Amazonia

  • May 2020
  • PDF

This document was uploaded by user and they confirmed that they have the permission to share it. If you are author or own the copyright of this book, please report to us by using this DMCA report form. Report DMCA


Overview

Download & View Amazonia as PDF for free.

More details

  • Words: 3,257
  • Pages: 14
A R Q U E OLO G I A NA A M A Z Ô N I A

POR MÔNICA TRINDADE CANEJO E MAURÍCIO DE PAIVA, de Iranduba

FOTOS MAURÍCIO DE PAIVA

AMAZÔNIA O caboclo de hoje perpetua a lida milenar de seus antepassados na floresta e reflete...

Arqueólogos de ponta desembarcam na floresta, desvendam um passado

32

TERRA

88985_Amazonia_G402_JC

32

15/10/07, 23:42

r

A R Q U E OLO G I A NA A M A Z Ô N I A

POR MÔNICA TRINDADE CANEJO E MAURÍCIO DE PAIVA, de Iranduba

FOTOS MAURÍCIO DE PAIVA

AMAZÔNIA O caboclo de hoje perpetua a lida milenar de seus antepassados na floresta e reflete...

Arqueólogos de ponta desembarcam na floresta, desvendam um passado

32

TERRA

88985_Amazonia_G402_JC

32

15/10/07, 23:42

r

o

a.C. ...um passado pouco conhecido, como o exposto nesta urna funerária da fase Guarita

repleto de cidades e mudam a história da pré-história do Brasil 88985_Amazonia_G402_JC

33

15/10/07, 23:43

TERRA

31 33

A R Q U E OLO G I A NA A M A Z Ô N I A

HIERARQUIA E BANQUETES “A cerâmica é a maldição dos arqueólogos.” A frase, chacota entre pesquisadores, brinca com o fato da onipresença do material em todo lugar que se faça arqueologia. A cerâmica brota das profundezas. No caso da Amazônia, onde as ocupações humanas podem passar dos 10 mil anos, ela aparece da Ilha de Marajó ao Equador. Estudar seus desenhos e formatos ajuda a entender a organização e até a mitologia das antigas sociedades. Diferenças na decoração de urnas funerárias indicam hierarquia. Pratos grandes, às vezes com restos de alimentos, levam a crer em banquetes. Na Amazônia Central e arredores, os pesquisadores acharam cerâmicas com mais de 2 mil anos de vida. Nas páginas a seguir, um mergulho por um Brasil oculto e desconhecido pelos próprios brasileiros.

ˆ As ocupações humanas na Amazônia são divididas em quatro fases, de acordo com o tipo de cerâmica encontrada

FASE

PERÍODO

Açutuba

300 a.C. a 400 d.C.

Manacapuru

400 d.C. a 900 d.C.

Paredão

700 d.C. a 1200 d.C.

Guarita

900 d.C. a 1500 d.C.

Legítimos guardiões de um mundo ainda em processo de descobrimento, os caboclos

34

TERRA

88985_Amazonia_G402_JC

34

15/10/07, 23:44

a

s

assumem os cuidados com os tesouros milenares desenterrados sob os seus pés 88985_Amazonia_G402_JC

35

15/10/07, 23:44

TERRA

33 35

A R Q U E OLO G I A NA A M A Z Ô N I A

om seu olhar claro, misto de melancolia e espírito renovado, Jennifer Brennon bate na porta do quarto e pergunta se pode participar da reunião dos arqueólogos. Entra, mistura-se aos presentes com naturalidade e senta-se como quem teve um dia duro. Paira no ar o silêncio e a sensação acolhedora de conforto, tanto dos pesquisadores atrelados a bochinchos científicos quanto por parte dela própria ao revelar-se aliviada. No momento em que espia o retrato emoldurado do finado arqueólogo de camisa xadrez, a viúva pega uma bebida destilada e, num trejeito de brinde, saúda a notícia do dia, atestada pelo Tribunal do município de Iranduba, a 25 quilômetros de Manaus. Saiu a sentença dos assassinos do marido: 29 anos de prisão para os quatro arrependidos. Nessa hora, assistindo à cena, perguntamos se nossos ancestrais indígenas também ritualizavam a justiça há mais de 2 mil anos como esses pesquisadores sentados no quarto da grande casa alugada em Manaus. Havia nas numerosas aldeias do Amazonas pré-colonial a noção de crime e castigo? De redenção e punição? Pensar em questões como essas era uma das tarefas de James B. Petersen, o arqueólogo norte-americano morto há dois anos durante um assalto em um restaurante na beira da estrada entre Manaus e Manacapuru. Junto com Eduardo Góes Neves, do Museu de Arqueologia e Etnologia da USP (MAE), e Michael Heckenberger, da Universidade da Flórida (EUA), Petersen criou em 1995 o Projeto Amazônia Central (PAC), responsável pela localização de mais de uma centena de sítios arqueológicos. Fora o trágico fim de Petersen, os pesquisadores estive-

