescrição continuará suspensa. A segunda é que não há prazo para que o contribuinte seja notificado da decisão administrativa, assim se a administração “esquecer-se” de notificar o contribuinte da decisão, essa prescrição estará suspensa “ad eternum”[119]. Essa não parece ser a saída mais justa, e deve o magistrado, entender que a inércia para expedir simples notificação não deve agir em favor de quem deu causa à demora, e duas situações poderão ser abarcadas pelo magistrado. A primeira, excluindo o juros e correção monetárias do tempo em que a fazenda manteve-se inerte, aplicando o conceito da mora do credor prevista na Lei Civil, ou fixando o prazo prescricional em desfavor da
administração na data da lavratura da decisão, são duas hipóteses
doutrinárias
aparentemente
recomendamos análise, jurisprudencial, ainda.
2.
mas
originais
sem
que
aplicação
Sujeito passivo notificado de ato
preparatório ao administrativa.
lançamento
não
apresenta
defesa
Nesse caso a prescrição não será suspensa, tendo o sujeito ativo o prazo de 05 anos contados da data em que o sujeito passivo foi notificado para modificar o lançamento de ofício, sob pena de prescrever o débito. ----1-------------2-------------3----------4----------5-----------6-----10/02/2010
Caso que
01/01/2011 01/01/2016
Início do SP prazo notificado Fato em Gerador/pagamento decadencial do lançame(primeiro a
dia
prescrição não é suspensa
6.6. Prescricionais.
exercício fiscal seguinte)
do nto.
Prescrição iniciada
Suspensão e Interrupção dos Prazos
6.6.1. Suspensão dos prazos prescricionais. As cláusulas previstas no artigo 151 do CTN tratam de suspensão do prazo prescricional para ambos os sujeitos, passivo e ativo: 52. 53. Art. 151. Suspendem a exigibilidade do crédito tributário: 54.
I - moratória;
55.
II - o depósito do seu montante integral;
56. III - as reclamações e os recursos, nos termos das leis reguladoras do processo tributário
administrativo; 57. IV - a concessão de medida liminar em mandado de segurança. 58. V – a concessão de medida liminar ou de tutela antecipada, em outras espécies de ação judicial; (Incluído pela Lcp nº 104, de 10.1.2001) 59. VI – o parcelamento. (Incluído pela Lcp nº 104, de 10.1.2001) 60. Parágrafo único. O disposto neste artigo não dispensa o cumprimento das obrigações assessórios dependentes da obrigação principal cujo crédito seja suspenso, ou dela consequentes. 61. Quando o dispositivo legal afirma “suspende a exigibilidade”, então o crédito tributário já foi constituído e a sua exigibilidade está suspensa, ou seja, já houve lançamento, mas não se pode cobrar, e nessa hipótese não há que se falar na ocorrência da prescrição diante de suspensão do prazo.
Sacha Calmon tem entendimento diverso, e afirma que nesse interregno em que há a concessão de medida liminar, seja em mandado de segurança ou qualquer outro tipo de ação judicial, o fisco não pode lançar[120]. Discordamos integralmente.
6.6.1.1. Negociação de dívidas tributárias e a suspensão dos prazos. 62. Quanto às negociações de dívidas tributárias (normalmente denominados REFIS), a jurisprudência entende que quando o sujeito passivo adere a programa de negociação, essa adesão se equipara a uma declaração do contribuinte de confissão espontânea do débito, e gera dois efeitos, (a) constitui o crédito tributário e reinicia a prescrição art. 174, IV[121], e (b) suspende a exigibilidade do crédito tributário (suspende a prescrição, 151, VI). O programa de negociação de débitos fiscais possui várias facetas, e apressadamente pode parecer um
benefício ao contribuinte, mas ter implicações gravosas que devem ser observadas atentamente, conforme explicaremos, verificar-se-á que auxílio profissional especializado ao aderir a programas de negociação de dívidas tributárias, pois é parte importante do planejamento tributário de qualquer empreendimento. Se o tributo ainda não foi lançado, a adesão ao REFIS tem o condão de constituir o crédito por meio da declaração espontânea; se já lançado suspende a prescrição (art. 151, VI do CTN).
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29/12/2010
Não pagamento
Contribuinte Primeiro Últ não paga a dia da da 1ª parcela prescrição pre Contribuinte quinquenal qui par inadimplente cob
Contribuinte antes de ser notificado do lançamento adere a
30/12/2010 30/
REFIS
juíz
CT Constituído
con
A prescrição inicia e é suspensa de imediato
Quando o sujeito passivo da obrigação interrompe o pagamento cabe ao sujeito ativo agir e retomar a execução, por isso, na prática, essas renegociações acabam por serem realizadas quando já existe execução fiscal que normalmente fica suspensa.
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01/01/2016 01/06/2020 01/0
Início da Último dia Adesão do Decadência. para o SP a SP fisco REFIS paga
notificar o Suspensão SP do da lançamento prescrição
parc
Con pres
SP notificado do
Não há Pres interrupção susp porque o por lançamento SP foi Início da notificado. Prescrição
No primeiro exemplo o sujeito ativo não sabia que o contribuinte lhe devia, ou mesmo que soubesse não havia tomado qualquer medida de cobrança ou fiscalizatória, então o sujeito passivo dirigiu-se livremente à Administração, e declarou por um ato inequívoco que lhe devia, aderindo ao programa de REFIS, esse ato teve o condão de encerrar a decadência, constituindo de imediato o Crédito Tributário e em segundo plano iniciando e suspendendo a prescrição. No segundo caso, o sujeito ativo agiu e notificou o
contribuinte, esse por força coercitiva, entendeu melhor parcelar o débito discutido, então o Crédito foi devidamente constituído, iniciando e suspendendo a prescrição imediatamente do dia 01/06/2020 até o dia 01/07/2020, dilatando o prazo prescricional em 01 mês, se o contribuinte não houvesse aderido ao REFIS a regra seria 01/01/2016 (início da prescrição) até 01/01/2021 (último dia).
6.6.2. Interrupção do prazo prescricional. 63. Art. 174. A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva. 64. interrompe:
Parágrafo único. A prescrição se
65. I - pela citação pessoal feita ao devedor; (revogado LCP 118/2005) 66.
I – pelo despacho do juiz que ordenar a
citação em execução fiscal; (Redação dada pela LCP nº 118, de 2005) 67.
II - pelo protesto judicial;
68. III - por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor; 69.
IV - por qualquer ato inequívoco ainda
que extrajudicial, que importe em reconhecimento do débito pelo devedor.
Como já afirmamos, não deve ser confundida com a suspensão, quando o prazo é interrompido ele recomeça, a exemplo do inciso I supramencionado, a administração possuía até o dia 10/10/2012 para intentar em juízo sua demanda, oferecida a ação, a prescrição recomeça com o despacho do juiz que defere a citação, serão contados novamente mais cinco anos. Com a reforma do inciso I em 2005, a diferença é que agora o contribuinte não poderá “esconder-se” para postergar o prazo e gerar a
prescrição, ou mesmo por ingerência judicial na citação do devedor, porque o que reinicia o prazo não é mais a citação do sujeito passivo, mas o despacho que ordena a citação. O que mais chama a atenção é o inciso IV porque quando o contribuinte reconhece que tem um débito com a fazenda, ele reinicia o prazo prescricional, e conforme a mais atual jurisprudência, a simples adesão a programa de negociação de dívida tributária (REFIS) a prescrição é ao mesmo tempo interrompida e suspendida. Interrompida porque ela será reiniciada e suspendida porque só se iniciará quando o contribuinte incorrer em mora. Ressalte-se que não há interrupção, nos termos do inciso IV quando o crédito já foi constituído por lançamento, mas somente quando há confissão espontânea.
7.
Prescrição Intercorrente.
Modalidade inicialmente prevista na Lei 6830 de 22 de setembro de 1980 (Lei de Execuções Fiscais -
LEF) em seu artigo 40, §4°, e trata da prescrição quando a fazenda pública, após ajuizada demanda executiva, essa é arquivada. Pacífica, jurisprudência nacional determina que o desinteresse do exequente enseja na prescrição intercorrente tributária, afinal o exequente não pode quedar-se inerte por tempo ilimitado[122]. Esse dispositivo de clamor social e jurisprudencial aplica interpretação sistemática para a criação da prescrição intercorrente no processo executivo fiscal, adotado, anteriormente à lei 11.051/2004[123], que acresceu o parágrafo 4°.
TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. DESPACHO CITATÓRIO. ART. 8º, § 2º, DA LEI Nº 6830/80. ART. 219, § 4º, DO CPC. ART. 174, DO CTN. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA. PRECEDENTES.
1. O art. 40, da Lei nº 6.830/80, nos termos em que foi admitido em nosso ordenamento jurídico, não tem prevalência. A sua aplicação há de sofrer os limites impostos pelo art. 174, do Código Tributário Nacional. 2. Repugna aos princípios informadores do nosso sistema tributário a prescrição indefinida. 3. Após o decurso de determinado tempo sem promoção da parte interessada, devese estabilizar o conflito, pela via da prescrição, impondo segurança jurídica aos litigantes. 4. Os casos de interrupção do prazo prescricional estão previstos no art. 174, do CTN, nele não incluídos os do artigo 40, da Lei nº 6.830/80. Há de ser sempre lembrado que o art. 174, do CTN, tem natureza de Lei Complementar.
5. A mera prolação do despacho que ordena a citação do executado não produz, por si só, o efeito de interromper a prescrição, impondo-se a interpretação sistemática do art. 8º, § 2º, da Lei nº 6.830/80, em combinação com o art. 219, § 4º, do CPC e com o art. 174 e seu parágrafo único do CTN. 6. Precedentes das 1ª Seção, 1ª e 2ª Turmas desta Corte de Justiça. 7. Agravo regimental não provido[124] (grifo nosso)
Suspenso o processo executivo fiscal, deve a fazenda impulsioná-lo no prazo de 06 anos, prazo, que, se excedido porá termo prescricional fatal ao direito da Fazenda Pública ao direito que pretenda na demanda, vejamos o quadro explicativo: --------*-----------------*--------------- -----------------*----*---------------------
10/02/2010 11/02/2010 11/02/2011 11/02/2016 Despacho Primeiro Primeiro dia Ùltimo dia para que do juiz que dia do prescricional a fazenda pública determinou prazo da (um ano após protocole pedido a suspensão suspensão. o despacho de desarquivamento da execução do feito e proceda que fiscal.
medida suspendeu a com de execução) inequívoca interesse processual
Não basta o pedido de desarquivamento, esse é até mesmo dispensável, necessário é o real impulso processual, efetiva medida de interesse da fazenda que requeira nova citação em novo endereço, indicação de novos bens ou informações úteis ao deslinde que ensejem em novas possibilidades de obtenção da pretensão. Atente-se que o processo foi arquivado por falta de bens ou informação do executado, e não será tão somente o pedido de desarquivamento que porá fim à prescrição
intercorrente.
7.1. 70.
No processo Administrativo Fiscal.
71. Em que pese nosso entendimento ser diverso, a jurisprudência não admite em processo administrativo fiscal a prescrição intercorrente, garantindo-se à Fazenda Pública prazo eterno para julgar demanda administrativa, estando suspensa a prescrição para propor a demanda executiva judicial, que se iniciará somente com a notificação do sujeito passivo da decisão administrativa transitada em julgado[125]. Incólume o direito de a Fazenda ajuizar executivo fiscal enquanto pender de resolução definitiva o processo administrativo, foi eternizado o crédito tributário a despeito dos princípios que regem a paz social. Essa omissão legal tem sabor amargo, refletido nos julgados que relutam em sistematizar a interpretação legal, rejeita o diálogo saudável entre as legislações em prejuízo ao contribuinte lesado por um processo fiscal
administrativo engavetado, por esquecimento, perda, demora, atolamento da administração pública, ou falta de vontade. O crédito tributário é de interesse da fazenda pública que deve prezar por seu resgate, difere da demora judicial já que esse integra a relação processual desinteressada, não se justifica a esquiva administrativa de suas obrigações quando lastreia-se para a resolução efetiva, observando os princípios da economia, celeridade e melhor interesse da administração pública, e, principalmente, a eficiência.
8.
A suspensão fática do prazo decadencial.
Trata-se de parecer da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional n° 070/2012[126] ao entender que, quando o sujeito passivo da obrigação dificulta sua notificação acerca do lançamento, a decadência estaria suspensa por conta de uma ocorrência fática que seria a impossibilidade de realizar a notificação porque a causa é
externa à administração. Esse entendimento tem base ainda em poucos estudos. Somos completamente contrários a essa teoria, pois que Decadência é matéria de Lei Complementar, ou seja, há de ter previsão legal, não se cria doutrinariamente ou jurisprudencialmente. As teses[127] que tentam encampar até então tal teoria cometem erro grosseiro confundindo prescrição com decadência e encampam para a suspensão da decadência por meio de liminar judicial que impediria o lançamento. Ao nosso ver esse argumento demonstra desconhecimento do instituto da decadência, pois liminar em mandado de segurança suspende a exigibilidade do crédito, ou seja, está se utilizando hipóteses aplicáveis à prescrição para fundamentar em decadência. Nenhum juízo de qualquer instancia pode impedir que o sujeito ativo notifique o sujeito passivo de ato preparatório ao lançamento, não há ilegalidade que corrobore tal impedimento, tal ato é privativo da autoridade administrativa e não pode ser suspenso pelo judiciário, sob pena de interferência inconstitucional entre
poderes. Obedecer a essa decisão judicial jamais suspenderá a decadência que terá seu curso normal, ensejando, no fim, numa possível perda do direito de lançar acaso o prazo seja atingido. Deve a procuradoria tentar reverter a decisão o quanto antes, em caso extremo de perda de direito, recomenda-se, inclusive o descumprimento da ordem judicial por ser manifestamente ilegal, portanto ambos os argumentos não servem de embasamento para a dita suspensão fática da decadência, a jurisprudência do STJ[128][129] corrobora com nosso entendimento de que suspensão de lançamento por decisão judicial não interrompe a decadência.
9.
Considerações Finais.
Por todo o exposto confirmamos que não é simples a interpretação da prescrição e da decadência aplicadas ao direito tributário, e é urgente a simplificação das normas. Mas não basta, deve ser rejeitada a desigualdade entre contribuinte e município que ainda
conserva seu prazo prescricional de “cinco mais cinco anos”, enquanto o sujeito ativo conta com apenas cinco anos do pagamento para pleitear a restituição nos casos de tributos sujeitos à homologação. Urge modificar os prazos para que sejam equivalentes sob pena de tratamento desigual, violando frontalmente o artigo 5°, caput da Constituição Federal. Também se faz necessária a inclusão da prescrição intercorrente no processo administrativo-fiscal ou outro mecanismo como a mora do credor para que não se postergue indefinidamente no tempo a obrigação administrativa de decidir e notificar o contribuinte em processo administrativo tributário. 10.
Bibliografia.
BRASIL. Lei Ordinária n° 5.172 de 25 de outubro de 1966. Código Tributário Nacional. Fonte: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5172.htm. Acesso em 25 de abril de 2012 72.
___________. Lei Ordinária n° 6.830 de 22
de setembro de 1980. Dispõe sobre a cobrança judicial da Dívida Ativa da Fazenda Pública, e dá outras providências. Fonte: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6830.htm. Acesso em 24 de abril de 2012 73. 74. ___________. Lei Ordinária n° 11.051 de 29 de dezembro de 2004. Dispõe sobre o desconto de crédito na apuração da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL e da Contribuição para o PIS/Pasep e Cofins não cumulativas e dá outras providências. Fonte: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato20042006/2004/Lei/L11051.htm# art6. Acesso em 24 de abril de 2012. 75. CALMON, Sacha: "Prescrição e Decadência em Matéria Tributária – Teoria Geral e Análise da Lei Complementar n° 118/2005”, in: Aurora Tomazini de Carvalho (org.), Decadência e prescrição em direito tributário. São Paulo: MP, 2010.
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. DE SANTI, Eurico Marcos Diniz. Decadência e Prescrição em Direito Tributário. 4ª ed. São Paulo: Saraiva. 2011. DE SANTI, Eurico Marcos Diniz. Lançamento Tributário. 3ª ed. São Paulo: Saraiva. 2010. SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. _____________________. Agravo Regimental nos embargos de Declaração no Agravo de Instrumento n° 446994 / RJ. Primeira Turma. Relator, Min. José Delgado. Publicado no Dje em 10/03/2003. Fonte: https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp?registro =200200445268&dt_ publicacao=10/03/2003 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n° 1192775 / SP. Segunda Turma. Relator, Min. Mauro Campbell Marques. Publicado em DJe em 24/08/2010. Fonte: https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp ? registro=201101334296&dt_publicacao=21/03/2012.
Acesso em 25 de abril de 2012.
_____________________. Agravo Regimental no Recurso Especial n° 1285895 / PR. Segunda Turma. Rel. Ministro Humberto Martins. Fonte: https://ww2.stj.jus. br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp? sLink=ATC&sSeq=18603663&sReg=201100369851&sDat Publicado em 07 de dezembro de 2011. Acesso em 24 de março de 2012.
_____________________. Recurso Especial n° 850321 / PE. Primeira Turma. Relator, Ministro Luiz Fux. Fonte: https://ww2.stj.jus.br/ revistaeletronica/ita.asp? registro=200302257566&dt_ publicacao=02/05/2005. Acesso em 25 de abril de 2012. _____________________. Recurso Especial 911489. Segunda Turma. Rel. Min. Castro Meira. Publicado em 10 de abril de 2007. Fonte: https://ww2.stj.jus.br /revistaeletronica/Abre_Documento.asp? sLink=ATC&sSeq=3003400&sReg=200602771588&sData Acesso em 25 de abril de 2012. Veja também AgRg no Ag 1337778 / MG _____________________. Recurso Especial 1113959 / RJ. Relator, Ministro Luiz Fux 1113959 / RJ. Fonte: https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento .asp?
sLink=ATC&sSeq=6855314&sReg=200900488813&sData Publicado no Dje em 11/03/2010.
_____________________. REsp 1113959. Rel. Ministro Luiz Fux. Publicado em 11/03/2010. Fonte: https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.as sLink =ATC&sSeq=8548157&sReg=200900488813&sData=2010 _____________________. Recurso Especial n° 1162026. Segunda turma. Relator Ministro Castro Meira. Dje. 22/112/2010. Fonte: https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica /ita.asp? registro=200900274 911&dt_publicacao=26/08/2010 SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Recurso Extraordinário n° 566621. Tribunal Pleno. Relatora Ministra Ellen Gracie. Publicado em 10/10/2011. Fonte: http:// redir.stf.jus.br/paginador pub/paginador.jsp? docTP=AC&docID=628479. Acesso em 25 de abril de 2012. .
3ª PARTE DIREITO TRIBUTÁRIO MUNICIPAL.
Capítulo 12 ESPÉCIES DE TRIBUTOS MUNICIPAIS: IMPOSTOS (ISS, IPTU, ITBI), TAXAS, CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA, CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA E CONTRIBUIÇÃO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA – COSIP. Alexandre Henrique Salema Ferreira [130]
1. INTRODUÇÃO. O atual sistema tributário nacional encontra-se detalhadamente inserido na Constituição Federal de 1988, que traz em seu corpo, dentre outras matérias tributárias, a repartição da competência tributária, os limites ao poder de tributar, as regras-matrizes de incidência e as espécies de tributos. A competência tributária está intimamente ligada à autonomia política dos entes federados. A forma de Estado federal impõe autonomia administrativa e financeira dos entes que o compõem. Cada ente federado possui, dentro da capacidade política que lhe foi constitucionalmente conferida, autonomia para legislar sobre os tributos inseridos na sua competência tributária específica, expressamente distribuída na Constituição Federal. Para Bastos (1998, p. 125), a competência tributária “[...] é a faculdade atribuída pela Constituição às pessoas de direito público com capacidade política para criar tributos”.
É através da repartição da competência tributária que a Constituição Federal individualiza os tributos de cada ente, chegando, no caso dos impostos, a enumerá-los exaustivamente. Com isso, impõe um limite intransponível ao exercício do poder tributante dos demais entes federados. Para Carrazza (1996, p. 102103): [...] nem a União pode invadir a competência tributária dos Estados, nem estes a da União. Do mesmo modo, aos Estados, porque juridicamente iguais entre si, é defeso se apossarem das competências tributárias uns dos outros. [...] nossa Carta Magna estruturou o País sob a forma de Federação e, para reforçá-la, repartiu as competências legislativas (inclusive as tributárias) entre a União e os Estados-membros.
Também é possível, a partir da análise do sistema tributário inserido na Constituição Federal de 1988, identificar as espécies de tributos. Antes de tratar, individualmente das espécies de tributos, especificamente dos Municipais, mostra-se de grande relevância abordamos as classificações dos tributos.
2. CLASSIFICAÇÃO DOS TRIBUTOS. Utilizando como critério para classificação dos tributos a contraprestação estatal, podemos segmentálos em vinculados, como sendo aqueles em que o fato gerador vincula-se a alguma contraprestação do Estado, como por exemplos as taxas e a contribuição de melhoria e, não vinculados. Neste último, o fato gerador do tributo independe de qualquer atividade estatal específica relativa ao contribuinte, tendo como exemplo os impostos[131]. Também é possível classificá-los em reais ou pessoais utilizando como critério a observância das condições pessoais do contribuinte. Será real quando forem desconsideradas as condições pessoais do contribuinte, incidindo diretamente sobre a coisa, como nos casos do IPTU e ITR, e será pessoal quando consideraram as condições pessoais do contribuinte, como por exemplo, o IR. Ressalve-se que a Constituição Federal no art. 145, §1° dispõe que, “Sempre que
possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, [...]”[132]. Ainda podemos classificar os tributos utilizando como critério a sua finalidade. Serão fiscais os tributos cujo objetivo preponderante foi arrecadar recursos para os cofres públicos – IPTU, ISS e ITBI, bem como serão extrafiscais os tributos que buscam interferir no domínio econômico, regulando-o, como por exemplo o Imposto de Importação. Neste ponto, deve-se ficar atento ao fato de que a fiscalidade e a extrafiscalidade não se anulam, ou seja, o tributo pode ser, e normalmente o é, fiscal e extrafiscal, alterando apenas a preponderância de um sobre o outro. O IPTU é um exemplo clássico, pois é preponderantemente fiscal, já que visa arrecadar recursos para o Município. Todavia, poderá ser utilizado com a finalidade extrafiscal para desestimular a manutenção de áreas desocupadas no perímetro urbano, entre outras. E por fim, temos a classificação econômica dos tributos que, pela sua importância será tratado em tópico especifico.
2.1 A classificação econômica dos tributos. Os tributos podem ser classificados em diretos, quando incidem diretamente sobre o contribuinte de fato; ou indiretos quando incidem juridicamente sobre o contribuinte de direito, que transfere o ônus para um contribuinte de fato que termina, indiretamente arcando com o custo do tributo. Como exemplo de tributo direto podemos citar o Imposto sobre Propriedade Predial Territorial Urbana – IPTU que incide, diretamente, sobre o proprietário, aquele que possui o domínio útil, bem como o possuidor de bem imóvel. Noutro giro, temos como espécie de tributo indireto o ICMS, IPI, tributos federais, que são transferidos para o consumidor não contribuinte destes impostos. Ressalve-se que a classificação dos tributos em diretos e indiretos não atende a critérios jurídicos, mas econômicos. Segundo Ataliba (2002, p. 143), “é classificação que nada tem de jurídica; seu critério é
puramente econômico. Foi elaborada pela ciência das finanças, a partir da observação do fenômeno econômico da translação ou repercussão dos tributos”. Na tributação direta, o contribuinte de fato, aquele que arca com o ônus econômico do tributo, coincide com o contribuinte de direito, aquele que a lei elegeu para cumprir a obrigação tributária. Na tributação indireta, ocorre o distanciamento entre aquele que deve cumprir a obrigação tributária, o contribuinte de direito, e aquele que efetivamente arcará com o ônus econômico do tributo. Neste caso, o contribuinte de fato pagará ao contribuinte de direito não só o valor das mercadorias, produtos ou serviços vendidos, mas também o montante do tributo devido. No entanto, cabe exclusivamente ao contribuinte de direito a obrigação de repassar para os cofres públicos os montantes tributários que oneraram o contribuinte de fato, isto é, consumidor. A tributação indireta aparta a obrigação jurídica tributária da capacidade econômica, o que implica na impossibilidade de se identificar a capacidade
contributiva individual, já que o ônus econômico do tributo não é assumido pelo sujeito passivo, mas por aquele que consome. Souto Maior Borges (2007, p. 187) aponta que “[...] ao direito tributário não interessa a figura do contribuinte de fato”. Neste mesmo sentido são as palavras de Carrazza (1996, p. 286): Esta classificação [econômica], em rigor, não é jurídica, já que, perante o Direito, é despiciendo saber quem suporta a carga econômica do imposto. O que importa, sim, é averiguar quem realizou seu fato imponível, independentemente de haver, ou não, o repasse do valor do imposto, para o preço final do produto, da mercadoria, do serviço etc.
Com a devida vênia, talvez não seja o Direito que não se interesse pelo contribuinte de fato ou pela classificação econômica dos tributos. Na verdade – pelos mesmos motivos que a norma jurídica não cuida de disciplinar a natureza constitutiva das coisas ou dos seres naturais, esta é inata à própria coisa ou ser, independe do Direito –, a enumeração na norma jurídica do contribuinte de fato ou da natureza econômica dos tributos apresentase desnecessária, tendo em vista que esses são
perfeitamente identificados pela natureza constitutiva (econômica) da espécie tributária. O que a norma jurídica cuida é de indicar o sujeito passivo, aquele que diante do Estado vai satisfazer a relação jurídico-obrigacional tributária. Mas, isso não implicar dizer que o contribuinte de fato e a classificação econômica do tributo sejam irrelevantes para o Direito. O Direito como ciência social aplicada enxerga além da técnica, do proceder. Aliás, o tecnicismo do Direito, que resulta em seu afastamento da realidade social, tem sido objeto de atentas considerações de Barcellona (2000, p. 142): [...] il codice dell’individuo moderno è una procedura per produrre codici [...] In questi termini il diritto moderno è essenzialmente una procedura. Per queste ragioni si può dire che la società moderna è per eccellenza una società giuridica, cioè uma società che si autorappresenta attraverso il suo diritto como diritto degli individui (una forma vuota). [...] Questa forma vuota riduce infatti il diritto a técnica e porta com sé il primado del mezzo sui fini.
O Direito como técnica tem resultado, não é prudente se esquecer, na imposição de normas que afetam
negativamente toda a coletividade. Aqui não se trata de por dúvidas no caráter democrático dessas normas jurídicas. Pelo contrário, apesar de democráticas, determinadas normas são suficientemente danosas à própria sociedade. Democracia e justiça social podem, não raras vezes, apresentar conflitos, cuja natureza meramente procedimental das regras do jogo democrático (BOBBIO) não tem se mostrado capaz de atenuar. Na verdade, o Direito como técnica, possui exacerbado apego à coerência interna da ordem jurídica: o que importa é a verificação da adequação constitucional e/ou legal das normas, pouco importando se essas são socialmente justas, se afetam a dignidade da pessoa humana ou, ainda, se subtraem as possibilidades materiais de sobrevivência humana digna. O resultado mais imediato do Direito como técnica é o esvaziamento do discurso jurídico, que se apresenta à sociedade cada vez mais desprovido de sentido, vazio, distante da realidade cotidiana das pessoas.
3. ESPÉCIES DE TRIBUTOS. De acordo com o Código Tributário Nacional, art. 5[133], e com o art. 145 da Constituição Federal[134], no Brasil existem 03 (três) espécies de tributos, são eles: impostos, taxas e contribuição de melhoria. Todavia, de acordo com o Supremo Tribunal Federal – STF existem 05 (cinco) espécies de tributos: impostos, taxas, contribuição de melhoria, empréstimo compulsório e contribuições (que se dividem em sociais, corporativas, de intervenção no domínio econômico – CIDE e iluminação pública – CIP ou COSIP). Os impostos, taxas e contribuição de melhoria podem ser instituídos, dentro da competência tributária de cada ente político, pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, conforme disposto no art. 145 da Constituição Federal de 1988: Art. 145. A união, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: I – impostos; II – taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos
específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição; III – contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas.
Os empréstimos compulsórios são da competência exclusiva da União, conforme disposto no art. 148, da Constituição Federal de 1988: Art. 148. A União, mediante lei complementar, poderá instituir empréstimos compulsórios: I – para atender a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência; II – no caso de investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional [...]
As contribuições especiais também são da competência tributária da União, podendo os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituírem, apenas, contribuição social para custeio do regime previdenciário próprio, conforme disposto no art. 149 da Constituição Federal de 1988: 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou
econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas [...] § 1º Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão contribuição, cobrada de seus servidores, para o custeio, em benefício destes, do regime previdenciário de que trata o art. 40 [...]
Para Coêlho (2002, p. 5), a competência tributária prevista no art. 145 da Constituição Federal de 1988, espelha duas realidades distintas: competências comuns e competências privativas. No primeiro caso, se incluiriam as taxas e a contribuição de melhoria, porque a Constituição Federal se exime de descrever os fatos jurígenos específicos necessários à instituição do tributo. A Constituição Federal de 1988 apenas descreve genericamente as regras-matrizes das taxas e da contribuição de melhoria, ficando todos os entes políticos autorizados a instituírem esses tributos, desde que a contraprestação esteja incluída no âmbito de competência do ente federado. Ou seja, a Carta Magna não enumera quais obras públicas poderiam figurar como regra-matriz de incidência da contribuição de melhoria. O mesmo ocorre com as taxas:
Basta que qualquer pessoa política vá realizar um regular ato do poder de polícia que lhe é próprio ou vá prestar um serviço ao contribuinte, se específico e divisível, para que o seu legislador, incorporando tais fatos na lei tributária, institua uma taxa (COÊLHO, 2002, p. 5).
Nessa situação, a Constituição Federal não discrimina, expressamente, as taxas e a contribuição de melhoria. Sendo assim, a repartição da competência tributária será atribuída ao ente federado que realizou a obra pública, que redunde em valorização imobiliária, ou exerceu o regular poder de polícia ou, ainda, prestou serviço público, específico e divisível, referível ao contribuinte, ou posto à sua disposição. Apenas para fins de detalhamento conceitual, considera-se serviço público utilizado efetivamente pelo contribuinte aquele por ele usufruído a qualquer título; e, potencialmente, quando, sendo de utilização compulsória, sejam postos à sua disposição mediante atividade administrativa em efetivo funcionamento. Noutro giro, no caso da competência privativa, a Constituição Federal enumera exaustivamente
os tributos incluídos na competência tributária de cada ente federado, como ocorre com os impostos e com as contribuições especiais. Além da competência privativa e comum, que são as centrais para o deslinde do presente estudo, por questão didática, cabe-nos mencionar a existência da competência residual: exclusiva da União que, por lei complementar, poderá criar novos impostos nãocumulativos e com fato gerador e base de cálculo diferente dos discriminados na CF/88, e dos Estados/Distrito Federal para instituir taxas já que estes possuem a competência residual na divisão constitucional de competências administrativas. Além da competência múltipla, prevista no art. 147 da CF, em que compete à União, em Território Federal, cumulativamente aos impostos federais, os impostos estaduais e, se o Território não for dividido em Municípios, cumulativamente, os impostos municipais; e ao Distrito Federal cabem os impostos municipais[135]. Ressalve-se que o Distrito Federal, por proibição constitucional, não pode ser dividido em municípios. E, por fim, temos a competência
extraordinária[136] exclusiva da União que por lei ordinária (ou medida provisória), em caso de guerra externa ou na sua iminência, poderá instituir imposto novo não previsto na Constituição, sobre o mesmo fato gerador de outro imposto de competência privativa, ordinária, de qualquer ente federado. 4. ESPÉCIES DE TRIBUTOS MUNICIPAIS. Os Municípios/Distrito Federal podem instituir os seguintes tributos: 1) Imposto sobre serviços – ISSQN; 2) Imposto sobre propriedade predial territorial urbana – IPTU; 3) Imposto sobre transmissão de bens inter vivos – ITBI; 4) Taxas; 5) Contribuição de Melhoria; 6) Contribuições Previdenciárias e 7) Contribuição de Iluminação Pública – CIP. Estes tributos serão, exaustivamente, tratados neste livro, todavia, de forma introdutória podemos asseverar que: 1. O Imposto sobre serviços de qualquer natureza - ISSQN, de competência dos Municípios e do
Distrito Federal, tem como fato gerador a prestação de serviços constantes da lista anexa à Lei Complementar 116/03, ainda que esses não se constituam como atividade preponderante do prestador. O imposto incide também sobre o serviço proveniente do exterior do País, ou cuja prestação se tenha iniciado no exterior (art. 1º, §1, da Lei Complementar nº. 116/03); 2. O Imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana - IPTU, de competência dos Municípios e Distrito Federal tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel, por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município (art. 32 do CTN). Ressalvese ainda que a lei municipal pode considerar urbanas as áreas urbanizáveis ou de expansão urbana, constantes de loteamentos aprovados pelos órgãos competentes, destinados à habitação, à indústria ou ao comércio, mesmo que localizados fora das zonas definidas nos termos do parágrafo anterior; 3. O Imposto sobre transmissão de bens intervivos – ITBI, de competência dos Municípios e
Distrito Federal tem como fato gerador a transmissão intervivos, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição (art. 156, inc. II da CF/88); 4. As taxas poderão ser instituídas dentro do restrito âmbito das atribuições dos Municípios para fazer frente ao custeio de gastos com o exercício regular do poder de polícia (taxas de polícia) e com a prestação de serviço público específico e divisível (taxas de serviço), referível ao contribuinte ou posto à sua disposição; 5. A Contribuição de Melhoria poderá ser instituída pelos Municípios para fazer frente ao custeio de obra pública da qual decorra valorização imobiliária; 6. A Contribuição Previdenciária Municipal poderá ser instituída e cobrada pelos Municípios, dos seus servidores, para custeio em benefício destes, do regime previdenciário de que trata o art. 40 da Constituição Federal; 7. Por fim, a Contribuição de Iluminação Pública, prevista no art. 149-A da CF/88, atribui
competência aos Municípios e ao Distrito Federal de instituírem e cobrarem contribuição, na forma das respectivas leis, para o custeio do serviço de iluminação pública. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS. O presente capítulo não teve o objetivo de exaurir as espécies tributárias municipais e sim tecer as breves considerações introdutórias sobre estas, reservando-se para os próximos capítulos o enfrentamento das questões mais polêmicas e relevantes. REFERÊNCIAS ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2002.
BARZOTTO, Luis Fernando. Justiça social: gênese, estrutura e aplicação de um conceito. Revista Jurídica Virtual, v.4, nº 48, mai. 2003. Disponível em:
Acesso em: 22 ago. 2004. BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito financeiro e de direito tributário. 6. ed. ampl. e atual. São Paulo: Saraiva, 1998. BORGES, José Souto Maior. Introdução ao direito financeiro. 2. ed. São Paulo: Max Limonad, 1998. CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 8. ed. rev. e ampl. São Paulo: Malheiros, 1996. COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Manual de direito tributário. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
Capítulo 13 INCIDÊNCIA DO ISS SOBRE O ARRENDAMENTO MERCANTIL DE BENS MÓVEIS E IMÓVEIS – LEASING Eduardo Coelho[137] 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS. Nos últimos anos, instituições financeiras e municípios de todo o país vêm travando uma acirrada disputa nos tribunais brasileiros, em decorrência das operações de arrendamento mercantil executadas por tais entes. Em apertada síntese, uma vez que o assunto será desenvolvido ao longo deste artigo, a discussão iniciou-se com a definição acerca da constitucionalidade da incidência do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISS sobre as receitas auferidas com tais atividades, tema já superado em razão da análise, pelo
Supremo Tribunal Federal, sob a relatoria do então Ministro Eros Grau, do leading case[138], no qual restou decidido pela constitucionalidade da dita cobrança, consoante será detalhado mais adiante. Atualmente, as questões centrais atinentes à discussão apresentada remetem à necessidade de resolução acerca do município competente para fazer cobrança, bem como da base de cálculo a ser utilizada para fins de cobrança. Só após essas definições é que se poderá construir um panorama juridicamente seguro, para os sujeitos ativos e passivos da referida relação jurídica tributária. Já há algum tempo, os Municípios vêm aumentando seus mecanismos de controle e fiscalização do adimplemento das obrigações tributárias pelos contribuintes, como uma das formas de garantir um incremento na arrecadação e de sustentar a máquina pública de forma equilibrada, face, principalmente, à concentração da arrecadação nas mãos da União e dos estados.
A situação apontada torna-se ainda mais importante quando envolve algum tributo municipal, tendo em vista a pulverização da discussão nos mais de 5.000 municípios[139] brasileiros e, pior, no caso do ISS, na hipótese de mais de um município pleitear uma dada exação incidente sobre um único fato gerador, tal como não raro ocorre no caso sob análise. A “pulverização” dessa discussão fica ainda mais evidente com a constatação de que as operações de leasing financeiro são extremamente comuns para a aquisição de veículos por parte de pessoas físicas e jurídicas. Nesse sentido, tem sido bastante comum observar a cobrança do ISS, por parte dos municípios em que os arrendatários dos veículos possuem residência ou domicílio, para fins de emplacamento do aludido bem. Por esse motivo, não é de se surpreender o fato de que, em Pernambuco[140], por exemplo, praticamente todos os municípios possuem demandas dessa natureza. Não é de se duvidar, portanto, que o mesmo fenômeno seja observado nas demais unidades da
federação, fato que traz ainda mais peso à dita questão. Diante desse cenário, neste artigo, pretende-se enfrentar a problemática da incidência do ISS sobre as operações de arrendamento mercantil (leasing), após a definição de sua constitucionalidade pelo STF. Será dada especial atenção para a configuração (ou não) das operações de leasing enquanto serviços, para fins de incidência do ISS, bem como serão analisados os critérios definidores da competência para um dado município instituir e cobrar o mencionado imposto. Para atingir os objetivos ora traçados, serão estudadas, preponderantemente, a doutrina sobre o tema, a legislação e a posição histórica dos tribunais pátrios em casos similares, bem como as decisões já existentes, e não menos conflitantes, sobre o caso específico da incidência do ISS sobre as operações de leasing nos tribunais brasileiros. 2. DEFINIÇÃO DE ARRENDAMENTO MERCANTIL.
O arrendamento mercantil possui uma caracterização complexa, que mescla, dentre outros, elementos tanto da locação quanto da compra e venda. Nos termos da legislação que rege a matéria, trata-se de negócio jurídico realizado entre pessoa jurídica, na qualidade de arrendadora, e pessoa física ou jurídica, na qualidade de arrendatária, e que tenha por objeto o arrendamento de bens adquiridos pela arrendadora, segundo especificações da arrendatária e para uso próprio desta[141]. Existem três modalidades de arrendamento mercantil, quais sejam, o operacional, o financeiro e o lease-back. No lease-back, o proprietário do bem o vende para o arrendador, a fim de que este proceda ao arrendamento, disponbilizando-o para o antigo proprietário. Trata-se de uma forma de desmobilizar capital e obter mais giro para o exercício das atividades de uma dada empresa. A definição do leasing operacional e a do financeiro encontram-se previstas na Resolução n° 2.309,
de 28 de agosto de 1996, do Banco Central do Brasil, em seus artigos 5º e 6º[142] e [143]. No operacional, uma determinada empresa, proprietária do bem, aluga este ao seu cliente, que, ao término do contrato firmado, pode optar pela respectiva aquisição, devolução ou mesmo pela renovação da avença. Já no financeiro, o cliente opta pela compra do bem no início da operação, fixando-se um preço ou optando pelo preço do mercado por ocasião do término do contrato. Nessa modalidade, o proprietário do bem o adquire para posterior “repasse” ao arrendatário, que o havia escolhido previamente. A doutrina pátria é uníssona ao validar os conceitos das modalidades de arrendamento mercantil ora detalhadas. Vejamos o que diz o ilustre mestre Caio Mário (2008, p. 240): O objeto do leasing operacional constitui-se de bens móveis duráveis, que o arrendador tem em stock; no leasing financeiro o arrendatário indica o bem que deseja, e o arrendador obriga-se a adquiri-lo, se não o possui. Sendo o leasing financeiro contrato personalíssimo em relação ao arrendatário, não pode este transferi-la terceiro sem expressa anuência do arrendador.
Ainda no que diz respeito ao leasing financeiro, além das contraprestações mensais, o cliente fica sujeito ao pagamento do Valor Residual Garantido – VRG, que consiste no preço a ser pago para que a propriedade do bem em questão seja transferida para a sua esfera patrimonial e que pode ser diluído nas parcelas pagas mês a mês, conforme entendimento já consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça[144], afastando os efeitos da Súmula n° 263 da aludida corte[145]. Interessante, ainda, atinar para as palavras de Venosa (2007, p. 543), segundo o qual “Em estreita síntese, significa contrato de locação com opção de compra pelo locatário.” Ainda complementa dispondo que: O arrendamento mercantil, como percebemos, é formado por um complexo de relações negociais, nas quais podem ser identificados claramente vislumbres de locação, promessa de compra e venda, mútuo, financiamento e mandato. Na maioria de suas modalidades, existe uma promessa unilateral de venda. Não é, no entretanto, elemento necessário em toda versão desse instituto. [...] Sua idéia centralizadora, todavia, é sem dúvida a locação de coisas.
Como se pode observar, a multiplicidade de elementos contidos no leasing é inegável. Não se pode refutar, igualmente, o conteúdo financeiro dessa modalidade de contrato, bem como os claros, e não menos centrais, elementos de compra e venda e, sobretudo, da locação. Não restam dúvidas, portanto, de que as características dos contratos de arrendamento mercantil, cujo escopo central é disponibilizar a posse de um bem a favor de um terceiro, remetem a uma clara obrigação de dar, premissa essencial para o desenvolvimento do presente estudo. 3. COMPETÊNCIA. 3.1 Conceito. Carrazza (2002, p. 257) define a competência como “a aptidão para criar, in abstracto, tributos”. Dessa forma, não se trata de um poder absoluto, discricionário, mas com limites impostos pelo próprio Estado, através da
Constituição. Assim, há que se observar a subordinação às normas constitucionais. É exatamente por esse motivo, completa o mestre, que se deve falar em competência, e não em poder tributário, uma vez que este será sempre absoluto, ao passo que aquela será sempre moldada pela legislação hierarquicamente superior. Machado (2002, p. 37), a seu turno, define-a como o “poder tributário juridicamente delimitado e dividido entre os entes que compõem a Federação”. Dessa forma, cada Unidade da Federação deverá observar as normas emanadas pelas Unidades distintas, a fim de exercerem a competência que lhes foi concedida sem extrapolar os limites impostos. É o caso, por exemplo, da legislação estadual não poder ir de encontro às leis municipais. Visto isso, podemos dizer que a competência tributária é uma forma de manifestação do poder estatal, do jus imperi, o qual dá atribuições às entidades que compõem a Federação para estas instituírem tributos, mas sempre dentro dos limites impostos pelas normas que
regulamentam o sistema. Assim, o poder
não
será
absoluto,
corroborando com as ideias dos doutrinadores ora comentados. Vale repisar que, seguindo as palavras de Baleeiro (1981, p. 72), os entes tributantes jamais podem renunciar à competência tributária que lhes foi outorgada de forma indelegável, consoante veremos adiante. Quando não desejar instituir ou cobrar tributos, completa Baleeiro (1981), estar-se-á deixando de exercer a competência, mas nunca renunciando a ela. Esta inércia, em face da indelegabilidade, tampouco possibilita que outro ente de direito público interno exerça esta atribuição. 3.2 Características. Com arrimo nas normas de regência, bem como nos ensinamentos de Melo (1997, p. 84-85), podem ser identificadas cinco características básicas da competência tributária. Vejamos:
Primeiramente, aparece a incaducabilidade. Esta não se encontra expressa em norma alguma, tendo em vista que inexiste qualquer dispositivo determinando um lapso temporal durante o qual o ente político deve exercer a competência tributária, sob pena de caducar.
Em seguida, consoante já adiantado no tópico precedente, a competência tributária é indelegável e irrenunciável. Indelegável na medida em que, além de o art. 7º do Código Tributário Nacional o dizer de forma expressa[146], a Constituição Federal é taxativa, em seu Título VI – Da Tributação e do Orçamento, ao outorgar a cada ente federativo, individualmente, a competência para instituir e cobrar determinados tributos. Não poderá, tampouco, o ente político renunciar a tal competência, mas, como foi dito anteriormente, apenas deixar de exercê-la sem, contudo, outro ente fazê-lo. A terceira característica é a da inalterabilidade. Assim, não poderá ser modificada, salvo a edição de Emenda Constitucional, visando modificar a distribuição das competências levada a cabo pela Lei Maior.
A privatividade, por sua vez, surge como uma consequência lógica da titularidade da competência tributária outorgada pela Constituição Federal. Apenas os entes políticos mencionados no texto constitucional instituirão e exigirão, dos sujeitos passivos ou responsáveis, os tributos de sua órbita de competência. Por derradeiro, tem-se a característica da facultatividade. Isto é, o ente político apenas exercitará sua competência quando achar o momento oportuno. Caso não queira cobrar o tributo, nenhum outro ente político poderá fazê-lo em seu lugar, por falecer a este competência para tanto. Mendonça (2004, p. 294) contesta as características enumeradas anteriormente e afirma que apenas duas, quais sejam, facultatividade e irrenunciabilidade, são compatíveis como o ordenamento jurídico pátrio. Para a autora, a incaducabilidade não pode ser considerada como característica da competência tributária em face da existência de previsões constitucionais delimitando no tempo a prática da competência legislativa, tal como se observava com
relação à antiga CPMF, extinta no final de 2007. Já a inalterabilidade da competência tributária seria afastada na medida em que há a possibilidade de alterá-la por meio de reforma constitucional, bem como no âmbito infralegal, para assegurar aos contribuintes outras garantias não encontradas no texto constitucional. A indelegabilidade, continua a autora, não seria uma característica da competência tributária por força do artigo 68[147] da Constituição Federal, o qual permite a elaboração de lei delegada pelo Presidente da República, condicionada à prévia autorização do Congresso Nacional. Finaliza sua crítica negando o atributo da privatividade à competência tributária. Isso porque, completa, apenas a União possui competência exclusiva, não podendo, assim, se tratar de uma característica geral. Apesar de as palavras de Cristiane Mendonça serem solidamente fundamentadas, concordamos com o rol apresentado por Eduardo Soares de Melo, o qual possui a mesma opinião externada por doutrinadores do quilate de Carraza (2002, p. 356-463). Cremos ser esta a melhor classificação tendo
em vista que as características elencadas revelam-se, efetivamente, como atributos gerais, enquanto os pontos apresentados por Cristiane Mendonça, exceções que não retiram a generalidade atribuída a estes. 3.3 Dos impostos. Os impostos encontram sua fundamentação constitucional insculpida no artigo 145, I, da Carta Magna[148]. Tratam-se, nas palavras de Harada (2008, p. 300), de tributos não vinculados a uma atuação estatal específica, cujo fato gerador não pressupõe qualquer atividade do Estado relativa ao contribuinte[149]. Nessa mesma linha, podemos citar autores como Machado Segundo (2007, p. 138) e Paulo de Barros Carvalho (2008, p. 34-36). Geraldo Ataliba (2005, p. 138-139), por sua vez, sugere a utilização do critério da exclusão para a identificação do tributo, enquanto imposto. Para o saudoso mestre, todo tributo, cuja materialidade da hipótese de incidência não representar uma atuação estatal, trata-se de
um imposto, sendo irrelevante a respectiva denominação. A atual redação do artigo 167, IV, da Constituição Federal, dada pela Emenda Constitucional n° 42, de 19 de dezembro de 2003, serve como arrimo para a sustentação desse argumento na medida em que veda a vinculação da arrecadação de impostos a órgão, fundo ou despesa[150]. Por outro lado, o artigo 4º, II, do Código Tributário Nacional[151], vai no caminho inverso, estabelecendo que a destinação legal do produto da arrecadação dos tributos seria irrelevante para a determinação da respectiva natureza. Entendemos, por uma questão de hierarquia e para fins de adequar o direito às evoluções legislativas (reflexo das sociais e doutrinárias na maioria dos casos), que deve prevalecer o entendimento extraído do texto constitucional, devendo ser observadas as exceções ali destacadas. Qualquer entendimento em sentido contrário daria ensejo à, por exemplo, criação de “impostos” com a vinculação da respectiva receita, os quais seriam
fatalmente julgados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, tal como ocorreu na Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 1.750/DF[152]. Assim, ainda que não seja o fator decisivo para a individualização das espécies tributárias, comungamos com a ideia de que a destinação legal do produto da arrecadação de um dado tributo possui relevância para a sua classificação, em observância à realidade fática existente e, principalmente, à ordem constitucional vigente. 3.4 Dos impostos municipais Os impostos municipais encontram seu fundamento insculpido no artigo 156 da Constituição Federal[153], pelo qual tais entes federativos poderão tributar a propriedade predial e territorial urbana, a transmissão inter vivos e os serviços de qualquer natureza, sendo a tributação destes o objeto do presente artigo. A competência, como visto anteriormente, não
caduca, é indelegável, irrenunciável, inalterável, privativa, e facultativa. Dessa forma, apenas os municípios e o Distrito Federal poderão instituir o imposto em tela, em detrimento de qualquer outro ente federativo, sob pena de inconstitucionalidade absoluta da tentativa em comento. Nesse sentido, especificamente no que diz respeito ao Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISS, tem-se, como regra geral, a Lei Complementar n° 116, de 31 de julho de 2003, que serve como alicerce para os Municípios instituírem a dita exação dentro de seus limites territoriais, por meio de Lei Municipal, de modo a legitimar a respectiva cobrança em face dos diversos sujeitos passivos. 4. IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS DE QUALQUER NATUREZA. REGRA MATRIZ DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA. Para se obter uma compreensão plena do problema ora proposto, concatenando os conceitos e
posições defendidas atualmente, é imperioso realizar uma análise da regra-matriz de incidência do imposto em discussão, que constitui a norma jurídica geral e abstrata que institui o tributo, sendo ela composta pela hipótese e pelo consequente normativo. A hipótese é que, na lei, prevê a situação passível de tributação, é o descritor de em evento ainda não ocorrido, que, verificado faticamente, faz aparecer o vínculo abstrato previsto no consequente normativo. Trata-se de um conceito eminentemente abstrato, previsto em lei, que descreve um fato genérico, sem influência de qualquer fato concreto e não se confunde com este. Possui três critérios identificadores, quais sejam, o material, o espacial e o temporal, a seguir detalhados e é una e indivisível. A mitigação de qualquer desses aspectos lhe retira a sua caracterização enquanto ente lógico-jurídico e a conjunção fática destes, juntamente com o consequente, faz surgir uma obrigação jurídica efetiva (ATALIBA, 2005, p. 65). Nesse sentido, deve haver o que a doutrina
descreve de subsunção do fato à norma, ou seja, o fato concreto, quando preenche todos os requisitos previstos de maneira abstrata na lei, faz nascer a obrigação tributária. O critério material vem a ser a descrição dos atos e/ou fatos necessários à ocorrência da tributação em tela. É, nas palavras de Carvalho (2008, p. 285), o núcleo da descrição fática, isto é, descreverá pessoas, situações, comportamentos, dentre outros elementos materialmente relevantes para a configuração do fato. Segundo Geraldo Ataliba (2005, p. 106), trata-se do aspecto mais complexo da hipótese de incidência, tratando-se da própria consistência material do fato ou estado de fato descrito pela hipótese de incidência; é a descrição dos dados substanciais que servem de suporte à hipótese de incidência. O critério espacial da hipótese tributária, nas palavras do festejado mestre (2005, p. 288-291), remete a um condicionante ainda indeterminado do espaço, dentro do qual a lei surtirá efeitos, mas ainda a ser especificado, por ocasião da ocorrência do respectivo fato jurídico
tributário. Apontará o local onde o fato deverá acontecer, a fim de que haja a observância da norma tributária. Geraldo Ataliba (2005, p. 104) ainda complementa observando que o aspecto espacial se revela como uma autêntica consequência do princípio da territorialidade da lei, o que, ao nosso ver, está colocado de forma bastante pertinente. O critério temporal da hipótese tributária constitui-se como uma referência futura de tempo, a qual, uma vez observada, irá ensejar a ocorrência do fato, a ser delimitada e especificada conforme o caso (elemento temporal do fato), delineando quando o fato haverá ocorrido. Revela o momento específico em que o fato imponível se consuma. Descreve a hipótese, assim, a situação hipoteticamente posta a ser observada em local e tempo determinados, a fim de, implementadas as condições ali previstas, tornar-se um fato jurídico tributário. Nesse sentido, na medida em que idealiza situações hipotéticas a ocorrerem num futuro indeterminado, daí a sua função descritora.
O consequente normativo aponta o que irá haver, uma vez verificada a situação prevista na hipótese, e é o prescritor dos efeitos da ocorrência desta, consoante as sempre fecundas lições de Carvalho (2008, p. 313). Possui, em sua estrutura, dois critérios de conformação, quais sejam, o pessoal e o quantitativo. O critério pessoal é composto, de um lado, pelo sujeito ativo, que, a despeito do artigo 119 do Código Tributário Nacional, o qual restringe sua identificação às pessoas jurídicas de direito público, vem a ser o ente, público ou privado, pessoa física ou jurídica, competente para exigir o adimplemento da obrigação tributária. Do outro lado, o sujeito passivo vem a ser a pessoa, física ou jurídica, de direito público ou privado, da qual o sujeito ativo irá exigir o cumprimento da obrigação tributária. Finalmente, o critério quantitativo determina o quantum a ser suportado pelo sujeito passivo e exigido pelo sujeito ativo da relação jurídica tributária, na maioria das vezes pela conjunção entre a base de cálculo
e a alíquota, conforme se verá adiante. Discordamos, data venia, nesse ponto, da posição de Carvalho (2008, p. 356-357), ao afastar as alusões aos tributos fixos, tais como algumas taxas ou o ISS cobrado dos profissionais liberais, pelo fato de que a Constituição Federal teria eleito a base de cálculo (além da hipótese normativa) como elemento diferenciador dos tributos. Nossa discordância da posição do renomado doutrinador, que afirma que o montante será definido sempre em conjunto pela base de cálculo e alíquota, remete ao fato de entenderemos não ser possível olvidarmos de uma forma de quantificação do tributo devido existente (e não rara) no nosso sistema tributário e cuja validade não é questionada. Passada essa discussão, tem-se que a base de cálculo possui três funções: uma mensuradora do fato; outra objetiva, para determinar o valor da dívida; e, por fim, uma função comparativa, que serve para confirmar, infirmar ou afirmar o elemento material contido no antecedente normativo.
A alíquota, por fim, possui o papel de, objetivamente, somar-se à base de cálculo, para se chegar ao valor a ser recolhido ao erário. A depender da intenção do legislador, poderá ser progressiva ou diferenciada em razão de peculiaridades pessoais dos sujeitos passivos destinatários da norma tributária. Visto isso, é possível identificar, genericamente, os elementos formadores da regra matriz de incidência do Imposto sobre os Serviços de Qualquer Natureza, o que facilitará a análise da pertinência da tributação das operações de arrendamento mercantil, na forma detalhada no tópico seguinte. 4.1 Análise da “regra matriz de incidência tributária” do ISS sobre as operações de leasing. 4.1.1 Da adequação do aspecto material A Constituição Federal de 1988 atribuiu aos municípios a competência para legislar sobre o ISS e foi taxativa ao definir a prestação de serviços como aspecto
material da hipótese de incidência tributária, nos termos de seu artigo 156, III. É certo que o texto constitucional não conceitua o que seriam serviços de qualquer natureza, em razão de que se deve atentar para o artigo 110, do Código Tributário Nacional[154]. A esse respeito, faz-se mister atinar para as sempre fecundas lições do mestre Harada (2008, p. 39), o qual delimita o campo de incidência do ISS apenas nos casos em que, efetivamente, houver a prestação de serviços, ipsis litteris: A partir das distinções entre obrigações de fazer e de dar, pode-se afirmar: O ISS só pode incidir sobre prestação de serviço, assim entendido o produto do esforço humano que se apresenta sob forma de bem imaterial, ou no caso de implicar utilização de material preserve a sua natureza no sentido de expressar uma obrigação de fazer, isto é, ter como objeto da prestação a própria atividade;
Como se pode observar, a prestação de serviço resulta diretamente de uma obrigação de fazer, que não pode ser mitigada pela legislação pátria, sob pena de infringir os comandos legais e constitucionais ora
abordados. A necessidade de o serviço assim ser configurado, aliás, já foi objeto de análise pelo Supremo Tribunal Federal, nos autos do Recurso Extraordinário n° 116.121-3, em que tal obrigatoriedade restou consignada no voto vencedor do Ministro Marco Aurélio[155]. Resta patentemente demonstrado, portanto, que, para que um item previsto na lista anexa à Lei Complementar n° 116/2003 venha a ser considerado como um serviço, é imprescindível que ele ontologicamente se demonstre enquanto tal, ou seja, que represente uma efetiva obrigação de fazer, um esforço humano. No caso em apreço, não restam dúvidas de que o arrendamento mercantil, já caracterizado anteriormente, não preenche esse requisito. Trata-se de uma exigência materialmente inconstitucional, uma vez que inexiste prestação de serviço, por ocasião da realização da dita operação. Com efeito, o leasing possui uma natureza reconhecidamente complexa. Possui elementos da locação, do financiamento e da compra e venda, sendo
esta a conceituação dada por Restiffe Neto (1985, p. 7): [...] (o leasing) tem na locação a médio prazo a sua essência, com a eventualidade de transformar-se ao final em venda, em que as importâncias pagas a título de aluguel passam a constituir parte do pagamento do preço estimado, segunda as conveniências do empresáriolocatário, isto é, o aluguel converte-se em amortização da dívida que, ao final, pode surgir da efetivação de compra e venda desde o início possibilitada na opção franqueada ao locatário.
Sobre a conceituação perseguida, é importante atentar novamente para as lições de Harada (2008, p. 165), que estão em estrita consonância com o que ora se pretende demonstrar: Trata-se, na realidade, de uma categoria intermediária entre a compra e venda e a locação, exercendo função parecida com a da venda e compra com reserva de domínio e com a alienação fiduciária, embora oferecendo ao utilizador do bem maior leque de alternativas no caso de a parte não querer ficar com a propriedade do equipamento, no final do prazo contratual. O leasing tem, pois, ligações com a compra e venda, locação e financiamento.
Percebe-se que os elementos que compõem a
estrutura da operação do leasing, em momento algum, se aproximam da prestação de serviços, de modo a ensejar a tributação pelo ISS. Pelo contrário, todas elas não estão no campo de incidência da mencionada exação. Assim, mesmo sendo considerado contrato típico, não se pode olvidar a estruturação da operação, que se constitui, unicamente, numa obrigação de dar. Pelas razões expostas, na esteira da doutrina acima transcrita, é que, a despeito da sua previsão na lista anexa à Lei Complementar n° 116/2003 e do pronunciamento do Supremo Tribunal Federal no leading case, conforme adiante detalhado, é inconstitucional a incidência do ISS sobre as operações de leasing 4.1.2 Da adequação do aspecto espacial. Passada a discussão sobre o aspecto constitucional do ISS sobre as operações de leasing, cumpre ao Superior Tribunal de Justiça, definir os demais elementos da relação tributária estudada.
Diversos municípios, em todo o Brasil, vêm tentando exigir o ISS de instituições financeiras, tomando por base a existência de automóveis cujas placas se encontram matriculadas com endereços dessas localidades, ainda que o emplacamento, a operação de compra e venda ou o financiamento não tenham sido efetuados dentro dos seus limites territoriais. Em razão disso, também se faz necessária uma análise do local em que tal exação venha a ser efetivamente devida, caso sejam seguidos os entendimentos daqueles que opinam pela possibilidade de tributação dessas operações. A Lei Complementar n° 116, de 31 de julho de 2003, estabelece as regras gerais a serem observadas pelos sujeitos da relação jurídica tributária ligada à incidência do ISS. No que tange ao local da prestação de serviços e ao sujeito competente para cobrar a exação em tela, faz-se mister realizar uma análise conjunta dos artigos 3º e 4º, do mencionado diploma legal, litteris:
Art. 3o O serviço considera-se prestado e o imposto devido no local do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador, exceto nas hipóteses previstas nos incisos I a XXII, quando o imposto será devido no local:(...) Art. 4o Considera-se estabelecimento prestador o local onde o contribuinte desenvolva a atividade de prestar serviços, de modo permanente ou temporário, e que configure unidade econômica ou profissional, sendo irrelevantes para caracterizá-lo as denominações de sede, filial, agência, posto de atendimento, sucursal, escritório de representação ou contato ou quaisquer outras que venham a ser utilizadas.
Depreende-se, assim, que o local da prestação de serviços deve ser aquele em que a instituição financeira esteja sediada ou onde exerça suas atividades, de modo a configurar unidade econômica, na forma do artigo 4º acima transcrito. Nesse sentido, entendemos como insubsistente qualquer tentativa das autoridades fiscais em buscarem a cobrança do referido imposto em locais diversos daquele em que o sujeito passivo possua sua sede, tal como nos municípios em que os veículos têm seus endereços registrados, locais onde ocorre a simples captação dos clientes.
A operação como um todo, que, no nosso sentir, não é um serviço, ocorre fora dos limites dos Municípios em que seus proprietários apontam endereço (local do registro das placas), mas, conforme exibido anteriormente, onde está sediado o sujeito passivo, pois é lá onde são praticados todos os atos necessários ao aperfeiçoamento da contratação. Sobre o assunto, são pertinentes as lições de Martins (p. 204, 2006), o qual demonstra com absoluta clareza o raciocínio que ora se detalha: [...] (não importa) onde a contratação é feita, onde a empresa mantém a sua contabilidade ou onde ela é escriturada, onde o serviço é pago. O que importa realmente é onde é efetuada a prestação de serviços. [...] O local do estabelecimento é o lugar em que as condições necessárias para a prestação dos serviços são reunidas e mantidas, vale dizer, o local em que o contribuinte possui um conjunto de meios necessários para a prestação de serviços.
Seguindo essa linha de raciocínio, o Superior Tribunal de Justiça já firmou entendimento consolidado, segundo o qual a competência tributária para cobrança do ISS deve ser firmada em razão do local da efetiva
prestação de serviços, conforme se depreende da leitura do julgamento exarado recentemente pela Segunda Turma daquele tribunal, vejamos: TRIBUTÁRIO – ISS – COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA – LOCAL DA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO – ART. 3º DA LC 116/2003 – TESE NÃO PREQUESTIONADA – SÚMULA282/STF. 1. Aplica-se o enunciado da Súmula 282/STF em relação à tese não-prequestionada. 2. A jurisprudência desta Corte é pacífica no sentido de que, para fins de incidência do ISS, importa o local onde foi concretizado o fato gerador, como critério de fixação de competência e exigibilidade do crédito tributário. 3. Recurso especial conhecido em parte e, nessa parte, improvido.[156]
Da mesma forma, a Primeira Turma do STJ mantém estreita sintonia com o entendimento acima exposto, no sentido de considerar o tributo exigível pelo município onde ocorre o fato gerador, ou seja, no local onde se efetiva a prestação dos serviços, in verbis: TRIBUTÁRIO. ISS. LOCAL DA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS. ALEGAÇÃO DE QUE OS SERVIÇOS ERAM PRESTADOS EM ALTO-MAR. FATO QUE NÃO PODE SER INFERIDO A PARTIR DO TEOR DO ACÓRDÃO RECORRIDO. REEXAME DE
PROVA. I - A orientação já pacificada no âmbito deste Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que o ISS é tributo somente exigível pelo Município onde se realiza o fato gerador, entendido este o local no qual há a prestação de serviço. Precedentes: EREsp nº 130.792/CE, Rel.p/ac. Min. NANCY ANDRIGHI, DJ de 12/6/2000; AgRg no AgRg no Ag nº 587.918/RJ, Rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJ de 1/7/2005; e AgRg no Ag nº 595.028/RJ, Rel. Min. JOSÉ DELGADO, DJ de 29/11/2004.(...) III - Agravo regimental improvido.[157]
A análise conjunta da realidade fática, aliada à legislação, à doutrina e ao posicionamento jurisprudencial já solidamente firmado nos diversos tribunais do país, confirma a argumentação ora adotada. Com efeito, em síntese, a jurisprudência pátria e a legislação aplicável ao tema estabelecem, unanimemente, que o imposto é devido no local do estabelecimento prestador, sendo este onde o contribuinte desenvolve a atividade de prestar serviços. Machado (2002) já afirmou que "o STJ, a pretexto de evitar práticas fraudulentas, tem decidido que é competente para a cobrança do ISS o Município onde ocorre a prestação do serviço, sendo irrelevante o local
em que se encontra o estabelecimento prestador.” Sob essa ótica, revela-se insubsistente a pretensão de tais Municípios (onde as sedes das instituições arrendadoras não estão instaladas), sob pena de deturpação da regra matriz de incidência tributária do ISS sobre as operações de arrendamento mercantil. 5. ENTENDIMENTO PESSOAL SOBRE A MATERIA. Fixados os conceitos dos elementos formadores da regra matriz de incidência tributária do ISS, aprofundando os pontos relativos aos aspectos material e espacial desta, acreditamos ser inviável, a pretensão dos municípios tributarem, pelo ISS, as operações de leasing, em que pese o posicionamento do Supremo Tribunal Federal. Isso porque, ao confrontarmos o texto legal com a realidade fática analisada, chega-se à conclusão de que o fato concreto não é suficiente para preencher todos os critérios da regra-matriz de incidência tributária prevista na Lei Complementar n° 116/2003, de modo que
resta completamente prejudicada qualquer tentativa de cobrança do ISS, por parte dos diversos Municípios brasileiros. De fato, a regra-matriz de incidência tributária encontra-se maculada, no mínimo, em dois de seus elementos: o material e o espacial. No que diz respeito ao aspecto material, ficou clara a ilegalidade e a inconstitucionalidade de enquadrar qualquer operação prestada pelas inúmeras instituições financeiras em atividade no país, como prestação de serviços, enquanto uma obrigação de fazer, mas como uma clara obrigação de dar. Já quanto ao aspecto espacial, comprovou-se a absoluta incompetência de Municípios diversos daqueles onde tais instituições financeiras possuem sede e onde processas as operações, para instituir e cobrar o ISS incidente sobre estas. Interessante ainda, juntamente com os aspectos anteriormente citados, analisar a Medida Provisória n° 449, de 3 de dezembro de 2008, que, dentre outras alterações, acrescentou, em seu artigo 40, o artigo 1º-A à
Lei n° 6.099, de 12 de setembro de 1974, a qual dispões sobre o tratamento tributário das operações de arrendamento mercantil. Tal inovação, certamente, vem ao encontro do entendimento ora defendido, uma vez que dispõe sobre a incompatibilidade e ilegitimidade da cobrança de ISS, sob pena de configuração do bis in idem, haja vista incidir IOF sobre essas operações de arrendamento mercantil, cujo somatório das contraprestações perfaz mais de setenta e cinco por cento do custo do bem, ipsis litteris: Art. 1º O tratamento tributário das operações de arrendamento mercantil reger-se-á pelas disposições desta Lei. Parágrafo único - Considera-se arrendamento mercantil, para os efeitos desta Lei, o negócio jurídico realizado entre pessoa jurídica, na qualidade de arrendadora, e pessoa física ou jurídica, na qualidade de arrendatária, e que tenha por objeto o arrendamento de bens adquiridos pela arrendadora, segundo especificações da arrendatária e para uso próprio desta. Art. 1o-A. Considera-se operação de crédito, independentemente da nomenclatura que lhes for atribuída, as operações de arrendamento cujo somatório das contraprestações perfaz mais de setenta e cinco por cento do custo do bem. Parágrafo único. No porcentual do caput inclui-se o valor
residual garantido que tenha sido antecipado.
Como se observa, pela novel redação da Lei n ° 6.099/1974 e para seus efeitos, as operações de arrendamento mercantil promovidas pelas instituições financeiras configuram-se como verdadeiras operações de crédito, uma vez que o somatório das contraprestações perfazem mais de setenta e cinco por cento do custo do bem, o que afasta definitivamente a incidência do ISS nesses casos. 6. POSIÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. LEADING CASE. RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 592.905 – SANTA CATARINA. Em que pese a posição por nós defendida, o Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário n° 592.905, relatado pelo então Ministro Eros Grau, decidiu pela constitucionalidade da cobrança do ISS sobre operações de arrendamento mercantil. Em seu voto, proferido em 02 de dezembro de
2009, ao analisar uma situação envolvendo um leasing financeiro, considerou que, na referida operação, prepondera o caráter de financiamento, sendo certo que a arrendadora, na qualidade de locadora, surge como intermediária entre o fornecedor e o arrendatário. Nas palavras do ilustre Ministro, financiamento seria um serviço e, como tal, passível de incidência do ISS. Afirmou, ainda, ser irrelevante existir uma compra, haja vista em toda prestação de serviços existir, em maior ou menor intensidade, a utilização de um bem. Finaliza sua curta análise justificando a incidência de ISS sobre as operações de leasing financeiro sob o argumento de que, para o exercício da referida “atividade”, é necessária a existência de uma série de serviços exercidos pelos dirigentes e demais prepostos da arrendatária, motivo pelo qual a operação em comento se aproximaria muito mais de uma prestação de serviços do que de qualquer outra atividade tributável. Seguindo o raciocínio desenvolvido ao longo do presente artigo e com a devida vênia, somos de
opinião diametralmente oposta àquela esposada pelo eminente Ministro Eros Grau. Primeiramente, entendemos que a questão, dada a sua relevância e o grande impacto econômico para instituições financeiras e municípios, merecia uma análise mais profunda, que certamente sucumbiria à constatação de que o arrendamento mercantil, em qualquer de suas modalidades, não se constitui uma prestação de serviços. Contrariamente ao defendido nos tópicos anteriores, o leading case não apontou onde está a prestação de serviços no leasing operacional senão nas tarefas de suporte operacional realizadas pelos dirigentes e prepostos da arrendadora. Esse papel (de apoio administrativo), vale lembrar, é inerente a toda e qualquer atividade humana, seja ela uma obrigação de dar ou de fazer e não pode ser considerado um fator determinante para a configuração de uma operação enquanto prestação de serviços. O argumento trazido pelo Ministro Eros Grau procura justificar a tributação de uma atividade-fim a partir das atividades-meio que a suporta. Em
prevalecendo esse raciocínio, toda atividade econômica, dentre as quais destacamos indústrias, shopping centers, em que há locação ou atividades comerciais mais robustas estariam sujeitas à incidência do ISS, algo que, ao nosso ver, é inconcebível. Insistimos na ideia de que o núcleo da operação deve consistir numa obrigação de fazer, fato que não ocorre no arrendamento mercantil, sob pena de ofensa literal ao artigo 110 do Código Tributário Nacional, como bem observou o Ministro Marco Aurélio, ao divergir dos demais colegas na votação ora analisada. A esmagadora maioria da doutrina, consoante já exemplificado neste breve estudo, ao analisar a caracterização de um serviço, impõe a necessidade de, no núcleo da referida prestação, existir uma obrigação de fazer, sob pena de descaracterização da prestação de serviço. Esse raciocínio, aliás, já foi consolidado há mais de dez anos, pelo próprio Supremo, por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário n° 116.121, que, naquela ocasião, afastou sabiamente a locação de bens
móveis do campo de incidência do ISS. O próprio relator, aliás, em diversos trechos do seu voto, usa o termo locadora para definir a arrendadora, fato que demonstra, no mínimo, uma incongruência entre as premissas utilizadas e a conclusão a que se chegou. A essência do arrendamento mercantil, ainda que na modalidade financeira, é a disponibilização de um bem, pelo arrendador, em favor do arrendatário e mediante uma contraprestação. Pelos breves motivos ora expostos e firmes na convicção ora formada, ousamos discordar da decisão sufragada pelo Supremo Tribunal Federal, cuja única voz dissonante foi o eminente Ministro Marco Aurélio Melo. Resta, agora, torcer para que os Ministros do Superior Tribunal de Justiça possam definir os demais elementos da obrigação tributária estudada com o rigor necessário à definição dos respectivos elementos, conferindo, assim, segurança jurídica aos sujeitos desse liame obrigacional.
7. CONSIDERAÇÕES VINCULANTE 31.
FINAIS.
A
SÚMULA
O STF muito recentemente decidiu a matéria em favor do contribuinte e o fez por meio da Súmula Vinculante 31: SV 31: É inconstitucional a incidência do imposto sobre serviços de qualquer natureza - ISS sobre operações de locação de bens móveis. Validamos o entendimento pelo qual, para que uma operação seja tributada pelo ISS, não basta que ela esteja prevista na legislação inferior como um serviço. É imperioso que a prestação represente ontologicamente uma obrigação de fazer, um facere humano, sob pena de flagrante inconstitucionalidade e de grave risco de lesão à Justiça. Assim vem decidindo mais recentemente o STF: "(...) 1. A não incidência do ISS sobre a locação de bens móveis decorre da impossibilidade do poder de tributar vir a modificar o conceito constitucional de serviço que provém do direito privado. Tal conclusão afasta a
competência do sujeito ativo com relação a qualquer dos diplomas que tenham disciplinado as normas gerais sobre o imposto. Não é por outro motivo que o item da atual lista de serviços que previa a possibilidade de fazer o tributo incidir sobre a atividade em questão foi objeto de veto presidencial." (RE 602295 AgR, Relator Ministro Roberto Barroso, Primeira Turma, julgamento em 7.4.2015, DJe de 23.4.2015). "Na espécie, o imposto, conforme a própria nomenclatura, considerado o figurino constitucional, pressupõe a prestação de serviços e não o contrato de locação. Em face do texto da Carta Federal, não se tem como assentar a incidência do tributo na espécie, porque falta o núcleo dessa incidência, que são os serviços. Observem-se os institutos em vigor tal como se contêm na legislação de regência. As definições de locação de serviços e locação de móveis vêm-nos do Código Civil. Em síntese, há de prevalecer a definição de cada instituto, e somente a prestação de serviços, envolvido na via direta o esforço humano, é fato gerador do tributo em comento. Prevalece a ordem natural das coisas cuja força surge insuplantável; prevalecem as balizas constitucionais, a conferirem segurança às relações Estado-contribuinte; prevalece, alfim, a organicidade do próprio Direito, sem a qual tudo será possível no agasalho de interesses do Estado, embora não enquadráveis como primários." (AI 623226 AgR, Relator Ministro Marco Aurélio, Primeira Turma,
julgamento em 1.2.2011, DJe de 11.3.2011) "O recurso extraordinário do Município de São Paulo funda-se no art. 102, III, a, da Constituição Federal. Sustenta a constitucionalidade do art. 78, §1º, da Lei municipal n.º 10.423/87, que previu a locação de bens móveis como hipótese de incidência de ISS. Alega que a Constituição, em seu art. 156, inciso III, usou a expressão 'serviços de qualquer natureza, dando amplitude maior ao conceito jurídico de serviços, de modo a englobar operações de locação de bens móveis. (...) Trago o presente leading case para apreciação do Tribunal Pleno e julgamento do mérito da questão constitucional cuja repercussão geral foi reconhecida [AI 766.684]. (...) Como relatado, o caso em tela versa sobre locação de filmes cinematográficos, videoteipes, cartuchos para video games e assemelhados, situação em que não está envolvida prestação de serviço." (RE 626706, Relator Ministro Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgamento em 8.9.2010, DJe de 24.9.2010) "Ementa: (...) É firme o entendimento do Supremo Tribunal Federal no sentido de que não incide Imposto sobre Serviços (ISS) sobre locação de bens móveis. A caracterização de parte da atividade como prestação de serviço não pode ser meramente pressuposta, dado que a constituição do crédito tributário é atividade administrativa plenamente vinculada, que não pode destoar do que permite a legislação (proibição do excesso
da carga tributária) e o próprio quadro fático (motivação, contraditório e ampla defesa). (...) Possibilidade de as autoridades fiscais exercerem as faculdades conferidas pela lei para aferirem quais receitas são oriundas da isolada locação de bens móveis." (AI 758697 AgR, Relator Ministro Joaquim Barbosa, Segunda Turma, julgamento em 6.4.2010, DJe de 7.5.2010)
Sobre as operações de arrendamento mercantil, por respeito aos preceitos legais e constitucionais invocados, em consonância com o que se deve entender por prestação de serviços, enquanto uma obrigação de fazer, em sua forma pura, não deve incidir o Imposto Sobre os Serviços de Qualquer Natureza, conforme já reconhece agora o Supremo Tribunal Federal.
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Capítulo 14 A INCIDÊNCIA DO IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS NOS PLANOS DE SAÚDE Eduardo José Dos Santos Pereira De Hollanda Cavalcanti[158] 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS: FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL DO IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS. A Constituição Federal de 1988 criou vários tributos, a despeito do Imposto sobre Serviços. Então no seu Título VI, Capítulo I, Seção V, artigo 156, tratou o legislador constitucional de prever a criação do ISS, cuja materialidade encontra-se definida pela ocultação do verbo. Precisamente definida pelo vocábulo prestar, ou seja, por um agir, um facere, é que vamos a todo tempo extrair a melhor exegese do texto constitucional, de acordo com nossa crítica, com a doutrina e os nossos tribunais superiores.
Assim dispõe o texto constitucional: Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: (…) III - serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar.” (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993). Note-se que o legislador constitucional atribuiu à Lei Complementar definir quais seriam os critérios de sua incidência e consequentemente sua aplicação na prática. Com a ressalva, a nosso ver, de que a Lei Complementar não poderia ferir o critério material já previamente definido pela Constituição. Neste contexto é que foi promulgada a Lei Complementar n.º 116 de 2003, cujo texto acolheu expressamente logo em seu artigo 1º a melhor exegese sobre o critério material, qual seja, a da existência de uma ação, assim definida pelo vocábulo prestar. Eis o citado artigo 1º da LC 116: Art. 1º O Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, tem como fato gerador a prestação de serviços constantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade preponderante do prestador.
É
justamente
sobre
os
questionamentos
acadêmicos e embates administrativos e judiciais com as Fazendas Públicas Municipais, que vimos prevalecer o entendimento de que só encontramos o critério material e quantitativo do ISS se pudermos identificar precisamente a existência de um prestar. Mais adiante teremos exemplos que nos ajudarão a diferenciar quando há ou não a prestação de serviço. 2. A SIMETRIA DO ISS NOS CÓDIGOS TRIBUTÁRIOS MUNICIPAIS. REPERCUSSÃO NACIONAL DO TEMA. Como prática legislativa tem-se a reprodução de leis, decretos e outros instrumentos normativos de modo a unificar a aplicação dos tributos no país. Não poderia ser diferente com o Imposto sobre Serviços. A maioria dos municípios possue códigos e regulamentos sobre o ISS de forma simétrica e praticamente não destoam. Por essa razão, a importância da abordagem
deste tema reside no fato de que o entendimento defendido repercute nacionalmente e consequentemente atinge o interesse dos usuários de plano de saúde em todo o território brasileiro. 3. DA NÃO-INCIDÊNCIA DO IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS – ISS SOBRE EVENTOS NÃO INDENIZÁVEIS. IMPOSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO DE CONCEITOS E FORMAS DE DIREITO PRIVADO. O legislador constitucional e infraconstitucional, ao definir a materialidade do tributo em comento, não deve interferir no conteúdo e no alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado de modo a desfigurar a natureza jurídica dos contratos, no caso em estudo, o de plano de saúde médico-hospitalar. Desse modo, deve o legislador obedecer ao disposto no artigo 110 do Código Tributário Nacional que diz, verbis: CTN - Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos
e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias.
As Leis Municipais que servem de fundamento para o agir da Administração Fazendária dispõem, a teor do Código Tributário Municipal de Recife que, in verbis: Art.102 – O ISS tem como fato gerador a prestação dos serviços não compreendidos na competência dos Estados, incidindo, em especial, nos serviços de: (...) 4.22 - Planos de medicina de grupo ou individual e convênios para prestação de assistência médica, hospitalar, odontológica e congêneres. 4.23 - Outros planos de saúde que se cumpram através de serviços de terceiros contratados, credenciados, cooperados ou apenas pagos pelo operador do plano mediante indicação do usuário.
Inadmissível, pois, a criação de nova materialidade para incidência do ISS sobre outro critério que não o definido pela Constituição Federal de 1988. Assim, deve o legislador ordinário respeitar os limites constitucionais impostos. Ora, a criação de nova materialidade fere
igualmente o mencionado artigo 110 do CTN, tendo em vista que altera o conteúdo e o alcance do contrato de plano de saúde celebrado entre os Planos de Saúde e seus usuários ao definir, entre outras palavras, que a simples transferência de receitas dos usuários do plano para uma conta única caracterize fato jurídico tributário para exigência e cobrança de ISS. Para que haja uma efetiva prestação de serviço, deve haver uma atividade humana direta, sob pena de não se estar prestando serviço algum, como é o caso da simples transferência de receita e o consequente ingresso de numerário em uma conta única administrada e gerida pelos Planos de Saúde. Vejamos o que diz a doutrina, nas palavras de Gustavo da Silva Cabral (2006, p. 485), in verbis: Apenas quem realiza a prestação do serviço revela a capacidade contributiva para suportar o ISS. O aspecto econômico relativo à prestação denuncia o sentido do constituinte que, sem técnica, deixou de enunciar o verbo “prestar” antes do vocábulo “serviço”. O próprio Supremo Tribunal Federal já se pronunciou sobre isso e atestou que “...somente a prestação de serviços, envolvido na via direta do esforço humano, é de fato
gerador do tributo em comento[159].
A esse respeito, mister atinar para as sempre fecundas lições do mestre Kiyoshi Harada (2008, p. 39), o qual delimita o campo de incidência do ISS apenas nos casos em que, efetivamente, houver a prestação de serviços, verbis: A partir das distinções entre obrigações de fazer e de dar, pode-se afirmar: O ISS só pode incidir sobre prestação de serviço, assim entendido o produto do esforço humano que se apresenta sob forma de bem imaterial, ou no caso de implicar utilização de material preserve a sua natureza no sentido de expressar uma obrigação de fazer, isto é, ter como objeto da prestação a própria atividade;
Como se pode observar, a prestação de serviço resulta diretamente de uma obrigação de fazer, que não pode ser mitigada pela legislação municipal, sob pena de infringir os comandos legais e constitucionais ora abordados. A necessidade de o serviço assim ser configurado, aliás, já foi objeto de análise pelo Supremo Tribunal Federal, nos autos do Recurso Extraordinário n° 116.121-3, em que restou consignado, no voto condutor do
Ministro Marco Aurélio, o seguinte entendimento: [...] Tenho para mim, na mesma linha de entendimento exposta por AIRES FERNANDINO BARRETO (“Revista de Direito Tributário”, vol. 38/192) e por CLÉBER GIARDINO (“Revista de Direito Tributário”, vol. 38/196), que a qualificação da “locação de bens móveis”, como serviço, para efeito de tributação municipal mediante incidência do ISS, nada mais significa do que a inadmissível e arbitrária manipulação, por lei complementar, da repartição constitucional de competências impositivas, eis que o ISS somente pode incidir sobre obrigações de fazer, a cuja matriz conceitual não se ajusta a figura contratual da locação de bens móveis. Cabe advertir, neste ponto, que a
locação de bens móveis não se identifica e nem se qualifica, para efeitos constitucionais, como serviço, pois esse negócio jurídico – considerados os elementos essenciais que lhe compõem a estrutura material – não envolve a prática de atos que consubstanciam um praestere ou um facere [...]. Resta demonstrado, portanto, que, para que um item previsto na lista anexa à Lei Complementar n° 116/2003 venha a ser considerado como um serviço, é imprescindível que ele ontologicamente se demonstre
enquanto tal, ou seja, que represente uma efetiva obrigação de fazer, um esforço humano, sob pena de ser declarado inconstitucional. Percebe-se, então, que os elementos que compõem a estrutura da aludida operação, em momento algum, se aproximam da prestação de serviços, de modo a ensejar a tributação pelo ISS. Todas elas não estão no campo de incidência da mencionada exação. Assim, mesmo sendo considerado contrato típico, não se pode olvidar a estruturação da operação, que se constitui, unicamente, numa obrigação de dar. Sobre o assunto a jurisprudência do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco é esclarecedora, in verbis: EMENTA: ADMINISTRATIVO. TRIBUTÁRIO. IMINÊNCIA DE AUTUAÇÃO PARA RECOLHIMENTO DE ISS. MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO. POSSIBILIDADE. SOCIEDADE LIMITADA OPERADORA DE PLANOS DE MEDICINA DE GRUPO. PRELIMINARES: IRREGULARIDADE NO DESEMPENHO DAS FUNÇÕES; DESCABIMENTO CONTRA LEI EM TESE. MÉRITO: INOCORRÊNCIA
DE HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA DO ISS EM CONTRATOS; BITRIBUTAÇÃO. SENTENÇA IMPROCEDENTE. APELAÇÃO PELA REFORMA DO DECISUM. OCORRÊNCIA DE EFEITO RESCINDENTE. RECURSO VOLUNTÁRIO A QUE SE DÁ PROVIMENTO, POR UNANIMIDADE. 1. Não é contra "lei em tese" o writ preventivo interposto contra autuação do Fisco quando é iminente o ato ilegal. 2. A Autora é sociedade limitada, operadora de planos de medicina de grupo, e procurou impedir a sua autuação pela autoridade fazendária, em razão de não ter recolhido o Imposto Sobre Serviços sobre as atividades desempenhadas por seus agentes credenciados. Suscitou ser ilegal a autuação, por dizer respeito a bitributação e por ter considerado como fato gerador não um serviço efetivamente prestado, mas a celebração de um contrato. 3. A teor do CTM - Lei 15.563/91 -, a sociedade empresária não é responsável tributária pelo recolhimento da exação, quando há o desempenho do serviço assistencial pelos agentes credenciados; 4. Ademais, a bitributação ainda resvala na incidência do IOF, visto tratar-se de sociedade operadora de seguros de assistência médica; 5. À operadora subsiste o encargo municipal apenas sobre os serviços médico-hospitalares e odontológicos por ela diretamente prestados. 6. Recurso a que se dá provimento, por unanimidade. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos da Apelação Cível nº 0117508-4, da Comarca do Recife, em que figuram, como Apelante, o SERVIÇO MÉDICO DE PERNAMBUCO Ltda, e, como Apelado, o Município de Recife, Acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores que compõem a Egrégia Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Pernambuco, unanimemente, em dar provimento ao apelo, tudo de conformidade com os votos e notas taquigráficas em
anexo, que, devidamente revistos e rubricados, passam a integrar este julgado. Recife, 15 de agosto de 2006. Des. João Bosco Gouveia de Melo Presidente Des. Luiz Carlos de Barros Figueirêdo Relator PODER JUDICIÁRIO Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco Gabinete Des. Luiz Carlos de Barros Figueirêdo.
Desse modo, pensar em sentido diverso representa uma séria ameaça à estabilidade jurídica e ao próprio Estado Democrático de Direito, uma vez que confere ao Poder Público, uma discricionariedade (de instituir tributos sem o devido respaldo constitucional) extremamente perigosa e indesejável frente aos particulares. Além disso, fica igualmente demonstrada a ilegalidade da (bi)tributação da receita auferida pelos Planos de Saúde, quando o serviço é prestado por seus credenciados, uma vez que o ISS, além de recolhido por ela, é retido na fonte, tendo o assunto já sido objeto de análise por parte do Superior Tribunal de Justiça, conforme ementa a seguir: PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. CONTRATO DE SEGURO SAÚDE. ISS. BI-TRIBUTAÇÃO. I -
Nas operações decorrentes de contrato de seguro-saúde, o ISS não deve ser tributado com base no valor bruto entregue à empresa que intermedeia a transação, mas sim pela comissão, ou seja, pela receita auferida sobre a diferença entre o valor recebido pelo contratante e o que é repassado para os terceiros, efetivamente prestadores dos serviços. II - Embargos de declaração acolhidos, com efeitos modificativos, para conhecer do recurso especial e dar-lhe parcial provimento, a fim de permitir à empresarecorrente a dedução dos valores correspondentes aos repasses entregues aos terceiros prestadores de serviço.
[160] PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. CONTRATO DE SEGURO SAÚDE. ISS. BI-TRIBUTAÇÃO. I Nas operações decorrentes de contrato de seguro-saúde, o ISS não deve ser tributado com base no valor bruto entregue à empresa que intermedeia a transação, mas sim pela comissão, ou seja, pela receita auferida sobre a diferença entre o valor recebido pelo contratante e o que é repassado para os terceiros, efetivamente prestadores dos serviços. Precedente: EDcl no REsp nº 227.293/RJ, Rel. Min. FRANCISCO FALCÃO, DJ de 19.9.2005. II - Recurso especial parcialmente provido.[161] ISS. BASE. CÁLCULO. SERVIÇO. PLANO. SAÚDE. A Turma, ao prosseguir o julgamento, por maioria, negou provimento ao recurso especial e afirmou que, nos serviços de plano de saúde, a base de cálculo do ISS é o valor líquido recebido (mensalidade paga pelo associado à empresa gestora do plano, deduzidas as quantias repassadas aos terceiros credenciados que prestam o atendimento médico). De acordo com o Min. Relator, o imposto já recai sobre os serviços prestados pelos profissionais, de modo que caracterizaria dupla tributação
a nova incidência sobre o valor destinado a remunerar esses serviços. Precedentes citados: AgRg no Ag 1.288.850-ES, DJe 6/12/2010; REsp 783.022-MG, DJe 16/3/2009; REsp 1.041.127-RS, DJe 17/12/2008, e EDcl no REsp 227.293-RJ, DJ 19/9/2005. REsp 1.137.234-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 14/6/2011.
Por tais motivos, os Planos de Saúde devem recolher o ISS apenas sobre os serviços médicohospitalares diretamente prestados e, no caso dos credenciados, que proceda tão-somente a respectiva retenção, por ocasião do repasse das receitas, excluindose, da base de cálculo do ISS-Próprio, o montante repassado, tendo em vista a vasta jurisprudência pátria, em especial do Superior Tribunal de Justiça. 4. UMA BREVE ANÁLISE DA REGRA-MATRIZ DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA. NÃO SATISFAÇÃO DE TODOS OS SEUS ELEMENTOS. IMPOSSIBILIDADE DE TRIBUTAÇÃO PELO ISS. Para se obter uma compreensão mais completa do tema ora proposto, interligando os conceitos e
posições defendidas ao longo deste texto, é imperioso realizar uma análise da regra-matriz de incidência do tributo em discussão, que constitui a norma jurídica geral e abstrata que institui o tributo, sendo ela composta pela hipótese e pelo consequente normativo. A hipótese é quem prevê a situação passível de tributação, é o descritor do fato, e possui três critérios identificadores, quais sejam, o material, o espacial e o temporal. O critério material vem a ser a descrição dos atos e/ou fatos necessários à ocorrência da tributação em tela. É, nas palavras de Carvalho (2007, p. 344), o núcleo da descrição fática, isto é, descreverá pessoas, situações, comportamentos, dentre outros elementos materialmente relevantes para a configuração do fato. O critério espacial, por sua vez, apontará o local onde o fato deverá acontecer, a fim de que haja a observância da norma tributária, enquanto o critério temporal delineará quando o fato haverá ocorrido. O consequente normativo aponta o que irá haver, uma vez verificada a situação prevista na hipótese,
é o prescritor dos efeitos da ocorrência desta. Possui, assim, dois critérios, quais sejam, o pessoal e o quantitativo. O critério pessoal é composto, de um lado, pelo sujeito ativo, que vem a ser o ente competente para exigir o adimplemento da obrigação tributária, nos termos do artigo 119, do Código Tributário Nacional. Do outro lado, o sujeito passivo vem a ser a pessoa da qual o sujeito ativo irá exigir o cumprimento da obrigação tributária. Já o critério quantitativo é composto pela base de cálculo e alíquota. A primeira, nas palavras de Paulo de Barros Carvalho (2007, p. 34), possui três funções: uma mensuradora do fato; outra objetiva, para determinar o valor da dívida; e, por fim, uma função comparativa, que serve para confirmar, infirmar ou afirmar o elemento material contido no antecedente normativo. Ao confrontarmos o texto legal com a realidade fática dos Planos de Saúde, chegar-se-á à conclusão de que o fato concreto analisado não é
suficiente para preencher todos os critérios da regramatriz de incidência tributária prevista na Lei Complementar n° 116/2003, de modo que resta, completamente prejudicada, qualquer tentativa de cobrança do ISS, por parte dos Municípios. De fato, a regra-matriz de incidência tributária encontra-se maculada (se admitirmos a irregularidade da legislação municipal), no mínimo, em seu critério material. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS.[162] No espírito de trazer à sociedade algo de novo em matéria de ISS e, sobretudo, imbuídos do sentimento de justiça fiscal como meio de equacionar as mazelas sociais de nosso país é que dedicamos este artigo, explicitando o que se pode extrair de melhor exegese do texto constitucional. Impõe-se aqui, registrar que a pesquisa ora desenvolvida deve servir para combater a insaciável tendência estatal de se arvorar da propriedade privada e
do que há de mais respeitável que são os direitos fundamentais do cidadão. Desse modo, desenvolvemos este trabalho, no esforço de tentar demonstrar a forma correta de se tributar os Planos de Saúde visando a aperfeiçoar a forma de arrecadar nesse setor tão importante e vital ao povo brasileiro.
REFERÊNCIAS. BRASIL (1988). Constituição da República Federativa do BrasiI. Organizador Alexandre de Moraes. 20ª ed., São Paulo: Editora Atlas S.A., 2003. CABRAL, Gustavo da Silva. Curso de especialização em direito tributário: estudos analíticos em homenagem a Paulo de Barros Carvalho./Coordenador: Eurico Marcos Diniz de Santi. Rio de Janeiro. Forense, 2006. CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 16. ed. – São Paulo: Saraiva, 2007.
HARADA, Kiyoshi. ISS: doutrina e prática. São Paulo: Atlas, 2008.