C

ram envolvidos em situações que deixariam com água na boca os exploradores mais ousados. Caminhos improváveis na floresta, viagens de canoas em imensas estradas de água, noites dormidas em redes sob rasantes de insetos assustadores e uma ou outra picada de cobra apareceram na volta ao passado traçada pelo PAC. Mas fique claro que a intenção do projeto não é a aventura. É ciência. A busca é unificar as pesquisas em torno de seu próprio Santo Graal: encontrar vestígios de grandes e complexas ocupações humanas na Amazônia. Eduardo é categórico: “Grandes ocupações existiram na Amazônia. A questão é entender como elas funcionavam”. Aqui abrimos parênteses para explicar ao leitor porque isto é tão relevante. Lá pela década de 40, e por muitos anos, então, a idéia de a Amazônia ser densamente habitada era carta fora do baralho. A justificativa dos céticos cientistas – notadamente Betty Meggers e Cliford Evans, até hoje duas das mais importantes referências para os pesquisadores – era de que a baixa fertilidade do solo não permitiria o florescimento da agricultura, e a falta de caça de grande porte tornava escassa a oferta de proteína animal. Sem agricultura e sem carne, não haveria jeito de “desenvolvimento”. Segundo a tese, existiriam, no máximo, pequenos grupos nômades que pelejavam por comida e praticavam o extrati-

No meio da floresta, o topógrafo norte-americano Morgan

9000 a.C.

6500 a.C.

Data provável das primeiras ocupações na Amazônia

36

Data do mais antigo artefato encontrado na Amazônia, a ponta da flecha de sílex, escavada por James B. Petersen no Sítio Dona Estela

vismo conforme as cheias dos rios. Indícios inegáveis, coletados nas últimas décadas, no entanto, dão conta de afloramentos demográficos com grandes núcleos habitacionais. Os antigos habitantes da Amazônia caçavam, pescavam, colhiam vegetais e, sim, eram agricultores – pilotavam, principalmente, roças de mandioca, raiz rica em amido e fácil de armazenar por períodos longos, se devidamente beneficiada e transformada em farinha. Soa familiar? Apesar de estarmos falando de datas que podem passar dos 2 500 anos, isso não difere do cotidiano do caboclo de hoje. É esse homem que, ao capinar sua roça, tropeça em fragmentos de cerâmica arqueológica, sem

6000 a.C. Início da domesticação das plantas na Amazônia

5000 a.C. Data das cerâmicas mais antigas no Baixo Amazonas

TERRA

88985_Amazonia_G402_JC

36

15/10/07, 23:44

500 a.C. Mudanças de padrão de organização social, econômica e política

Sc

Uma canoa flutua por um afluente do Rio Solimões rumo ao Sítio de Laguinho

Schimidt solta a ousada sentença: “Este lugar foi habitado por gente muito interessante”

Depois de desenterrar esta lâmina de machado feita de pedra, material raro na região, os arqueólogos colocam o mosquiteiro nas redes para garantir o sono

800 a 900

1500

Aumento da densidade populacional

Chegada dos primeiros europeus, que se encontram com os guaritas

1880 Primeiras escavações na Amazônia

1940 Início das pesquisas de Betty Meggers e Cliford Evans

1995 Início do Projeto Amazônia Central (PAC)

TERRA

88985_Amazonia_G402_JC

37

15/10/07, 23:45

37

A R Q U E OLO G I A NA A M A Z Ô N I A

ter a exata noção de seu valor. O caboclo do Amazonas – que, diga-se, não costuma ler livros de arqueologia – também parece ignorar a já superada hipótese de que o seu ambiente é inapropriado para grandes populações. Seguem em sua lida diária na floresta e na várzea, obedecendo à ordem divina do “crescei e multiplicai” – afinal, a Bíblia eles devem ler.

Mamoal mágico “Há três dias que a chuva dá as cartas”, comenta alguém entediado enquanto lê um artigo sobre cerâmicas na tela do laptop. A tempestade perdurou de fato durante dias e um raio derrubou uma árvore no meio da estrada que leva ao Sítio Arqueológico Laguinho, próximo à calha do Solimões, perto da cidade de Iranduba. Como é domingo, dia de futebol, os ribeirinhos ficaram de fora da desobstrução do caminho, em uma força-tarefa proposta pelo arqueólogo Márcio Castro, coordenador dos trabalhos de escavação no local – onde funciona um “sítio escola” para mais de 40 pesquisadores. A Kombi se abarrotou com 14 deles munidos de dois machados emprestados. Márcio foi o primeiro a cansar os músculos. Raoni, com um grande golpe e pés na lama, o segundo. Pupunha suou em seguida. Levemylson, amazonense de alcunha “Delegado”, abateu a tora de uma vez por todas. A união fez a força e garantiu a liberação do ramal, como os locais chamam a estrada. Para Eduardo, a intempérie também foi motivo para puxar conversa com o caboclo. “Pedro, e essa chuva, foi boa para o mamão?” Pedro Gomes

Dias é o proprietário das terras onde estão sendo feitas escavações e anda preocupado com a condição da estrada. “É boa para os mamões, só que ruim para o ramal”, respondeu. Filho de nordestinos migrantes, neto de peruano, Pedro é um exemplo do modo de vida local. Tem cabeças de gado, pesca no igapó e constrói sua casa com madeira nativa. A produção de mamão é sua principal atividade. Quando o ramal está impedido, por conta da chuva ou pela queda de uma árvore, a alternativa é a tradicional canoa. A área é um conjunto de elevações milenares construídas pelo homem com terra e cacos de cerâmica e chamadas pelos arqueólogos de montículos. Foram erguidas num longínquo passado para prevenir cheias, defender aldeias ou demonstrar poder. Sob as raízes da plantação, uma terra escura e fértil batizada de Terra Preta (veja quadro abaixo) esconde respostas para as intrigantes perguntas dos pesquisadores. “Tudo revela 1 800 anos de ocupação com um ápice no fim do primeiro milênio”, pensa alto Marcio, no meio do sítio. “Os indígenas atuavam nestes montículos como lugar de ritual e para demonstrar poder”, diz. Os arqueólogos iniciam seu balé. Espátulas e pincel em punho, ficha de registro e trena ao alcance das mãos. Escavam centímetro a centímetro, abrem perfis, peneiram a terra, observam cada detalhe. Logo cedo, o sol já torra a pele de quem vem de terras mais frescas (como São Paulo, Milão ou Quebec) e não ousa dispensar chapéu e protetor solar. Não há queixas. “Escavar é o fetiche de todo arqueólo-

O sol torra a pele, mas os arqueólogos iniciam seu balé: pincéis

TERRA PRETA: SINAL DE GENTE Um dos principais objetos de estudo da arqueologia na Amazônia é a presença de um solo batizado de Terra Preta. O acúmulo de dejetos orgânicos e restos de carvão de fogueiras transformaram o solo original numa mancha escura de dezenas de hectares. Fértil e com pH quase neutro, atraiu novos moradores, que deixaram ali mais material orgânico, como cascas de frutas, ossos de animais e cadáveres, tornando-a ainda mais fértil. É uma sucessão de depósitos através dos séculos. Sua presença no local, que pode chegar a 4 mil anos, é indicativa de habitações de grupos sedentários e agricultores. Ali, jazem os sinais indispensáveis para se compreender os hábitos dessas populações. A Terra Preta mantém seu magnetismo até hoje, atraindo agricultores por conta de sua fertilidade. Material orgânico, como ossos, cadáveres e restos de frutas, forma a instigante Terra Preta

38 36

TERRA

88985_Amazonia_G402_JC

38

15/10/07, 23:46

e

s

Vasilha de cerâmica restaurada encontrada no Sítio Lago do Limão, à beira do Rio Negro

e espátulas em punho, e um desejo de viajar para um passado ainda obscuro go”, diz Bernardo, um jovem mineiro cuja base de pesquisa é a Reserva de Mamirauá, a 36 horas de barco da capital amazonense, de onde já identificou mais de 200 urnas funerárias. “Prefiro esta parte da arqueologia a ficar anotando os registros. Gosto de suar debaixo dessa lona preta e sarcástica”, afirma enquanto os trabalhos ao seu redor desvendam mistérios e soterram qualquer ceticismo sobre a existência ou não de núcleos habitacionais na Amazônia. Os pesquisadores trazem à tona depósitos de dejetos, artefatos e ossadas de animais, talvez abatidos como oferenda.