Capítulo 14 ESTUDO SOBRE A INCIDÊNCIA E BASE DE CÁLCULO DO ISS NAS SOCIEDADES DE ADVOGADOS Edmilson Ewerton Ramos De Almeida[163] Wilson Sales Belchior[164] 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS. Desde as civilizações pré-helênicas, os historiadores do direito conseguem enxergar resquícios de contribuições compulsórias devidas pelos subordinados, em favor dos seus líderes, objetivando um interesse maior, seja militar, social, econômico, religioso, etc. Com as mutações pelas quais passou esse conceito, que adquiriu as feições que o acúmulo de fatos históricos lhes concedeu, dificilmente, na atualidade, uma atividade humana, ou que a ela se relacione, não está marcada, com maior ou menor intensidade, com o gravame de uma
obrigação tributária. Neste diapasão, de acordo com o direito positivo brasileiro, são instituídas e devidas várias taxas, contribuições e impostos que variam em quantidade e peso, a depender da natureza e características da atividade profissional exercida, no que se incluía advocacia. Sobre esta, especificamente, se exercida por autônomos, há incidência do Imposto de Renda (IR), Impostos Sobre Serviço (ISS) e Contribuição ao Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS); se o trabalho é realizado em sociedade, a esta lista somam-se mais três: a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), Contribuição ao Programa de Integração Social (PIS) e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Confins). Cada um dos tributos acima possui regulamentação legal específica e, junto com apalavra de quem tem a responsabilidade de interpretá-la, encontram suas características: competências, hipótese de incidência, fato gerador, base de cálculo, alíquota,
imunidades, etc. Ocorre que a práxis traz à tona os conflitos que dantes não foram percebidos e, portanto, desde a criação do ISS, com a Emenda Constitucional nº 18/65, há discussões técnicas acerca da sua base de cálculo: nas atividades realizadas em sociedade e que se utilizem do trabalho pessoal do contribuinte, notadamente a advocacia, dever-se-ia utilizar o preço do serviço prestado, como defende a doutrina tradicional, ou buscar alternativa, a fim de evitar o conflito de competências e a bitributação? A administração pública municipal vem realizando sua escolha dogmática e, quando está em oposição com outros interesses, tanto as sociedades de advogados espalhadas pelo país, quanto a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), vêm provocando o poder judiciário na defesa dos seus direitos e este, por sua vez, tem respondido, de maneira geral, com precisão técnica, a fim de desfazer tal celeuma. A presente pesquisa, portanto, intenciona expor e discutir as teses que possam responder, com
coerência científica, ao questionamento supra e expor os resultados dos embates entre a sociedade civil organizada e o poder público. 2. FUNDAMENTAÇÃO NORMATIVA E JURÍDICA DO ISS. Acompanhando a concepção hodierna sobre o fundamento do poder do Estado, o complexo sistema tributário brasileiro lastreia seus primeiros referenciais normativos na atividade do poder constituinte, transliterados no capítulo abrangido pelos arts. 145 e ss. da Constituição da República de 1988. Assim, quando na sessão específica para os impostos municipais, o art. 156, III, da CR/88 informa ser deste ente federativo a responsabilidade de instituir o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISSQN (ou ISS) e, paralelamente, o art. 156, §3º, determina que cabe, à lei complementar, a sua regulamentação. Para tanto, fora editada a Lei Complementar nº 116/2003 que, em conjunto com o Decreto-Lei nº
406/68 (vigente em partes), compõem o arcabouço legislativo federal necessário à configuração deste tributo – as LC’snºs 56/1987 e 100/1999 foram revogadas por completo. Este DL foi recepcionado pela CR/88 como Lei Complementar, em decorrência do § 5º do Art. 34 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, e como tal vige até a presente data, regulando as relações jurídicas dela decorrentes. É o que afirma Paulsen (2007, p. 392): Lei Complementar. DL 406/68 e LC 56/87. O Decreto-lei nº 406 de 31 de dezembro de 1968, alterado pela Lei Complementar nº 56/87, foi recepcionado pela CF/88 e cumpre a função de lei complementar definidora dos serviços sobre os quais incidem o ISS. Estabelecem como fato gerador do imposto a prestação de serviços constante de listagem a ele anexa.
A plena vigência do Decreto-Lei 406/68, e a sua utilização na apuração da base de cálculo do ISS pelas sociedades civis prestadoras de serviços profissionais, são matéria de farta jurisprudência, inclusive do Supremo Tribunal Federal, do que é
representante a transcrição abaixo: RECURSO. Extraordinário. Inadmissibilidade. ISS. Base de cálculo. Sociedades prestadoras de serviços. Art. 9º, §§ 1º e 3º do Decreto-lei nº 406, de 1968. Recepção pela Constituição Federal. Agravo regimental não provido. O Plenário desta Corte assentou orientação de que os dispositivos do Decreto-lei nº 406, de 1968, que disciplinam a base de cálculo do ISS para as sociedades prestadoras de serviços profissionais, foram recebidos pela Constituição Federal.[165]
Sobre a matéria, esta Suprema Corte, inclusive, já editou a Súmula nº. 663: "Os §§ 1º e 3º do art. 9º do Decreto-Lei nº. 406/1968 foram recebidos pela Constituição". Mesmo após a edição da LC nº 116/03, posterior e específica sobre a matéria do ISS, que restringiu a vigência do Decreto-Lei nº 406/68, ela não o fez completamente; antes, foi precisa e especificou os dispositivos que seriam revogados, o que, em ato contínuo, chancela o pleno vigor dos demais, dentre eles o art. 9º, §1º e §3º: Art. 10. Ficam revogados os arts. 8º, 10, 11 e 12 do
Decreto-Lei nº 406, de 31 de dezembro de 1968; os incisos III, IV, V e VII do art. 3º do Decreto-Lei nº 834, de 8 de setembro de 1969; a Lei Complementar nº 22, de 9 de dezembro de 1974; a Lei nº 7.192, de 5 de junho de 1984; a Lei Complementar nº 56, de 15 de dezembro de 1987; e a Lei Complementar nº 100, de 22 de dezembro de 1999.
Esta também é a posição de Xavier (2003): Que a Lei Complementar n. 116/03 não pretendeu revogar o art. 9, §§ 1º 3º do Decreto-lei n. 406/68 resulta claramente do fato de que na enumeração taxativa dos preceitos revogados, constantes do art. 10, foram incluídos todos os artigos do Decreto-lei nº 406/68 que versavam sobre o ISS (art 8., 10, 11 e 12) salvo precisamente o art. 9., ostensivamente omitido.
Acresce que a Lei Complementar n. 95, de fevereiro de 1998, que dispõe sobre a elaboração, redação e a consolidação das leis, é clara em exigir em seu art. 9, com a redação dada pela Lei Complementar n. 107, de 26 de abril de 2001, que a cláusula de revogação deverá enumerar, expressamente, as leis ou disposições legais revogadas. Ora, como a cláusula de revogação deve indicar expressamente as disposições que pretende
revogar, não há margem para dúvidas que, ao omitir o art. 9º do Decreto-lei nº 406/68 do rol das disposições revogadas, a Lei Complementar nº 116/2003 não poderia ter sido mais clara quanto à intenção de manter vigentes as regras nele contidas, notadamente os seus §§ 1º e 3º (XAVIER, 2003. p. 11). 3. ATUAL CONCEPÇÃO PÚBLICA.
PRÓ-ADMINISTRAÇÃO
Inobstante já tenha sido pacificado pela doutrina e pelos órgãos jurisdicionais que (i), o DL 406/68 fora plenamente recepcionado pela CR/88; e (ii), a LC nº 116/03 não revogou expressamente o art9º, §1º e §3º, do DL 406/68, algumas administrações municipais ainda procuram minar a validade da base de cálculo especial para as sociedades profissionais. Tal absurdo se fundamenta no fato de que a atual redação do art. 9º, §3º, do DL 406/68 não é do texto original, mas sim, oriunda da Lei Complementar nº56/87. Todavia, diferentemente do que ocorreu com aquele DL,
esta LC foi completamente revogada pelo art. 10º, da LC 116/03, o que levaria à falácia de que, por ato reflexo, o art. 9º, §3º, do DL 406/68, alterado pela LC nº 56/87, também perderia o vigor, acabando com a previsão da base de cálculo especial, pois, no Brasil, não há repristinação. Entretanto, há distinção basilar que deve ser considerada: enquanto a prescrição jurídica é o conteúdo, o dispositivo legal é mera forma através da qual aquela se manifesta. Destarte, quando a lei posterior revogou o dispositivo formal chamado de LC nº 56/87, a prescrição jurídica contida neste já havia cumprido o seu intento, qual seja, a modificação da redação do art. 9º, §3º, do DL 406/68 que, por sua vez, já não era mais parte da norma alteradora-revogada, mas sim, da alterada-vigente (MACHADO, 2005.) No mesmo sentido, ensinam Xavier (2003, p. 13): 18. Uma lei nova que, mantendo embora a lei anterior, se limita a dar-lhe nova redação, não constitui, do ponto de vista formal, um preceito autônomo, mas sim um preceito que se incorpora à lei originária da qual passa a fazer
parte integrante. Assim, não sendo autônoma, a sua revogação, na parte em que se limita a modificar lei anterior, não implica revogação indireta desta, a qual só pode operar por via de um comando que tenha tal revogação como objeto direto e imediato. 19. Por outras palavras: sem prejuízo da revogação da Lei Complementar nº 56/87 ter por efeito a revogação de suas disposições autônomas e inovadoras, notadamente a nova lista de serviços, tal revogação não implica a revogação indireta da disposição da lei anterior, por ela meramente modificada (o § 3º doa art. 9º do Decreto-lei nº 406/68), cuja revogação exigir disposição expressa, que, porém, não se verificou.
Assim corrobora a conclusão de Machado (2005, p. 12/13): Quando a Lei Complementar n° 56/87 alterou redação ao § 3°, do art. 9°, do Decreto-lei n° 406/68, além de manter a norma nele contida com pequena mudança em sua redação, na verdade manteve esse dispositivo como expressão formal do Direito. Poderia tê-lo revogado pura e simplesmente, editando um novo dispositivo, com a mesma norma com a redação devidamente adaptada à nova lista de serviços. Mas não o fez. Assim, é indiscutível a subsistência desse dispositivo como expressão formal, como veículo de norma. Quando uma lei altera lei anterior mediante a técnica de substituição, no próprio texto da lei anterior, do dispositivo alterado, dando ao antigo dispositivo nova redação, como ocorreu no caso de que se cuida, sua eficácia se exaure imediatamente. Sua missão fora dar ao dispositivo da lei
anterior nova redação. E somente isto. O dispositivo que subsiste, o veículo da norma, continua sendo o dispositivo da lei anterior. Assim, a revogação da Lei Complementar n° 56/87, depois que esta produziu o efeito de alterar o § 3°, do art. 9°, do Decreto-lei n°406/68, preservando-o como expressão formal do Direito, como veículo de norma, não revoga aquele dispositivo.
Por todo o exposto, a conclusão é natural e categórica: tanto por interpretação doutrinária, quanto jurisprudencial, ambos, o Decreto-Lei nº 406/68 e a Lei Complementar nº 116/2003, possuem lastro na atual Constituição da República de 1988, e estão em plena harmonia legal e jurídica entre si, sendo este com aplicabilidade plena e aquele com alguns dispositivos revogados, o que em nada compromete a base de cálculo especial do ISS, em favor dos profissionais liberais que atuam em sociedades. 4. BASE DE CÁLCULO DO SOCIEDADES PROFISSIONAIS.
ISS
PARA
AS
Os textos legais que regulamentam o ISS são uníssonos numa regra geral taxativa: “A base de cálculo
do imposto é o preço do serviço” (art. 7º, caput, da LC 116/03 e art. 9º, caput, do DL 406/68). Entretanto, há casos em que o serviço prestado se dá através do trabalho pessoal do contribuinte, notadamente os profissionais liberais e autônomos. Sendo assim, o valor sobre o qual o imposto devido deverá ser calculado é quantia fixa e considera outros fatores, conforme determina o art. 9º, §1º, do DL 406/68: Quando se tratar de prestação de serviços sob a forma de trabalho pessoal do próprio contribuinte, o impôsto[sic] será calculado, por meio de alíquotas fixas ou variáveis, em função da natureza do serviço ou de outros fatores pertinentes, nestes não compreendida a importância paga a título de remuneração do próprio trabalho. Assim o é em razão de, neste tipo de atividade, o preço do serviço ser equivalente à própria remuneração do profissional, a qual, por sua vez, é hipótese de incidência do Imposto de Renda, tributo de competência exclusiva da União (art. 153, III, da CR/88). Utilizar a regra geral nestes casos seria permitir a bitributação e a invasão de competências (LYRA, 2009).
Quanto ao exercício através de sociedades profissionais, o motivo e o critério são idênticos, pois,
não há qualquer diferença material que tenha força suficiente para descaracterizar o princípio da isonomia entre aqueles que optam por exercer seu trabalho, individualmente ou em conjunto (referência ao julgamento pelo pleno do STF do RE 236.604-7, de 26.05.1999). Esta lógica já está positivada no art. 9º, §3º, do DL 406/68, com redação alterada pela Lei Complementar nº56/87: Quando os serviços a que se referem os itens 1, 4, 8, 25, 52, 88, 89, 90, 91 e 92 da lista anexa forem prestados por sociedades, estas ficarão sujeitas ao imposto na forma do § 1°, calculado em relação a cada profissional habilitado, sócio, empregado ou não, que preste serviços em nome da sociedade, embora assumindo responsabilidade pessoal, nos termos da lei aplicável.
Em consonância, o doutrinador Machado (2004, p. 14) ensina com maestria que: A Lei Complementar nº 116/2003 estabelece, em seu art. 7º, que a base de cálculo do ISS é o preço do serviço. É uma norma geral, que convive perfeitamente com a norma albergada pelos §§ 1º e 3º, do art. 9º, do Decretolei nº 406/68. Ao demonstrar essa compatibilidade, aliás, basta que se note que a norma hoje albergada pelo art. 7º, caput, da Lei Complementar nº 116/2003, é exatamente a
mesma norma que antes estava albergada pelo art. 9º caput, do Decreto-lei nº 406/68.
Na lista Anexa à Lei Complementar nº 56/87, constam os serviços referidos: LISTA DE SERVIÇOS 1. Médicos, inclusive análises clínicas, eletricidade médica, radioterapia, ultra-sonografia, radiologia, tomografia e congêneres; 4. Enfermeiros, obstetras, ortópticos, fonoaudiólogos, protéticos (prótese dentária); 8. Médicos veterinários; 25. Contabilidade, auditoria, guarda-livros, técnicos em contabilidade e congêneres; 52. Agentes da propriedade industrial; 88. Advogados; 89. Engenheiros, arquitetos, urbanistas, agrônomos; 90. Dentistas; 91. Economistas; 92. Psicólogos.
Portanto, quando quaisquer destes serviços listados forem prestados por uma sociedade, o recolhimento do ISS deverá ser feito na forma especial, ou seja, calculado por valor fixo em relação a cada profissional que preste serviço em nome da sociedade, desde que (i), esteja devidamente habilitado, para exercer
a atividade-fim; e (ii), acarrete responsabilidade pessoal. Exercendo o seu papel de fontes secundárias do direito, tanto a doutrina, quanto a jurisprudência atual acrescentam que, para ter acesso a esse benefício, as sociedades precisam desempenhar única atividade-fim (sociedade uniprofissional[166] - SUP) e de caráter não empresarial, especialmente intelectual ou científica: em 2008, o Recurso Especial da consultoria “PriceWaterHouseCoopers Auditores Independentes”, sociedade de contadores de Curitiba/PR, que objetivava reforma da decisão em primeira instância que negou o recolhimento do ISS pelo SUP, foi negado pela 2ª Turma do STJ, sobre o fundamento de que, “embora formada exclusivamente por contadores, desenvolve suas atividades com caráter genuinamente empresarial, apresentando complexa estrutura organizacional e vultoso faturamento anual, além da previsão contratual de prólabore e divisão de lucros” (apud CRISTO, 2009). Insta pontuar que, conforme alertam Cristiano Carvalho e Rafael Machado (apud PAULSEN, 2007, p. 400), “O fato de a sociedade ter muitos sócios e
profissionais não lhe acarreta, por si só, o ‘elemento de empresa’, da mesma forma que a colaboração de estagiários na atividade-fim ou de outros funcionários na atividade-meio”. Particularmente, as sociedades de advogados possuem capítulo próprio (arts. 15 ss.) no “Estatuto da Advocacia da OAB”, cujo conteúdo revela forte preocupação em evitar a mercantilização dessa atividade: vedação de realizar qualquer atividade estranha à advocacia, proibição de incluir no quadro societário sócio não inscrito como advogado ou impedido de advogar, impossibilidade de funcionar apresentando forma ou características mercantis. Portanto, conclui-se que qualquer sociedade de advogados, devidamente registrada junto a sua seccional, será, invariavelmente, uniprofissional, no exercício de atividade não empresarial, com profissionais habilitados e que se responsabilizam pessoalmente pela atividade desenvolvida nesta, pelo que se infere que, ao cumprir todos os requisitos, a base de cálculo para o cálculo do ISS deve ser do art. 9, §3º, do Decreto-Lei nº
406/68. Assim dispõe a jurisprudência que vem sendo seguida: TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ISS. BASE DE CÁLCULO. SOCIEDADES DE ADVOGADOS. 1. O art. 9º, §§ 1º e 3º, do Decreto-lei n.º 406/68 estabelece alguns requisitos, sem os quais a sociedade estará obrigada a recolher o ISS com base na sistemática geral, vale dizer, sobre o valor do seu faturamento. São eles: a) que a sociedade seja uniprofissional; b) que os profissionais nela associados ou habilitados prestem serviços em nome da sociedade, embora sob responsabilidade pessoal. 2. O art. 16 da Lei n.º 8.906/94 (Estatuto da Advocacia) permite concluir que as sociedades de advogados, qualquer que seja o respectivo contrato social, caracterizam-se como sociedades uniprofissionais. O dispositivo proíbe que essas entidades realizem "atividades estranhas à advocacia" ou incluam em seus quadros "sócio não inscrito como advogado ou totalmente proibido de advogar". 3. Os profissionais que compõem os quadros de uma sociedade deadvogados prestam serviços em nome da sociedade, embora sobresponsabilidade pessoal. Essa conclusão é possível diante daleitura do art. 15, § 3º, da Lei n.º 8.906/94, segundo o qual "asprocurações devem ser outorgadas individualmente aos advogados eindicar a sociedade de que façam parte"; do art. 17, que fixa aresponsabilidade pessoal e ilimitada do sócio pelos danos causadosaos clientes por ação ou omissão no exercício da advocacia; bem comodo art. 18, do mesmo diploma legal, que estabelece que "a relação deemprego, na qualidade de advogado, não retira a isenção técnica nemreduz a
independência profissional inerentes à advocacia". 4. O art. 16 da Lei n.º 8.906/94 espanca qualquer dúvida acerca danatureza não-empresarial das sociedades de advogados. Segundo aprevisão normativa, não serão admitidas a registro, nem poderãofuncionar, "as sociedades de advogados que apresentem forma oucaracterísticas mercantis". 5. Tranqüila a conclusão de que a sociedade civil de advocacia,qualquer que seja o conteúdo de seu contrato social, goza dotratamento tributário diferenciado previsto no art. 9º, §§ 1º e 3º,do Decreto-lei n.º 406/68, já que são necessariamenteuniprofissionais, não possuem natureza mercantil, sendo pessoal aresponsabilidade dos profissionais nela associados ou habilitados.6. Recurso provido. (STJ - REsp 623772 / ES; Relator: Ministro CASTRO MEIRA; Órgão Julgador: T2 - SEGUNDA TURMA; Data do Julgamento: 01/06/2004; Data da Publicação/Fonte: DJe09/08/2004 p. 245).
5. ATUAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL ORGANIZADA. Imbuídos de todo esse cabedal teórico, sociedades uniprofissionais, principalmente de advogados, têm litigado individualmente contra as legislações municipais ilegais que preveem a cobrança do ISS com base de cálculo fundamentada na regra geral (art. 7º, caput, da LC 116/03 e art. 9º, caput, do DL 406/68), qual seja, o faturamento, e não naquela específica para
tais sujeitos da obrigação tributária (art. 9º, §3º, da DL 406/68). Eis que seguem de exemplos, algumas decisões que refletem a pacífica opinião: TRIBUTÁRIO - SOCIEDADE DE ADVOGADOS ISSQN - RECOLHIMENTO EM NOME DA SOCIEDADE - INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 9º, § 3º, DO DECRETO-LEI 406/68.Nas sociedades uniprofissionais, como é o caso das sociedades de advogados, em que o profissional presta serviço em nome desta, mas assume responsabilidade pessoal, o ISSQN deve ser recolhido pela sociedade, em relação a cada profissional habilitado, sócio, empregado ou não, que preste serviço em seu nome.[167] MANDADO DE SEGURANÇA. SOCIEDADE DE ADVOGADOS. ISS. RECOLHIMENTO. CÁLCULO. REGIME FIXO ANUAL E NÃO SOBRE O FATURAMENTO DA SOCIEDADE. TRATAMENTO TRIBUTÁRIO DIFERENCIADO. PREVISÃO LEGAL. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. APELAÇÃO CÍVEL. ALEGAÇÃO DE REVOGAÇÃO DOS DISPOSITIVOS LEGAIS QUE PERMITIAM O RECOLHIMENTO DIFERENCIADO. NÃO OCORRÊNCIA. VIGÊNCIA DO ART. 9º, §§ 1º E 3º, DO DECRETO-LEI Nº 406/68. PRECEDENTES DO STJ. DESPROVIMENTO DA APELAÇÃO. As sociedades de advogados, qualquer que seja o conteúdo de seus contratos sociais, gozam de tratamento tributário diferenciado previsto no art. 9º, §§ 1º e 3º, do DecretoLei nº 406/68 e não recolhem o ISS sobre o faturamento, mas em função de valor anual fixo, calculado com base
no número de profissionais integrantes da sociedade. O ISS é tributo que continua sendo regulado pelo DecretoLei nº 406/68, que apesar das alterações sofridas, em especial, pelas Leis Complementares nºs 56/87 e 116/2003, não teve modificado o seu art. 9º, §§ 1º e 3º. O art. 10 da Lei Complementar nº 116/03 revogou expressamente apenas os artigos 8º, 10, 11 e 12 do Decreto-Lei nº 406/68.[168] APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CAUTELAR DE DEPÓSITO E AÇÃO ORDINÁRIA - IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS SOCIEDADE DE PROFISSIONAIS - BASE DE CÁLCULO PREVISTA NO ART. 9º, § 3° DO DECRETO-LEI N° 406/68 ALÍQUOTA FIXA POR PROFISSIONAL HABILITADO - COMPATIBILIDADE COM AS DISPOSIÇÕES DA CARTA MAGNA DE 1988 - ART. 2° DA LEI MUNICIPAL N° 7852/95 QUE ESTABELECE A INCIDÊNCIA DO ISS COM BASE NO PREÇO DO SERVIÇO - INAPLICABILIDADE LEI COMPLEMENTAR N° 56/87 - VÍCIO FORMAL INEXISTENTE - APELAÇÃO E REMESSAS CONHECIDAS E IMPROVIDAS: I - Não há que se falar em incompatibilidade do art. 9°, § 3° do Decreto-lei n° 406/68 com o art. 151, inciso III, da Carta Magna de 1988, uma vez que aquele apenas define a base de cálculo do ISS incidente em face de sociedades de profissionais, não estabelecendo isenção tributária. II- O art. 9°, § 3° do Decreto-lei n° 406/68 não macula o princípio constitucional da isonomia (art. 150, inciso II, CF/88), uma vez que a previsão de bases de cálculo diferentes para as sociedades de capital e para as sociedades de trabalho é exigência dos princípios da isonomia e da capacidade contributiva, os quais não foram criados a partir da Constituição de 1988, estando
explicitados já na Constituição de 1967/69. Precedentes do STJ, STJ e TJCE. III - A Apelada, na qualidade de sociedade constituída exclusivamente por advogados, que tem como objeto social a prestação de ser especializado (serviço jurídico), sem caráter empresarial e com responsabilidade pessoal dos sócios, está albergada pela norma do art. 9º, § 3° do Decreto-lei n° 406/68. IV Improspera a apontada inconstitucionalidade da Lei Complementar n° 56/87, uma vez que o Apelante não comprovou o vício formal, estando referida norma em plena vigência. V - Apelação e remessas conhecidas e improvidas, para confirmar, em todos os termos, as sentenças prolatadas na ação cautelar e na ação ordinária.[169] EXECUÇÃO FISCAL. CERTIDÃO DE DÍVIDA ATIVA. NULIDADE. ISS. ESCRITÓRIO DE ADVOCACIA. BASE DE CÁLCULO. DECRETOLEI Nº 406/68. À prestação de serviços de advocacia por sociedade uniprofissional aplica-se o disposto no art. 9º, §§ 1ª e 3º, do Decreto-Lei n.º 406. Precedentes do STJ. Recurso do Embargante provido. Recurso do Embargado prejudicado.[170] Apelação. Mandado de segurança. Imposto sobre serviços de qualquer natureza. Sociedade uniprofissional de advogados. Responsabilidade pessoal e solidária dos sócios. Aplicação do tratamento fiscal diferenciado previsto no artigo 9º, § 3º, do Decreto-lei 406/68. Admissibilidade. Precedente do Superior Tribunal de Justiça. Recurso denegado.[171]
Entretanto, ainda mais emblemática e de
merecido destaque é a atuação das seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil, como Paraná, Rio Grande do Sul, Amazonas, Minas Gerais, Paraíba, que têm provocado o poder judiciário federal, no uso das suas atribuições legais[172], para requerer a abstenção das cobranças ilegais supra referidas, nos municípios sob sua jurisdição. Em modelo semelhante a todas elas, a OAB/PB impetrou Mandado de Segurança Coletivo, requerendo, em síntese, a suspensão: (i), do recolhimento do ISS com base de cálculo equivocada e (ii), da vigência de lei municipal da capital, sem prejuízo do recolhimento e cobrança pelo regime de tributação anual fixa, nos seguintes termos: Portanto, a Lei Complementar Municipal nº 02/91 que estabelece em seu art. 24que o ISS seja calculado com base no preço do serviço desbordou disposição do artigo 9º, §§ 1º e 3º do Decreto-Lei 406/68, impondo-se a suspensão de sua vigência. Portanto, o sistema de tributação por valor fixo, previsto pelo artigo 9º, §§ 1º e 3º do Decreto-Lei 406/68, não pode ser desconsiderado pelo Município de João Pessoa. A legislação municipal (Lei Complementar Municipal nº 02/91), ao determinar que o cálculo do ISS seja feito com
base no preço do serviço, não encontra suporte de validade; ao contrário, ofende diretamente a sistemática de cobrança prevista pelo artigo 9º, §§ 1º e 3º do Decreto-Lei 406/68.
Por sua vez, a OAB/PR já obteve acórdão favorável do TRF/4ª Região: MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO. OAB. SOCIEDADE DE ADVOGADOS. ISSQN. COMPETÊNCIA. JUSTIÇA FEDERAL. RECOLHIMENTO COM BASE EM VALOR FIXO ANUAL. SENTENÇA CONFIRMADA. 1. Não há in casu incompetência da Justiça Federal, tendo em vista que a Ordem dos Advogados do Brasil tem, sim, natureza jurídica de autarquia, revestida de caráter especial. 2. O e. STJ firmou orientação no sentido de que a sociedade uniprofissional de advogados de natureza civil, qualquer que seja o conteúdo de seu contrato social, goza do tratamento tributário diferenciado previsto no art. 9º, §§ 1º e 3º, do Decreto-Lei nº 406/68, não recolhendo o ISSQN com base no seu faturamento bruto, mas sim no valor fixo anual calculado de acordo com o número de profissionais que a integra (AgRg no Ag 1269954/MG, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, DJe 11.5.2010).[173]
De modo geral, percebe-se que todas as esferas de órgãos do poder judiciário têm respondido, com eficiência e precisão, às reclamações propostas, cujo
objetivo não é atender a mero capricho e privilegiar alguns profissionais em detrimento do erário público, retirando parcela do poderio financeiro municipal, mas sim, fazer com que a vontade da legislação seja cumprida, numa celebração do princípio da legalidade, fundamental à administração pública. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS[174]. Ao longo de toda a pesquisa, foram esclarecidos quais os tributos, cujas hipóteses de incidência abrangem o exercício da advocacia. A partir de então, o Imposto sobre Serviço de Qualquer Natureza foi explorado, no que se expôs toda a fundamentação constitucional, legal e jurídica, à luz da doutrina e jurisprudência atual, limitando os estudos à base de cálculo relacionada às sociedades profissionais autônomas e, em especial, àquelas reservadas ao exercício da advocacia. A partir de então, constatou-se, inicialmente, que ambas as normas federais atinentes à matéria, o
Decreto-Lei nº 406/68 e a Lei Complementar nº 116/2003, possuem firmeza constitucional, estão em vigor e em plena harmonia. Com este respaldo, pode-se afirmar que há previsão clara de uma base de cálculo especial do ISS, a partir de um valor fixo, reservada às atividades listadas, dentre as quais, se destaca a advocacia: tanto pela especificidade do seu estatuto, que já prevê a não mercantilização da atividade, quanto pela atuação das sociedades em litigar contra a fazenda pública, quando esta se propõe a ir de encontro à legislação ulterior. No intuito de evitar o vício argumentativocientífico, essa analise expôs, propositadamente, tanto as teses favoráveis, quanto aquelas contrárias à administração pública. A partir da técnica interpretativa utilizada, restou demonstrado que alguns municípios têm realizado escolhas dogmáticas equivocadas e, efetivamente, promovido cobranças ilegais, contra o que a sociedade civil organizada já tem se manifestado e obtido êxito. REFERÊNCIAS.
COSTA, Regina Helena. Curso de Direito Tributário: constituição e código tributário nacional. São Paulo: Saraiva, 2009. CRISTO, Alessandro. OAB-RS consegue manter ISS de escritórios reduzido. 2009. Disponível em: Acesso em: 15 maio 2012. LOBO, Paulo. Comentários ao Estatuto da Advocacia e da OAB. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.
LYRA, Bruno. ISS e as Sociedades Profissionais. 2009. Disponível em . Acesso em: 15 maio 2012.
MANGIERI, Francisco Ramos. ISS: teoria – prática – questões polêmicas. 4. ed. São Paulo: EDIPRO, 2012. PAULSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à luz da doutrina e da jurisprudência. 9. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado: ESMAFE, 2007. XAVIER, Alberto Pinheiro; ROBERTO, Duque Estrada. O ISS das Sociedades de Serviços Profissionais e a Lei Complementar n.24111 116/2003. Dialética, São Paulo, 2003.
Capítulo 15 O ISSQN NA BASE DE CÁLCULO DO IRPJ, PIS, COFINS E CSLL Renato Cesar Guedes Grilo[175]
1. INTRODUÇÃO Dos ramos da ciência jurídica o Direito Tributário talvez seja o único a se revelar por meio de todas as espécies normativas. Em genéricas linhas, a Constituição Federal desenha as materialidades abertas à tributação e as distribui aos entes políticos, a Lei Complementar estabelece as normas gerais tributárias e também institui alguns tributos – tarefa esta, em regra, veiculada mediante Lei Ordinária –; os atos normativos de menor estatura instrumentalizam a tributação, nos contornos permissivos da lei em sentido estrito. Assim, o Poder de tributar é disciplinado originariamente na Constituição Federal, por se tratar de
potestade sensível, mediante a qual se garantem os recursos necessários à definição do tamanho do Estado em sua atividade prestativa (serviços públicos) e de garantia aos direitos fundamentais. Trata-se de dever fundamental, que faz frente aos direitos e garantias assegurados na Carta Magna[176]. O arquétipo tributário, portanto, tem sede constitucional, de tal modo que se revela necessário o exame da Constituição para se efetivar a análise conceitual de uma determinada exação. As materialidades abertas à tributação são repartidas na Carta Magna, sendo outorgadas seletivamente a cada um dos entes federativos. A Constituição não cria tributos[177], mas define quais fatos signos presuntivos de riqueza[178] estão abertos à competência tributária criativa da União, Distrito Federal, Estados e Municípios. A partir da definição na Constituição do tipo tributário e sua base econômica encontramos a respectiva definição implícita da sua base de cálculo e também dos contribuintes[179]. É que a base de cálculo se conceitua
como a expressão dimensível do fato gerador – ou dimensão econômica do fato gerador. Essa quantificação econômico financeira deve guardar pertinência lógica com o fato tributado, sob pena de o tributo se desnaturar em sua essência material. A base de cálculo há de sempre refletir a expressão econômica do fato tributado[180]; não havendo a imprescindível relação de pertinência lógica, o tributo será constitucionalmente transmudado em exação de espécie ou feições diversas. Desnaturada que seja a base de cálculo estar-se-á tributando qualquer coisa, menos o fato constitucionalmente franqueado à exação. Por exemplo, caso a legislação instituidora do tributo ISSQN defina base de cálculo diversa que não seja o “valor da prestação do serviço”, como, por exemplo, o “lucro” ou a “receita líquida”, o que se estará tributando será o rendimento e não a prestação do serviço. Nesse caso, há frontal burla à Constituição Federal, ferindo a definição do “tipo tributário”. A esse respeito, Ataliba – que utiliza a terminologia ‘base imponível’ para a base de
cálculo –, assevera que: Efetivamente, fica evidente a posição central da base imponível – relativamente à hipótese de incidência – pela circunstância de ser impossível que um tributo, sem se desnaturar, tenha por base imponível grandeza que não seja ínsita na materialidade de sua hipótese de incidência. Efetivamente, não é possível que um imposto sobre o patrimônio tenha por base imponível a renda do seu titular. Tal situação – essencialmente teratológica – configuraria um imposto sobre a renda e não sobre o patrimônio[181]. De modo semelhante, se o tipo constitucional é “serviço de qualquer natureza” (Art. 156, III, da CF/88), o contribuinte não poderá ser outro senão o prestador do serviço; por isso, o contribuinte também já vem implícito ante a indispensável relação com a materialidade tributária. Portanto,
são
elementos
implícitos
das
materialidades abertas à tributação a base de cálculo e o contribuinte, sendo que estes não podem estar previstos na Lei instituidora da exação de forma desarmônica com o princípio da pertinência lógica, pois o Direito Tributário é um sistema inaugurado na Constituição e que perpassa pelas espécies normativas (até os atos regulamentares), sendo necessária a coerência sistêmica por todo esse percurso. O objeto de estudo deste capítulo volta-se para a análise da base de cálculo de um imposto (IRPJ) e de três contribuições sociais (CSLL, PIS e COFINS). Este introito tem por finalidade apresentar o conceito de base de cálculo e situar o tema dentro de uma conotação Constitucional, sabendo-se que para se quantificar economicamente um tributo devemos analisar os contornos da materialidade definida na Carta Magna. Deve ficar assentado que a base de cálculo é a medição da materialidade tributável, sempre mensurável – redutível a uma expressão numérica –, cujo delineamento deve ser encontrado com exatidão, de modo que não se
desconstitua o tributo mas, por outro lado, lhe dê a precisa conformação tributária, realizando a Justiça Fiscal[182]. Analisar a base imponível é perquirir acerca dos contornos da materialidade constitucional aberta à tributação; especificamente para o objetivo do nosso estudo: IRPJ, CSLL, PIS e COFINS. A definição da base imponível deve perseguir uma justa exação, sem exagero ou transbordamento, mas também sem reduções ou supressões que são capazes de desvirtuar o tributo e gerar injustiça fiscal. Além da análise do que se entende por base de cálculo, para a adequada compreensão do tema que será desenvolvido, é fundamental a compreensão do mecanismo de tributação do ISSQN. Embora se defenda que, no Brasil, exista uma tributação sobre o valor agregado cindida em três impostos (IPI, ICMS e ISSQN), isso não é tecnicamente correto. Desse modo, primeiramente devemos afastar a confusão que é feita entre tributos que, no Brasil, seguem
a sistemática da não cumulatividade e os denominados impostos sobre o valor agregado (IVA), a exemplo do IVA existente no âmbito da União Europeia. Só seria correta a assertiva segundo a qual a não cumulatividade brasileira equivale aos impostos sobre o valor agregado se as alíquotas do imposto não cumulativo fossem sempre uniformes (idênticas) em todas as etapas de uma mesma cadeia de produção. Um exemplo envolvendo a tributação em cadeia ajuda a ilustrar[183]: imagine um produto em cuja industrialização todos os insumos sejam tributados à alíquota 5% e o bem final a 20%; o total de insumos para a fabricação de um produto ‘X’ é de R$ 500,00, e este produto é vendido a R$ 700,00. Pela técnica adotada no Brasil – créditos e débitos –, esse fabricante terá R$ 25,00 de crédito de IPI e R$ 140,00 de débito, com um saldo de imposto a pagar de R$ 115,00. Como se vê, se a não cumulatividade implicasse em tributação sobre o valor agregado, no exemplo acima o IPI a pagar teria que ser R$ 40,00, porque o valor adicionado na operação de industrialização foi de R$
200,00 e a alíquota de 20% de IPI só poderia incidir sobre essa quantia. Por isso mesmo deve ser afastada a concepção segundo a qual há no Brasil tributação sobre valor agregado. Ademais, no que nos interessa, o ISSQN compõe o próprio valor do serviço prestado, sendo embutido no preço e sofrendo o fenômeno da translação tributária econômica – típica dos tributos indiretos[184]. A título exemplificativo, colaciono o Artigo 177, §40, do Decreto n. 52.703/2011 do Município de São Paulo – SP (grifamos)[185]: Seção IV - Base de Cálculo Subseção I - Disposições Gerais Art. 177. A base de cálculo do imposto é o preço do serviço, como tal considerada a receita bruta a ele correspondente, sem nenhuma dedução, excetuados os descontos ou abatimentos concedidos independentemente de qualquer condição.
(...) § 4º O montante do imposto é considerado parte integrante e indissociável do preço referido neste artigo, constituindo o respectivo destaque nos documentos fiscais mera indicação de controle. Como se percebe, o montante de ISSQN é parte integrante e indissociável da sua própria base de cálculo e o eventual destaque da alíquota e valor do tributo tem caráter meramente informativo ou de serventia para o controle pela Administração Fiscal. O valor pago por um serviço é um montante único e indivisível no qual está contido o valor do tributo; o contribuinte de fato, ao remunerar o prestador de serviço, paga tanto por este como pelo ISSQN, de forma indiscriminada do ponto de vista técnico tributário. E, por sua vez, o contribuinte de direito – prestador dos serviços da lista anexa à LC 116 –, ao receber o valor em contraprestação ao serviço, é remunerado por quantia global, una, indivisível.
Esse ponto é fundamental para a compreensão do tema objeto desse estudo. Entender que o valor do tributo compõe o próprio preço do serviço é o aspecto técnico que serve como ponto de partida para a análise da inclusão do ISSQN na base de cálculo do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS. Passemos, pois, a analisar a inclusão do ISSQN na base de cálculo de cada uma das exações – IRPJ, CSLL, PIS e COFINS – em estudo neste capítulo.
2. O ISSQN NA BASE DE CÁLCULO DO IMPOSTO SOBRE RENDA E PROVENTOS DE QUALQUER NATUREZA DE PESSOA JURÍDICA – IRPJ 2.1. Aspectos Constitucionais – base econômica do tributo Cumpre-nos inicialmente tecer as considerações necessárias acerca da base econômica do Imposto de Renda e Proventos de Qualquer Natureza de Pessoa Jurídica – IRPJ, tendo em conta que para o encontro do aspecto dimensível (base de cálculo) do tributo é
imprescindível
a
análise
de
sua
materialidade
constitucional. Dentre os impostos federais, prevê o inciso III do Artigo 153 da CF que Compete à União instituir impostos sobre (...)renda e proventos de qualquer natureza; (...). Analisando a materialidade aberta à tributação pelo imposto, Paulsen assevera que o “Acréscimo Patrimonial” é o elemento nuclear que abrange a renda e os proventos. A renda é o acréscimo patrimonial produto do capital ou do trabalho. Proventos são os acréscimos patrimoniais decorrentes de uma atividade que já cessou.[186] O Acréscimo Patrimonial é, portanto, o fato signo presuntivo de capacidade contributiva, que representa o resultado positivo de uma subtração que tem como elementos os rendimentos brutos auferidos pelo contribuinte, entre dois marcos temporais (aspecto temporal), e, por subtraendo, o total das deduções e abatimentos que a Constituição e as leis permitam fazer. Renda e proventos
pressupõem ações
que
representam mais valias, ou seja, incrementos na capacidade contributiva[187], que autorizam ao Estado derivar do patrimônio particular recursos para as finalidades coletivas. Antes de descer à complementação normativa do Sistema Tributário Nacional (CTN), devemos discorrer sobre os seguintes critérios constitucionais para a instituição do Imposto de Renda: generalidade, universalidade e progressividade (CF, Art. 153, §20). A generalidade relaciona-se com o aspecto pessoal do tributo: o sujeito passivo; todos os contribuintes devem ser tratados de modo isonômico. Não se pode admitir classes de patrimônios, nem espécies de acréscimos patrimoniais (proventos e rendas); todos os ganhos decorrentes do ato de produção de renda deve ser objeto de tributação. A base de cálculo é informada pela universalidade, a determinar que o tributo deve alcançar quaisquer rendas e proventos percebidos pelo contribuinte. De acordo com Paulsen:
Em face do critério constitucional da universalidade, ter-se-ia de considerar a totalidade das rendas do contribuinte como uma unidade, sem estabelecer distinções entre tipos de rendas para efeito de tributação diferenciada.[188] Esse ponto é importante para a compreensão da temática objeto desse estudo, na medida em que analisaremos se o ISSQN estará contido na base de cálculo do imposto sobre os acréscimos patrimoniais, sendo que está deverá ser qualificado pelo critério da universalidade do aspecto dimensível da hipótese de incidência. Por fim, a progressividade é um critério que exige variação positiva da alíquota do imposto de renda à medida em que há o aumento na base de cálculo. Trata-se de rega qualificadora da capacidade contributiva (Lobo Torres considera que a seletividade e a progressividade são subprincípios da capacidade contributiva[189], §1º do art. 145 da Constituição).
A progressividade pode ser simples ou gradual: simples quando haja elevação de alíquotas em face do aumento da base de cálculo; gradual quando se dê mediante aplicação de alíquotas maiores para a parte da base de cálculo que ultrapasse o limite previsto para a alíquota inferior.[190]
2.2. Fato Gerador (Aspecto Material) e Base de Cálculo do tributo Em nível complementar, estabelece o Código Tributário Nacional[191] (CTN) o seguinte aspecto material (fato gerador) do Imposto de Renda: Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica: I – de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos;
II – de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior. § 1º A incidência do imposto independe da denominação da receita ou do rendimento, da localização, condição jurídica ou nacionalidade da fonte, da origem e da forma de percepção. (Parágrafo incluído pela LC nº 104, de 10.1.2001) § 2º Na hipótese de receita ou de rendimento oriundos do exterior, a lei estabelecerá as condições e o momento em que se dará sua disponibilidade, para fins de incidência do imposto referido neste artigo. (Parágrafo incluído pela LC nº 104, de 10.1.2001) Conforme já destacado por ocasião da análise da base econômica, o art. 43 do CTN se reporta ao “acréscimo patrimonial” como elemento comum e nuclear dos conceitos de renda e proventos. Nesse sentido, podemos afirmar que o fato gerador
é
a
aquisição
patrimonial
da
produto
disponibilidade do
capital,
do
de
acréscimo
trabalho,
da
combinação de ambos (renda) ou de qualquer outra causa (proventos)[192]. Quanto ao aspecto quantitativo ou dimensível, o dispositivo seguinte do CTN, Art. 44, estabelece que: Art. 44. A base de cálculo do imposto é o montante, real, arbitrado ou presumido, da renda ou dos proventos tributáveis. Do dispositivo acima se extraem as três formas de se obter a base de cálculo do tributo: lucro real, presumido ou arbitrado – formas de apuração do “acréscimo patrimonial”[193]. A tributação pelo lucro real pressupõe determinadas formalidades legais de apuração efetiva do lucro da pessoa jurídica, mediante consideração das suas receitas e das deduções legalmente cabíveis. De acordo com a doutrina: Apura-se efetivamente o lucro ocorrido, calculando-se sobre ele, o montante devido a
título de IRPJ. Não há que se confundir o lucro líquido – que é o lucro contábil – com o lucro real. O que difere é que as deduções e compensações admissíveis para a apuração do lucro líquido não correspondem exatamente àquelas admitidas para fins de apuração da base de cálculo do IRPJ, ou seja, do lucro real. Assim, obtido o lucro líquido, fazem-se as adequações necessárias (adições, exclusões e compensações) para a apuração do lucro real.[194] Conforme o rol constante do art. 14 da Lei 9.718/98, há empresas que estão obrigadas a apuração do imposto de renda da pessoa jurídica por meio do lucro real.[195] Já a tributação pelos lucros presumido e arbitrado pressupõe a utilização de bases substitutivas da chamada base de cálculo primária. Desse modo, na apuração presumida ou arbitrada, não mais se tem como base de cálculo o “acréscimo
patrimonial” (base econômica), mas uma realidade diferente – um certo percentual do faturamento. No lucro presumido, a Lei prevê duas bases de cálculos alternativas, cuja escolha compete ao contribuinte; no lucro arbitrado a lei prevê uma base de cálculo primária e outra secundária, ou de segundo grau, que se substitui à primeira, não por opção do contribuinte, mas por impossibilidade objetiva de aferição da base de cálculo primária. Assim, asseveremos desde já que, tendo em conta o conceito de Acréscimo Patrimonial (base econômica do IRPJ) e que o ISSQN é calculado por dentro, compondo o preço do serviço e sendo objeto de translação tributária (transferência do encargo financeiro) – sendo impossível dissociar o que é ‘custo do serviço’ e o que é tributo – é inegável que esse montante indivisível constitui renda tributável. A contrapartida financeira do serviço é indiscutivelmente um acréscimo patrimonial do sujeito passivo que o presta, inovando positivamente em seu
patrimônio. O tributo sobre o serviço é parte indivisível do montante pago em contraprestação e sua repercussão financeira é repassada ao consumidor final – contribuinte de fato –, de modo que a renda remunera totalmente o serviço prestado. Dito de outro modo, o serviço é a remuneração do prestador, cobrada de quem o utiliza e que integralmente sofre a repercussão financeira; em termos de acréscimo financeiro e sob a ótica do prestador o valor auferido pelo serviço é livre de qualquer ônus. Portanto, tendo em conta a base econômica (acréscimo patrimonial) do Imposto de Renda, o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISSQN (CF, Art. 153, III) pode perfeitamente compor a base de cálculo do IRPJ, não havendo transbordamento da materialidade constitucional deste imposto.
2.3 Peculiaridade da apuração mediante o lucro real e a jurisprudência sobre o tema
Analisando as peculiaridades do tema, relevante destacar a situação da apuração do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica por meio do Lucro Real; neste caso, asseveramos que a Lei, o Regulamento do Imposto de Renda (RIR) e a Jurisprudência permitem que haja a dedução, como custo, dos impostos incidentes sobre as vendas (IPI, ICMS e ISS). Ou seja, embora seja legítima a inclusão do ISSQN na base de cálculo do IRPJ, a opção do contribuinte pela apuração pelo lucro real lhe dará um favor fiscal dedutivo da base de cálculo. Antes, frisamos que no caso da apuração da base econômica “acréscimo patrimonial” mediante apuração da base de cálculo do IRPJ através do lucro presumido, não há nenhuma dúvida da inclusão do valor do ISSQN no conceito de “receita bruta”. Nesse sentido, vejamos o Artigo 15 da Lei 9.249/1995 e o Artigo 518 do Decreto 3000/99 – RIR: Art. 15. A base de cálculo do imposto, em cada mês, será determinada
mediante a aplicação do percentual de 8% (oito por cento) sobre a receita bruta auferida mensalmente, observado o disposto no art. 12 do Decreto-Lei no 1.598, de 26 de dezembro de 1977, deduzida das devoluções, vendas canceladas e dos descontos incondicionais concedidos, sem prejuízo do disposto nos arts. 30, 32, 34 e 35 da Lei no 8.981, de 20 de janeiro de 1995. (Redação dada pela Lei nº 12.973, de 2014) Art. 518. A base de cálculo do imposto e do adicional (541 e 542), em cada trimestre, será determinada mediante a aplicação do percentual de oito por cento sobre a receita bruta auferida no período de apuração, observado o que dispõe o § 7o do art. 240 e demais disposições deste Subtítulo (Lei no 9.249, de 1995, art. 15, e Lei nº 9.430, de 1996, arts. 1º e 25, e inciso I). Relevante é descortinar o conceito de “receita
bruta”; nos termos do RIR – Decreto 3000/99: Art. 279. A receita bruta das vendas e serviços compreende o produto da venda de bens nas operações de conta própria, o preço dos serviços prestados e o resultado auferido nas operações de conta alheia (Lei nº 4.506, de 1964, art. 44, e Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 12). Parágrafo único. Na receita bruta não se incluem os impostos não cumulativos cobrados, destacadamente, do comprador ou contratante, dos quais o vendedor dos bens ou o prestador dos serviços seja mero depositário. Insistimos que o contribuinte de direito do ISSQN quando recebe o preço pela mercadoria ou serviço vendidos o recebe integralmente, ou seja, o recebe como receita sua o valor do serviço somado, indissociavelmente, ao valor do ISSQN (valor total da operação).
Esse montante, por se tratar de produto da venda dos serviços, transita pela sua contabilidade como receita, especificamente como RECEITA BRUTA, assim conceituada pela legislação que apura o IRPJ e a CSLL pelo lucro presumido[196]. Na apuração do IRPJ por meio do lucro arbitrado, o procedimento irá depender do contexto em que se encontre o contribuinte – especialmente quanto ao conhecimento (Art. 532 do RIR) ou não (Art. 535 do RIR) da receita bruta. Contudo, relevante destacar que sempre que a apuração pelo lucro arbitrado implicar em incidência de percentual sobre a receita bruta, indiscutivelmente o ISSQN (ou qualquer tributo embutido no valor das receitas do contribuinte – ICMS, v.g.) estará incluído na base de cálculo. Assim, utilizando a Lei como grandeza dimensível a RECEITA BRUTA – como é o caso da apuração pelo lucro presumido e arbitrado – os tributos incidentes sobre a venda ou serviços (IPI, ICMS e ISSQN) estarão contidos na base de cálculo do IRPJ.
Por outro lado, no caso da apuração do IRPJ pelo lucro real, há permissão supressiva (ou dedutiva) dos tributos incidentes sobre as vendas ou serviços da base de cálculo. Vejamos. Como dito no tópico anterior, a apuração do lucro real não se confunde com o lucro líquido, mas parte deste para, mediante a aplicação das deduções e compensações legais, ser encontrada a base de cálculo do IRPJ nesta sistemática. Uma dessas deduções franqueada pela Lei é a dos tributos incidentes sobre a venda ou serviços – Lei nº 8.981, de 1995, art. 41 e Decreto 3000/99 (RIR), Art. 344: Art. 41. Os tributos e contribuições são dedutíveis, na determinação do lucro real, segundo o regime de competência. Art. 344. Os tributos e contribuições são dedutíveis, na determinação do lucro real, segundo o regime de competência (Lei nº 8.981, de 1995, art. 41). Nesse sentido, destaco trecho do voto do Ministro
Mauro Campbell Marques no RESP 1.312.024/RS (Segunda Turma, DJe 7.5.2013) – Superior Tribunal de Justiça (STJ): A apuração do IRPJ e da CSLL pelo lucro presumido é faculdade posta à disposição do contribuinte que, se desejar, pode efetuar a apuração desses tributos pelo lucro real, situação em que poderá deduzir como custos os impostos incidentes sobre as vendas (ICMS, IPI, ISS). Embora tratando acerca do ICMS, mutatis mutandi, para a jurisprudência do STJ, nas empresas optantes pelo lucro presumido, a inclusão do ICMS na base de cálculo do IRPJ e CSLL não se reveste de ilegalidade, pois o cálculo de tais exação se efetivam sobre a "receita bruta" da entidade, compreendido o ICMS na sua composição (que, tal qual o ISSQN, também é calculado por dentro do preço). "nas empresas optantes pelo lucro presumido, a inclusão do ICMS na base de cálculo do
IRPJ e CSLL não se reveste de ilegalidade, pois o cálculo de tais exação se efetivam sobre a 'receita bruta' da entidade, compreendido o ICMS na sua composição" (AgRg no REsp 1.449.523/RS, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 12/06/2014). “As bases de cálculo do IRPJ e da CSLL apurados pelo lucro presumido têm por parâmetro a aplicação de determinado percentual sobre a "receita bruta" e não sobre a "receita líquida". Quisera o contribuinte deduzir os tributos pagos, no caso o ICMS, deveria ter feito a opção pelo regime de tributação com base no lucro real, onde tal é possível, a teor do art. 41, da Lei n. 8.981/95 e art. 344 do RIR/99 (Decreto n. 3.000/99).” Precedente: REsp. 1.312.024/RS, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 02.05.2013. “No regime do lucro presumido, o ICMS
compõe a base de cálculo do IRPJ e da CSLL” (AgRg no REsp 1.393.280/RN, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 16.12.2013; REsp 1.312.024/RS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 7.5.2013; AgRg no REsp 1.423.160/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, 15/04/2014)
SEGUNDA
TURMA,
DJe
Deve ser afastada qualquer tentativa de o contribuinte alegar em juízo ser optante do lucro presumido e, em seguida, exigir as benesses legais (dedução na base de cálculo) a que teria direito no regime do lucro real, mesclando os regimes de apuração do IRPJ[197]. Arrematando, o ISSQN está perfeitamente contido no conceito de receita bruta e compõe a base de cálculo do IRPJ, exceto no caso específico da opção pela apuração pelo lucro real, quando a Lei irá permitir a dedução dos tributos incidentes sobre a venda e serviços[198].
3. O ISSQN NA BASE DE CÁLCULO DAS CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS 3.1 Breves comentários sobre as contribuições na Constituição Federal de 1988 Existem situações nas quais o Estado age com referência a determinado grupo de contribuintes, dentro da concepção de uma “segurança social”, representativa da feição garantística do Estado. Em verdade, tais ações estatais não possuem a referibilidade[199] direta das taxas, mas não são genéricas (universais) para serem custeadas especificamente pela receita dos impostos. São medidas com finalidades peculiares, dentro da ordem social, custeadas diretamente[200] através de exação denominada contribuição. Não pressupondo nenhuma atividade direta, específica e divisível, as contribuições não são dimensionadas por critérios comutativos, mas por critérios distributivos, podendo variar conforme a capacidade contributiva de cada um.[201]
A doutrina nos oferece o seguinte conceito para a espécie tributária: Contribuição especial é o tributo que, apesar de ter hipótese de incidência desvinculada de atuações estatais, é juridicamente afetado à realização de finalidades específicas (notas conceituais), as quais autorizam a sua instituição e a sua cobrança dos sujeitos passivos a elas relacionados, no montante e no período em que a cobrança se revelar efetivamente necessária específicos de validade).[202]
(requisitos
Destacamos esse traço característico da finalidade a que estão preordenadas as contribuições sociais, somente podendo ser instituídas nos termos do 149 da Constituição Federal, sendo este o dispositivo a que se atribui a norma matriz de competência tributária para a instituição da exação: Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das
categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo. § 1º Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão contribuição, cobrada de seus servidores, para o custeio, em benefício destes, do regime previdenciário de que trata o art. 40, cuja alíquota não será inferior à da contribuição dos servidores titulares de cargos efetivos da União. § 2º As contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico de que trata o caput deste artigo: I - não incidirão sobre as receitas decorrentes de exportação[203]; II - incidirão também sobre a importação de produtos estrangeiros ou serviços; III - poderão ter alíquotas:
a) ad valorem, tendo por base o faturamento, a receita bruta ou o valor da operação e, no caso de importação, o valor aduaneiro[204]; b) específica, tendo por base a unidade de medida adotada. § 3º A pessoa natural destinatária das operações de importação poderá ser equiparada a pessoa jurídica, na forma da lei. § 4º A lei definirá as hipóteses em que as contribuições incidirão uma única vez. Como é perceptível a partir da leitura dos dispositivos constitucionais, não se deve confundir as finalidades das contribuições com o respectivo fato gerador (aspecto material), que é a situação definida em lei como necessária e suficiente ao seu surgimento. Com base no dispositivo colacionado, a doutrina elenca as seguintes espécies de contribuições: sociais, interventivas ou de intervenção no domínio econômico e coorporativas ou de interesse das categorias profissionais e econômicas. De outra feita, o Artigo 195, I a IV, dispõe
casuisticamente acerca das materialidades abertas às contribuições sociais: Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais: (Vide Emenda Constitucional nº 20, de 1998) I - do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre: a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício; b) a receita ou o faturamento; c) o lucro; II - do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não incidindo contribuição
sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de previdência social de que trata o art. 201; III - sobre a receita de concursos de prognósticos. IV - do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele equiparar. Para o objetivo perseguido neste estudo, nos interessa estudar as contribuições sociais previstas no Art. 195 incidentes sobres as seguintes materialidades (bases econômicas) abertas pela Carta Marga: - CSLL – Contribuição sobre o Lucro Líquido: Art. 195, I, c, da CF (Lucro). - PIS/PASEP e COFINS – Programa de Integração Social – PIS, para o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público – PASEP e Contribuição para Financiamento da Seguridade Social – COFINS: Art. 195, inciso I, b, da CF (Receita ou Faturamento)[205]. A aferição da inclusão do ISSQN na base de cálculo da CSLL, do PIS e da COFINS deve passar pela
análise das seguintes bases econômicas sobre as quais o tributo incidirá: lucro e receita ou faturamento. 3.2 O ISSQN na Base de Cálculo da Contribuição Sobre o Lucro Líquido – CSLL A previsão constitucional da CSLL está contida na alínea ' c' do inciso I do artigo 195 e sua instituição foi dada pela Lei nº 7.689, de 15 de dezembro de 1988. A hipótese de incidência da CSLL é o auferimento de lucro pela empresa e sua base de cálculo, o resultado obtido no respectivo exercício, conforme dispõe o artigo 2º da Lei nº 7.689, de 15 de dezembro de 1988. A base de cálculo da CSLL, assim como a do IRPJ, não corresponde de modo absoluto ao lucro líquido ou lucro contábil – como, aliás, já deixamos consignado em item acima. Em verdade, a Lei toma por base o lucro líquido e chega à base de cálculo mediante adições, exclusões e compensações. Assim, não se confundem as bases de cálculo da CSLL e do IRPJ: tratam-se de tributos que inegavelmente incidem sobre o lucro das empresas, mas com critérios
distintos de adições, exclusões e compensações adotados em cada uma das leis respectivas desses tributos, chegando às bases de cálculos próprias para um e para o outro – embora, insisto, o ponto de partida seja o mesmo (lucro líquido ou contábil), mas a regulação legal das adições, exclusões e compensações é diversa. A base de cálculo da CSLL é o chamado resultado ajustado, enquanto a do IRPJ é o lucro real, ambos obtidos a partir do lucro líquido, mas mediante adições, exclusões e compensações determinadas instituidora de cada tributo.[206]
pela
lei
Como se vê, em ambos os casos a incidência dos tributos se dá em função do lucro auferido pela pessoa jurídica. Quanto a empresa se sujeitar, relativamente ao IRPJ, à tributação pelo lucro real, a base de cálculo é o resultado do exercício, antes da provisão para o imposto de renda, com os ajustes determinados pela legislação; daí falar-se em resultado ajustado (Art. 36 e seguintes da
IN 390/04). Nesse sentido, do mesmo modo que o Art. 344 do Regulamento do Imposto de renda permite a dedução de tributos na apuração do lucro real, a IN 390/2004 também irá permitir a mesma dedução de tributos para o resultado ajustado; vejamos: Decreto 3000/99 (RIR), Art. 344. Imposto de Renda. Base: Lucro real. Art. 344. Os tributos e contribuições são dedutíveis, na determinação do lucro real, segundo o regime de competência (Lei nº 8.981, de 1995, art. 41). Instrução Normativa 390/2004. Art. 36 e 50. CSLL. Base: Resultado ajustado, para as pessoas jurídicas que se submetem à apuração do IRPJ segundo o lucro real. Art. 36. Estão sujeitas ao regime de incidência da CSLL sobre o resultado ajustado, em cada ano-calendário, as pessoas jurídicas que forem obrigadas ao regime de tributação com
base no lucro real. Art. 50. Os tributos e contribuições são dedutíveis, na determinação do resultado ajustado, segundo o regime de competência. Por outro lado, poderá a CSLL incidir, também, sobre o resultado presumido ou arbitrado, quando este seja o regime a que se submete a pessoa jurídica em relação ao IRPJ: Instrução Normativa 390/2004. Art. 85. CSLL. Para as pessoas jurídicas que se submetem à apuração do IRPJ segundo o lucro presumido ou arbitrado. Art. 85. As pessoas jurídicas que optarem pela apuração e pagamento do imposto sobre a renda com base no lucro presumido ou que pagarem o IRPJ com base no lucro arbitrado, determinarão a base de cálculo da CSLL conforme esses regimes de incidência. Portanto, quanto à inclusão do ISSQN na base de cálculo da CSLL serão aplicáveis as mesmas conclusões
apresentadas acima para o Imposto de Renda da Pessoa Jurídica: somente será excluído o tributo no caso de apuração do IRPJ segundo o lucro real. Nesse sentido, vale a jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça, anteriormente colacionada. Vejamos: (...) O ICMS deve compor as bases de cálculo do IRPJ e da CSLL apurados pelo lucro presumido. Para afastar tal incidência, a opção do contribuinte deve ser pelo regime de tributação com base no lucro real, situação permitida nos termos do art. 41 da Lei n. 8.981/95 e art. 344 do RIR/99. (AgRg no REsp 1495699/CE, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/06/2015, DJe 26/06/2015). DIREITO TRIBUTÁRIO. HIPÓTESE DE INCLUSÃO DO ICMS NA BASE DE CÁLCULO DO IRPJ E DA CSLL. No regime de lucro presumido, o ICMS compõe a base
de cálculo do IRPJ e da CSLL (AgRg no REsp 1.423.160-RS, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 27/3/2014). Repisamos que se trata de uma opção legal – supressão redutiva da base de cálculo, que se constitui em favor fiscal –, sendo que a materialidade constitucional (lucro) e o cálculo embutido do ISSQN no preço do serviço autorizam perfeitamente a sua inclusão na base de cálculo tanto do IRPJ como da CSLL – o que legitimamente ocorre quando o lucro é presumido ou arbitrado. 3.3 O ISSQN na Base de Cálculo do PIS/PASEP e da COFINS 3.3.1 A regulação jurídica do PIS e da COFINS O suporte constitucional para a instituição tanto do PIS/PASEP (a partir de agora chamado apenas de “PIS”) como da COFINS encontra-se no Artigo 195, inciso I, alínea b, da CF/88 – com redação dada pela Emenda n. 20/1998. Assim,
tanto
o
PIS
como
a
COFINS
(PIS/COFINS) têm a mesma materialidade e base econômica: a receita ou faturamento. Preliminarmente menciono dois aspectos que deixam de serem analisados neste tópico por fugirem ao escopo perseguido – que é descortinar a base de cálculo relativa à grandeza (ou base) econômica receita ou faturamento; primeiro o PIS/COFINS-Importação, tributo cobrado do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele equiparar (CF Art. 195, inciso IV); depois a questão relativa às contribuições sobre receita substitutivas de contribuições sobre a folha e demais pagamentos à pessoa física, amparadas no §13 do Art. 195 da CF/88[207]. Neste último caso, tem-se que a contribuição sobre a folha de salários será substituída pela incidente sobre a receita ou faturamento; assim, aplicar-se-ão as mesmas considerações a que chegaremos quanto às contribuições originariamente incidentes sobre a receita ou faturamento; apenas não analisaremos as peculiaridades da norma constitucional que permite essa substituição da materialidade sobre a qual incidirá o tributo (§13 do Art. 195 da CF/88).
Pois bem. Segue a análise da base econômica aberta à tributação pelo tributo ‘PIS/COFINS’. A redação originária do Artigo 195, inciso I, alínea b, da Constituição Federal de 1988 previa apenas a base econômica “faturamento” para a instituição do tributo. Com a Emenda Constitucional n. 20/1998, à grandeza faturamento acresceu-se a receita, alargando-se a materialidade aberta à tributação. A Lei Complementar 70/91, que primeiro regulamentou a COFINS trouxe no conceito de faturamento a expressão 'receita bruta'. De acordo com o Art. 20 da Lei, faturamento é a "receita bruta das vendas de mercadorias, de mercadorias e serviços e de serviços de qualquer natureza.", sendo que o parágrafo único efetivou as seguintes exclusões da base de cálculo (grifamos): Art. 2° A contribuição de que trata o artigo anterior será de dois por cento e incidirá sobre o faturamento mensal, assim considerado a receita bruta das vendas de
mercadorias, de mercadorias e serviços e de serviço de qualquer natureza.Parágrafo único. Não integra a receita de que trata este artigo, para efeito de determinação da base de cálculo da contribuição, o valor: a) do imposto sobre produtos industrializados, quando destacado em separado no documento fiscal; b) das vendas canceladas, das devolvidas e dos descontos a qualquer título concedidos incondicionalmente. Como se vê, apenas o IPI foi expressamente suprimido da base de cálculo. O Supremo Tribunal Federal (STF) foi instado a se manifestar acerca do conceito de faturamento adotado na Lei Complementar 70, concluindo pela sua constitucionalidade (ADC n. 1)[208][209]. Ao julgar improcedente a ADC n. 1, o STF simplesmente afirmou que o 'faturamento' não se circunscreve apenas às saídas acompanhadas de fatura;
pelo contrário, abrange o produto de todas as vendas. Nesse sentido, a equiparação se realizou simplesmente pelo fato de que, para o STF, o conceito de receita bruta na LC 70/91 não extrapolou a grandeza faturamento, presente na redação originária da CF/88. Esclarecedor, no ponto, o voto do Ministro Moreira Alves por ocasião do julgamento da referida ADC n. 1: “Note-se que a Lei Complementar n. 70/91, ao considerar o faturamento como ‘a receita bruta das vendas de mercadorias, de mercadorias e serviços e de serviços de qualquer natureza’ nada mais fez do que lhe dar a conceituação de faturamento para efeitos fiscais, como bem salientou o eminente Ministro Ilmar Galvão, no voto que proferiu no RE 150.764, ao acrescentar que o conceito de receita bruta das vendas de mercadorias e de mercadorias e serviços ‘coincide com o de faturamento, que, para efeitos fiscais, foi sempre entendido
como o produto de todas as vendas, e não apenas das vendas acompanhadas de fatura, formalidade exigida tão somente nas vendas mercantis a prazo”. Num segundo momento, sucedeu a Lei 9.718/98 para regular a PIS/COFINS (regulação hoje chamada de regime cumulativo do tributo, como veremos adiante); esta Lei, contudo, terminou abrangendo a grandeza econômica existente de uma forma inconstitucional. Vejamos os dispositivos originários da Lei 9.718/98: Art. 3º O faturamento a que se refere o artigo anterior corresponde à receita bruta da pessoa jurídica. § 1º Entende-se por receita bruta a totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica, sendo irrelevantes o tipo de atividade por ela exercida e a classificação contábil adotada para as receitas. Muito embora a Emenda n. 20/98 – que alargou a materialidade “faturamento” para acrescentar a grandeza
“receita” – tenha surgido dias depois da publicação da Lei 9.718/98, esta deturpou o conceito de receita bruta, extrapolando a grandeza econômica vigente na redação originária da CF (“faturamento”) e o âmbito de equiparação que o STF havia empreendido na ADC n. 1 entre faturamento e receita bruta. De fato, tratou-se de um equívoco legislativo: a Emenda n. 20 que alargou a materialidade de “faturamento” para “receita ou faturamento” deveria ter antecedido, em vigência, a Lei 9.718/98[210]. E qual o conceito, afinal, de faturamento e receita bruta? O faturamento está incluído na receita bruta, é um minus; a receita bruta é um majus. Assim, o faturamento se circunscreve às finalidades da empresa e a receita bruta abrange toda e qualquer receita. Nos termos da Lei Complementar n. 70/91 a equiparação dos termos se deu pelo fato deste diploma legislativo trazer um conceito de receita bruta circunscrito ao que é comum ao faturamento.
Um exemplo provavelmente ajuda a elucidar:
clínica médica que presta serviços em sua área final, mas como pessoa jurídica, atua no mercado de capitais e aufere receita (dividendos, v.g.); nesse caso, o faturamento abrange apenas as receitas oriundas da finalidade constante do contrato social (objeto social); a receita bruta, por outro lado, é capaz de abranger toda e qualquer receita, independentemente da sua interligação com o fim social da clínica médica (serviços médicos) [211], inclusive aquelas decorrentes da exploração financeira do capital dessa pessoa jurídica[212]. Acrescento ao exemplo da clínica médica o precedente do STF admitindo que a receita proveniente da realização do objeto social das seguradoras, embora não constitua venda de mercadorias e serviços, configura faturamento tributável (STF, EDAgRg RE 400.479/RJ, rel. Ministro Cezar Peluso, ago/09, conferir informativo 556 do STF). Do mesmo modo, STF e STJ entendem que a receita proveniente da locação de bens móveis, quando objeto social da empresa, configura faturamento para fins
de tributação (STF, Segunda Turma, RE 371.258, rel. Ministro Cezar Peluso, out/06; STJ, Primeira Seção, RESP 929.521, rel. Ministro Luiz Fux, set/09). Assim, a extensão indevida do conceito de ‘faturamento’, promovida pela Lei 9.718/98, culminou na declaração de inconstitucionalidade pelo STF, em controle difuso, no RE 346.084; e o motivo foi a "ampliação do conceito de receita bruta para envolver a totalidade das receitas auferidas por pessoas jurídicas, independentemente da atividade por elas desenvolvida.", permitindo que o tributo seja cobrado tão somente em relação ao que esteja relacionado ao objeto social do contribuinte pessoa jurídica. Em suma, a superveniência da Lei 9.718/1998 antes do alargamento constitucional promovido pela EC n. 20/98 (de “faturamento” para “receita ou faturamento”) acabou por fulminar o diploma legislativo com a inconstitucionalidade do indevido alargamento da base econômica tributável pelo PIS/COFINS. Com a superveniência das Leis 10.833/03 e
10.637/02 foi inaugurada a sistemática do PIS/COFINS não cumulativo[213], aplicável às empresas que são tributadas com base no lucro real do IRPJ. Nos conceitos de faturamento das Leis 10.833/03 e 10.637/02 já está inclusa a receita bruta. De tal forma que, qualquer receita, conectada ou não com o fim social da empresa, estará sujeita às contribuições sociais, nessa sistemática. Sem qualquer dúvida, essas leis são constitucionais, pois editadas após a EC n. 20/98. Lei 10.833/03. Art. 1º A Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - Cofins, com a incidência não cumulativa, incide sobre o total das receitas auferidas no mês pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil. Lei 10.637/02 Art. 1º A Contribuição para o PIS/Pasep, com a incidência não cumulativa, incide sobre o total das receitas auferidas no mês pela pessoa
jurídica, independentemente de denominação ou classificação contábil.
sua
Portanto, convivem hoje dois regimes de tributação para o PIS/COFINS: o regime cumulativo da Lei 9.718/98 e o não cumulativo das Leis 10.833/03 e 10.637/02. Fincadas essas premissas, nos compete agora analisar a inclusão (ou não) do ISSQN no conceito de receita ou faturamento para fins de incidência do PIS/CONFINS, seja no regime cumulativo ou no regime não cumulativo. Em arremate, esclareço que a Lei 9.718/98, quanto à definição da base de cálculo do regime cumulativo do PIS/COFINS – aplicável, como visto, às empresas tributadas pelo imposto de renda segundo o lucro presumido ou arbitrado –, foi alterada pela Lei 12.973 de 2014, passando a ter a seguinte redação (Art. 1o): Art. 1º A Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - Cofins, com a incidência não cumulativa, incide sobre o total
das receitas auferidas no mês pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil. § 1º Para efeito do disposto neste artigo, o total das receitas compreende a receita bruta de que trata o art. 12 do Decreto-Lei n. 1.598, de 26 de dezembro de 1977, e todas as demais receitas auferidas pela pessoa jurídica com os seus respectivos valores decorrentes do ajuste a valor presente de que trata o inciso VIII do caput do art. 183 da Lei no 6.404, de 15 de dezembro de 1976. Por sua vez, também com redação dada pela Lei nº 12.973, de 2014, o art. 12 do Decreto-Lei n. 1.598, prevê que: Art. 12. A receita bruta compreende: I - o produto da venda de bens nas operações de conta própria; II - o preço da prestação de serviços em geral; III - o resultado auferido nas operações de
conta alheia; IV - as receitas da atividade ou objeto principal da pessoa jurídica não compreendidas nos incisos I a III. Portanto, esta é a nova base de cálculo do PIS/COFINS no regime cumulativo da Lei 9.718/98, já dentro do permissivo constitucional inaugurado com a Emenda n. 20 que permite a incidência do tributo sobre as bases econômicas ‘receita’ ou ‘faturamento’. 3.3.2 A inclusão do ISSQN no conceito de receita ou faturamento para fins de incidência do PIS/COFINS Embora complexo todo o imbróglio jurídico que envolve a tributação do PIS/COFINS, em nenhum momento a legislação suprimiu da base de cálculo da contribuição o tributo incidente sobre os serviços – diferentemente do que ocorreu, como visto acima, quanto à CSLL. Inegável, portanto, que no conceito de faturamento ou receita – receita decorrente de venda de mecardoria e serviços – está incluído o valor do ISSQN que, como dito
mais de uma vez neste estudo, está contido indissociável e globalmente no valor do serviço (custo embutido transferido ao contribuinte direto ou de fato – consumidor). Dessa realidade não se afasta a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que é absolutamente pacífica no sentido da inclusão do ISSQN na base de cálculo do PIS/COFINS (destacamos): TRIBUTÁRIO. ANÁLISE
PROCESSUAL CIVIL. DE MATÉRIA
CONSTITUCIONAL. IMPOSSIBILIDADE. COMPETÊNCIA DO STF. ISS. INCLUSÃO NA BASE DE CÁLCULO DO PIS E DA COFINS. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. 1. A competência do Superior Tribunal de Justiça refere-se a matéria infraconstitucional. A discussão sobre preceitos da Constituição Federal cabe ao STF. 2.
Ademais,
NOS
TERMOS
DA
JURISPRUDÊNCIA PACÍFICA DO STJ, O VALOR DO ISS DEVE COMPOR A BASE DE CÁLCULO DO PIS E DA COFINS, POIS INTEGRA O PREÇO DOS SERVIÇOS E, POR CONSEGUINTE, O FATURAMENTO DECORRENTE DO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE ECONÔMICA. Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp 1344030/RS, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/05/2015, DJe 26/05/2015). No mesmo sentido são os seguintes precedentes do STJ: AgRg no REsp 1.252.221/PE, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 14/08/2013; EDcl no AgRg no REsp 1.233.741/PR, Rel. Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 18/03/2013; AgRg no AREsp 75.356/SC, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 15/10/2013, DJe 21/10/2013. Portanto, no nosso entendimento, não há nenhum empecilho à inclusão do ISSQN na base de cálculo do PIS/COFINS, qualquer que seja o regime aplicável –
cumulativo, da Lei 9.718/1998, ou não cumulativo, das Leis 10.833/03 e 10.637/02. Bem como, ainda que a redação original da Lei 9.718/98 tenha extrapolado a materialidade constitucional à época vigente (‘faturamento’), não há por isso qualquer inconstitucionalidade em considerar o ISSQN na base de cálculo do PIS/COFINS quando o objeto social da empresa for a prestação de serviço previsto na lista anexa da Lei Complementar n. 116/2003. Não obstante entendermos, nos termos da pacífica jurisprudência do STJ, pela inclusão do ISSQN na base de cálculo do PIS/COFINS, necessário se faz a análise do atual contexto da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Primeiro, pende de análise a ADC n. 18, referente à originária redação da Lei 9.718/98 e a inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS/COFINS nesse regime específico. Houve concessão de medida cautelar nessa ADC: EMENTA Medida cautelar. Ação declaratória
de constitucionalidade. Art. 3º, § 2º, inciso I, da Lei nº 9.718/98. COFINS e PIS/PASEP. Base de cálculo. Faturamento (art. 195, inciso I, alínea "b", da CF). Exclusão do valor relativo ao ICMS. 1. O controle direto de constitucionalidade precede o controle difuso, não obstando o ajuizamento da ação direta o curso do julgamento do recurso extraordinário. 2. Comprovada a divergência jurisprudencial entre Juízes e Tribunais pátrios relativamente à possibilidade de incluir o valor do ICMS na base de cálculo da COFINS e do PIS/PASEP, cabe deferir a medida cautelar para suspender o julgamento das demandas que envolvam a aplicação do art. 3º, § 2º, inciso I, da Lei nº 9.718/98. 3. Medida cautelar deferida, excluídos desta os processos em andamentos no Supremo Tribunal Federal. Esclareço que os dispositivos atacados na ADC n. 18 já foram objeto de alteração legislativa (Lei
12.973/2014) e que, embora trate da inclusão do ICMS na base do PIS/COFINS, mutatis mutandi, em tudo se aplica também à inclusão do ISSQN nesse mesmo aspecto dimensível. Tanto que, no RE 592.616, submetido ao regime de repercussão geral, o Supremo Tribunal Federal decidiu pela prejudicialidade em relação à ADC n. 18: REPERCUSSÃO GERAL NO RE 592616 (09/10/2008) EMENTA DIREITO TRIBUTÁRIO. ISS. INCLUSÃO NA BASE DE CÁLCULO DA CONTRIBUIÇÃO AO PIS E DA COFINS. CONCEITO FATURAMENTO. EXISTÊNCIA REPERCUSSÃO GERAL.
DE DE
Decisão de prejudicialidade quanto à ADC n. 18, de 01/02/2012: DECISÃO: A existência de nexo de prejudicialidade entre a matéria versada na presente sede recursal extraordinária e o tema objeto de indagação na ADC 18/DF justifica o
acolhimento
do
Procuradoria-Geral
parecer da
da
República,
douta cujos
fundamentos adoto como razão de decidir. Sendo assim, determino o sobrestamento dos presentes autos, na Secretaria Judiciária desta Corte, até o julgamento, que deverá ocorrer brevemente, da mencionada ADC 18/DF, de que sou Relator. Publique-se. Brasília, 1º de fevereiro de 2012. Ministro CELSO DE MELLO Relator Portanto, quanto ao tema, devemos aguardar o pronunciamento definitivo do Supremo Tribunal Federal no mérito da ADC n. 18, sabendo que a análise (como se atesta pela ementa colacionada quando da concessão da medida cautelar) leva em conta tão somente um dos regimes do PIS/COFINS – Lei 9.718, que foi, inclusive, declarada inconstitucional incidentalmente, por ter alargado a base de cálculo do tributo, no RE 346.084 – e dispositivos que já foram revogados (Lei 12.973/2014).
A redação original da Lei 9.718/1998 é, talvez, um dos diplomas de Direito Tributário de maior celeuma jurídica nos Tribunais pátrios e, embora tenhamos que aguardar as conclusões na ADC n. 18, não se deve esperar que este julgamento vá resolver por completo a questão da incidência do ICMS e ISSQN na base de cálculo do PIS/COFINS – até porque vige hoje um outro regime paralelo (não cumulativo), plasmado nas Leis 10.833/03 e 10.637/02 e o Supremo Tribunal Federal não impediu que houvesse a cobrança integral do tributo com base na redação originária da Lei 9.718/98, mas apenas que a tributação abrangesse apenas o faturamento decorrente do objeto social do contribuinte. Repiso que na posição adotada neste artigo, qualquer que seja o regime, o ISSQN deve compor a base de cálculo do PIS/COFINS, por estar embutido no preço pago pelo serviço que, por sua vez, é a própria materialidade aberta à tributação pela contribuição: receita ou faturamento de mercadorias ou serviços. Ao fim, colaciono precedente recente do Supremo
Tribunal Federal contrário à inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS/COFINS. Temos que esse julgamento não altera o contexto acima descrito (necessidade de se aguardar a ADC n. 18 e, prejudicialmente a esta, o RE 592.616, submetido ao regime de repercussão geral): TRIBUTO – BASE DE INCIDÊNCIA – CUMULAÇÃO – IMPROPRIEDADE. Não bastasse a ordem natural das coisas, o arcabouço jurídico constitucional inviabiliza a tomada de valor alusivo a certo tributo como base de incidência de outro. COFINS – BASE DE INCIDÊNCIA – FATURAMENTO – ICMS. O que relativo a título de Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e a Prestação de Serviços não compõe a base de incidência da Cofins, porque estranho ao conceito de faturamento. (RE 240.785, Pleno. Julgado em 08/10/2014, rel. Ministro Marco Aurélio) Esclareço que não votaram os Ministros Roberto Barroso, Teori Zavascki, Luiz Fux e Dias Toffoli, ou seja,
embora
se
trate
de
precedente
indubitavelmente
persuasivo, não se pode considerar pacificada a celeuma. 4. CONCLUSÃO Ante o que foi exposto neste estudo, concluímos que: (a) o ISSQN irá compor a base de cálculo do IRPJ e da CSLL, sempre que se trate da apuração daquele imposto mediante os critérios do lucro presumido ou arbitrado; (b) no nosso entendimento, o ISSQN compõe a base de cálculo do PIS/COFINS, por se tratar de valor embutido no custo de serviço, sendo que este representa a própria receita ou faturamento – base econômica da exação –, sendo necessário, contudo, fazer a ressalva de entendimento diverso do STF, no RE 240.785, e aguardar a conclusão do julgamento na repercussão geral reconhecida no RE 592.616, que está atrelado à solução da ADC n. 18. Ressaltamos que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, por outro lado, é absolutamente pacífica quanto à possibilidade de inclusão do ISSQN na base de cálculo do PIS/COFINS.
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tributário
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Capítulo 16 ISSQN E ELISÃO FISCAL QUANTO AOS SERVIÇOS DE STREAMING NO BRASIL: HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA NÃO PREVISTA NA LC 116/03
Cássio Nunes de Lira Braga[214]
INTRODUÇÃO
Existe um debate recente em torno da tributação de serviços oferecidos através de streaming. Em linhas gerais, streaming é uma tecnologia que envia informações multimídia através da transferência de dados que atravessam a rede mundial de computadores e chegam até o consumidor final. Essa tecnologia é possível no Brasil graças ao oferecimento de internet veloz aos consumidores, sendo que o serviço de streaming depende da paralela contratação de um serviço de dados estável.
Possibilidade nova, o streaming de vídeo contratado através do pagamento de mensalidade vem crescendo no Brasil e está sendo alvo de críticas por empresas de TV por assinatura e de comunicação em geral, vez que, enquanto estas últimas pagam tributos, as demais não são alvo de qualquer exação. Diante do posicionamento das empresas de comunicação, alegando concorrência desleal das empresas de streaming, o Governo Federal posicionou-se favoravelmente a uma regulamentação, especialmente para tributar, de alguma maneira, os serviços em questão, não obstante dificuldades quanto à localização de servidores, a desatualização da legislação tributária quanto aos serviços de comunicação e banda larga, e todos os demais problemas quanto à caracterização de novas hipóteses de incidência. Ressalte-se que existem diversos serviços de tecnologia postos em questão, além dos de transmissão de vídeo por streaming (v. g. Netflix): pode-se citar o Uber, aplicativo facilitador do transporte dentro da cidade – que está
sendo alvo de críticas pelos taxistas; os de streaming de música, como o Apple Music; os de mensagens instantâneas capazes de promover ligações, como o WhatsApp, dentre outros[215]. Assim, o artigo se propõe, diante da ausência de regulamentação sobre a tributação dos serviços expostos (especialmente os de transmissão de vídeos mediante pagamento de mensalidades), analisar a possibilidade de incidência do ISSQN sobre serviços de streaming de vídeo, partindo-se, antes, de uma análise detida sobre o referido tributo municipal.
2. O ISSQN E SUAS CARACTERÍSTICAS FUNDAMENTAIS NA LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA E NA JURISPRUDÊNCIA DOS TRIBUNAIS SUPERIORES
O Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), tributo de competência municipal com previsão no art. 156, III, da CF (Art. 156. Compete aos Municípios
instituir impostos sobre: III - serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar), incide sobre serviços, excluídos aí os de comunicação e os de transporte intermunicipal e interestadual, mas desde que estejam previstos na Lista Anexa à LC 116/03. Serviço, a propósito, é bem explicado por PAULSEN (2012): O conceito constitucional de serviço (“prestação de esforço humano a terceiros, com conteúdo econômico, em caráter negocial, sob regime de direito privado, tendendo à obtenção de um bem material ou imaterial”) abrange: a) obrigação de fazer (e nenhuma outra); b) serviços submetidos ao regime de direito privado, não incluindo, portanto, o serviço público (porque
este, além de sujeito ao regime de direito público, é imune ao imposto, conforme o art. 150, VI, “a” da Constituição); b.1) que revelem conteúdo econômico, realizados em caráter negocial – o que afasta, desde logo, aqueles prestados “a si mesmo”, ou em regime familiar ou desinteressadamente (afetivo, caritativo); b.2) prestados sem relação de emprego – como definida pela legislação própria – excluído, pois, o trabalho efetuado em regime de subordinação (funcional ou empregatício), por não estar in commercium. Assim, pode-se dizer que mesmo haja previsão na lista anexa supramencionada, não incide ISS sobre previsão que não se refira a um serviço.
É assegurado na jurisprudência que o ISS não incide sobre atividade meio, e somente sobre uma atividade fim: TRIBUTÁRIO. ISS. SERVIÇOS. ATIVIDADE-MEIO. NÃOINCIDÊNCIA. 1. Não incide o ISS sobre serviços prestados que caracterizam atividades-meio para atingir atividades-fim, no caso a exploração de telecomunicações. 2. Marcelo Caron Baptista, em "ISS - Do Texto à Norma", editada pela Quartier Latin, p. 692, doutrina: "A prestação de serviço tributável pelo ISS é, pois, entre outras coisas, aquela em que o esforço do prestador realiza a prestação-fim, que está no centro da relação contratual, e desde que não sirva apenas para dar nascimento a uma relação jurídica diversa entre as partes, bem como não caracteriza prestação do serviço de transporte
interestadual, intermunicipal ou de comunicação, cuja tributação se dará pela via do ICMS". 3. São serviçosmeio para o alcance dos serviços-fim de telecomunicações os de secretaria, datilografia, habilitação, mudança e religação de aparelhos, despertador, processamento de dados, entre outros. Não-incidência de ISS. 4. O STF tem jurisprudência consolidada no sentido de não incidir ISS sobre locação de bens móveis. Reconhece, também, proteção de imunidade tributária para a edição e publicidade das listas telefônicas. 5. Seguimento da orientação do Supremo Tribunal Federal. Reconhecimento de ser inaplicável legislação infraconstitucional interpretada em desacordo com a jurisprudência da Corte Maior. 6. Recurso especial
provido (STJ - REsp: 883254 MG 2006/0047850-0, Relator: Ministro JOSÉ DELGADO, Data de Julgamento: 18/12/2007, T1 PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 28.02.2008 p. 74) Os serviços de comunicação e os de transporte intermunicipal e interestadual estão sujeitos somente ao pagamento de ICMS. Ponto crucial no presente debate é entender do que se trata um serviço de comunicação. A Lei Complementar nº 87/96 dispõe: “Art. 2º. O imposto [ICMS] incide sobre: (...) III – prestações onerosas de serviços de comunicação, por qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a retransmissão, a repetição e a ampliação de comunicação de qualquer natureza”. Nesse caso, para efeitos de incidência do ICMS Comunicação, MOREIRA (2008) faz as seguintes considerações:
“É imprescindível que: (a) exista uma relação comunicativa (formada por cinco elementos: emissor, receptor, meio de transmissão, código e mensagem transmitida); (b) a comunicação seja viabilizada por um terceiro, mediante remuneração.” Não sendo serviço de comunicação e havendo previsão na Lista Anexa à Lei Complementar 116/03, haverá incidência do ISSQN – e não do ICMS. Os serviços de TV por assinatura e banda larga seriam tributados pelo ICMS, vez que se enquadram na descrição da relação comunicativa prevista em lei. MOREIRA (2008) discorre: “O serviço de TV por assinatura possui todos os elementos autorizativos da incidência do ICMScomunicação. O tomador do serviço é o próprio destinatário da mensagem, que paga uma quantia mensal para
recebê-la
em
seu
domicílio
(a
mensagem é criada pelas produtoras de programas televisivos, sendo posteriormente transmitida pela empresa de TV por assinatura para o destinatário, viabilizando a relação comunicativa tributável pelo imposto estadual).” PAULSEN (2012), sobre o serviço de banda larga, assim explica: “O sistema de banda larga (denominado Virtua) vale-se de uma mídia preexistente (telefonia, TV a cabo, rádio ou satélite), com a qual compartilha o suporte físico da transmissão. O cabeamento é seccionado em duas partes, cada qual denominada de “banda”, e que apresenta frequências diferentes: uma mais estreita para o trânsito dos
impulsos de áudio e vídeo da TV a cabo (ou sinais de voz da telefonia), e a outra mais larga, destinada à conexão com a Internet.” A Lei 9472/97 expõe em seus artigos 60 e 61 a definição de serviços de telecomunicações e, ao mesmo tempo, explica que os serviços adicionados estão excluídos do conceito de comunicação (impedindo a incidência de ICMS – Súmula 334 do STJ): Art. 60. Serviço de telecomunicações é o conjunto de atividades que possibilita a oferta de telecomunicação. § 1° Telecomunicação é a transmissão, emissão ou recepção, por fio, radioeletricidade, meios ópticos ou qualquer outro processo eletromagnético, de símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou informações de qualquer
natureza. § 2° Estação de telecomunicações é o conjunto de equipamentos ou aparelhos, dispositivos e demais meios necessários à realização de telecomunicação, seus acessórios e periféricos, e, quando for o caso, as instalações que os abrigam e complementam, inclusive terminais portáteis. Art. 61. Serviço de valor adicionado é a atividade que acrescenta, a um serviço de telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde, novas utilidades relacionadas ao acesso, armazenamento, apresentação, movimentação ou recuperação de informações. § 1º Serviço de valor adicionado não
constitui serviço de telecomunicações, classificando-se seu provedor como usuário do serviço de telecomunicações que lhe dá suporte, com os direitos e deveres inerentes a essa condição. § 2° É assegurado aos interessados o uso das redes de serviços de telecomunicações para prestação de serviços de valor adicionado, cabendo à Agência, para assegurar esse direito, regular os condicionamentos, assim como o relacionamento entre aqueles e as prestadoras de serviço de telecomunicações. Assim, em consonância com entendimento pela Súmula 334 do STJ, não incide o ICMS sobre provedores de internet – já que seriam serviços de valor adicionado que se valem do serviço de telecomunicação que lhe dá suporte. E mais, não incide ISS por ausência de previsão
na Lista Anexa à LC 116/03: TRIBUTÁRIO. ISS. PROVEDOR DE ACESSO À INTERNET. SERVIÇO DE VALOR ADICIONADO. NÃOINCIDÊNCIA. 1. A jurisprudência pacífica desta Corte é no sentido de que não incide o ICMS sobre o serviço prestado pelos provedores de acesso à internet, uma vez que a atividade desenvolvida por eles constitui mero serviço de valor adicionado (art. 61 da Lei n. 9.472/97), consoante teor da Súmula 334/STJ. 2. O ISS incide sobre a prestação serviços de qualquer natureza, não compreendidos aqueles que cabem o ICMS (art. 156, inciso III, da Constituição Federal). 3. Não havendo expressa disposição acerca do serviço de valor adicionado na lista anexa ao Decreto-Lei 406/68,
nem qualquer identidade entre esse serviço e outro congênere nela expressamente previsto, não ocorre a incidência do ISS. 4. Recurso especial não-provido. (STJ - REsp: 719635 RS 2005/0016338-2, Relator: Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, Data de Julgamento: 10/03/2009, T2 SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 07/04/2009) TRIBUTÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO . ARTIGO 544 DO CPC. ICMS. SERVIÇOS PRESTADOS PELOS PROVEDORES DE ACESSO A INTERNET. MODALIDADE BANDA LARGA. SERVIÇO DE VALOR ADICIONADO. ART. 61, § 1º, DA LEI N. 9.472/97. NÃO INCIDÊNCIA. POSICIONAMENTO DA PRIMEIRA SEÇÃO. JULGAMENTO DOS
ERESP 456.650/PR. RECURSO DESPROVIDO. 1. A Lei nº 9.472/97, que dispõe sobre a organização dos serviços de telecomunicações, em seu art. 61, caput, prevê: "Serviço de valor adicionado é a atividade que acrescenta, a um serviço de telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde, novas utilidades relacionadas ao acesso, armazenamento, apresentação, movimentação ou recuperação de informações". 2. O serviço de conexão à Internet, por si só, não possibilita a emissão, transmissão ou recepção de informações, deixando de enquadrarse, por isso, no conceito de serviço comunicacional. Para ter acesso à Internet, o usuário deve conectar-se a um sistema de telefonia ou outro meio eletrônico, este sim, em condições de
prestar o serviço de comunicação, ficando sujeito à incidência do ICMS. O provedor, portanto, precisa de uma terceira pessoa que efetue esse serviço, servindo como canal físico, para que, desse modo, fique estabelecido o vínculo comunicacional entre o usuário e a Internet. É esse canal físico (empresa de telefonia ou outro meio comunicacional) o verdadeiro prestador de serviço de comunicação, pois é ele quem efetua a transmissão, emissão e recepção de mensagens. 3. A atividade exercida pelo provedor de acesso à Internet configura na realidade, um "serviço de valor adicionado": pois aproveita um meio físico de comunicação preexistente, a ele acrescentando elementos que agilizam o fenômeno comunicacional. (...) 13. No
julgamento dos EREsp 456.650/PR, em 11 de maio de 2005, a Primeira Seção, por maioria de votos, negou provimento aos embargos de divergência, fazendo prevalecer o entendimento da Segunda Turma, no sentido de ser indevida a incidência de ICMS sobre os serviços prestados pelos provedores de acesso à internet, sob o fundamento de que esses prestam serviços de valor adicionado, nos termos do art. 61, § 1º, da Lei 9.472/97, apenas liberando espaço virtual para comunicação. 14. Agravo Regimental desprovido. (STJ - AgRg nos EDcl no Ag: 883278 RJ 2007/0060027-0, Relator: Ministro LUIZ FUX, Data de Julgamento: 04/03/2008, T1 PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 05/05/2008 DJe 05/05/2008)
Ainda sobre hipóteses de incidência do ISS, anote-se a Súmula Vinculante 31, com a seguinte redação: “É inconstitucional a incidência do imposto sobre serviços de qualquer natureza - ISS sobre operações de locação de bens móveis”.
3. A REGRA DE INCIDÊNCIA DO ISSQN EM RELAÇÃO AO ICMS (ART. 1º, § 2º DA LC 116/03) Diante de um conflito entre a incidência do ICMS e do ISSQN, deve-se incidir o tributo municipal. A justificativa decorre do art. 1º, § 2º da LC 116/03, que diz o seguinte em sua redação: 76. Art. 1o O Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, tem como fato gerador a prestação de serviços constantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade preponderante do prestador. (...)
77. § 2o Ressalvadas as exceções expressas na lista anexa, os serviços nela mencionados não ficam sujeitos ao Imposto Sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS, ainda que sua prestação envolva fornecimento de mercadorias. Deste modo, sobre os serviços previstos na Lista Anexa à LC 116/03 incide, em regra, somente o ISSQN. Se nos itens da lista anexa existir previsão expressa de que também incidirá o ICMS, tem-se uma exceção à regra. Caso não haja previsão na Lista Anexa, não incide o ISS, somente incidindo o ICMS, se for o caso (v. g. serviço de comunicação). Ademais, o § 1º da LC 116/03 prevê que: 78. Art. 1o (...) 79. § 1o O imposto incide também sobre
o serviço proveniente do exterior do País ou cuja prestação se tenha iniciado no exterior do País. Mesmo sendo o serviço proveniente do exterior do Brasil ou cuja prestação tenha sido iniciada em outro país, é possível a incidência do ISS. Assim, estando os servidores de uma empresa de streaming de vídeo localizados no exterior, seria pertinente que houvesse a inclusão de mais um inciso ao art. 3º da LC 116/03, permitindo-se que o critério espacial do ISSQN, nesse caso, fosse vislumbrado no local da prestação do serviço, e não no lugar do estabelecimento prestador, assim definido no art. 4º da referida Lei Complementar. Faz-se essa ressalva sob a justificativa de que a regra é que o critério espacial do ISSQN seja o lugar do estabelecimento prestador ou o local do domicílio do prestador. Para facilitar a tributação, também seria possível que se utilizasse do entendimento debatido no Superior Tribunal
de Justiça em sede do Resp. 1.060.210, no sentido de que, em se tratando de arrendamento mercantil, considera-se como critério espacial do ISSQN o local de poder decisório quando à prestação do serviço: 80. PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. ISS. DL N. 406/68. SUJEITO ATIVO DA EXAÇÃO. MUNICÍPIO COMPETENTE. LOCAL DO SERVIÇO. ENTENDIMENTO FIRMADO EM RECURSO REPETITIVO. RESP PARADIGMA 1.060.210/SC. QUALIFICAÇÃO DO SERVIÇO. SÚMULA 7/STJ. 1. A Primeira Seção do STJ firmou entendimento segundo o qual "o sujeito ativo da relação tributária, na vigência do DL 406/68, é o Município sede do estabelecimento prestador (art. 12) e que,"a partir da LC 116/03, é aquele onde o serviço é efetivamente prestado, onde a relação é perfectibilizada, assim
entendido o local onde se comprove haver unidade econômica ou profissional da instituição financeira com poderes decisórios suficientes à concessão e aprovação do financiamento - núcleo da operação de leasing financeiro e fato gerador do tributo"(REsp 1.060.210/SC, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, submetido ao rito dos recursos repetitivos, nos termos do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 8/2008). 2. Consignaram as instâncias ordinárias que não se tratava de serviço de engenharia civil, mas mero serviço de pintura de sinalização de rodovias. A reversão do julgado demandaria incursão na seara fática dos autos, inviável na via estreita do recurso especial, ante o óbice da Súmula 7/STJ. Agravo regimental improvido.
81. (STJ - AgRg no REsp: 1505233 RJ 2014/0240214-0, Relator: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data Julgamento: 05/03/2015, T2 SEGUNDA TURMA, Data Publicação: DJe 11/03/2015)
de de
Transpondo o entendimento para relacioná-lo aos serviços de streaming ora analisados, a tributação do ISSQN levaria em conta a sede da empresa (art. 4º da LC 116/03) no país, que seja responsável por gerir a assinatura de novos contratos. O tema é controvertido por beneficiar algumas poucas metrópoles, em detrimento da arrecadação dos demais municípios, e seria provável a escolha da cidade com menor alíquota de ISS para ser sede da pessoa jurídica contribuinte (as alíquotas desse imposto podem variar de 2% até 5%, conforme art. 5º da LC 116/03 e o art. 88 do ADCT da Constituição Federal). Pertinente a observação de MACEDO (2009) sobre a cada vez maior dificuldade em localizar o serviço,
decorrente do que o autor chama de desmaterialização: “Distintamente das situações concretas facilmente localizáveis, como no caso dos impostos sobre a propriedade imobiliária, em que a concepção clássica do Princípio da Territorialidade satisfaz os questionamentos sobre a competência tributária dos Municípios, no Imposto Sobre Serviços, a cada vez maior desmaterialização em realidades abstratas levou à potencial geração de mais e mais conflitos. As realidades imateriais ou incorpóreas demandam por parte do legislador o estabelecimento de modo positivado de critérios suplementares ao clássico Princípio da Territorialidade, a fim de conferir uma maior segurança jurídica na efetivação das relações jurídicas envolvidas, particularmente as
tributárias” Cabe agora tecer breves comentários acerca do planejamento tributário quanto às atividades postas em discussão.
4. ELISÃO FISCAL RELACIONADA ÀS EMPRESAS DE SERVIÇOS DE STREAMING
A Elisão Fiscal – Steuerumgehung – aqui tratada é a de conotação lícita: trata-se de uma forma de planejamento fiscal desenvolvida pelos contribuintes, com o objetivo de minimizar a tributação em geral, dentro da lei e sem abuso de forma – sob a pena de que se incorra naquilo que os alemães chamam de abuso de forma (v. § 42, 2, do Código Tributário Alemão[216]). Planeja-se para pagar bem, tanto em razão de omissões da legislação tributária, quanto para pagar menos, em virtude da existência de normas que possibilitem uma tributação mais atenuada em benefício dos contribuintes. TORRES (2011, p. 248) explica a elisão lícita como
sendo “a economia de imposto alcançada por interpretação razoável da lei tributária”. Assim, os abusos devem ser afastados: caso contrário, a elisão será ilícita. PAULSEN (2012) colaciona entendimento quanto à postura a ser tomada pelo Estado frente à elisão fiscal que, apesar de lícita, pode ser guiada pela atividade legislativa, impedindo que o contribuinte escolha sempre o “melhor caminho”, de menor tributação: Postura do Estado frente à elisão e à evasão. “O planejamento ou elisão tributária não é senão uma expressão concreta de autonomia patrimonial dos indivíduos e empresas num contexto constitucional cuja ordem econômica se funda na livre iniciativa e protege a propriedade privada (art. 170 da CF). Seria totalmente inconstitucional (e até mesmo estapafúrdia) uma norma que ordenasse aos contribuintes, ao considerarem os diversos meios
através dos quais podem atingir seus objetivos
econômicos,
que
escolhessem os caminhos que rendessem mais arrecadação tributária. Contudo, isso não significa que o Estado não possa ou não deva reagir frente ao planejamento tributário, pois mesmo não configurando uma infração à legislação tributária, a elisão reflete imperfeições do sistema tributário considerado sob os cânones da igualdade e da capacidade contributiva. A primeira forma de combater a elisão tributária, a qual não encontra crítica nem mesmo nos mais ardorosos defensores da autonomia da vontade e da liberdade contratual, é o estabelecimento, pelo legislador, de normas pontuais voltadas a comportamentos
específicos dos contribuintes. Com efeito, à medida que a elisão tributária vai sendo praticada e pouco a pouco vai se massificando entre os contribuintes, a legislação tributária geralmente é modificada para incorporar previsões específicas (...) (GODOI, Marciano Seabra de. A figura da ‘fraude à lei tributária’ prevista no art. 116, parágrafo único, do CTN. RDDT nº 68, maio/01, p. 101/123) AMARO (2012) diz ser uma obrigação do administrador (privado) o planejamento tributário: “Numa empresa, aliás, ter em mente o objetivo de economizar impostos é obrigação do administrador, a quem incumbe zelar pela preservação do patrimônio da sociedade. O planejamento tributário insere-se —
consoante já escrevemos alhures — na temática mais ampla do planejamento empresarial e envolve projetos que podem ultrapassar as fronteiras nacionais. Se o legislador quiser tributar a forma alternativa, basta fazê-lo de modo expresso, sem deixar para o intérprete a tarefa (ilegal) de estender o tributo para situações não previstas.” O planejamento tributário no tocante às prestadoras de serviços de vídeo por streaming vai ao encontro do argumento que sustenta a ausência de previsão dos serviços desenvolvidos por essas pessoas jurídicas na Lista Anexa à LC 116/03. É notória e justificável essa ausência: os serviços em evidência são fatos novos, desligados de quaisquer hipóteses de incidência atualmente previstas em lei. Ademais, diante da iminente regulamentação – vez que as pessoas jurídicas de comunicação estão pressionando o
Congresso Nacional e o Governo Federal – seria estranha a cobrança de ICMS: ora, o serviço de streaming não é um serviço de comunicação; não é uma atividade meio; desenvolve uma atividade de fazer (e não de dar). Seria um malabarismo enquadrá-la como devedora de ICMS. Estar-se-ia tributando o serviço de streaming como um suposto serviço de comunicação prestado dentro de outro serviço de comunicação. 5. AMUSEMENT TAX RULING #5 DE JUNHO DE 2015 EM CHICAGO: TRIBUTAÇÃO SOBRE O ENTRETENIMENTO
A cidade de Chicago (Illinois – EUA), através de seu departamento de finanças, estabeleceu regras para a tributação de serviços de streaming, que foram publicadas através do Amusement Tax Ruling #5, em junho de 2015. Nesse regramento, é dito que the amusement tax does not apply to sales of shows, movies, videos, music or games (normally accomplished by a "permanent" download). It applies only to rentals (normally accomplished by
streaming or a "temporary" download), ou seja, esse tributo recai sobre o “aluguel” de shows, filmes, vídeos, músicas e jogos, transmitidos por streaming – chamado de download temporário. Sobre o download permanente – a compra de shows, filmes, vídeos, músicas e jogos – não incide o Amusement Tax. As alíquotas são de 9%. Não seria possível que um Município do Brasil imitasse a Cidade de Chicago nesse sentido. Ora, no Brasil, somente a União tem competência para, através de Lei Complementar, instituir novos impostos (com descrição específica de novos fatos geradores), utilizando-se de sua competência tributária residual (art. 154, I, CF). No entanto, seria possível adicionar à LC 116/03, em sua Lista Anexa, serviço com previsão semelhante à descrita acima: incidência do ISSQN sobre serviços de entretenimento disponibilizados através de streaming, desde que a construção jurídica não recaísse sobre a vedação prevista na Súmula Vinculante n. 31[217]. A propósito, esse é o teor do Projeto de Lei do Senado Federal de n. 386 de 2012. O texto, até o momento, foi
aprovado pelo Senado Federal e enviado à Câmara dos Deputados (Projeto de Lei Complementar n. 366/2013), e conta com a previsão de inclusão do item 1.10 à LC 116/03 (lista anexa), cuja redação é a seguinte: “Disponibilização de conteúdos de áudio, vídeo, imagem e texto em páginas eletrônicas, exceto no caso de jornais, livros e periódicos”. Percebe-se que existe uma mobilização do legislativo para tributar os chamados serviços de streaming.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS E REFLEXÃO SOBRE A NATUREZA DO SERVIÇO DE STREAMING DE VÍDEOS
O serviço de streaming de vídeos e de outras mídias, mediante pagamento mensal, é crescente no Brasil. Segundo dados divulgados pelo IBGE, quase 50% da população possui acesso à internet banda larga, especialmente através de dispositivos móveis, que são os suportes para diversos aplicativos inovadores.
Frente às possibilidades da tecnologia, empresas estrangeiras têm encontrado no país amplas possibilidades de negócios, notadamente pela ausência de tributação de diversos serviços – especialmente os de streaming; do crescimento de acesso da população à rede mundial de computadores, com barateamento de preços e incentivos do Governo Federal; e pela presença cada vez maior de dispositivos móveis nas mãos da população, o que possibilita a distribuição de novas aplicações capazes de disponibilizar serviços atrelados à comunicação e ao entretenimento. As empresas de TV por assinatura e banda larga, além das de telefonia (comunicação em geral), queixam-se do tratamento tributário não isonômico que está sendo visualizado diante dos novos serviços oferecidos por streaming. Analisou-se, ao longo do artigo, a possibilidade de incidência do ISSQN sobre os serviços de streaming de vídeo, sendo que só seria possível essa tributação mediante a previsão na Lista Anexa à Lei 116/03.
Diante das informações acima destrinchadas, expõem-se algumas reflexões ou interpretações que pode ser levadas em conta pelo legislador tributário e pelas empresas, no tocante ao planejamento tributário: a) Streaming de vídeos é um serviço: é obrigação de fazer, quando se coloca à disposição do consumidor final novas utilidades atreladas a um serviço de comunicação; submete-se ao regime de direito privado (não é serviço público); revela um conteúdo econômico, com caráter negocial; presta-se sem relação de emprego; b) O serviço de streaming de vídeos mediante remuneração mensal guarda semelhanças com os provedores de internet quando estes últimos se utilizam do serviço de comunicação (sujeito ao ICMS), acrescentando a ele novas utilidades, nos termos do art. 61, § 1º da Lei 9472/97; c) Os provedores de internet não estão sujeitos ao ICMS, já que não se tratam de
serviços de comunicação e, por ausência de previsão em lista anexa à LC 116/03, não incide também o ISSQN; d) Seria possível tributar, em tese, os serviços de streaming por meio do ISSQN se houvesse previsão em Lei Complementar, vez que são serviços remunerados pelo consumidor final (atividade-fim) que se utilizam de um serviço de comunicação, atribuindo-lhe utilidades; e) A própria omissão legislativa quanto ao surgimento de novas situações fáticas, notadamente de caráter tecnológico, baliza, por si só, o planejamento tributário (elisão fiscal) das empresas que prestam serviços de streaming, o que demanda uma atualização das normas tributárias nacionais nesse sentido; f) O critério espacial de incidência do ISS certamente será alvo de fortes discussões. No entanto, em sendo caso de a incidência ser somente em relação à localização da sede (ou
congêneres) da empresa prestadora – tal como acontece em casos de arrendamento mercantil – seria interessante que essa pessoa jurídica se instalasse em município cuja previsão de alíquota do ISS seja de 2%; g) A construção jurídica sobre a tributação de serviços de streaming deve evitar um conflito com a Súmula Vinculante n. 31, que impede a incidência do ISS sobre serviços de locação de bens móveis: a concepção de serviço de streaming abordada no presente trabalho compara essa disponibilização de conteúdo aos serviços de valor adicionado (ausentes da lista anexa à LC 116/03); h) Em todo caso, aguarda-se o desdobramento do Projeto de Lei do Senado Federal de n. 386/2012 (Projeto de Lei Complementar n. 366/2013).
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Capítulo 17 ANÁLISE DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE URBANA E O IMPOSTO PREDIAL TERRITORIAL URBANO – IPTU, PROGRESSIVO NO TEMPO. Thiago Bento Quirino Herculano[218] 1. INTRODUÇÃO. O intenso processo de urbanização constituiu uma das mais destacadas transformações ocorridas na sociedade brasileira durante o século XX. Esse acelerado processo, aliado à falta de planejamento urbano e à ideologia prevalente de que a propriedade seria apenas fonte de direitos, não dotada de obrigações sociais, gerou uma profunda crise urbana, caracterizada pela ocupação desordenada e desigual do território urbano. Ao passo que a população de baixa renda é afastada das áreas centrais para as periferias, desprovidas de serviços e equipamentos urbanos essenciais, a
especulação imobiliária faz surgir em áreas urbanizadas os chamados “vazios urbanos”. Como medida para ordenar o crescimento urbano e promover o bem-estar da população citadina, a Assembleia Constituinte incluiu de modo pioneiro na Constituição de 1988 um capítulo específico para regulamentar a política urbana em nosso país, onde consagrou o Princípio da Função Social da Propriedade Urbana e estabeleceu os instrumentos que visam sua promoção, dentre os quais se destaca o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) progressivo no tempo (BRASIL, 1988). Nesses trilhos, este trabalho tem por objetivo analisar o IPTU progressivo no tempo como instrumento indutor da ordenação do espaço territorial urbano, conforme disposto no art. 182, §4º, II, da Constituição Federal (CF) e na forma como foi regulamentado pelo Estatuto da Cidade – Lei nº. 10.257/01. Para tanto, busca-se em um primeiro momento contextualizar o processo de urbanização no Brasil, perquirindo as consequências que dele emanaram. Em
seguida, procura-se desenvolver a análise do princípio da função social da propriedade urbana, avaliando a estrutura que lhe conferiu a CF e, mais recentemente, os contornos traçados pelo Estatuto da Cidade – Lei nº 10.257/2001. Por fim, busca-se abordar os aspectos gerais e específicos do IPTU progressivo no tempo, destacando-o como um dos instrumentos imprescindíveis à construção de cidades socialmente mais justas e ambientalmente mais equilibradas. 2. BREVE CONTEXTO DOS PROBLEMAS URBANOS NO BRASIL. Em todo o mundo, o processo de urbanização ocasionou sérias consequências, tendo em vista que as cidades não se encontravam estruturalmente preparadas para acolher toda a população que migrou do campo em busca de melhores condições de vida e de trabalho nos centros urbanos. O retrato das cidades europeias do século XIX já revelavam um cenário de segregação social e poluição ambiental preocupante, conforme relembra o
Relatório de Desenvolvimento elaborado pelo Banco Mundial: Entre 1815 e 1851, a população da França cresceu de 29 para 36 milhões. Foram as cidades que absorveram as milhares de pessoas que não conseguiram achar trabalho no campo [...]. Mas nelas não havia emprego suficientes. O desemprego e a superpopulação ajudaram a tornar péssimas as condições de vida nas cidades. Em 1832, a cólera matou 20 mil parisienses. Os subúrbios de Dublin eram um dos piores da Europa, apenas comparáveis aos de Glasgow. Casas elegantes, construídas no século XVIII para a população rica, caíram nas mãos de proprietários avarentos que as subdividiam e alugavam para famílias pobres, que viviam em condições de superlotação e sem instalações sanitárias adequadas (MUNDIAL, 2009, p. 69).
Se nas cidades europeias o processo de urbanização desencadeou uma série de problemas urbanos, nos países subdesenvolvidos este processo gerou
e continua a gerar consequências ainda mais gravosas. Nestes países, em razão de uma industrialização tardia, o processo de urbanização se intensificou, tão somente, na segunda metade do século XX e, então, adquiriu velocidades vertiginosas. Ratifica-se, desse modo, a ideia exposta por Ross (2005) de que quanto mais um país demora a se industrializar, mais rápida é sua urbanização. No Brasil, a concentração progressiva da população em núcleos urbanos tem início com a crise mundial de 1929, que alcançou o ciclo do café paulista e empurrou grandes contingentes de desempregados em direção às cidades (CHAFFUN, 1996). No entanto, à semelhança dos demais países “subdesenvolvidos”, o processo de urbanização brasileiro se intensificou a partir da segunda metade do século XX. Observa-se que, até a década de 1960, a maioria da população brasileira ainda residia na zona rural. Já na década de 1970 o quadro se inverteu e a população urbana passou a crescer em índices elevados, a ponto de alcançarmos, no ano de 2010, o emblemático percentual
de 84,36% da população brasileira residindo em centros urbanos (IBGE, 2012). Com esses dados, evidencia-se que, em apenas 50 anos, o Brasil passou, de país tradicionalmente rural, a ser eminentemente urbano. Ocorre que, a extensão da infraestrutura das cidades brasileiras não acompanhou o crescimento de toda a população que migrou do campo em busca de melhores oportunidades de vida nos centros urbanos. Com pertinência, Meirelles (1974) retrata que o adensamento populacional nos centros urbanos ocorreu – e ainda ocorre –, de forma desordenada com a criação de núcleos de sub-habitações, sem qualquer observância das regras de ocupação e edificação, sem infraestrutura suficiente, transformando, assim, as cidades e a vida de seus habitantes em um verdadeiro caos. Nesta seara, à medida que o crescimento da população resultou no aumento da demanda da terra urbana, o fenômeno da especulação imobiliária ganhou corpo nas cidades brasileiras, potencializando os já desastrosos efeitos do processo de urbanização sem planejamento.
De fato, além das massas populacionais, as cidades passaram a manifestar tendência à concentração e à centralização do capital que, na lição de Câmara (2011, p. 157), “criam monopólios que assumem o papel decisório na vida econômica e social das cidades”. Em sua abordagem, Arantes corrobora a ideia exposta ao sustentar que: [...] há algo de novo a registrar nessa fase do capitalismo em que as cidades passaram elas mesmas a ser geridas e consumidas como mercadorias (ARANTES, 1998, p. 26).
Assim, a terra urbana, além de ser expressão de riqueza – de poder –, passou a ser sinônimo de investimento seguro e lucrativo, tendo em vista ser um bem com grande demanda e, ao mesmo tempo, extremamente escasso. Para exemplificar este fenômeno, Arruda e Antero (1999) aduzem que na década de 1970 as terras urbanas no Brasil multiplicaram seu valor, estimulando a especulação imobiliária e fazendo com que as cidades brasileiras se transformassem em verdadeiras
“reservas de valor”. No escólio de Oliveira (2001), a retenção de imóvel urbano com fins especulativos se dá quando seu proprietário o mantém em estado de inatividade econômica – não utiliza, não investe e não vende –, esperando que seu valor de mercado aumente ao longo do tempo, principalmente através de investimentos feitos pelo poder público. Sob o panorama socioeconômico, verifica-se que a manutenção de imóveis ociosos com finalidade especulativa acentua a exclusão social, na medida em que diminuem a oferta de habitação em áreas já urbanizadas e expulsam a população pobre para regiões cada vez mais distantes dos centros urbanos e desprovidas de infraestrutura básica (abastecimento regular de água, rede de esgoto, coleta de lixo, pavimentação, transporte público eficaz, escolas, hospitais, segurança pública, oferta de emprego, comércio etc.) (OLIVEIRA, 2001). Nesse matiz, a retenção de terras urbanizadas ociosas, além de interferir no mercado imobiliário, eleva o custo do processo de urbanização, tendo em vista que
obriga o poder público a atender populações que residem cada vez mais distante do centro urbano. Nesse mesmo sentido expõe Maricato (2010, p. 15): “Essa extensão horizontal, pontuada por terras vazias que aguardam valorização, amplia os custos de urbanização de cidades cujos orçamentos são restritos para a dimensão das necessidades sociais”. Frise-se que esse processo não é simples resultado de um jogo de mercado, mas também de uma vontade política. Além de uma tradicional conivência, não raras vezes o poder público assume papel ativo neste processo, removendo favelas e assentamentos das áreas centrais e empurrando as camadas mais pobres para as periferias. Nesse sentido, expõe Santos (2005, p. 123): O próprio poder público torna-se criador privilegiado de escassez; estimula, assim, a especulação e fomenta a produção de espaços vazios dentro das cidades; incapaz de resolver o problema da habitação, empurra a maioria da população para as periferias; e empobrece ainda mais os mais pobres, forçados a pagar caro pelos precários
transportes coletivos e a comprar caro bens de um consumo indispensável e serviços essenciais que o poder público não é capaz de oferecer .
Evidencia-se, portanto, que a exclusão territorial não é apenas expressão da desigualdade socioeconômica, mas sim agente de reprodução dessa desigualdade, conforme adverte Rolnik (2008, p. 53): O quadro de contraposição entre uma minoria qualificada e uma maioria com condições urbanísticas precárias relaciona-se a todas as formas de desigualdade, correspondendo a uma situação de exclusão territorial. Essa situação de exclusão é muito mais do que a expressão da desigualdade de renda e das desigualdades sociais: ela é agente de reprodução dessa desigualdade. Em uma cidade dividida entre a porção legal, rica e com infra-estrutura e a ilegal, pobre e precária, a população que está em situação desfavorável acaba tendo muito pouco acesso a oportunidades de trabalho, cultura ou lazer.
Outra grave consequência desse processo de afastamento reside na agressão ambiental. Sem alternativas para moradia na “porção legal” da cidade, a população pobre ocupa áreas ambientalmente frágeis e desprovidas de coleta regular de lixo e rede de esgoto, tais como beira de córregos, encostas, várzeas, áreas de proteção de mananciais, mangues etc. Ao trazer sua contribuição ao tema, Maricato (2010, p. 09) acrescenta que: São as áreas vulneráveis, protegidas por legislação ambiental que não interessam ao mercado imobiliário privado legal e “sobram” para as moradias pobres. [...] O mercado mais do que a lei – norma jurídica – é que define onde os pobres podem morar ou invadir terras para morar.
Assim, a população pobre que migra para áreas sem infraestrutura urbana é afligida rotineiramente por enchentes, alagamentos, deslizamentos de morros e
desmoronamentos de encostas, agravando mais e mais sua condição de miserabilidade. Ressalte-se, contudo, que a retenção de imóveis urbanos ociosos além de contribuir para poluição ambiental indiretamente – consequência da escassez de espaços habitáveis e afastamento das camadas pobres para áreas de preservação ambiental –, provoca poluição ambiental direta. Em sua maioria, esses imóveis constituem terrenos baldios, sem cercas ou muros, e que acabam se tornando depósitos de lixo e restos da construção civil, proliferando vetores e prejudicando a população circunvizinha. Também é preciso registrar o impacto negativo no âmbito da segurança pública. Em geral, mal iluminados e cobertos por lixo e vegetação, os imóveis ociosos são rotineiramente utilizados para o cometimento de delitos, notadamente o tráfico de entorpecentes e os crimes contra a dignidade sexual. Desse modo, diante dos efeitos negativos que a manutenção de imóveis ociosos em áreas urbanizadas causa à população citadina, demonstrados nesta apertada
síntese, evidencia-se a necessidade de instrumentos eficazes ao combate da especulação imobiliária. Não se pode correr o risco de transformar o direito de propriedade em ativo financeiro, alheio aos direitos humanos fundamentais calcificados na Constituição da República de 1988 e reprodutor de injustiças sociais e ambientais (ROLNIK, 2011). Portanto, a limitação do direito de propriedade, com vistas à construção de cidades mais justas e ambientalmente menos predatórias, não é uma proposta radical de esquerda e nem mesmo socialista, conforme expõe com perspicácia Maricato (2010), trata-se de uma necessidade que se impõe em razão da preservação das condições mínimas de vida nas cidades, para a presente e para as futuras gerações. 3. A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE. Consoante registra Eros Roberto Grau (1977), o germe da ideia de função social da propriedade foi lançado com a teoria positivista de Augusto Comte, em
1850. No entanto, foi a partir das críticas de Leon Duguit à concepção individualista e metafísica do direito de propriedade, publicadas em seu “Les Transformations Du Droit Prive depuis le Code Napoleón”, que a ideia de função social da propriedade ganhou corpo (SUNDFELD, 1987). Em posição de vanguarda, Duguit (apud SUNDFELD, 1987, p. 5). propugnou que a propriedade não é mais um direito subjetivo, mas, sim, função social do detentor da riqueza, in verbis: Todo indivíduo tem obrigação de cumprir na sociedade uma certa função, na razão direta do lugar que nela ocupa. Ora, o detentor de riqueza, pelo próprio fato de deter a riqueza, pode cumprir uma certa missão que só ele pode cumprir. Somente ele pode aumentar a riqueza geral, assegurar a satisfação de necessidades gerais, fazendo
valer
o
capital que
detém.
Está,
em
consequência, socialmente obrigado a cumprir esta missão e só será socialmente protegido se cumpri-la e na medida em que o fizer. A propriedade não é mais o direito
subjetivo do proprietário, é função social do detentor da riqueza.
No plano constitucional esta concepção encontra uma primeira manifestação na Constituição do México, de 1917 e logo em seguida, na Constituição de Weimar, de 1919 – cartas marcadas pela quebra do paradigma liberalista. Na história do constitucionalismo brasileiro, a Carta de 1934 [219] – também norteada pela quebra do pensamento liberal – foi a primeira a prever a função social da propriedade, passando a constar, direta ou indiretamente, do texto de todas as constituições subsequentes. Entrementes, embora venha sendo repetido nominalmente por todas as constituições desde a de 1934, foi somente na de 1988 que o Princípio da Função Social da Propriedade encontrou uma fórmula consistente, consoante assevera Fernandes (2002). Tal evolução constitucional é fruto do amadurecimento jurídico do conceito de propriedade e de sua função social, mas,
sobretudo, da pressão popular dos movimentos sociais que passaram a eclodir neste período. Nesse sentido, Bassul (2004) registra que o cenário de exclusão socioespacial provocado pelo intenso e desordenado processo de urbanização, resultou na organização de diversos movimentos sociais urbanos no final da década de 1970, reivindicantes pela democratização do acesso a condições condignas de vida nas cidades brasileiras. Com a queda do governo militar, em 1985, e por ocasião do processo de conquista da Constituição de 1988, os movimentos sociais passam a reivindicar para que fosse inserido no texto da nova Constituição instrumentos eficazes para coibir a especulação imobiliária e promover uma reforma urbana orientada pela justa distribuição dos ônus e benefícios decorrentes do processo de urbanização. Nesse contexto, merece destaque a atuação Movimento Nacional pela Reforma Urbana – MNRU, órgão que reuniu diversas categorias profissionais e foi responsável por apresentar à Assembleia Nacional
Constituinte proposta de iniciativa popular subscrita por 131.000 (cento e trinta e um mil) eleitores, contendo os principais pontos para política urbana a ser prescrita pela Constituição (MARICATO, 2010). Bassul (2004, p. 9) retrata com pertinência essa conquista histórica: A despeito de um ambiente parlamentar majoritariamente refratário às proposições do MNRU — especialmente em relação às que buscavam conferir efetividade à função social da propriedade —, a Constituição de 1988, pela primeira vez na história do Brasil, incorporou dispositivos que fizeram migrar, do território patrimonialista do direito privado para o âmbito coletivo do direito público, as relações jurídicas pertinentes à propriedade urbana. Como resultado, a Constituição de 1988 elevou a
função social à condição para garantia do direito de propriedade (art. 5º, XXII c/c XXIII), assim como princípio da Ordem Econômica (art. 170, III), além de estabelecer instrumentos para sancionar o descumprimento, conforme um conteúdo específico para a política urbana (art. 182) e para a política agrícola (art. 184). Ultrapassa-se, desse modo, a concepção individualista assentada pelo pensamento liberal, para alcançar-se, com a Constituição de 1988, um direito de propriedade vocacionado à concretização de uma sociedade mais justa e ambientalmente equilibrada. 3.1 A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE NA CONSTITUIÇÃO DE 1988. Conforme assentado, o direito de propriedade vem, ao longo do tempo, ganhando contornos sociais, na medida em que a concepção individualista se mostrou inoperante em equacionar o desenvolvimento econômico e o bem-estar social.
Diante de tal cenário, a doutrina questiona-se: a propriedade é puramente função social, conforme vaticinava Leon Duguit ou ainda está configurada na CF, como um direito que têm função social? Em que pese a relevância dos argumentos em contrário, a doutrina majoritária entende que a propriedade ainda está claramente configurada como um direito que deve cumprir uma função social, e não como sendo pura e simplesmente uma função social – isto é, bem protegido tão só na medida em que a realiza (MELLO, 1987 apud ERENBERG, 2008). Se assim não fosse, não haveria razão de ser para a previsão constitucional de indenização na desapropriação-sanção, na qual resta comprovado o descumprimento da função social. Isto é, mesmo verificado que a propriedade não atende a função social, o direito de propriedade não é eliminado e, portanto, não pode o Poder Público confiscar o bem. Mas, finalmente, o que se entende por função social da propriedade? Sundfeld (1987, p. 1) explica que “função é conceito que se opõe ao de autonomia da
vontade, tal como concebido no Direito Civil” e cita Romano: “As funções (officia, numera) são os poderes que se exercem não por um interesse próprio, mas por interesse de outrem ou por um interesse objetivo”. Mello (apud Erenberg, 2008, p. 108). define função como “o exercício, no interesse de terceiro, de um poder que se dispõe exclusivamente para os efeitos de cumprir o dever de atender determinada finalidade legalmente estabelecida”, e arremata afirmando: Ela [a função] não se confunde meramente com direito ou com Poder, porque nestes alguém desfruta de uma situação subjetiva ativa que lhe permite mobilizar uma potencialidade jurídica em vista de seu próprio interesse, ao passo que, na função, o exercício dessa potencialidade se efetua no interesse alheio e como instrumento necessário ao cumprimento de um dever. Aí e só aí temos função.
Desse modo, é possível afirmar que a função social da propriedade consiste no espectro de obrigações
impostas ao proprietário, voltadas à satisfação dos interesses sociais. Frise-se que não é suficiente que o proprietário se abstenha de praticar ações socialmente inadequadas. Para que reste atendida a função social impõe-se ao proprietário o conjunto de obrigações de não fazer, mas também se lhe exige uma atitude positiva, isto é, o cumprimento de obrigações de fazer. Neste sentido, são elucidativas as palavras de Grau (apud CAMARGO, 2008, p. 37):
(...) o dever de exercê-la em benefício de outrem e não, apenas, de não a exercer em prejuízo de outrem. Isso significa que a função social da propriedade atua como fonte de imposição de comportamentos positivos – prestação de fazer, portanto, e não, meramente, de não fazer – ao detentor do poder que deflui da propriedade.
Conforme já ressaltado, a propriedade permanece garantida pela Constituição de 1988, compondo, ao lado da função social da propriedade, um dos princípios da Ordem Econômica, senão vejamos:
CF - Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XXII - é garantido o direito de propriedade; XXIII - a propriedade atenderá a sua função social; [...]
CF - Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: [...] II - propriedade privada; III - função social da propriedade;
A função social da propriedade também aparece na Constituição nos capítulos que cuidam da política urbana e da política agrícola, merecendo destaque o artigo 182, §§2º e 4º, e o artigo 186, in verbis:
82. CF - Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes. [...] 83. § 2º - A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor. [...] 84. § 4º - É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de: 85. I - parcelamento ou edificação compulsórios; 86. II - imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo; 87.
III - desapropriação com pagamento mediante
títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais. [...] 88. 89. CF - Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos: 90. I - aproveitamento racional e adequado; 91. II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; 92. III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho; 93. IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores. Verifica-se que a CF/1988 não se limitou a
estabelecer um caráter abstrato à função social da propriedade, tal
como retoricamente previsto nas
constituições anteriores – cuja serventia baseava-se em justificar a desapropriação por utilidade pública, voltada à satisfação dos interesses da pessoa jurídica de direito público expropriante. A inovação consistiu em especializar o tratamento da função social para as diversas modalidades de propriedade, assim como em conferir aos Poderes Públicos instrumentos efetivos para exigir seu cumprimento e penalizar o seu descumprimento (RABAHIE, 1991). Embora se reconheça que o constituinte cuidou da função social da propriedade rural (art. 186) de forma mais consistente, em atenção ao objeto deste trabalho, se aterá ao disciplinamento da função social da propriedade urbana. 3.2 FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE URBANA. O Art. 182, §2º da CF estabelece que a
propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor. Por sua vez, o §1º do mesmo art. 182 da Constituição estabelece que o plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, é obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes. Diante de tais normas constitucionais, questionase: o princípio da função social da propriedade encontrase vinculado à edição de um plano diretor? E mais, nos municípios sem plano diretor – seja em virtude da mera inércia legislativa ou em razão de não estarem obrigados a elaborarem, conforme dispõe o §1º do art. 182 da CF/1988 – estaria sua população desobrigada a atender a função social da propriedade? Não é esta a interpretação mais coerente do art. 182, §2º, da CF. Erenberg (2008, p. 120-122) defende a existência de um conteúdo constitucional mínimo possível para o princípio da função social da propriedade, cujo cumprimento pode ser exigido em face do proprietário, independentemente de normatização infraconstitucional, in verbis:
Submeter a própria existência e validade do princípio constitucional da função social da propriedade urbana à vontade do Poder Público de cada município seria, no mínimo, um contra-senso, permitindo o estabelecimento de situações diferentes para propriedades situadas em diferentes
municípios,
por
vezes
limítrofes,
exclusivamente pelo critério da quantidade de habitantes (um critério aleatório e, de certa forma, elitista, uma vez que, como já visto neste trabalho, menos de trinta por cento dos municípios brasileiros conta com mais de 20 mil habitantes [sic].
Por sua vez, Rabahie (1991) apresenta uma corrente doutrinária mais flexível, que busca conciliar a relevância do princípio da função social da propriedade com a necessidade edição de plano diretor. Segundo tal corrente, ante a ausência de plano diretor, é possível que outras regras (leis), mesmo sem a configuração formal de plano diretor, estabeleçam as diretrizes do ordenamento urbano, substituindo a exigência constitucional (art. 182,
§2º) e, assim, possibilitando o atendimento da função social da propriedade. De fato, ante a inexistência de lei que estabeleça o plano diretor, nada obsta que outras leis possam fixar regras de ordenamento urbano, a fim de orientar e exigir dos proprietários de imóveis urbanos posturas que respeitem o Princípio da Função Social. No entanto, como aduz Erenberg (2008), não se pode admitir que o atendimento ao princípio constitucional da função social da propriedade urbana esteja subordinado à edição de plano diretor, ou de qualquer outra lei que estabeleça regras de direito urbanístico, deixando ao simples talante do legislador municipal a aplicabilidade ou não de um princípio resguardado pela ordem constitucional vigente[220]. Frise-se, ademais, que não consta no art. 5º, XXIII da CF qualquer limitação, condicionante ou exceção à aplicabilidade do Princípio da Função Social da Propriedade. Superadas tais questões, resta perquirir qual o conteúdo da função social da propriedade urbana
apresentado pela Constituição de 1988. O já citado parágrafo 2º do art. 182 estabelece que a função social da propriedade urbana é cumprida quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade. Mas, então, que exigências são estas? Erenberg (2008) responde a tal questionamento afirmando que essas exigências se referem ao “pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade” e à “garantia do bem-estar de seus habitantes”, expressamente previstas no caput do art. 182, a saber: CF - Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes (BRASIL, 1988).
Uma análise conjunta do disposto no parágrafo 2º com conteúdo do parágrafo 4º, ambos do art. 182 da CF, revela o primeiro aspecto que deve integrar o conteúdo
mínimo da função social: a propriedade urbana não cumpre sua função social quando não utilizada, subutilizada ou não edificada, isto é, quando não é adequadamente aproveitada (ERENBERG, 2008). Portanto, o primeiro requisito constitucional para cumprimento da função social reside na utilização da propriedade urbana conforme seu adequado aproveitamento de modo que seu uso se ajuste com as exigências de ordenação da cidade e possibilite a garantia do bem-estar de seus habitantes. Inversamente, não cumpre a função social a propriedade urbana que não é adequadamente aproveitada, ou seja, a propriedade que não contribui para o desenvolvimento econômico, que degrada o meio ambiente, que não concorre para o bem-estar dos habitantes e usuários da cidade. Assim, para que a propriedade cumpra sua função social é preciso que não obste e que contribua com o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade, as quais, consoante lecionam Garcias e Bernardi (2008), podem ser classificar em três grandes grupos: funções
urbanísticas (habitação, trabalho, lazer e mobilidade); funções de cidadania (educação, saúde, segurança e proteção); e funções de gestão (prestação de serviços, planejamento, preservação do patrimônio cultural e natural e sustentabilidade urbana). Como visto na primeira parte deste trabalho, uma das condutas mais expressivas do descumprimento da função social da propriedade urbana é a especulação imobiliária, tendo em vista que os diversos obstáculos que causa ao desenvolvimento das funções da cidade, em todas as suas perspectivas (urbanísticas, de cidadania e de gestão). Assim, é possível sintetizar a disciplina constitucional do Princípio da Função Social da Propriedade “no dever de utilização adequada e racional da propriedade em prol dos objetivos sociais perseguidos pela Constituição, conforme sua vocação”, consoante sustenta Erenberg (2008, p. 155). Sem embargo, também se tem, no plano infraconstitucional, normas que visam regular a política urbana em nosso país e que tratam do princípio da função
social. A Lei nº. 10.257/01, denominada de Estatuto da Cidade, é verdadeiro marco na disciplina da função social da propriedade, bem como na utilização dos instrumentos constitucionais que visam sua promoção. Após 12 (doze) anos de tramitação legislativa[221], o Estatuto regulamentou os artigos 182 e 183 da Constituição Federal e, em seu artigo 39, trata da função social da propriedade urbana, in verbis: Lei nº. 10.257/01- Art. 39. A propriedade urbana cumpre sua
função social quando atende
às
exigências
fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor, assegurando o atendimento das necessidades dos cidadãos quanto à qualidade de vida, à justiça social e ao desenvolvimento das atividades econômicas, respeitadas as diretrizes previstas no art. 2o desta Lei.
Por sua vez, o artigo 2º do Estatuto assevera que “a política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e a propriedade urbana”, e elenca as diretrizes gerais a serem
observadas, dentre as quais se destaca: a) garantia do direito a cidades sustentáveis (direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações);
b) planejamento do desenvolvimento das cidades, da distribuição espacial da população e das atividades econômicas do Município e do território sob sua área de influência, de modo a evitar e corrigir as distorções do crescimento urbano e seus efeitos negativos sobre o meio ambiente;
c) ordenação e controle do uso do solo, de modo a evitar: I) a utilização inadequada dos imóveis urbanos; II ) a proximidade de usos incompatíveis ou inconvenientes; III) o parcelamento do solo, a edificação ou o uso excessivos ou inadequados em relação à infraestrutura urbana; IV) a instalação de empreendimentos ou atividades que possam
funcionar como pólos geradores de tráfego, sem a previsão da infraestrutura correspondente; V) a retenção especulativa de imóvel urbano, que resulte na sua subutilização ou não utilização; VI) a poluição e a degradação ambiental;
d) a exposição da população a riscos de desastres.
e) justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do processo de urbanização;
f) adequação dos instrumentos de política econômica, tributária e financeira e dos gastos públicos aos objetivos do desenvolvimento urbano; XI – recuperação dos investimentos do Poder Público de que tenha resultado a valorização de imóveis urbanos;
g) regularização fundiária e urbanização de áreas ocupadas por população de baixa renda
De certo, essas diretrizes refletem o conteúdo da
política urbana estabelecida pela Constituição de 1988 e, de igual modo, revelam o caminho para o efetivo cumprimento da função social da propriedade. O Estatuto da Cidade também regulamentou a utilização dos instrumentos, previstos no art. 182, §4º, da Constituição de 1988, que visam à promoção da função social da propriedade urbana. Destarte, o Poder Público municipal poderá exigir, nos termos do Estatuto da Cidade e mediante lei específica para área incluída no plano diretor, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado que promova seu adequado aproveitamento, sob pena de: a) parcelamento ou edificação compulsórios; b) Imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana – IPTU progressivo no tempo; c) desapropriaçãosanção. 4. O IPTU PROGRESSIVO NO TEMPO COMO INSTRUMENTO DE ATUAÇÃO URBANÍSTICA. O legislador constituinte de 1988 previu a
possibilidade de o IPTU ser progressivo de forma a assegurar o cumprimento da função social da propriedade, nos termos da redação originária do art. 156, §1º da CF. Com a Emenda Constitucional nº. 29/2000, que alterou o §1º do artigo 156, inseriu-se no ordenamento pátrio a possibilidade de progressão do IPTU em razão do valor do imóvel, neste caso com finalidade arrecadatória claramente preponderante. Desta feita, a competência tributária municipal compreende tanto a instituição do IPTU progressivo com finalidade extrafiscal, quanto do IPTU progressivo com finalidade fiscal. 4.1 FISCALIDADE E EXTRAFISCALIDADE. É certo que todos os tributos possuem, direta ou indiretamente, uma função arrecadatória. Nada obstante, podem eles apresentar outras funções que transbordam a mera finalidade de abastecimento dos cofres públicos. Fala-se em fiscalidade quando os objetivos que direcionaram a instituição do tributo estão voltados
unicamente para a arrecadação de dinheiro para os cofres públicos, sendo irrelevante para a satisfação de sua finalidade a produção de outros efeitos. Doutra banda, fala-se em extrafiscalidade quando, dentre os efeitos produzidos pela instituição e cobrança do tributo, sobressai a promoção de uma finalidade social, econômica ou política em detrimento da arrecadação de dinheiro para o erário que, mesmo presente, assume papel coadjuvante. Nada obstante, como bem observa Carvalho (2005), nenhum tributo é puramente fiscal ou extrafiscal; os dois objetivos convivem harmonicamente na mesma norma impositiva, sendo que, por vezes, um prevalece diante do outro. Embora haja remotos registros de utilização da extrafiscalidade[222], para o Estado de Bem-Estar Social o seu emprego se reveste de singular importância, conforme sustenta Duverger (1956, p. 2), citado por Schoueri (2005, p. 3): [...] no Estado moderno as finanças públicas não são
apenas
um
meio
de
assegurar
suas
despesas
administrativas, mas também e principalmente um meio de intervir na vida social, de exercer uma pressão sobre os cidadãos para organizar o conjunto da nação.
De fato, se a tributação é uma das formas de atuação estatal que mais sobressai, não se pode ignorar sua potencialidade para a concretização dos objetivos sociais, econômicos e políticos calcificados na Constituição. Schoueri (2005), com arrimo na lição de Von Arnim, sustenta que é possível identificar duas espécies de normas extrafiscais: (i) a norma tributária indutora; (ii) e a norma tributária de política social. A primeira atua através de incentivos e desincentivos a condutas eleitas pelo legislador, visando precipuamente modificar o comportamento do contribuinte. Ao passo que a segunda visa à melhoria da situação do beneficiário sem, contudo, constituir um incentivo a que sua situação seja modificada[223]. Verifica-se, desse modo, que o IPTU progressivo
no tempo é tributo extrafiscal de espécie indutora, vez que, através da majoração de sua alíquota, visa-se desestimular a subutilização de imóveis, promovendo sua adequação ao princípio da função social da propriedade urbana. Portanto, fixados os conceitos de fiscalidade e extrafiscalidade, cumpre esclarecer que importa ao presente estudo a análise da progressividade extrafiscal do IPTU (enquanto norma indutora do princípio da função social da propriedade), razão pela qual não se aterá às discussões que envolvem a sua progressividade fiscal, então compreendida no art. 156, §1º, I e II, da CF. 4.2 O IPTU EXTRAFICAL E O REGRAMENTO CONFERIDO PELO ESTATUTO DA CIDADE – LEI Nº 10.257/2001. Como prenunciado linhas atrás, o Estatuto da Cidade é a lei federal que regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição de 1988, conferindo operatividade aos instrumentos do direito urbanístico brasileiro, com
vistas à regulação do uso da propriedade urbana, do equilíbrio ambiental, da justa distribuição dos ônus e benefícios decorrentes do processo de urbanização, da segurança e, de um modo geral, do bem-estar de todos os cidadãos. Os instrumentos de estruturação e de execução conferidos ao Poder Público para desenvolvimento de sua política urbana estão assentados exemplificativamente no artigo 4º do Estatuto da Cidade. Encontram-se reunidos em diversas categorias, a saber: instrumentos de planejamento (inc. I a III), instrumentos tributários e financeiros (inc. IV), jurídicos e políticos (inc. V), e instrumentos socioambientais (inc. VI). Dentre os instrumentos tributários e financeiros previstos pelo Estatuto da Cidade, encontra-se o Imposto Predial e Territorial Urbano, que foi regulado por seu artigo 7º, in verbis: 94. Lei nº. 10.257/01 - Art. 7º Em caso de descumprimento das condições e dos prazos previstos na forma do caput do art. 5º desta Lei, ou
não sendo cumpridas as etapas previstas no § 5º do art. 5º desta Lei, o Município procederá à aplicação do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana (IPTU) progressivo no tempo, mediante a majoração da alíquota pelo prazo de cinco anos consecutivos. 95. De conformidade com o regramento constitucional, o Estatuto da Cidade estabeleceu que, para que seja possível a aplicação do IPTU progressivo no tempo, mister que haja descumprimento anterior à determinação de parcelamento, edificação, ou utilização compulsórios, conforme disposto no artigo 5º do Estatuto da Cidade. Destarte, antes do manejo do IPTU progressivo, o município deverá editar lei específica para área incluída no plano diretor determinando o parcelamento, edificação, ou utilização compulsórios do solo urbano, na qual também deverá fixar as condições e os prazos para cumprimento da obrigação. Os prazos não poderão ser inferiores a: (i) um
ano, a partir da notificação, para que seja apresentado o projeto no órgão municipal competente; (ii) dois anos, a partir da aprovação do projeto, para iniciar as obras do empreendimento (art. 5º, §4º). Tratando-se de empreendimentos de grande porte, em caráter excepcional, a lei municipal específica poderá prever a conclusão em etapas, assegurando-se que o projeto compreenda o empreendimento como um todo, consoante estabelece o parágrafo 5º, do artigo 5º do Estatuto. Só então, verificado o descumprimento das condições e dos prazos para implemento da obrigação, o município poderá aplicar o IPTU progressivo no tempo, mediante a majoração da alíquota pelo prazo máximo de cinco anos consecutivos. O valor das alíquotas a ser aplicado a cada ano será fixado em lei específica e não poderá exceder a duas vezes o valor referente ao ano anterior, respeitada a alíquota máxima de quinze por cento, de acordo com o parágrafo 1º, do artigo 7º do Estatuto. Caso o proprietário não atenda a obrigação de parcelar, edificar, ou utilizar em cinco anos, o município
poderá manter a cobrança pela alíquota máxima, até que se cumpra a referida obrigação, ou se valer da desapropriação-sanção, observado o disposto no art. 8º do Estatuto. Com tais medidas, sanciona-se o proprietário de imóvel urbano renitente em conduta incompatível com as exigências de ordenação da cidade insertas no plano diretor, almejando-se que promova a edificação ou a utilização do imóvel, para que cumpra a sua função social. Impende ressaltar que o Município deverá utilizar os instrumentos acima referidos na ordem como foram dispostos no artigo 182, §4º da CF, tendo em vista que, conforme sustenta Barreto (2011), não se trata de alternatividade, mas sim de sucessividade, deixando evidente a fixação de uma escala de precedência que deverá ser observada, sob pena de inconstitucionalidade. 4.3 DIFERENCIAÇÃO ENTRE “SANÇÃO DE ATO ILÍCITO” E O “CARÁTER SANCIONATÓRIO” DO IPTU PROGRESSIVO.
Consoante a descrição legal presente no art. 3º do Código Tributário Nacional – Lei nº. 5.172/1966, “tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada” (BRASIL, 1966). Segundo a doutrina de Rosa Júnior (2006), tal dispositivo comporta dois desdobramentos: (i) o primeiro consiste em diferenciar os tributos das penalidades que, apesar de terem em comum a natureza compulsória e caráter patrimonial, não se confundem; (ii) o segundo, por sua vez, consiste em vedar que atividades ilícitas figurem como hipóteses de incidência de tributos. No caso do IPTU progressivo no tempo, sanciona-se o proprietário, através da progressão da alíquota do IPTU, em razão de sua renitência em conduta desconforme às exigências de ordenação da cidade descritas no plano diretor. Não se trata, no entanto, de punição de ato ilícito por meio de tributação, mas de “mera coação para que o agente realizador do fato
imponível utilize a sua propriedade consoante a função social” (CAMARGO, 2008, p. 138). Nesse sentido, esclarecedora a lição de Rocha (1992, p. 73) apud Barreto (2011, p. 997): “O imposto, em si, tem como aspecto material de seu fato gerador a propriedade predial e territorial urbana; a pena que poderá estar no seu agravamento não desnatura o imposto”. De fato, razão assiste ao doutrinador, vez que o ilícito de não cumprir a função social da propriedade está completamente fora da hipótese de incidência (“fato gerador” em suas palavras) da norma jurídico-tributária, que, no caso do IPTU, é ser proprietário de imóvel urbano num dado dia do exercício financeiro. Assim, conforme arremata Camargo (2008), realizada a hipótese de incidência e por ocasião da apuração do montante devido, busca-se a alíquota aplicável, momento em que se verificará o cabimento da alíquota progressiva no tempo. Veja-se que a hipótese de incidência do IPTU progressivo continua a ser a mesma a propriedade de imóvel urbano -, só havendo diferença no momento da aplicação da alíquota.
Carraza (2000) também perfilha este entendimento ao aduzir que caráter sancionatório da progressividade no tempo não decorre da incidência do IPTU sobre um ato ilícito, mas sobre o fato lícito de ser proprietário de imóvel urbano. Segundo aduz, a sanção advém do mau uso que o sujeito passivo faz de sua propriedade urbana. 4.4 O PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO DO CONFISCO E A PROGRESSIVIDADE EXTRAFISCAL Dentre as limitações do poder de tributar calcificadas pela Constituição Federal de 1988, encontrase a vedação da utilização de tributos com efeito confiscatório, a saber: CF - Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: [...] IV - utilizar tributo com efeito de confisco; [...]
Para Castilho (2002, p. 39), citado por Sabbag (2012, p. 235) “confisco tributário consiste em uma ação
do Estado, empreendida pela utilização do tributo, a qual retira a totalidade ou parcela considerável da propriedade do cidadão contribuinte, sem qualquer retribuição econômica ou financeira”. Por sua vez, Torres (2005, p. 67) esclarece que a “proibição de confisco é imunidade tributária de uma parcela mínima necessária à sobrevivência da propriedade privada”. Já Villegas (1980, p. 89), citado por Camargo (2008, p. 117), aduz que haverá efeito confiscatório quando ocorrer exigência tributária que “exceda a razoável possibilidade de colaborar para os gastos públicos, isto é, que não vão além do que permite a capacidade contributiva do particular afetado”. Ao analisar o que seria tributação razoável para compreensão do confisco tributário, Coêlho (1995, p. 257) citado por Camargo (2008, p.117) leciona: Tributação razoável. Eis a questão. O que é razoável hoje não o será amanhã. Não é a mesma coisa aqui, alhures. Tema intrincado este, cuja solução terá de vir, e variando
com o tempo e o modo, pelos Poderes Legislativos e Judiciários da República.
Conforme se depreende dos conceitos citados, a doutrina ainda não logrou êxito em estabelecer as linhas demarcatórias do confisco de modo preciso, podendo-se dizer, com arrimo na análise de Paulo de Barros Carvalho (2005, p. 164), que “sempre haverá uma zona nebulosa, dentro da qual as soluções resvalarão para o subjetivismo”. Nada obstante, a questão que se põe neste tópico é: a vedação do “efeito do confisco” se aplica ao IPTU progressivo no tempo, ou deve ceder passo aos objetivos da tributação extrafiscal? Parte da doutrina entende que o Princípio da Vedação do Confisco também é aplicável aos tributos extrafiscais. Para esta corrente é inadmissível que a tributação extrafiscal grave a fonte geradora de recursos de tal modo que possa consumi-la parcialmente ou esgotála, tendo como defensores Elizabeth Carraza, Roque Carrazza, Regina Helena Costa, Aires Barreto entre outros
(CAMARGO, 2008). Uma outra corrente doutrinária compreende que o Princípio do Não-confisco é inaplicável quando se trata de tributação extrafiscal. Filia-se a esta corrente Sacha Calmon (apud CAMARGO 2008, p. 119-120), para quem o Princípio da Vedação ao Confisco: Cede o passo às políticas extrafiscais, mormente as expressamente previstas na Constituição, portanto onde o constituinte previu a exacerbação da tributação para induzir comportamentos indesejados, é vedada a argüição do princípio do não confisco tributário.
Entrementes, Sacha Calmon pondera seu entendimento ao considerar que o afastamento do princípio não é ilimitado, vez que não pode haver a absorção, por via do imposto, do próprio bem ou renda (COÊLHO, 1995 apud CAMARGO, 2008). Por sua vez, Hovarth (2002), citado por Camargo (2008), embora concorde não poder ser aplicado o Princípio do Não-confisco do mesmo modo para os tributos de caráter fiscal e extrafiscal, não afasta, mas sim
relativiza sua aplicação para os tributos predominantemente extrafiscais, admitindo até mesmo que sua fixação venha ultrapassar o quantum que normalmente se exigiria de um tributo de caráter fiscal. Em posição mais contundente, Camargo (2008) entende que a exação extrafiscal poderia perfeitamente atingir foros de efeito confiscatório, mediante até mesmo a absorção do bem ou renda exatamente por atender os objetivos constitucionais. Essa posição é também defendida por Bucher (1996) apud Camargo (2008), para quem a progressividade, utilizada como instrumento constitucional de promoção da função social da propriedade, poderá atingir patamares que assim desejar o legislador, ainda que em quantum superior ao valor econômico de que possa dispor o contribuinte, com escopo de perseguir os objetivos constitucionais calcificados no artigo 3º da Constituição cidadã. Em que pese a divergência doutrinária, verifica-se que a corrente mais harmônica com o espírito da Constituição Federal de 1998 é aquela defendida por
Sacha Calmon. De fato, se o texto constitucional autorizou a utilização dos tributos para desestimular condutas que não se coadunam com seus princípios e objetivos, como o fez no caso do IPTU, e se a extrafiscalidade adota a progressividade exacerbada para atingir seus fins, inferese que o Princípio do Não-confisco não é imponível à tributação extrafiscal (COELHO, 1995). Doutra banda, também não se pode tolerar que a tributação extrafiscal elimine o próprio bem ou a renda, impondo-se tal limite ao afastamento do Princípio do Não-confisco, conforme bem exortou Sacha Calmon. O próprio texto constitucional conduz a tal entendimento, ao estabelecer a gradação do emprego dos instrumentos urbanísticos em seu artigo 182, §4º, incisos I, II e III. Assim, não haveria sentido permitir que o IPTU extrafiscal consumisse todo o imóvel do proprietário renitente em cumprir a função social, se a Constituição previu, como medida subsequente a sua aplicação, a desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública. Nesse sentido, Paulo Macedo (2004, p. 20) expõe que:
96. 97. O art. 182, § 4º da Lei Maior impõe penalidades sucessivas, não se tratando a incidência de IPTU progressivo da mais severa delas e sim aquela prevista no inciso III do mencionado parágrafo (a desapropriação). E, mesmo no caso extremo de o proprietário de imóvel urbano não proceder o seu adequado aproveitamento após cinco anos de incidência da alíquota máxima do IPTU progressivo (art. 8º do Estatuto da Cidade), garantiu o texto constitucional (art. 182, § 4º, III) que o mesmo receberá o valor real da indenização e os juros legais, vedando assim o confisco, embora permitida a desapropriação. Portanto, em que pese reconhecer-se que o princípio da vedação do confisco cede passo à tributação extrafiscal, deve-se ponderar tal entendimento, vez que a própria CF explicita ao exegeta que a tributação extrafiscal não pode absorver o próprio bem ou renda.
A respeito do IPTU progressivo no tempo, Aires Barreto afirma que a sistemática adotada pelo Estatuto da Cidade esbarraria no princípio da vedação do confisco, e exemplifica sua aplicação: Tal como está, mesmo respeitado o valor venal do imóvel não construído, poderá ser adotada uma alíquota original de 10%, passando no segundo ano para 15%, permanecendo em 15% nos terceiro, quarto e quinto anos. Seguramente, em pouco tempo ocorrerá a absorção de parcela considerável da propriedade (70%) [...](2011, 1002)
Com o devido respeito ao entendimento do consagrado doutrinador, mas com ele não se pode concordar. Conforme visto linhas atrás, o princípio da vedação do confisco cede passo à tributação extrafiscal, só encontrando limite na própria absorção da propriedade. No exemplo extremado, não se pode alegar que o limite de 15% (quinze por cento) extinga a propriedade, ainda que considerada a somatória das
alíquotas no prazo de 05 (cinco) anos. Entrementes, também cabe observar outro detalhe no exemplo proposto por Aires Barreto. Afirma o mestre que poderá ser adotada uma alíquota original de 10%, passando-se nos demais anos para alíquota máxima de 15%. Nesse ponto, cabe observar o disposto no parágrafo 1º do artigo 7º da Lei 10.257, que prevê: Lei 10.257 - Art. 7º. [...]. § 1o O valor da alíquota a ser aplicado a cada ano será fixado na lei específica a que se refere o caput do art. 5o desta Lei e não excederá a duas vezes o valor referente ao ano anterior, respeitada a alíquota máxima de quinze por cento.
Percebe-se pela redação do dispositivo que o valor da alíquota do IPTU não poderá exceder a duas vezes o valor referente ao ano anterior. Pela exegese da norma é lícito afirmar que a alíquota progressiva inicial também não poderá exceder a duas vezes o valor da
alíquota do ano anterior, quando não estava presente a tributação extrafiscal. Desse modo, se o valor alíquota do IPTU em determinado município é 1%, o valor do primeiro ano da progressão extrafiscal não poderá exceder a 2%, vez que também deverá ser observada a regra do parágrafo primeiro, do artigo 7º da Lei nº. 10.257/01 na fixação da primeira alíquota progressiva no tempo. Portanto, embora o princípio da vedação do confisco não se aplique ao IPTU extrafiscal, a fixação das alíquotas progressivas no tempo não fica ao livre talante do legislador municipal, que deverá observar os limites fixados pelo Estatuto da Cidade, que visam estabelecer a progressão gradativa do IPTU ao longo de 05 anos, sem culminar na própria absorção do imóvel urbano. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS. Diante das graves consequências socioeconômicas e ambientais causadas pelo desestruturado processo de urbanização brasileiro, dar cumprimento à função social
da propriedade urbana não é uma faculdade do proprietário, mas sim um dever que se lhe impõe com vistas a assegurar a própria sustentabilidade da vida nas cidades. A concepção de um direito de propriedade sagrado, absoluto, ficou no tempo. Hoje a propriedade não serve apenas ao proprietário, ela também deve servir aos interesses da coletividade, mediante a sua utilização sadia, em compasso com as exigências fundamentais de ordenação da cidade. Refletindo este cenário, a Constituição da República de 1988 estabeleceu de forma pioneira regras da política urbana a ser desenvolvida pelos municípios, impondo três sanções sucessivas ao proprietário renitente em cumprir a função social da propriedade: 1) obrigação de parcelar, utilizar ou edificar; 2) o IPTU progressivo no tempo, e; 3) a desapropriação sanção. Dentre tais instrumentos, destaca-se o IPTU progressivo no tempo, tributo extrafiscal de espécie indutora, vez que visa desestimular a subutilização de imóveis, promovendo sua adequação ao princípio da
função social da propriedade urbana. Com efeito, se a tributação é uma das formas de atuação do estado brasileiro que mais sobressai, não pode ignorar a potencialidade da utilização do IPTU extrafiscal como instrumento de promoção da função social da propriedade urbana. Para que seja possível sua aplicação, deverá o município constatar a não edificação, subutilização ou não utilização do imóvel urbano, bem como o descumprimento da ordem de parcelamento, edificação ou utilização compulsórios, estabelecida em lei municipal específica para área incluída no plano diretor. Atua o IPTU extrafiscal através da majoração progressiva da sua alíquota pelo prazo de cinco anos, observado o disposto no parágrafo primeiro, do artigo 7º da Lei nº. 10.257/01, que estabelece que o valor da alíquota a ser aplicado a cada ano não poderá exceder a duas vezes o valor referente ao ano anterior, respeitado o limite de 15%. Em que pese o caráter sancionatório do IPTU extrafiscal, não se pode confundir com a tributação de ato
ilícito, vedada pelo artigo 3º do Código Tributário Nacional. O IPTU extrafiscal não incide sobre fato ilícito, mas sim sobre o fato lícito de ser proprietário de imóvel urbano. O agravamento do imposto em razão do não cumprimento da função social da propriedade não o descaracteriza. Oportuno ressaltar que o Princípio da Vedação do Confisco cede passo à tributação extrafiscal, nada obstante, esse distanciamento não é absoluto. Deve-se ponderar tal entendimento, vez que a CF, ao estabelecer a desapropriação-sanção como instrumento subsequente à utilização do IPTU extrafiscal, explicita ao exegeta que a tributação extrafiscal não pode absorver o próprio bem ou renda. Assim, desde que não extinga totalmente o bem, admite-se que a tributação extrafiscal ultrapasse os padrões convencionais da tributação fiscal, tendo sempre em vista que surge como instrumento de intervenção econômica e de promoção dos objetivos constitucionais. Como frisado, o próprio Estatuto da Cidade cuidou de ponderar a utilização do IPTU extrafiscal, ao
estabelecer o limite de 15%, bem como ao determinar que a progressão se dê de forma compassada, sem que o valor da alíquota do ano seguinte ultrapasse o dobro do valor referente ao ano anterior. Esta regra também se impõe na fixação da alíquota do primeiro ano, que não poderá exceder a duas vezes o valor da alíquota original do IPTU, isto é, da alíquota não progressiva no tempo. Logo, afere-se que não poderá o município fixar a alíquota inicial da progressão extrafiscal em qualquer patamar, mas deverá observar o disposto no artigo 7º, parágrafo primeiro da Lei nº. 10.257/01. Ante todo o exposto, evidencia-se a importância do IPTU progressivo no tempo, que atua, enquanto instrumento de ordenação do espaço territorial urbano, através de desestímulos à manutenção de imóveis em desconformidade com a função social da propriedade urbana, com vistas à construção de cidades mais justas e ambientalmente menos predatórias.
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Capítulo 18 A TRIBUTAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO DE
PEQUENOS MUNICÍPIOS RURAIS NO BRASIL: DA ZONA CINZENTA ENTRE O IPTU E O ITR À CONSTRUÇÃO DE UMA POLÍTICA FISCAL ADEQUADA À REALIDADE RURAL BRASILEIRA. Daniel Ferreira de Lira[224] [...] parece inegável a afirmação de que o futuro do país depende da solução que será encontrada para o Brasil rural, seja pelo fato de que as regiões rurais ocupam a maior área do espaço brasileiro, e é justamente onde se encontram os ecossistemas mais sensíveis, seja pelo fato de que aproximadamente um terço da população brasileira vive nas regiões com estas características (FAVARETO, 2010)
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS. O Direito, em sua caminhada rumo a pósmodernidade, assim como sói ocorrer com outros ramos das ciências jurídicas, passa a preocupar-se com a construção de um projeto nacional de desenvolvimento
para o Brasil. Durante anos alijados do processo de discussão e à margem doutras ciências sociais no debate sobre o desenvolvimento regional e nacional, alguns ramos do direito já acenam para a construção de uma agenda de pesquisa que possa dar um maior contributo para o planejamento nacional das próximas décadas. Deixando o jurista, portanto, de ser um mero exegeta para tornar-se, outrossim, um agente de intervenção sóciojurídica mais afinado com as grandes questões nacionais. Nessa seara, o Direito Tributário, assim como outras disciplinas que cuidam do chamado direito público, assume uma importância inegável, sobretudo, quando se debruça sobre questões afetas à fiscalização e a repartição de receitas tributárias entre os entes federativos. Como a maioria das políticas públicas de desenvolvimento, inclusive, as fomentadas pelo governo federal, desenvolvem-se no âmbito dos municípios, o Direito Tributário tem tentado colocar a questão municipal um pouco mais no centro da discussão. Pois, a
despeito de ser o ente-mirim o grande executor de boa parte das políticas públicas, mormente daquelas que são mais próximas ao cidadão, o município ainda depende de um sistema de repartição tributária centralizado em grande medida na figura da União e dos Estados. Ademais, alguns tributos municipais enfrentam “zonas cinzentas” de tributação que, por vezes, colocam dúvidas sobre a legalidade da sua atividade fiscal, como a existente entre o ICMS e o ISS, exempli gratia. Neste artigo, portanto, discutem-se adotando-se como método o paradigma da complexidade de Edgard Morin -, os limites jurídico-tributários entre a incidência e a não-incidência do IPTU e do ITR, à luz da realidade rural e urbana brasileira atual, numa dicotomia que se apresenta complexa, sob o prisma da prática tributária. 2. DA RELEVÂNCIA DOS NÚMEROS RELACIONADOS À QUESTÃO DOS PEQUENOS MUNICÍPIOS RURAIS BRASILEIROS.
Há muita divergência sobre o processo de ocupação do território nacional brasileiro e sua divisão entre urbano e rural. Para o IBGE, a maior parte da população brasileira seria urbana. Nessa senda, segundo o CENSO 2010, a população hoje no Brasil é mais urbanizada que há 10 anos: em 2000, 81% dos brasileiros viviam em áreas urbanas, agora seriam 84%, o que daria aos brasileiros, em termos de ocupação espacial, números muito próximos ao dos países desenvolvidos. Inobstante, os elementos levados em consideração para se aferir tais números, não sejam isentos de críticas. Muito pelo contrário! Há um dado irrealístico do grau de urbanização brasileiro traçado pelo IBGE, o qual não é baseado no tamanho e na densidade da população nos municípios. Assim, o critério do IBGE dá sustentação para um olhar jurídico míope que não se coaduna com os critérios utilizados por outros países desenvolvidos do mundo (VEIGA, 2001), razão pela qual estima-se que apenas 60 % da população brasileira possa ser considerada efetivamente urbana e que, em determinadas
áreas rurais, a população tem crescido até mais que nas áreas urbanas (KAGEYAMA, 2008). Assim “nos 1.109 municípios mais atraentes do Brasil rural, a população aumentou mais de 30% [entre 1991 e 2000], enquanto crescia 20% no Brasil urbano, e 15% no conjunto do país” (VEIGA, 2001, p.10) Verificam-se, em verdade, diversos estudiosos e estudos, para além do IBGE, que atestam outra realidade rural no Brasil, afirmando-se que, em verdade, cerca de 70% dos pequenos municípios brasileiros, assim considerados aqueles cuja população total não excede a 20 mil habitantes, sejam eminentemente municípios rurais, ou seja, quando revelados esses números apenas entre os pequenos municípios brasileiros ele é ainda mais inquietante. Assim, parece inegável a afirmação de que o futuro do país depende da solução que será encontrada para o Brasil rural, seja pelo fato de que as regiões rurais ocupam a maior área do espaço brasileiro, e é justamente onde se encontram os ecossistemas mais sensíveis, seja pelo fato de que aproximadamente um terço da população
brasileira vive nas regiões com estas características (FAVARETO, 2010). A tributação pode ser um dos vetores do desenvolvimento desses pequenos municípios nacionais que são, em verdade, municípios rurais, nos quais o liame entre a área urbana e rural é quase inexistente, sobremaneira na região norte e nordeste brasileira, o que força o legislador, o intérprete, enfim, o aplicador do direito, a ter um olhar mais acurado sobre a realidade dos pequenos municípios brasileiros que passam a exigir da legislação tributária, sob o prisma do desenvolvimento, uma maior e melhor adequação. 3. O IMBRICAMENTO TRIBUTÁRIO DO IPTU E DO ITR À LUZ DA REALIDADE RURAL E REGIONAL BRASILEIRA. De competência tributária municipal (art.156, I, da CRFB/88), mediante lei ordinária municipal[225], o IPTU é tributo cuja sujeição passiva abrange quem detenha qualquer direito de gozo sobre bem imóvel, seja
esse direito pleno ou limitado. Nessa senda, proprietários, titulares de domínio útil ou possuidores ad usucapionem[226] de bens imóveis urbanos localizados no município, então elemento espacial do tributo em tela, estarão sujeitos ao recolhimento do IPTU no dia 1º de janeiro de cada ano, então elemento temporal, cuja base de cálculo será o valor venal do imóvel. Já o ITR (art.153, VI, da CRFB/88) é tributo federal, mas já fora tributo estadual (CF de 1946) e tributo municipal (EC n.5/61), sendo, hodiernamente, regido pela lei nº 9.393/96, regulamentada pelo Decreto nº 4.382/02. De caráter nitidamente extrafiscal, o ITR é vocacionado à implementação de políticas agrárias, sendo, inclusive, a partir da EC nº 42/03 também progressivo, talqualmente o é o próprio IPTU, por seu turno, variando as alíquotas de forma a desestimular a manutenção das propriedades improdutivas, não se revelando incidente sobre pequenas glebas rurais, assim definidas em lei, desde que o proprietário não possua outro imóvel.
A base de cálculo do ITR é o valor fundiário da propriedade e, assim como o IPTU, o ITR está sujeito ao mesmo elemento temporal, qual seja: a comprovação da propriedade, domínio ou posse qualificada imobiliária rural em 1º de janeiro do ano fiscal em curso, entretanto, sob o prisma espacial, sua incidência se dá por exclusão, ou seja, o ITR incidirá sobre regiões municipais que não sejam consideradas urbanas por lei local, e é exatamente nesse ponto que surge uma discussão deveras relevante. A maior parte dos pequenos municípios brasileiros, ou seja, municípios cuja população local não excede a 20 mil habitantes, não são municípios efetivamente urbanos, são, em verdade, municípios rurais, consoante demonstrado linhas atrás. Desse modo, como a federação centrífuga brasileira exigiu que o município, enquanto ente federativo, tivesse como sede uma cidade, a área rural, porquanto, ficou à mercê das políticas urbanas e dos serviços públicos concentrados nessas áreas. Porém, essas cidades existem ao longo de todo o interior do Brasil, mas são eminentemente cidadesrurais. O que faz com que o critério da localização,
aparentemente hoje adotado pela legislação brasileira para se definir a incidência do IPTU, seja insuficiente e dissociado da realidade nacional, sobretudo, nas regiões norte, nordeste e centro-oeste do país, onde essa realidade é ainda mais latente. 4. CRÍTICA AO CRITÉRIO DA LOCALIZAÇÃO – UMA FICÇÃO INADEQUADA COMO TODA FICÇÃO. Hodiernamente, o critério adotado para a fixação do IPTU ou do ITR, inteligência da lei 9.393/96, corroborado por reiteradas decisões do STF, é o critério da localização, ou seja, considera-se urbano o imóvel localizado em área urbana, cf. previsão em lei municipal, independentemente de sua finalidade. Nessa senda, o conceito tributário de zona urbana é construído a partir da diretriz estabelecida pelo art.32, §§ 1º e 2º do CTN, segundo o qual: Art. 32. O imposto, de competência dos Municípios, sobre a propriedade predial e territorial urbana tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido
na lei civil, localizado na zona urbana do Município. § 1º Para os efeitos deste imposto, entende-se como zona urbana a definida em lei municipal; observado o requisito mínimo da existência de melhoramentos indicados em pelo menos 2 (dois) dos incisos seguintes, construídos ou mantidos pelo Poder Público: (grifos nossos) I - meio-fio ou calçamento, com canalização de águas pluviais; II - abastecimento de água; III - sistema de esgotos sanitários; IV - rede de iluminação pública, com ou sem posteamento para distribuição domiciliar; V - escola primária ou posto de saúde a uma distância máxima de 3 (três) quilômetros do imóvel considerado. § 2º A lei municipal pode considerar urbanas as áreas urbanizáveis, ou de expansão urbana, constantes de loteamentos aprovados pelos órgãos competentes, destinados à habitação, à indústria ou ao comércio, mesmo que localizados fora das zonas definidas nos termos do parágrafo anterior.
Assim, segundo o CTN, mesmo sendo definido em lei municipal, o conceito de zona urbana deve reconhecer pelos menos dois melhoramentos apontados nos incisos suso transcritos do § 1º do art. 32 do Código Tributário Nacional. Não seria impossível, mesmo provável, encontrar municípios brasileiros cuja lei local tenha definido como urbana determinada localidade por reunir, basicamente, abastecimento de água, iluminação
pública e escola primária precária próxima. Mas a questão fulcral da problemática não está aqui, mas sim na inobservância doutros critérios, como o da destinação econômica do imóvel. Cumpre registrar, nesse sentido, que o critério da destinação econômica ainda aparece em alguns julgados. E que a lei 5.868/72, que trazia em seu art. 6º o conceito de imóvel rural, teve o referido dispositivo declarado inconstitucional pelo Senado Federal, tendo sua execução suspensa por meio da resolução n.313/83. O referido conceito levava em consideração o critério da destinação econômica, senão vejamos: Art. 6º Para fim de incidência do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural, a que se refere o art. 29 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966, considera-se imóvel rural aquele que se destinar à exploração agrícola, pecuária, extrativa vegetal ou agroindustrial e que, independentemente de sua localização, tiver área superior a 1 (um) hectare. Parágrafo único. Os imóveis que não se enquadrem no disposto neste artigo, independentemente de sua localização, estão sujeitos ao Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana, a que se refere o art. 32 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966.
O pecado da referida lei está na adoção também de apenas um critério, qual seja: o da destinação econômica, pois fixar um ou outro critério isoladamente é desconhecer a imbricada relação cidade-campo, evidenciada nos pequenos municípios brasileiros, quais sejam, aqueles cuja população máxima não excede a 20 mil habitantes e que são imensa maioria quando se pensa nos 5.565 municípios que compõem ao lado dos estadosmembros e da União, a República Federativa do Brasil. Com a percuciência que lhe é peculiar Kyoshi Harada (2008, p.02), assim compreende a questão: Aliás, a adoção do critério da destinação do imóvel impossibilitaria ao Município o cumprimento de sua missão de ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade (art. 182 da CF), pois simplesmente desapareceria a fronteira entre as zonas rural e urbana. O território municipal ficaria constituído de imóveis urbanos e de imóveis rurais, de forma intercalada, impedindo ao Município de conferir a função social à propriedade imobiliária, pois esta, em relação ao imóvel rural, cabe apenas à União (art. 186 da CF).
O Supremo Tribunal Federal, apesar de, na esteira do Senado, declarar a inconstitucionalidade do
artigo 6º da Lei nº 5.868/72, nos autos do Recurso Extraordinário nº 140.773-5/210 – SP, com um entendimento mais recente, na determinação da cobrança do tributo, mesclou o conceito territorial com a destinação econômica para tentar combater a bitributação pelo IPTU e pelo ITR, dada a realidade dos municípios brasileiros, assim considerando no julgamento: [...] II - O c. Supremo Tribunal Federal pacificou o entendimento no sentido de que a regra do art. 32 do Código Tributário Nacional, na redação dada pelo art. 15 do Decreto-Lei 57/66, foi recepcionada pela Constituição Federal de 1967, pela Emenda Constitucional 01/69 e pela atual Constituição Federal de 1988 como norma com natureza de lei Complementar, por ser regra geral tributária acerca dos tributos ITR e IPTU, assim somente podendo ser alterada por norma desta mesma espécie, pelo que declarou a inconstitucionalidade do art. 6° e seu parágrafo único da Lei 5.868/72 (STF. RE 94.850-8/MG. LEX 46/91. Rel. Min. Moreira Alves) e também do art. 12 da mesma Lei (na parte que revogava o art. 15 do Decreto-Lei 57/66 (STF. RE 140773 / SP. J. 08/10/1998, DJ 04-06-1999, p. 17; EMENT 1953-01/127. Rel. Min. Sydney Sanches; Resolução 09/2005 do Senado Federal), restabelecendo assim a plena vigência do art. 32 do CTN, impondo a regra da prevalência da destinação do imóvel para fins de incidência do ITR ou do IPTU, sujeitando-se o imóvel com destinação rural ao ITR mesmo que esteja na área urbana do município.
Forçoso é concluir que no julgamento acima a adoção do critério da localização pelo STF, sem considerar outro elemento senão o da inconstitucionalidade formal do referido dispositivo, não se adentrou no mérito de sua adequação à realidade brasileira, como se espera talvez do STF, enquanto tribunal constitucional. Entendeu o Supremo Tribunal Federal que a fixação de critério para definição de imóvel é matéria que se insere no campo de normas gerais sobre tributação, pelo que somente lei complementar poderia revogar a expressa disposição do CTN. Mas, no STJ, houve oportunidades para análises recentes do mérito dessa discussão, senão vejamos: TRIBUTÁRIO. IMÓVEL NA ÁREA URBANA. DESTINAÇÃO RURAL. IPTU. NÃO-INCIDÊNCIA. ART. 15 DO DL 57⁄1966. RECURSO REPETITIVO. ART. 543-C DO CPC. 1. NÃO INCIDE IPTU, MAS ITR, SOBRE IMÓVEL LOCALIZADO NA ÁREA URBANA DO MUNICÍPIO, DESDE QUE COMPROVADAMENTE UTILIZADO EM EXPLORAÇÃO EXTRATIVA, VEGETAL, AGRÍCOLA, PECUÁRIA OU AGROINDUSTRIAL
(art. 15 do DL 57⁄1966). 2. Recurso Especial provido. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8⁄2008 do STJ.[227] TRIBUTÁRIO. IPTU. ITR. IMÓVEL. EXPLORAÇÃO EXTRATIVA VEGETAL. ART. 32 DO CTN, 15 DO DECRETO-LEI Nº 57⁄66. 1. O artigo 15 do Decreto-Lei nº 57⁄66 exclui da incidência do IPTU os imóveis cuja destinação seja, comprovadamente a de exploração agrícola, pecuária ou industrial, sobre os quais incide o Imposto Territorial Rural-ITR, de competência da União. 2. Tratando-se de imóvel cuja finalidade é a exploração extrativa vegetal, ilegítima é a cobrança, pelo Município, do IPTU, cujo fato gerador se dá em razão da localização do imóvel e não da destinação econômica. Precedente. 3. Recurso especial improvido.[228]
Estas decisões têm como esteio o decreto-lei 57/66 que altera dispositivos sobre lançamento e cobrança do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural, instituindo normas sobre arrecadação da Dívida Ativa correspondente, e outras providências. O art. 15 do referido decreto assim dispõe: “O disposto no art. 32 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966, não abrange o imóvel de que, comprovadamente, seja utilizado em exploração extrativa vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial, incidindo assim, sobre o mesmo, o ITR e
demais tributos com o mesmo cobrados”. É nessa linha, inclusive, o aresto abaixo colacionado do Superior Tribunal de Justiça: TRIBUTÁRIO. IPTU. ITR. FATO GERADOR. IMÓVEL SITUADO NA ZONA URBANA. LOCALIZAÇÃO. DESTINAÇÃO. CTN, ART. 32. DECRETO-LEI N. 57⁄66. VIGÊNCIA. 1. Ao ser promulgado, o Código Tributário Nacional valeu-se do critério topográfico para delimitar o fato gerador do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) e o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR): se o imóvel estivesse situado na zona urbana, incidiria o IPTU; se na zona rural, incidiria o ITR. 2. Antes mesmo da entrada em vigor do CTN, o DecretoLei nº 57⁄66 alterou esse critério, estabelecendo estarem sujeitos à incidência do ITR os imóveis situados na zona rural quando utilizados em exploração vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial. 3. A jurisprudência reconheceu validade ao DL 57⁄66, o qual, assim como o CTN, passou a ter o status de lei complementar em face da superveniente Constituição de 1967. Assim, o critério topográfico previsto no art. 32 do CTN deve ser analisado em face do comando do art. 15 do DL 57⁄66, de modo que não incide o IPTU quando o imóvel situado na zona urbana receber quaisquer das destinações previstas nesse diploma legal. 4. Recurso especial provido.[229]
Assim, mostra-se mui relevante, para a definição da incidência do ITR (Imposto Territorial
Rural) e do IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano), a destinação econômica do imóvel tributável, e não apenas a sua localização (rural ou urbana). O art. 32 do CTN não mais prevalece à vista dos arts. 15 e 16, do DL nº 57/66, não revogado pela Lei nº 5.868/72, declarada inconstitucional pelo STF e suspensa sua vigência pela Resolução nº 313/83, do Senado Federal. Assim, pode o Município instituir o IPTU sobre os bens imóveis localizados em sua zona urbana, definida em lei municipal, qualquer que seja o seu uso e destinação, ressalvados, contudo, os utilizados em exploração extrativa vegetal, agrícola, pecuária ou agro-industrial, que se sujeitam unicamente ao ITR, de competência federal. Ademais, cabe ao Município comunicar ao proprietário que o seu imóvel rural foi incluído no cadastro fiscal para efeitos do IPTU em razão de sua consideração como urbano, e não ao seu proprietário, no sentido de que este informe que o seu imóvel está sujeito ao ITR, ensejando a ampla possibilidade de impugnação de sua parte, o que, uma vez não ocorrendo, considerando
o caráter eminentemente rural e a destinação econômica do imóvel em questão, deve incidir apenas o Imposto Territorial Rural – ITR. Haja vista a vinculante declaração de inconstitucionalidade do Supremo Tribunal Federal sobre o art. 6º e seu parágrafo único, da Lei nº 5868/72, e, principalmente, do art. 12 na parte que revogara o art. 15 do Decreto-Lei nº 57/66, o qual o Senado Federal, desta feita, através da Resolução nº 09, de 07/06/2005, também suspendera a eficácia, vale dizer que o art. 15 do DL 57/66 não está revogado. Em decisão publicada em 30 de março de 2011, o TRF da 3ª Região, no julgamento da Apelação Cível nº 42132/SP, assim decidiu: PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. IPTU E ITR. INCIDÊNCIA. INSUFICIÊNCIA DO CRITÉRIO DA LOCALIZAÇÃO DO IMÓVEL. DESTINAÇÃO DO IMÓVEL. CTN, ART. 32. DECRETO-LEI N. 57 /66. 1. A regra do art. 32 do Código Tributário Nacional, na redação dada pelo art. 15 do Decreto-Lei nº 57 /66, foi recepcionada pela Constituição Federal de 1967, pela Emenda Constitucional nº 01 /69 e pela atual Constituição Federal de 1988 como norma com natureza de lei complementar, por ser regra geral tributária.
Essa construção que tem força no STJ e que parece ser a orientação da maioria dos tribunais regionais federais é mais consentânea com a realidade dos pequenos municípios brasileiros, pois estabelece, como regra, o critério da localização assim como fez o STF, mas sem olvidar da destinação econômica nas hipóteses do imóvel destinar-se à atividade de exploração vegetal, agrícola, agropecuária ou agroindustrial, independentemente de estar localizado ou não no perímetro urbano, o que atinge em cheio os pequenos municípios rurais brasileiros. A partir dessa primeira conclusão, chega-se a seguinte indagação: como ficariam os municípios cuja atividade é eminentemente agrícola ou rural, com imóveis localizados em área urbana, mas que desenvolvem atividade rural? Isso não geraria uma abrupta diminuição na arrecadação municipal de IPTU e um aumento da arrecadação do ITR? Apenas à guisa de exemplo existem municípios que são totalmente rurais, como o município de Nova Ramada no Rio Grande do Sul[230].
Harada (2008, p.01), demonstra preocupação com a temática ao aduzir que: O crescimento da cidade com a progressiva expansão de zona urbana do município, inclusive, com quase a absolvição total da zona rural em algumas comunas, têm trazido problemas de ordem tributária para diversos munícipes, que sempre se dedicaram às atividades agropastoris. São surpreendidos, da noite para o dia, com a nova tributação: o IPTU 'n' vezes mais oneroso do que o tradicional ITR que vinham pagando.
A verdade é que o ITR pode e deve ser fiscalizado e cobrado pelos municípios que assim optarem, na forma da lei, desde que não implique redução de imposto ou renúncia fiscal. Nesses casos, poderá o município ficar com o total do produto de arrecadação do ITR, cf. art.158, II, da CRFB/88, passando a estar obrigado a fazê-lo, in casu, sob pena de ver diminuir drasticamente a sua arrecadação. Assim, a regra constitucional de delegação da capacidade tributária ativa passaria a impor aos municípios uma regra de sobrevivência tributária. Nem todos os agricultores abandonaram as
suas terras ante a expansão urbana, como são os casos dos cultivadores de hortaliças de São Bernardo do Campo, que não mais conseguem arcar com os pesados encargos tributários do IPTU, em substituição ao ITR, que tem como base de cálculo o valor fundiário, ou seja, o valor da terra nua (valor da terra sem edificações ou culturas). O ITR permite, ainda, 90% de desconto, sendo 45% pelo grau de utilização da terra (GUT) e 45% pelo grau de eficiência na exploração (GEE). Isso, sem contar a imunidade instituída pela Constituição Federal em relação a pequenas glebas rurais exploradas pelo proprietário, que não possua outro imóvel, nos termos da lei (art. 153, § 4º, II da CF). O problema da tributação pelo IPTU, em lugar do ITR, nem sempre é de ordem jurídica, como acontece em alguns Municípios de tradição agrícola, mas que com o passar dos tempos transformaram seus territórios em zonas urbanas de conformidade com as normas do CTN. (HARADA, 2008, p.03) Hoje, a despeito da regra constitucional, poucos são os pequenos municípios que promovem a
fiscalização e o recolhimento do ITR, o que provoca um grande número de imóveis rurais que não são compelidos a recolher o referido tributo por ausência de atuação eficaz da administração tributária federal nessas áreas, exceto quando da alienação destas, o que empobrece, do ponto de vista fiscal, o próprio município. Cumpre registrar que a EC 42/03 foi, em muito, impulsionada pelos prefeitos desses pequenos municípios, passando a permitir, portanto, o repasse de 100% da arrecadação do ITR aos municípios que se conveniarem com a União no sentido de promover sua fiscalização e arrecadação. Se a fiscalização parte da União, apenas 50% será repassado ao município sede da área rural tributada, porém, a regra de delegação de capacidade tributária ativa, dependia de lei, razão pela qual foi publicada a lei 11.250/05, que em seu art.1º preceitua que compete à Secretaria da Receita Federal, celebrar convênios com o Distrito Federal e os Municípios que assim optarem, visando a delegar as atribuições de fiscalização, inclusive a de lançamento dos créditos tributários, e de cobrança do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural, sem
prejuízo da competência supletiva da Secretaria da Receita Federal. Havendo delegação aos municípios, por meio de convênios, a arrecadação do ITR dar-se-ia talqualmente ocorre com o IPTU, o que para os municípios seria um grande avanço, sob o prisma exacional. Mas, a despeito de tudo isso, o valor de arrecadação do ITR despencou, chegando a uma média de 400 milhões de reais anuais, o que é um valor irrisório se comparado ao volume de arrecadação que outros tributos federais promovem, o que não é suficiente sequer para as despesas e necessidades básicas dessas regiões, como, por exemplo, a melhoria da acessibilidade rural para escoamento produtivo e circulação de pessoas, a partir da manutenção e/ou ampliação de estradas vicinais. Segundo o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), o Imposto Territorial Rural é o que menos arrecada no Brasil, dentre os demais impostos. Em 2009, foram arrecadados aproximadamente R$ 470 milhões, ao passo que o ICMS arrecadou nesse
mesmo período a quantia R$ 226,09 bilhões em todo o país; e o IRPF e o IRPJ juntos somaram R$ 191,6 bilhões de arrecadação. O total de ITR a ser efetivamente lançado ainda nos início dos anos 2000, em verdade, era de mais de R$ 4 bilhões de reais, o que passaria a significar aproximadamente 1,76% da arrecadação tributária federal. Embora esse percentual signifique muito em relação aos atuais 0,1% que se arrecada atualmente com o ITR, ele fica ainda distante de números como os 3% de alguns países europeus, como a França e a Itália, os 4,5% do Chile, os 5% dos EUA ou os 6% de arrecadação em ITR a que chegam os uruguaios (SOUZA, 2001). Nesse sentido, mister é repetir a advertência de Souza (2004, p.07), in verbis: A participação do imposto cobrado sobre as terras rurais em relação ao total da receita tributária representa 5% (cinco por cento) nos EUA e Canadá, 3% (três por cento) na França e na Itália, 6% (seis por cento) no Uruguai e 4,5% (quatro e meio por cento) no Chile, enquanto no Brasil esse percentual em nenhuma vez, nas últimas décadas, alcançou 0,3% (três décimos percentuais) da receita tributária federal. É tão desprezível o valor arrecadado no Brasil a título de ITR
que, no ano de 2001, a arrecadação de R$ 245 milhões significou apenas 0,05% (cinco centésimos percentuais) da arrecadação total dos tributos federais.
Como pontua o referido autor, esses números são ainda mais relevantes em razão da dimensão do território nacional, pois o Brasil possui uma extensão territorial de 845.118.900 hectares, dos quais, segundo estudos, 552.500.000 hectares se constituem em área tributável, desses apenas 35% não seriam tributáveis, pois estão destinados a finalidades específicas, como o assentamento indígena, a preservação ecológica ou são áreas cujos imóveis rurais, pelo seu tamanho, estariam imunes à tributação (SOUZA, 2004). Lembrando-se, nesse sentido, do enunciado da súmula 595 do STF, segundo a qual “o proprietário que não possua outro imóvel poderá gozar de imunidade das pequenas glebas rurais.” Ocorre que a possibilidade trazida pela EC nº42/2003 de exercício de fiscalização do ITR pelos municípios, por vezes, esbarra nas exigências estabelecidas pela Receita Federal para a celebração do referido convênio, pois, por exemplo, o município,
interessado em ficar com 100% da arrecadação, deve ter um quadro de servidores próprio com curso de formação pela ESAF, ocupantes dos cargos com atribuições de lançamento dos créditos tributários. A instrução normativa RFB 884/2008, aduz que para a celebração do convênio de que trata esta Instrução Normativa, o Município optante deverá não ter convênio do ITR denunciado pela RFB nos últimos 2 (dois) anos, o que ocorre, por exemplo, quando o conveniado deixar de: a) informar os valores de terra nua por hectare (VTN/ha), para fins de atualização do Sistema de Preços de Terras (SIPT) da RFB; ou b) deixar de cumprir as metas mínimas de fiscalização definidas pela RFB, observadas as resoluções do CGITR; o município deverá ainda dispor de estrutura de tecnologia da informação suficiente para acessar os sistemas da Receita Federal, que contemple equipamentos e redes de comunicação; ademais, possuir quadro de carreira de servidores com atribuição de lançamento de créditos tributários; prestar atendimento decorrente dos procedimentos fiscais por ele efetuados; atender as
solicitações de retificação de lançamento por ele efetuado sem prévia intimação do sujeito passivo; expedir auto de infração, intimação, avisos e outros documentos em conformidade com modelos aprovados pela Receita Federal; tudo isso, arcando com os custos de treinamento a seus servidores que será realizado, em regra, pela Escola Superior de Administração Fazendária (ESAF); e com a expedição de auto de infração, intimação, avisos e outros documentos. Assim sendo, estando conveniado o município, este poderá arrecadar o ITR, assim como arrecada o próprio IPTU, fazendo jus a 100% (cem por cento) do produto da arrecadação do ITR, referente aos imóveis rurais nele situados, a partir do 1° (primeiro) dia útil do 2° (segundo) mês subsequente à data de celebração do convênio. A questão, no entanto, é que boa parte desses pequenos municípios rurais brasileiros que, poderiam ampliar sua arrecadação e, portanto, reverter em desenvolvimento local, não tem condições técnicas, logísticas e até financeiras, ou, por vezes, interesse
político suficiente, para atender às exigências da portaria 884/2008 da Receita Federal. Cumpre registrar que, aderindo o município ou o DF ao referido convênio que lhe permitirá ficar com 100% da arrecadação tributária do ITR, a legitimidade para a propositura da execução fiscal respectiva será do próprio município e não da União. Filiamo-nos a este pensamento por compreendermos que a legitimidade ad causam se define pela identidade entre as partes materiais e as partes formais, ou seja, a identidade entre quem está na relação jurídico-tributária, lançando, fiscalizando e arrecadando e quem está do outro lado como contribuinte ou responsável tributário, o que, in casu, se revelaria entre o município e o particular. 5. MAIS DUAS BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE ESSE IMBRICAMENTO. Há duas outras questões que ainda precisam ser enfrentadas quando se trata da “zona cinzenta” existente entre o ITR e o IPTU, sobretudo, quando a
questão é colocada fora dos grandes centros urbanos, portanto, no horizonte dos pequenos municípios rurais brasileiros, quais sejam: o imóvel por acessão física e as áreas urbanizáveis, senão vejamos. 5.1 O imóvel por acessão física e o ITR. Para efeitos de IPTU, considera-se imóvel o bem que assim se estabeleça, seja por acessão física ou natural. Inobstante, no caso do ITR, não há fato gerador quanto ao imóvel rural por acessão física, apenas natural. Pode-se dividir os bens imóveis em três categorias, a saber: a) imóveis por natureza; b) imóveis por acessão física e; c) imóveis por acessão intelectual. Por natureza é o solo e tudo aquilo que lhe incorporar naturalmente, assim a terra nua rural sofreria a incidência do ITR. Já os bens imóveis por acessão física, então objeto de tributação pelo IPTU, “são bens que o homem incorpora permanentemente ao solo” (FIUZA, 2004, p.173), a exemplo das construções, e das sementes lançadas à terra. Assim, o ITR não poderá ter incidência
sobre os acréscimos e melhoramentos evidenciados sobre a terra nua rural, o valor de sua base de cálculo, portanto, estaria adstrito a área natural composta basicamente da terra e do subsolo, e não das plantações ou edificações realizadas, razão pela qual é legítima a preocupação com a exata identificação da área rural, pois, do contrário, o proprietário poderá estar sujeito a uma tributação maior do IPTU que leva em consideração a acessão física, para além da natural, em sua base de cálculo, vez que é referente ao valor venal do bem. Mas ainda existe uma terceira classificação, qual seja: bens imóveis por acessão intelectual, os quais “são os bens que o proprietário intencionalmente destina e mantém no imóvel para exploração industrial, aformoseamento ou comodidade (art 43, III, do CC/16)” (STOLZE, 2007, p.262). Há divergência doutrinária civilista sobre a existência dessa classificação sob a égide do Código Civil de 2002, pois o legislador não a faz constar expressamente no texto da lei, como o fez no Código Civil de 1916. Sílvio de Salvo Venosa (2006, p. 311) aduz que essa “noção (acessão intelectual) também
deve estar compreendida na fórmula geral do novo art. 79”. Gustavo Tepedino, por sua vez, obtempera que “o legislador rejeitou a aderência legal e automática dessa classe de bens aos bens imóveis, o que vale rejeitar qualquer espécie de acessão intelectual, implicitamente configurada.” (TEPEDINO, 2004, p. 174). Essa discussão não tem relevância tributária no tocante ao ITR ou IPTU. Questão curial, nessa senda, é a referente as “ilhas artificiais” existentes em diversas áreas de lazer país afora, dentro de açudes privados, lagos privados, lagoas privadas etc, muitos dos quais localizados em áreas rurais, mas, consoante apontado acima tais acessões físicas não estarão sujeitas à tributação e ITR, embora possam estar sujeitas a tributação por IPTU, se o empreendimento estiver localizado em zona urbana. Esse mesmo entendimento é aplicado as sítios, granjas e chácaras de recreio que estarão sujeitos a IPTU se localizados em área urbana, isto é, atender aos parâmetros estabelecidos no art. 32 do CTN e em lei municipal.