Pedra nunca houve Montículos abaixo, há dois pequenos portos que podem ter feito o papel de embarcadouro há cerca de 2 mil anos. Caminhando por onde teriam caminhado os antepassados amazônicos, passamos por uma casa de farinha. Para olhos leigos, é um espaço semelhante a tantos outros por aquelas bandas. Mas olhos mais treinados conseguem mirar o passado. O norte-americano Morgan Schimidt observa atento à topografia e vislumbra paisagens que só seus olhos reco-

nhecem. Especialista em solos e pesquisador no Xingu, Morgan enxerga uma majestosa praça no centro do mamoal. No local onde florescem pés de limão, imagina uma grande casa. O arqueólogo traça ainda os caminhos de acesso ao porto. Segundo os pesquisadores, a enseada assistia à saída do excedente agrícola e da produção de cerâmica, permitindo o intercâmbio com outras aldeias. Morgan acredita que a organização espacial da cidade soterrada não era apenas funcional, mas também estética, como se houvesse a intenção de impressionar os vizinhos. “Aqui existiu uma aldeia complexa, um espaço com praças, casas comunais, quintais, lixeiras em forma de ferradura, centro religioso, portos, casa de banho, caminhos estratégicos...” Uma verdadeira cidade que deixou muito pouco de sua grandeza. Como estas, haviam outras, distribuídas por vários pontos da Amazônia. Objetos de pedra, utensílios de cerâmica e outros tantos resquícios de civilização dão conta do possível comércio entre elas, num trânsito que usava rios como estradas. O que não se pode calar, e às vezes parece sumir da mente TERRA

88985_Amazonia_G402_JC

39

15/10/07, 23:46

37 39

A R Q U E OLO G I A NA A M A Z Ô N I A

40

Sobre a Terra Preta, o caboclo plantou seu mamoal e faz o ritual com piras de fogo. TERRA

88985_Amazonia_G402_JC

40

16/10/07, 21:07

S

o.

Sob ela, segredos arqueológicos, como cadáveres, ossadas de animais e muita cerâmica TERRA

88985_Amazonia_G402_JC

41

16/10/07, 21:08

41

A R Q U E OLO G I A NA A M A Z Ô N I A

até dos pesquisadores, é que o objeto primordial a ser estudado é o ser humano. Nessa paisagem fantasma, muita gente circulava e reunia-se no rio. Desvendar sinais de uma casa, como um esteio de poste, seria coroar esses estudos não apenas porque edificações são raridades na arqueologia amazônica (afinal, não há pedra ali), mas porque daria suporte para se compreender mais sobre as pessoas que a construíram e nela moraram. “De repente, podemos encontrar a casa do pajé. Será que ele descia para nadar no igarapé e checar a pescaria?”, viaja Eduardo. As palavras de Morgan completam a especulação: “Este lugar, sem dúvida, foi habitado por gente muito interessante”.

ANTES E DEPOIS DE EDUARDO

A quantidade de urnas funerárias nos montículos faz os pesquisadores pensarem também nos motivos que levavam os habitantes à morte. A violência humana, tão antiga quanto qualquer civilização? A malária? A picada de uma cobra? Aliás, esta última hipótese fez suar frio o biólogo Leandro Cascon, o “Ceará”. A caminho de sua unidade de escavação, recebeu o bote da jibóia. Chamar o canoeiro, fazer o resgate, ser carregado até o atendimento... Tudo se calou em sua mente. “Deu um silêncio estranho no igapó. Não houve o luxo de pensar em angústia e morte naquele momento”, lembra. É o mito dos perigos amazônicos em nosso inconsciente. De fato, não era sua hora: apesar da mordida dolorida, a dentada da jibóia não é venenosa. Mas, enfim, começamos a falar de morte por conta das urnas funerárias. Só no Sítio Hatahara, em Iranduba, mais de 30 esqueletos foram encontrados. Os formatos das urnas, suas pinturas e seus apliques nos falam de uma cosmologia – uma relação com o natural e com o sobrenatural – esquecida, mas perpetuada nas faces de animais e pessoas. São deuses, santos de devoção, míticos heróis. Até hoje, a convivência com o sagrado parece não se desprender desses objetos desenterrados. “Foram feitos pela mão de Deus”, arrisca, sem a propriedade de um arqueólogo, mas cheio de

O caboclo Amâncio diz ao arqueólogo: Eduardo Góes Neves desvenda o passado no Sítio Escola Hatahara