5.2 Áreas urbanizáveis ou de expansão urbana. Pelo CTN as áreas urbanizáveis ou de expansão urbana, mesmo que localizadas fora das zonas definidas como tais, desde que previstas em lei municipal e o seu lote esteja previsto em loteamento aprovado pelos órgãos competentes, mesmo que não servidos pelos melhoramentos retromencionados, são designativos de áreas urbanas e, portanto, também, estão sujeitos a IPTU e não a ITR, o que se coaduna com o plano de expansão e desenvolvimento urbano dos municípios brasileiros 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS. Diante de todo o exposto, pode-se chegar as seguintes considerações: a) o critério adotado para se definir a incidência do IPTU ou do ITR é o critério da localização, assim sendo, se o imóvel está situado em área considerada urbana, consoante lei municipal local, observados os parâmetros estabelecidos pelo art. 32 do CTN, sofrerá a incidência do IPTU, assim, por exclusão,
os demais imóveis sofrerão incidência de ITR, salvo as hipóteses em que este tributo também não incida, mesmo em se tratando de área rural; b) Há exceções a essa regra, qual seja: imóvel cuja finalidade é a exploração extrativa vegetal, agrícola ou agropastoril torna ilegítima a cobrança pelo Município do IPTU, cujo fato gerador se dá em razão da localização do imóvel e não da destinação econômica, mas, nesses casos, mesmo estando o imóvel em área urbana, em razão da atividade desenvolvida estariam sujeitos ao ITR, inteligência do DL 57⁄66. Ademais, é preciso compreender a dinâmica de organização espacial dos municípios brasileiros, os quais são eminentemente rurais, ressalvadas as metrópoles urbanas que são poucas se comparadas ao universo de mais de 5.500 municípios, a fim de, ad leg ferenda, criarmos uma legislação tributária que melhor se coadune com essa realidade, e, que de fato, promova desenvolvimento. Afinal, não há possibilidade de desenvolvimento sem investimento público, e não há investimento público se não houver poupança pública que permita esse investimento. Até lá, a apropriação
municipal dos valores arrecadados com ITR aponta como uma possível solução, inclusive, para o imbricamento existente entre ele e o ITR e as possibilidades de bitribução que são latentes. Inobstante, existam dificuldades institucionais na celebração dos convênios entre a União, por intermédio da Receita Federal, e os municípios interessados, ora em virtude das exigências estabelecidas para o credenciamento municipal, ora por ausência de interesse político municipal em viabilizar o convênio. Por fim, cumpre ainda registrar que para efeitos de IPTU considera-se imóvel o bem que assim se estabeleça, seja por acessão física ou natural. Inobstante, no caso do ITR, não há fato gerador quanto ao imóvel rural por acessão física, apenas por acessão natural e as áreas urbanizáveis ou de expansão urbana mesmo que localizadas fora das zonas definidas como tais, desde que previstas em lei municipal e o seu lote esteja previsto em loteamento aprovado pelos órgãos competentes, mesmo que não servidos pelos melhoramentos previstos no art. 32 do CTN, são designativos de áreas urbanas e, portanto,
também, estão apenas sujeitos a IPTU. REFERÊNCIAS. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal. ______________ Lei nº 5. 172, de 25 de Outubro de 1966 (Código Tributário Nacional). Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e Institui Normas Gerais de Direito Tributário Aplicáveis à União, Estados e Municípios. Diário Oficial [da] Republica Federativa do Brasil. Brasília, DF, v. 132, n. 152, p. 12037, 25 out., 1966. Seção 1. pt. 1. ______________ Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 140773 / SP. J. 08/10/1998, DJ 04-061999, p. 17; EMENT 1953-01/127. Rel. Min. Sydney Sanches; Resolução 09/2005 do Senado Federal. Disponível em: Acessado em: 01 Mai 2012. ______________ Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1112646⁄SP, Rel. Ministro HERMAN
BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26⁄08⁄2009, DJe 28⁄08⁄2009. Disponível em: Acessado em: 02 Mai 2012. ______________ Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 738.628⁄SP, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 12⁄05⁄2005, DJ 20⁄06⁄2005 p. 259. Disponível em: Acessado em: 02 Mai 2012. ______________ Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 492.869⁄PR, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 15⁄02⁄2005, DJ 07⁄03⁄2005 p. 141. Disponível em: Acessado em: 02 Mai 2012. ______________ Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Apelação Cível nº 42132/SP Em julgado em 30/03/2011, DOU em 05/04/2011, p.1138. Disponível em: Acessado em: 01 Mai 2012. FAVARETO, Arilson. As tentativas de adoção da abordagem territorial do desenvolvimento rural: lições para uma nova geração de políticas públicas. Campina
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Capítulo 19 TRIBUTAÇÃO INDUTORA COMO INSTRUMENTO DE PROMOÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS: O BENEFÍCIO FISCAL DE IPTU PARA ADOÇÃO DE CRIANÇAS CARENTES E OS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. Fernando Lucena Pereira dos Santos Júnior[231] Rodrigo Silveira Rabello de Azevedo[232] 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS. A efetivação dos direitos fundamentais é um objetivo cada vez mais desafiador para o Estado, cujo ônus e responsabilidades têm assumido dimensões notáveis, nas mais diversas áreas. Em face de tal realidade, tem o Estado buscado a participação dos particulares, mediante postura promotora de estímulos e desestímulos a condutas estrategicamente planejadas e desejáveis, como auxílio ao
seu dever-poder de consecução dos fins constitucionais. Nesse panorama, exsurgem as normas tributárias, outrora tão somente dirigidas à arrecadação, hoje tidas como verdadeiros veículos indutores de comportamento, seja na seara econômica, seja no campo social. Foi sob tal perspectiva que, na tentativa de incentivar pessoas a adotarem crianças carentes, ou, ao menos, desonerá-las após tal louvável iniciativa, se instituiu isenção fiscal de IPTU àqueles que enveredassem por tal caminho. Desnecessário tecer maiores considerações sobre a importância dessa inserção da criança, sob realidade marginalizada e sem perspectivas, em uma família que lhe proverá condições de um crescimento sadio, humano e digno. Mais que incentivo, tal tarefa resume em si o dever estatal de promoção de bem estar e dignidade de seus cidadãos, por meio de sua instituição mais primorosa: a família. Assim, após breve levantamento sobre a importância da adoção e da família no contexto dos
direitos fundamentais da criança e do adolescente, adentraremos na discussão sobre a possibilidade e viabilidade de uma norma tributária assumir tal finalidade. Para tanto, realizaremos uma análise da matéria sob a óptica constitucional, com pauta tanto no Sistema Tributário Nacional, como em aspectos doutrinários e jurisprudenciais. Por fim, tecermos no último item, opinião crítica sobre a matéria, que merece cada vez mais atenção no campo dos assuntos e deliberações estatais. 2. A PROBLEMÁTICA DA EFICÁCIA DOS DIREITOS SOCIAIS. Há muito que existe uma preocupação central compartilhada por diversos juristas, com especial relevância entre os constitucionalistas, referente à eficácia dos direitos sociais e no tocante à possibilidade de sua prestação. As peculiaridades desta segunda dimensão dos direitos fundamentais constituem um objeto de estudo
necessariamente vinculado com a própria concretização das constituições em que, os mesmos, restam programados. Diferentemente do que ocorre com os direitos fundamentais de primeira dimensão (aqueles que têm uma natureza negativa, ou seja, garantem que o Estado não invada a esfera jurídica do cidadão), as normas de direitos fundamentais sociais, ou de segunda dimensão, prescrevem condutas de atuação positiva do Estado. Ou seja, conforme Sarlet (2006, p.293), se efetivam, via de regra, através de uma prestação de natureza fática ou normativa. Assim, podemos sintetizar os direitos sociais como sendo aqueles que tenham por objetivo alguma prestação por parte do ente estatal, podendo ter relação com alguma melhoria, distribuição, redistribuição ou criação de bens essenciais ou, também, a própria intervenção estatal nas relações entre privados que venham a ferir direitos constitucionalmente previstos, dentre outros. Os direitos sociais rompem com a mera simplificação da proteção à liberdade e igualdade para
partir para um plano em que se visa a consecução prática de tais programas normativos. O já mencionado doutrinador Ingo Sarlet (2006, p.303) ensina que os direitos sociais prestacionais, em geral, são positivados vaga e abertamente, de maneira que o legislador tenha liberdade de conformação na tarefa de concretizá-los. Observemos, neste sentido, a importante característica da eficácia vinculante dos direitos fundamentais, sendo esta um importante adendo quando nos referimos à vinculação dos poderes públicos, incluindo o poder legislativo, à Constituição. Assim, ainda com relação a retromencionada força vinculante, conforme a formulação de Krüger (SARLET, 2006, p.383), a concepção atual rompe com a ideia de tratarmos os direitos fundamentais na medida da lei, para passarmos a compreender que as leis encontramse nas medidas dos direitos fundamentais. Independente de quão difícil seja a efetivação dos direitos sociais em um sentido prático, a defesa de tais direitos é obrigação imposta pela Constituição. Canotilho (2008, p.51), afirma que a problemática dos
direitos sociais consiste em “levarmos a sério” a defesa e reconhecimento constitucionais de tais direitos. Ou seja, o direito à educação, à saúde, à alimentação, entre outros, devem ser perseguidos sem óbice a fins de uma real vivência democrática e constitucional. 3. DIREITOS FUNDAMENTAIS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. É sabido que encontramos vários direitos fundamentais implícitos no texto constitucional e fora dele, além dos expressamente arrolados na Constituição Federal de 1988. Sendo tal entendimento pacificado e confirmado pelo Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento da ADIn 939-7/DF (RTJ 150/68), avalizando o princípio da não-taxatividade. A partir dessa compreensão e adentrando na matéria específica, ora trabalhada, vislumbramos no art. 227 da lei maior, além das disposições em consonância com direitos fundamentais arrolados, a óbvia fundamentalidade do referido dispositivo em seu
específico direcionamento às crianças e adolescentes e a vinculação do Estado à proteção de tais figuras e suas esferas de direitos individuais. Senão vejamos: Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Observemos que o dispositivo retro é, incontestavelmente, dotado de carga de fundamentalidade máxima. O legislador constituinte preocupou-se, inclusive, em conceder a tal núcleo de proteção a “absoluta prioridade” prescrita no texto, denotando, assim, ainda mais importância à tutela dos direitos da criança e do adolescente. Com base no dispositivo constitucional transposto, também, denotamos a importância da entidade familiar na proteção dos direitos em questão. É de ponderarmos ainda que o fortalecimento do núcleo e a
garantia da convivência familiar, além de sua relevância para a formação do impúbere, são, também, direitos que exigem preservação. A adoção, neste contexto, mostra-se como um meio eficaz, facultado e regulado pelo Estado, de proteção da criança e do adolescente a partir de sua inserção em um novo núcleo familiar, diverso de seu consanguíneo, a fins de viver uma vida normal e ter seus direitos e garantias protegidos ou objetivados. Valemonos da lembrança de que por vezes, na realidade prática, encontramos situações completamente destoantes com as pretensões supra-apresentadas, mas não podemos negar as intenções a que a adoção se propõe e os frequentes casos de êxito de tais relações familiares. Partindo dessa percepção, o Estado assume a obrigação de incentivar todos os meios em direito admitidos para a remodelagem e reinserção dos menores em condições de vida familiar digna, utilizando, para tal, de possíveis meios e estímulos visando o sucesso da intenção. Tomando por base o retro afirmado, as
políticas tributárias indutoras mostram-se como importantes instrumentos, facultados ao Estado, para a consecução de diversos de seus objetivos. 4. NORMAS TRIBUTÁRIAS INDUTORAS. Com
relação
à
tributação
indutora,
primeiramente, destaquemos a concepção, hoje consolidada, das duas facetas da tributação (NABAIS, 2008, p. 3-36 e p. 401-ss): a fiscalidade, como representação da transferência de recursos da economia privada para os Estados, e a extrafiscalidade, que diz respeito à utilização de mecanismos com repercussão econômico-financeira para a indução dos agentes econômicos a comportamentos mais desejáveis em face do interesse público (SEIXAS FILHO, 1989, p. 114). Tratam-se, os incentivos ou desincentivos fiscais, de instrumentos financeiros destinados a estimular ou desestimular os comportamentos dos agentes econômicos ou da sociedade em geral. Assim, atuam para que os agentes econômicos ou sociais, dentro da liberdade
de decidirem como atuar, exerçam determinados comportamentos que acabarão auxiliando na conformação dos objetivos econômicos e sociais do sistema jurídico (ELALI, 2006, p. 560-567), uma alternativa para a direção estatal. É pontual, acerca do assunto, a lição de Schoueri (2005, p. 206): As normas tributárias indutoras atuam, também, no sentido de incentivar contribuintes que adotem comportamentos desejados pelo legislador. Vale-se o legislador da premissa de que os contribuintes buscam economizar tributos, para abrir uma válvula, pela qual a pressão tributária é aliviada, de modo dosado. Seria, como diz Bellstedt, uma espécie de elusão tributária guiada à distância, com efeitos pré-calculados.
No dizer do professor Rosembuj (2001, p. 237), os incentivos e os prêmios em direito tributário são benefícios fiscais, verdadeiras ‘sanções positivas’, na acepção de Norberto Bobbio, dedicadas a promover situações que o legislador entende dignos de tutela, isto é, “Los benefícios fiscales integran el derecho promocional y, por tanto, no están dirigidos a satisfacer el interés
fiscal, ejercitando una actividade de gasto público que no de deber de contribuición.” No presente trabalho, acentuaremos a análise à iniciativa tributária de incentivo social, mais precisamente voltada à adoção de crianças e adolescentes carentes, que, prima facie¸ já são vítimas justamente da assimetria social e ineficácia estatal de provê-las do bemestar, condições dignas e uma vida saudável, daí a propriedade do termo carente. 5. ANÁLISE DA LEGISLAÇÃO: LEI MUNICIPAL Nº 117/98 DA CIDADE DE NATAL. Trata-se de lei municipal instituída na cidade de Natal-RN, de nº 117/94, cujo conteúdo ora transcrevemos: O presidente da Câmara Municipal do Natal, no uso das atribuições que lhes são conferidas, de acordo com o art. 22, inciso XVI, da Lei Orgânica do Município de Natal, PROMULGA a seguinte lei: Art. 1º Fica isento do pagamento de IPTU incidente sobre imóvel de sua propriedade em que residir o contribuinte que venha adotar, legalmente, criança
carente. Art. 2º O mesmo benefício será concedido ao contribuinte que assumir a guarda legal de criança carente enquanto perdurar essa guarda. Art. 3º A isenção prevista no Art. 1º será requerida após a adoção e com a comprovação do fato, enquanto a isenção prevista no Art. 2º deverá ser requerida com a prova da guarda, devendo ser renovada anualmente, até o terceiro mês do exercício fiscal. Art. 4º Essa lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.
O conteúdo é claro, entretanto, sobejam-lhe discussões que objetivamos ponderar no presente trabalho. Iniciando, pois, da análise de sua constitucionalidade. 5.1 Da (in)constitucionalidade da norma. A Constituição é, sem dúvida, a base do sistema jurídico, englobando e concretizando valores que marcam as diferenças próprias de um Estado dotado de desigualdades, de modo que acaba por equacionar uma postura proativa e fomentadora, em prol do desenvolvimento (ELALI, 2007, p.43).
Entretanto, em face do regime federativo adotado, não podem as iniciativas dos entes federados serem desordenadas, de modo a contraporem-se ou colidirem umas às outras. Nesse sentido, a Carta determinou-lhes dever coerência, distribuindo competências e limites de atuação. Frente a tal circunstância, relevante observarmos se a referida lei acabou por desobedecer aos limites constitucionalmente impostos, eivando-se de incompetência material ou formal. Desde já, adiantemos que, sob ambos os prismas, a lei não há de vir a ruir. Quanto à matéria, o art. 23 determina que é competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios cuidar da saúde e assistência pública(inciso II) e combater as causas da pobreza e os fatores de marginalização, promovendo a integração social dos setores desfavorecidos (inciso X). Se tais atos poderão ser viabilizados por meio de tributos, a resposta é igualmente positiva, eis que a competência tributária sobre os impostos é comum, ou
concorrente, entre os entes federativos (Art. 145, I), ao passo que, quanto ao IPTU, cabe justamente ao Município a sua disciplina (Art. 156). No que se refere à isenção, a regra é a mesma, embora se exija complementarmente a especificidade da lei (Art. 150, § 6º). Logo, materialmente cumpridos os requisitos constitucionais. Quanto à formalidade, no que tange à competência da Câmara Municipal, ou seja, parlamentar, na instauração do processo legislativo em tema de direito tributário (e benefícios fiscais), o Supremo Tribunal em diversos precedentes usou em acatá-la. A premissa é de que “o ato de legislar sobre direito tributário, ainda que para conceder benefícios jurídicos de ordem fiscal, não se equipara – especialmente para os fins de instauração do respectivo processo legislativo – ao ato de legislar sobre o orçamento do Estado[233]”, de modo que, não atrairia a competência ao Chefe do Executivo (aplicação do caput do Art. 61, afastada a previsão do § 1º, II, “b” do mesmo artigo).
Dessa forma, não há que falarmos em inconstitucionalidade pelo vício da incompetência também pelo viés formal, devendo-se, agora em um segundo passo, verificar seu ajuste aos princípios tributários objetivamente aplicáveis, como da isonomia, capacidade contributiva e respeito à Ordem Econômica. 6. CONSTITUCIONALIDADE PRINCÍPIOS TRIBUTÁRIOS ECONÔMICA.
EM FACE DOS E DA ORDEM
Primeiramente, não é difícil perceber que inexiste ofensa à igualdade tributária. Observando que tal princípio possui natureza formal, ou seja, é definido dentro de critérios do legislador, que tenham pertinência entre o meio e o fim. As questões que podem ser suscitadas são: “igualdade em quê?” e “igualdade para quê?” (ÁVILA, 2008, p. 97-99). No caso, a discriminação deve se ater a um comportamento objetivo, não arbitrário e que não defina distorção concorrencial. Ávila (2008, p. 97-99) ensina que a
igualdade, na forma de neutralidade da tributação: [...] impede o tratamento injustificável, assim considerado aquele decorrente de uma medida de comparação que não mantenha relação de pertinência fundada e conjugada com a finalidade que justifica sua utilização, ou o tratamento baseado em medida de comparação ou finalidade cujo uso seja vedado pela Constituição.
Dessa forma, a discriminação fiscal existe quando se emprega uma discriminação pejorativa e irrelevante, isto é, desproporcional e arbitrária (RAAD, 1986, p. 7-15). No caso, a lei tributária em comento imprime o caráter da neutralidade ativa, ou seja, pugna pela postura comissiva (e diferenciada) em face de contribuintes em situações díspares. Dessa maneira, tratase de tentativa normativa de alcançar condições iguais a pessoas econômica e socialmente diferentes: uma medida de comparação com relação de pertinência fundada e conjugada com a finalidade que justifica sua utilização. Por outro lado, a finalidade da discriminação é proporcional e coligada aos valores constitucionais, eis
que temos como fundamento do Estado Brasileiro a dignidade da pessoa humana (Art. 1º, III) e como objetivo a erradicação da pobreza e da marginalização e a redução das desigualdades sociais e regionais (Art. 3º, III). Logo, na lei em análise, sobeja pertinência às perguntas destacadas por Ávila. Quanto à capacidade contributiva de quem vai adotar, ou seja, se teria capacidade econômica para fins de incidência tributária da exação municipal, tal questão soa irrelevante, já que quando se tem em questão uma criança carente, que, caso continuasse nessa circunstância, provavelmente sequer capacidade econômica teria. Por fim, em relação aos princípios da ordem econômica, esses restam sobejamente respeitados. Tal medida favorece ipso facto a inserção da criança carente no mercado de trabalho, eis que, pelo menos em tese, inserida em uma família, haverá de ter maiores oportunidades de obter uma educação de qualidade, participação econômica e um futuro em potencial. 7. A POSIÇÃO DOS TRIBUNAIS ACERCA DA LEI
ANALISADA. A referida lei foi objeto de vários processos judiciais no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, tendo sido, à unanimidade deles, julgada constitucional. De acordo com aquela corte, em suma, a isenção objeto da Lei Promulgada nº 117/94, do Município de Natal, é constitucional[234], eis que i) observa o Art. 150, § 6º da Constituição[235]; ii) teria a referida iniciativa parlamentar natureza concorrente com a do chefe do executivo, por não ser o caso de aplicação do art. 60, § 1º, II, “b”, da Constituição Federal[236]; iii) estimula um princípio expresso na Constituição, artigo 227, inciso VI do parágrafo 3º, que é a ampla proteção à criança e ao adolescente[237], eis que “tal dispositivo aponta para a necessidade de adoção de medidas pelo próprio poder público no sentido de estimular, através, inclusive, de incentivos fiscais, tal como é classificada a isenção, que a sociedade promova a convivência familiar da universalidade das crianças e adolescentes, em especial daqueles que se encontrem em situação de
carência”. Os referidos julgados, que foram por vezes levados até o Supremo Tribunal Federal, não tiveram análise da Corte Máxima, porquanto se referiam a ofensa reflexa ao texto da Constituição (RTJ 120/912 – RTJ 132/455 – RTJ 161/284), muito embora sob a afirmação de que se reveste de plena legitimidade jurídicoconstitucional a adoção, no caso, da técnica da motivação “per relationem[238]” (HC 69.438/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO – HC 69.987/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.). Já no RE 626354, de relatoria do Min. Marco Aurélio, foi negado seguimento sob razão de que o assunto se revela interpretação de normas estritamente legais, não ensejando campo ao acesso do Supremo. Assim, retemo-nos às disposições da Corte Norte-rio-grandense, que reiteradamente aceitou a constitucionalidade da referida lei, assim como o fazemos, conforme as constatações acima transcritas. 8. CONSIDERAÇÕES FINAIS.
Conforme reiteradamente afirmado no início do presente trabalho, existe uma patente obrigação por parte das entidades estatais de tutela dos direitos fundamentais sociais. Dentre estes, restam inseridos os direitos da criança e do adolescente, tidos como de tutela prioritária, visando à garantia de dignidade dos menores. Ainda, vimos que a adoção é utilizada como uma forma de inserir os menores abandonados em um núcleo familiar (também tido como responsável pelas garantias dos direitos da criança e do adolescente) e assegurar as melhores condições de vida sob a ótica do interesse do menor. Neste sentido, o Estado procura (e deve procurar) meios de facilitar e incentivar práticas que o interessem na consecução dos seus objetivos, seja através de campanhas, políticas públicas, políticas tributárias, etc. No presente estudo, abordamos a ideia de políticas tributárias, através de normas tributárias indutoras, sob uma ótica de incentivo à efetivação dos
direitos fundamentais sociais da criança e do adolescente carente, com base em uma polêmica lei promulgada na cidade de Natal. Ou seja, analisamos a indução, através de tributos, de um comportamento ansiado pelo Estado e estimulado através da isenção tributária. A constitucionalidade, pois, no seu viés formal, foi comprovada, e, sua viabilidade, sob a óptica dos valores e fins constitucionais, destacada à altura, já que não há dúvida que incentivar ações desejáveis e hábeis a dar cumprimento aos direitos fundamentais trazidos na Carta (que tanto carecem de efetividade, sob aplicação prática reiteradamente questionada), é uma máxima louvável. É de se esperar, por fim, que tal iniciativa contagie governantes e parlamentares, para que passem a enxergar na norma tributária mais que um expediente de enriquecimento estatal. A criação de normas tributárias indutoras, no seu caráter social, possibilitará outra e tão importante espécie de enriquecimento, o da dignidade da pessoa humana, no caso, das nossas necessitadas crianças.
REFERÊNCIAS. ÁVILA, Humberto. Teoria da Igualdade Tributária. São Paulo: Malheiros, 2008 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Distrito Federal: 1988. CANOTILHO, J.J. Gomes. Estudos sobre direitos fundamentais. 2.ed. Coimbra: Coimbra, 2008. CARBAJALES, Mariano. El Estado regulador – Haciaunnuevo modelo de Estado. Buenos Aires: Abaco, 2006. ELALI, André. Incentivos Fiscais, Neutralidade da Tributação e Desenvolvimento Econômico. In: Incetivos fiscais – Questões pontuais nas esferas federal, estadual e municipal. São Paulo: MP Editora, 2007. ______________ Tributação e Regulação Econômica – um exame da tributação como instrumento de regulação econômica na busca da redução das desigualdades
regionais. São Paulo: MP, 2006 MONCADA, Luís S. Cabral de. Direito Econômico. 4. ed. Coimbra: Coimbra Editora, 2003 NABAIS, José Casalta. Direito Fiscal. São Paulo: Almedina, 2008. RAAD, Kees Van. Nondiscrimination in International Tax Law. The Netherlands: Kluwer Law and Taxation, 1986 ROSEMBUJ, Tulio. Derecho Barcelona: El Fisco, 2001
Fiscal
Internacional.
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 6.ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. SEIXAS FILHO, Aurélio Pitanga. Teoria e Prática das Isenções Tributárias. Rio de Janeiro: Forense, 1989.
Capítulo 20 O REGIME JURÍDICO DO IMPOSTO SOBRE A TRANSMISSÃO DE BENS IMÓVEIS E DIREITOS A ELE RELATIVOS Diego Fernandes Guimarães[239] 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS. De modo a evitar conflito de competência entre Municípios e Estados, a Constituição Federal de 1988 delimitou, de modo preciso, a competência tributária municipal, deferindo-lhe o “poder impositivo”, dentre outros, sobre a transmissão "inter vivos", a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição (ITBI). Se é certo, com Ataliba (2011), que a hipótese de incidência é uma fórmula hipotética descrita na norma
legal, é fundamental analisar, estratificadamente, o tipo legal, necessário à delimitação da competência impositiva e, consequentemente, da própria legitimidade do nascimento da relação jurídica tributária. Adiante, após breve exposição sobre a evolução histórica da tributação incidente sobre a transmissão da propriedade imobiliária, analisaremos, passo a passo, os elementos objetivo, temporal, pessoal e quantitativo do ITBI, abstendo-nos, porém, de examinar as imunidades constitucionais específicas em relação a esse imposto, em face dos objetivos deste trabalho. 2. HISTÓRICO DO ITBI. No plano legislativo brasileiro, a primeira previsão da transmissão de propriedade imobiliária como hipótese de incidência tributária se deu no art. 19 da Lei nº 1507, de 26 de setembro de 1867, norma de natureza orçamentária que autorizava o Governo imperial a editar regulamento uniformizador das regras para a cobrança dos impostos sobre a transmissão da propriedade e usufruto
de imóveis, móveis e semoventes, por título oneroso ou gratuito, inter vivos ou causa mortis, que deveriam compreender e substituir, entre outros, a “taxa de heranças e legados” e a “siza dos bens de raiz”, a demonstrar que tais exações já eram exigidas de forma assistemática. No que interessa aos limites deste trabalho, é importante destacar que a Constituição Federal de 1946 conferia aos Estados-membros a competência tributária para “decretar impostos” sobre a transmissão de propriedade causa mortis(art. 19,I) e sobre transmissão de propriedade imobiliária inter vivos e sua incorporação ao capital de sociedades (art. 19, II), distribuídos pela Emenda Constitucional nº 5, de 21.11.1961, respectivamente, às competências estadual e municipal, mas reunificados pela Emenda Constitucional nº 18/65. Com base nesta autorização constitucional, foi editada a Lei nº 5172/66, o Código Tributário Nacional (CTN) que, em seus arts. 35 a 42, delimitava-lhes os aspectos gerais do imposto que incidia sobre a transmissão imobiliária, quer fundada em negócio jurídico inter vivos ou em causa mortis.
Mantido este arquétipo constitucional no art. 24, I da Constituição de 1967 e no art. 23, I da Emenda Constitucional nº 01/69, foi reorientado pela Constituição de 1988 (CF-88), separando-se as duas hipóteses de incidência, de modo que aos Estados restou atribuída a competência impositiva sobre a “transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos”, enquanto que aos Municípios, ampliada a sua competência, agora abrangendo “a transmissão inter vivos, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição”. A despeito dessa nova previsão constitucional, o Código Tributário Nacional não foi modificado no que tange aos impostos incidentes sobre a transmissão de propriedade imobiliária, fazendo a doutrina defender, majoritariamente, a recepção dos arts. 35 a 42 da Lei nº 5172/66, com status de lei complementar, exigida pelo art. 146, III, “a” da Constituição de 1988, por ser o ITBI imposto discriminado na Carta, a exigir a definição de seus fatos
geradores, bases de cálculo e contribuintes. Com a devida vênia à doutrina majoritária, entendemos que a recepção constitucional, fenômeno de criação abreviada do direito, pressupõe que a norma préconstitucional seja materialmente compatível com a nova ordem constitucional, sob pena de simples revogação. As tentativas de “salvar” o texto do CTN através de interpretações restritivas, além de implicarem na criação de uma nova regra jurídica (lextertia) frontalmente dissociada do art. 156, II da CF-88, esbarram no conjunto de princípios inspiradores do sistema constitucional tributário que privilegiaram o fortalecimento da autonomia municipal no âmbito do pacto federativo, de modo a não se admitir a pretendida novação. Saliente-se que, na nossa ótica, a revogação tácita dos arts. 35 e seguintes do CTN não seria capaz de obstar o exercício da competência tributária por parte dos Municípios, na medida em que a própria Constituição Federal disciplina o mecanismo de suprimento dessa omissão no art. 24, §3º,admitindo o exercício da competência legislativa plena, concretamente já efetuada
no caso da omissão de norma geral que cuide do imposto sobre propriedade de veículos automotores (v.g. AI 167.777-AgR, Rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 43-1997, Segunda Turma, DJ de 9-5-1997). Seja qual for o resultado, é certo que a exação em epígrafe só poderá ser instituída e, consequentemente, exigida nos estritos limites do art. 156, II da Constituição Federal, seja através da interpretação conforme dos arts. 35 e ss. do CNT, seja através do exercício da competência legislativa plena municipal, razão porque, nos debruçaremos adiante sobre o arquétipo constitucional do imposto sobre a transmissão de bens imóveis e direitos a ele relativos (ITBI). 3. ANÁLISE DA REGRA-MATRIZ DE INCIDÊNCIA DO ITBI. No que tange ao ITBI, positiva a Constituição a seguinte regra-matriz, resta claro que o fez utilizando-se de institutos e conceitos de direito privado cuja identificação é imprescindível para definir a amplitude
daquela competência[240] e, consequentemente, a própria caracterização do fato gerador (art. 110, CTN) Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: [...] II - transmissão "inter vivos", a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição;
3.1 ELEMENTO OBJETIVO: TRANSMISSÃO “INTER VIVOS”, POR ATO ONEROSO. De um lado, tem-se como elemento objetivo a transmissão de bens imóveis e de direitos reais a estes relativos e, de outro, a cessão de direitos à aquisição de bens imóveis, àquela equiparada para fins de incidência tributária. Vejamos. Etimologicamente, transmissão é o ato ou efeito de transmitir ou transferir direitos. Logo, a transmissão de direitos reais imobiliários se caracteriza pela alteração do titular da propriedade ou de outro direito real sobre imóveis, através de uma intermediação
subjetiva que caracterize uma forma de aquisição derivada, excluídas, para efeitos de incidência do ITBI, as transmissões causa mortis (princípio da saisine e sucessão). Com efeito, atinente ao direito de propriedade, leciona Tavares (2008, p. 9): Não se pode desprezar, em subserviência ao sentido técnico subjacente, que a transmissão jurídica de propriedade é genuinamente ligada à forma de aquisição derivada, onde o antigo proprietário, mediante um negócio jurídico de índole essencialmente consensual, transmite o direito ao novo proprietário, de forma direta ou indireta, voluntária ou involuntária, ou, na forma da terminologia assente, a título universal ou a título singular.
Cabe destacar, desde logo, que a doação de bem imóvel[241], por implicar na transmissão gratuita da propriedade, não se subsume ao arquétipo constitucional do ITBI, qualquer que seja a sua espécie, simples – negócio jurídico gratuito – ou com encargo – negócio jurídico oneroso –, uma vez que o constituinte retirou da competência tributária municipal a transmissão imobiliária decorrente de doação, independentemente de
sua onerosidade no art. 155, I, CF-88, ao afirmar que “compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos”. Sob outra ótica, é exatamente pela inexistência de transmissão de direito real imobiliário que não incide ITBI na usucapião, porquanto se trata de forma de aquisição originária da propriedade em virtude da posse continuada e duradoura, atendendo-se aos demais requisitos da modalidade de prescrição aquisitiva[242]. O mesmo raciocínio se aplica aos institutos da retrocessão e da desapropriação. A desapropriação é, sucintamente, a supressão da propriedade por ato estatal, pautada na supremacia do interesse público sobre o privado. Salienta Giannetti (2010, p. 393) que: A aquisição da propriedade pela desapropriação é originária. Com efeito, não há na desapropriação quem transmita a propriedade, sendo, por conseguinte, bastante em si mesma para assegurar, em prol do Estado, o domínio de certo bem, independentemente de qualquer vinculação com o título jurídico do então proprietário. (...) Tudo isso demonstra a ausência de transmissão na
aquisição de um imóvel pela desapropriação, motivo suficiente para fundamentar a não incidência do ITBI nas aquisições de propriedade imobiliária em virtude de desapropriação.
Já a retrocessão é “o direito que tem o expropriado de exigir de volta o seu imóvel, caso o mesmo não tenha o destino para que se desapropriou” (DI PIETRO, 2011, p. 188). O instituto da retrocessão é cercado de divergências, haja vista que o art. 519 do Código Civil vigente estabelece tão somente o direito de preferência em caso de tredestinação ilícita e o art. 35 do Decreto-Lei nº 3365/41 prevê que “os bens expropriados, uma vez incorporados à Fazenda Pública, não podem ser objeto de reivindicação”, de modo que, essencialmente, a retrocessão provocaria a devolução do imóvel desapropriado à titulares privados, garantindo-se o direito de preferência ao antigo proprietário. Assim, a retrocessão seria mero ato ou procedimento administrativo que desfaria anterior desapropriação, levando as partes ao status quo anterior a esta, de forma que não haveria transmissão de propriedade propriamente dita, deixando de caracterizar
fato gerador do ITBI. A seu turno, Harada (2010, p. 179-180) defende que é “indiscutível a incidência do ITBI na retrocessão, pois há ocorrência de fato gerador da obrigação tributária, que é a transmissão da propriedade pelo poder público expropriante” e cita o enunciado da súmula 111 do Supremo Tribunal Federal (STF)[243]. Destaque-se, porém, que posteriormente à edição do enunciado, o próprio Tribunal chegou a julgar contrariamente à súmula: Repetição de indébito. Não é devido o imposto de transmissão sisa, nos casos de retrocessão, quando se verifica simples retorno a condição inicial da propriedade. Recurso conhecido e não provido. (RE 57246, Relator(a): Min. ADALÍCIO NOGUEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 31/05/1966, DJ 19-04-1967).
Outra questão polêmica acerca da caracterização da transmissão se situa na hipótese de alteração da titularidade de direito real (normalmente, a propriedade) derivada de expropriação judicial. Em sede de execução por quantia certa, e no
regime processual instaurado após o advento da Lei nº 11382/2006, existem três meios de expropriação do patrimônio do executado para a satisfação do crédito, quais sejam, a adjudicação (art. 685-A, CPC), a alienação particular (art. 685-C, CPC) e a alienação judicial (art. 686), também chamada alienação em hasta pública. A adjudicação é “a assinação do bem penhorado ao exequente, ou a quem de direito, pelo juiz” (MARINONI, 2008, p. 667), e não se confunde com a dação em pagamento, por se tratar de ato processual executivo que implica a transferência coativa do bem pela via judicial. Já a arrematação é o ato processual final da alienação judicial, significando a “aquisição em hasta pública de determinado bem” (MARINONI, 2008, p. 675). A seu turno, a alienação particular não tem natureza jurídica de compra e venda, por se tratar de um procedimento executivo controlado pelo Estado-juiz, a despeito de realizado pelo exequente ou por corretor credenciado perante a autoridade judiciária. Em todas essas hipóteses, a nosso ver, não se tem intermediação subjetiva, geralmente associada a
negócios jurídicos, mas coerção estatal substitutiva. Some-se ao caráter originário da aquisição, o próprio regime jurídico da responsabilidade tributária por sucessão (art. 130, parágrafo único, CTN) e a ausência de garantia dos vícios redibitórios e da evicção ao adquirente de bens de hasta pública, a evidenciar que a propriedade é obtida sem a intermediação subjetiva. Em artigo que trata especificamente sobre a arrematação judicial, frisou Tavares (2008, p. 9) que: Em tempo, surgiu uma terceira corrente teórica, hoje prevalecente, reconhecendo o caráter nimiamente público da alienação judicial, no sentido da mesma corresponder a um ato de império do Estado, de natureza jurisdicional executiva. O próprio órgão jurisdicional, no exercício de sua função, transfere a título oneroso o direito do executado para outrem. (...) Em outros termos, consiste num ato de desapropriação forçada, ou seja, num ato processual de soberania do Estado que, por intermédio do Poder Judiciário, expropria os bens do executado e propicia a aquisição, a título oneroso, a terceira pessoa, da propriedade regularmente constrita.
Não é demais lembrar que o próprio Superior Tribunal de Justiça (STJ) já se pronunciou acerca do caráter de aquisição originária da propriedade, na
hipótese de arrematação judicial, veja-se: “[...] 2. A arrematação de bem em leilão caracteriza-se como aquisição originária da propriedade, liberando-o dos ônus até então incidentes. Precedentes do STJ. [...] (REsp 1038800/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 20/08/2009, DJe 27/08/2009)” Desta maneira, causa espécie o entendimento reiterado pelo próprio STJ, no sentido de que é devido o ITBI na “aquisição” de propriedade em hasta pública, compreensão que, a nosso sentir, se baseia na premissa equivocada de que o registro imobiliário constituiria o fato gerador do ITBI, e não, como adiante exporemos, constituiria mero aspecto temporal, daquele dependente: [...] 1. A arrematação representa a aquisição do bem alienadojudicialmente, considerando-se como base de cálculo do ITBI aquelealcançado na hasta pública. (Precedentes: (REsp 863.893/PR, Rel.Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, DJ 07/11/2006; e REsp2.525/PR, Rel. Ministro ARMANDO ROLEMBERG, PRIMEIRA TURMA, DJ25/06/1990).
[244]
Por último, mister destacar a polêmica questão da realização do fato gerador do ITBI, nos casos de anulação do negócio jurídico ou da própria escritura de compra e venda. Já vimos defendendo nesse tópico que a transmissão do direito real imobiliário é um elemento objetivo ou nuclear da caracterização do fato gerador do ITBI, devendo a mudança da titularidade decorrer de uma intermediação subjetiva que caracterize uma forma de aquisição derivada, em geral associada a negócios jurídicos, tais como a compra e venda, dação e pagamento, permuta, etc, os quais, sob o prisma civil, precisam atender aos requisitos de validade previstos no art. 54 e não incorrer nos vícios do art. 166, ambos do Código Civil vigente. Como se não bastasse, não é incomum a realização de negócios jurídicos translativos de domínio como forma de fraudar a ordem jurídica, através de simulações ou lavagem de dinheiro e capitais, visando a atingir finalidades ilícitas. Nas situações de invalidade ou de ilicitude do
negócio jurídico, a solução passa pela aplicação do art. 118[245] do CTN, vez que a relação jurídica tributária será constituída através da realização, no mundo fático, da transmissão onerosa de direito real imobiliário, ainda que, adjacentemente, essa transmissão esteja contaminada por vícios de nulidade[246] ou de ilicitude. Citando Daniel Zannetti Marques Carneiro, explica Paulsen (2010, p. 919): Para fins tributários, a incidência fiscal toma em consideração apenas o aspecto econômico do fato jurídico, não se questionando sobre a licitude ou ilicitude dos aspectos direta ou indiretamente relacionados ao fato gerador da obrigação, característica esta a que se identifica como ‘princípio do non olet’. (...) longe de implicar condescendência ou incentivo à ilegalidade, representa a concretização de superiores postulados principiológicos da tributação.
3.1.2 Elemento objetivo: transmissão de bens imóveis e de direitos reais a estes relativos. A transmissão, tal como acima explicada, deve ter como objeto bens imóveis, isto é, implicitamente, a sua propriedade ou os demais direitos reais aqueles
relativos. O direito real é uma relação jurídica estabelecida em face de um bem corpóreo, autorizando o seu titular a extrair, de modo exclusivo e contra todos, as suas utilidades. Como se vê, o rol de direitos reais está taxativamente previsto na lei, particularmente[247] no Código civil[248], quais sejam, a propriedade, a superfície, as servidões, o usufruto, o uso, a habitação, o direito do promitente comprador do imóvel, o penhor, a hipoteca, a anticrese, a concessão de uso especial para fins de moradia e a concessão de direito real de uso, abstendo-se aqui de pormenorizar-lhes o conteúdo, limitando-nos a explicitar que a transmissão de quaisquer destes direitos reais, que incidam sobre bens imóveis, a exceção do penhor, da hipoteca e da anticrese, por se tratarem de direitos reais de garantia, é apta a constituir fato gerador do ITBI. 3.1.2.1 A questão que merece reflexão se refere ao compromisso de compra e venda e de sua natureza
jurídica. Tartuce (2008, p. 396-398) sintetiza a questão: Então, podemos concluir que, na vigência do Código Civil de 1916 e antes da existência de leis esparsas que atribuíram ao promissário comprador o direito de adjudicação, a natureza do compromisso irretratável poderia ser considerada a de pré-contrato. Entretanto, após a vigência do Decreto-lei 58/1937, das leis que o sucederam, e principalmente do Código Civil de 2002, sua natureza como negócio definitivo se acentuou. Por fim, deve-se dizer que, se o compromisso de compra e venda de imóvel for retratável, sua natureza pré-contratual mantém-se intacta. (...) Em suma, o registro não é obrigatório, sendo apenas um fator de eficácia do negócio e de categorização jurídica. Como já dito, não havendo o registro do compromisso de compra e venda, haverá um contrato preliminar, cujos efeitos são obrigacionais, gerando uma obrigação de fazer. Com o registro, surge o direito real de aquisição de natureza definitiva, com efeitos reais, e gerando uma obrigação de dar.
Desta forma, o simples compromisso de compra e venda não tem o condão de transferir a propriedade, não se realizando o fato gerador do ITBI[249], raciocínio que, no entanto, difere do caso de promessa irretratável de compra e venda registrada,
verdadeiro direito real constante do rol do art. 1225, do Código Civil. Neste sentido: IMPOSTO SOBRE A TRANSMISSAO DE BENS IMÓVEIS E DE DIREITOS A ELES RELATIVOS. FATO GERADOR. O compromisso de compra e venda e a promessa de cessão de direitos aquisitivos, dada a sua natureza de contratos preliminares no direito privado brasileiro, não constituem meios idôneos a transmissão, pelo registro, do domínio sobre o imóvel, sendo, portanto, inconstitucional a norma que os erige em fato gerador do imposto sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a eles relativos. [...] (Rp 1211, Relator(a): Min. OCTAVIO GALLOTTI, Primeira Turma, julgado em 30/04/1987, DJ 05-06-1987 PP-11112 EMENT VOL01464-01 PP-00015)
3.1.3 Elemento objetivo: cessão de direitos à aquisição de bens imóveis. O art. 156, II da CF-88 adicionou como elemento objetivo a cessão de direitos à aquisição (transmissão) de bens imóveis como hipótese de incidência do ITBI, de modo a abarcar a atual realidade em que as cessões de direitos configuram seguros
instrumentos de circulação econômica. Mas, frise-se, é necessário que a cessão de direitos tenha a aptidão de transmitir direitos reais imobiliários, o que não acontece na cessão de direito de lavrar ou pesquisar jazidas minerais, nem no caso de promessa de cessão de direitos relativos às transmissões: ESCRITURA DE CESSÃO DE DIREITO DE LAVRAR JAZIDAS MINERAIS. Indevido o imposto de transmissão de propriedade inter-vivos, uma vez que na cessão, não se opera a alienação de domínio.[250] DIREITO DE PESQUISA - CESSÃO - IMPOSTO DE TRANSMISSAO INTER-VIVOS. Constituindo o direito de pesquisa mera concessão ou autorização do proprietário de minas, que e o estado, não há, no caso, de transmissão de direito, incidência do imposto inter-vivos por não existir transmissão de direito real.[251] TRIBUTÁRIO - ITBI - PROMESSA DE CESSÃO NÃO INCIDÊNCIA. Promessa de cessão de direitos à aquisição de imóvel não é fato gerador de ITBI.[252]
Questão intrigante, ainda, é a incidência de ITBI na cessão de direitos hereditários. Em primeiro lugar, só é admitida a cessão de direitos hereditários, negócio jurídico inter vivos, após a
abertura da sucessão, já que “não pode ser objeto de contrato a herança de pessoa viva” (art. 426, CC). A cessão deve ser realizada por escritura pública, abrangendo total ou parcialmente o quinhão hereditário, sendo ineficaz a cessão de um bem considerado singularmente (art. 1793, §2º, CC). Portanto, a questão não cuida de cessão de direito real sobre determinado imóvel integrante do acervo, mas sim, de cessão do próprio direito à herança, considerada imóvel por força do art. 80, II do Código Civil. A este respeito, leciona Harada (2010, p. 175): Logo, a cessão a esse direito implica ocorrência do fato gerador à luz do que dispõe o art. 156, II da CF e do disposto no inciso III do art. 35 do CTN. (...) Cumpre esclarecer se houve a renúncia à herança, ou sua desistência antes da aceitação não haverá incidência do ITBI, desde que essa renúncia ou desistência não seja feita a favor deste ou daquele herdeiro, mas a favor do monte-mor.
3.1.4 Elemento objetivo: bens imóveis por natureza ou
acessão física. É importante destacar que a regra-matriz inscrita no art. 156, II, estabeleceu que constituirá a hipótese de incidência deste imposto a transmissão ou a cessão de direitos, à transmissão da propriedade ou de outros direitos reais relativos a bens imóveis por natureza ou por acessão física. Na época da promulgação da Constituição Federal de 1988 vigia a Lei nº 3071/1916 – Código Civil –e a doutrina identificava a existência de três espécies de bens imóveis, quais fossem, imóveis por natureza, imóveis por acessão física artificial e imóveis por acessão intelectual, cuja definição legal era identificada, respectivamente, nos incisos do seu art. 43, adiante: Art. 43. São bens imóveis: I. O solo com os seus acessórios e adjacências naturais compreendendo a superfície, as árvores e frutos pendentes, o espaço aéreo e o subsolo. II. Tudo quanto o homem incorporar permanentemente ao solo, como a semente lançada à terra, os edifícios e construções, de modo que se não possa retirar sem destruição, modificação, fratura, ou dano. III. Tudo quanto no imóvel o proprietário mantiver
intencionalmente empregado em sua industrial, aformoseamento, ou comodidade.
exploração
Ocorre que no advento da Lei nº 10406/2002 – Novo Código Civil – as espécies acima não mais estão diferenciadas legalmente, mas subsistem no conceito de bens imóveis, à exceção dos imóveis por acessão intelectual. A propósito da alteração legal, salienta Regina Sahm (2008, p. 75) que: O autor da parte geral José Carlos Moreira Alves aponta poucas inovações uma vez que considera a matéria já bastante estratificada na Teoria Geral do Direito Privado. O Livro em questão não apresenta pontos polêmicos. No Capítulo I, do Título Único, disciplinam-se os bens considerados em si meses; sua Seção I se ocupa com os bens imóveis e já aí se observa que não há alusão entre esses (art. 80) aos imóveis por destinação, porque o Código Civil acolhe com ineditismo o conceito de pertença (art. 93).
Assim, o Novo Código Civil positiva os conceitos de bens imóveis por natureza e bens imóveis por acessão artificial, expressos no art. 79 e bens imóveis por força de lei, no art. 80. Veja-se:
Art. 79. São bens imóveis o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente. Art. 80. Consideram-se imóveis para os efeitos legais: I - os direitos reais sobre imóveis e as ações que os asseguram; II - o direito à sucessão aberta.
Portanto, a transmissão onerosa, por ato inter vivos, de direitos reais que tenham como objeto bens imóveis por natureza e por acessão intelectual sem sombra de dúvidas configura fato gerador do ITBI. Obviamente, a transmissão de direitos reais imobiliários, exceto direitos reais de garantia, e a cessão de direitos hereditários já figuram como fato gerador do ITBI, independentemente de sua atual consideração como bens imóveis por força de lei, em face da própria redação do art. 156, II da Constituição Federal. 3.2 ASPECTO TEMPORAL DA HIPÓTESE INCIDÊNCIA DO ITBI. Já
foi
exposto,
estratificadamente,
DE
os
elementos objetivos ou materiais da hipótese de incidência do ITBI, devendo, contudo, analisar-se qual o momento em que se reputa acontecido o fato imponível. Tal como preceituado no art. 116 do CTN, tratando-se de situação jurídica, considera-se ocorrido o fato gerador desde o momento em que esteja definitivamente constituída, nos termos de direito aplicável, autorizando-se a conclusão de que tão logo seja constituída a transmissão do direito real imobiliário ou a cessão de direito à aquisição da propriedade, estará realizado o fato gerador do ITBI. Neste contexto, o Código Civil prescreve em relação aos direitos reais e, particularmente, ao direito de propriedade que: Art. 1.227. Os direitos reais sobre imóveis constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com o registro no Cartório de Registro de Imóveis dos referidos títulos (arts. 1.245 a 1.247), salvo os casos expressos neste Código. Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis. § 1º Enquanto não se registrar o título translativo, o
alienante continua a ser havido como dono do imóvel.
É inquestionável que o registro do título translativo do direito real é o momento em que se considera realizado, temporalmente, o fato gerador, momento em que nasce a obrigação tributária e a partir de quando se pode exigir o adimplemento do crédito. Neste sentido: TRIBUTÁRIO - IMPOSTO DE TRANSMISSÃO DE BENS IMÓVEIS - FATO GERADOR - REGISTRO IMOBILIÁRIO - (C. CIVIL, ART. 530). A propriedade imobiliária apenas se transfere com o registro respectivo título (C. Civil, Art. 530). O registro imobiliário é o fato gerador do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis. Assim, a pretensão de cobrar o ITBI antes do registro imobiliário contraria o Ordenamento Jurídico.(REsp. 12.546/HUMBERTO).[253]
Mas, frise-se, não obstante seja o registro do título translativo do direito real o momento em que se considera realizada a hipótese de incidência, o registro não constitui o próprio fato gerador, descrito no art. 156, II da CF-88 como a transmissão de direito real imobiliário, ou a cessão de direitos à aquisição da
propriedade. E essa diferença é fundamental, como já expusemos, no que tange a não realização do fato gerador nos casos de desapropriação, usucapião e expropriação judicial. Em todos estes casos, haverá, sim, um novo registro de propriedade – ou, eventualmente, de outro direito real –, por exemplo, após a averbação da carta de sentença ou da carta de arrematação ou de adjudicação. Mas, tecnicamente, não terá havido transmissão de direito real imobiliário, uma vez que inexistira intermediação subjetiva que caracterizasse uma forma de aquisição derivada, não havendo que se falar em fato gerador do ITBI. Esta sutileza, repita-se, a diferença entre os elementos material e temporal da hipótese de incidência do ITBI, tem passado desapercebido na jurisprudência e provocado inúmeras situações de reconhecimento de fatos geradores dissociados do arquétipo constitucional. 3.3
ASPECTO
PESSOAL
DA
HIPÓTESE
DE
INCIDÊNCIA DO ITBI. No que se refere ao titular da competência tributária, não há qualquer dúvidas de que, sob o regime da CF-88, compete aos municípios instituir o imposto ocorrente sobre a transmissão inter vivos, por ato oneroso, de bens imóveis e direitos a eles relativos. A própria Constituição, aliás, previu expressamente no art. 156, §2º, II que a exação “compete ao Município da situação do bem”, detendo este a titularidade da relação jurídica tributária, bem como ao Distrito Federal ou à União, esta nos casos de territórios federais não divididos em municípios (art. 147, CF-88), não havendo qualquer relevância na invocação do art. 41 do CTN, que cremos não recepcionado. Relativamente ao sujeito passivo, não há dúvidas de que qualquer das partes envolvidas no negócio jurídico transmissor do direito real imobiliário ou da cessão de direitos à sua aquisição pode ser considerado pela legislação municipal como contribuinte, por deter relação pessoal e direta (art. 121, parágrafo único, I,
CTN) com o fato gerador, tornando desnecessária a invocação – óbvia – do disposto no art. 42 do CTN. Importante questão se refere à responsabilidade tributária, comumente atribuída aos tabeliães e notários, tendo em vista a sua participação nos atos de transmissão de direitos reais, através do registro público, assim sintetizada por Harada (2010, p. 159), com a ressalva de se tratar de responsabilidade subsidiária: Entretanto, em relação aos oficiais de registro poderá haver essa responsabilidade solidária (sic). Contudo, é importante observar que o art. 134 exige a presença dos seguintes requisitos impostergáveis para a caracterização dessa responsabilidade solidária: (a) a impossibilidade de o contribuinte cumprir a obrigação tributária principal; e (b) o fato de o responsável tributário ter uma vinculação indireta, pro meio de ato comissivo ou omissivo, com a situação que constitui o fato gerador da obrigação tributária.
3.4 ASPECTO QUANTITATIVO DA HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA DO ITBI. Sob a rubrica de aspecto quantitativo, está-se a examinar a base de cálculo e a alíquota que definirão o
quantum será pago a título de tributo. Referente ao ITBI, é mister destacar que se a hipótese de incidência é a transmissão de direitos reais ou a cessão de direitos à sua aquisição, é evidente que a base de cálculo desse tributo poderá ser o valor do negócio jurídico[254] adjacente ou, ainda como ocorre com os tributos que consideram a propriedade em sua configuração, a utilização do valor venal, como instrumental seguro para a definição do aspecto quantitativo. A doutrina majoritária e a jurisprudência fazem uso do art. 38 do CTN, o qual explicita que “a base de cálculo do ITBI é o valor venal dos bens ou direitos transmitidos”. Recorde-se que “valor venal” é conceituado como: [...] o valor de mercado do bem imóvel por natureza ou acessão física, excluindose tudo quanto no imóvel o proprietário mantiver intencionalmente empregado em sua exploração industrial, aformoseamento
ou comodidade, que, por serem bens imóveis por acessão intelectual (sic), estão constitucionalmente fora do campo de incidência do tributo (ALEXANDRE, 2008, p. 614). No que se refere às alíquotas aplicáveis ao ITBI, a doutrina tem admitido a relativa discricionariedade legislativa do Município, na medida em que o art. 39 do CTN não foi recepcionado pela nova ordem constitucional, devendo aquele ente federativo apenas obedecer às demais limitações ao poder de tributar, em especial a capacidade contributiva e a vedação ao efeito confiscatório. Situação bem debatida é a da possibilidade de fixação de alíquotas progressivas, variando de acordo com a capacidade econômica do contribuinte. De fato, a CF-88 estabeleceu um parâmetro de desigualdade a ser considerado para se conferir tratamento diferenciado aos contribuintes, qual seja a capacidade contributiva, prescrevendo no §1º do art. 145 que: “Sempre que possível, os impostos terão caráter
pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte (...)”. Ocorre que, a despeito da moderna tendência de personalização do fenômeno tributário, em relação aos impostos reais – incidentes sobre bem, receita ou operação do contribuinte, abstraindo-se qualquer elemento pessoal –remanesce o entendimento da impossibilidade de estabelecimento de alíquotas diferentes para diferentes bases de cálculo, salvo se expressamente previstas no texto constitucional, entendimento cristalizado no enunciado da súmula nº 656 do STF, in verbis: “É inconstitucional a lei que estabelece alíquotas progressivas para o imposto de transmissão inter vivos de bens imóveis – ITBI com base no valor venal do imóvel”. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS. A tributação incidente sobre a transmissão de direitos reais imobiliários, se, de um lado, teve definição precisa quanto à competência tributária no regime
posterior à Constituição Federal de 1988, por outro, remanesce cercado de divergências no que pertine à própria caracterização do fato gerador, haja vista a utilização de conceitos de direito privado, naturalmente evolutivos, bem como a fixação da doutrina e da jurisprudência majoritárias em repetir entendimentos baseados em normas legais não recepcionadas pelo conjunto de princípios que impulsionam o sistema tributário instituído desde a CF-88. Neste trabalho, foram expostos alguns destes problemas interpretativos, propondo-se soluções acordantes com o texto constitucional.
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Capítulo 21 O ITBI, SUA (NÃO) INCIDÊNCIA E O PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO NAS SUCESSÕES. Hipótese em que a constituição de holding patrimonial familiar é meio adequado para concretização de conduta elisiva nas sucessões. Amanda Lucena Lira[255]
1 INTRODUÇÃO A discussão sobre o planejamento tributário é antiga, seu termo inicial parece datar da época em que foi promulgado o Código Tributário Nacional (CTN), isto é, 1966. Contudo, permanece atual, tanto por ser sempre abastecida de novidades – como a recente sanção da MP 685/2015 –, como por jamais se ter chegado a um consenso quanto à definição de seus contornos. Considerar-se-á, neste artigo, o planejamento tributário como técnica que utiliza o ordenamento jurídico
como instrumento para atingir seus objetivos: excluir a incidência de determinado tributo; reduzir a carga tributária; e/ou diferir o recolhimento da exação. Alcançar estes objetivos de maneira lícita só é possível graças à complexidade da legislação tributária pátria, prenhe de atalhos e rotas alternativas, que permitem ao contribuinte chegar ao destino desejado por vários caminhos diferentes. Buscar-se-á, aqui, demonstrar a validade e a eficiência de uma dessas rotas alternativas, que consiste na constituição de uma holding patrimonial familiar para realizar a sucessão de uma empresa operacional familiar e seus bens imóveis, de maneira menos onerosa sob a ótica tributária. Para tanto, cuidar-se-á dos conceitos de empresa familiar, holding e sucessão patrimonial. Sem deixar de tratar dos aspectos tributários, com enfoque no ITBI, suas imunidades e isenções. Tudo com o objetivo de evidenciar o porquê da holding patrimonial familiar ser considerada um meio válido para concretização de um
planejamento tributário realizado com a finalidade de reduzir a carga tributária na sucessão patrimonial envolvendo uma empresa operacional e os bens imóveis de uma determinada família. 2 EMPRESA FAMILIAR Nas empresas familiares há a interação entre dois institutos: a empresa e a família. Da análise do conceito de empresário trazido pelo artigo 966 do Código Civil, infere-se ser a empresa constituída pelo exercício da atividade econômica organizada cujo escopo é a produção ou circulação de bens e serviços. Nota-se, no conceito de empresa, a presença conjunta de um aspecto estático e outro dinâmico. Este diz respeito aos procedimentos, às rotinas, imagem pública etc.; aquele, por sua vez, referese ao estabelecimento e ao patrimônio organizado para o exercício da atividade empresarial[256]. Já a família é compreendida como base da sociedade, merecendo, inclusive, especial proteção do Estado, conforme dispõe o artigo 226 da Constituição Federal. A importância do instituto da família reside no
fato de que do seu seio saem, em geral, os valores que construirão os cidadãos. Sob a ótica objetiva, família é o conjunto de parentes, unidos por laços sanguíneos e descendentes do mesmo ancestral. A empresa familiar, por seu turno, pode ser definida como “aquela em que a consideração da sucessão da diretoria está ligada ao fator hereditário e onde os valores institucionais da firma identificam-se com o sobrenome da família ou da figura de um fundador” [257]. Filiar-se-á, aqui, à ideia de classificação da empresa como familiar que toma como base o entendimento dos sócios da empresa sobre sua própria caracterização. Assim, considerar-se-á empresa familiar aquela que seus titulares entenderem como tal, independentemente de já ter ocorrido alguma sucessão que levou membros da família à gestão dos negócios. No Brasil, as empresas familiares são maioria e correspondem a, aproximadamente, 90% do total das empresas pátrias[258]. Ocorre que o índice de mortalidade dessas empresas, que já é alto, com o passar
das gerações, atinge percentuais assustadores. Basta analisar um grupo de 100 empresas durante três gerações para enxergar a gravidade do problema: apenas 30% delas chega à segunda geração, 13% à terceira geração e 5% à quarta[259]. Nota-se, portanto, que o processo sucessório envolvendo aquelas empresas merece especial atenção e cuidado, em todos os seus aspectos. 3 HOLDING 3.1 Conceito A Lei 6.404/76 introduziu, no ordenamento jurídico pátrio, a figura da holding, em seu artigo 2°,§3°, in verbis: “Pode ser objeto da companhia qualquer empresa de fim lucrativo, não contrário à lei, à ordem pública e aos bons costumes. [...] A companhia pode ter por objeto participar de outras sociedades; ainda que não prevista no estatuto, a participação é facultada como meio de realizar o objeto social, ou para beneficiar-se de incentivos fiscais” (sem grifos no original).
Ao observar o texto do dispositivo, parcela da doutrina define a holding como uma sociedade detentora de participação societária em outra ou de outras sociedades. Classificando-a como holding pura caso seja constituída exclusivamente com o intuito de deter participações em outras sociedades e como holding mista se for constituída com outros propósitos além do ora em comento[260]. Há, porém, uma vertente doutrinária que apresenta uma definição mais abrangente, no sentido de que a holding consiste em uma sociedade cujo escopo é a detenção de bens e direitos, como imóveis e participações em outras sociedades. Cuida-se, no primeiro caso, de holding imobiliária; e, no segundo, de holding de participações. Tem-se, ainda, de acordo com esta corrente, a holding patrimonial, que detém tanto participações societárias, como imóveis, além de outros bens e direitos variados[261]. Alerta-se, ainda, que a holding não é um tipo societário, mas uma qualificação que pode ser utilizada
para designar tanto sociedades simples ou empresárias, a serem registradas na Junta Comercial ou no Cartório de Registro de Pessoas Jurídicas[262]. Aconselha-se a instituição da holding por meio de sociedade por ações, limitada ou EIRELI. Desse modo, realizar-se-á, com a sua criação, a reorganização e proteção patrimonial, afastando os bens e direitos da relação direta com a pessoa física, dentro dos limites legais. No
que
toca
ao
planejamento
sucessório
envolvendo uma empresa e os demais bens e direitos da família, parece que a escolha pela instituição de uma holding patrimonial é a mais adequada. Abordar-se-á, por esta razão, de maneira pormenorizada, as características deste tipo de holding. 3.2 Holding Patrimonial A holding patrimonial é a simbiose entre as holdings de participação e imobiliária, sendo possível adicionar à mistura, ainda, outros bens e direitos dos mais variados (v.g. animais, embarcações, ativos financeiros
etc.). Razão pela qual se entende ser a modalidade de holding mais adequada para realização do planejamento patrimonial sucessório que envolva, além de uma empresa familiar, imóveis ou outros bens e direitos pertencentes à família. No tocante à empresa familiar, a escolha pela instituição da holding acarretará o distanciamento entre o sócio pessoa física e a empresa operacional – no caso, a familiar. A hipótese apresenta-se vantajosa por dois motivos: viabiliza a proteção do patrimônio dos sócios, afastando-o dos riscos diários do negócio da operacional; e garante a concentração do poder familiar nas votações que envolvam decisões na operacional, uma vez que as discussões sobre as questões a serem votadas são realizadas no âmbito da holding, logo, em casos de dissidência, os sócios cujo entendimento for vencido na votação não poderão interferir na tomada da decisão na operacional. Em outras palavras, as vantagens se referem à separação do patrimônio dos sócios e a consequente
redução dos riscos desse patrimônio ser utilizado para quitar obrigações das sociedades operacionais; e à diminuição da possibilidade de ingerência de pessoas distintas do sócio (v.g. cônjuge meeiro, herdeiros etc.) na empresa. Assim, nota-se que a holding proporciona, além da proteção patrimonial dos sócios e da própria empresa operacional, a proteção contra possíveis reflexos acarretados pela mudança no quadro societário em virtude de sucessão. Já quanto ao patrimônio imobiliário, nota-se ser a criação da holding vantajosa por promover a segregação entre os imóveis do sócio e patrimônio da empresa; por manter as pessoas físicas titulares dos imóveis no anonimato, promovendo, destarte, a segurança da família, mormente se esta for detentora de vultoso patrimônio; e, ainda, por evitar a manutenção do bem em condomínio e suas nefastas consequências, porquanto garante que a tomada de decisões seja realizada por deliberações da maioria. Há de se tomar cuidado, porém, com alguns
aspectos na constituição de uma holding patrimonial, dentre os quais se destaca aquele que interessa ao tema ora sob análise: a inclusão dos ativos financeiros como bens integrantes do patrimônio da holding. Como dito, é possível incluir no patrimônio da holding bens e direitos distintos das participações societárias e dos imóveis. Incluí-los, contudo, não configura sempre uma situação vantajosa. Tome-se como exemplo o caso dos ativos financeiros em que se apresenta economicamente mais interessante a sua manutenção como patrimônio da pessoa física. Isto porque a pessoa jurídica sofre a incidência da alíquota de 34% sobre os ativos financeiros, sendo esta porcentagem correspondente à soma das alíquotas do Imposto de Renda – IR (15%) e Adicional de IR (10%) e Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido – CSL (9%), independentemente de a tributação ser por lucro real ou presumido; ao passo que a pessoa física sofre a incidência de alíquotas que variam entre 15% a 22,5% sobre seus rendimentos financeiros.
Ante o exposto, cingir-se-á, neste artigo, a tratar de uma holding patrimonial constituída pelas ações ou quotas da empresa familiar e o patrimônio imobiliário da família, cuidando de suas vantagens para a concretização de um planejamento tributário na sucessão. 3.3 Holding Familiar A holding será classificada como familiar em razão do contexto no qual se encontra inserida e do fato de abarcar a empresa familiar. Não se trata, portanto, de uma espécie diferente, ela pode ser constituída como qualquer uma das formas de holding. Salienta-se que as holdings familiares “permitem a manutenção do controle, favorecem o encaminhamento da sucessão nas empresas familiares” e “dispõem sobre a reaplicação de recursos provenientes de dividendos de outras companhias” [263]. As holdings familiares são instituídas, em geral, com intuito de facilitar o processo sucessório e torná-lo menos oneroso. A formação de uma empresa holding familiar tem como escopo reunir os bens e direitos pertencentes à empresa e à família, a fim de possibilitar
ao gestor da empresa a repartição, ainda em vida, de todo o patrimônio, por meio da distribuição de quotas ou ações para os herdeiros. Reserva-se, normalmente, o direito de usufruto vitalício das participações na sociedade ao administrador. O
planejamento
sucessório
por
meio
da
constituição de uma holding familiar parece vantajoso também no sentido de que evitar que os litígios envolvendo os sucessores possam desaguar nas decisões da empresa operacional e prejudicar sua governança. Dentre as vantagens apresentadas, cingir-se-á a abordagem do artigo ao processo sucessório, a fim de, uma vez explanado o processo, tratar do planejamento para redução da carga tributária incidente sobre ele. 4 SUCESSÃO PATRIMONIAL O vocábulo “sucessão”, lato sensu, cuida do ato através do qual uma pessoa passa a ocupar o lugar da outra, assumindo a titularidade de certos bens e direitos[264]. Há casos de sucessão por ato entre vivos e aqueles cuja causa é a morte. “Quando se fala, na ciência
jurídica, em direito das sucessões, está-se tratando de um campo específico do direito civil: a transmissão de bens, direitos e obrigações em razão da morte. É o direito hereditário” [265]. Entende-se, assim, que o termo inicial do processo de sucessão se dá, normalmente, com a morte do detentor do patrimônio. Cuidar-se-á, aqui, de três situações hipotéticas distintas e seus resultados no caso do de cujus ser proprietário de uma empresa familiar. A sucessão intestada é aquela em que não houve qualquer preparação para o processo sucessório, isto é, não há sequer um testamento. Dar-se-á do seguinte modo com relação à empresa familiar: após a morte do administrador e a abertura do inventário, a gestão da empresa operacional acaba se tornando uma questão do próprio inventário. Nos casos em que existe disputa na definição de titularidade e distribuição dos bens, é comum levar o caso ao judiciário e esperar sua resolução. Neste ínterim, a litigiosidade passa a ser qualidade do inventário e da própria administração da empresa.
Definida a partilha dos bens, restará, ainda, a designação da nova administração da empresa, que suscitará outra disputa: a disputa pelo comando, pela gestão empresarial. Como se vê, a sucessão intestada, sem qualquer planejamento prévio, geralmente, é repleta de percalços que, além de afetarem o relacionamento familiar, podem gerar problemas na condução da administração da empresa familiar. Na sucessão testamentária, a morte e consequente abertura do inventário acarretam
a a
administração provisória da empresa pelo inventariante e a gestão passa a ser assunto do inventário. Não há disputa pelos bens, uma vez que, em se tratando de testamento válido, a distribuição seguirá de acordo com o que nele estiver disposto. Há possibilidade, porém, do surgimento de conflitos entre os herdeiros cujo escopo seja a detenção do poder de gestão da empresa, nas hipóteses em que as participações societárias forem atribuídas a mais de um herdeiro. Embora mitigue os conflitos, as determinações testamentárias, normalmente, não alcançam a questão da administração da empresa, razão pela qual é
possível que os conflitos oriundos da influenciem negativamente a gestão daquela.
sucessão
É possível realizar o planejamento sucessório por meio distinto do testamento e que parece ser ainda mais vantajoso do ponto de vista de proporcionar economia financeiro-tributária: utilização de estrutura financeira disponibilizada pelo mercado para facilitar o processo de sucessão. Dentre as muitas estruturas disponíveis[266], tratar-se-á, neste artigo, da constituição de holding patrimonial familiar como meio para concretização do planejamento. Na hipótese do patrimônio ser disposto sob a égide de uma holding familiar, a sucessão patrimonial e da empresa é decidida por ato inter vivos, ainda sob o comando do empresário. Quando da morte e abertura do inventário, não há surpresas, porquanto o novo quadro administrativo da empresa já está resolvido. Logo, os herdeiros-sócios darão continuidade à gestão conforme determinado em vida por seu pai e/ou mãe. Assim, evitam-se disputas por patrimônio e poder, preservando
as relações familiares e a própria empresa operacional. Com efeito, como a sucessão hereditária não fará diretamente com relação aos bens e às participações societárias na empresa operacional, mas por meio de quotas ou ações da holding, mesmo nos casos em que surgirem conflitos referentes à herança, estes não afetarão tão fortemente as decisões da operacional. Assinala-se que a transferência das quotas ou ações pode ser realizada tanto em vida como depois da morte. No tocante à opção de transferência causa mortis, não há muito a falar, transferir-se-ão as quotas ou ações aos herdeiros, após o falecimento do empresário, pelo valor venal dos bens[267]. Em se tratando de transferência das quotas ou ações por ato entre vivos, ocorrerá um adiantamento da legítima, que consiste na ordem de vocação hereditária prevista em lei. O ato será concretizado por meio de doação. Impende lembrar que o Código Civil estabelece, em seu artigo 555, que a revogação da doação somente pode ser feita em virtude de ingratidão do donatário ou
por inexecução de encargo. Infere-se, portanto, ser a realização da doação uma decisão a ser tomada em caráter definitivo. Tendo isto em vista, é comum que a doação, nestes casos, seja feita com reserva de usufruto vitalício do doador. Desse modo, garantem-se ao doadorusufrutuário amplos poderes para gerir a empresa e o direito à percepção de rendimentos.
4.1 Planejamento Sucessório Das modalidades apresentadas como possíveis formas de sucessão, a que parece mais interessante é aquela em que se institui uma holding patrimonial, por meio da integralização de bens móveis (as quotas ou ações da empresa operacional) e imóveis. De seguinte, o quotista ou acionista, que detinha todo o patrimônio, faz uma doação, com reserva de usufruto vitalício, aos seus herdeiros e sucessores, das quotas ou ações da holding, observando, sempre, os limites estabelecidos pela legítima. Este procedimento torna o processo sucessório
bem mais simples. Explica-se. Quando da morte do doador, neste caso, o usufruto será extinto[268]. Logo, o pleno domínio das quotas ou ações passará aos respectivos sucessores. Demais disso, as holding patrimoniais familiares servem, também, para propiciar uma melhor gestão dos bens e direitos a ela transferidos, especialmente porque permite a unidade das decisões no âmbito da operacional; reduzir a exposição dos proprietários de patrimônios vultosos, prezando, desse modo, pela segurança deles; e, em grande parte dos casos, proporcionar uma diminuição da carga tributária incidente sobre o patrimônio transferido. Examinar-se-á, a seguir, o tributo de competência municipal que onera a transmissão da propriedade imobiliária: o ITBI. Uma vez que a análise de suas imunidades, regras e exceções é de suma importância para determinar se haverá redução de encargos fiscais com a constituição da holding patrimonial ou não. 5 ITBI: IMUNIDADE E ISENÇÃO A Constituição, em seu artigo 156, estabelece:
“Compete aos Municípios instituir impostos sobre: [...] II - transmissão "inter vivos", a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição; [...] § 2º O imposto previsto no inciso II: I - não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil;”. Para a incidência do ITBI, portanto, exige-se a transmissão, isto é, a mudança de titularidade do bem. Esta transmissão deve ser realizada por ato entre vivos, posto ser a transmissão causa mortis hipótese de incidência de imposto estadual. Ademais, deve ser realizada por ato oneroso, também por ser a transmissão a título gratuito hipótese de incidência de imposto estadual. Após a previsão constitucional da hipótese de
incidência do ITBI, vê-se a previsão de hipótese de não incidência do imposto, ou melhor, a constituição de uma norma de imunidade que delimita a competência e proíbe a tributação em determinadas situações, a saber: transmissão de bens e direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital; e transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica. Estabelece, ainda, uma exceção à imunidade, qual seja: se a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda dos bens imóveis e dos direitos a eles referentes, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil. A norma constitucional ora sob exame é regulada pelos artigos 36 e 37 do Código Tributário Nacional, que dispõem: Art. 36. Ressalvado o disposto no artigo seguinte, o imposto não incide sobre a transmissão dos bens ou direitos referidos no artigo anterior: I - quando efetuada para sua incorporação ao patrimônio de pessoa jurídica em pagamento de capital nela subscrito; II - quando decorrente da incorporação ou da fusão de
uma pessoa jurídica por outra ou com outra. Parágrafo único. O imposto não incide sobre a transmissão aos mesmos alienantes, dos bens e direitos adquiridos na forma do inciso I deste artigo, em decorrência da sua desincorporação do patrimônio da pessoa jurídica a que foram conferidos. Art. 37. O disposto no artigo anterior não se aplica quando a pessoa jurídica adquirente tenha como atividade preponderante a venda ou locação de propriedade imobiliária ou a cessão de direitos relativos à sua aquisição. § 1º Considera-se caracterizada a atividade preponderante referida neste artigo quando mais de 50% (cinquenta por cento) da receita operacional da pessoa jurídica adquirente, nos 2 (dois) anos anteriores e nos 2 (dois) anos subsequentes à aquisição, decorrer de transações mencionadas neste artigo. § 2º Se a pessoa jurídica adquirente iniciar suas atividades após a aquisição, ou menos de 2 (dois) anos antes dela, apurar-se-á a preponderância referida no parágrafo anterior levando em conta os 3 (três) primeiros anos seguintes à data da aquisição. § 3º Verificada a preponderância referida neste artigo, tornar-se-á devido o imposto, nos termos da lei vigente à data da aquisição, sobre o valor do bem ou direito nessa
data. § 4º O disposto neste artigo não se aplica à transmissão de bens ou direitos, quando realizada em conjunto com a da totalidade do patrimônio da pessoa jurídica alienante. Antes de tratar das regras legais especificamente, vale lembrar que, conforme o entendimento do STF, as imunidades tributárias constitucionais devem ser interpretadas de maneira teleológica, não literal como pede o artigo 111 do CTN com relação às isenções. O fundamento daquela imunidade parece ser incentivar o dinamismo e os investimentos na economia pátria, uma vez que impede a incidência do ITBI em mudanças patrimoniais imobiliárias envolvidas na instituição de novas empresas ou em reestruturações societárias. A exceção à regra vem para corroborar este entendimento, já que exclui da abrangência da imunidade as empresas que trabalham diretamente com a venda, locação ou arrendamento mercantil de bens imóveis. Já que, em se tratando de empresas que desenvolvem este tipo de atividade, a circulação dos bens e direitos referentes aos imóveis é o próprio objeto de exploração
econômica, razão pela qual não se justifica a aplicação da imunidade. Ante o exposto, é possível enxergar que as normas previstas nos dispositivos do CTN, cujo escopo é incentivar a fomentação da economia nacional por meio de incentivos tributários, vão ao encontro do entendimento esposado pela CF. Entende-se, portanto, da leitura dos dispositivos legais interpretados conforme as normas constitucionais, que também não incide o ITBI nos casos de desincorporação do patrimônio da pessoa jurídica dos bens e direitos que foram objeto da integralização do seu capital, sempre que o patrimônio retorne ao sócio ou ao acionista da empresa. Embora alguns teçam críticas veementes com relação à aplicação desta norma, haja vista a possibilidade que ela gera para instituição e extinção de empresas somente com a finalidade de escapar da incidência do ITBI, não há nenhuma razão plausível que justifique a sua não aplicação. Impende lembrar, ainda, que nos casos de utilização de meios legais para a
redução da carga tributária, o ato será considerado elisivo ou não levando em conta o entendimento das normas aplicado nas hipóteses de planejamento tributário. Logo, não existe motivo para não incidência da exceção trazida pelo parágrafo único, artigo 36 do CTN em um ambiente jurídico hígido. É preciso debruçar-se, outrossim, sobre a regra trazida pelo artigo 37 do CTN, que define o que se entende por “atividade preponderante” da empresa. Restará caracterizada, segundo o dispositivo, a atividade imobiliária preponderante sempre que mais de 50% da receita operacional da adquirente, nos dois anos que antecederem e nos dois anos que sucederem a aquisição, seja proveniente de operações cujo objeto consista na “venda ou locação de propriedade imobiliária ou a cessão de direitos relativos à sua aquisição”. Parece acertada, assim, a interpretação que analisa o percentual da receita operacional em dois períodos distintos, de maneira cumulativa: os dois anos anteriores e os dois anos posteriores à aquisição. E, no caso da
empresa iniciar suas atividades após a aquisição ou menos de dois anos antes dela, observar-se-á o período dos três subsequentes à realização do negócio, conforme determinação do artigo 37,§2° do CTN. Entende-se, portanto, que se a média da receita operacional referente aos valores oriundos de negócios imobiliários dos quatros anos, no primeiro caso, e dos três anos, no segundo, superar o percentual de 50 %, resta caracterizada a atividade preponderante da empresa como imobiliária. Afasta-se, como consequência, a aplicação da imunidade constitucional prevista, incidindo, normalmente, o ITBI. 6 HOLDING PATRIMONIAL FAMILIAR: UM MEIO PARA REALIZAÇÃO DE PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO NA SUCESSÃO Restringir-se-á, aqui, a tratar da sucessão que envolva empresa operacional familiar e patrimônio imobiliário da família, tratando de um quadro generalista, a fim de nortear o planejamento nas sucessões. Sem olvidar, é claro, a necessidade de analisar individualmente os casos em um trabalho de planejamento
tributário na prática. De pronto, faz-se necessário que a atividade da empresa operacional não seja preponderantemente imobiliária, uma vez que a imunidade garantida pela constituição ao ITBI será bastante relevante na realização do planejamento. Demais disso, devem ser analisados os tributos que incidem diretamente sobre a sucessão: o ITCMD e o IRPF sobre ganho de capital. Além de pensar em todos os tributos que podem exercer influência sobre os atos paralelos que serão realizados a fim de dirimir tributos, in casu, a constituição da holding patrimonial familiar. Insta observar, ainda, que se já há pretensão de alienar os bens a serem conferidos à holding, a sua constituição não é vantajosa, uma vez que a alíquota referente ao IR sobre ganho de capital incidente na pessoa jurídica é superior àquela incidente nas relações com a pessoa física. Ultrapassadas aquelas questões, é possível tratar das muitas vantagens na constituição da holding, como no
que toca à distribuição de lucros e dividendos, que é isenta da incidência do IR; à redução da tributação de rendimentos em comparação à pessoa física; maior proteção do patrimônio; e à possibilidade de realização de acordos entre os acionistas ou quotistas, regulando suas relações. Por essas razões, em grande parte dos casos, considera-se interessante a constituição da holding para a realização de um planejamento tributário na sucessão. O referido planejamento, na situação a ser examinada – na qual está envolvida a empresa operacional e o patrimônio imobiliário familiar –, dar-seá da seguinte maneira: Inicialmente, verifica-se se há pretensão de alienar os bens. Se não houver, averigua-se a atividade preponderante da empresa familiar e compara sua receita com a proveniente dos alugueis dos imóveis que serão conferidos à holding. Em não se configurando supremacia da receita imobiliária, procede-se a conferência dos bens móveis (quotas ou ações da empresa familiar) e dos bens
imóveis para a pessoa jurídica, em realização de capital. Integraliza-se, assim, o capital da holding em operação imune ao ITBI. Em seguida, o quotista ou acionista, antes detentor de todo o patrimônio integralizado na holding, realiza a doação, com reserva de usufruto vitalício, aos seus herdeiros e sucessores, respeitando os limites da legítima. Incide sobre esta operação o ITCMD, em razão da transmissão dos bens a título gratuito. Vale lembrar, porém, que a base de cálculo para incidência da exação será o valor venal das quotas ou ações doadas, e não o valor venal de cada bem. Convém mencionar, ainda, que, na realização da sucessão sem qualquer planejamento, também incide o ITCMD em razão da transmissão de bens causa mortis. Neste caso, contudo, a base de cálculo diz respeito ao valor venal de cada um dos bens em sucessão. Durante todo o período do usufruto, o usufrutuário garante o seu direito de administrar os bens e a empresa operacional. Além disso, é facultada a realização de acordo entre quotistas ou acionistas, que protegem a
holding de ações isoladas dos herdeiros[269]. Quando da morte do usufrutuário, o usufruto se extingue. Logo, passa-se o pleno domínio das quotas ou ações aos donatários. Estes, por sua vez, passarão a ser detentores de todo patrimônio que lhes seria transmitido através da herança, por meio da holding. A partir do momento em que passam a controlar o destino dos bens, os sócios da holding patrimonial familiar podem decidir seguir por vários caminhos, levando em consideração sempre as características tributárias envolvidas nos negócios a serem firmados pela holding patrimonial. Neste sentido, é possível continuar explorando o patrimônio por meio da própria holding e garantido o recebimento de rendas por meio de distribuição de lucros e dividendos, isentos da incidência do IR. Além disso, caso pretendam realizar a divisão dos bens propriamente ditos, é possível reduzir o capital da holding, retornando os bens aos seus sócios e já os deixando sobre a propriedade de quem de direito. Esta é
uma hipótese que subsume à isenção quanto à incidência do ITBI em casos de desincorporação patrimonial nos quais os bens são devolvidos aos sócios da empresa, prevista no artigo 36, parágrafo único do CTN. Nesta operação, portanto, deve-se ter cuidado apenas com a possibilidade da incidência de IR sobre ganho de capital. 7 CONCLUSÃO O planejamento tributário, como técnica de organização lícita cuja finalidade é reduzir, retardar ou extinguir a incidência tributária sobre determinados negócios jurídicos, vale-se das várias opções oferecidas pelo ordenamento jurídico para se alcançar os fins desejados e escolhe, dentre elas, a economicamente mais vantajosa. A consecução de um planejamento tributário, portanto, não é simples, deve sempre analisar as diversas variáveis do caso específico, para, só assim, estabelecer qual o melhor caminho a ser seguido. A utilização da holding como forma de planejar a sucessão e a divisão de bens entre os herdeiros vem se
tornando cada vez mais comum. Todavia, a sua instituição não é remédio para curar todos os males. Em alguns casos, ao analisar o todo, vê-se a desvantagem da sua utilização. Buscou-se, neste artigo, tratar de uma situação hipotética na qual a instituição da holding, além de ser considerada como uma forma de planejamento tributário e sucessório válida, seria vantajosa sob a ótica financeira. Concluiu-se que, nos casos em que é possível se valer das imunidades e isenções referentes à incidência do ITBI, é vantajosa a constituição de uma holding familiar, que passa a ser detentora da empresa operacional familiar e dos bens imóveis daquela família, para fins de planejamento tributário e sucessório. Uma vez que, como restou demonstrado, além das diversas vantagens extratributárias apresentadas pela instituição da holding, os valores pagos em razão de incidência de exações será minorado.
CONTRIBUIÇÃO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA – CIP. Capítulo 22 DESDOBRAMENTOS DA CONTRIBUIÇÃO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA SOB O VIÉS CONSTITUCIONAL Saulo Medeiros da Costa Silva[270] Ítalo Dominique[271]
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS. A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 plasmou, nos arts. 145 a 162, o Sistema Tributário Nacional. O primeiro dispositivo do Sistema Tributário Constitucional (art. 145) previu que os entes federados poderiam instituir, através da competência concorrente, impostos, taxas e contribuição de melhoria. Percebe-se que, inicialmente, a Constituição ratificou a
divisão dos tributos de acordo com a escola tricotômica, também prevista no Código Tributário Nacional – datado de 1966. Todavia, num segundo momento, inovou no ordenamento jurídico pátrio concedendo à União a competência tributária para, além de instituir os seus impostos, taxas e contribuições de melhoria, instituir, mediante lei complementar, uma nova espécie de tributo, no art. 147, que foram os empréstimos compulsórios para atender a despesas extraordinárias decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência; ou no caso de investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional. Ampliando o campo de atuação da União – que reflete a visão conservadora e centralizadora do Brasil, amplamente relatada pela história da tributação e do Estado Federativo do Brasil – o art. 149 outorgou competência tributária para também instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas. Além das três espécies de tributos citadas
alhures, a Assembleia Nacional Constituinte de 1988 previu que os Estados, o Distrito Federal e os Municípios ainda poderiam instituir contribuição cobrada de seus servidores, para o custeio e em benefício destes, do regime previdenciário próprio. Nesse passo, percebe-se que, originariamente, cabiam aos Municípios apenas instituir os impostos, taxas, contribuição de melhoria e contribuição previdenciária dos seus servidores, ou seja, quatro espécies de tributos. Todavia, a partir do ano de 2002, passados quase quinze anos da publicação da Carta Magna vigente, o legislador constituinte derivado ampliou o leque de tributos dos Municípios, através da EC nº. 39, calcificando que os mesmos, bem como o Distrito Federal, poderiam instituir contribuição, na forma das respectivas leis, para o custeio do serviço de iluminação pública. Ou seja, as contribuições especiais, que originariamente eram exclusivas da União, passaram a ter uma exceção constitucional, qual seja a Contribuição de Iluminação Pública, de competência exclusiva dos Municípios e Distrito Federal.
Diante do exposto, o objeto do presente estudo limita-se a tecer breves considerações sobre a mais recente e controvertida espécie de tributo municipal, que é a Contribuição de Iluminação Pública, prevista no art. 149-A da Constituição Federal. 2. ASPECTOS HISTÓRICOS DA CONTRIBUIÇÃO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA – CIP. Em meados de 1954, foi publicada a Lei Federal nº. 2.308, que “Institui o Fundo Federal de Eletrificação, cria o imposto único sobre energia elétrica, altera a legislação do imposto de consumo, e dá outras providências” (Redação mantida do original). O art. 3º dessa lei disciplina que a energia elétrica, entregue ao consumo, estaria sujeita ao imposto único, cobrado pela União sob a forma de imposto de consumo, pago por quem a utilizar. E, no art. 5º, dispõe que: O total da arrecadação do imposto único, 40% (quarenta por cento) pertencerão à União, 50% (cinqüenta por
cento) aos Estados, Distrito Federal e Territórios e 10% (dez por cento) aos municípios, para ser aplicado segundo planos plurianuais de investimentos, elaborados com a colaboração da Eletrobrás na produção, transmissão e distribuição de energia elétrica (Destaque nosso).
Sem maiores delongas, percebe-se, desde já, que a origem da Contribuição de Iluminação Pública, a nosso ver, foi o imposto único sobre energia elétrica, de competência da União, todavia, rateando os seus recursos entre as pessoas políticas, nas quais se incluem os Municípios. Isso denota a necessidade histórica de recursos para custear a iluminação pública. Em que pese a existência histórica deste Fundo Federal, a aludida Lei não foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988, deixando os municípios sem recursos para custear a iluminação pública já que, a princípio, os recursos obtidos com os impostos não eram suficientes para abranger tal serviço. Nesse diapasão, inexistindo recursos próprios dos impostos para custear a iluminação pública, e não possuindo competência para instituir uma contribuição, a única alternativa foi criar uma taxa de iluminação pública
de competência municipal.
2.1 Taxa de iluminação pública. De acordo como o art. 145, II, da Constituição Federal e art. 77 e ss. do Código Tributário Nacional, a taxa é o tributo vinculado, cujo fato gerador é configurado por uma atuação estatal específica, referível ao contribuinte, o que pode consistir: a) no exercício regular do poder de polícia; b) na prestação ao contribuinte de um serviço público específico e divisível ou c) na colocação à sua disposição. 2.1.1 Taxa de Polícia. O conceito de poder de polícia é extraído do próprio CTN, no art. 78, que o conceitua como atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou a abstenção de fato, em razão de interesse público
concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos. Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder. Em síntese, trata-se de ação estatal de fiscalização que limita o exercício de direitos e liberdades individuais em prol da coletividade. Dentre as taxas decorrentes do poder de polícia, podemos citar: taxa de fiscalização ambiental; taxa de fiscalização de títulos e valores mobiliários pela Comissão de Valores Mobiliários – CVM; taxa de alvará de funcionamento; taxa de Controle e Fiscalização Ambiental – TCFA etc. 2.1.2 Taxa de serviço.
De acordo com o art. 77 do CTN, a taxa de serviço tem como fato gerador, além do exercício regular do poder de polícia, a utilização, efetiva ou potencial, do serviço público específico e divisível prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição. Considera-se serviço público utilizado efetivamente pelo contribuinte aquele por ele usufruído a qualquer título; e, potencialmente, quando, sendo de utilização compulsória, sejam postos à sua disposição mediante atividade administrativa em efetivo funcionamento. Por sua vez, será específico, quando possa ser destacado em unidades autônomas de intervenção ou de necessidades públicas que o justifiquem; e divisível, quando suscetível de utilização, separadamente, por parte de cada um dos seus usuários. No STF, “prevalece a ideia de que, ou um serviço é específico e divisível, ou é geral e indivisível” (ALEXANDRINO e VICENTE, 2009, p. 19). Acrescentase ainda que, na prática, a definição de serviço específico
exposta no CTN perde relevância, pois o problema reside principalmente na indivisibilidade propriamente dita. Pelo exposto, o serviço público geral, ou universal, não enseja taxa. Ademais, tratando-se de taxa, o Estado age e o contribuinte paga, e a base de cálculo dessa taxa é uma grandeza que dimensiona a ação do Estado, o custo da ação estatal. 2.1.3 Da inconstitucionalidade da Taxa de iluminação pública. Pelas razões postas, o serviço de iluminação pública, por não ser específico e divisível, não poderá ser custeado pela taxa e sim pelos impostos (até a EC nº. 39/2002), já que se trata de serviços públicos gerais – inespecíficos e indivisíveis. Nesse sentido – da inconstitucionalidade da taxa de iluminação pública –, vejamos o teor do julgado do STF, bem como a Súmula Vinculante editada sobre a matéria:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº. 233.332-6 RIO DE JANEIRO. TAXA DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA. Tributo de exação inviável, posto ter por fato gerador serviço inespecífico, não mensurável, indivisível e insuscetível de ser referido a determinado contribuinte, a ser custeado por meio do produto da arrecadação dos impostos em gerais. Recurso não conhecido, com a declaração da inconstitucionalidade dos dispositivos sob epígrafe, que instituíram a taxa no município. Relator Min. Ilmar Galvão, 10/03/199, Tribunal Pleno.
Súmula 670. O SERVIÇO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA NÃO PODE SER REMUNERADO MEDIANTE TAXA. Data de Aprovação Sessão Plenária de 24/09/2003. Fonte de Publicação. DJ de 9/10/2003, p. 4; DJ de 10/10/2003, p. 4; DJ de 13/10/2003, p. 4. 3. DO SURGIMENTO DA CONTRIBUIÇÃO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA. Após a declaração da inconstitucionalidade da Taxa de Iluminação Pública, os gestores municipais utilizaram a sua força, e exigiram do Governo Federal que fosse criada “alguma coisa” para custeá-la, alegando a inexistência de recursos próprios para fazer frente a essas
despesas. E essa “alguma coisa” foi justamente a Contribuição de Iluminação Pública acrescentada pela Emenda à Constituição nº. 39/2002, que alterou o texto da Carta Magna em seu art. 149, para acrescentar o art. 149A, cujo teor se transcreve abaixo: Art. 1º A Constituição Federal passa a vigorar acrescida do seguinte art. 149-A: Art. 149-A Os Municípios e o Distrito Federal poderão instituir contribuição, na forma das respectivas leis, para o custeio do serviço de iluminação pública, observado o disposto no art. 150, I e III. Parágrafo único. É facultada a cobrança da contribuição a que se refere o caput, na fatura de consumo de energia elétrica.
Pelo parecer da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), na relatoria do Senador Luiz Otávio, tombado sob o nº. 303/02, cujos trechos seguem abaixo, adaptados e resumidos pelo autor deste capítulo, é verificável que: A proposta de Emenda era oportuna e tinha como objetivo resolver um problema que se tornou crucial para milhares de Municípios. É de conhecimento geral que as comunas enfrentam grande dificuldade para implantar e
manter os serviços que lhe incumbem. O modelo tributário é centralizador, em total descompasso com a descentralização de serviços por todos preconizada e, mais que isso, exigida pelos cidadãos que têm, na administração local, o desaguadouro natural de todas suas demandas e carências de serviço público. As receitas próprias municipais, além de poucas, têm sofrido grande flutuação em relação ao PIB – o que, na verdade, revela a inadequação do modelo tributário e a incapacidade dos municípios de adotar mecanismos de defesa ante as flutuações da economia. Nesse contexto, o custeio das despesas com iluminação pública assumiu caráter de dramaticidade, ainda mais agravado quando ocorreu a privatização do setor elétrico, trazendo consigo mais rigor nas cobranças, inclusive com suspensão do fornecimento de energia, deixando várias cidades às escuras. Todavia, o problema é antigo, anterior à Constituição de 1988 (que, aliás, não inovou na matéria). A tentativa dos Municípios de atender à despesa mediante criação da taxa de iluminação pública provocou inúmeros questionamentos judiciais, do que decorreu farta e consolidada jurisprudência afirmativa da indivisibilidade do serviço e conseqüente inconstitucionalidade dessa taxa. Uma vez que há a convicção da necessidade de se proporcionar aos Municípios nova fonte de receita para atender a despesa específica, a solução deve ser a que menos prejuízo cause à estrutura tributária. A solução proposta utiliza o conceito das contribuições especiais, que defluem do art. 149 da Constituição Federal. Tais contribuições, que por deliberação dos Constituintes de 1988 deixarão o limbo da parafiscalidade para se integrar ao sistema tributário, oferecem a flexibilidade conceitual propícia para o caso.
Percebe-se que a intenção do legislador foi de introduzir um novo tributo no ordenamento jurídico, objetivando gerar receitas para que os Municípios possam custear as despesas decorrentes do serviço de iluminação pública. 4.
TERMINOLOGIA
E
CONCEITO
DA
CONTRIBUIÇÃO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA. Interessante abordagem faz Machado Segundo (2009, p. 01) quanto à terminologia dessa nova espécie de tributo, dispondo que: Vejam só o que ocorre com a palavra imposto. É logo associada a algo contrário à vontade de quem a ele se submete, não raro de forma arbitrária, excessiva... Taxa, por sua vez, é ligada - embora indevidamente - a uma restrição, a uma punição. Não raro alta e injustificada. Já a palavra contribuição, não. É doce, e tem algo de solidário envolvido em seu âmbito.
Ou seja, imposto está vinculado à imposição de uma vontade; taxa seria algo que é taxado, também opera no plano da coerção; todavia, contribuição é o
significado mais suave que exprime a cooperação da sociedade em custear as despesas públicas, com base na solidariedade e não na compulsoriedade. Nesse passo, percebe-se que a terminologia “contribuição” é menos pejorativa do ponto de vista jurídico, enquanto espécie de tributo. Todavia, essa “doçura” possui um preço para o Estado, que é justamente a necessidade dos recursos arrecadados serem aplicados na finalidade que justifica a exação, não podendo custear as despesas públicas aleatórias. Noutro giro, no âmbito conceitual podemos definir as contribuições como sendo espécie de tributo previstas na Constituição, de competência da União e, excepcionalmente, dos Municípios e dos Estados, diferentemente dos impostos, taxas, contribuição de melhoria e dos empréstimos compulsórios. E iluminação pública, de acordo com a Resolução da ANEEL nº 456, de 29 de novembro de 2000[272], em seu art. 2º, XXIV, é o: Serviço que tem por objetivo prover de luz, ou claridade artificial, os logradouros públicos no período noturno ou
nos escurecimentos diurnos ocasionais, inclusive aqueles que necessitam de iluminação permanente no período diurno.
Já no art. 20, inc. IV, a mesma resolução classifica como iluminação pública o: Fornecimento de energia elétrica para iluminação de ruas, praças, avenidas, túneis, passagens subterrâneas, jardins, vias, estradas, passarelas, abrigos de usuários de transportes coletivos, e outros logradouros de domínio público, de uso comum e livre acesso, de responsabilidade de pessoa jurídica de direito público ou por esta delegada mediante concessão ou autorização, incluído o fornecimento destinado à iluminação de monumentos, fachadas, fontes luminosas e obras de arte de valor historio, cultural ou ambiental, localizadas em áreas públicas e definidas por meio de legislação específica, excluído o fornecimento de energia elétrica que tenha por objetivo qualquer forma de propaganda ou publicidade.
Assim, a contribuição de iluminação pública é o valor cobrado pelos Municípios destinado a cobrir os gastos com os serviços de iluminação pública, tendo como objetivo final reforçar a segurança pública, pois, sem claridade nos logradouros públicos no período noturno, a ação dos delinquentes seria em maior número, e
mais difícil para se apurar e identificar os autores das referidas ações. De forma técnica, podemos conceituar a contribuição de iluminação pública como espécie de tributo prevista no art. 149-A da Constituição Federal, de competência dos Municípios, destinada ao custeio do serviço de iluminação pública, ou, conforme Sabbag (2010, p. 536), “é tributo associado à espécie das contribuições, como uma contribuição sui generis, sem que se confunda tal contribuição com as três outras, previstas no caput do art. 149 da CF/88”. 5. NATUREZA JURÍDICA DA CONTRIBUIÇÃO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA. A natureza jurídica da Contribuição de Iluminação Pública foi exaurida, no Recurso Extraordinário 573.675-0, em que ficou assentado que: A doutrina é praticamente unânime quanto à natureza tributária da exação em comento, intitulada "contribuição" pelo constituinte derivado. Isso porque, além de ter sido o art. 149-A inserido no capítulo da Constituição Federal
referente ao Sistema Tributário Nacional, o dispositivo estabelece que os Municípios e o Distrito Federal,
ao instituí-la, devem observar o disposto nos incs. I e III do art. 150. Os estudiosos assentam, ainda, que ela se amolda a todos os elementos contidos no conceito de tributo estabelecido pelo art. 32 do Código Tributário Nacional, embora haja discordância entre eles quanto à espécie a que pertence. Se seria taxa, imposto ou contribuição sui generis. Filiamo-nos ao entendimento do Ministro Ricardo Lewandowski, no sentido de que a Contribuição de Iluminação Pública – COSIP constitui um novo tipo de contribuição, que foge aos padrões estabelecidos nos arts. 149 e 195 da Constituição Federal, tratando-se de uma nova espécie de Tributo distinto de todas as espécies anteriormente existentes. 6. DA (IN)CONSTITUCIONALIDADE CONTRIBUIÇÃO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA.
DA
Considerando que, de acordo com a Doutrina e Jurisprudência do STF, a COSIP constitui-se em espécie de tributo, teremos que analisar os aspectos da sua hipótese de incidência. Todavia, não podemos fazê-lo sem antes verificar a sua constitucionalidade. 6.1 Pela constitucionalidade da COSIP. Paulo Roberto Lyrio Pimenta (apud PAULSEN, 2007, p. 165), de forma pioneira, no ano de 2003, afirmou que a Emenda Constitucional nº. 39/02 seria constitucional, pois: Poderia modificar o perfil das contribuições especiais – ao autorizar a instituição de uma contribuição distinta do modelo normativo descrito no caput do art. 149, conduta que não poder ser acoimada de inconstitucionalidade. Tais atos normativos não violaram qualquer cláusula pétrea, sendo, portanto, válidos. Infelizmente, seguindo esta linha, o STF, por
maioria dos votos, reconheceu a constitucionalidade da COSIP, em 25/03/2009, ao julgar o Recurso Extraordinário nº 573675, apresentado pelo Ministério Público Catarinense, entendendo ser constitucional a Lei Municipal de São José (SC), que disciplinava a cobrança da Contribuição para Custeio do Serviço de Iluminação Pública. 6.2 Pela inconstitucionalidades da COSIP. Contrário ao entendimento do STF, entendemos que a COSIP é inconstitucional. A EC nº. 39 foi instituída sem observar as formalidades de praxe, entre elas, a de que o projeto deveria ser aprovado em dois turnos nas duas Casas do Congresso Nacional, com período mínimo entre eles. E, conforme nos lembra Alexandre (2007, p. 81): A exigência não existe à toa. O intervalo foi previsto porque, ao menos em teoria, a mudança da Carta Magna é algo extremamente sério, que deve ser feita de maneira pensada, sem os arroubos a que uma circunstância eventual poderia levar. [...]
Na votação da Emenda Constitucional 39, todavia, a regra [do regimento interno da Câmara dos Deputados e do Senado] foi flagrantemente violada. [...] os dois turnos de votação ocorreram na mesma sessão, sem o intervalo exigido implicitamente pela Constituição Federal e explicitamente pelo Regimento Interno da Casa. Por esta razão, percebe-se a inconstitucionalidade formal existente mediante a violação ao princípio constitucional da razoabilidade, que inclui a razoabilidade dos prazos, não sendo possível pensar que uma votação de uma Emenda à Constituição para incluir um tributo novo seja realizado no apagar das luzes, ferindo ainda a moralidade pública! A EC nº. 39 inova no Sistema Tributário Constitucional, incluindo espécie de tributo não prevista pela Assembleia Nacional Constituinte, e ferindo, dessa forma, a Constituição, na medida em que “tende a abolir direitos fundamentais dos contribuintes, entre os quais o de serem tributados dentro dos limites que o Sistema Tributário Nacional estabeleceu” (MACHADO SEGUNDO, 2009). Acrescente-se a isso, o fato de que a
carga tributária já se encontrava no seu limite máximo e, surgindo um novo tributo, tende a ultrapassar a capacidade contributiva dos contribuintes e mais uma vez ferir o princípio constitucional que veda o confisco. Fere o princípio constitucional da separação dos poderes, pois a Constituição Federal, no art. 2º, dispõe que “São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”. Sendo assim, se o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade da taxa de iluminação pública, considerando que esse serviço, por ser universal, deve ser custeado por impostos, não poderia o legislador incluí-lo novamente na ordem jurídica, alterando apenas a sua roupagem, quando aquele já pacificou que os serviços públicos de caráter universal devem ser custeados por impostos e não por taxas ou outra nomenclatura criada pela mente fértil do legislador! Percebe-se, facilmente, a inexistência de harmonia entre os poderes e, sim, a imposição da vontade do legislador, diga-se, contrária à vontade popular e ao do próprio Supremo. Ainda sobre a inconstitucionalidade da
Contribuição de Iluminação Pública, Barreto (2009, p. 518) assevera que a EC 39: [...] afronta cláusulas pétreas e está insanavelmente viciada por inconstitucionalidade: primeiro porque implica a abolição dos limites do poder de reforma; derruba as balizas dessa diretriz para atribuir ao Município tributo cuja espécie a Constituição reservou à União (salvo as de sistemas previdenciária); segundo, porque a emenda aniquila o direito individual de os contribuintes não serem tributados, à luz da imodificável discriminação de rendas, plasmada na Constituição.
Sendo assim, mostra-se lastimável que o Supremo Tribunal Federal tenha constitucionalizado a EC nº. 39, Emenda eivada de inúmeros e insanáveis vícios de forma e material. 7. DAS PECULIARIDADES DA CONTRIBUIÇÃO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA – CIP. 7.1 Da efetiva utilização dos recursos da contribuição de iluminação pública. Quanto
à
utilização
dos
recursos
da
Contribuição de Iluminação Pública, percebe-se que os Municípios estão distorcendo a finalidade dessa contribuição, que é exclusivamente fazer frente às despesas de iluminação pública, e tornando-a verdadeira espécie de imposto cuja arrecadação é desvinculada, objetivando utilizá-la com fins diversos dos constitucionalmente permitidos. Nesse sentido, a arrecadação da COSIP, como regra geral, obtém mais receitas do que despesas oriundas da iluminação pública e, ao invés de reduzir as alíquotas desse tributo, com a efetiva diminuição da carga tributária, os Municípios preferem mantê-la sufocante, desvinculando sua destinação para cobrir outros serviços como a expansão da rede de iluminação pública que, na verdade, trata-se do fato gerador de outro tributo que é a Contribuição de Melhoria, dever do Estado. É perceptível, pela leitura acima das razões da proposta da Emenda Constitucional nº. 39, que o legislador constituinte derivado pretendeu apenas viabilizar o pagamento das despesas de energia elétrica decorrente da iluminação pública, e não criar nova fonte
de receita para os Municípios. Sendo assim, a cobrança de Contribuição de Iluminação Pública em valores superiores ao seu efetivo gasto será, nitidamente, inconstitucional, assim como a utilização destas receitas para cobrir gastos diversos da iluminação pública. 7.2 Análise da cobrança da COSIP na fatura de energia elétrica. O parágrafo único do art. 149-A da CF/88, que incluiu a Contribuição de Iluminação Púbica no campo de competência tributária dos Municípios e Distrito Federal, dispõe ser facultativa a cobrança da contribuição em epígrafe na fatura de consumo de energia elétrica, in verbis: Art. 149-A - Os Municípios e o Distrito Federal poderão instituir contribuição, na forma das respectivas leis, para o custeio do serviço de iluminação pública, observado o disposto no art. 150, I e III. Parágrafo único. É facultada a cobrança da contribuição a que se refere o caput, na fatura de consumo de energia elétrica.
É óbvio que o legislador apenas mencionou que a cobrança da dita contribuição poderá (faculdade) ser através da fatura de consumo de energia elétrica e, em hipótese alguma, que o pagamento da conta de energia elétrica só poderá ser realizado mediante a quitação do tributo incluído também na sua fatura. Ou seja, trata-se de simples técnica de cobrança e não pré-requisito para o pagamento da contribuição de iluminação pública o pagamento da tarifa de energia elétrica, nem o inverso, a obrigação de pagar o tributo para quitar a conta efetiva de energia. No mesmo sentido, Machado (2003, p. 02) calcifica que “ao dizer que [a COSIP] poderá ser cobrada na fatura de energia elétrica, evidentemente não disse que o seu pagamento pode ser exigido como condição para o pagamento da energia, nem que o seu fato gerador seja o consumo, ou o fornecimento da energia”. Logo, não existe obrigatoriedade do pagamento da COSIP pelo consumidor ao efetuar o pagamento da fatura de energia elétrica. Neste caso,
poderá a Fazenda Pública Municipal, através dos meios legais, inscrever o contribuinte na Dívida Ativa, extrair a Certidão de Dívida Ativa – CDA, e ajuizar ação de execução fiscal objetivando o recebimento do crédito tributário oriundo deste tributo. 7.3 Progressividades das alíquotas da COSIP. A priori, diversamente do entendimento de inúmeros doutrinadores – que conceituam a progressividade fiscal como princípio que é “alcançado através da estipulação de alíquotas mais elevadas em detrimento da maior exteriorização de riqueza demonstrada pelo contribuinte, propiciando ao legislador, por conseguinte, atenuar substancialmente a carga tributária a ser suportada pelos menos afortunados” (TAVARES, 2009, p. 38) –, preferimos inseri-la na órbita tributária, como técnica para alcançar a plenitude dos princípios constitucional-tributários da isonomia e da capacidade contributiva. Para alcançar a justiça fiscal – corolário da
capacidade contributiva e isonomia, o legislador poderá (ou deverá) adotar alíquotas progressivas que crescem de acordo com o aumento da base de cálculo do tributo, buscando onerar aqueles que demonstrem maior capacidade econômica, e diminuir o impacto econômicotributário. Neste ínterim, os Municípios vêm estabelecendo alíquotas progressivas, conforme a classe de consumidores e a quantidade de consumo de energia elétrica, fundamentando este discrímen na capacidade contributiva dos contribuintes. Em que pesem algumas teses jurídicas levantadas contra a progressividade das alíquotas deste tributo, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 573.675/SC, tendo como Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, decidiu que a “progressividade da alíquota, que resulta do rateio do custo da iluminação pública entre os consumidores de energia elétrica, não afronta o princípio da capacidade contributiva”. Mesmo ciente de que a doutrina não pode se
submeter, ou se orientar, pelas decisões judiciais, é fato a importância que os julgados do STF vêm tomando nos últimos anos, falando-se em alguns casos, inclusive, em ativismo judicial. Nesse sentido, concordamos com Sobrane[273] (2011, p. 02), ao dispor que mesmo que “o posicionamento adotado pelo STF, nessa hipótese, tenha eficácia essencialmente persuasiva, e não vinculativa (a não ser para os destinatários da lei que fora glosada na ação direta de inconstitucionalidade proposta junto ao Tribunal de Justiça de Santa Catarina), não se pode olvidar que se trata de expressivo pronunciamento do intérprete mais abalizado da Constituição da República (mormente considerando, como antes frisado, que houve apenas um voto vencido)”. Sendo assim, as alíquotas progressivas da Contribuição de Iluminação Pública, conforme entendimento do Supremo, são constitucionais. 8. CONSIDERAÇÕES FINAIS. Em síntese, a Contribuição de Iluminação
Pública - CIP é uma espécie de tributo prevista no art. 149-A da Constituição Federal, introduzida pela Emenda Constitucional 39, de competência dos Municípios e Distrito Federal, destinada ao custeio do serviço de iluminação pública. Por mais simples que seja o seu conceito, as peculiaridades da CIP, desde a sua origem até a efetiva instituição, são demasiadamente complexas. Senão vejamos: A CIP possui como antecedente imediato a Taxa de Iluminação Pública que, por não ser serviço público específico e divisível, não poderia ser custeado por taxa e sim por imposto, já que iluminação pública se trata de serviço público geral, inespecífico e indivisível. Contudo, restou calcificado pelo STF que se trata de tributo de exação inviável, posto ter por fato gerador serviço inespecífico, não mensurável, indivisível e insuscetível de ser referido a determinado contribuinte, a ser custeado por meio do produto da arrecadação dos impostos em geral (Recurso Extraordinário nº. 233.332-6, Rio de Janeiro. Taxa de Iluminação Pública); e sumulado, também pelo STF (súmula 670), ao dispor que o “serviço de
iluminação pública não pode ser remunerado mediante taxa”. Após o reconhecimento da inconstitucionalidade da Taxa de Iluminação Pública pelo Poder Judiciário e a declaração de que este serviço deve ser custeado pelos impostos, burlando a separação dos poderes, o Poder Legislativo, por razões políticas e não jurídicas, incluiu na Constituição Federal, através da Emenda Constitucional 39, uma nova espécie de tributo de competência dos Municípios e Distrito Federal, denominado de Contribuição de Iluminação Pública, para custear justamente aqueles serviços que a Corte Suprema já havia deliberado sobre a necessidade de ser custeado por impostos e não por uma nova espécie de tributo. Esse novo tributo, com a roupagem de contribuição, possui feições sui generis, pois as Contribuições previstas nos art. 149 da CF/88 são de competência da União e destinadas a Seguridade Social, Intervenção no Domínio Econômico e de Interesse das Categorias Profissionais ou Econômicas, ao passo que aquela contribuição é de competência dos Municípios e
Distrito Federal e é destinada a custear os serviços de iluminação pública. Ainda quanto ao seu nascedouro, faz-se importante mencionar que a EC nº. 39 foi instituída sem observar as formalidades de praxe, entre elas que o projeto seja aprovado em dois turnos nas duas Casas do Congresso Nacional, com período mínimo entre elas. Por essa razão, percebe-se a inconstitucionalidade formal existente mediante a violação ao princípio constitucional da razoabilidade, que inclui a razoabilidade dos prazos, não sendo possível pensar que uma votação de uma Emenda à Constituição, para incluir um tributo novo, seja realizado no apagar das luzes, ferindo a moralidade pública. A Contribuição de Iluminação Pública - CIP, como todas as contribuições especiais previstas no art. 149 da CF/88, não pode ter o destino de sua receita diverso da finalidade para a qual foi criada, nem sua arrecadação pode ser superior às despesas que originaram a sua previsão. Sendo assim, a cobrança da CIP em valores superiores ao efetivo gasto com iluminação
pública será nitidamente inconstitucional, bem como a utilização destas receitas para cobrir gastos diversos da iluminação pública. Se a arrecadação está sendo superior às despesas, ao invés de utilizar tais recursos para cobrir os gastos universais da administração pública, já custeados pelos impostos, deve ser reduzida a incidência desse tributo desonerando os contribuintes. Quanto à cobrança da CIP na fatura de energia elétrica, trata-se de mera faculdade de arrecadação, não existindo obrigatoriedade do pagamento da CIP pelo consumidor, ao efetuar o pagamento da fatura de energia elétrica. Não ocorrendo o pagamento, poderá a Fazenda Pública Municipal, através dos meios legais, inscrever o contribuinte na Dívida Ativa, extrair a Certidão de Dívida Ativa – CDA, e ajuizar ação de execução fiscal objetivando o recebimento do crédito tributário oriundo deste tributo, mas nunca condicionar o pagamento da fatura de energia ao pagamento da Contribuição em epígrafe. O Plenário do Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE nº 573.675/SC, (Rel. Min. Ricardo
Lewandowski), decidiu que a “progressividade da alíquota, que resulta do rateio do custo da iluminação pública entre os consumidores de energia elétrica, não afronta o princípio da capacidade contributiva”; logo, a CIP pode ter alíquotas progressivas buscando efetivar o princípio constitucional da capacidade contributiva e da isonomia. Por fim, não poderíamos deixar de registrar a vulnerabilidade do contribuinte frente ao Estado-Leviatã, que busca, incessantemente, arrecadar cada vez mais, sem observar a capacidade contributiva e o mínimo existencial dos contribuintes, instituindo, a cada dia, mais novos tributos, preferencialmente, criando novas contribuições talvez por seu nome ser mais ameno do que imposto ou taxa, já que trazem à tona que pagamento do tributo é imposto ou taxado, independentemente da vontade do súditos, ao passo que contribuir parece ser mais voluntário, mesmo que a contribuição seja compulsória. Assim, se é fato que os Municípios não possuem receitas tributárias próprias para custear os serviços de iluminação pública, também é fato que a
população não suporta mais pagar tributos como se fosse um país de primeiro mundo, e receber serviços públicos de países periféricos. Dessa forma, faz-se mister, com urgência, uma reforma tributária com melhor divisão das competências tributárias, garantindo mais recursos próprios aos Municípios e principalmente diminuição da carga tributária, acompanhada de mais eficiência na gestão dos recursos públicos. REFERÊNCIAS. ALEXANDRE, Ricardo. Direito Esquematizado. São Paulo: Método, 2007.
Tributário
BARRETO, Aires F. Curso de Direito Tributário Municipal. São Paulo: Saraiva, 2009. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 05 out. 1988. ______________ Lei nº. 2.308, de 31 de agosto de 1954.
Institui o Fundo Federal, de Eletrificação, cria o impôsto único sôbre energia elétrica, altera a legislação do impôsto de consumo, e dá outras providências. Diário Oficial da União. Rio de Janeiro, RJ, 31 de agosto de 1954. Disponível em: Acesso em: 22 mar 2012. ______________ Emenda Constitucional nº 39, de 19 de dezembro de 2002. Acrescenta o art. 149-A à Constituição Federal (Instituindo contribuição para custeio do serviço de iluminação pública nos Municípios e no Distrito Federal). Diário Oficial da União, Brasília, DF, Poder Legislativo, 20 dez. 2002. p. 2. MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. STF e a Contribuição de Melhoria. 2009. Disponível em: Acesso em: 23 março 2012.
MACHADO, Hugo de Brito. Contribuição de Iluminação Pública. 2003. Disponível em: http://qiscombr.winconnection.net/hugomachado/conteudo.a home=1&secao=2&situacao=2&doc_id=87. Acesso em:
23 mar 2012. ALEXANDRINO, Marcelo; VICENTE, Paulo. Direito tributário na Constituição e no STF. São Paulo: Métodos, 2009. PAULSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à luz da Doutrina e da Jurisprudência. 9ª. rev. atual. 2 tiragem. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2010. SENADO FEDERAL. Parecer nº. 303, de 2002. Diário do Senado Federal, Brasília, DF. 27 abr. 2002.
TAXAS Capítulo 23 TAXAS MUNICIPAIS. Massillania Gomes Medeiros[274] 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS. A Assembleia Nacional Constituinte, considerando que o Brasil estava em fase transitória de um regime ditatorial para um “democrático”, plasmou, de forma analítica, na Constituição Federal de 1988, o Sistema Tributário Nacional, incluindo as limitações ao poder de tributar: competência tributária, princípios e imunidade, além de prever os tributos e as suas principais peculiaridades, dentro da própria Constituição. Por isso, que a doutrina também denomina o nosso sistema tributário de Sistema Constitucional Tributário. Todavia, a CF/88 não cria tributos, apenas os
prevê e define a competência de cada ente para instituílos e reparte as suas receitas de forma vertical buscando garantir a autonomia financeira dos entes federados. Concordamos com Barreto (CTN comentado, p. 583) ao dispor que “a Carta Magna não se limita a falar em tributação ou tributos. Vai além: traça um perfil, sombreja os contornos dentro dos quais se há de erigir as hipóteses de incidência tributária”. Neste ínterim, a Constituição Federal, no art. 145 dispõe que: Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: I - impostos; II - taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição; III - contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas. [...] (Destaque nosso)
Por esse dispositivo constitucional não pairam dúvidas de que os Municípios possuem competência tributária para instituir e cobrar a taxa. Ressalve-se que não iremos tecer maiores
considerações sobre a tributação, lato sensu, nem ingressar nos pormenores constitucionais do sistema tributário, considerando que tais temas já foram explorados em outros capítulos deste livro. Concentraremos o presente estudo nas taxas, enquanto espécie de tributo comum aos entes políticos, todavia, sempre que possível, com abordagem na competência tributária municipal. 2. HISTÓRIA DAS TAXAS. A origem dos tributos, nos quais se incluem as taxas, se confunde com o próprio surgimento do Estado e do Direito. Na pré-história, o homem vivia só, entre os outros animais. Para sua sobrevivência era necessário que fosse mais forte, lutando contra o frio, fome e predadores, e mais inteligente que os outros animais, se utilizando dos conhecimentos acumulados para fabricar os seus instrumentos de proteção e caça. Os instintos naturais do homem, dentre outros fatores, fizeram com que os mesmos se agrupassem para se manterem unidos contra os
inimigos, garantindo, inclusive, a posse das melhores terras para plantio e caça. A terra passou a ser o bem mais valioso para o homem e objeto constante de cobiça e disputa, motivando o surgimento de guerras pela sua conquista e manutenção (SILVA, 2012, p. 22). E é neste momento, em que o homem passa a se agrupar, que surge o tributo, termo provindo do verbo latino tribuere: tributum, que significa “repartir entre as tribos”. Os tributos eram oferecidos como presentes aos líderes, fossem eles chefes guerreiros, faraós, reis, e até aos deuses. Considerando que apenas os mais fortes sobreviviam, os chefes eram presenteados pela sua bravura e proteção que conferia ao seu grupo, contra os animais e outros povos também rudimentares. Se num primeiro momento aqueles eram oferendas, no segundo passou a estar “na dependência da satisfação das necessidades coletivas e dos caprichos dos chefes, que o exigiam de seus súditos. Eram prestações in labora, in natura ou in pecunia, exigidas pela força e arbitrariedade” (MARTINS, 2007, p. 257) Todavia, é com o surgimento das guerras que
o caráter compulsório dos tributos fica mais perceptível. Os egípcios, assírios, fenícios, dentre outros povos da Antiguidade[275], já usavam o tributo como instrumento de servidão, através da sua imposição sobre os povos conquistados. No mesmo sentido, Moraes (apud JANCZESKI, 1999, p. 17) nos lembra que “embora sem os contornos atuais, já na Antiguidade a taxa era encontrada, observando-se que, mesmo antes de Cristo, os egípcios, os assírios e os caldeus exigiam dos povos conquistados tributos que poderiam ser caracterizados como taxa”. Em que pese os dados históricos mais remotos, o estudo científico das taxas se iniciaram por obra de Von Justi e Adam Smith, que iniciam a diferenciação com outros tributos. Justi (apud BALEEIRO, 2010, p. 303). “fixou com clareza que, em certos casos, a despesa pública não deve ser suportada por toda a coletividade, mas apenas pelo grupo de indivíduos que provocam ou que com ela se beneficia”, sendo este raciocínio o germe da teoria das taxas, no fim do século XVIII.
Forma-se assim, a noção clássica da taxa como processo de repartição de uma despesa apenas entre aqueles que se beneficiarem dela ou que deram motivo ao seu surgimento. 2.1 História das taxas no Brasil. A primeira Constituição no Brasil, datada de 1824, não tratou das espécies de tributos, limitando-se a dispor, no Título 3º, Capítulo II, art. 36, inc. I que “E´ privativa da Camara dos Deputados a Iniciativa. I Sobre Impostos”. (Grafia mantida do original) A Constituição Federal, que sucedeu a colonial, promulgada em 1891, pela primeira vez fez a diferenciação dos tributos entre imposto e taxa. Nos arts. 7º e ss esta Carta Magna dispõe que: Art 7º - É da competência exclusiva da União decretar: 1 º ) impostos sobre a importação de procedência estrangeira; 3 º ) taxas de selo, salvo a restrição do art. 9º, § 1º, nº I; 4 º ) taxas dos correios e telégrafos federais. § 2º - Os impostos decretados pela União devem ser uniformes para todos os Estados.
Art 9º - É da competência exclusiva dos Estados decretar impostos: 1 º ) sobre a exportação de mercadorias de sua própria produção; 2 º ) sobre Imóveis rurais e urbanos; 3 º ) sobre transmissão de propriedade; 4 º ) sobre indústrias e profissões. § 1º - Também compete exclusivamente aos Estados decretar: 1 º ) taxas de selos quanto aos atos emanados de seus respectivos Governos e negócios de sua economia; 2 º ) contribuições concernentes aos seus telégrafos e correios. § 2º - É isenta de impostos, no Estado por onde se exportar, a produção dos outros Estados. [...][276]
É bem verdade que, conforme leciona Janczeski (1999, p. 18) “apesar de falar em imposto e taxa, a Constituição de 1891 não estabelecia critérios rigorosos de tais conceitos”. Em meados de 1896, conforme noticiado por Baleeiro (2010, p. 299) “a palavra taxa, sem embargo de ser igualmente usada como sinônimo geral de impostos, não devia ser assim entendida ou empregada; visto como, na sua acepção própria, ela designa o gênero de contribuição, que os indivíduos pagam por um serviço diretamente recebido”.
As Constituições subsequentes, de 1934 e 1937, mantiveram a divisão bipartida, com pouco avanço na distinção entre taxas e impostos, razão pela qual foi editado o Dec.-lei 1.804/39 que conceituou os impostos e taxas, definindo-as como sendo “tributos exigidos como remuneração de serviços específicos prestados ao contribuinte ou posto à sua disposição, ou ainda contribuição para custear atividades especiais provocadas por conveniências de caráter geral ou de determinados grupos” (JANCKZESKI, 1999, p. 18). A Constituição de 1946, por sua vez, incluiu a terceira espécie de tributo – denominada de contribuição de melhoria, cuja cobrança era de competência comum da União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, bem como cuidou, de forma mais especifica, das taxas, todavia, sem alterar a sua antiga definição. A conformação jurídica do conceito apareceu com a reforma tributária de 1965, que retirou a parte final do tipo que incluía no seu conceito a contribuição para custear atividades especiais provocadas por conveniências de caráter geral ou de determinados grupos.
A Carta Magna de 1967 repetiu o conceito, já delimitado, de taxa, no seu art. 19, como sendo o tributo cobrado “pelo exercício regular do poder de polícia ou pela utilização de serviços públicos de sua atribuição, específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos à sua disposição”. Tipo mantido pela Emenda Constitucional nº. 1, de 17 de outubro de 1969. Por fim, a Constituição Federal de 1988, no art. 145, inc. II, também manteve o conceito constitucional da taxa. 3. NATUREZA JURÍDICA DOS TRIBUTOS. De acordo com o Código Tributário Nacional – CTN, art. 4º, a natureza jurídica específica do tributo é determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação, sendo irrelevantes para qualificá-la, a denominação e demais características formais adotadas pela lei, bem como a destinação legal do produto da sua arrecadação. Sacha Calmon (2006, p. 439-473) tratando deste dispositivo, leciona que:
O CTN está, no tangente à qualificação do tributo, rigorosamente certo. O que importa é analisar o fato gerador e a base de cálculo do tributo para verificar se o mesmo está ou não vinculado a uma atuação estatal, específica, relativa à pessoa do contribuinte, indiferentes o nomen juris, características jurídico-formais e o destino da arrecadação.
Entende-se por natureza jurídica específica do tributo a sua identificação como espécie, ou, em outras palavras, a posição que ocupa na ordem jurídica tributária – imposto, taxa, contribuição etc. De acordo com Machado (2002, p. 31), no CTN Comentado, o art. 4º “cuida-se de norma de efeito meramente didático, que apenas explicita o que tem de ser, com ou sem ela, em face da Constituição”, e continua ao dispor que: Reportando-se a cada uma das espécies de tributo, a Constituição deixou evidente que existem diferenças entre elas. Que uma espécie tributária com outra não se confunde. E tais diferenças não podem ser apenas de rótulo, de nome, que este legislador poderia manipular à vontade, reduzindo a nada as normas da Constituição atributivas da competência.
Ou seja, o fato gerador da obrigação tributária determinará a natureza jurídica do tributo, independente
do nomen juris. Isto porque o tributo não será nominado aleatoriamente, “ao revés, há de seguir fielmente a natureza jurídica específica [...] não será taxa somente porque assim se denominou, do mesmo modo que, reciprocamente, como imposto também não será se há de o ter, apenas porque foi batizado” (TAVARES, 2009, p. 71). No mesmo sentido, leciona Dino Jarach (1982, p. 83) que “solamente analizando la naturaleza del hecho jurídico tributario, es posible llegar a una distinción entre los tributos y las otras obrigaciones legales y entre diferentes especies de tributos”. Sendo assim, tratando-se de imposto, todavia denominado de taxa, deverá ser declarada a sua inconstitucionalidade, pela natureza jurídica do tributo, e requisitos, serem diversos da que se externa. 4. DAS TAXAS. A taxa é uma espécie de tributo vinculado, que nasce da realização de uma atividade
estatal relacionada, de modo específico, ao contribuinte. Trata-se de prestação comutativa em que é preciso, de forma apriorística, que o Estado atue - preste um serviço, enfim, faça algo em favor do contribuinte, para depois poder exigir o valor corresponde a sua atuação. Pela sua contraprestação, correspectividade[277] ou comutatividade, Carrazza (2002, p. 461) assevera que “de um certo modo prestigia o princípio da igualdade, pois se concentra na pessoa beneficiada, evitando que os demais membros da comunidade suportem os ônus econômicos de uma atuação estatal que, pelo menos diretamente, não os alcançou”. As taxas possuem previsão constitucional no art. 145, inc. II da CF/88, bem como previsão legal no art. 77 do CTN, que dispõem, respectivamente, que: Art. 145 - A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: [...] II - taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição; Art. 77. As taxas cobradas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de
suas respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição.
A partir desses dispositivos, é possível extrair inúmeras características das taxas, como a competência tributária para instituí-las, os fatos jurígenos passíveis de serem tributados mediante taxa, entre outras que veremos nos tópicos abaixo. 4.1 Diferença entre Taxa e Tarifa (Preço Público). Sem maiores discussões doutrinarias, para a finalidade deste estudo, é suficiente elencar que a taxa é um tributo vinculado, cujo fato gerador é configurado por uma atuação estatal específica, referível ao contribuinte, o que pode consistir: a) no exercício regular do poder de polícia; b) na prestação ao contribuinte de um serviço público específico e divisível ou c) na colocação à sua disposição. A taxa constitui receita pública derivado para o Estado.
Noutro giro, se a execução dos serviços públicos for transferida para terceiros, estes utilizarão a tarifa (preço público) como contraprestação pela utilização efetiva dos serviços prestados e usufruídos. Lembrando que a atividade pública é de titularidade do Estado, que apenas transfere o direito de executá-la para terceiros, que irão fazê-la com finalidade lucrativa, mas, com a devida regulamentação dos seus valores pelo Estado. A tarifa é receita pública originária. Guilherme Soares Diniz (apud MARTINS & BRITO, 2011, v. I, p. 617) ainda nos lembra que, nos casos permitidos pela Constituição, quando o Estado explora atividade econômica privada, na qual estará despido do seu poder de império, não há que se falar em cobrança de taxa, pois em sendo exploração de uma atividade privada, não se trata de serviço público, a despeito de sua prestação se dar pelo Estado. Somente é cabível o preço (tarifa). Abaixo quadro comparativo entre estas duas espécies de exações (SILVA, 2012, p. 55):
TAXA Regime jurídico tributário (legal) Regime jurídico de direito público Não há autonomia da vontade (cobrança compulsória) Não admite rescisão Pode ser cobrado por utilização potencial do serviço Cobrança não proporcional à utilização Sujeita aos princípios tributários (legalidade, anterioridade, noventena etc) Exemplos: taxa de licenciamento de importação; custas processuais; taxa de alvará de funcionamento; taxa de fiscalização dos serviços de cartórios extrajudiciais etc.
PREÇO PÚBLICO (TARIFA) Regime jurídico contratual Regime jurídico de direito privado Decorre da autonomia da vontade do usuário (é facultativo) Admite rescisão Só a utilização efetiva enseja cobrança Cobrança proporcional à utilização Não sujeito aos princípios tributários Exemplos: tarifa de ônibus; tarifa de armazenagem portuária; tarifa de água e esgoto (de acordo com o entendimento mais recente do STJ); tarifa de transporte ferroviário etc.
Considerar o princípio da capacidade econômica
Dominará a utilidade do benefício, para o obrigado ao pagamento do serviço recebido (Guilherme Soares Diniz, in MARTINS, BRITO, 2011, v. I, p. 614)
Receita derivada
Receita originária
4.2 Competência tributária para instituir as taxas. A competência tributária é aptidão, constitucionalmente qualificada, para as pessoas políticas criarem os seus tributos previstos na Constituição Federal. Percebe-se pela leitura do art. 145 e ss da Carta Magna que o constituinte originário, ao dispor sobre o Sistema Tributário Nacional, repartiu os tributos entre os entes federados, atribuindo a cada um deles (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), privativamente os seus tributos. Nesse sentido, calcificou que compete, privativamente, aos Municípios instituir o Imposto[278] Sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISSQN, Imposto
sobre Transmissão de bens intervivos – ITBI e o Imposto sobre Propriedade Predial Territorial Urbana – IPTU, além da Contribuição de Iluminação Pública[279], bem como, através da competência comum com os demais entes, instituir contribuição previdenciária dos seus servidores públicos, taxas, contribuição de melhoria[280]. Sendo assim, podemos asseverar que a taxa é um tributo de competência concorrente da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, logo, todos os entes políticos possuem aptidão constitucional para instituí-la, todavia, apenas poderão fazê-lo, efetivamente, a pessoa detentora da titularidade da ação estatal, consoante a outorga constitucional de competência para prestar o serviço ou exercer o poder de polícia. Não é por outra razão que Silva (apud BARRETO, 2002, p. 615) especifica que “Cada uma das entidades tributantes tem competência própria no que se refira ao seu campo de atuação”. Ademais, faz-se mister enfatizar que só poderá instituir a taxa o ente político que, efetivamente,
desenvolva a atividade estatal; bem como que não se invalida a possibilidade de o mesmo contribuinte submeter-se à taxa federal, a outra, estadual, e até a uma terceira, municipal, pelo fato de desenvolver determinada atividade que sobre fiscalização pelos órgãos das três esferas da federação. Nesse sentido, Barreto (2002, p. 616) assevera que “não basta, ademais, que o serviço (ou poder de polícia) seja pertinente à competência recebida. Mister é que se desenvolva com efetividade. Atividades ou serviços futuros, ainda que programados, não podem dar origem ao tributo. Dá-se o mesmo se faltar a referibilidade direta em relação ao obrigado”. Finalizando a competência tributária para instituir as taxas é de grande importância a lembrança de Ricardo Alexandre (2012, p. 25) ao dispor que “Como os estados têm competência material residual, podendo prestar os serviços públicos não atribuídos expressamente à União nem aos Municípios (CF, art. 25, §1º.), a consequência é que, indiretamente, a Constituição Federal atribuiu a competência tributária residual para instituição de taxas aos Estados”. Sendo assim, considerando que a
competência residual para instituir tributos é da União, no caso das taxas, trata-se de exceção constitucional. 4.3 Fatos geradores das taxas. O fato gerador é o fato in concreto, previsto abstratamente na hipótese de incidência que, uma vez ocorrido, faz surgir o liame jurídico-obrigacional entre sujeito ativo e passivo (contribuinte ou responsável), ou seja, é a concretização material do fato previsto em lei como suficiente ao surgimento da obrigação tributária. Percebe-se, pela leitura dos art. 77 do CTN e art. 145 da CF, que o fato gerador da taxa será “o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição”. Ou seja, o seu fato gerador é configurado por uma atuação estatal específica, referível ao contribuinte, que pode consistir: a) no exercício regular do poder de polícia; b) na prestação ao contribuinte de um serviço público específico e divisível ou c) na colocação à sua
disposição. Neste sentido, Nogueira (1989, p. 164) já ensinava que “a taxa somente pode ser arrecadada para custear o gasto com o exercício regular do poder de polícia ou com serviços públicos de respectiva atribuição, específicos e divisível, prestados ao contribuinte ou postos efetivamente à sua disposição”. O fato gerador da taxa é de extrema relevância para o ordenamento jurídico tributário, considerando que o mesmo define a natureza jurídica do tributo, nos termos do art. 4º do Código Tributário Nacional. Antes de esmiuçar as espécies de taxas, decorrente justamente do fato gerador correspondente, iremos tratar da sua base de cálculo, bem como do seu caráter contraprestacional. 4.4 Base de cálculo e caráter contraprestacional das taxas. Pelos princípios da legalidade e da tipicidade fechada, os tributos devem ser instituídos por lei e esta deverá pormenorizar os aspectos da hipótese de incidência tributária, prevendo de forma abstrata, quem
são as pessoas envolvidas (sujeito ativo e passivo), a situação hipotética (aspecto material) que, uma vez ocorrida no mundo fático (fato gerador), ensejará o nascimento da obrigação tributária, especificando também o local em que se consumará o fato gerador (princípio da territorialidade – aspecto espacial), definindo ainda o momento exato da consumação, prevendo também o aspecto quantitativo do tributo. Intrínseco ao aspecto quantitativo da hipótese de incidência tributária, a base de cálculo é “uma perspectiva dimensível do aspecto material da h.i., que a lei qualifica, com a finalidade de fixar critério para a determinação, em cada obrigação tributária concreta, do quantum debetur. [...] é a definição legal da unidade de medida, constitutiva do padrão de referência a ser observado na quantificação financeira dos fatos tributários” (ATALIBA, 2008, p. 108). Especificamente, no que tange a base de cálculo das taxas, o CTN e a CF não esmiuçaram os seus elementos, limitando-se a dispor que não poderão ter base de cálculo própria de impostos, in verbis:
Art. 77. [...] Parágrafo único. A taxa não pode ter base de cálculo ou fato gerador idênticos aos que correspondam a imposto nem ser calculada em função do capital das empresas. Art. 145. [...] § 2º - As taxas não poderão ter base de cálculo própria de impostos.
Sendo assim, na ausência de elementos legais, para se mensurar o valor, ou base de cálculo das taxas, deveremos formular o seu conceito e características com base na doutrina e jurisprudência. Percebe-se, pela doutrina a existência, de 03 (três) teorias que procuram fixar o valor da taxa, partindo da contraprestacionalidade ou não deste tributo. A 1ª teoria, defendida pelo saudoso Machado (2002, p. 36/37 e 2007, p. 443) dispõe que não existe, necessariamente, correlação entre o valor da taxa cobrada e o valor da atividade estatal exercida ou posta à disposição do contribuinte, in verbis: É freqüente o equívoco de definir a taxa dizendo que é um tributo contraprestacional. A contraprestacionalidade não é uma característica da taxa como espécie de tributo,
embora nela muita vez esteja presente. No direito positivo brasileiro, admitida como está a taxa instituída em razão do poder de polícia, deve ser afastada a idéia de contraprestação como elemento distintivo entre taxa e imposto. [...] não nos parece que exista necessariamente uma correlação entre o valor da taxa cobrada e o valor do serviço prestado ou posto à disposição do contribuinte[281], ou ainda da vantagem que o Estado lhe proporcione. Entendemos até que a instituição e cobrança de uma taxa não têm como pressuposto essencial um proveito, ou vantagem, para o contribuinte, individualmente. O essencial, na taxa, é a referibilidade da atividade estatal ao obrigado. [...] Preferimos, portanto, excluir do conceito de taxa a idéia de contraprestação, não obstante o maior respeito que temos pelas opiniões divergentes.
No mesmo sentido Jarach e Micheli (apud Janczeski, 1999, p. 32) para quem não há como pretenderse correlação do valor da taxa com o custeio do serviço, já que na sua fixação predomina a política adotada pelo legislador, que levará em conta suas finalidades (fiscais ou extrafiscais), limitando exclusivamente pela vedação do uso do tributo com efeito de confisco. Ademais, a praticidade restaria comprometida, pela dificuldade de apuração do real custo da atividade estatal e a parte correspondente a cada usuário, cuja fórmula ideal ainda
não foi encontrada. A 2ª teoria, defendida pela maioria das doutrinas, entende que a taxa é, obrigatoriamente, contraprestacional, devendo o aspecto quantitativo da sua hipótese de incidência estar relacionado ao fato gerador e vinculado aos custos da atividade estatal, seja do poder de política ou do serviço especifico e divisível, colocado à disposição do contribuinte. Neste sentido lecionam: [...] a taxa instituída em razão do exercício do poder de polícia ou de serviço específico e divisível colocado à disposição do contribuinte, deve servir ao custeio destas atividades, guardando com elas proporcionalidade. Por isso, aliás, é que se afirma que a base de cálculo a taxa precisa ter relação com uma grandeza relativa à atividade estatal, e não ao patrimônio do contribuinte. [...] Em razão da própria natureza da taxa enquanto tributo vinculado a determinada atividade estatal, que o seu aspecto quantitativo deve ser dimensionado em função de tal atividade, tem de estar em harmonia com o fato gerador, que é vinculado (PAULSEN, 2007, p. 70/71) As taxas, por sua própria natureza, representam o ressarcimento do valor da atuação estatal a elas correspondentes. Somente podem ser medidas com base custos dessa mesma atuação (MARTINS, 2012, p. 96). A base de cálculo da taxa de serviço, assim como da taxa de polícia, deve guardar simetria com custo operacional
condizente com sua prestação, isto é, ao contrário do que ocorre com os impostos, as taxas não são tributos finalisticamente vocacionados a carrear dinheiro aos cofres públicos. O valor da taxa, in genere, deve corresponder ao custo, ainda que aproximado, da atuação estatal específica. Embora certo que não se exige uma precisão matemática em sua quantificação, não menos verdadeiro é que seu valor deve ser razoável, ou seja, deve haver, no mínimo, uma correlação entre o custo da atividade estatal e o montante exigido (TAVARES, 2009, p.89) [...] conquanto não seja necessária uma perfeita coincidência entre o custo da atividade estatal e o montante exigido a título de taxa, deve haver, no mínimo, uma correlação entre ambas. [...] Portanto, a base de cálculo das taxas só poderá dimensionar o custo do exercício do poder de polícia ou dos serviços públicos específicos e divisíveis, sem qualquer alusão à condição do contribuinte (v.g., seus rendimentos, o volume das operações mercantis que presta, seu patrimônio líquido etc) (CARRAZZA, 2002, p. 477) Es de esencia de la tasa que no exceda de una razonable equivalencia entre su producto y el costo global del servicio estatal vinculado (Conclusões da XV Jornadas do Instituto Latino-Americano de Direito Tributário, apud JANCZESKI, 1999, p. 32) Escolhida pelo legislador a opção de dimensionar a materialidade da hipótese de incidência, em se tratando de taxa, significa que terá eleito, fatalmente, o valor da atuação estatal. A indicação de outra perspectiva para dimensionar a atuação do Poder Público (que em si mesma possibilite a exigência de taxa) importa criar
espécie tributária diversa da de taxa” (BARRETO, 2009, p. 469). Taxas devem revestir-se sempre do caráter de contraprestação inerente a essa espécie de tributos. Se adotar-se interpretação outra, malograr-se-ão todas as cautelas da Constituição [...] BALEEIRO (2010, p. 301) A análise de suas bases de cálculo deverá exibir, forçosamente, a medida da intensidade da participação do Estado. Acaso o legislador mencione a existência de taxa, ma eleja base de cálculo mensuradora de fato estranho a qualquer atividade do Poder Público, então a espécie tributária será outra, naturalmente um imposto (CARVALHO, 2004, p. 39)
A 3ª teoria, defendida por Ruy Barbosa (1989), com os seus ensinamentos incaducáveis, encontrou o ponto de equilíbrio quanto à mensuração do aspecto quantitativo das taxas ao sedimentar que enquanto a taxa cobrada em razão da utilização de serviço público pelo contribuinte ou posto à sua disposição é diretamente contraprestacional porque beneficia a ele, utente do serviço, a taxa cobrada para o custeio do gasto com o exercício do poder de polícia não é diretamente contraprestacional, porque quem se beneficia da regulamentação é essencialmente a sociedade e não o
contribuinte sujeito ao poder de polícia, a fiscalização ou regulamentação. Ressalve-se que o Judiciário vem flexibilizando o caráter contraprestacional das taxas, como ocorreu com Súmula Vinculante nº 29 do STF, que constitucionalizou ser possível “a adoção, no cálculo do valor de taxa, de um ou mais elementos da base de cálculo própria de determinado imposto, desde que não haja integral identidade entre uma base e outra”. 5. ESPÉCIES DE TAXAS. As taxas, de acordo com a atuação estatal, nos termos dos supracitados arts. 77 do CTN e 145 da CF, podem ser “taxas de polícia” – decorrentes do exercício regular do poder de polícia-, ou “taxas de serviços” – decorrentes da prestação de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição. 5.1 Taxa de Polícia.
Se por um lado a Constituição Federal e as normas infraconstitucionais conferem as pessoas, físicas e jurídicas, inúmeros direitos relacionados com uso, gozo e disposição da propriedade e com o exercício da liberdade, por outro, objetivando garantir a convivência harmoniosa do exercício desses direitos, a paz social e a segurança, impõe limites, restringindo-os e condicionando-os ao bem-estar social e ao interesse do Poder Público. Neste sentido, os administrados podem usar, gozar e dispor da propriedade, bem como exercer a sua liberdade, todavia, com limites e condições em proveito da coletividade ou do interesse público. Ressalve-se que “as limitações, os condicionantes, as restrições incidem sobre a liberdade e a propriedade, não sobre os respectivos direitos” (GASPARINI, 2004, p. 123). Pois bem, entende-se por poder de polícia ou polícia administrativa o direito que os entes de direito público possuem, com fundamento na supremacia da Administração Pública em relação aos administrados, de
condicionar o uso, gozo e disposição da propriedade e restringir o exercício da liberdade dos administrados. Em síntese, podemos conceituar o poder de polícia como ação estatal de fiscalização que limita o exercício de direitos e liberdades individuais em prol da coletividade, ou “atividade da Administração Pública destinada a limitar o exercício da atividade dos particulares, adequando-a aos interesses encampados no sistema normativo, impondo-lhes uma abstenção” (OLIVEIRA, 2004, p. 41). Segundo Baleeiro (2010, p. 300) “a noção de poder de polícia é indefinida e flexível, mais ou menos elástica, [...], dela fazendo depender a ordem social, a vida e a saúde dos cidadãos, o bem-estar, o ego da vida, da segurança e da propriedade etc”. No Brasil, o legislador, talvez objetivando limitar o uso dessa espécie de taxa, conceituou, no art. 78 do CTN, que o poder de polícia é a “atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou a abstenção de fato, em razão de interesse público
concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos”. Ressalve-se que o poder de polícia está relacionado diretamente a competência administrativa e a competência para legislar, previstos da Constituição Federal. Assim, cabe ao Município o exercício da polícia administrativa em prol do interesse local[282], planejando o uso e a ocupação do solo; estabelecendo normas de construção, de loteamento e fiscalizando o seu efetivo cumprimento; regulando e fiscalizando o funcionamento de estabelecimentos comerciais, obedecendo às limitações urbanísticas convenientes à ordenação do seu território; regulando a utilização dos logradouros públicos; regulando o trânsito, o transporte público, determinando, inclusive, os itinerários e pontos de estacionamento e de paradas dos transportes coletivos; regulando e fiscalizando o depósito de lixo domiciliar e
industrial, fixando normas de coleta e transporte, inclusive dos resíduos nocivos à saúde; regulando os serviços funerários e de cemitérios, além do uso de propagandas, cartazes e anúncios; regulando e fiscalizando o comércio e depósito de animais, inclusive a circulação destes nas vias públicas; regulando os serviços de mercados públicos, feiras e abatedouros etc. (TAUIL, 2006), e, decorrente destas atuações estatais o ente político estará apto a instituir (obrigatoriamente através de lei) a taxa e a cobrá-la sempre que ocorra o efetivo exercício do poder de polícia. Frise-se ainda que a utilização potencial do exercício do poder de polícia não autoriza a exigência da taxa, “apenas o efetivo exercício de atividades ou diligências, por parte da Administração Pública, em favor do contribuinte, removendo-lhe obstáculos jurídicos, mantendo-os, fiscalizando a licença que lhe foi concedida etc”. (CARRAZZA, 2002, p. 467). Todavia, o Supremo Tribunal Federal “tem orientação no sentido de que o exercício do poder de polícia é presumido em favor da Municipalidade.
Precedente. Agravo regimental a que se nega provimento.” (RE 581.947-AgR, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 16-12-2008, Segunda Turma, DJE de 27-2-2009, com repercussão geral.) 5.2 Taxa de serviços. De acordo com o art. 77 do CTN, a taxa de serviço tem como fato gerador, a utilização, efetiva ou potencial, do serviço público específico e divisível prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição. Partindo da premissa de que as necessidades e os desejos das pessoas são ilimitados e que os bens são limitados, faz-se necessário escolher os prioritários para investir e executá-los. Com o Estado é da mesma forma, os anseios dos governos são ilimitados, a vontade de realizar saneamento básico, melhorar a iluminação das vias públicas, investir em saúde, segurança, educação etc, são perceptíveis, todavia, o Estado/Governo não possui recursos financeiros para prestar todos os serviços, de saúde, educação, segurança, voltados ao lazer, que os
indivíduos precisam, por isso é preciso fazer escolhas, selecionar, naquele contexto histórico e espacial, qual será a prioridade do governo e transformar determinados serviços em público. Não é por outra razão que cada época escolhe politicamente os objetivos imediatos que devem constituir a tarefa dos serviços públicos e os inclui no ordenamento jurídico. Entende-se por serviço público “toda atividade material que a lei atribui ao Estado para que exerça diretamente ou por meio de seus delegados, com o objetivo de satisfazer concretamente às necessidades coletivas, sob regime jurídico total ou parcialmente público” (DI PIETRO, 2006, p. 114)[283]. Diferentemente do poder de polícia, em que a taxa só poderá ser cobrada mediante o efetivo exercício da polícia administrativa, no que tange aos serviços públicos, poderão ser cobrados taxa pela utilização efetiva do serviço ou potencial, quando, sendo de utilização compulsória, sejam postos à disposição do contribuinte mediante atividade administrativa em efetivo funcionamento. Por essa razão, a doutrina assevera que
“contrário do que ocorre noutros países, existem no Brasil, as taxas de serviço fruído e as taxas de serviços fruível” (CARRAZZA, 467, p. 467). Por sua vez, será específico, quando possa ser destacado em unidades autônomas de intervenção ou de necessidades públicas que o justifiquem; e divisível, quando suscetível de utilização, separadamente, por parte de cada um dos seus usuários (art. 79 do CTN). Em síntese, temos que: TAXA UTILIZAÇÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS EFETIVA
POTENCIAL
Quando por Quando, sendo ele de utilização (contribuinte) compulsória, usufruído a sejam postos à qualquer sua disposição título; mediante atividade
TIPOS DE SERVIÇ PÚBLICOS ESPECÍFICO
DIVIS
Quando Qua possam ser suscetí destacados utiliz em unidades separad autônomas de por pa intervenção, cada u de unidade, seus us
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funcionamento;
públicas;
No STF, “prevalece a ideia de que, ou um serviço é específico e divisível, ou é geral e indivisível” (ALEXANDRINO e VICENTE, 2009, p. 19). Acrescentando ainda que, na prática, a definição de serviço específico exposta no CTN perde relevância, pois o problema reside principalmente na indivisibilidade propriamente dita. Como exemplo de taxa municipal decorrente de serviços públicos, temos a taxa de coleta, remoção e tratamento ou destinação de lixo ou resíduos provenientes de imóveis, em que os Municípios cobram uma taxa pela prestação desses serviços aos contribuintes, que o usem de forma efetiva ou potencial. 6. (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA TAXA DE REMOÇÃO DE LIXO.
É importante lembrarmos que a Taxa de Limpeza Pública já foi declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, considerando que o serviço de limpeza pública é universal e não divisível e específico, in verbis: Taxas de limpeza pública e de segurança. Leis municipais (...). Acórdão que os declarou inexigíveis. (...). Decisão que se acha em conformidade com a orientação jurisprudencial do STF no que tange (...) à taxa de limpeza urbana (...), exigida com ofensa ao art. 145, II e § 2º, da CF, porquanto a título de remuneração de serviço prestado uti universi e tendo por base de cálculo fatores que concorrem para formação da base de cálculo do IPTU. Declaração da inconstitucionalidade dos dispositivos enumerados, alusivos à taxa de limpeza urbana. [...] AI 848.281-AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 20-9-2011, Segunda Turma, DJE de 4-10-2011; RE 433.335-AgR, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 3-3-2009, Segunda Turma, DJE de 20-3-2009. Vide: AI 677.891-AgR, Rel. Min.Ricardo Lewandowski, julgamento em 17-3-2009, Primeira Turma, DJE de 17-4-2009.
Em que pese a decisão do STF reconhecendo a inconstitucionalidade da taxa de limpeza pública, inúmeros municípios ainda exigem este tributo (inconstitucional) dos contribuintes que, anualmente, o
pagam juntamente com o IPTU no carnê do leão municipal. Noutro giro, no que tange a taxa pela prestação de serviços públicos de coleta, remoção e tratamento ou destinação de lixo ou resíduos provenientes de imóveis, mesmo possuindo ainda feições de serviço público universal, o Supremo Tribunal Federal, declarou a sua constitucionalidade e sumulou a matéria da seguinte forma: SÚMULA VINCULANTE Nº. 19. A taxa cobrada exclusivamente em razão dos serviços públicos de coleta, remoção e tratamento ou destinação de lixo ou resíduos provenientes de imóveis, não viola o artigo 145, II, da Constituição Federal.
Ainda quanto a constitucionalidade desta taxa, não poderíamos deixar de registrar os entendimentos dos Ministros Carlos Brito e Marco Aurélio, respectivamente, que: [...] confessa que todas as vezes que paro para refletir sobre a cobrança da taxa de lixo experimento um desconforto cognitivo. Ou seja, sem querer fazer trocadilho, hermeneuticamente, essa taxa não me cheira
bem. Todas as vezes fico em dificuldade para compreender como se pode, sem artificializar a mensuração, dividir e quantificar o consumo. E, às vezes, chego a conclusão de que, não raras as vezes, a cobrança se torna uma ofensa ao princípio da razoabilidade porque, com freqüência, há casas e apartamentos menores habitados por muita gente. Então a produção de lixo não guarda conformidade com o tamanho do imóvel. [...] há um neologismo ao se referir à volumetria, não do lixo, e sim do imóvel: metragem quadrada. E não há relação automática, de início, entre a metragem quadrada e o lixo a ser recolhido (YOSHIKAWA).
Em síntese, de acordo com o STF, temos que a taxa de limpeza pública é inconstitucional, todavia, a taxa de remoção de lixo é constitucional, ou pelo menos constitucionalizada. 7. CONSIDERAÇÕES FINAIS. Percebeu-se que, dentre os fatos geradores das taxas, temos a fiscalização decorrente do poder de polícia. Importante salientar que para a instituição desta taxa é necessário que uma lei, de natureza administrativa, anteriormente tenha disciplinado o exercício do poder de polícia para, apenas no segundo momento, o ente
tributante instituir, através de outra lei – esta essencialmente tributária –, a taxa desde que a atuação do órgão fiscalizar tenha se verificado no mundo fático e não apenas pela previsão legal no plano abstrato. Noutro giro, a atividade decorrente do poder de polícia, bem como a prestação de serviços públicos específico e divisível, passíveis de serem taxados, podem ser prestados pelo Estado de forma gratuita, como por exemplo a fiscalização sanitária (poder de polícia) e o serviço de vacinação (serviço público específico e divisível). Ainda quanto a gratuidade na prestação de serviços públicos, o art. 206, inc. IV, da Constituição Federal dispõe que “O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: IV - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais; [...]”. Ou seja, mesmo sendo o serviço público de ensino específico e divisível, por proibição constitucional, não poderá ser cobrado taxa, devendo ser custeado pelas receitas gerais do Estado, advindas, em sua maioria, pela arrecadação dos impostos. Logo, os Municípios não poderão cobrar
taxas, a título de matrícula ou mensalidade, pela prestação do serviço de ensino, da mesma forma que não poderão os demais entes federados. Nesse sentido, foi edita a Súmula Vinculante nº. 12 calcificando a impossibilidade das universidades públicas cobrarem taxa de matrícula dos alunos por expressa proibição constitucional prevista no art. 206, inc. IV, da Constituição Federal. Por fim, entendemos que a instituição das taxas, pelos Municípios, sempre que possível, devem ser valorizadas considerando que a despesa pública decorrente dos fatos geradores da taxa não devem serem suportadas por toda a coletividade, mas apenas pelo grupo de indivíduos que provocam ou que com ela se beneficia, conforme externado em linhas anteriores.
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Capítulo 24 A COBRANÇA DA TAXA DE LICENCIAMENTO AMBIENTAL PELOS MUNICÍPIOS Talden Farias[284] Geórgia Karênia Martins de Melo[285] 1.
INTRODUÇÃO
Conforme estabelece o caput do art. 225 da Constituição Federal o Poder Público e a coletividade têm a obrigação de atuar na defesa e na preservação do meio ambiente tendo em vista o direito das gerações
presentes e futuras. A função de controlar as atividades potencialmente causadoras de impactos no meio ambiente está expressamente estabelecida pelo inciso V do § 1º do citado dispositivo, que reza que, para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público “controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente”. Com efeito, o Estado no exercício do seu mister, deve utilizar-se de todos os meios lícitos para concretizar o disposto no artigo supracitado. A Lei 6.938/81 estabelece em seu art. 9º os instrumentos da Política Nacional de Meio Ambiente, dentre eles o licenciamento ambiental, no entanto, o Estado pode valerse também de outros meios para promover a defesa do meio ambiente. Desde a Lei de Política Nacional do Meio Ambiente, Lei 6.938/81 o licenciamento ambiental é uma exigência para a instalação e o funcionamento das atividades econômicas potencial ou efetivamente poluidoras em todo o território nacional. Este
procedimento é a base estrutural da gestão ambiental pelas empresas e demais atividades capazes de causar impacto ambiental, visto que cada licença ambiental aponta expressamente uma série de condicionantes que devem ser seguidos pelos empreendedores (FARIAS, 2015). O licenciamento ambiental tem por escopo garantir que o meio ambiente seja devidamente respeitado quando da instalação ou funcionamento das atividades econômicas. Embora as atividades em operação também estejam submetidas a ele, em regra, esse controle é exercido desde antes da instalação ou funcionamento da atividade econômica potencial ou efetivamente poluidora, já que para serem efetivos os instrumentos de defesa e de preservação do meio ambiente devem se pautar por uma atuação preventiva. Embora não seja um dos instrumentos previstos na Lei 6.938/81, a tributação ambiental é também um importante instrumento na defesa do meio ambiente ecologicamente equilibrado. Por outro lado, considerando que o
licenciamento ambiental é atuação do poder de polícia estatal em prol do meio ambiente, há a possibilidade do ente público impor, em razão do exercício deste poder de polícia, o pagamento de taxa como contraprestação ao órgão ambiental em razão da prestação do serviço pelo órgão licenciador. Com efeito, a taxa de licenciamento ambiental é obrigação tributária cujo fato gerador é a atuação do órgão ambiental respectivo em cada uma das fases do licenciamento ambiental. Com a entrada em vigor da Lei Complementar nº. 140/2011 ficou estabelecido que apenas um ente federativo é competente para o licenciamento dos empreendimentos e atividades potencialmente causadoras de dano ambiental. O presente artigo analisa a taxa de licenciamento ambiental e a possibilidade de sua instituição pelo município. 2. ASPECTOS GERAIS DO LICENCIAMENTO AMBIENTAL O licenciamento ambiental está previsto no
inciso I do art. 1º da Resolução 237, de 19 de setembro de 1997 do Conama, que o define como: O procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental competente licencia a localização, instalação, ampliação e a operação de empreendimentos e atividades utilizadoras dos recursos ambientais, consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental, considerando as disposições legais e regulamentares e as normas técnicas aplicáveis ao caso. A Lei Complementar nº. 140/2011, no art. 2º, inciso I define o licenciamento ambiental como “o procedimento administrativo destinado a licenciar atividades ou empreendimentos utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental”. Assim, o licenciamento ambiental é o processo administrativo complexo que tramita perante a
instância administrativa responsável pela gestão ambiental, seja no âmbito federal, estadual ou municipal, e que tem como objetivo assegurar a qualidade de vida da população por meio de um controle prévio e de um continuado acompanhamento das atividades humanas capazes de gerar impactos sobre o meio ambiente. O objetivo do licenciamento é que, mediante o embasamento de análises técnicas e de avaliação de impacto ambiental, os impactos ambientais positivos possam ser aumentados e os impactos ambientais negativos possam ser evitados, diminuídos ou compensados. O licenciamento ambiental é, pois, o processo administrativo que ao final concederá ou não a licença ambiental autorizando o empreendimento a funcionar (FARIAS, 2015). 2.1.
Licença ambiental
A licença ambiental, segundo o inciso II do art. 1º da resolução 237/97, é:
O ato administrativo pelo qual o órgão ambiental competente estabelece as condições, restrições e medidas de controle ambiental que deverão ser obedecidas pelo empreendedor, pessoa física ou jurídica, para localizar, instalar, ampliar e operar empreendimentos ou atividades utilizadoras dos recursos ambientais consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou aquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental. Para Henkes e Kohl (2005) o licenciamento é um procedimento ou um conjunto de atos cujo objetivo final é a concessão da licença ambiental, seja a licença prévia, a licença de instalação ou a licença de operação. Segundo Fiorillo (2014) licenciamento ambiental é o conjunto de etapas que integra o procedimento administrativo que tem como objetivo a concessão de licença ambiental. Para Van Acker (2015), o licenciamento
ambiental é o instrumento que implementa o princípio da prevenção, preconizado pela Conferência de Estocolmo em 1972, viabilizando a ação preventiva do Poder Público em relação aos empreendimentos potencialmente poluidores ou degradadores. Segundo Destefenni (2004) o licenciamento ambiental é o procedimento administrativo que tramita junto aos órgãos ou entidades ambientais competentes e que visa a determinar as condições e exigências para o exercício de uma atividade potencial ou efetivamente causadora de impactos ao meio ambiente. Alonso Jr. (2002) entende o licenciamento como um mecanismo de proteção ambiental e de controle da poluição e Santos (2002) apresenta o licenciamento ambiental como um instrumento preventivo e não jurisdicional de gestão ambiental. Com efeito, é licenciamento ambiental o conjunto de procedimentos realizados pelo órgão ambiental cujo objetivo é avaliar a implantação de atividades econômicas e os impactos destas no meio ambiente, com vistas a conceder a autorização para
implantação e funcionamento destas atividades desde que em conformidade com o que preceitua a legislação ambiental, com intuito de garantir que os padrões de qualidade ambiental sejam respeitados. 2.2.
Fases do licenciamento ambiental
O licenciamento ambiental, enquanto conjunto de procedimentos que visam a concessão de uma licença ambiental ao final, permitindo a instalação ou funcionamento de um empreendimento, é composto por uma sequência de fases que têm como objetivo verificar se uma determinada atividade está efetivamente adequada aos padrões de qualidade ambiental prescritos pela legislação e pelo órgão ambiental competente. Este procedimento é compreendido basicamente, de três etapas: licença prévia, licença de instalação e licença de operação. Cada etapa, em regra, deve terminar com a concessão da licença ambiental correspondente. Assim, as licenças ambientais servem para formalizar que até aquela
etapa o proponente da atividade está cumprindo o que a legislação ambiental e o que a administração pública determinam. Segundo José Afonso da Silva (2003), as licenças ambientais constituem atos administrativos que se propõem a controlar preventivamente as atividades de particulares no exercício de seus direitos, no que diz respeito à exploração ou uso de um bem ambiental de sua propriedade. Esse mesmo autor destaca que o exercício desses direitos depende do cumprimento dos requisitos estabelecidos em lei tendo em vista a defesa do meio ambiente, de forma que o particular fica condicionado à obtenção da licença ambiental por parte da autoridade competente. A primeira licença é a prévia, definida no art. 19 do Decreto n. 99.247/90 e o art. 8º da Resolução n.237/97 do Conama como sendo a licença ambiental concedida na fase preliminar do planejamento do empreendimento ou atividade, aprovando sua localização e concepção, atestando a viabilidade ambiental e estabelecendo os requisitos básicos e condicionantes a
serem atendidos implementação.
nas
próximas
fases
de
sua
Na licença prévia, é o momento em que o empreendedor manifesta a intenção de realizar a atividade, e o órgão ambiental avalia a viabilidade do projeto no tocante a localização e a concepção do empreendimento, a viabilidade ambiental deste e para estabelecer os requisitos básicos para as próximas fases. A segunda fase compreende a licença de instalação, quando se elabora o projeto executivo, reestruturando o projeto original com muito mais detalhes e no qual são fixadas as prescrições de natureza técnica capazes de compatibilizar a instalação do empreendimento com a proteção ao meio ambiente por meio das medidas técnicas adequadas. Após a instalação da atividade é que o órgão ambiental vistoria a obra com o fim de constatar se todas as exigências foram seguidas no que se refere ao controle ambiental. E, por fim, a licença de operação, última fase do licenciamento, definida no art. 19 do Decreto n. 99.247/90 e no art. 8º da Resolução n.237/97 do Conama
como sendo a licença ambiental que autoriza a operação da atividade ou empreendimento, após a verificação do efetivo cumprimento do que consta das licenças anteriores, com as medidas que condicionam a operação do empreendimento. É a licença que autoriza o inicio das atividades, quando o órgão ambiental avalia se foram cumpridas efetivamente as disposições constantes das licenças anteriores. As recomendações previstas na licença ambiental são procedimentos básicos de gestão ambiental, o que não impede que o responsável pela atividade econômica em questão tome cuidados adicionais em relação ao meio ambiente além dos já determinados pelo órgão ambiental. 2.3.
Atividades sujeitas ao licenciamento
ambiental De acordo com o art. 10 da Lei nº. 6.938/81, a exigência de licenciamento ambiental diz respeito somente a estabelecimentos e atividades utilizadoras de recursos
ambientais, considerados efetiva e potencialmente poluidores, bem como capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental. Com efeito, submetem-se ao licenciamento não apenas as atividades que poluem realmente, mas também as que simplesmente têm a possibilidade de poluir. Qualquer ente público ou privado, pessoa física ou jurídica que instale ou tenha atividades que preencham esses requisitos, sujeitam-se ao licenciamento, desde que causem ou possam causar uma degradação ambiental. As atividades sujeitas ao licenciamento ambiental estão elencadas no Anexo I da Resolução 237/97 do Conama, porém, não se limitam a esta lista posto que tem caráter exemplificativo, o que é justificável porque cada dia surgem novas atividades e tecnologias, cada uma com impactos diferentes sobre o meio ambiente e sobre a qualidade de vida. Com efeito, são raras as atividades cujo licenciamento é dispensado, visto que, são raras as atividades cujo efeito não causa algum impacto adverso ao meio ambiente.
3. COMPETÊNCIA DO MUNICÍPIO PARA REALIZAR O LICENCIAMENTO AMBIENTAL A Constituição Federal em seu art. 23, VI, estabelece que é competência comum entre os entes federativos a proteção do meio ambiente e o combate da poluição em quaisquer de duas formas. De acordo com parágrafo único deste mesmo artigo, a cooperação entre as esferas do Estado deveria ser feita através de Lei Complementar o que veio a ocorrer apenas com o advento da LC nº 140/2011, que tratou de fixar as normas para a cooperação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios nas ações administrativas decorrentes do exercício da competência comum relativas à proteção das paisagens naturais, à proteção do meio ambiente, ao combate à poluição em qualquer de suas formas e à preservação das florestas, da fauna e da flora, alterando também a Lei no 6.938/81. A LC nº. 140/2011 estabelece em seu art. 13 que os empreendimentos e atividades serão licenciados por um único ente federativo nos termos do que estabelece
a referida lei. O art. 9º, XIII, por sua vez, deixa claro que cabe aos municípios exercer o controle e fiscalizar as atividades e empreendimentos cuja atribuição para licenciar ou autorizar, ambientalmente, for cometida a este ente. A LC 140/2011 acabou de vez com a celeuma antes existente face a ausência de norma que disciplinasse as questões relativas à competência administrativa em matéria ambiental. Assim, será da competência do município licenciar as atividades cujo impacto ambiental esteja restrito aos limites territoriais do município, bem como, aqueles empreendimentos cujo licenciamento lhe for atribuído por delegação em razão de convênio firmado com o Estado, após ouvidos os órgãos ambientais do Estado, Distrito Federal e União, quando necessário (THOMÉ, 2015). Segundo Thomé (2015) não é demais lembrar que, embora a referida lei deixe claro a competência do município para licenciar atividades cujo impacto ambiental for local, este ente só poderá licenciar se tiver
instituído Conselho Municipal de Meio Ambiente, haja vista que, o licenciamento é privativo dos órgãos ambientais integrantes do SISNAMA. 4. AMBIENTAL
A TAXA DE LICENCIAMENTO
Taxa é espécie de tributo vinculada a alguma atividade estatal. Segundo Carvalho (2012) é isso que o diferencia do imposto, tendo em vista que, enquanto este último tem sua base de cálculo associada a atividades estranhas às funções estatais, a existência de taxa fica subordinada sempre a atividade do Estado. O art. 77 do Código Tributário Nacional estabelece que as taxas cobradas pelos entes federativos no âmbito de suas respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição. O poder de polícia é definido pelo art. 78 do
mesmo diploma legal: Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos. Os serviços públicos, por seu turno, são os dispostos no art. 79, quais sejam: Art. 79. Os serviços públicos a que se refere o art. 77 consideram-se: I - utilizados pelo contribuinte: a) efetivamente, quando por ele usufruídos a
qualquer título; b) potencialmente,
quando,
sendo
de
utilização compulsória, sejam postos à sua disposição mediante atividade administrativa em efetivo funcionamento; II - específicos, quando possam ser destacados em unidades autônomas de intervenção, de utilidade ou de necessidade públicas; III - divisíveis, quando suscetíveis de utilização, separadamente, por parte de cada um dos seus usuários. A competência para instituir taxas está prevista no art. 80 do CTN, é atribuição da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios conforme estabelecer a Constituição Federal, as Constituições dos Estados, as Leis Orgânicas do Distrito Federal e dos Municípios, respectivamente e conforme as esferas de atuação de cada um. As taxas, segundo Coêlho (2011) não pode ter base de cálculo de imposto, nem com preço público se
confunde. Não é imposto, porque atrelado está ao exercício do poder de polícia ou à prestação de um serviço público, efetiva ou potencial. Não é preço público visto que este decorre da prestação efetiva de um serviço público. Nesse sentido, a Súmula 545 do STF esclarece que “preços de serviços públicos e taxas não se confundem, porque estas, diferentemente daqueles, são compulsórias e tem sua cobrança condicionada a prévia autorização orçamentária, em relação a lei que as instituiu”. A instituição de taxa pode ter objetivo ambiental. A Taxa Controle e Fiscalização Ambiental (TCFA), por exemplo, é um tributo instituído e cobrado pelo IBAMA no exercício do seu poder de polícia para controlar e fiscalizar as atividades potencialmente causadoras de impactos ambientais, sendo enquadrado como contribuinte qualquer pessoa física ou jurídica que exerça atividade descrita no anexo VIII da Lei 10.165/00. A Constituição Federal estabeleceu no art. 145, II, dois fatos geradores para a taxa: (a) em razão do exercício do poder de polícia ou (b) pela utilização,
efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição. A taxa de licenciamento ambiental é tributo cujo fato gerador é a prestação de serviços pelo Estado, o que significa que, toda e qualquer atividade em que a concessão de licença ambiental seja condição para o exercício desta, pode sujeitar-se ao pagamento da referida taxa. A taxa de licenciamento ambiental, enquanto espécie tributária, só poderá ser instituída mediante lei. Com frequência e arbitrariamente, têm-se instituído taxa de licenciamento ambiental através de Resoluções ou Decretos, o que é inconstitucional, haja vista que, consoante disposto no art. 150, I da CF, a instituição ou majoração de tributos deve ocorrer mediante lei. O município de Curitiba – PR, por exemplo, instituiu taxa de licenciamento ambiental por meio do Decreto Municipal nº. 1215/04 . Nesse sentido, em decisão proferida na ADIMC 1823-DF consagrando o que estabelece o princípio
da legalidade tributária, ficou determinado que: EMENTA: AÇAO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGOS 5º, 8º, 9º, 10, 13, § lº, E 14 DA PORTARIA Nº 113, DE 25.09.97, DO IBAMA. Normas por meio das quais a autarquia, sem lei que o autorizasse, instituiu taxa para registro de pessoas físicas e jurídicas no Cadastro Técnico Federal de Atividades Potencialmente Poluidoras ou Utilizadoras de Recursos Ambientais, e estabeleceu sanções para a hipótese de inobservância de requisitos impostos aos contribuintes, com ofensa ao princípio da legalidade estrita que disciplina, não apenas o direito de exigir tributo, mas também o direito de punir. Plausibilidade dos fundamentos do pedido, aliada à conveniência de pronta suspensão da eficácia dos dispositivos impugnados. Cautelar deferida. O Tribunal, por votação unânime, deferiu o pedido de medida
cautelar e suspendeu, com eficácia ex nunc, a execução e aplicabilidade dos arts. 5º, 8º, 9º, 10, parágrafo único do art. 13, e 14, da Portaria Normativa nº 113, de 25/9/1997, e da Portaria nº. 037, de 05/3/1998, ambas do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA. Acerca da cobrança de Taxa de Licenciamento Ambiental (TLA) em conjunto com a Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental – TCFA, criada pelo artigo 17-B da Lei n. 6.938/81, tal cumulação não é possível, haja vista que se estaria tributando duas vezes o mesmo fato gerador, o que é vedado pela legislação pátria. Na hipótese de pagamento da TLA com o mesmo fato gerador que a TCFA, esta é passível de compensação, por força do que dispõe art. 17-P da norma federal. Outro aspecto importante a respeito da taxa de licenciamento ambiental é que a sua cobrança decorre da existência de atividade econômica passível de licenciamento ambiental, o que significa dizer que as
atividades em que não há necessidade de concessão de licença, ainda que situadas num mesmo imóvel onde funciona ou funcionará outro empreendimento cuja licença é exigida, só sujeita o empreendedor ao pagamento da TLA referente à atividade licenciável. De acordo com o art. 13 § 3o da Lei complementar 140/2011, o valor cobrado pela taxa de licenciamento ambiental deve ser proporcional ao custo e complexidade do serviço prestado pelo órgão ambiental licenciador. 5.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O licenciamento ambiental, um dos instrumentos de defesa do meio ambiente, é procedimento advindo da atuação do poder de polícia estatal. Em razão deste exercício, pode o ente estatal impor, por meio de lei, o pagamento de taxa como contraprestação ao órgão ambiental em razão da prestação do serviço pelo órgão licenciador. A taxa de licenciamento ambiental é, portanto,
obrigação tributária cujo fato gerador é a atuação do órgão ambiental respectivo em cada uma das fases do licenciamento ambiental. Com a entrada em vigor da Lei Complementar nº. 140/2011 ficou estabelecido a competência de cada um dos entes federativos para o licenciamento dos empreendimentos e atividades potencialmente causadoras de dano ambiental, cabendo ao município licenciar as atividades cujos impactos ocorrerem dentro dos seus limites territoriais bem como àquelas cujo licenciamento lhe for delegado pelo Estado ou União. A cobrança da taxa de licenciamento ambiental municipal fica restrita as atividades passíveis de concessão da licença ambiental respectiva e o valor cobrado pelo serviço deverá ser proporcional ao custo e complexidade do serviço prestado pelo órgão ambiental. REFERÊNCIAS ALONSO JR., Hamílton. Da competência para o licenciamento ambiental. In: FINK, Daniel Roberto;
ALONSO JR, Hamilton; DAWALIBI, Marcelo (orgs). Aspectos jurídicos do licenciamento ambiental. 2 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2002. CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011. DESTEFENNI, Marcos. Direito penal e licenciamento ambiental. São Paulo: Memória Jurídica, 2004. FARIAS, Talden. Licenciamento ambiental: aspectos teóricos e práticos. 5. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2015. FIORILLO, Celso Antonio Pachêco. Curso de direito ambiental brasileiro. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. HENKES, Silviana Lúcia; KOHL, Jairo Antônio. Licenciamento ambiental: um instrumento jurídico disposto à persecução do desenvolvimento sustentável. In: BENJAMIN, Antônio Herman de Vasconcellos e (org). Paisagem, natureza e direito/landscape, nature and law. São Paulo: Instituto O Direito por um Planeta Verde, 2005.
VAN ACKER, ambiental.
Francisco (Apostila
Thomaz. Licenciamento básica III).
http://www.ambiente.sp.gov.br/EA/adm/admarqs/Dr.VanAc . Acesso em 6.4.2015. SANTOS, Maria Walquiria Batista dos. Licenciamento ambiental. Fórum de direito urbanístico e ambiental, nº. 02. Belo Horizonte, Editora Fórum, 2002. SILVA, José Afonso da. Direito ambiental constitucional. 4 ed. São Paulo: Malheiros, 2003. THOMÉ, Romeu. Manual de Direito Ambiental. 5. ed. Salvador: Editora JusPodivm, 2015. .
CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA Capítulo 25 CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA COM VIÉS MUNICIPAL Paulo Antônio Caliendo Velloso da Silveira[286] 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS. A contribuição de melhoria é a espécie tributária cobrada quando da realização de uma obra pública, da qual decorra, para os proprietários de imóveis adjacentes, uma valorização (ou melhoria) de sua propriedade, estando previsto no art. 145 III da CF/88. Esse instituto é conhecido, desde muito tempo, no direito estrangeiro e, especialmente, no Direito norteamericano e visava corrigir uma anomalia frequente no Estado patrimonialista, qual seja, o fato de recursos públicos serem utilizados para custear a realização de
obras que beneficiavam um reduzido grupo de pessoas apesar do concurso de todos os contribuintes em seu custeio. Esses poucos viam o seu patrimônio valorizar-se sobremaneira com o esforço da maioria, em verdadeiro uso privado do patrimônio público. É como uma reação ao enriquecimento injusto em detrimento da coletividade que surge a exigência da cobrança da contribuição de melhoria (BILAC, 1940, p. 08). O instituto da contribuição de melhoria realiza-se como um similar público ao princípio privado de vedação do enriquecimento sem causa ou injusto. O fundamento deste instituto pode ser buscado na ideia de justiça reparativa ou corretiva, ou seja, na noção de que esta tributação tem um sentido excepcional de vedar que ocorra o locupletamento de alguns em benefício do todo e, portanto, cabe à tributação corrigir uma falha no sistema de financiamento de obras públicas que provocam uma valorização imobiliária. Para Bilac Pinto os fundamentos desse instituto deveriam ser buscados na noção de equidade. Em nosso entender a equidade tal como é tratada no direito privado e na teoria
geral do Direito pode ser considerada como um método de integração normativo limitado para as tarefas que se exigem da contribuição de melhoria. 2. DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO DA CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA NO DIREITO ESTRANGEIRO. A origem histórica do instituto da contribuição de melhoria é disputado pela doutrina, para alguns doutrinadores este tipo de tributo tem suas origens na cobrança para a reconstrução dos diques do rio Tamisa na Londres de 1250, para outros doutrinadores este tributos surgiu pela primeira vez em Florença, na Itália de 1296. Outros inclusive encontram precedentes no Direito Romano para este instituto, informando Virgilio de Sá Pereira que os proprietários, segundo o Digesto, deveriam pagar por determinadas obras. No direito português a origem histórica do instituto está vinculado a cobrança das Fintas, que era um instituto tributário previsto nas Ordenações Filipinas de
1562. Esse instituto tinha por objetivo custear a construção e manutenção de estradas, pelas pessoas que fossem por elas beneficiados, bem como o fazimento e desfazimento de muros, pontes e calçadas[287]. Igualmente já as Ordenações Manuelinas em 1514, em seu Livro Primeiro, Título LVXII tratava das fintas para fazimento e desfazimento de obras com o intuito inclusive de defesa da cidade[288]. Como elemento relevante cabe ressaltar que este dispositivo proibia o excesso de cobrança, de tal forma que as sobras dos valores arrecadados deveriam ser devolvidos, sendo vedada a sua aplicação em destinação diversa daquela para o qual foi criado o tributo[289]. Apesar das diferentes experiências históricas essa espécie tributária somente recebeu uma caracterização geral e aplicável a todos os tipos de obras públicas, devendo ser considerado o meio correto de financiamento da atividade estatal no direito norteamericano em 1691.
3. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA NO DIREITO BRASILEIRO. O primeiro caso de utilização da contribuição de melhoria teria ocorrido em solo brasileiro com a utilização do instituto das fintas, em 1812, na Bahia, para a edificação de obras públicas, bem como no reparo de pontes em Mariana, em Minas Gerais, em 1818. 3.1 A contribuição de melhoria na Constituição Federal de 1988. A Constituição de 1988 foi ainda mais omissa que os textos anteriores sobre os limites individuais e totais da contribuição de melhoria, aumentando ainda mais os questionamentos sobre o posicionamento constitucional. Determina o dispositivo constitucional que: Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: (...) III – contribuição de melhoria, decorrente de obras
públicas;
Novamente o texto constitucional reabre o debate doutrinário sobre a natureza do instituto. A corrente minoritária irá defender que o texto constitucional irá permitir a tributação independentemente da mais valia sob os seguintes argumentos: i) a tributação deve decorrer da repartição de encargos entre os proprietários de terrenos na Zona de Influência, em razão de sua área; ii) ocorrendo mais-valia imobiliária (melhoria) esta será tributada pelo Imposto de Renda; iii) ocorrendo desvalia imobiliária (pioria) será devida a indenização e a repetição do tributo pago, em obediência ao princípio do solve et repete. Os argumentos contrários a essa posição são as seguintes:
i) a mais valia imobiliária decorre de conduta do Estado e não do contribuinte e, portanto, foge aos objetivos do Imposto de Renda que exige a conduta do particular; ii) o princípio solve et repete na desvalia imobiliária fere os fundamentos do Direito Tributário contemporâneo. Para os defensores da teoria da mais valia o texto constitucional de 1988 recepcionou tanto os conceitos e regramentos previstos no Código Tributário Nacional quanto no Decreto Lei nº195/67. 4. NATUREZA E ELEMENTOS DAS CONTRIBUIÇÕES DE MELHORIA NO DIREITO BRASILEIRO. A primeira questão surgida se relaciona à natureza autônoma ou não da contribuição de melhoria; bem como aos seus fundamentos jurídicos e econômicos.
O segundo aspecto envolvido se relaciona ao modelo de contribuição adotado no direito brasileiro, seja este sobre o custo ou sobre o benefício. Por último, far-se-à uma análise dos elementos constitutivos deste instituto. 5. DISTINÇÃO ENTRE IMPOSTOS, CONTRIBUIÇÕES DE MELHORIA.
TAXAS
E
Duas correntes dominaram os primeiros debates sobre a natureza da contribuição de melhoria, uma autonomista que enxergava no instituto uma nova espécie tributária e outra que entendia ser este uma subespécie de taxa. Na primeira corrente encontramos Bilac Pinto, Aliomar Baleeiro, Ruy Barbosa Nogueira e Rubens Gomes de Souza, e na segunda a chamada “escola paulista da taxa de melhoria”. A divisão entre as duas escolas tinha diferenciais profundos em termos conceituais, sendo que a escola autonomista defendia a contribuição de melhoria como uma forma de tributação da mais-valia, ou seja, da valorização do imóvel, enquanto que a escola paulista
defendia a tributação como uma forma de recuperação da valorização. A primeira, defendia a teria do benefit assessment com a tributação pela a valorização, enquanto que a outra defendia o cost assessment desconsiderando o benefício individual que a tributação acarretava para o particular individualmente considerado. A escola paulista assumiu esta denominação pelo prestígio de seus defensores e pelas posições de destaque na prefeitura e no governo estadual de São Paulo na década de 30 e 40. Estavam dentre os seus defensores Osvaldo Aranha Bandeira de Mello, Theotonio Monteiro de Barros, Carlos A.A. de Carvalho Pinto, J. H. Meirelles Teixeira, Francisco Campos, Themistocles Cavalcanti e Pontes de Miranda. Cabe relembrar que este debate recebeu um reforço pela omissão da Constituição de 1937 sobre a aceitação da contribuição de melhoria e se encerrou com a inclusão expressa do instituto no texto constitucional de 1946. A principal crítica deste grupo pode ser resumida no comentário de Carvalho Pinto [290] de que: “a taxa, se cobrada exatamente proporcional (...) à
valorização do imóvel traria complicações (inestimáveis) de avaliação e de lançamento”. Apesar da consagração constitucional na década de 50 surgiram novos doutrinadores destinados, tais como Aristophanes Accioly, a questionar a tese da consagração da tributação da mais valia como núcleo axiológico da contribuição de melhoria. Para essa corrente dicotômica, as contribuições de melhoria não possuem autonomia tributária perante outras figuras, não se caracterizando como espécie tributaria autônoma. Tal conclusão decorre do fato de que pela sua base de cálculo ela será um tributo tipo imposto de renda ou taxa. Ela será tipo imposto de renda se houver a tributação de uma mais valia ou taxa quando representar a remuneração pelo custo de uma obra pública que gera benefícios referíveis ao contribuinte. Em nosso entendimento a contribuição de melhoria deve ser entendida como uma forma autônoma de tributo de tipo contribuição sobre o benefício, conforme iremos demonstrar a seguir.
6. DA NATUREZA DE CONTRIBUIÇÃO MELHORIA TIPO BENEFÍCIO NO DIREITO BRASILEIRO. O modelo brasileiro de tributação de melhoramentos por obras públicas segue o princípio da tributação pelo benefício [291] e não pelo custo. Tanto uma concepção quanto a outra possuem sólidos argumentos em sua defesa, que exporemos a seguir: i) Da defesa da contribuição tipo custo. A defesa da contribuição de melhoria cobrada em função do custo de obras públicas possui como argumentos: 1. argumento financeiro: é muito difícil proceder a cobrança da contribuição de melhoria considerando a valorização imobiliária, dado que os cálculos exigidos são muito complexos e, portanto, isso reflete a parca experiência nacional na tributação para o financiamento de obras públicas com o recurso a este tipo de tributo;
2. argumento moral: a exigência de requisitos desarrazoados para a cobrança do instituto implica em uma “impunidade” fática para o uso de recursos públicos que valorizam imóveis privados e acarretam uma ofensa ao princípio da igualdade e à vedação do enriquecimento sem causa; 3. argumento econômico: a cobrança da contribuição de melhoria com base no custo da obra implica em um combate à especulação imobiliária ao mesmo tempo que tributa o aumento da utilidade geral do imóvel e de seu contexto urbano, mas principalmente pela realização do objetivo constitucional de redistribuição de riquezas ao tributar pessoas com maior capacidade contributiva. ii) Da defesa da contribuição de tipo benefício. São argumentos em favor da tese da contribuição de tipo benefício, em nosso entender, são: 1.
argumento
moral:
a
tributação
da
contribuição de melhoria representa uma forma de combate o enriquecimento sem causa. Desse modo, deve existir um nexo entre a obra e a valorização imobiliária sob pena de existir um ganho “injustificado” ou “imoral”. Por outro lado, se existir a tributação sem que exista a valorização imobiliária para o proprietário poderia surgir o questionamento sobre o porquê somente um contribuinte deverá suportar os encargos de uma obra que traz benefícios para todos e nenhum benefício particular para este. Em sentido contrário, a cobrança da contribuição de melhoria sem valorização imobiliária seria uma forma de confisco do patrimônio do contribuinte. 2. argumento econômico: a tributação da valorização imobiliária é uma forma de combate à especulação imobiliária, mas deve igualmente significar uma forma de financiamento público por meio da cobrança de tributos que não trazem benefício particular para o contribuinte. O Estado Contemporâneo pressionado por demandas sociais e limitado na geração de recursos poderia ver-se estimulado a utilizar a contribuição de melhoria como uma forma de incremento dos recursos
públicos cobrando este tributo sem trazer benefícios diretos para o proprietário. Por outro lado, este tipo de instituto não se permite a adequada redistribuição de riqueza, existindo tributos mais adequados a esta finalidade; 3. argumento financeiro: a tributação da maisvalia decorrente de obras que tragam melhorias diretas para o contribuinte tem o papel de reservar este tributo para situações residuais de financiamento de obras públicas que tragam claramente o aumento de valor imobiliário para os contribuintes. O financiamento de obras públicas que trazem um benefício geral para toda a sociedade deve continuar a ser realizado por meio de impostos. Apesar da profundidade dos argumentos, nos posicionamos claramente pela conveniência e correção da tributação da contribuição de melhoria tão somente no caso de valorização imobiliária decorrente de obras públicas, pelos argumentos que destacamos acima. Como se pode notar a defesa da contribuição de melhoria tipo
custo somente se sustenta na argumentação sobre a dificuldade na cobrança do tributo, tal argumento, contudo, não adquire uma relevância significativa em virtude do fato de que em nosso entender este é um tributo residual que deve ser usado somente em casos extremos, não sendo capaz de substituir o financiamento de obras públicas por meio de impostos. Os impostos são e devem continuar sendo a principal forma de custeio dos melhoramentos públicos. A cobrança de contribuição de melhoria deve somente ser cobrada em casos notórios de valorização que impliquem em substancial enriquecimento do contribuinte e jamais pode ser entendida como forma de substituição de tributos gerais. 6.1. Regime da contribuição melhoria no direito brasileiro. O tratamento da contribuição de melhoria no direito brasileiro passa pela análise do texto constitucional e da recepção tácita dos dispositivos do Código Tributário Nacional e o Decreto-Lei 195/67 sobre
a matéria. O
Código Tributário Nacional, Lei
5.172, de 25 de outubro de 1966, e o Decreto-lei n° 195, de 24 de fevereiro de 1967 foram editados sob a égide da Constituição Federal de 1946 e apesar de possuírem o mesmo arcabouço constitucional não possuem textos idênticos. O CTN tratou da contribuição de melhoria nos artigos 81 e 82, definindo o fato gerador e a base de cálculo do tributo da seguinte forma:
CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL
DECRETO-LEI N° 195/67
“Art. 81 – A contribuição de melhoria cobrada pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, é
“Art. 1º: A Contribuição de Melhoria, prevista na Constituição Federal, tem como fato gerador o acréscimo do valor do imóvel localizado nas áreas beneficiadas direta ou
instituída para fazer face ao custo de obras
indiretamente por obras públicas.”
públicas de que decorra valorização imobiliária, tendo como limite total a despesa realizada e como limite individual o acréscimo de valor que da obra resultar para cada imóvel beneficiado. Art. 82. A lei relativa à contribuição de melhoria observará os seguintes requisitos mínimos: I – publicação prévia dos seguintes elementos: a) memorial descritivo do projeto; b) orçamento do custo da obra;
Art 3º A Contribuição de Melhoria a ser exigida pela União, Estado, Distrito Federal e Municípios para fazer face ao custo das obras públicas, será cobrada pela Unidade Administrativa que as realizar, adotando-se como critério o benefício
c) determinação da parcela do custo da
resultante da obra, calculado através de
obra a ser financiada pela contribuição; d) delimitação da zona beneficiada; e) determinação
índices cadastrais das respectivas zonas de influência, a serem fixados em regulamentação dêste Decreto-lei.
do fator de absorção do benefício da valorização para toda a zona ou para cada uma das áreas diferenciadas, nela contidas; II- fixação de prazo não inferior a 30 (trinta) dias, para impugnação, pelos interessados, de qualquer dos elementos referidos no inciso anterior; III – regulamentação do processo administrativo
de instrução e julgamento da impugnação a que se refere o inciso anterior, sem prejuízo da sua apreciação judicial. § 1º A contribuição relativa a cada imóvel será determinada pelo
§ 1º A apuração, dependendo da natureza das obras, far-se-á levando em
rateio da parcela do custo da obra a que se refere a alínea “c”, do inciso I, pelos imóveis situados na zona beneficiada em função dos respectivos fatores individuais de valorização.
conta a situação do imóvel na zona de influência, sua testada, área, finalidade de exploração econômica e outros elementos a serem considerados, isolada ou conjuntamente. § 2º A determinação da Contribuição de Melhoria far-se-á rateando, proporcionalmente, o custo parcial ou total das obras,
entre todos os imóveis incluídos nas respectivas zonas de influência. § 3º A Contribuição de Melhoria será cobrada dos proprietário de imóveis do domínio privado, situados nas áreas direta e indiretamente beneficiadas pela obra.