Com letra miúda, o professor Eduardo Góes Neves, 42 anos, espalha datas, nomes, conceitos e flechas pelo quadro-negro. “Arqueólogos adoram flechas”, diz. A mão na cintura, o cabelo sempre um pouco despenteado e um humor irônico, Edu, como é chamado por alunos e colegas, versa de Darwin a Aziz Ab’Sáber, da Lingüística à Antropologia. Em campo, solta o inglês, para a compreensão dos estrangeiros sempre presentes em suas imersões na Amazônia. Em 2006, durante escavações no Sítio Hatahara, era ele quem dirigia a Kombi branca até uma bela vista do Lago de Iranduba. Nos tropeços de chão batido, contava sobre sua amizade com James Petersen, saía do carro, abria uma porteira, apontava uma área de montículos, lembrava a picada de cobra que levou no Alto Rio Negro e que quase lhe rendeu a morte em 2001. Intercalava e conectava pensamentos numa velocidade bem maior que o nosso deslocamento na Kombi. Com mestrado e doutorado pela Universidade de Indiana (EUA), idealizador e coordenador do Projeto Amazônia Central, o paulistano está sempre dentro quando o assunto é arqueologia. Seus alunos o classificam como “brilhante”. É fácil entender o adjetivo: ele representa uma geração de pesquisadores que modificou o modo como se pensa a pré-história do Brasil. “Somente a intensa pesquisa de campo pode trazer verdades à tona”, diz. Não se intimida em rever teorias de papas da arqueologia, como Betty Meggers, Clifford Evans e Anna Roosevelt. Valorizou a multidisciplinaridade: nas empreitadas terra abaixo, une geógrafos, geólogos, antropólogos, etnólogos, botânicos, lingüistas e quem mais tiver algo a oferecer. Quem conhece o assunto não crê ser exagero dizer que a arqueologia brasileira se divide entre antes e depois de Eduardo.

40 42

fé, Geraldo da Costa Franca, exímio artesão em madeira residente em Santa Rita da Valéria, em Parintins.

Chuvas e caretinhas Geraldo aproveita a atenção que lhe é dada para tocar num ponto delicado do PAC. “Esse pessoal pesquisa, pesquisa e nunca dá um resultado certo”, reclama, sem saber patavina do que emerge do solo amazônico. A culpa, claro, não é dele. Afinal, o que está sendo feito para que o atual morador da Amazônia se intere e entenda o porquê desse boom arqueológico? Nem todos sabem, por exemplo, que todo e qualquer objeto encontrado é propriedade da União e que vendê-lo é crime. “É preciso repensar o modo como as instituições relacionam-se com os moradores”, afirma Maria Tereza Parente, do Museu de Arqueologia e Etnologia da USP. “Não podemos nos apropriar das leis patrimoniais criadas por nós sem ouvir o saber dos caboclos”, conclui. Bom exemplo da prática acontece em Santa Rita, no Projeto Baixo Amazonas, derivado do PAC. Um certo orgulho anima os moradores, que, estimulados pela doutoranda Helena Lima, da USP, fazem do contato com os tesouros arqueológicos algo misterioso, porém corriqueiro. Basta uma chuva forte para que aflorem fragmentos de urnas e apliques com faces desenhadas, apelidados de caretinhas.

TERRA

88985_Amazonia_G402_JC

42

15/10/07, 23:47



o:

Há milênios o pirarucu é fonte essencial de proteína para o caboclo amazônico

“Vivemos no presente, mas queria que me contassem a história das coisas do passado”

Escavação no Laguinho desvendados cacos de cerâmica outros indícios da passagem “ASítio cerâmica é a maldição arqueólogos.” Ae frase, espécie de inegáveis chacota entre pesquisa do homem

88985_Amazonia_G402_JC

43

16/10/07, 5:46

TERRA

43

RETRANCA

Depois de colher mandioca e recolher a rede malhadeira, ribeirinho retorna para casa sob o pôr-do-sol em afluente do Rio Negro

Antes da noite sem energia elétrica, o menino conta sobre assovios que quiseram lhe

44

TERRA

88985_Amazonia_G402_JC

Enquanto os pais suam no mamoal da família, a filha os espera em sua palafita de cores intensas na calha do Rio Solimões

44

15/10/07, 23:48

a

Related Documents

Amazonia
May 2020 9
Amazonia
October 2019 15
Amazonia
June 2020 10
Amazonia
November 2019 12
Amazonia Sustentavel
July 2020 9
Madeira Amazonia
June 2020 9