Como podemos verificar, os dois textos possuem profundas divergências, enquanto o CTN fala em “imóveis valorizados”, o DL n° 195/67 trata dos “imóveis beneficiados”. Novamente encontramos a disputa histórica do direito tributário nacional reeditada nestes dois diplomas. O que pode exigir a seguinte interpretação: i)
o DL n° 195/67 viola a CF/46 e o texto
do CTN[292]; ii) o DL n° 195/67 não possui natureza de lei complementar e, portanto, não pode alterar o conteúdo e alcance do CTN; iii)
não há revogação do modelo de
contribuição de melhoria tipo benefício (“imóveis valorizados”) pela não recepção deste dispositivo pela CF/46; EC n° 23/83 e CF/88; iv) o DL n° 195/67 não seria aplicável, pois não teria recebido a regulamentação exigida pelo art. 20 (“Dentro de 90 (noventa) dias o Poder Executivo baixará decreto regulamentando o presente decreto-lei, que entra em vigor na data de sua publicação”). 7. ELEMENTOS DA CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA NO DIREITO BRASILEIRO. Iremos considerar para fins de análise dos
elementos da contribuição de melhoria no Direito brasileiro o modelo da Regra-Matriz de Incidência Tributaria proposto pelo Prof. Paulo de Barros Carvalho. 7.1 Aspecto Material. O aspecto material da contribuição de melhoria, conforme já demonstrado, é composto pela realização de melhoria de que decorra valorização imobiliária. Em função do estreito vínculo entre o fato gerador deste tributo e a formação de sua base de cálculo iremos alterar, para fins didáticos, a apresentação dos aspectos componentes da Regra-Matriz de Incidência Tributária descrevendo a seguir o seu aspecto passivo. 7.2. Aspecto Pessoal. A contribuição de melhoria tem como sujeitos ativos a União, Estados, Distrito Federal e Municípios, no âmbito das suas competências constitucionais, conforme determina o art. 81 do CTN. As competências estarão
estabelecidas, por sua vez, no texto constitucional nos art. 21 (União); art. 23 (competência comum); art. 25 (Estados Federados) e art. 30 (Municípios). Não podem, contudo, as empresas públicas e as sociedades de economia mista cobrar contribuições de melhoria por força do impedimento do art. 173, § 1° da CF/88. A competência tributária é indelegável, nada impedindo a realização de um convênio que possibilite a arrecadação e fiscalização de tributos, como no caso a contribuição de melhoria[293], podendo assim atribuir a outro ente federado ou mesmo a uma entidade privada a cobrança e a fiscalização do tributo. Cabe, contudo, ao poder público competente instituir o tributo por meio de lei, executar a obra, lançá-lo e atribuir a terceiro a sua arrecadação. O sujeito passivo da contribuição de melhoria pode ser definido como contribuinte e responsável. O contribuinte é aquele proprietário beneficiado pela execução de obra pública que adquire valorização imobiliária. A definição do contribuinte somente pode ser realizada obra a obra pela “determinação da Zona de
Influência” de cada obra. Outra dúvida se dirige à extensão da imunidade do art. 150, VI, “a” da CF/88 aos imóveis públicos. Nesse caso, a doutrina se divide. De um lado encontramos aqueles que defendem a: i) não-incidência sobre os imóveis públicos (Barreto); ii) incidência, dado que a regra geral é de incidência e não existem exceções expressas (Ataliba[294]); iii) incidência aos bens dominicais e de uso especial que podem ser desafetados e valorizados irão gerar um incremento financeiro para o Estado, diferentemente dos bens de uso comum (Biava e Carlos Alberto Alves de Carvalho Pinto). Concordamos com este entendimento de Biava. Entendemos que a regra de exclusão de competência do art. 150, VI, “a” da CF/88, que estabelece a imunidade recíproca não estabelece nenhuma forma de distinção entre a propriedade privada e pública, mas deve levar em consideração as modalidades de bens públicos. Essa distinção entre a incidência de contribuição de melhorias em bens públicos e particulares não aparece nem no CTN nem na CF/88, mas tão somente no art. 2° do
Decreto-Lei nº 195, de 24 de fevereiro de 1967, que determina que “será devida a Contribuição de Melhoria, no caso de valorização de imóveis de propriedade privada (...)”. Os imóveis públicos podem ser de três espécies: de bens dominicais, de uso especial ou de uso comum; assim, cada uma dessas espécies possui características distintas e, portanto, devem receber tratamento tributário diverso. No caso dos bens de uso comum, dado que são bens fora de mercado e que estão afetados para servirem ao conjunto da coletividade e, portanto, onde o incremento financeiro possui uma relevância menor em relação à sua função pública não deve existir a incidência de contribuição de melhoria. 7.3. Aspecto Espacial. A contribuição de melhoria deve incidir sobre os imóveis situados na “Zona de Influência” da obra. Este conceito é extremamente fluido e difere de obra para obra e de contexto. Dessa forma, uma obra de drenagem urbana
irá produzir benefícios diferentes de uma pavimentação de uma rua ou de uma rede de esgoto, o que torna a tarefa de delimitação deste objeto bastante complexa na exigência de critérios de determinação. 7.4. Aspecto Quantitativo. O aspecto quantitativo divide-se em base de cálculo e alíquota. A base de cálculo determina o montante a sofrer a incidência da alíquota. 7.4.1. Base de Cálculo. A base de cálculo da contribuição de melhoria é dada pelo disposto no art. 81 do CTN que determina que: “(...) custo de obras públicas de que decorra valorização imobiliária, tendo como limite total a despesa realizada e como limite individual o acréscimo de valor que da obra resultar para cada imóvel beneficiado”. Encontramos na formação da base de cálculo os seguintes elementos: i) limites totais: custo da obra e ii) limites
individuais: valorização imobiliária A) Limite total: Custo da obra. Devem fazer parte da determinação do custo da obra pública: a) custo de terra e de edificações, bem como de eventuais desapropriações que vierem a ser necessárias; b) custo de construção, incluindo-se a parte de projetos preliminares, do projeto executivo, execução e fiscalização da obra; c) eventuais indenizações decorrentes da obra; d) custo de administração tributária da arrecadação, cobrança e fiscalização do tributo, em geral; e) reserva de contingência como proteção contra imprevistos da obra; f) custos financeiros, decorrentes da diferença temporal entre os ingressos e as despesas, como forma de compensar o custo de administração financeira e g) honorários de representantes e suplentes. B) imobiliária.
Limites
individuais:
valorização
A determinação da valorização como limite individual da contribuição de melhoria possui diversos objetivos, tais como: i) ser uma proteção do indivíduo a uma cobrança confiscatória do Estado e ii) servir como uma retribuição pelo acréscimo patrimonial decorrente da obra pública, como obstáculo ao enriquecimento sem causa. A valorização deve levar em consideração tão somente o acréscimo de valor decorrente da obra, expurgando-se os valores decorrentes do aumento em virtude da inflação, da valorização geral da comunidade ou de fatores externos ao benefício público. Na determinação do valor venal do imóvel utiliza-se, como critério básico, a área da propriedade e como critérios complementares: 1) distância do imóvel em relação à obra; 2) acessibilidade do imóvel à obra; 3) localização do imóvel em relação à obra; 4) forma geométrica do imóvel; 5) topografia do imóvel; 6) condições naturais da área que circunda o imóvel; 7) uso do imóvel (finalidade da exploração); 8) condições sócioeconômicas dos habitantes.
7.4.2. Da fórmula de cálculo. A determinação da base de cálculo tem sido idealizada pela doutrina de duas formas[295]: i) Valor proporcional da valorização: para os defensores desta teoria a base de cálculo da contribuição de melhoria seria o percentual aplicado à valorização de um imóvel. Assim para Carrazza (1998, p. 346) e Coelho (1996,
p. 411).
A representação lógica da presente fórmula
seria: Vp = Bc x Alq; onde Vp= valor do tributo a pagar; Bc = base de cálculo e Alq= alíquota. Por exemplo, se um imóvel possuir o valor de R$ 100.000,00 e tiver uma valorização de 10% (R$ 10.000,00) haverá a aplicação de uma alíquota sobre a valorização imobiliária, assim, por exemplo seria aplicável uma alíquota de 5% sobre o valor da valorização gerando um valor a pagar de R$ 500,00. ii) Valor integral da valorização:
Para Robson Lima (2005) a doutrina tradicional erra ao confundir a base de cálculo dos impostos com a base de cálculo da contribuição de melhoria. Para o autor, esse tipo de sistema de cálculo é aplicável aos impostos, mas não para a contribuição de melhoria. Para ele, se for aplicado um percentual sobre o valor da valorização ocorreria uma redução da base de cálculo e, portanto, a alíquota da contribuição de melhoria deve ser o percentual do valor do imóvel, ou seja, Alq = % de Vi (modelo de contribuição de melhoria). Desse modo, há uma clara diferença com o modelo tradicional de formação da base de cálculo dos impostos, em que Alq = % da Bc. Assim, na contribuição de melhoria a Base de Cálculo e a Alíquota não existem, sendo esse tributo possuidor de um critério quantitativo simplificado. iii) Fatores individuais de valorização: Entendemos que se aplica à contribuição de melhoria o art. 82, § 1° do CTN que determina que os limites individuais de valorização serão calculados
conforme os “fatores individuais de valorização”. Desta forma, não há no direito brasileiro a aceitação do princípio de excess condemnation ou de desapropriação integral do valor da valorização, mas a aplicação de um percentual decorrente da valorização que será aplicável à base de cálculo que é dada pela diferença de valor do imóvel antes e depois da obra (Δ Vi = Vi¹ - Viº). Assim sobre o acréscimo de valor do imóvel (Δ Vi) deverá ocorrer a aplicação do fator individual de valorização (Fiv) a ser definido em lei. Assim, a fórmula a ser aplicada seria Vp= Δ Vi x Fiv. Se um imóvel, por exemplo, possuía um valor de R$ 100.000,00 antes da obra (Viº) e passou a valer R$ 150.000,00 (Vi¹), então a diferencial de valorização será R$ 50.000,00 (Δ Vi). Sobre este valor será aplicado o fator individual de valorização pelo benefício auferido (p.ex.; 10%), o que daria o valor de R$ 5.000,00. 7.5. Aspecto Temporal. Conforme
demonstrado
anteriormente,
a
contribuição de melhoria tipo valorização somente pode ocorrer após a realização da obra, visto que designa a diferença entre o valor antes da obra e depois desta. 7.6 Lançamento. O lançamento da contribuição de melhoria deve levar em consideração as seguintes etapas: 1) anúncio da obra ou do plano (primeira notícia sobre a mesma); 2) término dos estudos de viabilidade; 3) aprovação definitiva da execução; 4) licitação (algum momento desde sua abertura à adjudicação); 5) início dos trabalhos; 6) inversão efetiva de certa parcela do custo total; 7) término da obra; 8) inauguração da obra (colocação em serviço).
Como se pode perceber o lançamento da contribuição de melhoria é um ato administrativo complexo, que envolve um conjunto de atos preliminares e preparatórios, sem os quais ocorrerá a nulidade do lançamento. Dentre esses atos podemos destacar a exigência de um edital prévio. A cobrança somente poderá ocorrer após a realização da obra pública, mas o seu edital de cobrança pode ser publicado depois da realização da obra, visto que não existe nenhuma ofensa ao direito do contribuinte na designação da base de cálculo ou de seus direitos. Ao contrário do entendimento de determinadas decisões judiciais entendemos que a instituição da contribuição de melhoria decorre de lei e não pode ser determinada por decreto, tal qual a peça orçamentária não pode ser redigida em decreto a realização de obras públicas relevantes com cobrança de tributos deve ser antecedida de lei municipal ou estadual autorizativa com a discriminação das obras previstas para o ano e sua fonte de custeio.
8. ANÁLISE DE CASOS CONTROVERSOS. 1. Cobrança de contribuição somente com base no custo da obra: trata-se de inconstitucionalidade, visto que a CF estabeleceu o sistema de duplo limite, ou seja, pelo lado da Administração Pública o limite máximo a cobrar é o custo da obra e pelo lado do administrado o limite máximo a pagar é a valorização imobiliária decorrente de obras públicas. Conforme o STF” 2. CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA VALORIZAÇÃO IMOBILIÁRIA - CF/67, ART. 18, II, COM A REDAÇÃO DA EC Nº 23/83 - CF/88, ART. 145, III - Sem valorização imobiliária, decorrente de obra pública, não há contribuição de melhoria, porque a hipótese de incidência desta é a valorização e a sua base é a diferença entre dois momentos: o anterior e o posterior à obra pública, vale dizer, o quantum da valorização imobiliária. (STF - RE 114.069-1 - São Paulo - 2ª T. Rel. Min. Carlos Velloso - DJU 30.09.1994). 3. Necessidade de edital prévio:
“TRIBUTÁRIO, CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA, EDITAL, conforme: “O art. 82 da Lei 5.172 de 1966, foi revogado pelo artigo 5º do Decreto-Lei n. 195/67, porque a época as normas gerais de direito tributário ainda não tinham o status ou a força de lei complementar (emenda Constitucional 1/1969, art. 18, par. 1º. No novo regime, o edital que antecede a cobrança da contribuição de melhoria pode ser publicado depois da realização da obra pública. Recurso especial conhecido e improvido. (Resp. 89791/SP 1ª Turma do STJ. Rel. Min. Ari Pargendler, DJ 29/06/1998”. No mesmo sentido entendeu o STF que: “prevalência da tese de que a publicação prévia do edital previsto no mencionado dispositivo é necessária para a cobrança da contribuição de melhoria e não para a realização da obra. (RE. 98408/PR – STF 1º Turma. Rel. Min. Soares Munoz DJ 20/05/83).” 4. Necessidade de lei por obra por obra: “Inexigibilidade no exercício de 1992, contudo, por força do princípio da anualidade, previsto no artigo 150, III, b, da Constituição Federal. – Tributo legitimamente exigível após a conclusão das obras, ou, em casos especiais,
quando a conclusão parcial já tenha seguramente provocado valorização do imóvel do contribuinte, uma vez que, a despeito do laconismo da Constituição Federal de 1988, a contribuição de melhoria é tributo vinculado ao beneficio, vale dizer, à valorização decorrente da obra. – Prematura, pois,a exigência do tributo em causa dos apelantes, se a obra não está concluída. – Honorários advocatícios. Vigente a Súmula nº 512 do STF, reafirmada pelo Excelso Pretório e pelo STJ, após julgamento dos Embargos de Divergência no REsp 27.879 (DJU de 8.11.93), entendimento mantido no Embargos de Divergência no REsp n. 17.124-0 (...)”. 5. COBRANÇA A PROPRIETÁRIOS DE IMÓVEIS DOS CUSTOS DE OBRA PÚBLICA REALIZADA POR EMPRESA MUNICIPAL. “Tratandose de contribuição de melhoria, é indevida a cobrança por quem não tem o poder de tributar, nem pode o município cobrar o tributo sem lei anterior que o autorize.(Rext. 99466/SP. STF – 2 ª Turma, Rel. Min. Carlos Madeira. DJ 19/12/1985).” 6. Taxa de pavimentação pública:
“CONTRIBUIÇAO DE MELHORIA. FATO GERADOR. ASFALTAMENTO DE VIA PÚBLICA. Tratando-de de contribuição de melhoria, pois o fato gerador é a valorização do imóvel particular, em razão do asfaltamento da via pública, não legitima a cobrança a titulo de taxa, aliás esta mesma desvirtuada por ser imposta por empresa privada, ainda que concessionária de serviço público, e mediante duplicata de serviço. (RE. 98841/SP. STF 1ª Turma. Rel. Min. Rafael Mayer, DJ 05/08/1983).” REFERÊNCIAS ACCIOLY, Aristophanes. Contribuição de Melhoria e Valorização Imobiliária. Rio de Janeiro: Financeiras, 1952. ATALIBA, José Geraldo. Natureza Jurídica da Contribuição de Melhoria. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1964.
ATALIBA, José Geraldo. A Contribuição de Melhoria no Código Tributário Nacional em elaboração. in Revista de Direito Público. vol. 2 out/dez./67. BIAVA, Adriano Henrique Rebelo. Contribuição de Melhoria: Um Tributo Esquecido. in Revista de Administração Municipal. Rio de Janeiro. julho/setembro 1976. pp. 6/19. BILAC, Pinto. Contribuição de Melhoria. Rio de Janeiro: Forense, 1937. CARVALHO, Rubens Miranda de Carvalho. Contribuição de Melhoria e Taxas no Direito Brasileiro. São Paulo: Juarez de Oliveira, 1999. LEONETTI, Carlos Araújo. A Contribuição de Melhoria na Constituição de 1988. Florianópolis: Diploma Legal. 2000. MACHADO, Hugo de Brito. Os Limites da Contribuição
e Melhoria. Dialética de Direito Tributário, nº 21, São Paulo: Oliveira Rocha, São Paulo. MELLO, Oswaldo Aranha Bandeira de. Contribuição de Melhoria e Autonomia Municipal. São Paulo: Publicação da Prefeitura Municipal de São Paulo, 1952. MELLO, Oswaldo Aranha Bandeira. A Contribuição de Melhoria e a Autonomia Municipal. São Paulo. 1950. PINTO, Bilac. Contribuição de Melhoria. Rio de Janeiro: Forense, 1940. RODRIGUES, Priscila Figueiredo da Cunha. Contribuição de Melhoria. São Paulo: Malheiros, São Paulo, 2000.
CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA Capítulo 26 CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS MUNICIPAIS José Egberto Alves de Sousa[296] John Tenório Gomes[297] Julia De Arruda Rodrigues[298] 1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS. A Constituição Brasileira de 1988, com seu caráter democrático-cidadão, provedor dos mais necessitados, previu o direito à Seguridade Social como um direito social fundamental, por força do disposto em seu art. 6º, ipsis litteris: Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 64, de 2010) (grifo nosso)
Dessa forma, é um direito imanente ao ser humano, indispensável ao seu mínimo existencial, sem o qual o indivíduo não vive condignamente. A previdência socorre os cidadãos contra os principais riscos sociais, tais como: gravidez, doença, acidente, invalidez, senilidade, morte, desemprego e prisão. Em virtude de sua relevância para a sociedade, a própria Constituição disciplinou o direito à Seguridade Social em seu Capítulo II do Título VIII (Da Ordem Social). Sendo assim, a Constituição Federal (CF) expressa não uma simples positivação de tal instituto, mas o reconhecimento da necessidade de uma atuação positiva do Estado em benefício da sociedade para a sua concretização. Tal raciocínio expressa o marco no desenvolvimento dos direitos fundamentais de segunda dimensão, que podem gerar para o indivíduo tanto um direito de exigir dos entes públicos uma prestação normativa, quanto uma prestação material, tendo esta a intenção de atenuar as desigualdades fáticas existentes na
sociedade e conferir efetividade aos direitos sociais. Utilizando-se da classificação de George Jellinek, sobre a teoria dos quatro status dos direitos e garantias fundamentais, Kildare Gonçalves Carvalho (2009) obtempera que os direitos sociais possuem um status positivus, pois possibilitam ao indivíduo requerer uma atuação do Estado, no sentido de melhorar suas condições de vida e garantir seus pressupostos materiais para o exercício da liberdade. Tais considerações atrelam-se às hodiernas concepções de Estado Democrático de Direito, por ser este decorrente das transformações sociais e da necessidade de concretização dos preceitos da justiça social. É sabido que mesmo os direitos sociais, tendo natureza de prestação positiva do Estado, alguns deles exigem para a sua concretização ações positivas não somente do ente público, mas também do próprio indivíduo que será beneficiado. Nesse sentido, não implica dizer que o poder de exigir, concedido pelos direitos de segunda dimensão, não necessitará de qualquer atitude de seus destinatários,
pois o que caracteriza tais direitos é a possibilidade de fruição e gozo dos mesmos, assim como ocorre com a Previdência Social que, mesmo sendo um dever do Estado provê-la ao indivíduo, exige deste, em regra, que contribua pecuniária e compulsoriamente, em decorrência da natureza tributária das contribuições sociais – o que será alvo de análise posteriormente neste estudo - para adquirir o seu benefício previdenciário. O caráter democrático do regime constitucional vigente possibilitou um desenvolvimento social nitidamente perceptível do ordenamento jurídico pátrio, sobretudo por devolver o Poder ao povo, dispondo o parágrafo único do art. 1º da Carta Magna que “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. Nessa feita, as implicações no campo da Seguridade Social, ocasionadas pelo novo paradigma constitucional, ganharam fundamento e desenvolvimento nunca antes conhecido em nosso país. Por este motivo, teremos como foco deste
estudo as Contribuições Previdenciárias criadas nos Regime Próprio de Previdência Social dos Municípios, através de uma breve análise histórico-jurídica do Sistema Previdenciário Brasileiro e, em um segundo momento, da natureza jurídica dessas contribuições, a relação de sua instituição com o princípio da legalidade e, por fim, da viabilidade dos Regimes Próprios de Previdência Social nos Municípios. 2. ANÁLISE HISTÓRICO-JURÍDICA DO SISTEMA PREVIDENCIÁRIO BRASILEIRO. Antes da promulgação da Carta de 05 de outubro de 1988, o Estado brasileiro não concebia a Seguridade Social tal qual a conhecemos hodiernamente. A proteção restringia-se, predominantemente, à Previdência Social de caráter privado, na qual apenas teriam proteção aqueles trabalhadores que pertenciam a empresas que possuíam as Caixas de Previdência, nos mesmos moldes da proteção à saúde. A assistência social não fazia parte das políticas obrigatórias do Poder
Público. Assim, a nova ordem constitucional estruturou e articulou os três seguimentos em um só instituto, qual seja, a Seguridade Social. E atualmente, no Brasil, a previdência faz parte da política oficial, sendo o regime privado complementar àquela. Igualmente ocorreu com a saúde, a qual é dever do Estado, através do Sistema Único de Saúde (SUS), contando com a ajuda da iniciativa privada. Por fim, a assistência social tem prioridade nas políticas estatais, promovendo vida digna a quem mais necessita (crianças, adolescentes, idosos e portadores de deficiência). A principal diferença entre as três áreas que integram a Seguridade Social recai sobre o caráter contributivo. Enquanto que para a previdência o princípio da universalidade está condicionado à prévia contribuição do favorecido, para a saúde e assistência social o referido princípio é mais amplo, porquanto serão disponibilizadas a todos, independentemente de ser brasileiro ou estrangeiro, de contribuir ou não com o sistema. Desse modo, a fonte de custeio do Sistema
Único de Saúde (SUS) e da Assistência Social incide sobre os impostos – espécies de tributos instituídos sem vinculação a qualquer atividade estatal – e, em contraponto, os Regimes Previdenciários são financiados por contribuições sociais específicas, denominadas de previdenciárias, pois fatalmente são criadas para essa finalidade. No Brasil há três tipos de regimes previdenciários: o primeiro deles, e mais abrangente, é o Regime Geral de Previdência Social (RGPS), gerido pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), o qual é destinado, em regra, à proteção dos trabalhadores da iniciativa privada; o segundo, diz respeito ao Regime Próprio de Previdência Social (RPPS), tendo como beneficiários os servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; o terceiro regime de previdência é o complementar, de filiação facultativa a qualquer indivíduo, subdividindo-se em Regime de Previdência Complementar dos Servidores Públicos e Regime de Previdência Privada Complementar.
Saliente-se que o objeto do presente estudo é reservado aos Regimes Próprios de Previdência Social da esfera municipal. Em virtude de sua qualidade de direito fundamental para a sociedade, “a Seguridade Social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade” (CF, art. 194, caput), estando pautada, portanto, no princípio constitucional da solidariedade. Ademais, por se tratar de um direito social, sua efetividade está condicionada a uma prestação estatal positiva. Logo, o Estado deve destinar recursos financeiros para custear a Previdência Social juntamente com toda sociedade. O art. 195 da CF determina que “a seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”, além das contribuições sociais por parte do empregador (inciso I), do trabalhador e demais segurados (inciso II), dentre outras fontes. Assim, percebe-se que o sistema
previdenciário não é custeado exclusivamente pela entidade estatal, uma vez que tem a indispensável participação de toda sociedade para que seja possível sua existência e continuidade. A Lex Major autoriza a cada ente federativo Estados, Distrito Federal e Municípios - a instituição de seu próprio regime previdenciário, tendo por destinatários os servidores efetivos, em consonância com o que versa a cabeça do art. 40 da CF, in verbis: Art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003) (grifo nosso)
Os servidores públicos titulares de cargos efetivos são aqueles que foram investidos mediante aprovação em concurso público de prova ou de provas e títulos, e que sejam vinculados ao regime estatutário, conforme disciplina o inciso II do art. 37 da Constituição
Federal. Destarte, os empregados públicos e os servidores ocupantes de cargos comissionados demissíveis ad nutum serão contratados sob a égide da Consolidação das Leis do Trabalho, e estarão sujeitos à inscrição e filiação ao RGPS, bem como os servidores temporários (mesmo sendo regidos por um contrato de trabalho, possuindo assim um vínculo jurídicoadministrativo e não celetista[299]) por força do disposto no § 13 do art. 40 da Carta Magna. Note-se, ainda, que a própria Constituição permitiu a instituição de apenas um regime por ente federativo (art. 40, § 20). A maioria dos sistemas previdenciários em todo o mundo é contributiva. Em alguns países não há necessidade de contribuições específicas para os órgãos de seguro social, visto que parte dos tributos gerais pagos pela população é vertida para a Previdência Social, de modo que todos os contribuintes, em sentido amplo (tributários), são considerados contribuintes previdenciários indiretos (LAZZARI, 2009, p. 56). O ordenamento jurídico pátrio consente também que o Município que tenha criado seu RPPS possa
instituir suas respectivas contribuições sociais, em conformidade com o caput do art. 40 da CF, in fine, combinado com o art. 149 da CF, nos seguintes termos: Art. 149. Omissis. § 1º Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão contribuição, cobrada de seus servidores, para o custeio, em benefício destes, do regime previdenciário de que trata o art. 40, cuja alíquota não será inferior à da contribuição dos servidores titulares de cargos efetivos da União. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003) (grifo nosso)
O preceito normativo em comento expressa o vinculum foederis, que possui reflexos também quando da instituição dos Regimes Próprios de Previdência Social dos Estados, Distrito Federal e Municípios. Caracterizase por ser um federalismo assimétrico, destacado por BULOS (2008, p. 724) como “a busca do equilíbrio, da cooperação, do entendimento entre as ordens jurídicas parciais perante o poder central, dentro de uma realidade naturalmente contraditória e nebulosa”, evidenciando que encontra-se presente no Brasil em diversos preceitos constitucionais, sobretudo, de natureza tributária.
Ainda sobre o federalismo, vale salientar que o Brasil adotou o federalismo simétrico ou homogêneo, em que cada Estado federado possui a mesma parcela de poder, ainda que dotados de fatores e peculiaridades próprias (CARVALHO, 2009) e em virtude destas, excepcionalmente - por razões geográficas, financeiras, econômicas, demográficas, dentre outras - encontramos algumas concessões à forma assimétrica de federalismo, estando a competência para instituir cada RPPS dos entes federados, muito mais atrelada ao equilíbrio financeiro que propriamente a mera distribuição igualitária do Poder. Os regimes previdenciários oficiais estão todos submetidos ao princípio da contributividade, uma vez que se trata de direito prestacional. No entanto, nem sempre foi assim, pois, antes da promulgação da Emenda Constitucional nº 20/1998, o art. 40 da Carta Política não exigia contribuição para os sistemas próprios de previdência, pondo em risco o equilíbrio financeiro e atuarial, isto é, a sanidade e continuidade do sistema previdenciário local.
3. NATUREZA TRIBUTÁRIA DAS CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. Os tributos no ordenamento jurídico brasileiro são objeto de diversas celeumas, entre as quais uma diz respeito à classificação dos tributos adotada pelo Brasil. A legislação brasileira acabou por adotar a concepção tripartite, que divide os tributos nas espécies: impostos, taxas e contribuições de melhoria. No entanto, o Supremo Tribunal Federal é adepto da concepção da pentapartição, que divide os tributos em impostos, taxas, contribuições de melhoria, empréstimos compulsórios e contribuições especiais. Por sua vez, as contribuições especiais subdividem-se em contribuições sociais (dentre as quais estão as contribuições previdenciárias), contribuição de intervenção no domínio econômico (CIDE), contribuições corporativas e contribuição para custeio de serviço de iluminação pública (COSIP). Por essa razão, não resta dúvida de que as contribuições da Seguridade Social (ou previdenciárias) têm natureza tributária. No julgamento do RE 556.664 e
RE 559.882, sob a relatoria do Ministro Gilmar Mendes, em 12/06/2008, publicado no DJE de 14/11/2008, com repercussão geral, o Plenário do STF decidiu que “As contribuições, inclusive as previdenciárias, têm natureza tributária e se submetem ao regime jurídicotributário previsto na Constituição. Interpretação do art. 149 da CF de 1988. Precedentes”. Sendo assim, prevalece entre os doutrinadores a teoria que considera a natureza jurídica das contribuições previdenciárias como tributária, excepcionando-se a contribuição do segurado facultativo, visto que a mesma não é obrigatória, logo, entendem que possui natureza não fiscal, ficando à margem do caráter compulsório do conceito de tributo inserto no art. 3º do Código Tributário Nacional[300]. 4. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE E A INSTITUIÇÃO DAS CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. Como verdadeiros tributos que são, as contribuições previdenciárias devem ser criadas por lei
própria, prevendo o respectivo fato gerador, base de cálculo, alíquota e os contribuintes. O § 4º do art. 195 da Constituição Brasileira possibilita a criação de outras fontes para garantir a manutenção ou expansão da seguridade social, mediante lei, com observância do disposto no art. 154, I da Carta Política. O último artigo estabelece que a criação de novos tributos, diversos daqueles previstos no art. 153, dar-se-á somente através de lei complementar, desde que sejam não cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados nesta Constituição. Apenas rememorando, a lei complementar é emanada pelo legislador infraconstitucional, devendo ser aprovada pela maioria absoluta de cada uma das Casas do Congresso (art. 69 da CF), demandando um quórum mais qualificado do que a lei ordinária para que seja aprovada. Em contrapartida, a lei ordinária exige apenas a aprovação pela maioria simples dos membros do Poder Legislativo. Assim, nos ensina o tributarista Ricardo
Alexandre (2009, p. 76), nestas palavras: [...] a exigência de utilização de lei complementar só é aplicável para a criação de novas contribuições (não daquelas previstas expressamente na Constituição Federal de 1988). Para a criação daquelas cujas fontes já constam da Constituição, vale a regra geral: a utilização da lei ordinária. Esse entendimento é pacífico no STF. (grifo nosso)
Na presente situação, a Carta Política já prevê a criação, pelos entes federados, de contribuições previdenciárias sobre a remuneração dos servidores efetivos ativos, aposentados e pensionistas, demandando, desse modo, a edição de lei ordinária. Os elementos integrantes da contribuição em análise também têm disciplinamento em sede constitucional, cujo fato gerador será o exercício de atividade em cargo público efetivo, e a base de cálculo recairá sobre os vencimentos do servidor e sobre os proventos do aposentado e do pensionista. O Município, em respeito ao princípio federativo, pode fixar sua respectiva alíquota, porém nunca será inferior nem superior ao dobro da contribuição
dos servidores federais, atualmente fixada em 11% (onze por cento)[301], consoante expressa o § 1º do art. 149 da CF cumulado com o caput do art. 2º da Lei nº 9.717/1998, que dispõe sobre regras gerais para a organização e o funcionamento dos regimes próprios de Previdência Social. Por fim, o RPPS está sujeito ao custeio quadripartite, de forma que seus contribuintes deverão ser, além da entidade pública municipal, os servidores ativos ocupantes de cargo efetivo em âmbito municipal, os aposentados pelo regime próprio e os pensionistas do RPPS, tudo com observância dos princípios do equilíbrio financeiro e atuarial e da solidariedade, introduzidos, respectivamente, pelas Emendas Constitucionais nº 20/1998 e nº 41/2003, denominadas Reforma da Previdência (OLIVEIRA, 2006, p. 331-332), alterando-se o caput do art. 40 da Carta Política. No entanto, com relação aos inativos e pensionistas, a incidência tributária está condicionada ao que prescreve os §§ 18 e 21 do art. 40 da Constituição, in verbis:
§ 18. Incidirá contribuição sobre os proventos de aposentadorias e pensões concedidas pelo regime de que trata este artigo que superem o limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201, com percentual igual ao estabelecido para os servidores titulares de cargos efetivos. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003) [...] § 21. A contribuição prevista no § 18 deste artigo incidirá apenas sobre as parcelas de proventos de aposentadoria e de pensão que superem o dobro do limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201 desta Constituição, quando o beneficiário, na forma da lei, for portador de doença incapacitante. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005) (grifos nossos)
Desta feita, a imunidade alcança apenas até o valor correspondente ao limite do teto dos benefícios do RGPS, incidindo contribuição sobre a parcela excedente. Ademais, se o aposentado for portador de doença incapacitante a imunidade se estende até o dobro do referido teto. Contudo, o Supremo Tribunal Federal decidiu, no Recurso Extraordinário nº 552.487, sob a relatoria do Ministro Eros Grau, julgado em 10/09/2008 e publicado
no DJE nº 189 de 06/10/2008, que a norma do § 21 não é autoaplicável, necessitando-se da edição de lei complementar para conceituar juridicamente essa categoria de doença, ex vi do disposto no inciso II do art. 146 da Lei Maior. Paulsen (2007, p. 157) elenca que o RPPS tem caráter supletivo ao RGPS, logo: Sempre que inexistir regime próprio de previdência, estarão vinculados, necessariamente, ao Regime Geral de Previdência Social, de maneira que tanto o ente político como seus servidores terão de contribuir mediante pagamento das contribuições patronal e do empregado ao INSS. (grifo nosso)
Referido entendimento coaduna com a redação do caput do art. 40 e da alínea j do inciso I do art. 9º do Decreto nº 3.048/1999, o qual aprova o Regulamento da Previdência Social. O § 13 do supracitado preceito constitucional versa, ainda, que “ao servidor ocupante, exclusivamente, de cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração bem como de outro cargo temporário ou de emprego público, aplica-se o regime geral de Previdência Social”.
Tendo em vista que as contribuições previdenciárias têm natureza tributária, previu a Carta Republicana de 1988, precisamente no § 6º de seu artigo 195, a observância do princípio nonagesimal. O texto normativo constitucional é esclarecedor de per si, podendo as novas contribuições previdenciárias serem exigidas no mesmo exercício financeiro que forem instituídas, conquanto depois que decorrido o prazo de noventa dias, contado a partir da publicação da lei. A lei que majora as contribuições também está sujeita à anterioridade mitigada, ao passo que a modificação benéfica, que apenas reduz a contribuição, não gera prejuízo ao contribuinte, não havendo, destarte, fundamento para observar o princípio da noventena (cf. ADI 1135-9/DF). Recorde-se de que, após atingido o prazo supracitado, todos os segurados e beneficiários deverão respeitar o mandamento legal, não se podendo falar em ofensa a direito adquirido, visto que inexiste norma de imunidade tributária absoluta, em consonância com entendimento jurisprudencial do STF, reproduzido a
seguir: No ordenamento jurídico vigente, não há norma, expressa nem sistemática, que atribua à condição jurídico-subjetiva da aposentadoria de servidor público o efeito de lhe gerar direito subjetivo como poder de subtrair ad aeternum a percepção dos respectivos proventos e pensões à incidência de lei tributária que, anterior ou ulterior, os submeta à incidência de contribuição previdencial. Noutras palavras, não há, em nosso ordenamento, nenhuma norma jurídica válida que, como efeito específico do fato jurídico da aposentadoria, lhe imunize os proventos e as pensões, de modo absoluto, à tributação de ordem constitucional, qualquer que seja a modalidade do tributo eleito, donde não haver, a respeito, direito adquirido com o aposentamento.[302]
Assim sendo, tanto os servidores ativos quanto os inativos, além dos pensionistas, têm deveres equiparados perante a entidade previdenciária, independentemente de sua condição jurídico-subjetiva. A instituição de Regime Próprio de Previdência Social, pelos municípios, depende da previsão obrigatória da concessão de dois benefícios básicos para seus segurados, quais sejam aposentadoria e pensão por morte, que gozam de previsão constitucional
(vide § 2º do art. 40). Contudo, outros benefícios podem ser criados pelo RPPS, desde que não sejam distintos dos concedidos pelo RGPS na Lei nº 8.213/1991, salvo previsão contrária em sede constitucional, como regulamenta o art. 5º da Lei nº 9.717/1998. Todavia, se mesmo assim a lei municipal previr a concessão de benefícios diversos do RGPS, o RPPS está obrigado a conceder o benefício até que seja alterada a norma legal. Saliente-se que há necessidade de prévia instituição de fonte de custeio antes que o Poder Público municipal crie ou amplie qualquer benefício previdenciário, em consonância com a redação do § 5º do art. 195 da Nova Constituição da República, nestes termos: Art. 195 Omissis. [...] § 5º Nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total.
O princípio, em análise, é norma constitucional de importância atuarial, cujo objetivo é conservar o equilíbrio financeiro e atuarial do sistema
securitário, para que não o ponha em risco, inviabilizando direito fundamental. Logo, o ato de criação ou majoração/extensão de benefício previdenciário deverá “apontar expressamente a fonte de custeio respectiva, através da indicação da dotação orçamentária, a fim de se manter o equilíbrio entre as despesas e as receitas públicas” (AMADO, 2012, p. 45). 5. VIABILIDADE DOS REGIMES PRÓPRIOS DE PREVIDÊNCIA NOS MUNICÍPIOS. Como exposto, a Constituição Federal abriu espaço para que os Estados, Distrito Federal e Municípios estabeleçam seus respectivos Regimes Previdenciários. Entretanto, o grande questionamento na atualidade circunda em volta da viabilidade econômica que a instituição de tais regimes teria em relação aos entes federados de menor proporção, a saber, os Municípios, tendo em vista que são inúmeros os municípios brasileiros que possuem uma população ínfima e, consequentemente,
um número de servidores tão diminuto que torna excessivamente onerosa sua instituição, ao ponto de desequilibrar financeiramente o Regime, não atingindo a finalidade para qual fora instituído. Ocorre que, por diversas razões - tais como o percentual que o Município deverá repassar para o RGPS, pois caso optem por este, serão reputados como empregadores e deverão fazer o repasse de 20% (vinte por cento) e, a depender do salário de contribuição de cada servidor, sobre estes incidirão alíquotas que podem variar de 8% (oito por cento) a 11% (onze por cento) - os municípios preferem instituir um RPPS, ainda que sem qualquer estrutura financeira e suporte contributivo para tanto, ocasionando, em várias situações, severos danos aos direitos de seus segurados, privando-lhes de uma garantia constitucionalmente assegurada. De acordo com a tabela abaixo, outro fator que pode ocasionar um grande desequilíbrio financeiro nos municípios que optam pelo RPPS é a desproporcionalidade entre o número de servidores ativos e os inativos e pensionistas, conforme destaca a tabela com informações colhidas no ano de
2000 das Secretarias de Administração Municipais, (apud SILVA, 2002, p. 57):
Note-se a completa desproporcionalidade entre a relação dos servidores ativos, inativos e pensionistas de alguns municípios do Brasil, tendo Salvador um número abaixo do mínimo necessário para que, matematicamente, tenha condições de manter um Regime Previdenciário Próprio. Ressalte-se que tais dados foram colhidos no ano de 2000, ou seja, há 12 (doze) anos atrás esta era a realidade destes municípios e já vinham sendo desenvolvidas inúmeras críticas quanto à situação em comento, levando-nos a imaginar como estão estes municípios na atualidade, vez que a quantidade de servidores que
se aposentam ou ficam inativos por qualquer outra situação, bem como os pensionistas, cresce de forma bem mais acelerada que o quadro de servidores ativos.
O Instituto de Previdência Municipal de São Paulo, em notícia veiculada em seu endereço eletrônico no dia 11 de maio de 2011[303], aponta que de acordo com o relatório atuarial do IPREM-SP 2010, divulgado em março de 2011, o número de servidores inativos subiu 4,77% (quatro vírgula setenta e sete por cento) em 2010, o que monetariamente equivale a cerca de R$ 23 milhões, enquanto que a folha dos ativos caiu R$ 16 milhões, o que corrobora o entendimento de que a instituição de um RPPS por determinados municípios devem ser analisada de forma extremamente calculista e sob o ponto de vista do equilíbrio financeiro e atuarial. Nesse diapasão, o RGPS por conter um quadro bem mais estruturado de segurados, além de possuir uma estruturação financeira equilibrada, possibilita aos municípios uma maior segurança quanto à manutenção e aplicação da Previdência Social para seus servidores, mesmo tendo que arcar com algumas despesas
de contribuição, pois, ao final, evita o desgaste de implantar um RPPS com todo o aparato necessário e, ademais, respeita os direitos e garantias fundamentais de seu pessoal. Ainda sobre a viabilidade dos RPPS, interessante descartar o art. 10 da Lei nº 9.717/1998, que dispõe sobre regras gerais para a organização e o funcionamento dos Regimes Próprios de Previdência Social dos servidores públicos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos militares dos Estados e do Distrito Federal, in verbis: Art. 10. No caso de extinção de regime próprio de previdência social, a União, o Estado, o Distrito Federal e os Municípios assumirão integralmente a responsabilidade pelo pagamento dos benefícios concedidos durante a sua vigência, bem como daqueles benefícios cujos requisitos necessários a sua concessão foram implementados anteriormente à extinção do regime próprio de previdência social.
Pelo preceito legal mencionado, chegamos à conclusão de que, caso um Município que instituiu um RPPS tiver o seu RPPS extinto em decorrência de algum fator (dentre algumas possibilidades, a comentada
desproporcionalidade entre servidores ativos e inativos e o desequilíbrio financeiro e atuarial), este deverá custear todos os benefícios que foram concedidos enquanto o RPPS estava vigente. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS. Vimos que a Constituição Federal Brasileira permite aos entes federados a criação de contribuições previdenciárias sobre a remuneração de seus servidores efetivos ativos, aposentados e pensionistas, sob a forma de custeio quadripartite, isto é, contribui não só o Município, mas os servidores ativos ocupantes de cargo efetivo no âmbito municipal, os aposentados pelo regime próprio e os pensionistas do Regime Próprio de Previdência Social. Todavia, pelas considerações feitas no decorrer deste estudo, pode-se entender que a instituição de Regimes Próprios em Municípios com instituição de contribuições previdenciárias deve ser analisada sob a ótica dos princípios do equilíbrio financeiro e atuarial e
da solidariedade, tendo em vista que a partir de sua criação, deverão ser tomadas em primazia as garantias constitucionais de seus segurados. Imaginemos, por exemplo, que determinado Município teve o seu RPPS extinto, tendo inúmeros servidores inativos, bem como alguns pensionistas para manter, independentemente de possuir ou não contribuições para tanto, em virtude da obrigação imposta pelo art. 10 da Lei nº 9.717/1998. Nesse caso, a alternativa lógica seria vincular-se ao Regime Geral de Previdência Social, em que o Município teria natureza de empregador, devendo efetuar o repasse obrigatório de 20% (vinte por cento). No entanto, ainda hipoteticamente, imaginemos que o motivo que engendrou a extinção do RPPS foi a falta de servidores ativos que contribuíssem suficientemente para o seu Regime. Diante dessa situação, como teria o Município condições suficientes para manter os beneficiários e ainda repassar a contribuição do RGPS? A única conclusão seria recorrer a outras
fontes de receitas, o que, além do desequilíbrio orçamentário, acarretaria inúmeras críticas ao administrador. Em razão disso, os RPPS, antes de sua instituição, deveriam ser planejados de forma minuciosamente detalhada, a fim de evitar transtornos e desequilíbrios financeiros severos à administração pública, bem como aos seus servidores, pois o Estado tem o dever, na qualidade de provedor dos direitos sociais, em zelar e assegurar aos seus trabalhadores o melhor Regime Previdenciário para cada situação. Destarte, para tanto, torna-se imprescindível a elaboração de prognósticos levando em considerações inúmeros fatores, tais como a expectativa do número de servidores ativos e inativos, além da possibilidade orçamentária e financeira para manter um RPPS que possua estrutura para desempenhar suas finalidades com precisão. Nesse tocante, relembramos que a instituição de Regime Próprio de Previdência Social pelos Municípios depende da previsão obrigatória da concessão
de ao menos dois benefícios básicos para seus segurados - aposentadoria e pensão por morte – fator que certamente deverá ser considerado quando da avaliação da capacidade do ente federado municipal para tanto, e, ainda, se poderão ser criados outros benefícios pelo RPPS, desde que não sejam distintos dos concedidos pelo RGPS na Lei nº 8.213/1991, salvo previsão contrária em sede constitucional. Tais cuidados são imprescindíveis antes da instituição de um Regime Próprio de Previdência Social pelo Município, visto que se a lei municipal previr a concessão de benefícios previstos ou diversos do RGPS, o RPPS estará obrigado a concedê-lo até que seja alterada a norma legal. REFERÊNCIAS. ALEXANDRE, Ricardo. Direito tributário esquematizado. 3 ed. São Paulo: Método, 2009. AMADO, Frederico. Direito e processo previdenciário
sistematizado. 3 ed. Salvador: JusPodivm, 2012. BULOS, Uadi Lâmmego. Curso de Direito Constitucional. 2 ed., rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008. CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional: teoria do Estado e da Constituição. 15 ed., rev., atual. e ampl. Belo Horizonte: Del Rey, 2009. CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; e LAZZARI, João Batista. Manual de direito previdenciário. 11 ed. Florianópolis: Conceito Editorial, 2009. MARTINS, Ives Gandra da Silva. O Tributo: reflexão multidisciplinar sobre sua natureza. Rio de Janeiro: Forense, 2007. OLIVEIRA, Raul Miguel Freitas de. Seguridade social e integração. In: CASELLA, Pulo Borba & LIQUIDATO, Vera Lúcia Viegas (coord.). Direito da integração. São Paulo: Quartier Latin, 2006. PAULSEN, Leandro. Direito tributário: constituição e
código tributário à luz da doutrina e da jurisprudência. 9 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado: ESMAFE, 2007. SILVA, Delúbio Gomes Pereira da. Regime de Previdência Social dos servidores públicos no Brasil: perspectivas. 2002. 138 f. Monografia (Especialização no V Master em Direção dos Sistemas de Seguridade Social) – Organização Iberoamericana de Seguridade Social, Brasília. Disponível em: . Acesso em 10 agosto 2003. TEMAS ESPECIAIS Capítulo 27 O MUNICÍPIO COMO CONTRIBUINTE NA RELAÇÃO JURÍDICA TRIBUTÁRIA Por Arthur Moura e Leonardo Cordeiro Brasil 1. CONSIDERA ÇÕ ES INICIAIS Com o advento do sistema federativo trazido pela Constitui çã o Federal de 1988, foi concedida de maneira original status de ente da federa çã o aos munic í pios. N ã o adentrando ao m é rito dessa op çã o
do constituinte origin á rio, mat é ria pertinente a outra discuss ã o, salienta-se apenas que de forma conjunta a essa atribui çã o ao ente municipal, houve a discrimina çã o no texto constitucional de suas compet ê ncias, dentre elas a tribut á ria, diretamente conexa à autonomia administrativa e financeira municipal. Nesse contexto, diversos manuais jur í dicos costumam abordar o direito tribut á riomunicipal restringindo-se aos tributos de compet ê ncia dos munic í pios, elencando-os e explanando suas principais caracter í sticas. Sem de modo algum retirar o m é rito dessa an á lise de tamanha import â ncia, nota-se que o munic í pio nem sempre figura no polo ativo das obriga çõ es tribut á rias, n ã o sendo raras as vezes em que deve arcar com encargos dessa natureza para com os demais entes da federa çã o, malgrado a imunidade rec í proca prevista na Carta Magna. Oportuno,portanto, o estudo da atua çã o do munic í pio como contribuinte, atento à s possibilidades de tributos a serem cobrados pelos demais entes p ú blicostributantes, que t ê m reflexos relevantes no
cotidiano das finan ç as municipais.
2.
A
IMUNIDADE
REC Í PROCA
E
SUA
ABRANG Ê NCIA
No â mbito da an á lise da figura da edilidadecomo contribuinte tribut á rio é necess á rio o enfrentamento de um primeiro ponto, a imunidade rec í proca entre os entes p ú blicos tributantes,prevista na Constitui çã o Federal. O art. 150, VI, a, da CF/88 disp õ e acerca da veda çã o aos entes pol í ticos de instituir impostos sobre o patrim ô nio, renda ou servi ç os uns dos outros. Desse modo, observa-se a pretens ã o do constituinte em dar efic á cia ao princ í pio federativo. Em um primeiro olhar se extrai a conclus ã o correta de que o munic í pio n ã o poderia figurar no polo passivo de uma obriga çã o tribut á ria decorrente do fato gerador de qualquer imposto incidente sobre sua renda, patrim ô nio ou servi ç os prestados.
Contudo, n ã o se pode confundir a esp é cie “ impostos ” com o g ê nero “ tributos ” , que por ser um termo mais amplo,cont é m o primeiro. O imposto é apenas uma das esp é cies de tributo e a Constitui çã o foi bastante clara ao delimitar a imunidade apenas a esse tipo de tributo, excetuando os demais. Portanto, a referida imunidade em nada obsta a ocorr ê ncia de rela çõ es tribut á rias entre as diversas pessoas pol í ticas, desde que as obriga çõ es decorrentes n ã o sejam afetas aos impostos, mas a outros tipos de tributos elencados na Carta Magna. Nessas obriga çõ es o munic í pio pode figurar no polo ativo, como por exemplo, na institui çã o e cobran ç a de taxa pelo servi ç o de coleta domiciliar de lixo prestado em reparti çõ es p ú blicas federais ou estaduais. ¹ Por outro lado, tamb é m é poss í vel ao munic í pio ser contribuinte, ou sujeito passivo,em obriga çã o tribut á ria para com outro entetributante , casos que ser ã o especificamente estudados neste cap í tulo.
3.
DAS
CONTRIBUI ÇÕ ES
SOCIAIS
DOS
MUNIC Í PIOS
A Carta Magna de 1988 estabeleceu a exist ê ncia de um novo tipo de tributo, as contribui çõ es sociais. Conforme leciona Regina Helena Costa, esses tributos “ constituem instrumentos de atua çã o da Uni ã o na á rea social ”² . Algumas dessas contribui çõ es, conforme afirma a Lei Maior em seu artigo 195, s ã o destinadas ao financiamento da Seguridade Social. Assim sendo, caracterizam-se por serem tributos de arrecada çã o vinculada ao or ç amento previdenci á rioe de car á ter sinalagm á tico, sem contudo, demandaruma contrapresta çã o estatal individualizada, sen ã o diante de situa çõ es especificadas em lei (como aposentadoria, aux í lio doen ç a etc.). 3.1. Dos regimes b á sicos de previd ê ncia social
Toda administra çã o municipal disp õ e em menor ou maior quantidade de um quadro de pessoal para desempenhar as diversas fun çõ es necess á rias à sua atividade. Para tanto, o ente municipal aloca em sua folha de pagamento al é m de servidores p ú blicos, submetidos ao regime estatut á rio, outros agentes que n ã o se submetem a esse regime, sejam eles ocupantes exclusivamente de cargos em comiss ã o, assim como os de outro cargo tempor á rio ou de emprego p ú blico. Verifica-se a exist ê ncia de dois grandes blocos de rela çõ es de trabalho no interior da administra çã o p ú blica. Enquanto a discuss ã o sobre os direitos devidos a cada grupo n ã o é pertinente no momento, ressalta-se que cada uma dessas rela çõ es constitui fato gerador para a cobran ç a de contribui çõ es sociais, seja nos termos da Lei 8.212/91 ou em poss í veis leis espec í ficas criadas pelos munic í pios e estados aptas a instituir seu regime pr ó prio de previd ê ncia social. A Constitui çã o Federal estabeleceu dois
regimes b á sicos de previd ê ncia social, o “ RGPS ” , regime geral (art. 201) e o “ RPPS ” , regime pr ó prio (art. 40). ³ Enquanto o Regime Geral vincula a grande maioria dos trabalhadores brasileiros, a pr ó pria Carta Magna disp õ e aos entes pol í ticos criarem seus regimes pr ó prios de previd ê ncia em favor de seus servidores p ú blicos. Enquanto com rela çã o ao RGPS apenas a Uni ã o det é m compet ê ncia exclusiva para legislar, aos demais entes foi concedida a compet ê ncia para organizar o sistema de previd ê ncia de seus servidores p ú blicos, seguindo as regras gerais da lei 9.717/98 e Lei n º 10.416/02.
3.2. Da aplica çã o servidores municipais
dos
regimes
aos
Muito embora a Constitui çã o Federal preveja a cria çã o de Regimes Pr ó prios, n ã o imp õ e compulsoriedade da institui çã o daquele regime aos entes federativos municipais. Com a aus ê ncia de RPPS
institu í do por lei, submetem-se os servidores ao RGPS, gerido pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), autarquia federal. Assim sendo, quanto aos servidores p ú blicos municipais podemos ter dois regimes aplic á veis: a) Com a exist ê ncia de Regime Pr ó prio, a este os servidores municipais s ã o vinculados, devendo o munic í pio recolher de seus pr ó prios servidores as contribui çõ es necess á rias à manuten çã o do sistema de previd ê ncia. Existindo RPPS, o munic í pio ir á gerir esse regime em sua integralidade, recolhendo as contribui çõ es de seus servidores, que n ã o podem ser inferiores a al í quota de 11% (percentual cobrado pela Uni ã o de seus servidores), e integralizando os valores necess á rios a garantir a manuten çã o do sistema nos termos da lei instituidora. b) Com a aus ê ncia de Regime Pr ó prio os servidores se vinculam ao RGPS. Nesse caso, o INSS é quem vai gerir o regime previdenci á rio aplicado, cabendo aos munic í pios a obriga çã o tribut á ria de pagar suas contribui çõ es sociais (contribui çã o patronal,
SAT/RAT, etc.), bem como se haver com as obriga çõ es acess ó rias, tal qual promover o recolhimento das contribui çõ es devidas pelos servidores e efetuar seu repasse, e declarar por GFIP todos os valores à Receita Federal do Brasil.
3.3. Da aplica çã o dos regimes aos ocupantes de cargos p ú blicos sem v í nculo de efetividade
Com rela çã o aos ocupantes de cargos p ú blicos na administra çã o municipal sem v í nculo efetivo, a t í tulo exemplificativo, os ocupantes de cargos comissionados e empregados p ú blicos (que trabalham sob o regime da CLT), por sua vez, a impossibilidade de seu enquadramento em regimes pr ó prios de previd ê ncia tem decorr ê ncia da previs ã o do art. 40 § 13 da Constitui çã o Federal, que disp õ e sobre a obrigatoriedade de filia çã o dos servidores sem v í nculo efetivo ao RGPS. A posi çã o do STF é uniforme nesse sentido, enquadrando os ocupantes de cargos
comissionados nesse rol.[304] exposto
Assim, a situa çã o descrita se enquadrar á no no item “ b) ” acima, culminando nas
consequ ê ncias jur í dicas que ser ã o tratadas mais esmiu ç adamente no t ó pico a seguir.
3.4. Das consequ ê ncias jur í dicas tribut á rias da exist ê ncia de segurados vinculados ao RGPS nos quadros do Munic í pio
Conforme j á exposto, seja pela exist ê ncia de ocupantes de cargos p ú blicos sem v í nculo efetivo, ou pela aus ê ncia de Regime Pr ó prio de Previd ê ncia Social institu í do por lei local para os servidores p ú blicos, haver á a vincula çã o do quadro de pessoal municipal ao RGPS, gerido pelo INSS, autarquia federal. Nesse contexto, o ente municipal ser á admitido como empregador (empresa), nos termos do art. 15, I da lei 8.212/91[305]. Sendo equiparado à empresa, certas obriga çõ es tribut á rias lhe
ser ã o impostas. A primeira delas é a chamada contribui çã o patronal, estipulada no art. 22 da lei 8.212/91, in verbis: Art. 22. A contribuição a cargo da empresa, destinada à Seguridade Social, além do disposto no art. 23, é de: I - vinte por cento sobre o total das remunerações pagas, devidas ou creditadas a qualquer título, durante o mês, aos segurados
empregados
e
trabalhadores
avulsos que lhe prestem serviços, destinadas a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma, inclusive as gorjetas, os ganhos habituais sob a forma de utilidades e os adiantamentos
decorrentes
de
reajuste
salarial, quer pelos serviços efetivamente prestados, quer pelo tempo à disposição do empregador ou tomador de serviços, nos termos da lei ou do contrato ou, ainda, de convenção ou acordo coletivo de trabalho ou sentença normativa.
Apesar de não expresso, é possível a extração
desse texto normativo do fato gerador do tributo como sendo a ocorrência de uma relação de trabalho entre a empresa e o segurado vinculado ao RGPS. Como no caso o município se equipara à empresa nos termos do art. 15 supracitado, este ente figurará no polo passivo da obrigação tributária, como contribuinte. Em relação à contribuição do segurado, evidentemente o município equiparado à empresa não será contribuinte. Contudo, terá para si a obrigação acessória imposta aos empregadores de recolher os valores devidos pelos segurados e repassá-los à União. Assim sendo, qualquer mora pelo ente público nos repasses será uma direta infração à lei[306]. As sanções decorrentes dessa omissão no repasse são diversas, desde a possibilidade de ocorrência do crime de apropriação indébita previdenciária pelo prefeito, nos termos do fato típico descrito no art. 168-A do Código Penal, a imputação de multa tributária, bem como a ocorrência de improbidade administrativa. Por fim, no rol de contribuições sociais
devidas pelo ente público em análise restam as contribuições do Seguro de Acidente de Trabalho e do Risco Ambiental do Trabalho. A primeira refere-se à manutenção do referido seguro com a aplicação de alíquota variável de 1%, 2% ou 3% em razão do grau de risco da atividade preponderante na empresa. No caso do município atenção deve ser dada, porque, não obstante serem diversas as atividades de seus servidores e seu consequente grau de risco heterogêneo, haverá a aplicação uniforme de uma das alíquotas para a universalidade da folha de pagamento. Chega-se, portanto, a uma média das atividades desenvolvidas pelos segurados para a imposição da alíquota ao ente público. A contribuição ao RAT, de maneira diversa, é específica aos segurados que por situação de sua atividade de risco, possam fruir de aposentadoria especial. Nesse caso a alíquota adicional de 6, 9 ou 12 por cento deverá ser adicionada apenas em relação aos servidores que tenham essa atividade de risco excepcional, não importando para tanto o grau de risco considerado para o SAT, seja leve, médio ou alto.
passivos
Assim, os municípios podem ser sujeitos da obrigação tributária relacionada às
contribuições previdenciárias devidas ao sistema do INSS, e cobradas pela Receita Federal do Brasil e pela Procuradoria da Fazenda Nacional.
4. DAS TAXAS DEVIDAS PELOS MUNICÍPIOS
Em mem ó ria ao racioc í nio firmado no princ í pio deste cap í tulo, foi observado que o texto constitucional ao estabelecer a imunidade rec í proca entre os entes federativos delimitou sua abrang ê ncia apenas aos impostos, esp é cie do g ê nero tributo, restando os demais tipos sem qualquer ó bice no plano das imunidades tribut á rias. Neste t ó pico ser ã o tratadas as taxas, que se caracterizam nos termos do art. 77 do CTN como tributos cujo fato gerador decorre do exerc í cio regular do poder de pol í cia, ou a utiliza çã o, efetiva ou potencial, de servi ç o p ú blico espec í fico e divis í vel, prestado ao
contribuinte ou posto à sua disposi çã o.
4.1. Taxas de licenciamento de ve í culos De imediato distingue-se a presente taxa do Imposto sobre a Propriedade de Ve í culos Automotores, de compet ê ncia municipal. Al é m da diferen ç a de esp é cie tribut á ria, verifica-se que a taxa em quest ã o n ã o se refere à propriedade de ve í culo automotor, nem o poderia por veda çã o do art. 77, Par á grafo Ú nico, do CTN, mas à presta çã o do servi ç o p ú blico de licenciamento do ve í culo pela autarquia estadual competente, qual seja, o DETRAN. Outra diferen ç a é que enquanto a taxa é recolhida pelo ente descentralizado, o referido imposto deve ser cobrado diretamente pela Receita Estadual. Delimitadas as particularidades dos tipos tribut á rios, nota-se que enquanto o imposto n ã o poderecair sobre os ve í culos de propriedade municipal, a taxa em quest ã o pode e deve ser cobrada anualmente dos munic í pios para o licenciamento de seus ve í culos,
salvo isen çã o por lei estadual.
4.2. Taxas ambientais A fiscaliza çã o ambiental é de compet ê ncia compartilhada entre a autarquia federal IBAMA e os ó rg ã os de prote çã o ambiental criados em cada estado da federa çã o. Neste cen á rio, caber á a esses entes o exerc í cio do poder de pol í cia na fiscaliza çã o do impacto ambiental decorrente de obras, culminando na concess ã o ou n ã o do licenciamento ambiental necess á rio ao empreendimento. H á possibilidade, no caso, da cobran ç a tanto pelo IBAMA, como pelos ó rg ã osestaduais de taxas ao exerc í cio desse poder de pol í cia nos termos do art. 77 do CTN. A quest ã o é exposta quando da incid ê ncia tribut á ria em fiscaliza çã o de obras p ú blicas promovidas pelo munic í pio. Ora, a imunidade n ã o é pass í vel de aplica çã o, haja vista que n ã o se estende à s taxas. A possibilidade vislumbrada para o n ã o pagamento da referida taxa pelo ente municipal é a
exist ê ncia de isen çã o no plano legal, que deve ou n ã o ser observada no caso concreto. Concluindo, ao promover uma obra p ú blica o munic í pio dever á obter o licenciamento ambiental, fornecido pelas entidades federal e estadual acima descritas. Para essa fiscaliza çã o, poder á a lei estabelecer uma taxa devida, que vincular á o ente municipal em uma obriga çã o tribut á ria, salvo a exist ê ncia de isen çã o no plano legal, haja vista que a imunidade constitucional n ã o alcan ç aria tal tributo.
4.3. Taxas de fiscaliza çã o pelo Corpo de Bombeiros
As reparti çõ es p ú blicas municipais devem ser fiscalizadas periodicamente pelo Corpo de Bombeiros Militar do Estado, para aferir a seguran ç a das instala çõ es e fornecer laudo t é cnicoelencando as altera çõ es necess á rias a serem realizadas. Como
este
procedimento
se
configura
perceptivelmente como exerc í cio regular de direito de pol í cia, é pass í vel de institui çã o de taxa correspondente, nesse caso, a ser devida pelo ente p ú blico municipal.
5. AS CONTRIBUIÇÕES DE MELHORIA TERRITÓRIO MUNICIPAL DECORRENTES
NO DE
OBRAS EFETUADAS POR OUTRO ENTE PÚBLICO
As Contribui çõ es de Melhoria foram previstas pelo constituinte no art. 145, III da CF/88. Esses tributos t ê m como fato gerador o acr é scimo patrimonial de im ó veis locais em decorr ê ncia de alguma obra p ú blica. Identifica-se, portanto, que a principal fun çã o dessa esp é cie tribut á ria é impedir o enriquecimento sem causa, um dos nortes que permeia diversos ramos do direito p á trio. A quest ã o relevante que surge no presente estudo diz respeito à possibilidade de ser cobrada a
contribui çã o de melhoria do ente municipal, propriet á rio de um bem im ó vel local que sofra valoriza çã o em decorr ê ncia de obra p ú blica realizada por outra pessoa jur í dica de direito p ú blico. Exemplifiquemos: Suponhamos que a Uni ã o construa uma rodovia pr ó xima a um terreno de propriedade municipal. Decorrente desta obra, o terreno passa a ter uma excelente via de acesso, incrementando seu valor imobili á rio. Seria poss í vel a cobran ç a de contribui çã o de melhoria ao munic í pio? Em an á lise da situa çã o em quest ã o, parece-nos que a cobran ç a entre os entes pol í ticos de tal contribui çã o n ã o seria compat í vel com a fun çã o do tributo. Isso porque o munic í pio, enquanto detentor de bens p ú blicos, cuja utiliza çã o pressup õ e o atendimento ao interesse p ú blico, não iria “ lucrar ” com a obra de outro ente. Os bens p ú blicos n ã o t ê m como finalidade a comercializa çã o no mercado imobili á rio. Assim sendo, acr é scimos neste valor teriam pouca import â ncia para a promo çã o do interesse p ú blico.
Ressalta-se que mesmo que haja ulterior aliena çã o do bem, com a sua desafeta çã o pr é via, o valor acrescido deste que ser á base para o procedimento licitat ó rio, ter á como fim o retorno ao munic í pio de recursos destinados à presta çã o dos servi ç os p ú blicos devidos à popula çã o, não havendo efetivo enriquecimento, como ocorreria com bens privados. Essa parece ser a op çã o trazida pelo Decreto-Lei 195/67, diploma normativo com for ç a de lei que regulamenta a mat é ria das contribui çõ es de melhoria, que em seu art. 2 º disp õ e:
Art 2 º Ser á devida
a
Contribui çã o
de
Melhoria, no caso de valoriza çã o de im ó veis de propriedade privada, em virtude de qualquer das seguintes obras p ú blicas:
[…] No teor do texto legal é determinada a incid ê ncia da contribui çã o apenas em decorr ê ncia da valoriza çã o de im ó veis de propriedade privada. Assim,
o legislador retirou do alcance do fato gerador do tributo a valoriza çã o de bens p ú blicos, impedindo a institui çã o de cobran ç as desse tipo entre os entes.
Acresce ainda o quanto disposto no art. 13 do referido diploma: Art 13. A Contribui çã o
cobran ç a da de Melhorias,
resultante de obras executadas pela Uni ã o, situadas em á reas urbanas de um ú nico Munic í pio, poder á ser efetuada pelo ó rg ã o arrecadador municipal, em conv ê nio com o ó rg ã o federal que houver realizado as referidas obras. Ou seja, n ã o apenas a contribui çã o de melhoria n ã o ser á cobrada, pela Uni ã o, ao munic í pio, como, por meio de conv ê nio, a cobran ç a do valor referente à quele tributo pode ser repassada à edilidade,
numa verdadeira opera çã o de parafiscalidade.
6. DA INSCRI ÇÃ O DOS MUNIC Í PIOS EM D Í VIDA ATIVA DE OUTROS ENTES E O AJUIZAMENTO DE EXECU ÇÕ ES FISCAIS CONTRA A FAZENDA P Ú BLICA MUNICIPAL Figurando no polo passivo da obriga çã o tribut á ria, pode o munic í pio ser objeto de execu çã o fiscal contra a Fazenda P ú blica, caso em que se sujeitar á ao quanto disposto na LEF - Lei 8.630[307]. A Fazenda P ú blica municipal ser á executada pela Uni ã o, por exemplo, em caso de d í vidas relativas à contribui çã o previdenci á ria nos termos da Lei 8.212. O munic í pio, evidentemente, não ser á citado para pagar em 5 dias, mas, sim, para embargar e discutir a validade do d é bito, apresentando sua defesa. Os embargos ser ã o necessariamente
recebidos em seu efeito suspensivo. Julgados improcedentes, ou na hip ó tese de n ã o ter havido impugna çã o à execu çã o fiscal, o juiz determinar á a requisi çã o de valores por meio de precat ó rio ou RPV, conforme o valor do d é bito. A partir da inscri çã o em d í vida ativa, o munic í pio passa a ter restri çõ es cadastrais no CADIN[308], o que lhe impede a realiza çã o de opera çõ es financeiras diversas e o recebimento de verbas federais. É certo que, com a suspens ã o do cr é dito exequendo por meio do manejo de embargos à execu çã o fiscal ou de ades ã o a parcelamento do d é bito, o munic í pio faz jus à certid ã o positiva com efeito de negativa. Relevante lembrar que, em caso de n ã o pagamento do precat ó rio ou do RPV, mesmo o FPM pode ser bloqueado em percentual que n ã o comprometa as finan ç as da edilidade, mas que seja suficiente para pagamento, ainda que n ã o integral, do cr é dito tribut á rio.
7. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA: Costa, Regina Helena. Curso de direito tributário. Constituição e Código tributário Nacional/ Regina Helena Costa – São Paulo : Saraiva, 2009. Ibrahim, Fábio Zambitte. Curso de direito previdenciário/Fábio Zambitte Ibrahim – 7ª. Ed. – Rio de Janeiro: Impetus, 2006. Horvath Júnior, Miguel. Direito previdenciário/ Miguel Horvath Júnior. – 5ª ed. – São Paulo: Quartier Latin, 2005 Paulsen, Leandro. Contribuições: custeio da seguridade social / Leandro Paulsen. – Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2007. Alexandre, Ricardo. Direito tributário esquematizado / Ricardo Alexandre. – 2. ed. Atual. Ampl. São Paulo : Método, 2008. Martins, Sérgio Pinto. Direito da seguridade social /
Sérgio Pinto Martins. – 18. Ed. – São Paulo : Atlas, 2002.
Capítulo 28 REFLEXÕES ACERCA DO IMPACTO DA ISENÇÃO DO IPI NA REPARTIÇÃO DE RECEITAS DO FUNDO DE PARTICIPAÇÃO DOS MUNICÍPIOS
Morgana Rosa Leite Gurjão[309]
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS O Fundo de Participação dos Municípios, constitucionalmente estabelecido como uma das formas de transferência e distribuição de recursos da União para os Municípios, revelou-se de extrema importância para a subsistência e autonomia financeira desses entes políticos. A receita do FPM é composta pelo percentual do produto da arrecadação de dois importantes tributos federais: o Imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza (IR) e o Imposto de Produtos Industrializados (IPI). Quanto ao IPI, em específico, as desonerações tributárias concedidas pela União têm ocasionado impacto
nos valores repassados ao municípios e, por conseguinte, questionamentos acerca da possibilidade da União conceder benefícios fiscais em matéria de IPI, a despeito da diminuição da receita arrecadada para composição do fundo. Nas linhas seguintes, pretende-se analisar, de forma mais específica, as razões que impulsionam a concessão das desonerações fiscais em relação ao IPI e o ônus imposto aos Municípios em decorrência da diminuição dos valores repassados ao fundo, no intuito de verificar em que termos essa política de desoneração fiscal pode ser empregada e encontra amparo em nosso ordenamento jurídico.
2. REPARTIÇÃO CONSTITUCIONAL DE RECEITAS 2.1 Federalismo e repartição de competências tributárias O fortalecimento do pacto federativo depende da
autonomia financeira e do equilíbrio entre os entes políticos que compõem o Estado Federado, de modo que as suas atribuições e competências foram discriminadas na nossa Carta Magna. O Sistema Tributário Nacional foi constitucionalmente definido de maneira que cada ente político possua competência para instituir e arrecadar exclusivamente determinados tributos. A divisão de competências tributárias comtempla a ideia de que cada esfera de governo, em um Estado Federado, é autônomo e necessita arrecadar seus próprios tributos com o objetivo de obtenção da receita necessária para a realização de suas atribuições. A CF/88, além da distribuição de competências tributárias, estabelece também, a repartição e transferência de recursos entre os entes federativos com o objetivo de fomentar o equilíbrio socioeconômico, reduzir as desigualdades sociais regionais[310] e contribuir para que os diferentes níveis de governo tenham autonomia financeira. Assim, com a repartição de rendas, os estadosmembros são habilitados a desempenhar de modo mais
autônomo as suas competências (MENDES; COELHO E BRANCO, 2010). Na esteira das lições de Amaro (2009, p.93): No que respeita às receitas (ou, mais genericamente, aos ingressos) de natureza tributária, optou a Constituição por um sistema misto de partilha de competência e de partilha do produto da arrecadação. No primeiro mecanismo – que mais de perto vai interessar-nos – o poder de criar tributos é repartido entre os vários entes políticos, de modo que cada um tem competência para impor prestações tributárias, dentro da esfera que lhe é assinalada pela Constituição.
Não obstante a repartição de competências para a instituição e arrecadação de tributos próprios, a Constituição estabeleceu, ainda, hipóteses de partilha do produto da arrecadação de alguns tributos de um ente político com outro. Ainda consoante Amaro (2009, p. 94): No segundo mecanismo, o produto da arrecadação de determinados tributos, instituídos por certo ente político, não é por este apropriado, ou não é por ele totalmente apropriado, mas partilhado com outros entes políticos. Desse modo, as decisões sobre o nível de incidência dependem do ente político titular da competência; mas a arrecadação resultante das leis que ele editar não lhe pertence integralmente, pois é partilhada. (grifou-se)
Importante estabelecer desde logo a seguinte premissa: ainda que determinado ente político esteja constitucionalmente obrigado a partilhar o produto da arrecadação de tributos que lhe sejam próprios, as decisões sobre níveis de incidência somente dele dependem. Isso significa que o ente político tem plena liberdade para reduzir alíquotas e conceder isenções de determinado tributo que seja de sua competência, ainda que o produto da arrecadação deva ser partilhado conforme determinação constitucional.
2.2 Transferência de receita da União para os Municípios e o Fundo de Participação dos Municípios A repartição constitucional de recursos em favor dos municípios, com o objetivo de amenizar as desigualdades e promover o equilíbrio econômico, pode ser realizada de forma direta ou indireta. Na primeira, o ente beneficiado recebe parcela da receita de forma direta, sem interferência de qualquer intermediário. Na transferência indireta, o repasse de parte da receita é
destinada, inicialmente, a um fundo de participação e posteriormente repartida entre os entes que o compõem, de acordo com critérios constitucionais e legais. A CF/88 trata da repartição das receitas tributárias da União em favor dos municípios em seus artigos 158 e 159, assim redigidos: Art. 158. Pertencem aos Municípios: I - o produto da arrecadação do imposto da União sobre renda e proventos de qualquer natureza, incidente na fonte, sobre rendimentos pagos, a qualquer título, por eles, suas autarquias e pelas fundações que instituírem e mantiverem; II - cinqüenta por cento do produto da arrecadação do imposto da União sobre a propriedade territorial rural, relativamente aos imóveis neles situados, cabendo a totalidade na hipótese da opção a que se refere o art. 153, § 4º, III; III - cinqüenta por cento do produto da arrecadação do imposto do Estado sobre a propriedade de veículos automotores licenciados em seus territórios; IV - vinte e cinco por cento do produto da arrecadação do imposto do Estado sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação. Parágrafo único. As parcelas de receita pertencentes aos Municípios, mencionadas no inciso IV, serão creditadas conforme os seguintes critérios: I - três quartos, no mínimo, na proporção do valor adicionado nas operações relativas à circulação de
mercadorias e nas prestações de serviços, realizadas em seus territórios; II - até um quarto, de acordo com o que dispuser lei estadual ou, no caso dos Territórios, lei federal. (Grifou-se)
Art. 159. A União entregará: I - do produto da arrecadação dos impostos sobre renda e proventos de qualquer natureza e sobre produtos industrializados, 49% (quarenta e nove por cento), na seguinte forma: a) vinte e um inteiros e cinco décimos por cento ao Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal; b) vinte e dois inteiros e cinco décimos por cento ao Fundo de Participação dos Municípios; c) três por cento, para aplicação em programas de financiamento ao setor produtivo das Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, através de suas instituições financeiras de caráter regional, de acordo com os planos regionais de desenvolvimento, ficando assegurada ao semi-árido do Nordeste a metade dos recursos destinados à Região, na forma que a lei estabelecer; d) um por cento ao Fundo de Participação dos Municípios, que será entregue no primeiro decêndio do mês de dezembro de cada ano; e) 1% (um por cento) ao Fundo de Participação dos Municípios, que será entregue no primeiro decêndio do mês de julho de cada ano; [..]
Um dos modos que a União tem de repartir suas receitas é, pois, destinando percentual da arrecadação do IR e IPI para rateio entre os Municípios mediante um Fundo de Participação. Trata-se de importante incremento na composição das receitas municipais, uma vez que, depois de repassado ao FPM, ocorrerá a divisão do montante oriundo da arrecadação dos impostos mencionados, de acordo com critérios estabelecidos LC nº62/1989[311], cabendo ao Tribunal de Contas União a tarefa de efetuar o cálculo da participação cada Município, consoante determinação do art. 161 CF/88[312].
na da de da
No entanto, observa-se da análise da redação dos dispositivos acima transcritos, que as duas formas de transferência de recursos são distintas. No art. 158, o Constituinte asseverou, de forma clara, que as parcelas dos impostos ali mencionados, ainda que sejam instituídos e arrecadados pela União, pertencem, em parte, aos municípios. Todavia, no que concerne ao disposto no art. 159, a determinação constitucional é de que a União entregue aos municípios, via transferência para o FPM,
determinado percentual do produto da arrecadação do IR e do IPI. Sendo assim, ainda que parcela considerável do produto da arrecadação desses tributos seja destinado, via fundo, aos municípios, os referidos tributos pertencem única e exclusivamente à União. Logo, considerando que o montante transferido a cada período é diretamente proporcional ao desempenho da arrecadação líquida desses impostos no período anterior[313], é lógico concluir que ocorrerá a diminuição da quota parte dos Municípios em razão de benefícios fiscais eventualmente concedidos pela União. Além disso, cumpre relembrar que o IPI, especificamente, é imposto utilizado para fins extrafiscais, sendo constantemente utilizado pela União como instrumento regulador do mercado o que, por consequência, provoca uma inevitável redução na arrecadação e no montante destinado ao FPM. 3. EXTRAFISCALIDADE DO IPI Conforme já se viu, o Fundo de Participação dos
Municípios é composto por parte da arrecadação do IR e do IPI e a competência para a instituição é arrecadação desses impostos é privativa da União, conforme estabelecem os incisos III e IV do art. 153 da Constituição Federal de 1988. É importante ressaltar, de início, que os tributos não são instituídos para fins exclusivamente fiscais, embora sejam a principal fonte de receita do Estado. Além da finalidade arrecadatória, por incidirem em determinadas operações, os tributos possuem também efeitos extrafiscais, influenciando as escolhas dos agentes econômicos (PAULSEN, 2012). O IPI incide sobre operações com produtos industrializados e é tributo que deve ser necessariamente instrumento de extrafiscalidade (CARRAZA, 2007), uma vez que é utilizado para a consecução de outros objetivos econômicos, além da arrecadação de receitas para os cofres públicos. Por ser intimamente relacionado à produção e ao consumo, em tempos de estagnação econômica, a União pode desonerar ou isentar o IPI incidente sobre determinados produtos industrializados,
no intuito de estimular a produção e venda no mercado. O imposto em comento deve, pois, ser utilizado como instrumento de ordenação político-econômica (CARRAZA,2007), já que capaz de estimular ou desestimular a venda e o consumo de produtos. Utilizando-se da função extrafiscal do IPI, em 2008 e 2009, para amenizar o impacto da crise econômica mundial, a União implantou diversas medidas para a diminuição interna dos seus efeitos e para aumentar a atividade econômica dos setores mais afetados. No que concerne à política fiscal, entre outras medidas adotadas, as renúncias ficais foram utilizadas para estimular determinados setores da economia, reduzindo as alíquotas ou até mesmo isentando determinados produtos do IPI. Essa desoneração provocou, obviamente, a redução da arrecadação de impostos, mas, por outro lado, foi crucial para o estímulo da economia nacional em meio a crise externa. Da análise de nota técnica elaborada pelo IPEA[314] (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) que estudou o impacto da desoneração do IPI de
automóveis em 2009 especificamente, observa-se que houve, sim, vultosa queda no valor da arrecadação do mencionado tributo, todavia, de acordo com a avaliação feita pelo Instituto, se as alíquotas não tivessem sido reduzidas, a venda de veículos teria sido menor, afetando, também, a arrecadação de outros tributos que incidem na cadeia automobilística. Concluiu-se, pois, que a perda de arrecadação do IPI foi compensada com outros tributos. Ademais, quanto ao impacto social, observou-se que a desoneração colaborou para manutenção de empregos diretos e indiretos na economia brasileira. Como se vê, se por um lado essa medida foi essencial para evitar a estagnação da economia nacional e o desemprego no setor industrial, por outro lado, no entanto, como consequência da desoneração fiscal do IPI, houve a diminuição da arrecadação de valores aos cofres públicos e, por conseguinte, um impacto negativo no montante repassado ao FPM. A função extrafiscal atingiu seu objetivo, embora a função fiscal tenha sido prejudicada.
4. IMPACTO DAS DESONERAÇÕES TRIBUTÁRIAS NO FPM 4.1 Correção do procedimento de cálculo adotado pelo TCU Seguindo esse raciocínio da importância da redução e isenção de alíquotas do IPI para estímulo de alguns setores da economia, interessante questão se impõe a respeito dessas desonerações fiscais e do seu impacto na receita dos municípios, em razão da diminuição da arrecadação de tributos e, consequentemente, do montante destinado ao FPM. A transferência de recursos, via fundo, é, sem dúvidas, muito importante para a composição das receitas municipais, cabendo ao Tribunal de Contas da União a tarefa de efetuar o cálculo da quota que será devida a cada município. Feitas essas considerações, poderia o TCU, ao compor o montante do FPM, proceder à dedução das desonerações fiscais do IPI? A resposta só pode ser sim. Explica-se. O Tribunal de Contas da União procede desse
modo por obediência ao inciso I, do art. 159, da CF/88, que prescreve que a União entregará percentual, nos moldes ali descritos, do produto da arrecadação do IR e do IPI. Isso significa que só irão compor o FPM as parcelas efetivamente arrecadadas a título de imposto de renda (IR) e imposto sobre produtos industrializados (IPI). Ocorre que, no caso de isenção, não há arrecadação efetiva, ou seja, aquela que ingressa de forma definitiva nos cofres públicos e nela permanecem a título de IPI. É que a arrecadação de que trata a CF/88 é a efetiva, a líquida, e não a meramente contábil ou ficta. Nessa lógica, parte do produto da arrecadação efetiva dos tributos é que devem ser repassados ao FPM. Quando há desoneração, seja pela isenção ou diminuição de alíquota do IPI, a arrecadação para os cofres públicos referente a esse imposto é reduzida. Logo, conclui-se, por óbvio, que o montante a ser repassado ao fundo, bem como o recebido por cada Município, também será reduzido. Assim sendo, embora a desoneração de IPI com o objetivo de aquecer o setor econômico tenha impacto
direto no FPM, já que parte dos valores destinados ao fundo advém da arrecadação desse tributo federal, devese considerar que essas renúncias fiscais objetivam fomentar a produção e compra de produtos para estimular a economia nacional e beneficiar, com isso, toda a coletividade, evitando o desemprego e outras consequências sociais que atingem a todos, indistintamente, inclusive os munícipes.
4.2 Repartição do ônus econômico financeiro na Federação A CF/88 ao atribuir ao Poder Executivo Federal, através de seu art. 153, § 3º, a faculdade de alterar alíquotas dos impostos ali previstos (IR, IE, IPI e IOF), não afirma que apenas a União, de forma isolada, é que deverá suportar eventuais prejuízos fiscais em caso de redução da tributação, e nem tampouco que tal ente será o único beneficiado por eventual acréscimo. Ademais, e esse talvez seja o ponto crucial da questão, se fosse admissível a tese de que a União não
pode reduzir alíquotas dos tributos que compõem o FPM por também pertencerem aos municípios, seria possível concluir, de igual modo, que eventuais valores recolhidos em virtude do aumento das alíquotas também não deveriam compor o FPM. Conforme mencionado alhures, a União pode, sim, reduzir alíquotas e isentar contribuintes do pagamento do IPI sem ter de arcar sozinha com os custos de tais reduções e isenções, porquanto essas desonerações fiscais beneficiam a todos, ainda que de forma indireta. Feitas essas considerações, compreende-se razoável, pois, que o ônus dessa política fiscal de desoneração do IPI também seja suportado pelo municípios. Nesse sentido, importante transcrever trecho de sentença, em razão de ser bastante elucidativa a respeito do assunto, proferida em ação ordinária, movida por Município de Sergipe, em que se requisitava que a União utilizasse para cálculo da quota parte no fundo a base de cálculo de 22, 5% do produto da arrecadação do IR e do IPI sem a exclusão dos benefícios, incentivos e isenções fiscais concedidos pelo Governo Federal:
Federalismo. econômico.
Distribuição
do
ônus
financeiro-
Sob outro prisma, é válida a premissa de comunhão quanto aos ônus das políticas fiscais, monetária e econômicas adotadas pelo País, sendo, as duas primeiras, com primazia pela União, e a última, concorrentemente com os Estados e o Distrito Federal (CF/1988, art. 22, VI, VII e VIII, e art. 24, I). Penso ser inafastável essa idéia de partição, de rateio isonômico, entre os entes integrantes da Federação, quanto aos reveses assumidos ao se buscar construir uma sociedade livre, justa e solidária, garantir-se o desenvolvimento nacional, a erradicação da pobreza, da marginalização e a redução das desigualdades sociais e regionais, inclusive diante de graves crises econômicas (CF/1988, arts. 3º, I, II e III, 159, I, 'c', e 170, VII). Por definição, o federalismo (significando pacto, ajuste, convenção), como forma de Estado, implica a união indissolúvel, assentada em uma Constituição, de Estados-membros (autonomias regionais, na expressão de Michel Temer2), dotados de autonomia, ou seja, de autogoverno limitado, exercido dentro do círculo de competências traçadas na própria Carta Política. No caso brasileiro, a Constituição Federal de 1988 consagrou o município como "entidade federativa indispensável ao nosso sistema federativo, integrando-o na organização político-administrativa e garantindo-lhe plena autonomia"3. O federalismo cooperativo, expressão cunhada já nos idos de 1969, como esclarece Michel Temer4, e quer serviria para o atual estágio do
federalismo, em especial no Brasil, é reportado também por Misabel Machado Derzi, baseada em lição de Aliomar Baleeiro, e revelaria uma "evolução do princípio federal, compreendido como garantia adicional da liberdade - forma de evasão da concentração de poder - e profundamente impregnado da igualdade, da redução das grandes disparidades econômico-materiais, em favor de um desenvolvimento harmonioso e solidário"5. A partir dessa ordem de idéias, é de se convir da assunção isonômica entre União, Estadosmembros, Distrito Federal e Municípios, acerca das conseqüências em relação ao maior ou menor desempenho na atividade financeira do Estado quanto à arrecadação de receitas derivadas (receitas tributárias), implementada com vista a garantir os recursos necessários à consecução das políticas públicas e de gastos correntes. Considerada essa visão integrativa dos entes políticos autônomos, componentes da Federação, tem-se que o planejamento econômico e financeiro estatal é fundamental para a superação das vertiginosas e por vezes drásticas mudanças na economia mundial. Tal quadro enseja não um retorno ao modelo de Estado intervencionista, protagonista da atividade econômica, mas, sim, regulador e fomentador dos agentes econômicos, intervenção essa a ser desempenhada de forma excepcional, de modo temperado, e no interesse maior da coletividade (CF/1988, arts. 173 e 174). Sobre a interrelação entre a política econômica com as políticas fiscal e monetária, e o Direito Tributário, emanando reflexos na atividade financeira-tributária estatal, cito magistério de Celso Bastos:
A Política Econômica guarda estritas ligações com a Política Fiscal e Monetária. Para que um País alcance o tão almejado desenvolvimento econômico é necessário que as três estejam em perfeita harmonia. A Política Fiscal consiste na manipulação dos tributos e das despesas estatais tendo em vista a regulação da atividade econômica com o intuito de neutralizar os fenômenos da inflação e da depressão. A Política Fiscal é considerada expansiva quando a demanda é insuficiente em relação à produção de pleno-emprego, ocasionando uma 'deflação'. Nesse caso é necessário que haja uma diminuição da carga tributária como forma de estimular o consumo e também um incentivo às exportações, bem como um aumento nas tarifas e barreiras às importações e aos gastos públicos. [...] Note-se que por força da necessidade de estimular ou reprimir certas atividades, é normal hoje o Estado fazer uso da tributação para atingir esses objetivos. Essa fiscalidade é hoje uma realidade consiste na utilização dos tributos não só para os fins mais fundamentais seus, quais sejam o de obter recursos financeiros para o Estado, mas também como meio ou instrumento de atingimento de fins econômicos, sociais, tecnológicos, científicos etc. Os tributos constituem a fonte primordial das receitas do Estado. Essa extração de pode aquisitivo não pode deixar de produzir efeitos econômicos, quer sobre as atividades isoladas e especificamente consideradas, quer sobre a ordem econômica como um todo.6 Por conseguinte, repita-se, é irretorquível a conclusão de que a repartição das receitas tributárias, e, na hipótese concreta, a formação da base de
cálculo do FPM, haverá de levar em conta o produto efetivamente arrecadado, que ingressou como receita pública, abatidos os recursos destinados para os fundos de desenvolvimento regionais acima declinados, bem como os incentivos fiscais (sentido amplo) concedidos pela União, mediante isenções. A alusão ao federalismo cooperativo, ou, como refere Aliomar Baleeiro, federalismo integrativo, conduz à raciocínio diverso do sustentado pelo Município-autor, o qual não pode se eximir à sua parcela de responsabilidade e sacrifício no que pertine aos reflexos imediatos de políticas fiscais, monetárias e econômicas que, a par de levaram, em um primeiro momento, à diminuição da captação de recurso públicos, tendem a, posteriormente, gerar o aumento dos postos de emprego, de investimentos econômicos do setor privado, e, por conseguinte, à retomada ascendente das receitas tributárias. É sintomática e representativa dessa assunção e comunhão de responsabilidades no âmbito federativo a aguda crise econômica que se abateu em todos os países a partir de meados de setembro de 2008. Passado o momento inicial, houve a adoção de medidas fiscais incisivas, voltadas, em especial, ao aumento do consumo interno e manutenção dos empregos, a exemplo da desoneração da carga tributária em diversos setores da economia, redução das taxas de juros e manutenção quanto possível da liquidez do crédito (política monetária). Transcorridos pouco mais de um ano do início da crise, o Brasil, reconhecidamente, conseguiu atravessar o período turbulento sem maiores sobressaltos, mantendo-se a estabilidade econômica e a geração de riquezas em patamares satisfatórios, além de inalterabilidade da segurança jurídica
(ausentes os controversos planos econômicos, alteradores de regras comerciais-financeiras préexistentes e supressores de direitos). Sobre o tema, pontificou o ex-ministro da Fazenda Marcílio Marques Moreira7: A CRISE ECONÔMICO-FINANCEIRA global, de intensidade inédita nos últimos 60 anos, atingiu a economia brasileira duramente a partir de outubro de 2008. A atividade econômica que até o terceiro trimestre se expandia a mais de 6%, retraiuse no último trimestre em 3,6%. Freada brusca, quase sem precedentes. A reação do governo, que parecia acreditar na tese do 'descolamento', passou então ganhar consistência. Como principal correia de transmissão da crise entre os países desenvolvidos - a fragilidade do sistema bancário - não ocorreu no Brasil, eis que o sistema havia sido saneado, tanto em sua banda privada, quanto pública, em meados da década de 1990, urgia atuar sobre os demais mecanismos de contágio, em especial a retração do crédito internacional, a queda dos preços das principais commodities e na demanda pelos produtos de nossa pauta de exportação, a incerteza generalizada e a quebra de confiança que se instaurara em todo o mundo. A reação teve um componente monetário e outro fiscal. A cautelosa política do Banco Central havia resguardado importante colchão de segurança, o que permitiu reduzir, gradual mas significativamente, as taxas Selic, ao mesmo tempo em que se baixaram os compulsórios e se introduziram outras medidas tendentes a assegurar a liquidez e segurança dos bancos menores. Adicionalmente, parte das reservas
foi mobilizada para dar apoio tanto às empresas exportadoras, quanto àquelas que não mais podiam contar com a renovação dos financiamentos que haviam contraído no exterior. Com isto, foi possível contrarrestar os efeitos mais adversos da contração de crédito e restabelecer o financiamento aos bens de consumo durável - automóveis, motocicletas, eletrodomésticos da linha branca. Na área fiscal, por sua vez, procurou-se, por meio de desonerações temporárias, proporcionar sustento adicional à demanda desses bens. Em contraste com a folga que a política monetária soube preservar, entretanto, a área fiscal sofre restrição a uma atuação mais ampla, em face do aumento de gastos correntes que assumira na fase de arrecadações extremamente encorajadoras: despesas de natureza não só recorrente, mas com previsão de expansão escalonada. A súbita desaceleração da atividade econômica da atividade econômica doméstica e do comércio exterior, de um lado, e as desonerações fiscais, de outro, conduziram, por sua vez, a uma expressiva queda, nos primeiros meses do ano, da arrecadação, o que em vista de despesas em alta acabou gerando situação preocupante, insustentável a longo prazo. A curto prazo, entretanto, políticas fiscais anticíclicas em épocas de recessão são, por sua própria natureza, expansionistas. Os déficits fiscais decorrentes são o preço a pagar para evitar que a conjuntura não resvale para fenômeno ainda mais profundo e prolongado. Desse ponto de vista, portanto, a reação brasileira foi oportuna e capaz de superar o quadro mais agudo de pânico, mitigar-lhe os efeitos mais imediatos e estancar a queda livre da atividade do
último trimestre de 2008, que fora agravada pela eliminação precipitada de estoques e pela suspensão, ao menos temporária, do investimento e consumo. Agora, fortalecida pela distensão no contexto internacional, que superou o risco de desmanche do sistema financeiro e favoreceu o surgimento de 'brotos verdes', presságio da primavera, a nossa política contracíclica pode ser considerada haver alcançado os objetivos conjunturais a que se propusera. [...] (destaquei) A renúncia fiscal adotada pela União, por óbvio, em tributos de sua competência, com reflexos na arrecadação tributária, não pode ser a ela exclusivamente atribuída ou suportada, mormente porque, de outra forma, estaríamos sustentando, indevidamente, uma espécie de direito adquirido a patamares mínimos de repasses de verbas. Nada mais contingente, como se percebe, e que decorre da sua própria natureza, do que a atividade financeiro-tributária estatal, consubstanciada nas medidas de arrecadação de tributos de forma impositiva e coercitiva a partir da capacidade contributiva da pessoa (em sentido amplo). Compreender como quer a parte autora o federalismo cooperativo significaria, em boa verdade, conceber um federalismo de mão única, pela metade. Para tudo aquilo que fosse de interesse - e por interesse pretendo dizer benéfico - aos municípios, o federalismo, nesse sentido maniqueísta, serviria como fundamento de extensão, a criar obrigações unicamente para o ente central. Por outro lado, para tudo aquilo contrário aos interesses dos municípios - e por contrário aos interesses pretendo dizer gravoso ou prejudicial - o
federalismo já não poderia funcionar como cláusula de extensão, mas como barreira. A ser assim, por cooperação deveria ser entendido apenas um dever da União em relação aos entes periféricos, em lugar de um feixe recíproco de mútuas obrigações. Notícia corrente, toda a movimentação da União, na esfera tributária, com as reduções de alíquotas e demais expedientes mitigadores, teve por mira estimular a economia. Já o disse na presente sentença. Ora, em que sede esse ente mítico - a economia - demonstra sua dimensão tangível? Não seria justamente nos municípios, onde vivem, consomem e trabalham as pessoas que, por força daquelas medidas, puderam dar continuidade às suas atividades produtivas, mesmo em face do difícil período? Não seriam, portanto, os municípios indiretamente beneficiados pelas providências adotadas pela União, ao permitir que sua população encontrasse meios para sobreviver diante da crise? Não seria, portanto, a pretensão da parte autora a busca de um duplo benefício - o federalismo em que os entes menores não pagam a conta dos esforços à sua manutenção? A suposta injustiça da partilha de competências e receitas tributárias, ditada pela Constituição, apontada como causa da fragilidade dos entes periféricos no concerto federativo, não escapa de um contraponto. A injustiça aí argumentada residiria em um momento político e não puramente jurídico. O Judiciário, portanto, não tem a missão de remediá-la, salvo por meio de um desgarramento de suas funções movido por um embalo ideológico qualquer. Além disso - e é esse o contraponto também se poderia dizer, em um campo puramente político, e antes do momento jurídico, que, longe de
injusta, a partilha de competências e receitas não funciona em virtude da generosidade das regras constitucionais referentes à criação e estruturação de municípios, a permitir que diversos desses entes existam sem que gerem recursos próprios minimamente suficientes à sua manutenção. Mas, como disse, o debate aqui não é político. Se fosse, argumentos existiriam para os dois lados. [...] Por fim, não há se falar, igualmente, em necessária e prévia anuência dos municípios para se autorizar a alteração de alíquotas e da base de cálculo. A uma, porque, na hipótese, a competência tributária (poder de editar normas jurídico-tributárias) de cada ente político é estabelecida taxativamente pela Constituição Federal, de forma incondicionada e plena. Di-lo o CTN: Art. 6º A atribuição constitucional de competência tributária compreende a competência legislativa plena, ressalvadas as limitações contidas na Constituição Federal, nas Constituições dos Estados e nas Leis Orgânicas do Distrito Federal e dos Municípios, e observado o disposto nesta Lei. Parágrafo único. Os tributos cuja receita seja distribuída, no todo ou em parte, a outras pessoas jurídicas de direito público pertencerá à competência legislativa daquela a que tenham sido atribuídos. Art. 7º A competência tributária é indelegável, salvo atribuição das funções de arrecadar ou fiscalizar tributos, ou de executar leis, serviços, atos ou decisões administrativas em matéria tributária, conferida por uma pessoa jurídica de direito público a outra, nos termos do § 3º do artigo 18 da
Constituição. [...] Art. 8º O não-exercício da competência tributária não a defere a pessoa jurídica de direito público diversa daquela a que a Constituição a tenha atribuído. Não está a União condicionada à prévia ou posterior manifestação dos demais entes políticos quanto ao seu exercício pleno da competência de legislar sobre os impostos a ela conferidos exclusivamente pela Constituição Federal (art. 153), podendo, nessa condição, instituir benefícios fiscais ou isentar tributos, bem assim disciplinar acerca das alterações/reduções de alíquotas relativas àqueles tributos. Inconfundível, portanto, competência tributária com repartição de receitas tributárias. [...]
Em razão de parte do recurso destinado ao FPM advir do produto da arrecadação do IPI, não seria possível que os Municípios passassem pelo período de crise econômica totalmente incólumes. Inevitavelmente, a crise afetou a todos os entes políticos, e, sendo assim, foi por todos repartida. Não seria razoável exigir que a União assumisse sozinha os seus custos, uma vez que também dispõe de obrigações constitucionais para serem cumpridas.
Além disso, a própria União, à época, tentou reverter de certa forma o prejuízo experimentado pelos municípios. Deste modo, na pretensão de manter o equilíbrio econômico e social, tentou minimizar os efeitos da redução e isenção das alíquotas do IPI prestando apoio financeiro, no exercício de 2009, aos entes que receberam recursos do FPM, por meio da transferência de valores do Tesouro Nacional, conforme o teor da Medida Provisória nº 462 posteriormente convertida na lei nº 12.058/09.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao analisar a concessão de benefícios fiscais a título de IPI em tempos de crise econômica e o impacto provocado no montante destinado ao Fundo de Participação dos Municípios, verificou-se que a União tem legitimidade para instituir benefícios fiscais ou isentar o mencionado tributo cuja competência lhe foi atribuída pelo legislador constituinte originário sem qualquer tipo de ressalva em relação aos municípios, uma vez que está constitucionalmente obrigada e amparada a
tanto. Desse modo, a diminuição da arrecadação e do valor repassado a cada Município, depois de devidamente calculada a quota de rateio pelo TCU com as deduções dos benefícios fiscais concedidos, é um ônus inevitável em tempos de crise econômica e que não deve ser isoladamente suportado pela União, já que os benefícios das desonerações fiscais do IPI atingem toda a coletividade, ainda que de forma indireta. Por esta razão, tanto o ônus como o bônus do sistema de repartição de receitas através do Fundo de Participação dos Municípios, estabelecido na CF/88, deve ser compartilhado. REFERÊNCIAS AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 15ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988.
______. Lei Complementar no 62, de 28 de Dezembro de 1989. Estabelece normas sobre o cálculo, a entrega e o controle das liberações dos recursos dos Fundos de Participação e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 28 dez. 1989. Disponível em: . Acesso em: 19 ago. de 2015. ______. Tribunal Regional Federal – 5ª Região. Ação Ordinária nº 2009.85.00.3673-7. 2ª Vara. Juiz Federal: Fernando Escrivani Stefaniu. Aracaju, SE, 18 dez. 2009. Disponível em: < http://consulta.jfse.jus.br/Consulta/resconsproc.asp >. Acesso em: 19 ago. de 2015.
CARRAZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 23ª ed. Editora Malheiros, 2007. MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Martires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010. PALSEN, Leandro. Curso de Direito Tributário completo. 4ª ed. rev. atual. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012.
Capítulo 29 DOS CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA MUNICIPAL Por Luciara Lima Simeão Moura[315]
1. INTRODUÇÃO
Segundo o renomado doutrinador Capez[316], determinadas práticas defraudatórias do fisco se revelam tão danosas e constituem hábito tão arraigado em nosso sistema que o legislador foi obrigado a erigi-las à condição de crime, a fim de reforçar os mecanismos jurídicos de repressão a tais praticas atentatórias ao regular funcionamento do Estado e, por conseguinte, ofensivas à subsistência do próprio corpo social. Vê-se que a existência de legislação penal que tenha como objetivo a repressão aos crimes contra a ordem tributária mostra-se de suma importância no atual cenário econômico em que vivemos. O Direito Penal, que deve manter caráter subsidiário e fragmentário, entrou em cena para constituir mais uma ferramenta na tentativa de coibir a prática extremamente perniciosa e danosa da sonegação fiscal. Não por outra razão, a importância do estudo da Lei n.º 8.137/90, fim a que se propõe este capítulo. Primeiramente, realizar-se-á uma análise dos
crimes contra a ordem tributária elencados na Lei n.º 8.137/90 em seus aspectos penais e processuais, abrangendo o estudo das figuras típicas, com suas elementares, a classificação jurídica de cada delito, as causas de suspensão e extinção da punibilidade, e o entendimento do Excelso Supremo Tribunal Federal em aspectos mais controversos sobre a matéria. Num segundo momento, passa-se ao estudo e análise das principais formas de sonegação fiscal do tributo municipal denominado de Imposto Sobre os Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), abordando primeiramente as principais características deste imposto, para em seguida, deter-se sobre de que forma podem ser as condutas ilícitas enquadradas nos tipos penais trazidos pela lei de crimes contra a ordem tributária. 2. OS CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA E OS PRINCIPAIS ASPECTOS PENAIS E PROCESSUAIS. 2.1. OS TIPOS PENAIS DA LEI N.º
8.137/90. A Lei n.º 8.137, de 27 de dezembro de 1990, trata dos crimes contra a ordem tributária em seus três primeiros artigos, sendo o bem jurídico relevante tutelado a ordem tributária, entendida não apenas como a mera arrecadação dos tributos, mas toda e qualquer atividade relacionada à atividade arrecadatória do Estado. No escólio de Alécio Adão Lovatto[317]: “Nessas circunstâncias, deduz-se que não é em si mesmo, o pagamento, a arrecadação, o objeto primeiro de proteção da Lei n.º 8.137/90. O que se protege, antes de tudo, é a ordem tributária, a qual somente funciona, em nosso sistema, se houver veracidade das declarações, da documentação, dos lançamentos por homologação. No campo dos tributos, há que se preservar a verdade. Somente por reflexo, de forma indireta, é que exsurge protegida a arrecadação. É, pois no campo da documentação dos atos do contribuinte, quando deve registrar as operações de forma correta, quando não deve omitir seu registro, que se efetiva a redução do tributo ou
a sua supressão: em razão da conduta, ficou menor ou foi suprimido o tributo. Mais que a arrecadação, pelo texto legal, protege-se a regularidade, punindo-se toda ação ou omissão que nos termos da antiga definição legal de sonegação, impedia ou retardava o conhecimento por parte da autoridade fazendária da ocorrência do fato gerador da obrigação tributária principal, sua natureza ou circunstâncias materiais, bem como das condições pessoais do contribuinte, suscetíveis de afetar a obrigação tributaria principal ou o crédito tributário correspondente”. Elegeu-se a ordem tributária como bem jurídico de grande relevância diante da constatação de que sem o pagamento dos tributos o Estado não pode arcar com suas inúmeras obrigações voltadas sobretudo ao bem-estar social de seus cidadãos. O dinheiro com o qual todos devem contribuir em razão de obrigações tributárias é arrecadado para que o Estado possa desenvolver exatamente todas as prestações positivas que dele é exigido. Sem essa arrecadação, perdem a saúde, a educação, o transporte, o meio ambiente, a segurança
pública. Não por outra razão, está assim redigido o art. 1º da Lei n.º 8137/90: Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas: I - omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias; II - fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal; III - falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo à operação tributável; IV - elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato; V - negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relativa
à venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo com a legislação. Pena - reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. Parágrafo único. A falta de atendimento da exigência da autoridade, no prazo de 10 (dez) dias, que poderá ser convertido em horas em razão da maior ou menor complexidade da matéria ou da dificuldade quanto ao atendimento da exigência, caracteriza a infração prevista no inciso V. O tipo penal dos crimes elencados no art. 1º da supracitada lei, reconhecidos como os verdadeiros delitos de sonegação fiscal, possui dois verbos nucleares, quais sejam, suprimir e reduzir tributos, contribuição social ou qualquer acessório. Faz-se necessário, portanto, que toda a ação delituosa esteja voltada para a finalidade especifica de tornar inexistente a obrigação de pagar o tributo (suprimir), ou deixar tal obrigação menor (reduzir). Claramente, afigura-se impossível a existência de tal crime na modalidade
culposa. A tentativa é, em tese, possível, salvo para as condutas omissivas. De outra banda, convém sublinhar que além da vontade de fazer desaparecer ou diminuir o tributo exigível, é imperioso que a conduta criminosa tenha a capacidade real de reduzir ou suprimir o tributo, sob pena de estarmos diante de crime impossível. Dessas considerações, extrai-se que os tipos abrangidos no art. 1º são tipos penais materiais, que exigem o resultado. O resultado naturalístico (supressão ou redução efetiva do tributo, com prejuízo para o Estado) faz parte do tipo penal. É necessário, portanto, que as fraudes e quaisquer outros artifícios maliciosos realizados venham a suprimir efetivamente ou a reduzir o tributo. Este é o resultado que deve estar presente: em razão das condutas perpetradas, a obrigação tributária deixou de existir ou passou a ser de menor valor. Sem o resultado danoso, não há que se falar em crime de sonegação fiscal[318]. Em praticamente todos os incisos do art. 1º, encontra-se a descrição da prática de alguma fraude ou
falsificação cometida com o intuito deliberado de fazer com que o tributo não seja devido ou que, devido, seja menor do que realmente seria, não fosse o emprego de fraude, engodo, ou ardil. A sanção penal, portanto, cominada é mais grave que a estipulada no art. 2º. Varia de 2 (dois) a 5 (cinco) anos de reclusão, sendo incabível a suspensão condicional do processo, ao passo que as figuras penais disciplinadas no art. 2º são de menor potencial ofensivo, deslocando-se a competência para processamento aos Juizados Especiais Criminais, haja vista a pena máxima não ultrapassar os 2 (dois) anos. Nesses casos, é direito subjetivo do autor do fato, em eventual procedimento penal, a possibilidade de transação penal. No art. 1º, temos as seguintes modalidades de condutas criminosas: a) a omissão de informação ou declaração falsa (inciso I); b) a fraude pela inserção de elementos inexatos ou pela omissão de alguma operação realizada (inciso II); c) a falsidade material, com a criação de nota fiscal, duplicata ou nota de venda, ou qualquer outro documento relevante, ou a alteração de
algum desses documentos preexistentes (inciso III); d) a produção ou distribuição e uso de meios falsos (inciso IV); e) a recusa ou omissão de fornecimento de documento obrigatório ou o obstáculo à ação fiscal (inciso V e parágrafo único). O art. 2º da Lei traz, em seus cinco incisos, modalidades mais brandas de crime contra a ordem tributária[319], considerados de natureza formal: Art. 2° Constitui crime da mesma natureza: I - fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre rendas, bens ou fatos, ou empregar outra fraude, para eximir-se, total ou parcialmente, de pagamento de tributo; II - deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos; III - exigir, pagar ou receber, para si ou para o contribuinte beneficiário, qualquer percentagem
sobre a parcela dedutível ou deduzida de imposto ou de contribuição como incentivo fiscal; IV - deixar de aplicar, ou aplicar em desacordo com o estatuído, incentivo fiscal ou parcelas de imposto liberadas por órgão ou entidade de desenvolvimento; V - utilizar ou divulgar programa de processamento de dados que permita ao sujeito passivo da obrigação tributária possuir informação contábil diversa daquela que é, por lei, fornecida à Fazenda Pública. Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa. Para essa categoria de delitos, não se exige a presença do resultado como para os tipificados no artigo anterior. São delitos de mera conduta; formais, portanto. Necessário, contudo, o dolo específico de querer se ver eximido do pagamento do tributo, total ou parcialmente. Assim é que se o sujeito ativo omite uma declaração sobre um fato (a transmissão onerosa de um bem imóvel, exemplificando) para eximir-se do
pagamento de imposto (aqui no exemplo, o imposto municipal de transmissão de bens imóveis – ITBI), independentemente de ter havido a efetiva supressão do tributo, resta configurado o delito estampado no inciso I do art. 2º acima transcrito. E se houver, com essa conduta fraudulenta de omissão de fato, a efetiva supressão do tributo, com evidente prejuízo à Fazenda Municipal? Melhor capitulado o fato como o crime do inciso I do art. 1º. Essa, todavia, não é a única distinção entre os dois tipos penais, na medida em que o art. 2º, I, exige ainda como elementar do tipo que a declaração omitida ou falsa seja sobre rendas, bens ou fatos, o que não vem expressamente contido no art. 1º. Por fim, o art. 3º da lei trata dos crimes praticados por funcionário público, ditos crimes próprios, fazendo-se menção à coexistência com outros crimes tipificados no Código Penal[320]: Art. 3° Constitui crime funcional contra a ordem tributária, além dos previstos no Decreto-lei n.º
2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal (Título XI, Capítulo I): I - extraviar livro oficial, processo fiscal ou qualquer documento, de que tenha a guarda em razão da função; sonegá-lo, ou inutilizá-lo, total ou parcialmente, acarretando pagamento indevido ou inexato de tributo ou contribuição social; II - exigir, solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de iniciar seu exercício, mas em razão dela, vantagem indevida; ou aceitar promessa de tal vantagem, para deixar de lançar ou cobrar tributo ou contribuição social, ou cobrá-los parcialmente. Pena reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa. III - patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a administração fazendária, valendo-se da qualidade de funcionário público. Pena reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. Os crimes contra a ordem tributária praticados por funcionários públicos são de três categorias: a) o extravio, a sonegação ou a inutilização de
documento (inciso I); b) a concussão e a corrupção passiva (inciso II); c) advocacia administrativa perante Fazenda Pública (inciso III). Em todos as três categorias, obviamente, existe a presença de elementares que se conectam com a proteção da ordem tributária. Assim é que o extravio, a sonegação e a inutilização de documentos devem acarretar o pagamento indevido ou inexato de tributo ou contribuição social; a concussão e a corrupção passiva devem ser praticadas com a finalidade de deixar de lançar ou cobrar tributo ou contribuição social, ou cobrá-los parcialmente; o patrocínio, direto ou indireto, de interesse privado deve ser perante a Administração Fazendária. Sem os dolos específicos, condutas típicas e antijurídicas de funcionários públicos podem ser capituladas juridicamente como outros crimes tipificados no Código Penal[321]. 2.2. CONSEQUÊNCIAS DO PAGAMENTO OU PARCELAMENTO DOS TRIBUTOS O pagamento do tributo extingue a
punibilidade, bem como o ingresso em sistema de parcelamento, que pressupõe a confissão do débito, suspende a pretensão punitiva do Estado, com correspondente suspensão do prazo prescricional. O reconhecimento da extinção de punibilidade somente se dará, entretanto, findo o parcelamento com seu pagamento integral. Assim ocorre porque, por motivos de política criminal, considerou mais vantajoso o Estado privilegiar a arrecadação, recebendo o valor que lhe era devido, do que continuar com o jus persequendi em face do sonegador/devedor. Pago o tributo, desaparece o interesse do Estado-Juiz em continuar com a persecução criminal. A matéria é controversa na medida em que sucessivas alterações legislativas trazem constantemente a lume disciplinamentos diferentes, gerando certo tumulto e perplexidade entre os juristas. A Lei de Crimes contra a Ordem Tributária trazia originalmente em seu art. 14 a previsão da extinção da punibilidade pelo pagamento integral do
tributo desde que realizado antes do oferecimento da denúncia. Nada era mencionado quanto ao parcelamento do débito. Ocorre que um ano após o advento da legislação, o referido artigo foi revogado, pela Lei n.º 8.383/91, sendo restabelecido anos depois apenas com a edição da Lei n.º 9.249/96, que assim dispunha: Art. 34. Extingue-se a punibilidade dos crimes definidos na lei 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e na lei 4.729, de 14 de junho de 1965, quando o agente promover o pagamento do tributo ou contribuição social, inclusive acessórios, antes do recebimento da denúncia. Até então, permanecia ainda sem previsão legal a possibilidade de estender tal benefício político-criminal para contribuintes que parcelassem o débito (apenas o pagamento integral extinguia a punibilidade, e desde que feito até recebimento da peça acusatória), até que em abril de 2000, surgiu a lei 9.964 que instituiu o REFIS (Programa de Recuperação Fiscal) e que, no âmbito penal, dispôs sobre a extinção da punibilidade e sobre a suspensão da pretensão punitiva do
Estado, mas limitados aos débitos incluídos no Programa, o qual referia-se apenas a tributos federais, não abarcando impostos estaduais ou municipais. A suspensão da punibilidade ocorreria durante o período em que o contribuinte devedor fosse optante pelo Programa e, a extinção da punibilidade, ocorreria nos casos de pagamento do tributo e contribuição social integral, antes do recebimento da denúncia. Já em 2003, com a edição, desta feita, da Lei n.º 10.684, que instituiu novo parcelamento (PAES), também só aplicável na seara federal, o marco temporal de aderir ao parcelamento até antes do oferecimento da denúncia foi ignorado, não dispondo a lei nesse sentido. Em outras palavras, aderindo-se ao parcelamento, em qualquer momento processual, até mesmo em sede recursal, estaria suspensa a pretensão punitiva do Estado e, claro, findo o parcelamento com pagamento, extinta a punibilidade, obviamente também em qualquer momento processual. O pagamento do tributo por meio direto, sem prévio parcelamento, por motivos óbvios, também acarretaria a extinção da punibilidade,
sem a restrição relativa ao tempo em que fosse efetivado. Assim foi que o STF se manifestou nestes termos, tal como descrito abaixo: AÇÃO PENAL. Crime Tributário. Pagamento após o recebimento da denúncia. Extinção da punibilidade. Decretação. HC concedido de ofício para tal efeito. Aplicação retroativa do art. 9º da Lei Federal 10.684/03, cc. Art. 5º, XL, Da CF e art. 61 do CPP. O pagamento do tributo, a qualquer tempo, ainda que após o recebimento da denúncia, extingue a punibilidade do crime tributário. (BRASIL. Supremo Tribunal Federal – Habeas-corpus nº 81.929-0- Primeira Turma- Relator Ministro Sepúlveda Pertence - DJ 27/02/2004). A questão restava assentada na jurisprudência, sem maiores controvérsias. O pagamento extinguia a punibilidade a qualquer tempo; o parcelamento a suspendia, também se formalizado a qualquer tempo. Ocorre que foi promulgada em 25 de fevereiro de 2011, a Lei n.º 12.382, que regulamentou o valor do salário mínimo e alterou o artigo 83 da Lei 9.430/96, tratando assim de crimes tributários, pagamento e parcelamento.
Mais uma vez, o marco temporal de recebimento da denúncia voltou a ser contemplado pelo legislador. Os parcelamentos necessitariam, novamente, ser formalizados até antes do recebimento da denúncia para poderem dar azo à suspensão da punibilidade do agente, bem como para que a prescrição punitiva do Estado restasse suspensa. Os pagamentos diretos continuaram, todavia, por interpretação sistemática dos novos dispositivos, com o condão de extinguir a punibilidade sem marcos temporais limitadores. Assim vem sendo o entendimento majoritário do STF. Cite-se como exemplo o julgamento da Ação Penal 450/MG, de novembro de 2014, cuja ementa assim dispõe: AÇÃO PENAL. EX-PREFEITO E ATUAL DEPUTADO FEDERAL. DENÚNCIA DE INFRAÇÃO AO DECRETO-LEI 201/1967, ART. 1º, III E IX. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. EMENDATIO LIBELLI. ABSOLVIÇÃO EM RELAÇÃO À PARCELA DA APROPRIAÇÃO, EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE PELO PAGAMENTO, EM RELAÇÃO
AO MAIS. 1. A apropriação indébita previdenciária (art. 168-A do Código Penal) prevalece sobre o tipo previsto no art. 1º, XIV, do Decreto-Lei 201/1967, quando a hipótese versa descumprimento de lei municipal atinente a recolhimento a autarquia previdenciária. 2. Ausência de descrição própria de desvio de renda pública, independente da suposta apropriação indébita, leva à absolvição, sobretudo quando a prova dos autos evidencia não ter havido o suposto fato. Improcedência da denúncia, no ponto. 3. Incide, no caso, o entendimento de que o pagamento do tributo, a qualquer tempo, extingue a punibilidade do crime tributário. Precedente. (GRIFO NOSSO). 2.3. O PRÉVIO EXAURIMENTO DA VIA ADMINISTRATIVA ANTES DA INSTAURAÇÃO DE PROCESSO PENAL Durante muitos anos, o assunto relativo à necessidade ou não de esgotamento da via administrativa para instauração de processo penal pela prática dos crimes tipificados no art. 1º da Lei n,º
8.137/90 foi tema de discussões doutrinárias e jurisprudenciais. A tendência dos pretórios sempre foi de considerar a necessidade de exaurimento da via administrativa: PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. 1. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. SONEGAÇÃO DE ISS. INSTAURAÇÃO DE INQUÉRITO POLICIAL. PENDÊNCIA DE PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCUTINDO A EXISTÊNCIA DO TRIBUTO. ATIPICIDADE DA CONDUTA. TRANCAMENTO. PROCEDÊNCIA. 2. PAGAMENTO INTEGRAL DO DÉBITO. TRANCAMENTO. NECESSIDADE. 3. ORDEM CONCEDIDA. 1. Constitui constrangimento ilegal a instauração de inquérito policial visando à apuração de crime contra a ordem tributária (sonegação de ISS) enquanto ainda pendente processo administrativo no qual é questionada a existência do tributo, já que inexistente, assim, elemento normativo do próprio tipo penal, tornando atípica, por ora, a conduta. 2. Confirmado o pagamento integral do débito tributário em questão, de
rigor o trancamento do inquérito policial. 3. Ordem concedida para trancar o inquérito policial, em razão do pagamento integral do débito tributário. (STJ – HC 59449 – Sexta Turma. Rel: Maria Theresa de Assis Moura. DJE 04.05.2009). Hoje, não restam dúvidas na medida em que o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula Vinculante n.º 24, assim redigida: Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo. Segundo o Código Tributário Nacional, em seu art. 142, “compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo o caso, propor aplicação da penalidade cabível”. Como já analisado no inicio deste
tópico, os crimes do art. 1º da Lei n.º 8.137/90 são delitos de resultado, em que se precisa averiguar a efetiva supressão do tributo ou sua redução. O prejuízo deve ser sentido pelo Fisco. Ocorre que apenas por via do procedimento administrativo é que se pode avaliar com precisão qual era o tributo devido, e, consequentemente, se houve sua supressão ou redução. Por este motivo, a necessidade de se aguardar o desfecho do procedimento administrativo. A supressão ou redução do tributo devem estar configuradas extreme de dúvidas, uma vez que fazem parte da própria tipicidade do crime. Tributo é, portanto, elemento normativo do tipo penal. Sem esse elemento, não há crime. E somente se obtém a certeza desses elementos depois de findo o procedimento administrativo fiscal. Não se trata, portanto, de uma condição de procedibilidade, mas da própria tipicidade. Sem provas da tipicidade do fato, a materialidade não se encontra patente, o que inviabilizaria o recebimento da denúncia, por inepta.
3. OS CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA MUNICIPAL – O IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS DE QUALQUER NATUREZA (ISSQN) 3.1. BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE O ISSQN O ISSQN (ou comumente chamado ISS) – Imposto sobre serviços de qualquer natureza – é um dos tributos de competência própria dos Municípios, conforme dispõe a Constituição Federal[322]. Constitui a principal fonte de receitas do Município, mas, a despeito disto, muitos são os Municípios que deixam de tributar o ISSQN, ou quando o fazem, não procedem à fiscalização eficiente, renunciando indevidamente a esta receita. Suas regras gerais estão disciplinadas na Lei Complementar n.º 116, de 31 de julho de 2003. No primeiro artigo, conceitua-se o fato gerador do imposto, sendo este a prestação de serviços constantes da lista anexa[323], ainda que esses não se constituam como atividade preponderante do prestador. A denominação dada ao serviço, ainda que diversa da lista, não servirá
como impedimento à tributação (art. 1º, §4º). O sujeito passivo da
obrigação
tributária de pagamento do ISSQN, ou contribuinte, é o prestador do serviço (art. 5º). Como regra geral, considera-se prestado o serviço e devido o imposto no local do estabelecimento prestador, ou na falta deste, no local do domicílio do prestador. A lei prevê, entretanto, inúmeras exceções à regra geral em seus mais de vinte incisos (art. 3º). Os aspectos quantitativos do ISSQN são a base de cálculo e a alíquota. A base de cálculo é o preço do serviço (art. 7º). O outro aspecto quantitativo do imposto sobre serviços de qualquer natureza diz respeito à sua alíquota, a qual deve vir estabelecida em lei ordinária municipal. A lei complementar trata da alíquota máxima (art. 8º), silenciando quanto à alíquota mínima. Essa veio estabelecida em emenda constitucional no patamar de 2%[324]. 3.2. OS CRIMES RELATIVOS AO
ISSQN Os contribuintes de ISSQN (prestadores de serviços) devem possuir os livros fiscais exigidos em lei, assim como emitir os documentos fiscais imprescindíveis à correta tributação. São obrigações acessórias consideradas como as prestações de fazer ou não fazer determinados atos em cumprimento do interesse do exercício fiscalizatório do Estado. Na realidade, cuida-se de deveres instrumentais que auxiliam o Fisco nas suas atividades. Em outras palavras, consideram-se obrigações acessórias do ISS a escrituração de livros contábeis e a emissão de notas fiscais[325]. O cumprimento das obrigações acessórias é importante ao extremo, na medida em que é na escrituração dos livros obrigatórios e na emissão dos documentos, a saber, principalmente, as notas fiscais relativas aos serviços prestados, que o contribuinte informa as operações realizadas e os preços dos serviços, consubstanciando a base de cálculo do imposto, sobre a qual incidirão as alíquotas. Sobre a importância do cumprimento
dessas obrigações acessórias, ilustra perfeitamente Antônio Correa[326]: A fiscalização e a administração tributária, para poderem acompanhar os negócios dos empresários que se qualificam como comerciantes ou industriais perante suas repartições, exigem que estes documentem os fatos comerciais em livros, que define em regulamentos e cuja escrituração é obrigatória para que, estando perenizada, possam ser examinados e comparados com outros elementos que possua para então homologar os lançamentos e considerar extintos os débitos ou creditos tributários, ou, em outra hipótese, discordando deles, faça a respectiva autuação e imponha os tributos e acessórios, no caso apontado como multa e acréscimos com base na legislação a ser cumprida pelo autuado depois de lhe ser garantido o direito ao devido processo legal. Em praticamente todos os incisos do art. 1º da lei analisada temos a referências aos livros e documentos fiscais, obrigatórios para todos os prestadores de serviços. É crime, portanto, a inserção de elementos inexatos ou a omissão de operações em
documento ou livro exigido pela lei; a falsificação (material ou ideológica) ou alteração de qualquer documento relativo à operação tributável, englobando-se aqui a prestação do serviço; a produção, distribuição e uso de documento falso; a recusa em fornecer documento fiscal relativo à prestação do serviço. Se um prestador de serviço presta determinado serviço e não o registra em seu livro obrigatório e, consequentemente, não fatura o serviço, deixando de fornecer ao consumidor a nota fiscal, temos o crime de sonegação fiscal. Ao agir dessa maneira, o agente omitiu operação tributável e suprimiu o tributo que deveria pagar. Acaso agisse dentro dos estritos limites da legalidade, a obrigação seria de registrar o serviço prestado e emitir a nota fiscal correspondente, recolhendo o ISSQN sobre o preço recebido pelo serviço, e que provavelmente fora embutido no valor final cobrado do recebedor do serviço. Sem duvida, o não fornecimento da nota fiscal de um serviço é um dos crimes de sonegação fiscal mais comuns, caracterizando o inciso II, do art. 1º.
Outras fraudes, no entanto, são muito corriqueiras no que tange à emissão de notas fiscais. Nesses casos, o documento existe e o registro da operação não foi omitido, mas houve inserção de elementos falsos ou inexatos, ou adulterados. São os casos dos incisos II (parte dele) e III. Podem ser enumerados dois principais tipos de fraude relacionados à adulteração de notas fiscais: as notas fiscais calçadas e as notas fiscais paralelas. No artifício da nota fiscal calçada, o contribuinte lança dados diferentes nas diversas vias da nota. Geralmente, a via que fica à disposição da fiscalização possui valores menores do que o consignado na via que ficou com o tomador/pagador do serviço. Esta fraude tem o propósito de reduzir o tributo devido. O contribuinte recolhe o ISSQN sobre preço inferior ao efetivamente pago a ele, pagando, portanto, menos do que deveria. A nota fiscal paralela é outro meio fraudulento de que se vale o sonegador que consiste na
duplicidade de notas com a mesma numeração. É a impressão em duplicidade da mesma nota fiscal. Isso permite ao sonegador registrar a operação em apenas uma das notas fiscais, claramente a de menor valor, com o desiderato criminoso de redução do valor do imposto devido. Normalmente, para essa modalidade de fraude, costuma haver o conluio com o estabelecimento gráfico de impressão das notas. O inciso IV do art. 1º, que trata da elaboração, distribuição, emissão ou utilização de documento falso, seja com dolo direto ou eventual, normalmente abrange os casos conhecidos de “notas frias”. A nota fiscal fria é um documento ideologicamente falso. Em regra, são emitidas por empresas “fantasmas”, criadas com o propósito criminoso de obterem autorização do fisco para a emissão de talonários. As notas não correspondem a um serviço efetivamente prestado. Infelizmente, essa é uma modalidade de crime muito usada por gestores municipais que usam as ditas notas frias para simularem uma
prestação de serviço que não existiu ao Município, com o vil propósito de apropriarem-se dos recursos públicos. No que tange ao art. 2º da lei, o interesse para o estudo aqui realizado de crimes relativos ao ISSQN recai no inciso II. Segundo a disposição normativa, é crime deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos. Como já apontado anteriormente, o contribuinte do ISSQN é o prestador de serviço. Ocorre que o valor referente ao imposto costuma vir embutido no preço do serviço, sendo pago antecipadamente por quem toma o serviço e o paga. É o significam as expressões descontado ou cobrado, constantes do tipo penal em comento. No caso desse crime ora analisado, a operação foi feita regularmente, não havendo fraude, e o valor do imposto, já constante do preço final do serviço, foi pago ao contribuinte de forma antecipada e ele tem a obrigação legal de recolher esse valor ao sujeito ativo da
obrigação tributária (no caso, o fisco municipal). Quando não o faz, comete o crime do art. 2º, inciso II. A sanção penal é mais branda, até porque nesses crimes do art. 2º, não se cogita de fraudes ou outros artifícios dessa natureza. Por fim, os crimes próprios de funcionários públicos podem ser praticados por servidores municipais, na atuação da administração tributária do Município. A título de exemplo, se um agente fiscal municipal aceita vantagem indevida paga por um contribuinte de ISSQN com vistas a deixar de cobrar o citado imposto, sua conduta se amolda ao crime descrito no art. 3º, inciso II, da Lei n.º 8.137/90. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS É inquestionável a importância da arrecadação para o Estado. Sem os recursos oriundos dos tributos suportados por todos, não existiriam os meios para a satisfação das necessidades públicas. Leciona Arthur Moura, que “a arrecadação de receitas possibilita ao Estado dispor dos
meios para traduzir para o cotidiano do cidadão os direitos abstratamente consignados na Constituição Federal. Os tributos correspondem à principal fonte de receita do Estado Moderno e deles sociedade alguma pode prescindir, sob pena de restarem desatendidas as prementes necessidades dessa mesma sociedade”. Nesse diapasão, a ordem tributária deve ser protegida e se revela bem jurídico penalmente relevante. Condutas ilícitas que atentem contra sua integridade atingem a todos, haja vista que a falta dos recursos financeiros em razão da deletéria prática da sonegação fiscal acaba por prejudicar toda a atuação do Estado na consecução do bem comum. Infelizmente, a prática da sonegação fiscal é tão prejudicial quanto corriqueira. Ela não apenas faz com que o dinheiro não chegue aos cofres públicos, mas também pune quem paga em dias suas obrigações, gerando concorrência desleal e desequilíbrio na ordem econômica. Necessário um maior esforço e uma maior interação entre os agentes do Estado que lidam com
a matéria. Na medida em que se entrelaçam noções de direito penal e de direito administrativo e tributário, pode-se considerar que apenas uma atuação conjunta do Fisco e do titular da ação penal pública, o Ministério Público, seria apta a frear a prática da sonegação fiscal. Experiências bem sucedidas em alguns Estados, como o de Santa Catarina, mostram que quando a Administração Fazendária e o Ministério Público trabalham em sintonia, o poder de coerção da tutela penal mostra-se extremamente útil aos interesses arrecadatórios do Estado. Na Paraíba, foi criada recentemente uma Promotoria de Crimes contra a ordem tributária, com atuação na capital do Estado. Mister que a boa inovação se estenda a outros municípios, até mesmo para fins de instar os gestores municipais a não descuidarem da arrecadação de seus impostos privativos, na medida em que muitos deles vivem apenas da parcela do Fundo de Participação dos Municípios, e poderiam, com a efetiva cobrança de seus impostos, melhorar o aporte de recursos aos cofres municipais.
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Capítulo 30
100.
TRIBUTOS MUNICIPAIS NO CONTEXTO DO SIMPLES NACIONAL 101.
102. 103. [327]
Francisco Leite Duarte.
1. Introdução
Os países que adotam a forma federativa de Estado, como o Brasil, têm grande dificuldade em instituir um sistema tributário que se revele ao mesmo tempo eficaz, eficiente e simplificado. É que a descentralização político-administrativa própria das federações, requer um manejo político inteligente, responsável e de difícil implementação na configuração e manutenção do pacto federativo. Por outro lado, se essa Federação adota a forma
republicana de governo, esta dificuldade só tende a aumentar, posto que a República afasta qualquer possibilidade da concessão de privilégios que não sintonizados com o princípio da isonomia, na sua dimensão da razoável tributação segundo a capacidade econômica do contribuinte e nos moldes de um Estado democrático de Direito. Sendo o Brasil uma República, uma república federativa, composto de uma ordem jurídico - política central – a União -, e de vinte e sete ordens jurídicas parciais (Estados membros e Distrito Federal), aqueles divididos em Municípios (mais de cinco mil), intensificase a dificuldade de se encontrar um justo e razoável equilíbrio basilador de um sistema tributário ideal, de modo a aquilatar alguns dos conflitos de interesses que normalmente ocorrem em tais casos. Daí que o tema reforma tributária no contexto do pacto federativo brasileiro é matéria recorrente. A Emenda Constitucional nº 42, de 2003, que possibilitou a instituição de um regime único de arrecadação dos impostos e contribuições da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios ( Simples Nacional) é uma das últimas que alterando a Constituição de 1988, ensaiou uma reforma tributária, ficando conhecida pela alcunha de “mini-reforma tributária”, a renovar, posto que inconclusa, os anseios por uma verdadeira reforma tributária, que reclama ampla discussão que deve passar pela própria definição do modelo de Estado que queremos, quais os recursos que devem supri-lo e quais os estratos da sociedade devem suportar os encargos estatais, e em que medida. Dada a importância que têm as microempresas e as empresas de pequeno porte para a economia nacional, também sempre foi recorrente no contexto das discussões tributárias a discussão sobre um adequado tratamento jurídico a essas células do desenvolvimento nacional, que não por acaso, representa a maioria das empresas brasileiras. Este artigo tem, pois, como objetivo expor os aspectos jurídicos do Imposto sobre serviços de qualquer natureza (ISSQN), inserindo-o nos quadrantes do regime jurídico tributário conhecido por Simples nacional,
instituído pela Lei complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006. O Estudo que ora se faz, como assim centrado no ISSQN, é porque é este imposto o único dos tributos municipais que está abrangido na sistemática de regime diferenciado e simplificado de tributação direcionado às das microempresas e empresas de pequeno porte. 2. Competência tributária municipal e Imposto sobre serviços de qualquer natureza (ISSQN)
104. Dos entes federativos da Republica, o que se nos mostra mais presente, porque é nele em que aportamos nossa existência, são os Municípios. No ordenamento jurídico-político constitucional, apesar de poucas opiniões em contrário, os Municípios pertencem à ossatura da federação brasileira, configurado num plexo de competências materiais, dentre elas, portando o exercício do poder de tributar (Art. 30, III e 145 da Constituição da República), respeitadas as limitações
constitucionais ao exercício desse poder. Exercitando a competência tributária, os Municípios brasileiros (e também o Distrito Federal) podem instituir impostos, taxas e contribuições de melhoria ( CF, art. 145), bem assim, contribuição social cobrada de seus servidores, para o custeio, em benefício destes, do regime previdenciário próprio de que trata o artigo 40 da Constituição Federal (CF, art.149, º 1º), sem prejuízo da contribuição sobre iluminação pública ( COSIP), de que trata o art. 149-A da Constituição da República. Dentre os três impostos de competência municipal (CF, art. 156 da Constituição da República), o único que está incluído na sistemática do regime único de arrecadação dos impostos e contribuições da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (Simples Nacional), instituído pela Lei complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006, é o Imposto sobre serviços de qualquer natureza ( ISSQN). Porque a formatação das competências tributárias municipais, mormente no que se refere ao ISSQN,
potencializa inúmeros conflitos tributários entre os Municípios, fenômeno que puxou para si a alcunha de guerra fiscal, houve por bem o Constituinte de 1988 exigir lei complementar para traçar alguns aspectos nacionais desse imposto, a serem observados por todos os Municípios brasileiros e pelo Distrito Federal. De fato, e sem prejuízo da necessidade da lei complementar genérica a que se refere o artigo 146 da Constituição da República, estabelece ainda o § 3º do artigo 156 da mesma Constituição, que cabe a lei complementar definir o serviços tributáveis, fixar as alíquotas máximas e mínimas do imposto, bem assim excluir da incidência exportações de serviços para o exterior e regular a forma e as condições como isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados. Para efetivar esses preceitos constitucionais, veio a lume a Lei complementar no 116, de 31 de julho de 2003, revogadora do antigo Decreto-lei 406, de 1968, que disciplinava, anteriormente, em âmbito nacional, o ISSQN. A lei complementar no 116, de 2003, é lei de
espectro nacional (e não federal), daí, de cumprimento obrigatório por todos os Municípios e pelo distrito Federal. A lei complementar no 116, de 2003, traça o arquétipo nacional do ISSQN e é com base nela que os Municípios brasileiros e o Distrito Federal instituem, por lei, a peculiar regra de incidência desse imposto. Como já é bem sabido por todos, e de há muito tempo exposto por Paulo de Barros Carvalho, no modelo da regra de incidência tributária, no antecedente da regra, ou em seu descritor, encontramos três critérios ou aspectos: Os critérios material, temporal e espacial. No consequente da regra de tributação encontramos dois aspectos ou critérios: os aspectos pessoal e valorativo. Cuidemos de ser breves neste particular, posto que nossa ênfase há de ser a discussão sobre o ISSQN no contexto do Simples Nacional, nos sendo legítimo imaginar que o leitor já porta conhecimentos sobre os aspectos fundamentais da incidência desse importante imposto municipal/distrital. O campo de incidência tributária do ISSQN ( o
aspecto material) não poderia deixar de ser a prestação de serviço ( Lei complementar no 116, art. 1º), obrigação de fazer, e não obrigação de dar. Não qualquer prestação de serviço. Os serviços de transporte interestadual e intermunicipal e o serviço de comunicação estão fora da incidência do ISSQN porque, por previsão constitucional, foram inseridos no campo de incidência do Imposto sobre a circulação de mercadorias e serviços ( ICMS), de competência estadual, como reza o próprio artigo 155,II. Demais disso, serviços passíveis de tributação pelo ISSQN hão de estar previstos na lei complementar no 116/2003, bem assim na lei municipal/distrital instituidora do imposto, respeitadas as imunidades do artigo 150, VI da Constituição e as não incidências previstas no art. 2o da mesma Lei complementar no 116, de 2003. No que se refere aos aspectos temporal e espacial da regra matriz de incidência, eles se relacionam, respectivamente, aos referenciais indicativos de tempo e de lugar da ocorrência da situação descrita na materialidade de incidência.
Como o ISSQN é imposto de fato gerador instantâneo, e não continuado[328], não é comum a lei prescritiva desse imposto indicar, expressamente, o momento da ocorrência do fato gerador, posto que isto fica implícito na norma da tributação, a partir da natureza da hipótese tributária, daí se considerar como aspecto temporal do ISSQN a data da efetiva da prestação do serviço. De outra banda, o aspecto espacial da regra de incidência do ISSQN sempre foi marcado por inúmeras polêmicas e controvérsias jurídicas. O antigo Decreto-Lei 406, em seu artigo 12, previa como local da prestação do serviço o local do estabelecimento prestador ou, na falta de estabelecimento, o do domicílio do prestador, mas trazia uma exceção para os serviços de construção civil, caso em o local da prestação do serviço era o local onde se efetuasse a prestação. Não obstante a clareza da literalidade normativa, eram por demais conhecidas as decisões reiteradas do STJ ( Exemplo: Acórdão 252.114/PR)[329], no sentido de que o Município competente para exigir o ISSQN seria
o local da realização do fato gerador. A lei complementar no 116/2003, que revogou a Decreto-lei 406, estabeleceu em seu artigo 3o
que o
serviço considera-se prestado e o imposto devido no local do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador, exceto nas hipóteses previstas nos incisos I a XXII, quando o imposto será devido em locais diferenciados, de conformidade com o disposto naquele dispositivo. Observe-se que o legislador, apesar de conhecer a mansa e torrencial jurisprudência do STJ no sentido de considerar como devido o ISS ao Município onde ocorresse o fato gerador, manteve , de certa forma, as premissas normativas do diploma revogado, razão porque a jurisprudência estabelecida após o advento da referida lei complementar nº 116/2003 quebra o paradigma jurisprudencial anterior e firma-se no sentido de que a competência passou a ser o local do estabelecimento prestador do serviço, considerando-se como tal a localidade em que há uma unidade econômica ou profissional, isto é, onde a atividade é desenvolvida,
independentemente de ser formalmente considerado como sede ou filial da pessoa jurídica[330]. Dessa forma, como bem o diz o art. 3o da lei complementar no 116, de 2003, o serviço considera-se prestado e o imposto devido no local do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador, a não ser que o serviço esteja inserido em uma das vinte e duas hipóteses de exceção previstas no mesmo dispositivo, para os quais o critério espacial da regra é o ali fixado, em nível de exceção. Relativamente ao consequente da regra de tributação, o sujeito ativo do ISSQN é o Município. O contribuinte é o prestador do serviço ( Art. 5o da Lei complementar no 116/ 2003) e o responsável é a pessoa indicada pela lei municipal, respeitadas as prescrições do art. 6 o da mesma lei complementar, que elege como regra geral de responsabilidade o tomador do serviço. No que se refere à base de cálculo, um dos referenciais quantificadores do imposto presente no aspecto valorativo da regra de incidência, é o preço do
serviço, como assim dispõe o art. 7º da Lei complementar nº 116, de 2003. As alíquotas ( outro elemento do aspecto valorativo) são fixadas pelos Municípios e pelo Distrito Federal, respeitados os tetos máximos , estabelecidos em lei complementar. A Lei complementar n o 116/2003 já estabeleceu a alíquota máxima em 5% ( cinco por cento). Como ainda não fixou a alíquota mínima, vale a disposição do art. 88, I do Ato das disposições constitucionais transitórias (ADCT), isto é, 2% ( dois por cento), salvo em relação aos serviços dos itens 32,33 e 34 da Lista de serviços anexa ao Decreto-lei 406/68, hoje correspondente aos itens 7.02, 7.04 e 7.05 do anexo à lei complementar 116/2003. Esses são os elementos nucleares presentes na regra de incidência da tributação dos serviços, via ISSQN. Para aprofundamento do tema, veja capítulo especial neste mesmo livro, ou em nosso Direito Tributário: Teoria e prática[331]. Essa configuração normativa básica do ISSQN sofre profunda alteração por força da inserção dos Municípios e do Distrito Federal na obrigatoriedade da
adoção de um regime jurídico de tributação diferenciado, aplicável às Microempresa (ME) e Empresa de pequeno porte (EPP), por força do disposto nos artigos 179 e 146, III da Constituição da República, uma inteligente engrenagem jurídica instituída pela lei complementar n o 123,de 14 de dezembro de 2006, em vigor em 1 o de julho de 2007, e que, por decorrência dos princípios federativo e republicano brasileiro, porta uma paradoxal e necessária complexidade, em manifesta contradição com o apelido pela qual ficou conhecida: Simples nacional. 3. O Simples Nacional O Simples Nacional não é um tributo. Tributos são as prestações pecuniárias compulsórias em moeda ou em cujo valor nela se possa exprimir, instituídas por lei e cobradas mediante atividade administrativa plenamente vinculada.[332] Os tributos estão mencionados na Constituição federal e são os impostos, as taxas, as contribuições de melhoria, os empréstimos compulsórios
e as contribuições especiais, tributos estes que podem ser federais, estaduais/distritais ou municipais, segundo rígida partilha de competência tributária estatuída na própria Constituição. O Simples Nacional é tão somente um regime especial, diferenciado, simplificado, único, opcional de arrecadação e recolhimento de alguns tributos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, devidos pelas microempresas (ME) ou empresas de pequeno porte(EPP), que devem ter tratamento diferenciado e favorecido, conforme assim se depreende dos artigos 146,III,b e 179 da Constituição Federal. Tal regime, instituído pela Lei complementar n° 123, de 14 de dezembro de 2006, entrou em vigor em 1 de julho de 2007. Das prescrições constitucionais e legais emanam as seguintes características do Simples Nacional: a) O Simples nacional é regime jurídico de tributação destinado às microempresas e empresas de pequeno porte. Nos termos do 3º da Lei complementar 123, de 2006, consideram-se microempresas ou empresas
de pequeno porte, a sociedade empresária, a sociedade simples, a empresa individual de responsabilidade limitada e o empresário a que se refere o art. 966 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), devidamente registrados no Registro de Empresas Mercantis ou no Registro Civil de Pessoas Jurídicas, conforme o caso, desde que no caso da microempresa, aufira, em cada ano-calendário, receita bruta igual ou inferior a R$ 360.000,00 (trezentos e sessenta mil reais), e no caso da empresa de pequeno porte, aufira, em cada ano-calendário, receita bruta superior a R$ 360.000,00 (trezentos e sessenta mil reais) e igual ou inferior a R$ 3.600.000,00 (três milhões e seiscentos mil reais), sendo que no caso de início de atividade no próprio anocalendário, esses limites serão proporcionais ao número de meses em que a microempresa ou a empresa de pequeno porte houver exercido atividade, inclusive as frações de meses. b) Mas nem toda sociedade empresária, sociedade simples, empresa individual de responsabilidade limitada ou empresário, mesmo com
receita bruta dentro dos limites acima mencionados, podem optar pela sistemática do simples nacional. Há vedações gerais que os exclui do estatuto geral das Microempresas e das empresas de pequeno porte (vedações do artigo 3º da Lei complementar 123, de 2006), como vedações específicas, que as impede de serem beneficiárias do regime de tributação especial ( Simples nacional), por vedações expressas do artigo 17 da mesma lei. c) O regime único de arrecadação dos impostos e contribuições da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios ( Simples Nacional) será opcional para o contribuinte, mas obrigatório para as entidades políticas: União, Estados, Distrito Federal e Municípios ( inciso I do parágrafo único do artigo 146 da CF); 105. d) Poderão ser estabelecidas condições de enquadramento diferenciadas por Estado ( inciso II do parágrafo único do artigo 146 da CF); 106. e) O recolhimento será unificado e centralizado e a distribuição da parcela de recursos pertencentes aos respectivos entes
federados será imediata, vedada qualquer retenção ou condicionamento ( inciso III do parágrafo único do artigo 146 da CF); 107. f) A arrecadação, a fiscalização e a cobrança poderão ser compartilhadas pelos entes federados, adotado cadastro nacional único de contribuintes( inciso IV do parágrafo único do artigo 146 da CF); 108. g) É administrado, em sua versão tributária, por um Comitê Gestor composto por quatro representantes da União, dois dos Estados e distrito Federal e dois dos Municípios (art. 2° da Lei complementar n° 123/2006); 109. calendário;
h)É irretratável para todo o ano-
110. i)Abrange parte considerável dos impostos e contribuições; De observar que até 30 de junho de 2007 vigiam diversos atos normativos estabelecendo regimes
diferenciados de tributação relativamente às ME e EPP. No âmbito federal havia a lei nº Lei nº 9.317, de 5 de dezembro de 1996 que disciplinava o antigo Simples federal, ora substituído pelo Simples Nacional. No âmbito estadual, distrital e municipal também havia diversos regimes jurídicos tributários, de que são exemplos o simples paulista, o simples candango, o simples farroupilha, dentre outros. A partir de 1º de julho de 2007 toda a disciplina sobre tratamento diferenciado às ME e EPP encontra-se na Lei complementar nº 123/2006, e suas alterações, seja a parte tributária seja a não tributária, conforme prescrição do art. 94 do ADCT da CR e também do art. 89 da Lei complementar nº 123. Dessa forma: a)Todos os regimes de tributação favorecida da União, dos Estados, do Distrito federal e dos Municípios vigoraram até 30 de junho de 2007. Os regimes especiais como o antigo Simples Federal (Lei nº 9.317, de 5 de dezembro de 1996), o simples paulista, o simples candango do Distrito Federal, o simples farroupilha (RS),
dentre outros, todos cessaram com a entrada em vigor dos dispositivos da Lei complementa nº 123/2006 que tratam do simples nacional; b) As demais pessoas jurídicas que não queiram ou não possam se enquadrar no Simples Nacional serão tributadas pelas normas gerais de incidência tributária ( no âmbito federal, lucro real, presumido ou arbitrado); c) Isto não implica que não possa haver concessão de privilégio fiscal por parte dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, só que neste caso demanda lei específica, conforme previsão dos §§ 18 a 20 da referida Lei complementar; 111. d) A Lei complementar nº 123/2006 disciplina matéria de lei complementar e de lei ordinária. Visando impedir possíveis questionamentos[333] sobre a hierarquia das leis complementares sobre as leis ordinárias, o artigo 86 prevê de forma expressa que “ As matérias tratadas nesta Lei Complementar que não sejam reservadas constitucionalmente a lei complementar
poderão ser objeto de alteração por lei ordinária.” 112. A opção da empresa pelo Simples Nacional implica-lhe uma série de benefícios tributários, o que induz a inserção de um grande contingente de empresas que estão na informalidade na vida legal no âmbito das administrações tributárias, o que lhe acarreta melhorias de competitividade e condições de existência formal. 113. Com efeito, dentre outros benefícios, destacam-se a tributação com alíquotas mais favorecidas e progressivas, de acordo com a receita bruta auferida; o recolhimento unificado de vários tributos, pagos em um único documento de arrecadação; o cálculo simplificado; dispensa do pagamento das demais contribuições instituídas pela União, e de formação profissional vinculadas ao sistema sindical, e demais entidades de serviço social autônomo e Isenção do imposto de renda, na fonte e na declaração de ajuste do beneficiário dos valores efetivamente pagos ou distribuídos ao titular ou sócio da ME ou EPP(salvo pró-labore, aluguéis ou
serviços prestados). Destarte, em termos gerais, pode se afirmar que é vantajoso para a empresa optar pelo Simples Nacional. No entanto, a opção deve ser feita de forma criteriosa, pois a depender da situação particular da empresa a opção pode se revelar maléfica, se comparado com os regimes ordinários de tributação. O Simples Nacional implica o recolhimento mensal, mediante documento único de arrecadação dos seguintes impostos e contribuições devidos por ME e EPP (A rt. 13 da LC nº 123/2003): a)Imposto sobre a renda da pessoa jurídica(IRPJ); b)Imposto sobre produtos industrializados (IPI), salvo o IPI incidente na importação; c)Contribuição Social sobre o lucro líquido (CSLL); d)Contribuição Social para Financiamento da Seguridade Social(COFINS), salvo a COFINS incidente na importação de bens e serviços; e)Contribuição para o PIS/PASEP, salvo o PIS/PASEP incidente na importação de bens e
serviços; f)Contribuição Patronal Previdenciária –CPP para a seguridade social, a cargo da pessoa jurídica, de que trata o art. 22 da Lei 8.212, de 24 de julho de 1991,exceto no caso da ME e da EPP que se dediquem às seguintes atividades de prestação de serviços: g)Imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação (ICMS), salvo em alguns casos; h) Imposto sobre serviços de qualquer natureza(ISS),salvo em alguns casos. Todos os demais tributos federais, estaduais ou municipais não referidos acima estão fora desse regime especial de tributação e são regidos por normas gerais de suas respectivas incidências. 4. O ISSQN no âmbito do Simples Nacional No âmbito do Simples Nacional, há de se ter dois tipos de cuidados. Um, próprio da complexidade ostensiva dessa sistemática de tributação; o outro, pela
particularidade do ISSQN. Isto se deve ao fato de que nem toda prestação de serviço está incluída na sistemática favorecida de tributação. Com efeito, nos termos do inciso XIV do § 1o do artigo 13 da lei complementar 123/2006, o recolhimento na forma do Simples nacional não exclui a incidência do ISSQN, em relação aos serviços sujeitos à substituição tributária ou retenção na fonte e o ISSQN na importação de serviços, que se sujeitam à legislação aplicável às demais pessoas jurídicas. Na conformidade do art. 18 da Lei complementar 123/2006, o valor devido mensalmente pela microempresa ou empresa de pequeno porte, optante pelo Simples Nacional, será determinado mediante aplicação das alíquotas constantes das tabelas dos Anexos I a VI daquela Lei Complementar sobre as respectivas bases de cálculo.Sobre a receita bruta auferida ( regime de competência) ou recebida (regime caixa), segundo opção do contribuinte, no mês incidirá a alíquota constante dos mencionados Anexos. A base de cálculo corresponde ao produto da
venda de bens e serviços nas operações de conta própria, o preço dos serviços prestados e o resultado nas operações em conta alheia, não incluídas as vendas canceladas e os descontos incondicionais concedidos, conforme previsão do § 1 º art. 3 º da lei complementar n º 123, de 2006 em combinação com o § 3o do art. 18 da mesma lei. Vê-se, assim, que para efeitos de tributação no âmbito do Simples Nacional, as atividades econômicas foram enquadradas em seis grupos, daí a existência de seis tabelas com alíquotas diferenciadas, segundo o somatório da receita bruta acumulada nos doze meses anteriores ao período de apuração do Simples Nacional: Anexo
Atividades
I
114. Receitas
Dispositivo legal Lei Complementar 123/2006
Tributos abr máxim
Art.18, § 4o, I. IRPJ+ICMS+CS Menor
Maior al
decorrentes da revenda de mercadorias II
III
Receitas Art.18, § 4o, II decorrentes da e § 5o venda de mercadorias industrializadas
IRPJ+ICM PIS+C
Receitas decorrentes da prestação de serviços de que
IRPJ+IS COF Menor Maior al
trata o § 5o-B do artigo 4o da Lei e dos serviços vinculados à locação de bens imóveis e
Art.18, § 4o, III e § 5º-B.
Menor Maior al
corretagem de imóveis. IV
Receitas decorrentes da prestação de serviços vinculadas á construção de imóveis e obras de engenharia em geral, inclusive sob a forma de subempreitada, execução de projetos, serviços de paisagismo, decoração de interiores, serviço de
Art.18, § 5ºC.
IRPJ+IS
Menor Maior al
vigilância, limpeza ou conservação e serviços advocatícios. V
Atividades de prestação de serviços mencionados nos incisos I a XIV do § 5º-D do art.18 da LC 123/2006.
VI
Atividades de prestação de serviços relacionadas nos incisos I a XII do § 5o-I da LC 123/2006.
Art. 18, § 5ºD
IRPJ+ COF Menor Maior alíquota
acrescentar a e do Anexo IV, rec
Art. 18, § 5o-I. IRPJ+ ISS+ CSL Menor al Maior al
As alíquotas do simples nacional, grosso modo, resultam do somatório dos percentuais correspondentes a cada um dos tributos abrangidos na sistemática especial de tributação, segundo o Anexo respectivo. Assim, por exemplo, a alíquota do Simples Nacional para a terceira faixa de receita bruta (De 360.000,01 a 540.000,00 ) do anexo III é 10,26% ( Dez inteiros e vinte e seis centésimos), correspondente ao somatório de 0,48% (IRPJ) + 0,43% (CSLL) + 1,43% (COFINS) + 0,35% (PIS/PASEP)+ 4,07% (CPP) + 3,5% (ISS), conforme abaixo:
Receita Bruta em 12 meses ALÍQUOTA IRPJ CSLL COFINS PIS/PA (em R$) Até 180.000,00
6,00%
0,00% 0,00% 0,00%
0,00
De 180.000,01 a 360.000,00
8,21%
0,00% 0,00% 1,42%
0,00
De 360.000,01 a 540.000,00
10,26%
0,48% 0,43% 1,43%
0,35
De 540.000,01 a 720.000,00
11,31%
0,53% 0,53% 1,56%
0,38
11,40%
0,53% 0,52% 1,58%
0,38
De 900.000,01 a 1.080.000,00
12,42%
0,57% 0,57% 1,73%
0,40
De 1.080.000,01 a 1.260.000,00
12,54%
0,59% 0,56% 1,74%
0,42
De 1.260.000,01 a 1.440.000,00
12,68%
0,59% 0,57% 1,76%
0,42
De 720.000,01 a 900.000,00
De 1.440.000,01
13,55%
0,63% 0,61% 1,88%
0,45
13,68%
0,63% 0,64% 1,89%
0,45
14,93%
0,69% 0,69% 2,07%
0,50
De 1.980.000,01 a 2.160.000,00
15,06%
0,69% 0,69% 2,09%
0,50
De 2.160.000,01 a 2.340.000,00
15,20%
0,71% 0,70% 2,10%
0,50
a 1.620.000,00 De 1.620.000,01 a 1.800.000,00 De 1.800.000,01 a 1.980.000,00
De 2.340.000,01
15,35%
0,71% 0,70% 2,13%
0,51
15,48%
0,72% 0,70% 2,15%
0,51
16,85%
0,78% 0,76% 2,34%
0,56
De 2.880.000,01 a 3.060.000,00
16,98%
0,78% 0,78% 2,36%
0,56
De 3.060.000,01 a 3.240.000,00
17,13%
0,80% 0,79% 2,37%
0,57
a 2.520.000,00 De 2.520.000,01 a 2.700.000,00 De 2.700.000,01 a 2.880.000,00
De 3.240.000,01
17,27%
0,80% 0,79% 2,40%
0,57
17,42%
0,81% 0,79% 2,42%
0,57
a 3.420.000,00 De 3.420.000,01 a 3.600.000,00
Para se saber qual a alíquota a ser aplicada sobre a base de cálculo, correspondente à receita bruta auferida ou recebida no mês, conforme o regime de competência ou caixa eleito pelo contribuinte, é preciso trabalhar com o conceito RBT12, sigla da expressão “Receita bruta acumulada total nos meses anteriores ao período de apuração” ( PA), conforme previsão do § 1o do artigo 18 da Lei complementar 123, de 2006, sendo que em caso de início de atividade, os valores de receita bruta acumulada constantes das tabelas dos Anexos I a VI da Lei Complementar devem ser proporcionalizados ao número
de meses de atividade no período (§ 1o do artigo 18 da mesma Lei):
Somatório das Receitas Brutas dos 12
12/2013 01/2014 02/2014 03/2014 04/2014 05/2014
R Assim, tomando como exemplo a tributação do Anexo III, acima, a alíquota a ser aplicada à base cálculo, na forma do § 3o do art. 18 da mesma lei, para um RBT12 igual a R$ 400.000,00 ( Quatrocentos mil Reais) é 10, 26% ( Dez inteiros e vinte e seis centésimos por cento). Se a receita bruta auferida no mês for R$ 50.000,00 ( cinquenta mil Reais), o simples nacional devido seria 10,26% de R$ 50.000,00, que daria R$ 5.130,00 ( Cinco mil, cento e trinta reais). Observe-se que dos seis Anexos, quatro deles se referem à tributação dos serviços. Mas é preciso considerar algumas particularidades, por cada Anexo.
a) No Anexo I, pelo fato da tributação ser das receitas decorrentes da revenda de mercadoria, o anexo não contempla nem o IPI nem o ISS, que não incide sobre essas receitas. É de bom alvitre alertar que na comercialização de medicamentos e produtos magistrais produzidos por manipulação de fórmulas, se não for sob encomenda para entrega posterior ao adquirente, em caráter pessoal, mediante prescrições de profissionais habilitados ou indicação pelo farmacêutico, produzidos no próprio estabelecimento após o atendimento inicial, eles serão tributadas na forma do Anexo I desta Lei Complementar ( inciso VII, b, do § 4o do artigo 18 da LC 123/2006); b) No Anexo II, pelo fato da tributação ser das receitas decorrentes da venda de mercadorias industrializadas, o anexo não contempla o ISS. No caso da atividade com incidência simultânea de IPI e de ISS, essas serão tributadas na forma do Anexo II da Lei Complementar, deduzida a parcela correspondente ao ICMS e acrescida a parcela correspondente ao ISS prevista no Anexo III da Lei Complementar ( inciso VI
do§ 4o do artigo 18 da LC 123/2006); c) O Anexo III, tributação de receitas decorrentes da prestação de serviços, não contempla o ICMS e o IPI, que não incidem sobre aquelas receitas. Observa-se que as receitas decorrentes da locação de bens móveis também são tributadas na forma deste Anexo, mas como não há incidência de ISS na locação de bens móveis, ordena a Lei complementar a dedução da alíquota do simples nacional da parcela correspondente ao ISS ( inciso V do§ 4o do artigo 18 da LC 123/2006). Importa considerar ainda que na comercialização de medicamentos e produtos magistrais produzidos por manipulação de fórmulas se for sob encomenda para entrega posterior ao adquirente, em caráter pessoal, mediante prescrições de profissionais habilitados ou indicação pelo farmacêutico, produzidos no próprio estabelecimento após o atendimento inicial, serão eles tributadas na forma deste Anexo III ( inciso VII, a, do § 4o do artigo 18 da LC 123/2006). Também são tributados na forma do Anexo III as atividades de
prestação de serviços de comunicação e de transportes interestadual e intermunicipal de cargas, e de transportes autorizados no inciso VI do caput do art. 17, inclusive na modalidade fluvial, deduzida a parcela correspondente ao ISS e acrescida a parcela correspondente ao ICMS prevista no Anexo I ( Art. 18 § 5o-E. da Lei complementar 123, de 2006); d) O Anexo IV, tributação de receitas decorrentes da prestação de serviços, também não contempla o ICMS e o IPI, que não incidem sobre aquelas receitas. Demais disso, e nisto há de se ter especial cuidado, os serviços tributados na forma do Anexo IV, hão de se submeter á tributação em separado, portanto, fora do simples nacional, da Contribuição previdenciária patronal: Receita Bruta em 12 Alíquota IRPJ CSLL COFINS PIS/PASEP meses (em R$) Até 180.000,00
4,50% 0,00% 1,22% 1,28%
0,00%
De 6,54% 0,00% 1,84% 1,91% 180.000,01 a
0,00%
360.000,00 De 360.000,01 a 7,70% 0,16% 1,85% 1,95% 540.000,00
0,24%
De 540.000,01 a 8,49% 0,52% 1,87% 1,99% 720.000,00
0,27%
De 720.000,01 a 8,97% 0,89% 1,89% 2,03% 900.000,00
0,29%
De 900.000,01 a 9,78% 1,25% 1,91% 2,07% 1.080.000,00
0,32%
De 1.080.000,01 10,26% 1,62% 1,93% 2,11% a 1.260.000,00
0,34%
De
1.260.000,01 10,76% 2,00% 1,95% 2,15% a
0,35%
1.440.000,00 De 1.440.000,01 11,51% 2,37% 1,97% 2,19% a 1.620.000,00 De 1.620.000,01
0,37%
12,00% 2,74% 2,00% 2,23%
0,38%
De 1.800.000,01 12,80% 3,12% 2,01% 2,27% a 1.980.000,00
0,40%
De 1.980.000,01 13,25% 3,49% 2,03% 2,31% a 2.160.000,00
0,42%
a 1.800.000,00
De
2.160.000,01 13,70% 3,86% 2,05% 2,35% a
0,44%
2.340.000,00 De 2.340.000,01 14,15% 4,23% 2,07% 2,39% a 2.520.000,00 De 2.520.000,01
0,46%
14,60% 4,60% 2,10% 2,43%
0,47%
De 2.700.000,01 15,05% 4,90% 2,19% 2,47% a 2.880.000,00
0,49%
De 2.880.000,01 15,50% 5,21% 2,27% 2,51% a 3.060.000,00
0,51%
a 2.700.000,00
De
3.060.000,01 15,95% 5,51% 2,36% 2,55% a
0,53%
3.240.000,00 De 3.240.000,01 16,40% 5,81% 2,45% 2,59% a 3.420.000,00 De 3.420.000,01 a 3.600.000,00
16,85% 6,12% 2,53% 2,63%
0,55%
0,57%
e) O Anexo V, tributação de receita decorrente da prestação de serviços, não contempla o ICMS e o IPI, que não incidem sobre aquelas receitas. As alíquotas do simples nacional constante deste Anexo correspondem tão somente ao somatório do IRPJ, PIS/Pasep, CSLL, Cofins e CPP, devendo-se somar à alíquota do Simples Nacional apurada na forma do Anexo a parcela correspondente ao ISS prevista no Anexo IV da Lei Complementar. Por outro lado, a alíquotas correspondentes ao
somatório dos percentuais do IRPJ, PIS/Pasep, CSLL, Cofins e CPP depende da relação do montante da folha de salários, incluídos os encargos e a receita bruta em doze meses, obtida mediante a seguinte fórmula: (r) = Folha de Salários incluídos encargos (em 12 meses) Receita Bruta (em 12 meses) Neste caso, enquanto maior a relação “r”, menor a alíquota do simples nacional, como se observa do citado Anexo:
Receita Bruta (r) em 12 meses <0,10 (em R$)
0,10≤ (r)
0,15≤ (r)
0,20≤ (r)
0,25 (r)
e
e
e
e
(r) < (r) < (r) 0,15 0,20 0,25
< (r) 0,30
Até 180.000,00 17,50% 15,70% 13,70% 11,82% 10,4
De 180.000,01 17,52% 15,75% 13,90% 12,60% 12,3 a 360.000,00
De 360.000,01 17,55% 15,95% 14,20% 12,90% 12,6 a 540.000,00 De 540.000,01 a 720.000,00
17,95% 16,70% 15,00% 13,70% 13,4
De 720.000,01 18,15% 16,95% 15,30% 14,03% 13,5 a 900.000,00 De 900.000,01 a 1.080.000,00
18,45% 17,20% 15,40% 14,10% 13,6
De 1.080.000,01 a 18,55% 17,30% 15,50% 14,11% 13,6 1.260.000,00
De 1.260.000,01 a 18,62% 17,32% 15,60% 14,12% 13,6 1.440.000,00
De 1.440.000,01 a 18,72% 17,42% 15,70% 14,13% 14,0 1.620.000,00
De 1.620.000,01 a 18,86% 17,56% 15,80% 14,14% 14,0 1.800.000,00
De 1.800.000,01 a 18,96% 17,66% 15,90% 14,49% 14,4 1.980.000,00
De 1.980.000,01 a 19,06% 17,76% 16,00% 14,67% 14,6 2.160.000,00 De
2.160.000,01 a 19,26% 17,96% 16,20% 14,86% 14,8 2.340.000,00
De 2.340.000,01 a 19,56% 18,30% 16,50% 15,46% 15,1 2.520.000,00
De 2.520.000,01 a 20,70% 19,30% 17,45% 16,24% 16,0 2.700.000,00
De 2.700.000,01 a 21,20% 20,00% 18,20% 16,91% 16,7 2.880.000,00
De 2.880.000,01 a 21,70% 20,50% 18,70% 17,40% 17,1
3.060.000,00
De 3.060.000,01 a 22,20% 20,90% 19,10% 17,80% 17,5 3.240.000,00
De 3.240.000,01 a 22,50% 21,30% 19,50% 18,20% 17,9 3.420.000,00
De 3.420.000,01 a 22,90% 21,80% 20,00% 18,60% 18,4 3.600.000,00 f) O Anexo VI, tributação de serviços, não contempla o ICMS e o IPI, que não incidem sobre aquelas receitas. Foi introduzido pela Lei complementar n 147, de 7 de agosto de 2014, com vigência desde 1o de janeiro de 2015. Receita Bruta em 12 meses (em R$)
Alíquota
IRPJ, PIS/Pasep, CSLL, Cofins e CPP
Até 180.000,00
16,93%
14,93%
De 180.000,01 a 360.000,00
17,72%
14,93%
De 360.000,01 a 540.000,00
18,43%
14,93%
De 540.000,01 a 720.000,00
18,77%
14,93%
De 720.000,01 a 900.000,00
19,04%
15,17%
De 900.000,01 a 1.080.000,00
19,94%
15,71%
De 1.080.000,01 a 1.260.000,00
20,34%
16,08%
De 1.260.000,01 a 1.440.000,00
20,66%
16,35%
De 1.440.000,01 a 1.620.000,00
21,17%
16,56%
De 1.620.000,01 a 1.800.000,00
21,38%
16,73%
De 1.800.000,01 a 1.980.000,00
21,86%
16,86%
De 1.980.000,01 a
21,97%
16,97%
De 2.160.000,01 a 2.340.000,00
22,06%
17,06%
De 2.340.000,01 a 2.520.000,00
22,14%
17,14%
De 2.520.000,01 a
22,21%
17,21%
De 2.700.000,01 a 2.880.000,00
22,21%
17,21%
De 2.880.000,01 a 3.060.000,00
22,32%
17,32%
De 3.060.000,01 a 3.240.000,00
22,37%
17,37%
De 3.240.000,01 a 3.420.000,00
22,41%
17,41%
De 3.420.000,01 a
22,45%
17,45%
2.160.000,00
2.700.000,00
3.600.000,00 No que se refere a retenção do ISSQN pela fonte pagadora, dispõe o § 6o do artigo 18 que “No caso dos serviços previstos no § 2o do art. 6o da Lei Complementar no 116, de 31 de julho de 2003, prestados pelas microempresas e pelas empresas de pequeno porte, o tomador do serviço deverá reter o montante correspondente na forma da legislação do município onde estiver localizado, observado o disposto no §4o do art. 21 desta Lei Complementar”. De início, posto que o critério espacial de incidência do ISSQN está previsto na Lei complementar n o
116, de 2003, conforme aqui mesmo já comentado,
especificamente em seu artigo 3o, a retenção desse imposto pela fonte pagadora, mormente quando o estabelecimento prestador é estabelecido ou domiciliado em um Município e a prestação do serviço ocorre em outro Município, só pode ocorrer se alei Municipal observar o preceito do mencionado art. 3o .
Repita-se que, como bem o diz o art. 3o da lei complementar no 116, de 2003, o serviço considera-se prestado e o imposto devido no local do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador, a não ser que o serviço esteja inserido nas vinte e duas hipóteses de exceção previstas no mesmo dispositivo, para os quais o critério espacial da regra é o ali fixado, em nível de exceção, regra esta que deve ser observada rigorosamente pela Municipal prescritiva de responsabilidade pela retenção. Assim, para efeitos de retenção, devemos levar em consideração duas situações: a) prestador e tomador do serviço são estabelecidos ou domiciliados na jurisdição do Município. Neste caso, o Município, respeitadas as prescrições gerais da Lei complementar 116, de 2003, tem plena liberdade de criar hipótese de responsabilidade pela retenção do ISS, e impô-la ao tomador do serviço; b) Prestador do serviço é domiciliado em outro Município. Neste caso, só pode o Município estabelecer hipótese de retenção observando-se, rigorosamente, os
termos do artigo art. 3o da Lei Complementar no 116, de 31 de julho de 2003 e para isso há de verificar se o serviço se enquadra na regra geral em que o ISSQN pertence ao Município do local do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador, ou é hipótese de uma ou mais das vinte e duas exceções previstas no aludido artigo. Caso a prestação do serviço tenha se dado por prestador estabelecido ou domiciliado em outro Município, não pode o Município onde o serviço foi prestado, estabelecer casos de retenção. Demais disso, há de se observar as seguintes regras previstas no § 4º do ar. 21 da lei complementar 123, ora transcritas: 115. a) a alíquota aplicável na retenção na fonte deverá ser informada no documento fiscal e corresponderá ao percentual de ISS previsto nos Anexos III, IV, V ou VI desta Lei Complementar para a faixa de receita bruta a que a microempresa ou a empresa de pequeno
porte estiver sujeita no mês anterior ao da prestação; 116. b) na hipótese de o serviço sujeito à retenção ser prestado no mês de início de atividades da microempresa ou empresa de pequeno porte, deverá ser aplicada pelo tomador a alíquota correspondente ao percentual de ISS referente à menor alíquota prevista nos Anexos III, IV, V ou VI desta Lei Complementar. Neste caso, constatando-se que houve diferença entre a alíquota utilizada e a efetivamente apurada, caberá à microempresa ou empresa de pequeno porte prestadora dos serviços efetuar o recolhimento dessa diferença no mês subseqüente ao do início de atividade em guia própria do Município; 117. c) na hipótese de a microempresa ou empresa de pequeno porte estar sujeita à tributação do ISS no Simples Nacional por valores fixos mensais, não caberá a retenção a
que se refere o caput deste parágrafo; 118. d) na hipótese de a microempresa ou empresa de pequeno porte não informar a alíquota de que tratam os incisos I e II deste parágrafo no documento fiscal, aplicar-se-á a alíquota correspondente ao percentual de ISS referente à maior alíquota prevista nos Anexos III, IV, V ou VI desta Lei Complementar; 119. e) não será eximida a responsabilidade do prestador de serviços quando a alíquota do ISS informada no documento fiscal for inferior à devida, hipótese em que o recolhimento dessa diferença será realizado em guia própria do Município; 120. f) o valor retido, devidamente recolhido, será definitivo, não sendo objeto de partilha com os municípios, e sobre a receita de prestação de serviços que sofreu a retenção não haverá incidência de ISS a ser recolhido no Simples Nacional.
Naturalmente que na apuração do montante devido no mês relativo a cada tributo serão consideradas as reduções relativas aos tributos já recolhidos, ou sobre os quais tenha havido tributação monofásica, isenção, redução ou, no caso do ISS, que o valor tenha sido objeto de retenção, ou seja, devido diretamente ao Município (§ 12 do art. Do art. 18 da LC 123/2006). Vejamos três exemplos, todos colhidos do “perguntas e respostas, do site do Simples nacional que julgamos muito esclarecedores[334]: “1.Caso a prefeitura de Nova Prata (RS) tome um serviço de vigilância de uma EPP optante pelo Simples Nacional sediada em Rio Grande (RS), deverá fazer a retenção considerando a alíquota informada pela EPP no respectivo documento fiscal. A alíquota informada no documento fiscal corresponderá ao percentual de ISS ao qual a EPP estiver sujeita no Simples Nacional no mês
anterior. Essa EPP poderá segregar a receita já retida (ISS retido em Nova Prata) e, consequentemente, quando da apuração do valor devido do Simples Nacional não será considerado o percentual do ISS no cálculo. 2.Entretanto, se a Prefeitura de Nova Prata tomar um serviço de treinamento de uma ME de Rio Grande (RS), considerando que essa atividade não se encontra dentre aquelas previstas para recolhimento no local da prestação, não deverá efetuar a retenção do ISS. Nesse caso, essa ME não deverá segregar essa receita como sujeita a retenção na fonte. 3.Considerando o exemplo do item 2, se a ME de treinamento for sediada em Nova Prata e a lei local previr a retenção, a ME deverá segregar essa receita como sendo de retenção, não
sendo considerado pelo aplicativo de cálculo o percentual do ISS no cômputo do valor devido do Simples Nacional”. Por outro lado, como previsto no § 18 do art. 18 da mesma lei, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, no âmbito das respectivas competências, poderão estabelecer, na forma definida pelo Comitê Gestor, independentemente da receita bruta recebida no mês pelo contribuinte, valores fixos mensais para o recolhimento do ICMS e do ISS devido por microempresa que aufira receita bruta, no ano-calendário anterior, de até o limite máximo previsto na segunda faixa de receitas brutas anuais constantes dos Anexos I a VI, ficando a microempresa sujeita a esses valores durante todo o anocalendário. É pelo dever de retenção do ISS e pela possibilidade do ISS fixo, que o § 4o-A do art. 18 da LC determina que o contribuinte deverá segregar, também, as receitas de prestações de serviços sobre as quais houve retenção de ISS, bem como sobre as quais o ISS seja
devido a Município diverso do estabelecimento prestador, quando será recolhido no Simples Nacional ou sujeitas à tributação em valor fixo ou que tenham sido objeto de isenção ou redução de ISS na forma prevista na Lei Complementar 123/2003. Cumpre mencionar que a sistemática de cálculo do Simples Nacional é por demais complexa. O nosso intuito neste trabalho foi apenas o de fornecer as premissas gerais do regime, mas é preciso conhecer as suas particularidades, como, só para citar alguns exemplos, toda a complexidade dos submilites, as situações de excesso de receita, os casos de empresas em início de atividade, a questão da omissão de receita, as obrigações acessórias, etc. Por fim, é prudente avisar que a opção pelo Simples Nacional requer criteriosa análise sobre as vantagens e desvantagens que o sistema aponta. É preciso responder a algumas perguntas básicas: A empresa pode ser enquadrada como ME ou EPP? Com que efeitos? Somente os efeitos gerais, ou com efeitos tributários também? qual o alcance dos efeitos tributários. Como
determinar o valor devido? Como optar pelo regime? quais as hipóteses de exclusão do sistema? Existe outro regime tributário mais favorável ao contribuinte?
[1]
Mestre pela UEPB; Presidente do Instituto Paraibano de Estudos Tributários – IPBET; Membro da Comissão de Estudos Tributários da OAB/PB; Professor de Direito Tributário da FRR/CESREI, da Pós-graduação em Direito Tributário da Escola Superior da Advocacia – ESA/PB, da Escola Superior da Magistratura – ESMA/CG e dos Cursos Jurídicos Misael Montenegro – PE; Lecionou Direito Tributário e Processo Civil na Universidade Estadual da Paraíba – UEPB; Sócio e Diretor Jurídico do Escritório Advocacia David Diniz – ADD.
[2]
Procurador da Fazenda Nacional, com exercício na Coordenaçã o de Representação Judicial - CRJ em Brasília e perante o STJ; Graduado em Direito pela UFPB e pela University of Leeds – UK (Programa Piani); Especialista em Direito Tributário pela UNISUL; Pós-graduação em Gestão Tributária pela ESAF; Professor de Direito Tributário e de Direito Financeiro, com passagens pela UNESC, FESMIP, ESMA, e IESP, na graduação e na especialização; Professor de curso preparatório para carreiras jurídicas da AGU, com passagens pelo LEXUS, pela EBEJI e com atuação com coaching desde 2012; Autor do livro LEI DE EXECUÇÃO FISCAL COMENTADA E ANOTADA pela Editora JUSPODVM.
[3]
Graduado em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba – UEPB. Pós-Graduado em Direito Público; Professor das disciplinas: Direito Constitucional, Administrativo e Previdenciário; Autor do livro de Direito Previdenciário pela Edijur, 2012. Consultor Jurídico e Advogado associado do Escritório Medeiros e Duarte Advogados. [4] Formado em Direito e Filosofia. Pós-graduado em Direito Constitucional, Processo Civil e Doutorando em Ciências Jurídicas. Palestrante e conferencista. Autor dos livros Direito Constitucional e Direito Administrativo
Positivo. Professor da Escola Superior da Magistratura e da Universidade Estadual da Paraíba. Juiz de Direito. [5] É o que ocorre no Brasil, cujo art. 60 da Carta Magna estipula que as emendas constitucionais somente serão aprovadas mediante o voto favorável de 3/5 dos parlamentares federais, em dois turnos de votação em cada Casa do Congresso Nacional. Além disso, há limitações materiais (como as cláusulas pétreas explícitas – art. 60, §4º, da CF) e circunstanciais (vedando-se a aprovação de emendas durante a intervenção federal, o Estado de Sítio e o Estado de Defesa) ao poder de modificar a Constituição.
1. [6] O controle difuso (ou concreto) de constitucionalidade é assim denominado por ser exercido por todos os órgãos judicantes que integram a estrutura do Poder Judiciário, atribuindo-se a estes, de forma ampla, a possibilidade de apreciar a constitucionalidade das normas jurídicas. O controle difuso realiza-se sempre de forma incidental, haja vista que é suscitado no transcurso de processos ainda pendentes de julgamento. Nestes feitos, embora o objeto principal da lide não seja o controle de constitucionalidade, os debates processuais acabam envolvendo a matéria constitucional para que o litígio seja decidido da forma mais justa possível. 2. [7] O controle concentrado traduz uma centralização da competência para a apreciação da
matéria da constitucionalidade. Trata-se do método de controle preconizado pelo positivismo kelseniano. Na ordem jurídica nacional, o controle concentrado vem ganhando nítida primazia em relação ao critério difuso, sobretudo após a adoção da Ação Declaratória de Constitucionalidade – ADECON e da inegável força normativa das súmulas vinculantes do STF, instrumentos que realçam a centralização da discussão constitucional no órgão de cúpula do Judiciário. Assim, no Brasil, o controle concentrado é reservado a somente duas categorias de órgãos jurisdicionais: ao Supremo Tribunal Federal e, no âmbito local, aos tribunais de justiça estaduais ou do DF. [8] O Tribunal Federal da Suíça, que não desempenha propriamente a função de uma Corte Constitucional, não pode realizar o controle de normas federais, mas apenas de leis locais (leis cantonais). No sistema suíço, as leis federais estão submetidas a um controle de natureza predominantemente política. [9] O STF já julgou inconstitucional a intervenção da União em hospitais municipais (MS n° 25295/RJ). [10] No modelo federativo tradicional, o conjunto de competências dos entes federados é bem mais amplo do que aquele conferido à União, posto que remanescem, para aqueles, todas as atribuições não reservadas expressamente à esta última. Entretanto, tal situação não acontece no Brasil, vez que aqui a União concentra a maior parte das atribuições
previstas na Carta Política, isto por razões históricas. Não se deve olvidar, nesse ponto, o fato de que a Federação brasileira surgiu a partir de uma desagregação do poder central, partindo-se do antigo Estado Unitário (Constituição de 1824) para o Estado Federal, quando, então, os demais entes políticos passaram a auferir, paulatinamente, somente algumas competências cedidas pela União, disseminando-se parte do poder. Em outros países, ao contrário, houve um movimento concêntrico de agregação de apenas uma pequena parcela dos poderes de titularidade dos entes antes soberanos, os quais cederam uma fração de suas competências com o objetivo de formar a chamada União federal. Tal fenômeno verificado na realidade histórica nacional certamente explica a extrema concentração de atribuições e competências em favor da União, restando um número reduzido de matérias exclusivas a cargo dos demais entes federativos, o que restringe o campo de atuação de Estados e Municípios. [11] Como adverte Luciano Amaro, falta rigor científico nessa classificação, haja vista que “não se pode contrapor a competência privativa à residual. A ideia de competência residual opor-se-ia à de competência arrolada, descrita, partilhada, identificada: as situações que não tenham sido nomeadamente atribuídas a ninguém formam o resíduo, o resto, o campo remanescente ou residual. Ora, se esse campo remanescente (de situações idôneas a servir de suporte à incidência de imposto) pertence com exclusividade à União, a competência aí exercida poderia dizer-se privativa da União, adjetivação que a faria confundir-se com a outra ‘espécie’ de competência, de que deveria diferenciar-se” (AMARO, 2003, p. 95-96). [12] Todavia, essa competência tributária remanescente da União não se refere a todas as modalidades de tributos, mas apenas aos impostos. [13] Como o serviço de iluminação pública não pode ser remunerado mediante taxa (STF – Súmula nº 670), cabe aos Municípios e ao Distrito Federal instituir contribuição para o custeio dessa atividade (STF – RE nº 573.675). [14] É vedada a retenção ou qualquer restrição à entrega e ao emprego dos recursos atribuídos aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, neles compreendidos adicionais e acréscimos relativos a impostos (art. 160 da CF). Inobstante isso, a Lei Maior permite que a União e os Estados condicionem a
entrega de tais receitas: a) ao pagamento de seus créditos, inclusive de suas autarquias; b) ao cumprimento da aplicação da receita mínima em ações e serviços de saúde (art. 198, § 2º, II e III, da CF). [15] STF – RE nº 421256/SP, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, j. 26/09/2006.
3. [16] A demarcação dos chamados preceitos fundamentais relaciona-se com as normas materialmente constitucionais, isto é, com aquelas disposições da Lei Maior que tratam de matérias dotadas de status tipicamente constitucional. Em linhas gerais, são normas dessa natureza aquelas que definem a forma e a estrutura do Estado, bem como as que têm pertinência com os direitos e garantias fundamentais. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (ADPF nº 1 QO/RJ), tentando elucidar a problemática atinente à definição dos chamados preceitos fundamentais – posto que não é plausível considerar como tais todas as disposições contidas na Constituição –, vem fixando um elenco de temas que podem ser tidos como paradigma de confronto na ADPF: a) os princípios fundamentais (arts. 1º ao 4º) e os princípios sensíveis (art. 34, VII); b) os direitos e garantias individuais; c) as cláusulas pétreas (art.
60, §4º), como a separação dos Poderes e a forma federativa de Estado, notadamente no que tange à distribuição de competências constitucionais; d) os princípios relativos ao sistema tributário nacional e à ordem econômica e financeira; e) a ordem social. [17]
“Tendo em vista a existência, pelo menos em tese, de outras medidas processuais cabíveis e efetivas para questionar os atos em apreço, entendo que o conhecimento do presente pedido de ADPF não é compatível com uma interpretação adequada do princípio da subsidiariedade” (STF – ADPF 76/TO). [18] CF – Art. 102: “§ 1.º A arguição de descumprimento de preceito fundamental, decorrente desta Constituição, será apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, na forma da lei”. [19] STF – ADPF n° 3 QO/CE, Relator Ministro Sydney Sanches, julgamento em 18/05/2000.
4. [20] “O ato normativo impugnado é passível de controle concentrado de constitucionalidade pela via da ação direta. [...] Questão de ordem resolvida com o aproveitamento do feito como ação direta de inconstitucionalidade, ante a perfeita satisfação dos requisitos exigidos à sua propositura (legitimidade ativa, objeto, fundamentação e pedido), bem como a relevância da situação trazida aos autos, relativa a conflito entre dois Estados da Federação” (STF –
ADPF nº 72 QO/PA, DJ 02.12.2005). [21] O Plano Diretor consiste no diploma jurídico que organiza e preordena o desenvolvimento das cidades, tendo como objetivos promover o crescimento racional e conter a expansão desordenada dos espaços urbanos. Trata-se de instrumento normativo fundamental ao processo de planejamento dos Municípios. Cabe ao Plano Diretor dispor sobre temas como a edificação de imóveis, o correto uso do solo, o zoneamento e a adequada utilização das áreas urbanas (urbanificação). Desse modo, o Plano Diretor é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana. Deve ser veiculado através de norma aprovada pela Câmara Municipal e é obrigatório para todas as cidades que possuam mais de vinte mil habitantes (art. 182, §1º, da CF). [22] Embora a execução da política de desenvolvimento urbano seja de competência do Município, compete à União “instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico e transportes urbanos” (art. 21, XX, da CF). No que tange à legislação, compete aos entes federativos legislar concorrentemente sobre direito urbanístico (art. 24, I, da CF). [23] Constituição Federal com a redação anterior à Emenda Constitucional nº 29/2000: “Art. 156 [...] § 1º - O imposto previsto no inciso I poderá ser progressivo, nos termos de lei municipal, de forma a assegurar o cumprimento da função social da propriedade”. [24] Segundo o art. 78 do Código Tributário Nacional, o poder de polícia é a “atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou a abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos”. Assim, a polícia administrativa não se confunde com a polícia judiciária, esta última sendo exercida pelos órgãos de segurança pública. A distinção é de grande relevância posto que as fontes de custeio dessas atividades são distintas: a polícia administrativa pode ser custeada por taxas, ao passo em que a polícia judiciária apenas pode ser mantida por meio dos
impostos. Conforme o entendimento da Corte Suprema: “Instituição de taxa de serviços prestados por órgãos de Segurança Pública. Atividade que somente pode ser sustentada por impostos" (STF – ADI nº 2.424, Relator Ministro Gilmar Mendes, DJ 18/06/2004).
5. [25] O STF pacificou o entendimento de que a taxa decorrerá do efetivo exercício do poder de polícia, mas, para tanto, não é necessária a realização de diligência fiscalizatória no estabelecimento do contribuinte, bastando a existência e o funcionamento permanente do ente fiscalizatório para estar legitimada a cobrança (RT 373/221). [26]
Por sua vez, os serviços públicos gerais (uti universi) não possuem destinatários individualizados, sendo dirigidos a toda a coletividade de forma indivisível, sem a possibilidade de determinação dos seus efetivos usuários (ex.: iluminação de vias públicas e segurança). Em suma, os serviços gerais, dada a sua abrangência, devem ser custeados por impostos, enquanto que os individuais serão remunerados por taxa. [27] “O serviço de iluminação pública não pode ser remunerado mediante taxa” (STF – Súmula nº 670). [28] TJRJ – Agravo de Instrumento nº 0018359-47.2010.8.19.0000, Relator Desembargador José Geraldo Antonio, julgamento em 03/05/2010. [29] Os serviços públicos condicionados ao pagamento de alguma taxa devem pautar-se na relação custo-benefício, isto é, o quantum a ser pago pelos que deles se utilizarem deve ter sempre como parâmetro a proporcionalidade entre os gastos realizados na prestação e o benefício que eles efetivamente representam para os seus destinatários. Deve, assim, haver a “ponderação entre a exigência de ajustar o preço do serviço às situações econômicas
concretas do segmento social dos respectivos usuários ao imperativo de manter a viabilidade econômico-financeira do empreendimento” (STF – RE nº 191.532-3/SP, DJ 29/08/1997). [30] “Municípios e Tribunais de Contas. A Constituição da República impede que os Municípios criem os seus próprios Tribunais, Conselhos ou órgãos de contas municipais (CF, art. 31, § 4º), mas permite que os Estados-membros, mediante autônoma deliberação, instituam órgão estadual denominado Conselho ou Tribunal de Contas dos Municípios (RTJ 135/457), incumbido de auxiliar as Câmaras Municipais no exercício de seu poder de controle externo (CF, art. 31, § 1º)” (STF – ADI nº 687, DJ 10/02/2006). [31] Art. 11 da LRF: “Constituem requisitos essenciais da responsabilidade na gestão fiscal a instituição, previsão e efetiva arrecadação de todos os tributos da competência constitucional do ente da Federação. Parágrafo único. É vedada a realização de transferências voluntárias para o ente que não observe o disposto no caput, no que se refere aos impostos". [32] Enquanto a União arrecada, em tributos, quase 40% do seu PIB, os Municípios não arrecadam nem 4% do PIB municipal. Desse modo, somente a título ilustrativo, no que se refere ao ISS, por exemplo, a arrecadação dos Municípios não chega a 2%. Em 2005, a maior arrecadação de ISS foi Goiânia (1,8% do PIB) e a menor, em Macapá (0,4%). Em São Paulo, a arrecadação de ISS foi de 1,5%. [33] A título de exemplo, somente no Estado do Ceará, cerca de metade dos Municípios não instituiu ou arrecadou sequer o IPTU, conforme apuração do Tribunal de Contas local (Fonte: Jornal O Povo, edição de 25/07/2009). [34] Segundo o art. 10 da LIA, constitui ato de improbidade administrativa “agir negligentemente na arrecadação de tributo ou renda, bem como no que diz respeito à conservação do patrimônio público”. Neste item, a norma pune, precipuamente, a conduta culposa do agente que exerce, de forma desidiosa, suas funções fazendárias ou de preservação dos bens que integram o domínio público. [35] O art. 5º, LXXIII, da Constituição Federal assevera que “qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural”. A ação
popular tem por objeto a invalidação de condutas da Administração que se mostrem lesivas ao patrimônio público, à probidade administrativa ou aos interesses difusos gerenciados pelo Estado. O remédio constitucional está disciplinado pela Lei n° 4.717/65, podendo ser ajuizado de forma preventiva ou repressiva, a depender de cada situação concreta. [36] A ação civil pública tem base constitucional (art. 129, III, da CF) e é regida pelas disposições da Lei n° 7.347/85. Funciona como importante instrumento de proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos, como a proteção ao consumidor, ao meio ambiente, dentre outros. [37] Mestrando em Desenvolvimento Regional pela UEPB; Pós-graduado em Direito Tributário pelo IESP; Membro do Instituto Paraibano de Estudos Tributários – IPBET; Presidente da Comissão de Estudos Tributários da OAB/PB – Subseção de Campina Grande; Professor de Direito Tributário e Financeiro da FRR/CESREI, da Escola Superior da Advocacia – ESA/CG e dos Cursos Jurídicos Misael Montenegro e da Fundação de Apoio ao Ensino Pesquisa e Extensão Da Unisul – Faepesul; Advogado Tributarista. [38] Nomenclatura adotada pela Constituinte insculpida na Seção II do Capítulo que trata do Sistema Tributário Nacional.
6. [39] Ferrenha é a crítica de Carrazza (2002, p. 143) ao afirmar que embora o art. 1º da Constituição Federal estabeleça que a República brasileira seja formada pela união indissolúvel dos Estados, Distrito Federal e Municípios, estes não integram, no plano concreto, a Federação considerando que não influem, nem muito decidem, no Estado Federal, como também não participam da formação da vontade jurídica nacional pois não integram o
Congresso pela ausência de representantes no Senado (Casa do Estados) e na Câmara dos Deputados (Casa do Povo). [40]
Frise-se que a repartição de receitas tributárias, previstas dentro do Capítulo I, ao nosso sentir, não faz parte do sistema tributário e sim do Direito Financeiro. A repartição de receita tributária é tema objeto do Direito Financeiro e não Tributário, já que este limita-se a disciplinar da competência tributária prevista na CF/88 até a extinção do crédito tributário, sendo, os momentos posteriores, como a repartição destes recursos campo do direito financeiro. [41] Gráfico elaborado em co-autoria Raymundo Juliano Rego Feitosa.
[42] Ministério da Fazenda, Estudo Tributário nº. 8. [43] Art. 1º da Constituição Federal: A República
Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal [...]. [44] Procuradora da Fazenda Nacional – PGFN/BRASIL; Membro do Instituto Paraibano de Estudos Tributário – IPBET; Graduada em Direito pela UEPB e Especialista em Direito Processual pela UNAMA. [45] Art. 145 (…) § 1º - Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte. [46] Neste sentido: “Imposto de transmissão de imóveis, inter vivos – ITBI: alíquotas progressivas: a CF não autoriza a progressividade das alíquotas, realizando-se o princípio da capacidade contributiva proporcionalmente ao preço da venda.” (STF. RE 234.105, Rel. Min. Carlos Velloso, julgamento em 8-4-1999, Plenário, DJ de 31-3-2000.) [47] STF. RE 586693, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 25/05/2011, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-119 DIVULG 21-06-2011 PUBLIC 22-06-2011 EMENT VOL-02549-01 PP-
00126. [48] Art. 33. A base do cálculo do imposto é o valor venal do imóvel.
[49]
STF, AgRg no AI 420.015-1 – 2ª T – rel Min. Carlos Velloso – j. 22.11.05, DJU de 16.12.05 [50] STJ. AgRg no Ag 903258/PR, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/02/2008, DJe 05/03/2008. [51] STF. RE 188.951, Segunda Turma, DJ de 15.09.1995.
[52] Número que foi ampliado com a edição da E.C. [53]
STF. AI 469.768-AgR, Rel. Min. Ayres Britto, julgamento em 20-62006, Primeira Turma, DJ de 29-9-2006. [54] No mesmo sentido: RE 475.268-AgR, Rel. Min. Ellen Gracie, julgamento em 22-2-2011, Segunda Turma, DJE de 15-3-2011. [55] STF. ADIn 1.378-5 - TP - Rel. Min. Celso de Mello - DJU 23.05.1997.
[56] STF. RE 325.822, Rel. p/ o ac. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 1512-2002, Plenário, DJ de 14-5-2004. [57] Com a mesma fundamentação, também se estende a imunidade dos imóveis locados no caso de ITBI ("Senac. Instituição de educação sem finalidade lucrativa. ITBI. Imunidade. (...) Esta Corte, por seu Plenário, ao julgar o RE 237.718, firmou o entendimento de que a imunidade tributária do patrimônio das instituições de assistência social (art.150, VI, c, da Constituição) se aplica para afastar a incidência do IPTU sobre imóveis de propriedade dessas instituições, ainda quando alugados a terceiros, desde que os aluguéis sejam aplicados em suas finalidades institucionais. Por identidade de razão, a mesma fundamentação em que se baseou esse precedente se aplica a instituições de educação, como a presente, sem fins lucrativos, para ver reconhecida, em seu favor, a imunidade relativamente ao ITBI referente à aquisição por ela de imóvel locado a terceiro, destinando-se os aluguéis a ser aplicados em suas finalidades institucionais." (RE 235.737, Rel. Min. Moreira Alves, julgamento em 13-11-2002, Primeira Turma, DJ de 17-5-2002.) No mesmo sentido: AI 409.806-AgR, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 6-4-2010, Segunda Turma, DJE de 7-5-2010) e para partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de
educação e de assistência social, sem fins lucrativos (alínea 'c'). “Ainda quando alugado a terceiros, permanece imune ao IPTU o imóvel pertencente a qualquer das entidades referidas pelo art. 150, VI, c, da Constituição, desde que o valor dos aluguéis seja aplicado nas atividades essenciais de tais entidades.” (Súmula 724) [58] No mesmo sentido: AI 690.712-AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 23-6-2009, Primeira Turma, DJE de 14-8-2009; AI 651.138AgR, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 26-6-2007, Segunda Turma, DJ de 17-8-2007 [59] STF. RE 578.562, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 21-5-2008, Plenário, DJE de 12-9-2008. [60] Disponível em http://www.migalhas.com.br/arquivo_artigo/art20130925-02.pdf Acesso em 26 out.13
[61]
Os serviços tributáveis exclusivamente pelo Município, por intermédio do ISS, acham-se relacionados em lista cuja taxatividade, constituindo natural consequência do princípio da legalidade tributária, tem sido reconhecida tanto pela doutrina, como pela jurisprudência.
[62]
Graduada em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba (2010) e mestra em Direito pela Universidade Federal da Paraíba (2012). Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Público, atuando principalmente nos seguintes temas: direito ao desenvolvimento, cooperação internacional, roscoe pound e liberdade.
[63]
Decreto n° 7.030. Artigo 7: Plenos Poderes. 1. Uma pessoa é considerada representante de um Estado para a adoção ou autenticação do texto de um tratado ou para expressar o consentimento do Estado em obrigarse por um tratado se: a)apresentar plenos poderes apropriados; ou b)a prática dos Estados interessados ou outras circunstâncias indicarem que a intenção do Estado era considerar essa pessoa seu representante para esses fins e dispensar os plenos poderes. [64] A limitação do poder do Estado, dentro do seu próprio território está
ligada aos direitos fundamentais do indivíduo.
7. [65] De acordo com o Tratado de Assunção, artigo I: Os Estados Partes decidem constituir um Mercado Comum, que deverá estar estabelecido a 31 de dezembro de 1994, e que se denominará "Mercado Comum do Sul" (MERCOSUL). Este Mercado Comum implica: A livre circular de bens serviços e fatores produtivos entre os países entre outros, da eliminação dos direitos alfandegários restrições não tarifárias à circulação de mercado de qualquer outra medida de efeito equivalente; O estabelecimento de uma tarifa externa comum e a adoção de uma política comercial comum em relação a terceiros Estados ou agrupamentos de Estados e a coordenação de posições me foros econômico-comerciais regionais e internacionais; A coordenação de políticas macroeconômicas e setoriais entre os Estados Partes - de comércio exterior, agrícola, industrial, fiscal, monetária, cambial e de capitais, de serviços, alfandegária, de transportes e comunicações e outras que se acordem -, a gim de assegurar condições
adequadas de concorrência entre os Estados Partes; e O compromisso dos Estados Partes de harmonizar suas legislações, nas áreas pertinentes, para lograr o fortalecimento do processo de integração. [66]1 Mestre
em Direito pela PUC/SP. Mestre em Educação pela UFMT. Especialista em Direito Tributário e Processo Tributário. Professor Titular de Direito Tributário da FRB e UNIME. Professor em diversos cursos de pósgraduação em direito tributário pelo país. Coordenador da Pós-graduação de Direito Tributário da ATAME/MT. Professor do Curso Preparatório para Concurso JUSPODIVM. Autor do livro: Manual Prático de Direito Processual Tributário. Autor de diversos artigos jurídicos.
8.
[67]2 Advogada. Historiadora. Mestranda em
Direito Público pela Universidade Federal da Bahia. Especialista em Direito Público. Supervisora de Pesquisa da Faculdade Ruy Barbosa – Bahia. Professora de Direito. Foi Professora Substituta do Curso de Direito da UEPB. [68]
Procurador da Fazenda Nacional. Graduado pela UFPB e pela University of Leeds/UK. Especialista em Direito Tributário pela UNISUL. Autor do livro LEI DE EXECUÇÃO FISCAL COMENTADA E ANOTADA. [69] ATALIBA, Geraldo, Hipótese de Incidência Tributária. 6ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011. [70] Segundo o STJ: “O ente federado legiferante pode instituir dever instrumental a ser observado pelas pessoas físicas ou jurídicas, a fim de viabilizar o exercício do poder-dever fiscalizador da Administração Tributária, ainda que o sujeito passivo da aludida "obrigação acessória" não seja
contribuinte do tributo ou que inexistente, em tese, hipótese de incidência tributária, desde que observados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade ínsitos no ordenamento jurídico. 2. A relação jurídica tributária refere-se não só à obrigação tributária stricto sensu (obrigação tributária principal), como ao conjunto de deveres instrumentais (desprovidos do timbre da patrimonialidade), que a viabilizam. 3. Com efeito, é cediço que, em prol do interesse público da arrecadação e da fiscalização tributária, ao ente federado legiferante atribui-se o direito de instituir obrigações que tenham por objeto prestações, positivas ou negativas, que visem guarnecer o fisco do maior número de informações possíveis acerca do universo das atividades desenvolvidas pelos administrados, o que se depreende da leitura do artigo 113, do CTN”. In RESP 1116792. [71] Segundo Luciano Amaro (2004, p. 113), “deve o legislador, ao formular a lei, definir, de modo taxativo (numerus clausus) e completo, as situações (tipos) tributáveis, cuja ocorrência será necessária e suficiente ao nascimento da obrigação tributária, bem como os critérios de quantificação (medida) do tributo”, vedando-se ao aplicador da lei “a interpretação extensiva e a analogia, incompatíveis com a taxatividade e determinação dos tipos tributários”. [72] Assim já decidiu o STJ: “Esse princípio edificante do Direito Tributário engloba o da tipicidade cerrada, segundo o qual a lei escrita - em sentido formal e material - deve conter todos os elementos estruturais do tributo, quais sejam a hipótese de incidência - critério material, espacial, temporal e pessoal , e o respectivo conseqüente jurídico, consoante determinado pelo art. 97, do CTN” (RESP 724779). Ver também RESP 395143. [73] A exclusão se dá em razão do trecho “não compreendidos no art. 155, II” e decorre de decisão política tributária materializada na Norma Ápice. [74] Apreciando a APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA – 51727, o TRF da 2ª Reagião dexou assentado, citando Geraldo Ataliba: A taxa, de acordo a definição de Geraldo Ataliba é uma “espécie de tributo vinculado, tendo em vista o critério jurídico do aspecto material do fato gerador”, que Geraldo Ataliba denomina de hipóteses de incidência (“Hipótese de Incidência Tributária”, Ed. Rev. dos Tribs., 4ª ed. 1991, págs. 128 e ss.), ou é de polícia, decorrente do exercício do poder de polícia, ou é de serviço, resultante da utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis,
prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição (CF, art. 145, II). A materialidade do fato gerador da taxa, ou de sua hipótese de incidência, é, “sempre e necessariamente um fato produzido pelo Estado, na esfera jurídica do próprio Estado, em referibilidade ao administrado”. [75] No entanto, aquela análise não pode ser o único critério de definição da espécie tributária. A despeito do que prescreve o art. 4º, inc. II, do CTN, a vinculação da receita e da finalidade das contribuições sociais são determinantes para defini-las como tal. [76] Cf. STJ, RESP 872095: “Destarte, impende perscrutar o momento em que se realiza a hipótese de incidência tributáriado imposto de renda, a fim de se determinar o exato momento em que se deflagra a obrigação tributária, com a ocorrência, no mundo real, do fato que gera a obrigação de pagar o tributo, posto imperativo lógico da norma concessiva de isenção. Consoante determina o artigo 43, do Código Tributário Nacional: "O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica”. [77] Cf. TRF da 4ª Região, APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA n. 199904010963864: Ainda que tomado como referência o aspecto temporal da hipótese de incidência tributária, não se tem como entender possível que a modificação na legislação, ocorrida em dezembro, venha a gravar o lucro do mesmo ano seja relativamente ao imposto de renda ou à contribuição sobre o lucro, eis que não atende nem à anterioridade de exercício nem à anterioridade nonagesimal. - O momento de cumprimento de obrigação tributária acessória e o próprio prazo para pagamento dos tributos são dados irrelevantes para a análise da irretroatividade e da anterioridade, pois desbordam do fenômeno da incidência. Não há como continuar-se aplicando, pois, a Súmula 584 do STF. [78] Porém, normas procedimentais de fiscalização, havidas após a verificação do aspecto material, podem ser utilizadas pelo Fisco para fins de lançamento, nos termos do §1º do art. 144 do CTN. Cf. STJ, RESP RECURSO ESPECIAL – 776045: TRIBUTÁRIO E ADMINISTRATIVO. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 197, II, DO CTN, 8º DA LEI N. 8.021/90 E § § 5º E 6º DO ART. 38 DA LEI N. 4.595/64. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 211/STJ.
AUTUAÇÃO DO CONTRIBUINTE. UTILIZAÇÃO DOS DADOS DA CMPF. POSSIBILIDADE. ART. 144, § 1º, DO CTN. APLICAÇÃO RETROATIVA DO AUTORIZATIVO DA NOVA REDAÇÃO DO § 3º DO ART. 11 DA LEI N. 9.311/96 DADA PELA LEI N. 10.174/01. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. 1. Discute-se no recurso especial apossibilidade do Fisco utilizar os dados da CPMF para a fiscalização dos contribuintes. 2. Da análise dos autos, verifica-se que, a despeito da oposição de embargos de declaração, o acórdão recorrido não proferiu juízo de valor a respeito dos arts. 197, II, do CTN, 8º da Lei n. 8.021/90 e § § 5º e 6º do art. 38 da Lei n. 4.595/64, pelo que o recurso especial não merece conhecimento quanto aos referidos dispositivos legais, eis que ausente o requisito inarredável do prequestionamento. Incide, na hipótese, o Enunciado Sumular n. 211 desta Corte. 3. A orientação desta Corte é no sentido de que, nos termos do § 1º do art. 144 do CTN, as normas tributárias processuais ou formais tem aplicação imediata, não submetidas, portanto, ao princípio da irretroatividade das leis, de forma que a nova redação dada ao § 3º do art. 11 da Lei n. 9.311/96 pela Lei n. 10.174/01 - para possibilitar a utilização das informações prestadas para a instauração de procedimento administrativo-fiscal tendente a verificar a existência de eventuais créditos tributários referentes a impostos e contribuições e para lançamento, no âmbito do procedimento fiscal, do crédito tributário porventura existente - incide de imediato, ainda que os créditos tributários sejam relativos a fato gerador ocorrido antes de entrada em vigor desta norma. Precedentes. 4. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido. [79] Tópico redigido com a colaboração da Dra. Amanda Lucena Lira, Advogada Tributarista graduada pela UEPB, Campina Grande, PB, e Especilista em Direito Tributário. [80] Cf. art. 119 do CTN: Sujeito ativo da obrigação é a pessoa jurídica de direito público, titular da competência para exigir o seu cumprimento. [81] Cf. Lei 11.250/2005.
[82]
Ainda que, no caso das taxas, a previsão se dê nos termos da competência prevista para atuação da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. [83] STJ. Súmula 399: Cabe à legislação municipal estabelecer o sujeito
passivo do IPTU. [84] Cf. CTN, art. 42: “Contribuinte do imposto é qualquer das partes na operação tributada, como dispuser a lei.” [85] A doutrina tradicional prefere o termo transferência, como destaca Regina Helena Costa (Ob. cit.. p. 197.). O termo, contudo, passa ideia de que a responsabilidade tributária cessou para o sujeito passivo direito e foi transferida a terceiro. Evidentemente, isso não ocorre nos casos de solidariedade nem de redirecionamento (CTN, art. 135, III). Em casos que tais a responsabilidade é estendida a terceiro, mas o sujeito passivo direito permanece no polo passivo da relação tributária. [86] Cf., a propósito, NABAIS, José Casalta. O dever fundamental de pagar impostos. Coimbra: Livraria Almedina, 2004. [87] STF. AI-AgR 420015. EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IPTU. VALOR VENAL DO IMÓVEL. ATUALIZAÇÃO. NECESSIDADE DE LEI EM SENTIDO FORMAL. I. - É vedado ao Poder Executivo Municipal, por simples decreto, alterar o valor venal dos imóveis para fins de base de cálculo do IPTU. Precedentes. II. - Agravo não provido. [88] STJ. Súmula 160: É defeso, ao município, atualizar o IPTU, mediante decreto, em percentual superior ao índice oficial de correção monetária.
[89] Doutora em Direito Tributário Europeu pela “Universidad de Castilla-La Mancha”, na Espanha, e pela “Università di Bologna”, na Itália. Professora titular de Direito Tributário do CESED/FACISA e UNIPÊ. Coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas de Direito Tributário e Financeiro (NEPDTF) do CESED. [90]Vide artigos 1.º, parágrafo único e 2º, incisos I, IV, VI, f e g, XII, XIII e XIV, da Lei 10.257/01. Conforme explicita Édis Milaré (2009, p. 549-552). [91] Conforme o artigo 41, da Lei 10.257/01: “Art. 41. O plano diretor é obrigatório para cidades: I – com mais de vinte mil habitantes; II – integrantes de regiões metropolitanas e aglomerações urbanas; III – onde o Poder Público municipal pretenda utilizar os instrumentos previstos no § 4o do art. 182 da Constituição Federal; IV – integrantes de áreas de especial interesse turístico; V – inseridas na área de influência de empreendimentos ou atividades com
significativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional.” [92] Para haver posse tributável pelo IPTU é preciso que se trate de posse ad usucapionem. [93] Súmula 668, do STF: “É inconstitucional a lei municipal que tenha estabelecido, antes da Emenda Constitucional 29/2000, alíquotas progressivas para o IPTU, salvo se destinada a assegurar o cumprimento da função social da propriedade urbana.” [94] Sobre a função social da propriedade o Estatuto da Cidade (Lei 10.257/01) assim complementa: “Art.39. A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende as exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor, assegurado o atendimento das necessidades dos cidadãos quanto à qualidade de vida, a justiça social e ao desenvolvimento das atividades econômicas, respeitadas as diretrizes previstas no art. 2 º desta Lei.” [95] O plano diretor é a norma em que “o Município, dentro da sua autonomia para legislar sobre o assunto, além dos demais sujeitos à sua administração, informará a sua pretensão urbanística para direção e planejamento quanto ao seu mapa urbano, discriminando as áreas para as finalidades inerentes à existência de uma cidade, dando-lhe contornos de organização” (MIRANDA, 2002, p. 333). [96] Vide Lei Municipal de São Carlos, n. 13.962, de 25 de novembro de 2005, especificamente, artigos 44 e 45. [97] Vide Lei Municipal de Guarulhos n. 6.793/10, especificamente nos artigos 60 a 63. [98] Esta proposição foi delineada ponderando a constitucionalidade já afirmada pelo Supremo Tribunal Federal quanto à cobrança da contribuição para custeio do serviço de iluminação pública conforme o consumo individual de energia elétrica (RE 573675). Ressalta-se, no entanto, que não se está se posicionando quanto ao mérito dos critérios deste julgamento. [99] Graduado em Direito Pela Universidade Estadual da Paraíba - UEPB; Pós-Graduado em Direito do Trabalho e Processual do Trabalho pela Escola Superior da Magistratura Trabalhista – ESMAT-13ª; Mestrando em Direito Público pela Universidade Estácio de Sá – UNESA/RJ; Doutorando em
Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad Del Museu Social Argentino – UMSA – Buenos Aires/AR; Diretor–Geral da Escola Superior de Advocacia – ESA – OAB/PB/CG; Professor no Departamento de Direito Público da Universidade Federal de Campina Grande – UFCG/CCJS. [100] Súmula 467: Prescreve em cinco anos, contados do término do processo administrativo, a pretensão da Administração Pública de promover a execução da multa por infração ambiental. [101] STJ. EDecl no AgRg no AI 418.205-SP, Rel Min. José Delgado.
[102] STF. Pleno – Ag. Rg Nº 152.676/PR. [103] Art. 295, CPC - A petição inicial será indeferida: IV - quando o juiz verificar, desde logo, a decadência ou a prescrição (art. 219,§ 5º) [104] O direito não socorre aos que dormem.
[105] Especialista em Direito Tributário pelo “Centro Universitário de João Pessoa”. Advogado e Consultor Tributário. Vice-presidente da Comissão de Estudos Tributários da OAB de Campina Grande, Paraíba.
[106]
Lei n° 5.172 de 25 de outubro de 1966. Código Tributário Nacional. Fonte: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5172.htm. Acesso em 25 de abril de 2012
[107] Art. 173. O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco) anos, contados: Parágrafo único. O direito a que se refere este artigo extingue-se definitivamente com o decurso do prazo nele previsto, contado da data em que tenha sido iniciada a constituição do crédito tributário pela notificação, ao sujeito passivo, de qualquer medida preparatória indispensável ao lançamento. (grifei)
[108] Entenda que, o CTN trata a decadência como “extinção” do crédito tributário, mas o que impede a existência do crédito tributário não o extingue, porquanto o que não existe não pode ser extinto. Essa é uma análise meramente lógica que deve ser levada como crítica ao texto legal, mas utilizaremos o termo “extinção do crédito tributário” para a decadência por questão didática, apontada a ressalva.
[109]
O ITR não é tributo de competência municipal, mas por convênio poderá ser fiscalizado e arrecadado pelo município.
9. [110] Art. 173. O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco) anos, contados: I - do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado;
10. II - da data em que se tornar definitiva a decisão que houver anulado, por vício formal, o lançamento anteriormente efetuado. Parágrafo único. O direito a que se refere este artigo extingue-se definitivamente com o decurso do prazo nele previsto, contado da data em que tenha sido iniciada a constituição do crédito tributário pela notificação, ao sujeito passivo, de qualquer medida preparatória indispensável ao lançamento. (redação legal, in verbis) [111]
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Agravo Regimental no Recurso Especial n° 1285895 / PR. Segunda Turma. Rel. Ministro Humberto Martins. “A Primeira Seção desta Corte, por ocasião do julgamento do Recurso Especial representativo de controvérsia 973.733/SC, reafirmou que o prazo decadencial quinquenal para o Fisco constituir o crédito tributário (lançamento de ofício) rege-se pelo disposto no art. 173, I, do CTN e conta-se do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado, nos casos em que a lei não prevê o pagamento antecipado da exação ou quando, a despeito da previsão legal, este não ocorre. Incidência da Súmula 83/STJ”. Fonte: https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp? sLink=ATC&sSeq=18603663&sReg=201100369851&sData=20111107&sTipo=5 Publicado em 07 de dezembro de 2011. Acesso em 24 de março de 2012. [112] SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Recurso Especial n° 850321 / PE. Primeira Turma. Relator, Ministro Luiz Fux. “(...)6. Assim é porque
decorrido o prazo de cinco anos da data da declaração, e não havendo qualquer lançamento de ofício, considera-se que houve aquiescência tácita do Fisco com relação ao montante declarado pelo contribuinte. Conquanto disponha o Fisco de um quinquênio para efetuar lançamento do débito não declarado, somente conta com cinco anos da data da declaração para cobrar judicialmente o débito declarado em DCTF”. Fonte: https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=200302257566&dt_ publicacao=02/05/2005. Acesso em 25 de abril de 2012.
[113]
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Recurso Especial 911489. Segunda Turma. Rel. Min. Castro Meira. “Em se tratando de tributos lançados por homologação, ocorrendo a declaração do contribuinte e na falta de pagamento integral da exação no vencimento, mostra-se incabível aguardar o decurso do prazo decadencial para o lançamento. A declaração elide a necessidade da constituição formal do débito pelo Fisco, podendo este ser imediatamente inscrito em dívida ativa, tornando-se exigível, independentemente de qualquer procedimento administrativo ou de notificação ao contribuinte”. Publicado em 10 de abril de 2007. Fonte: https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp? sLink=ATC&sSeq=3003400&sReg=200602771588&sData=20070410&sTipo=5& Acesso em 25 de abril de 2012. Veja também AgRg no Ag 1337778 / MG [114] O mais correto seria dizer que a decadência não se opera nesse caso, pois ela sequer é iniciada.
[115]
SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p 793.
[116] Idem. Nota 11. [117] Art. 165. O sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento, (...), nos seguintes casos: I - cobrança ou pagamento espontâneo de tributo indevido ou maior que o devido em face da legislação tributária aplicável, ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorrido; II - erro na edificação do sujeito passivo, na determinação da alíquota aplicável, no cálculo do montante do débito ou na
elaboração ou conferência de qualquer documento relativo ao pagamento; III reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão condenatória.
[118]
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Recurso Extraordinário n° 566621. Tribunal Pleno. Relatora Ministra Ellen Gracie. Publicado em 10/10/2011. Fonte: http://redir.stf.jus.br/paginador pub/paginador.jsp? docTP=AC&docID=628479. Acesso em 25 de abril de 2012,
[119] Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 1113959 / RJ. Relator,
Ministro Luiz Fux. “O recurso administrativo suspende a exigibilidade do crédito tributário, enquanto perdurar o contencioso administrativo, nos termos do art. 151, III do CTN, desde o lançamento (efetuado concomitantemente com auto de infração), momento em que não se cogita do prazo decadencial, até seu julgamento ou a revisão ex officio, sendo certo que somente a partir da notificação do resultado do recurso ou da sua revisão, tem início a contagem do prazo prescricional, afastando-se a incidência prescrição intercorrente em sede de processo administrativo fiscal, pela ausência de previsão normativa específica. Fonte:https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp? sLink=ATC&sSeq=6855314&sReg=200900488813&sData=20100311&sTipo=91 Publicado no Dje em 11/03/2010. [120] CALMON, Sacha: "Prescrição e Decadência em Matéria Tributária – Teoria Geral e Análise da Lei Complementar n° 118/2005”, in: Aurora Tomazini de Carvalho (org.), Decadência e prescrição em direito tributário. São Paulo: MP, 2010. p. 233 e 234. [121] Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n° 1162026. Segunda turma. Relator Ministro Castro Meira. “2. A confissão espontânea de dívida com o pedido de adesão ao Refis representa um inequívoco reconhecimento do débito, nos termos do art. 174, IV, do CTN, ainda que o parcelamento não tenha sido efetivado. 3. Recurso especial provido em parte.” Dje. 22/112/2010. Fonte: https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=200900274 911&dt_publicacao=26/08/2010
[122]
Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n° 1192775 / SP. Segunda Turma. Relator, Min. Mauro Campbell
Marques. Publicado em DJe em 24/08/2010. Fonte: https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp? registro=201101334296&dt_publicacao =21/03/2012. Acesso em 25 de abril de 2012.
11. [123] Lei Ordinária n° 11.051 de 29 de dezembro de 2004. Dispõe sobre o desconto de crédito na apuração da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL e da Contribuição para o PIS/Pasep e Cofins não cumulativas e dá outras providências. Fonte: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato20042006/2004/Lei/L11051.htm#art6. Acesso em 24 de abril de 2012. [124]
Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental nos embargos de Declaração no Agravo de Instrumento n° 446994 / RJ. Primeira Turma. Relator, Min. José Delgado. Publicado no Dje em 10/03/2003. Fonte: https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=200200445268&dt_ publicacao=10/03/2003
12. [125] SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. REsp 1113959. Rel. Ministro Luiz Fux. Publicado em 11/03/2010. Fonte: https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp? sLink=ATC&s Seq=8548157 &sReg =200900488813&sData=20100311&sTipo=5&formato=PDF. Acesso em 06/09/2012. “O recurso administrativo suspende a exigibilidade do crédito tributário, enquanto perdurar o contencioso administrativo, nos termos do art. 151, III do CTN, desde o lançamento (efetuado concomitantemente com auto de infração), momento em que não se cogita do prazo decadencial, até seu julgamento ou a revisão ex officio, sendo certo que somente a partir da notificação do resultado do recurso ou da sua revisão, tem início a contagem do prazo prescricional, afastando-se a incidência prescrição intercorrente em sede de processo administrativo fiscal, pela ausência de previsão normativa específica”.
[126]
ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO. Parecer número 70 de 2012. Fonte: http://www.agu.gov.br/page/download/index/id/25730728. Acesso em 31 de agosto de 2015.
[127]
PECHI, Wagner. Suspensão do prazo decadencial. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 3030, 18 out. 2011. Acesso em: 31 ago. 2015. Fonte: http://jus.com.br/artigos/20201/suspensao-do-prazodecadencial/2#ixzz3kSJ9OByx.
[128] Superior Tribunal de Justiça. Primeira Turma. Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial n/ 609226. Relator(a) Ministro Napoleão Nunes Maia Filho. 2. A orientação adotada pela Corte local está em sintonia com a jurisprudência deste STJ, já que as causas suspensivas da exigibilidade do crédito tributário (art. 151 do CTN) obstam a prática de atos que visem à sua cobrança. Esse entendimento foi sedimentado no julgamento dos EREsp . 572.603/PR, de relatoria do eminente Ministro Castro Meira, DJ 05/09/2005. Contra esse entendimento em 2008 o STJ decidiu contrariamente ao nosso entendimento afirmando que a falta de inércia desconfigura a decadência.
[129] Superior Tribunal de Justiça. Primeira Turma. Recurso Especial n° 849273. Relator Ministro Luiz Fux. 2008. O STJ corrobora nosso
entendimento. No caso havia ordem judicial que impediria o lançamento, o Sujeito Ativo desobedeceu à ordem e efetuou o lançamento, que foi anulado pelo judiciário, mas referendado posteriormente pelo STJ que entendeu o Fisco ter cumprido a exigência, mesmo contra decisão judicial.
[130] Doutorando em Direito pela UFPE; Mestre em Ciências da Sociedade pela UEPB; Especialista em Auditoria Fiscal-contábil pela UFPB; Professor da UEPB; e Auditor Fiscal do Estado da Paraíba. [131] Art. 16 do CTN. Imposto é o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte. [132] Destaque nosso.
[133] Art. 5º Os tributos são impostos, taxas e contribuições de melhoria. [134] Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: I - impostos; II - taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição; III - contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas. [135] Ressalve-se que Eduardo Sabbag (2010, p. 382) entende que o comando é plenamente aplicável às demais espécies tributárias. [136] Art. 154. A União poderá instituir:[...] II - na iminência ou no caso de guerra externa, impostos extraordinários, compreendidos ou não em sua competência tributária, os quais serão suprimidos, gradativamente, cessadas as causas de sua criação. [137] Advogado. Sócio do Coelho & Dalle Advogados. Graduado pela Faculdade de Direito do Recife, da Universidade Federal de Pernambuco – UFPE. Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET. [138] Recurso Extraordinário n° 592.905/SC.
[139] http://www.ibge.gov.br/ [140] Informação disponível no endereço eletrônico do Tribunal de Justiça de
Pernambuco – www.tjpe.jus.br [141] Artigo 1°, parágrafo único da Lei n° 6.099, de 12 de setembro de 1974. [142] Art. 5º Considera-se arrendamento mercantil financeiro a modalidade em que: I - as contraprestações e demais pagamentos previstos no contrato, devidos pela arrendatária, sejam normalmente suficientes para que a arrendadora recupere o custo do bem arrendado durante o prazo contratual da operação e, adicionalmente, obtenha um retorno sobre os recursos investidos; II - as despesas de manutenção, assistência técnica e serviços correlatos à operacionalidade do bem arrendado sejam de responsabilidade da arrendatária; III - o preço para o exercício da opção de compra seja livremente pactuado, podendo ser, inclusive, o valor de mercado do bem arrendado. [143] Art. 6º Considera-se arrendamento mercantil operacional a modalidade em que: I - as contraprestações a serem pagas pela arrendatária contemplem o custo de arrendamento do bem e os serviços inerentes à sua colocação à disposição da arrendatária, não podendo o total dos pagamentos da espécie ultrapassar 75% (setenta e cinco por cento) do custo do bem arrendado; II - as despesas de manutenção, assistência técnica e serviços correlatos à operacionalidade do bem arrendado sejam de responsabilidade da arrendadora ou da arrendatária; III - o preço para o exercício da opção de compra seja o valor de mercado do bem arrendado. [144] EREsp n° 213.828/RS, Corte Especial, Relator Ministro Edson Vidigal, DJU de 29.09.2003. [145] A cobrança antecipada do valor residual (VRG) descaracteriza o contrato de arrendamento mercantil, transformando-o em compra e venda a prestação. [146] Art. 7º A competência tributária é indelegável, salvo atribuição das funções de arrecadar ou fiscalizar tributos, ou de executar leis, serviços, atos ou decisões administrativas em matéria tributária, conferida por uma pessoa jurídica de direito público a outra, nos termos do §3º do artigo 18 da Constituição. [147] Art. 68. As leis delegadas serão elaboradas pelo Presidente da
República, que deverá solicitar a delegação ao Congresso Nacional. § 1º - Não serão objeto de delegação os atos de competência exclusiva do Congresso Nacional, os de competência privativa da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, a matéria reservada à lei complementar, nem a legislação sobre: I - organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de seus membros; II - nacionalidade, cidadania, direitos individuais, políticos e eleitorais; III - planos plurianuais, diretrizes orçamentárias e orçamentos. § 2º - A delegação ao Presidente da República terá a forma de resolução do Congresso Nacional, que especificará seu conteúdo e os termos de seu exercício. § 3º - Se a resolução determinar a apreciação do projeto pelo Congresso Nacional, este a fará em votação única, vedada qualquer emenda. [148] Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: I - impostos; (...) § 1º - Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte [149] Artigo 16, do Código Tributário Nacional.
[150] Art. 167. São vedados: (...) IV – a vinculação de receita de impostos a órgão, fundo ou despesa, ressalvadas a repartição do produto da arrecadação dos impostos a que se referem os arts. 158 e 159, a destinação de recursos para as ações e serviços públicos de saúde, para manutenção e desenvolvimento do ensino e para realização de atividades da administração tributária, como determinado, respectivamente, pelos arts. 198, § 2º, 212 e 37, XXII, e a prestação de garantias às operações de crédito por antecipação de receita, previstas no art. 165, § 8º, bem como o disposto no §4º deste artigo; [151] Art. 4º A natureza jurídica específica do tributo é determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação, sendo irrelevantes para qualificá-la: (...) II – a destinação legal do produto da sua arrecadação. [152] Disponível no endereço eletrônico www.stf.jus.br.
[153]
Art. 156 Compete aos Municípios instituir impostos sobre: I – propriedade predial e territorial urbana; II – transmissão “inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão
física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição; III – serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar. [154] Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias [155] (...) Tenho para mim, na mesma linha de entendimento exposta por AIRES FERNANDINO BARRETO (“Revista de Direito Tributário”, vol. 38/192) e por CLÉBER GIARDINO (“Revista de Direito Tributário”, vol. 38/196), que a qualificação da “locação de bens móveis”, como serviço, para efeito de tributação municipal mediante incidência do ISS, nada mais significa do que a inadmissível e arbitrária manipulação, por lei complementar, da repartição constitucional de competências impositivas, eis que o ISS somente pode incidir sobre obrigações de fazer, a cuja matriz conceitual não se ajusta a figura contratual da locação de bens móveis. Cabe advertir, neste ponto, que a locação de bens móveis não se identifica e nem se qualifica, para efeitos constitucionais, como serviço, pois esse negócio jurídico – considerados os elementos essenciais que lhe compõem a estrutura material – não envolve a prática de atos que consubstanciam um praestere ou um facere (...) [156] STJ RESP nº 753.360, Segunda Turma, Relatora Ministra Eliana Calmon. DJ de 30/04/2007. [157] STJ AGRESP nº 893.365, Primeira Turma, Relator Ministro Francisco Falcão. DJ de 09/04/2007. [158] Graduado pela Universidade Católica de Pernambuco. Pós-Graduado em Direito Tributário pelo Instituto Pernambucano de Direito Tributário. Advogado. Sócio de Hollanda Cavalcanti Advogados. [159] STF – Pleno, RE n.º 116.121/SP, DJU de 25.05.2001, pp 17-18.
[160]
Superior Tribunal de Justiça. Embargos de Declaração no Recurso Especial n° 227293/RJ. Relator: Ministro Francisco Falcão. Diário da Justiça de 19 de setembro de 2005. [161] Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n° 1.002.704/DF.
Relator: Ministro José Delgado. Diário da Justiça de 15 de setembro de 2008. [162] NOTA DA CORRDENAÇÃO: atualmente o tema se encontra em repercussão geral no STF, tombado sob o n. RE 651.703.
[163]
Bacharel em Direito e bacharelando em Administração Pública pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB). Pós-graduando em Direito Público pela Universidade Anhanguera-Uniderp. Membro atuante das Comissões de Sociedade de Advogado da OAB/PB e de Estudos Tributários da subseção de Campina Grande/PB. Membro fundador da Associação de Jovens Advogados/PB. Advogado associado ao escritório “Rocha, Marinho e Sales advogados”. [164] Bacharel em Direito pela Universidade de Fortaleza (Unifor). Pósgraduado em Direito Processual Civil pela Escola Superior do Ministério Público do Estado do Ceará. Presidente da Comissão de Sociedade de Advogados da OAB/PB. Sócio e Diretor Jurídico do escritório “Rocha, Marinho e Sales advogados”. [165] STF - AI 391092 AgR/MG; Relator(a): Min. CEZAR PELUSO; Julgamento: 14/02/2006; Órgão Julgador: Primeira Turma; Publicação: DJ 1703-2006. [166] Todavia, já há, na atuação jurisprudencial, precedentes favoráveis às sociedades pluriprofissionais: “... ISS. SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS. ART. 9º, §§1º E 3º, DO DECRETO-LEI Nº 406/68... 5. As sociedades de advogados, qualquer que seja o conteúdo de seus contratos sociais, gozam do tratamento tributário deiferenciado previsto no art. 9º, §§1º E 3º, do Decreto-lei nº 406/68 e não recolhem o ISS sobre o faturamento, mas em função de valor anual fixo, calculado com base no número de profissionais integrantes da sociedade. 6...” (STJ, 2ª T., REsp 724.684/RJ. Rel. Min. CASTRO MEIRA, mai/05). [167] Apelação Cível n° 1.0024.04.425193-2/001 –TJMG. Relator: Exmo. Sr. Des. Antônio Sérvulo. [168] Apelação Cível 200.2008.020.871-9/002, 4ª Câmara Cível do TJPB, Rel. Romero Marcelo da Fonseca Oliveira. j. 22.09.2009, DJe 14.10.2009 [169] Apelação cível 46895579200080600000, 3ª Câmara Cível do TJCE. Rel. MARIA CELESTE THOMAZ DE ARAGÃO. Publicado em 14/05/2004.
[170]
Apelação Cível Nº 70045797396, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Maria Isabel de Azevedo Souza, Julgado em 20/12/2011. [171] Apelação/Reexame Necessário nº 0129367-39.2007.8.26.0000, 14ª Câmara de Direito Público, do TJSP, Rel. Geraldo Xavier. Data do Julgamento: 12/04/2012. Data da publicação: 16/05/2012. [172]A legitimidade ativa das seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil decorre do disposto no art. 5º, inc. LXX, alínea ‘b’ , da CF, art. 54 , II e XIV , da Lei nº 8.906/99 (Estatuto da Advocacia e da OAB) e art. 105 , V , c , do Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia e da OAB. Ainda, os Conselhos Seccionais tem personalidade jurídica própria, com jurisdição sobre os respectivos territórios, de acordo com o disposto no artigo 45, §2ºe 57 da Lei nº 8.906/94. Assim, prescindem de autorização individual para a defesa da classe dos advogados (artigo 44, IIda Lei nº 8.906/94). [173] TRF4, APELREEX 0002594-57.2009.404.7005, Segunda Turma, Relator Sebastião Ogê Muniz, D.E. 05/11/2010. [174] NOTA DA COORDENAÇÃO. Com as alterações no regime do SIMPLES, a sociedade de advogados pode optar por continuar a recolher carga tributária pode chegar a 14,27% sendo: IRPJ 4,8%, CSLL 2,88%, PIS 0,65%, COFINS 3%, Adicional IRPJ 2,94%, mais um valor fixo de ISS que varia de município para município, ou aderir ao SIMPLES, em que o advogado pagará ISS e os demais tributos em alíquota calculada pelo faturamento.
[175]
Procurador da Fazenda Nacional com atuação perante os Tribunais Superiores. Pós-graduação em Direito
Tributário e Direito Constitucional. Professor de cursos preparatórios para concursos. Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Autor do “Manual do Procurador da Fazenda Nacional”, coautor de “Questões Discursivas Comentadas – Advocacia Pública Federal” da Editora Juspodivm, e do livro “Estudos de Direito Constitucional”, em coautoria com o professor André Regis de Carvalho, pela editora da UFPB.
[176]
A esse respeito, doutrinador português Casalta Nabais aponta que “o tema dos deveres fundamentais é reconhecidamente considerado dos mais esquecidos da doutrina constitucional contemporânea”. (NABAIS. José Cassalta. O dever fundamental de pagar impostos. Coimbra: Almedina. pp. 15 e 16.) Ricardo Lobo Torres, citando James Buchanan, considera que o tributo é o ‘preço da liberdade’, sendo que esse custo se origina no pacto social entre o Estado e o cidadão, no qual este cede aquela parcela de seu patrimônio em troca de bens e serviços que proporcionem dignidade e satisfação
comunitária (Apud. ABRAHAM , M arcus. Curso de direito financeiro brasileiro. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010. P. 100).
[177]
“Como é sabido, a Constituição Federal não cria tributos, apenas outorga competência para que os entes políticos o façam por meio de leis próprias”. Alexandre. Ricardo. Direito tributário. 4 ed. São Paulo: M étodo, 2010. P. 204.
[178]
A expressão é de Becker; ‘signo’ por representar alguma expressão de riqueza aberta à instituição de um tributo, como a renda, v.g. BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. 3ª Edição. São Paulo: Lejus, 1998.
[179]
Para a compreensão da Teoria da Norma Tributária é de fundamental importância a leitura das seguintes obras: CARVALHO, Paulo de Barros. Teoria da norma tributária. 4 ed. São Paulo: M ax Limonad, 2002; COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro. 6 ed. Rido de Janeiro: Forense, 2001; BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. 2ed. São Paulo: Saraiva, 1972; ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 6 ed. São Paulo: M alheiros, 2010. Na doutrina encontramos a conceituação do chamado aspecto dimensível da hipótese de incidência, composto pela alíquota e base de cálculo. Ataliba explica que nem todos os tributos tem dualidade no aspecto dimensível, como é o caso de algumas taxas (tributos com preço fixo).
[180]
“Com efeito, a base de cálculo de um tributo é o padrão ou o critério que
permite dimensionar o fato econômico eleito pela lei como gerador da correspondente obrigação tributária”. ALEXANDRINO, M arcelo. PAULO, Vicente. Direito tributário na Constituição e no STF. 16 ed. Rio de Janeiro: Forense. P. 48.
[181]
ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária. 6 ed. São Paulo: M alheiros, 2010. P. 111.
[182]
Já tivemos a oportunidade de asseverar que “a base de cálculo é um dos aspectos mais relevantes do tributo, dando dimensão ao aspecto material da hipótese de incidência, associando-a a elementos de grandeza que lhe sejam compatíveis. Assim é que a ‘propriedade de imóvel urbano’ tem como grandeza dimensível o ‘valor venal’ (Artigo 33 do CTN). Além disso, serve a base de cálculo de identificação da própria espécie tributária, bem como realiza a capacidade contributiva; no caso do ‘valor venal’, pela aplicação da alíquota sobre essa grandeza (proporcionalidade), há maior tributação na medida em que aumente o próprio signo ostensivo da capacidade de ser tributado”. (GRILO, Renato Cesar Guedes. M anual do procurador da fazenda nacional. Salvador: Juspodivm, 2014. P. 71).
[183]
ALEXANDRINO, M arcelo. PAULO, Vicente. Direito tributário na Constituição e no STF. 16 ed. Rio de Janeiro: Forense. P. 231.
[184]
Em se tratando de tributos indiretos é de indispensável rememoração o
seguinte dispositivo do STF: Art. 166. A restituição de tributos que comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro somente será feita a quem prove haver assumido o referido encargo, ou, no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la.
[185]
O ISS pode ser cobrado de forma fixa (DL 406/68, Art. 9º, § 1º) ou variável (LC 116/03, Art. 7º, caput). O ISS variável tem o preço do serviço como a base de cálculo do tributo. A LC 116 prevê a possibilidade de dedução da base de cálculo em algumas circunstâncias. O ISS, insistimos, integra a sua própria base de cálculo. Já o ISS fixo, previsto para profissionais liberais e sociedades simples, o tributo é um valor fixo.
[186]
MELO, José Eduardo Soares de. PAULSEN, Leandro. Impostos federais, estaduais e municipais. 7 ed. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2012. P. 30.
[187]
CARRAZZA, Roque Antonio. A natureza meramente interpretativa do art. 129 da Lei nº 11.196/05, o imposto
de renda, a contribuição previdenciária e as sociedades de serviços profissionais. RDDT 154, jul/08, p. 109.
[188]
M ELO, José Eduardo Soares de. PAULSEN, Leandro. Impostos federais, estaduais e municipais. 7 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012. P. 35.
[189]
TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 16ª ed. São Paulo: Renovar, 2009, p. 94.
[190]
PAULSEN, Leandro. Curso de direito tributário completo. 3ª ed Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. P. 80.
[191]
Art. 146. Cabe à lei complementar: III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente
sobre: a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes;
[192]
M ELO, José Eduardo Soares de. PAULSEN, Leandro. Impostos federais, estaduais e municipais. 7 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012. P. 38.
[193]
Na legislação ordinária, o Imposto sobre a Renda da Pessoa Física (IRPF) encontra suporte nas Leis nºs 7.713/1988 e 9.250/1995 e o Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) nas Leis nºs 8.981/1995 e 9.430/1996, dentre outras. Ambos, IRPF e IRPJ, têm sua tributação, fiscalização, arrecadação e administração regulamentada pelo Decreto nº 3.000/1999. Nos interessa neste estudo apenas o Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas.
[194]
M ELO, José Eduardo Soares de. PAULSEN, Leandro. Impostos
federais, estaduais e municipais. 7 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012. P. 46.
[195]
Art. 14. Estão obrigadas à apuração do lucro real as pessoas jurídicas: I - cuja receita total no ano-calendário anterior seja superior ao limite de R$ 78.000.000,00 (setenta e oito milhões de reais) ou proporcional ao número de meses do período, quando inferior a 12 (doze) meses; (Redação dada pela Lei nº 12.814, de 2013) II - cujas atividades sejam de bancos comerciais, bancos de investimentos, bancos de desenvolvimento, caixas econômicas, sociedades de crédito, financiamento e investimento, sociedades de crédito imobiliário, sociedades corretoras de títulos, valores mobiliários e câmbio, distribuidoras de títulos e valores mobiliários, empresas de arrendamento mercantil, cooperativas de crédito, empresas de seguros privados e de capitalização e entidades de previdência privada aberta; III - que tiverem lucros, rendimentos ou ganhos de capital oriundos do exterior; IV - que, autorizadas pela legislação tributária, usufruam de benefícios fiscais relativos à isenção ou redução do imposto; V - que, no decorrer do ano-calendário, tenham efetuado pagamento mensal pelo regime de estimativa, na forma do art. 2° da Lei n° 9.430, de 1996; VI - que explorem as atividades de prestação cumulativa e contínua de serviços de assessoria creditícia, mercadológica, gestão de crédito, seleção e riscos, administração de contas a pagar e a receber, compras de direitos creditórios resultantes de vendas mercantis a prazo ou de prestação de serviços (factoring). VII - que explorem as atividades de securitização de créditos imobiliários, financeiros e do agronegócio.(Incluído pela Lei nº 12.249, de 2010)
[196]
Para uma melhor compreensão da temática, embora tratando especificamente do ICM S na base de cálculo do Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas, ver o voto do relator M inistro M auro Campbell M arques no RESP 1.312.024/RS.
[197]
"Não é possível para a empresa alegar em juízo que é optante pelo lucro presumido para em seguida exigir as benesses a que teria direito no regime de lucro real, mesclando os regimes de apuração" (AgRg nos EDcl no AgRg no Ag 1.105.816/PR, Segunda Turma, Rel. M in. M auro Campbell M arques, julgado em 02.12.2010).
[198]
Lateralmente, destaco temática diversa (mas semelhante) atinente à inclusão dos créditos relativos ao ICM S na base de cálculo do IRPJ e CSLL. A jurisprudência pacífica da Segunda Turma do STJ é no sentido da legalidade da inclusão (v.g. RESP 1.449.523). Contudo, há registro de dois precedentes em sentido contrário, oriundos da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 1.227.519, Rel. M inistro Benedito Gonçalves, DJe 07/04/2015; REsp 1.210.941/RS, Rel. p/ Acórdão M inistro Napoleão Nunes M aia Filho, DJe 14/11/2014). Nesta Corte Superior, a Primeira Seção – dividida na Primeira e Segunda Turmas – é competente para julgar as demandas envolvendo o Direito Tributário, dentre outras; sempre que há divergência entre
julgados dessas turmas caberá recurso de Embargos de Divergência, a ser julgado pela Primeira Seção. Nesse sentido, a Fazenda Nacional, representada pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, interpôs recurso contra o acórdão proferido no Resp 1.227.519 pela Primeira Turma. O EREsp nº 1227519/RS (2011/0002242-7) foi autuado em 09/05/2015 e admitido pelo M inistro relator Herman Benjamin. Recomenda-se que o leitor consulte o julgamento deste processo pela Primeira Seção, a quem competirá fazer prevalecer o entendimento absolutamente pacífico na Segunda Turma, ou manter o julgado divergente oriundo da Primeira Turma do STJ.
[199]
Em homenagem ao princípio da solidariedade, que deve permear a tributação pelas contribuições, e relativizando em parte a referibilidade, o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça legitimam a cobrança de contribuições interventivas de categorias diversas. A contribuição ao SEBRAE pode ser exigida de todas as empresas que desenvolvam atividades econômicas, ainda que sejam de grande porte e, portanto, não estejam abrangidas diretamente com os benefícios advindos da intervenção econômica (STF, Primeira Turma, RE 401.823, AgRg 9.2004; Segunda Turma, AI 650.194 AgRg, 4.2009). O STJ, por sua vez, permite a cobrança da contribuição ao INCRA até mesmo de empresas urbanas.
[200]
Nos termos do caput do Art. 195, a seguir colacionado, a Seguridade Social será custeada por toda a sociedade, de forma direta ou indireta: diretamente o custeio se dá por meio das contribuições previstas neste dispositivo; indiretamente, por meio dos recursos dos impostos.
[201]
PAULSEN, Leandro. Curso de direito tributário completo. 3ª ed Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. P. 45.
[202]
PAULSEN, Leandro. VELLOSO, Andrei Pitten. Contribuições: Teoria geral e contribuições em espécie. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. P. 47.
[203]
A intenção clara do Constituinte é desonerar as exportações, pelo princípio de que não se deve exportar tributos, em claro estímulo à economia brasileira. “Esta Suprema Corte, nas inúmeras oportunidades em que debatida a questão da hermenêutica constitucional aplicada ao tema das imunidades, adotou a interpretação teleológica do instituto, a emprestar-lhe abrangência maior, com escopo de assegurar à norma supralegal máxima efetividade. O contrato de câmbio constitui negócio inerente à exportação, diretamente associado aos negócios realizados em moeda estrangeira. Consubstancia etapa inafastável do processo de exportação de bens e serviços, pois todas as transações com residentes no exterior pressupõem a efetivação de uma operação cambial, consistente na troca de moedas. O legislador constituinte – ao contemplar na redação do art. 149, § 2º, I, da Lei M aior as ‘receitas decorrentes de exportação’ – conferiu maior amplitude à desoneração constitucional, suprimindo do alcance da competência impositiva federal
todas as receitas que resultem da exportação, que nela encontrem a sua causa, representando consequências financeiras do negócio jurídico de compra e venda internacional. A intenção plasmada na Carta Política é a de desonerar as exportações por completo, a fim de que as empresas brasileiras não sejam coagidas a exportarem os tributos que, de outra forma, onerariam as operações de exportação, quer de modo direto, quer indireto. Consideram-se receitas decorrentes de exportação as receitas das variações cambiais ativas, a atrair a aplicação da regra de imunidade e afastar a incidência da contribuição ao PIS e da Cofins. Assenta esta Suprema Corte, ao exame do leading case, a tese da inconstitucionalidade da incidência da contribuição ao PIS e da Cofins sobre a receita decorrente da variação cambial positiva obtida nas operações de exportação de produtos.” (RE 627.815, rel. min. Rosa Weber, julgamento em 23-5-2013, Plenário, DJE de 1º-10-2013, com repercussão geral.)
[204]
“Ao dizer que a contribuição ao Pis/Pasep-Importação e a CofinsImportação poderão ter alíquotas ad valorem e base de cálculo o valor aduaneiro, o constituinte derivado circunscreveu a tal base a respectiva competência. A referência ao valor aduaneiro no art. 149, § 2º, III, a, da CF implicou utilização de expressão com sentido técnico inequívoco, porquanto já era utilizada pela legislação tributária para indicar a base de cálculo do Imposto sobre a Importação. A Lei 10.865/2004, ao instituir o Pis/PasepImportação e a Cofins-Importação, não alargou propriamente o conceito de valor aduaneiro, de modo que passasse a abranger, para fins de apuração de tais contribuições, outras grandezas nele não contidas. O que fez foi desconsiderar a imposição constitucional de que as contribuições sociais sobre a importação que tenham alíquota ad valorem sejam calculadas com base no valor aduaneiro, extrapolando a norma do art. 149, § 2º, III, a, da CF. Não há como equiparar, de modo absoluto, a tributação da importação com a tributação das operações internas. O Pis/Pasep-Importação e a Cofins-Importação incidem sobre operação na qual o contribuinte efetuou despesas com a aquisição do produto importado, enquanto a Pis e a Cofins internas incidem sobre o faturamento ou a receita, conforme o regime. São tributos distintos. O gravame das operações de importação se dá não como concretização do princípio da isonomia, mas como medida de política tributária tendente a evitar que a entrada de produtos desonerados tenha efeitos predatórios relativamente às empresas sediadas no País, visando, assim, ao equilíbrio da balança comercial. Inconstitucionalidade da seguinte parte do art. 7º, I, da Lei 10.865/2004: ‘acrescido do valor do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de M ercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICM S incidente no desembaraço aduaneiro e do valor das próprias contribuições, por violação do art. 149, § 2º, III, a, da CF, acrescido pela EC 33/01’.” (RE 559.937, rel. p/ o ac. min. Dias Toffoli, julgamento em 20-3-2013, Plenário, DJE de 17-10-2013, com repercussão geral.)
[205]
O Artigo 239 da Constituição Federal trata da finalidade da arrecadação da contribuição social do PIS: Art. 239. A arrecadação decorrente das contribuições para o Programa de Integração Social, criado pela Lei Complementar nº 7, de 7 de setembro de
1970, e para o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público, criado pela Lei Complementar nº 8, de 3 de dezembro de 1970, passa, a partir da promulgação desta Constituição, a financiar, nos termos que a lei dispuser, o programa do seguro-desemprego e o abono de que trata o § 3º deste artigo.
[206]
PAULSEN, Leandro. VELLOSO, Andrei Pitten. Contribuições: Teoria geral e contribuições em espécie. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. P. 230.
[207]
§ 13. Aplica-se o disposto no § 12 inclusive na hipótese de substituição
gradual, total ou parcial, da contribuição incidente na forma do inciso I, a, pela incidente sobre a receita ou o faturamento. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)
[208]
ADC 1. Pleno. DJ 16.06.95. Relator M inistro M oreira Alves. Ementa: Ação Declaratória de Constitucionalidade. Artigos 1º, 2º, 9º (em parte), 10 e 13 (em parte) da Lei Complementar nº 70, de 30.12.91. COFINS. - A delimitação do objeto da ação declaratória de constitucionalidade não se adstringe aos limites do objeto fixado pelo autor, mas estes estão sujeitos aos lindes da controvérsia judicial que o autor tem que demonstrar. - Improcedência das alegações de inconstitucionalidade da contribuição social instituída pela Lei Complementar nº 70/91 (COFINS). Ação que se conhece em parte, e nela se julga procedente, para declarar-se, com os efeitos previstos no parágrafo 2º do artigo 102 da Constituição Federal, na redação da Emenda Constitucional nº 3, de 1993, a constitucionalidade dos artigos 1º, 2º e 10, bem como das expressões "A contribuição social sobre o faturamento de que trata esta lei não extingue as atuais fontes de custeio da Seguridade Social "contidas no artigo 9º, e das expressões "Esta lei complementar entra em vigor na data de sua publicação, produzindo efeitos a partir do primeiro dia do mês seguinte nos noventa dias posteriores, aquela publicação,..." constantes do artigo 13, todos da Lei Complementar nº 70, de 30 de dezembro de 1991.
[209]
Apenas a título de complementação, em incidente na ADC 1, o Supremo Tribunal Federal assentou a própria constitucionalidade da Emenda Constitucional n.3/93 que inseriu a Ação Declaratória de Constitucionalidade no ordenamento jurídico constitucional, sendo lavrada a seguinte ementa: AÇÃO DECLARATORIA DE CONSTITUCIONALIDADE. INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE DA EM ENDA CONSTITUCIONAL N. 03/93, NO TOCANTE A INSTITUIÇÃO DESSA AÇÃO. QUESTÃO DE ORDEM . TRAM ITAÇÃO DA AÇÃO DECLARATORIA DE CONSTITUCIONALIDADE. INCIDENTE QUE SE JULGA NO SENTIDO DA CONSTITUCIONALIDADE DA EM ENDA CONSTITUCIONAL N. 3, DE 1993, NO TOCANTE A AÇÃO DECLARATORIA DE CONSTITUCIONALIDADE.
[210]
Asseverando não ser admitido no Brasil o fenômeno da constitucionalização ou constitucionalidade superveniente, a doutrina destaca que: “O
alargamento posterior da base econômica passível de ser tributada, de faturamento para “receita ou faturamento”, decorrente da EC 20/98, não tem o efeito de convalidar legislação anterior que fizera incidir a contribuição sobre a totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica (conceito mais largo que o de faturamento), com extrapolação inconstitucional da competência outorgada, como fato gerador da contribuição nominada do art. 195, I, da CF. Isso porque a inconstitucionalidade vicia a norma na origem, não se podendo pretender a recepção de norma inválida”. PAULSEN, Leandro. VELLOSO, Andrei Pitten. Contribuições: Teoria geral e contribuições em espécie. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. P. 180.
[211]
“A receita proveniente de receitas financeiras por empresas que não
sejam instituições financeiras e que, portanto, não tenham a obtenção de receitas financeiras como seu próprio objeto [social], é afastada da incidência [do PIS/COFINS]”. PAULSEN, Leandro. VELLOSO, Andrei Pitten. Contribuições: Teoria geral e contribuições em espécie. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. P. 183.
[212]
PIS E CONFINS - LEI 9718/98 - RECEITA BRUTA E FATURAMENTO - A sinonímia dos vocábulos - ADC 1,
Pleno, rel Moreira Alves - conduz à exclusão de aportes financeiros estranhos à atividade desenvolvida. (STF, Pleno, RE 527602, rel Marco Aurelio).
[213]
Tal regime não cumulativo para o PIS/COFINS é diverso daquele constitucionalmente previsto para o ICMS,
por exemplo. É que a contribuição social incide sobre “receita ou faturamento” e não em cadeia, como o IPI, ICMS e ISS. Um exemplo ajuda a ilustrar: construtora que incorpora e comercializa imóveis vende apartamento novo e recebe um usado na negociação. A venda foi contabilizada em determinada competência e teve como valor total R$ 500.000,00, sendo R$200.000,00 em dinheiro e o restante referente ao ingresso do apartamento usado na negociação. Para a incidência do PIS/COFINS não interessa a composição do negócio: a receita é de R$ 500.000,00 e neste valor contabilizada, o tributo irá incidir sobre tal montante. Ocorre que, dois anos depois, após dificuldades na procura de um adquirente, a construtora consegue vender o imóvel usado pelos mesmos R$ 300.000,00 que o recebeu. Como este dinheiro ingressa como produto da sua atividade fim (venda de imóveis), será considerado faturamento e está sujeito à incidência de PIS/COFINS. Portanto, percebe-se que, a rigor, este mesmo “bem” já havia sido tributado; mas não é este o raciocínio que deve ser feito, pois a contribuição incide com foco no faturamento ou receita – e não na comercialização. Assim, no regime cumulativo essa construtora pagará novamente PIS/COFINS sobre esse fato gerador (materializado pelo faturamento). Contudo, essa mesma construtora, acaso tributada no IRPJ pelo lucro real, poderá aderir ao regime não cumulativo do PIS/COFINS e realizar a apuração de crédito em relação aos bens adquiridos para revenda (Art. 3o, inciso I, da Lei 10.833/03). Portanto, esse regime não cumulativo é um favor fiscal, uma faculdade aberta ao contribuinte; não se confunde como a não cumulatividade constitucional do IPI, ICMS e ISS, ínsita e conceitualmente própria à essas exações.
[214] Graduação em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba. Ex-bolsista do Deutscher Akademischer Austauschdienst (DAAD). Participação no curso Wirtschaftsstandort Deutschland em Freiburg im Breisgau
– Alemanha. [215] O aplicativo Ringo (lançado no Brasil em Setembro de 2015), diferentemente de aplicativos por streaming de voz, que se utilizam da rede de dados do usuário para estabelecer ligações, promete dispensar o uso de internet, usando, porém, o número da operadora local como espelho para realização de ligações. A ligação será concretizada, no entanto, a partir de uma conexão a ser feita dentro dos próprios servidores da empresa, localizados, exclusivamente, nos EUA. Não será de estranhar uma manifestação negativa das empresas de telefonia, sob o argumento de que elas são pagadoras de tributos no Brasil, e os aplicativos como o Ringo não. Naturalmente, necessitase de uma atualização das normas tributárias brasileiras nesse sentido. [216] Tradução livre pelo autor: Seção 42: Do Abuso Dos Esquemas De Elisão Fiscal (...) (2) Um abuso é considerado existente quando uma opção legal imprópria é eleita, quando comparada com outra opção apropriada, conduzindo a vantagens desassociadas da intenção legal, para o contribuinte ou terceiros. Não haverá aplicação da norma quando o contribuinte evidenciar hipótese de não incidência quanto à opção escolhida, a qual deve ser relevante quando vista em uma perspectiva global.
[217] Súmula Vinculante n. 31: É inconstitucional a incidência do imposto sobre serviços de qualquer natureza – ISS sobre operação de locação de bens móveis.
[218] Membro da Comissão de Estudos Tributário da OAB/PB – Subseção de Campina Grande; Graduado em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba – UEPB e Advogado.
[219] Art. 113, inciso 17 da Constituição de 1934: “É garantido o direito de propriedade, que não poderá ser exercido contra o interesse social ou coletivo, na forma que a lei determinar. A desapropriação por necessidade ou utilidade pública far-se-á nos termos da lei, mediante prévia e justa indenização. Em caso de perigo iminente, como guerra ou comoção intestina, poderão as autoridades competentes usar da propriedade particular até onde o bem público o exija, ressalvado o direito à indenização ulterior. (BRASIL, 1934) [220] Também é preciso lembrar que se encontra superado o pensamento jurídico que sustenta serem os princípios normas meramente informativas, conceituais, sem natureza cogente. A esse respeito, tomam-se por empréstimo as palavras de Ruy Samuel Espíndola, citado por Camargo (2008, p.30): “Hoje, no pensamento jurídico contemporâneo, existe unanimidade em se reconhecer aos princípios jurídicos o status conceitual e positivo de norma de direito, de norma jurídica. Para este núcleo de pensamento, os princípios tem positividade, vinculatividade, são normas, obrigam, têm eficácia positiva e negativa sobre comportamentos públicos ou privados.”
[221]
José Roberto Bassul, em seu “Estatuto da Cidade: Quem ganhou? Quem perdeu?”, relata com primazia todos os entraves políticos que marcaram a tramitação do Projeto de Lei nº. 5.788/90, que deu origem ao Estatuto da Cidade.
[222]
Desde o Império Romano foram inúmeras as circunstâncias em que os tributos foram utilizados para estimular/desestimular determinadas condutas. Ao citar Dieter Birk, Luis Eduardo Schoueri (2005) relata, inclusive, alguns casos curiosos, como a utilização de um imposto sobre a posse de rouxinóis, em 1984, na cidade de Potsdam, com o objetivo de promover uma proteção destes pássaros nos jardins reais. O imposto teve efeito tão significativo que, em 1987, não havia mais quem registrasse a posse de um rouxinol.
[223] Schoueri (2005) cita como exemplo o caso da legislação que assegure tratamento tributário diferenciado em caso de
desemprego que, embora beneficie o contribuinte, não configura incentivo para que a situação de desemprego seja modificada.
[224] Bolsista de Mestrado. Ex- Conciliador Cível do Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba, Especialista em Direito Processual Civil e Especialista em Direito Tributário pela Universidade do Sul de Santa Catarina, Civilista e ExProfessor de Teoria Geral do Processo, Juizados Especiais e Direito Processual Civil na União de Ensino Superior de Campina Grande (UNESC), do Centro de Ensino Superior Reinaldo Ramos (CESREI), do Roma Cursos Jurídicos, do Lexus e do Meritus - preparatório para concursos. Palestrante em eventos jurídicos e articulista em diversas revistas jurídicas. Autor do livro Juizados Especiais Cíveis e Criminais pela Edijur/Leme-SP, dentre outros. É colunista quinzenal da revista jurídica jus vigilantibus com sede no Espírito Santo. [225] Na hipótese de território federal, hodiernamente inexistente, essa competência será da União e, portanto, sua instituição se dará por lei ordinária federal, inteligência do art. 147 da CRFB/88. [226] Posse qualificada pela possibilidade de aquisição do domínio ou a propriedade por usucapião. [227] REsp 1112646⁄SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26⁄08⁄2009, DJe 28⁄08⁄2009. [228] REsp 738.628⁄SP, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 12⁄05⁄2005, DJ 20⁄06⁄2005 p. 259. [229] (REsp 492.869⁄PR, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 15⁄02⁄2005, DJ 07⁄03⁄2005 p. 141. [230] Nova Ramada é um município brasileiro do estado do Rio Grande do Sul, com base econômica no agro negócio. Sua população estimada no CENSO 20010 era de 2.437, com PIB per capita de R$ 20 763,38, e PIB geral de 51 700,814, além de IDH de 0,77. Portanto, um município rural rico, se comparado a outros pequenos municípios. [231] Advogado. Mestrando em Constituição e Garantia de Direitos pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. [232] Advogado. Mestrando em Constituição e Garantia de Direitos pela
Universidade Federal do Rio Grande do Norte. [233] ADI 724 MC, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 07/05/1992, DJ 27-04-2001 PP-00056 EMENT VOL-02028-01 PP00065. No mesmo sentido, a ADIMC 2464, Pleno, Rel. Ellen Gracie, DJ 28.06.02; e o AgRRE 309.425, 2ª T., Rel. Carlos Velloso, DJ 19.12.02. [234] TJRN -1.ª C. Cível -Ap. Cível 2009.008432-6 -Rel. Des. VIVALDO PINHEIRO -j. 27-10-2009, TJRN -3.ª C. Cível -Ap. Cível 2009.005853-4 Rel.ª Juíza SOLEDADE FERNANDES -j. 21-1-2010 [235] TJRN -2.ª C. Cível -Ap. Cível 2010.007686-6 -Rel. Des. OSVALDO CRUZ -j. 21-8-2010 [236] TJRN -3.ª C. Cível -Ap. Cível 2007.005439-6 - Rel. Juiz GABRIEL MAIA - j. 25-10-2007 [237]72019 RN 2010.007201-9, Relator: Des. Dilermando Mota, Data de Julgamento: 09/11/2010, 1ª Câmara Cível) [238] RE 630553, Min. Celso de Mello.
[239]
Juiz de Direito do Tribunal de Justiça da Paraíba. Ex-ProcuradorChefe da Procuradoria Federal junto ao Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Paraíba. Professor da Faculdade de Ciências Sociais e Aplicadas do Centro de Ensino Superior e Desenvolvimento (CESED/FACISA). Bacharel em Ciências Jurídicas pela Universidade Estadual da Paraíba. Pós-Graduado em Direito Tributário. [240]RE 346084, Relator(a): Min. ILMAR GALVÃO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 09/11/2005, DJ 01-09-2006 [241]A súmula 328 do STF (“É legítima a incidência do Imposto de Transmissão Inter Vivos sobre a doação de imóvel”) restou superada pela Constituição Federal. [242]Neste sentido: (RE 103434, Relator(a): Min. ALDIR PASSARINHO, Segunda Turma, julgado em 24/10/1985, DJ 14-02-1986 PP-01209 EMENT VOL-01407-02 PP-00216) [243]Súmula 111: É legítima a incidência do imposto de transmissão ‘inter vivos’ sobre a restituição, ao antigo proprietário, de imóvel que deixou de servir
à finalidade da sua desapropriação. [244] REsp 1188655/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20/05/2010, DJe 08/06/2010. [245]A definição legal do fato gerador é interpretada abstraindo-se: I - da validade jurídica dos atos efetivamente praticados pelos contribuintes, responsáveis, ou terceiros, bem como da natureza do seu objeto ou dos seus efeitos [246]Neste sentido, confira-se: STJ, REsp 1175640/MG, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 04/05/2010, DJe 11/05/2010. [247] Direitos reais há em legislação extravagante, como a alienação fiduciária em garantia. [248]A Súmula 326 do STF (“É legítima a incidência do Imposto de Transmissão Inter Vivos sobre a transferência do domínio útil”) remanesce aplicável para os casos das enfiteuses especiais, não atingidas pelo art. 2038 do Código Civil de 2002. [249]Neste sentido: REsp 264064/DF, Rel. Ministro GARCIA VIEIRA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 14/11/2000, DJ 11/12/2000, p. 180. [250] AI 26917, Relator(a): Min. RIBEIRO DA COSTA, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/08/1962, DJ 13-09-1962 PP-02561. [251] RE 55320 embargos, Relator(a): Min. CÂNDIDO MOTTA, TRIBUNAL PLENO, julgado em 10/08/1964, DJ 22-10-1964. [252] STJ, AgRg no REsp 327188/DF, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, PRIMEIRA TURMA, julgado em 07/05/2002, DJ 24/06/2002, p. 203. [253] REsp 253.364/DF, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, PRIMEIRA TURMA, julgado em 13/02/2001, DJ 16/04/2001, p. 104. [254]No RE 234.105 (Rel. Min. Carlos Velloso, julgamento em 8-4-1999, Plenário, DJ de 31-3-2000) o STF explicitou o preço da venda como possível base de cálculo. Já o STJ, no REsp 1188655/RS (Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20/05/2010, DJe 08/06/2010), definiu o
preço obtido em hasta pública, no caso de arrematação. [255] Advogada. Especialista em Direito Processual Civil pela FDDJ. Extensão em Planejamento Tributário pelo IBET e Introdução ao Common Law, com enfoque no Direito Norte-Americano pela George Washington University.
[256]
MAMEDE, Gladston; MAMEDE, Eduarda Cotta. Empresas Familiares: Administração, Sucessão e Prevenção de conflitos entre sócios. São Paulo: Atlas. 2012, p.6.
[257]
LODI, João Bosco. A Empresa Familiar. São Paulo:
Pioneira. 1998, p.6.
[258] Informações fornecidas pelo SEBRAE, de acordo com estudo de dados levantados pelo IBGE. Disponível em: < http://www.sebraesp.com.br/index.php/42-noticias/empreendedorismo/11552sucessores-devem-ser-preparados-para-assumir-empresa-familiar >. Acesso em: Agosto de 2015. [259]
MAMEDE, Gladston; MAMEDE, Eduarda Cotta. Empresas Familiares: Administração, sucessão e prevenção de conflitos entre sócios. São Paulo: Atlas. 2012, p. 12-13.
[260] MAMEDE, Gladston; MAMEDE, Eduarda Cotta. Holding familiar e suas vantagens: planejamento jurídico econômico do patrimônio e da sucessão familiar. 3 ed. São Paulo: Alta, 2012, p. 2. [261]
LONGO, José Henrique. Criação de Holding e Proteção Patrimonial. IX Congresso Nacional de Estudos Tributários (IBET – Instituto Brasileiro de Estudos Tributários).
[262] MAMEDE, Gladston; MAMEDE, Eduarda Cotta. Holding familiar e suas vantagens: planejamento jurídico econômico do patrimônio e da sucessão familiar. 3 ed. São Paulo: Alta, 2012, p. 8. [263]
LODI, João Bosco. Lobby e Holding: as bases do poder. São Paulo: Pioneira. 1982, p.14.
[264] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume 7: direito das sucessões. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 19. [265]
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões. 13 ed. São Paulo: Atlas, 2013, p.1.
[266] Previdência Privada (VGBL), Fundos Fechados, Escrow Accounts, Fundos de Investimento em Participações (FIP) etc. [267] CTN, artigo 38: “A base de cálculo do imposto é o valor venal dos bens e direitos transmitidos”. No escólio de Kiyoshi Harada: “Conceituamos o valor venal como sendo aquele preço que seria alcançado em uma operação de compra e venda à vista, em condições normais do mercado imobiliário, admitindo-se a diferença de até 10% para mais ou para menos”. (ITBI: doutrina e prática. Atlas, 2010, p. 144). [268] Consoante dispõe o Código Civil, em seu artigo 1.410, I, o usufruto se extingue pela morte do usufrutuário. Em razão de ser um direito intuitu personae, não se transmite aos herdeiros.
[269] Como cláusulas de lock up, tag along, drag along, entre outras.
[270]
Mestre pela UEPB; Presidente do Instituto Paraibano de Estudos Tributários – IPBET; Membro da Comissão de Estudos Tributários da OAB/PB; Professor de Direito Tributário da FRR/CESREI, da Pós-graduação em Direito Tributário da Escola Superior da Advocacia – ESA/PB, da Escola Superior da Magistratura – ESMA/CG e dos Cursos Jurídicos Misael Montenegro – PE; Sócio e Diretor Jurídico do Escritório Advocacia David Diniz – ADD.
[271] Graduado em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba – UEPB; Pós-graduando em Direito Tributário pela Escola Paulista de Direito; Membro do Instituto Paraibano de Estudos Tributários – IPBET; Autor de artigos jurídicos e Advogado.
[272] Disponível em http://www.aneel.gov.br/cedoc/res2000456.pdf [273]
http://www.mp.sp.gov.br/portal/page/portal/Assessoria_Juridica/Civel/Controle_C 990104526396_15-03-11.htm [274] Assessora Jurídica do TJPB, Advogada, Professora Universitária, Especialista em Direito Público, Membro do Instituto Paraibano de Direito Tributário, Mestre em Letras pela UFPB e Doutorando pela UEPB. [275] Este período é chamado de antiguidade e começa com a invenção da escrita, ocorrida, aproximadamente em 5000 a.c. até 476 d.c., ano que marcou o fim do império romano. [276] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao91.htm
[277] Nomenclatura utilizada por Pasquele Russo (apud CARRAZZA, 2002, p. 461)
[278] Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: I - propriedade predial e territorial urbana; II - transmissão "inter vivos", a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição; III - serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar. [279] Art. 149-A - Os Municípios e o Distrito Federal poderão instituir contribuição, na forma das respectivas leis, para o custeio do serviço de iluminação pública [...]. [280] Art. 145 - A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: I - impostos; II - taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição; III - contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas.
[281] Ressalve-se que comentado o art. 4º do CTN Comentado, coordenado
por Ives Gandra da Silva Martins, edição de 2002, pg. 37, Hugo de Brito Machado dispôs que “o valor da taxa está relacionado com o custo da atividade estatal que constitui o seu fato gerador. Essa relação é uma decorrência natural do próprio fato gerador, que tem, sempre, o seu aspecto quantitativo, a sua expressão econômica”. [282] Art. 30. Compete aos Municípios: I - legislar sobre assuntos de interesse local; [283] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 19 ed. São Paulo: Atlas, 2006 [284] Advogado, consultor jurídico e professor da Universidade Federal de Campina Grande. Mestre em Ciências Jurídicas pela Universidade Federal da Paraíba e doutor em Recursos Naturais pela Universidade Federal de Campina Grande.
[285] Advogada, consultora jurídica e professora da Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas. Mestre e doutoranda em Recursos Naturais pela Universidade Federal de Campina Grande.
[286]
297 Possui graduação em Faculdade de Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1992), mestrado em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1996) e doutorado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2002), Doutorado Sandwich na LudwigMaximilians Universität em Munique (Alemanha) (2001). Participou do Program of Instruction for Lawyers da Harward Law School (2001). Árbitro da Lista brasileira do Sistema de Controvérsias do Mercosul Atualmente é professor permanente da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. [287] Cf. Livro 1, tit. LXVI, 43 das Ordenações Filipinas.
[288] “Livro 1 Tit.47: Das pessoas que podem dar licença pera as fintas, e quaes sam as pessoas que dellas sam escusas, e que os Concelhos nom ponham tença a alguém”, Ordenações Manuelinas, 1514.
[289] Segundo Moraes: “Os Governadores e Vice-Reis encarregar-se-ão da
construção e reconstrução das estradas e pontes dos seus distritos, devendo tais obras ser custeadas por aquelas que delas se beneficiem. As despesas devem ser custeadas somente pelas pessoas ou grupos de população que gozem de suas vantagens, não se podendo exigir mais do que o necessário, de forma a não haver”; ver in MOREIRA, João Baptista. Contribuiçao de melhoria. In:____Tratado de direito tributário. Coord. Flávio Bauer Novelli. Rio de Janeiro: Forense, 1981, v.8, p. 167.
[290] Cf. Carlos Alberto Alves de Carvalho Pinto, tinha sido ex-Governador de São Paulo e era Professor Catedrático da Faculdade de Direito da USP. Carvalho Pinto, Carlos Alberto Alves de. Contribuição de Melhoria: a Lei Federal Normativa. in Revista de Direito Administrativo, R.J. vol. 12. abr./jun/1948. pp. 2/31 e 1949 pp. 2/22.
[291] Segundo Biava: “A ênfase da legislação brasileira na valorização do imóvel como fato gerador da Contribuição de Melhoria tem sido atribuída como uma das principais razões da inaplicabilidade histórica deste tributo em nosso País, havendo muitos autores que propugnam pela redefinição da legislação brasileira, recolocando em termos diversos o papel da valorização na Contribuição de Melhoria”; ver in Biava, Adriano Henrique Rebelo. Contribuição de melhoria. Necessidade de inovação fiscal. São Paulo: IPE/USP, 1986. [292] Para Sacha Calmon Navarro Coelho: “O decreto lei nº 195/67 Caducou antes da Constituição de 1988. É que este diploma legal regulava, com caráter de lei complementar, uma contribuição de melhoria baseada no critério valorização, como previsto na constituição de 1967 e na Emenda nº 1/69. Ocorre que em 1983 a Emenda Constitucional nº 23 de 01/12, a chamada emenda Passos Porto, alterou fundamentalmente o tipo de contribuição de melhoria existente, optando pelo critério custo. A redação passou a ser a seguinte. Poderiam as pessoas políticas instituir: Contribuição de melhoria arrecada dos proprietários de imóveis beneficiados por obras públicas, que terá como limite total a despesa realizada. Duas alterações introduziu a emenda em relação ao texto anterior : (a) substitui-se a expressão "imóveis valorizados" por imóveis beneficiados e (b) omitiu-se a expressão "tendo como limite individual o acréscimo de valor que da obra resultar para cada imóvel
beneficiado”; Cf. COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários À Constituição de 1988 Sistema Tributário. 6ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 77. [293] “Art. 7º A competência tributária é indelegável, salvo atribuição das funções de arrecadar ou fiscalizar tributos, ou de executar leis, serviços, atos ou decisões administrativas em matéria tributária, conferida por uma pessoa jurídica de direito público a outra, nos termos do § 3º do artigo 18 da Constituição”.
[294]
Cf. Ataliba, Geraldo. Em prol das Contribuições de Melhoria. 2ª Reunião Regional Latino-americana de Direito Tributário. São Paulo: Resenha Tributária, 1976, p. 224
[295]
Cf. LIMA, Robson Luiz Rosa. Contribuição de melhoria . Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 775, 17 ago. 2005. Disponível em: . Acesso em: 24 maio 2007.
[296] Advogado e Consultor Jurídico. Bacharel em Geografia e Direito pela Universidade Estadual da Paraíba - UEPB e Pós-graduando em Direito Previdenciário pela Escola Superior de Advocacia da Paraíba – ESA/PB, em convênio com a Faculdade Maurício de Nassau - FMN.
[297]
Advogado; Graduado em Direito pela Faculdade Reinaldo Ramos FARR/CESREI. Pós-graduando em Direito Constitucional pela Universidade Estadual da Paraíba - UEPB e em Direito Imobiliário pela Escola Paulista de Direito - EPD. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Constitucional, Direito Processual Civil e Direito Imobiliário.
[298]
Advogada e Consultora Jurídica. Bacharela em Direito e Mestranda pela Universidade Estadual da Paraíba - UEPB.
[299] O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE 573.202 - Relator o Exmo. Ministro Ricardo Lewandowski, com repercussão geral, definiu que a relação de emprego entre o Poder Público e seus servidores é sempre de caráter jurídico-administrativo e, portanto, a competência para dirimir conflitos entre as duas partes será sempre da Justiça Comum, e não da Justiça do Trabalho. [300] Art. 3º Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada. (grifamos) [301] Cf. artigo 4º da Lei nº 10.887, de 18 de junho de 2004.
[302] STF, ADI 3.105, Rel. p/ o ac. Min. Cezar Peluso, julgamento em 18-8-
2004, Plenário, DJde 18-2-2005. [303] Disponível em: http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/planejamento/iprem/noticias/in p=9047 [304] “O sistema previdenciário dos ocupantes de cargos comissionados foi regulado pela lei 8.647/1993. Posteriormente, com a Emenda Constitucional 20/1998, o art. 40, § 13 da Constituição Federal determinou a filiação obrigatória dos servidores sem vínculo efetivo ao Regime Geral de Previdência. Como os detentores de cargos comissionados desempenham função pública a título precário, sua situação é incompatível com o gozo de quaisquer benefícios que lhes confira vínculo de caráter permanente, como é o caso da aposentadoria. Inadmissível, ainda, o entendimento segundo o qual, à míngua de previsão legal, não se deva exigir o preenchimento de requisito algum para a fruição da aposentadoria por parte daqueles que desempenham a função pública a título precário, ao passo que, para os que mantêm vínculo efetivo com a Administração, exige-se o efetivo exercício no cargo por cinco anos ininterruptos ou dez intercalados (art. 193 da Lei 8.112/1990). Recurso ordinário a que se nega provimento” (RMS 25.039, Rel. Min. Joaquim
Barbosa, Segunda Turma, DJe 18.4.2008).
[305]
Art. 15. Considera-se: I - empresa - a firma individual ou sociedade que assume o risco de atividade econômica urbana ou rural, com fins lucrativos ou não, bem como os órgãos e entidades da administração pública direta, indireta e fundacional;
[306]
E infração penal grave, prevista no Código Penal, e capaz de levar o responsável pela pagadoria, na Prefeitura, à cadeia: CP. Art. 168-A. Deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, no prazo e forma legal ou convencional: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. § 1o Nas mesmas penas incorre quem deixar de: I - recolher, no prazo legal, contribuição ou outra importância destinada à previdência social que tenha sido descontada de pagamento efetuado a segurados, a terceiros ou arrecadada do público; II - recolher contribuições devidas à previdência social que tenham integrado despesas contábeis ou custos relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços; III - pagar benefício devido a segurado, quando as respectivas cotas ou valores já tiverem sido reembolsados à empresa pela previdência social. § 2o É extinta a punibilidade se o agente, espontaneamente, declara, confessa e efetua o pagamento das contribuições, importâncias ou valores e presta as informações devidas à previdência social, na forma definida em lei ou regulamento, antes do início da ação fiscal. § 3o É facultado ao juiz deixar de aplicar a pena ou aplicar somente a de multa se o agente for primário e de bons antecedentes, desde que: I - tenha promovido, após o início da ação fiscal e antes de oferecida
a denúncia, o pagamento da contribuição social previdenciária, inclusive acessórios; ou II - o valor das contribuições devidas, inclusive acessórios, seja igual ou inferior àquele estabelecido pela previdência social, administrativamente, como sendo o mínimo para o ajuizamento de suas execuções fiscais.
[307]
Para maiores detalhes, confira nosso livro LEI DE EXECUÇÃO FISCAL COMENTADA E ANOTADA.
[308]
Ver Lei 10.522/2002.
[309]
Graduada em direito pela Universidade Estadual da Paraíba – UEPB. Pós Graduada em Processo Civil. Consultora jurídica tributária e advogada associada do Escritório Lira e Leite Advocacia e Assessoria Jurídica. 13. [310] Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: 14. [...] 15. III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;” (Grifou-se) 16. [311] Art. 5° O Tribunal de Contas da União efetuará o cálculo das quotas referentes aos Fundos de Participação e acompanhará, junto aos órgãos competentes da União, a classificação das receitas que lhes dão origem. 17. Parágrafo único. No caso de criação e instalação de Município, o Tribunal de Contas da União fará revisão dos coeficientes individuais de participação dos demais Municípios do Estado a que pertence, reduzindo proporcionalmente as parcelas que a estes couberem, de modo a lhe assegurar recursos do Fundo de Participação dos Municípios - FPM. 18. [...] 19. Art. 7° A União, através do Ministério da Fazenda, e o Tribunal
de Contas da União baixarão, nas suas respectivas áreas de competência, as normas e instrução complementares necessárias ao pleno cumprimento do disposto nesta Lei Complementar. 20.
[312] Art. 161. Cabe à lei complementar:
21. I - definir valor adicionado para fins do disposto no art. 158, parágrafo único, I; 22. II - estabelecer normas sobre a entrega dos recursos de que trata o art. 159, especialmente sobre os critérios de rateio dos fundos previstos em seu inciso I, objetivando promover o equilíbrio sócio-econômico entre Estados e entre Municípios; 23. III - dispor sobre o acompanhamento, pelos beneficiários, do cálculo das quotas e da liberação das participações previstas nos arts. 157, 158 e 159. 24. Parágrafo único. O Tribunal de Contas da União efetuará o cálculo das quotas referentes aos fundos de participação a que alude o inciso II.
[313] Para maiores informações, consultar cartilha elaborada pela Secretaria do Tesouro Nacional: http://www.tesouro.fazenda.gov.br/documents/10180/329483/pge_cartilha_fpm.p [314] Nota técnica do IPEA disponível no seguinte endereço eletrônico: http://ipea.gov.br/agencia/images/stories/PDFs/2009_nt015_agosto_dimac.pdf
[315] LUCIARA LIMA SIMEÃO MOURA, Promotora de Justiça, graduada pela UFPB e Universitè de Poitiers,
Especialista em Ciencias Penais e em Criminologia Segurança Pública. [316] Curso de Direito Penal – Legislação Penal Especial, p. 586. [317]
Crimes
Tributários
–
Aspectos
Criminais
e
Processuais, p. 88.
[318]
Segundo Luiz Flávio Gomes, “sem se verificar o efetivo dano fiscal, não resulta perfectibilizado o crime. O resultado naturalístico exigido (supressão ou redução patrimonial do erario público), portanto, é parte integrante do tipo. Sem ele não há que se falar em delito fiscal consumado”.
[319]
Assim deve ser entendida a expressão contida no caput “crime da mesma natureza”, isto é, também crime contra a ordem tributária. Há quem advogue a tese de que pela expressão “mesma natureza”, os crimes do art. 2º seriam também crimes materiais em que seria necessária a presença do resultado naturalístico mediante a supressão ou redução do tributo. Tal posicionamento não é majoritário, entretanto. As sanções penais bem mais brandas aponta nessa direção, além de que as condutas elencadas nesse artigo não se revestem de gravidade como as do artigo precedente.
[320]
CP. Excesso de exação (Redação dada pela Lei n.º
8.137/90) Art. 316. § 1º - Se o funcionário exige tributo ou contribuição social que sabe ou deveria saber indevido, ou, quando devido, emprega na cobrança meio vexatório ou gravoso, que a lei não autoriza: Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa. § 2º - Se o funcionário desvia, em proveito próprio ou de outrem, o que recebeu indevidamente para recolher aos cofres públicos: Pena reclusão, de dois a doze anos, e multa.
[321]
CP. Art. 314 - Extraviar livro oficial ou qualquer
documento, de que tem a guarda em razão do cargo; sonegá-lo ou inutilizá-lo, total ou parcialmente: Pena - reclusão, de um a quatro anos, se o fato não constitui crime mais grave. Art. 316 - Exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida: Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa. Art. 317 - Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa Art. 321 – Patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a administração pública, valendo-se da qualidade de funcionário. Pena: detenção, de 1 a 3 meses, ou multa.
[322] CF/88. Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: (…) III – serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em Lei Complementar. [323] A lista é bastante extensa e traz mais de cento e vinte serviços, motivo pelo qual perdeu a importância o debate sobre seu caráter taxativo ou exemplificativo, considerações que faziam sentido na legislação anterior que trazia uma lista tímida de serviços.
[324]
Emenda Constitucional 37/2002 fixou a alíquota mínima de 2% para o ISS, com objetivo de combate à guerra fiscal entre Municípios
[325] A obrigação principal, por seu turno, é o pagamento propriamente dito do tributo devido, acrescido de juros e multa. [326] Dos crimes contra a ordem tributária, p. 103 25. [327] Auditor-fiscal da Receita Federal do Brasil. Mestre e Doutorando em Direito. Professor de Teoria Geral do Estado, Direito Administrativo e Direito Tributário da Universidade Estadual da Paraíba (
UEPB), do Centro Universitário de João Pessoa e da Escola Superior da Magistratura ( ESMA - PB). Palestrante em temas de Direito e legislação tributária. É autor de Direito Tributário: Teoria e prática, Revista dos Tribunais, 864, 2015.
[328] Veja-se que no Imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana (IPTU), Imposto territorial rural (ITR) e Imposto sobre a propriedade sobre veículos automotores (IPVA ), impostos de fatos geradores continuados, a lei sempre indica o momento da ocorrência do fato gerador, o que, nesses três impostos, normalmente, é primeiro de janeiro de cada ano.
[329] RESP 252.114/PR, 2 turma, j.17.10.2002, rel. Min. Francisco Peçanha Martins, DJ 02.12.2002. [330] STJ, Resp 1.245.310/MG, 2 T, J. 19.05.2011, rel. Ministro Humberto Martins, DJe 25.05.2011. [331] DUARTE, Francisco Leite. Direito tributário: teoria e prática, 2 ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p.610/643. [332] Art.3º do CTN. [333] Questionamento neste sentido ocorreu na revogação da isenção da COFINS, instituída pela Lei complementar nº 70/1991(art.6,II) pelo art.56 da Lei ordinária nº 9.430/1996.
[334]
Disponível em http://www8.receita.fazenda.gov.br/SimplesNacional/Perguntas/Perguntas.aspx.A em 14/09/2015.