Entrevista CAROLINA VIANNA HOISEL
Tarsilla Alvarindo e Maria Garcia
“O diferencial da moda baiana está nas cores e estampas.”
A estilista fala sobre as características da moda baiana, como fez para se consolidar no mercado e quais as perspectivas de crescimento no setor.
A
baiana Carolina Vianna Hoisel, 32 anos, sempre teve dom para moda. Na infância costumava desenhar e criar roupas de bonecas, delas passou a vestir gente de verdade. Hoje, Carola, como é conhecida, é uma das estilistas mais requisitadas do mercado, inclusive por músicos e atrizes de prestígio nacional, como Jauperi e Samara Filipo. Como todo sucesso requer trabalho, inicialmente ela cursou desenho industrial na UFBA, mas logo percebeu que não era a melhor maneira para ser estilista e trancou o curso. Em 1999 partiu para o Rio de Janeiro e ingressou no curso de Moda e Estilismo na Faculdade Estácio de Sá, onde também fez pós graduação em Marketing. Por ironia do destino, conheceu um baiano e voltou a Salvador. Aqui trabalhou um tempo criando coleções femininas em uma indústria local. Como não estava satisfeita, por não ter liberdade de criação, tomou coragem, pediu demissão e criou a própria marca, Carola Hoisel. Seu talento logo foi reconhecido: no ano passado, Carola foi uma das três finalistas do concurso “Novos Talentos”, do Barra Fashion. Nessa entrevista Carola fala da sua experiência com a moda e sua visão sobre o mercado na Bahia, as dificuldades encontradas pelos novos estilistas e as alternativas para alavancar o mercado local. Quando optou pela formação em moda você teve que ir para o Rio de janeiro, porque na Bahia não existia cursos na área. Hoje três faculdades em Salvador já oferecem esses cursos. Como você vê a importância deles para o mercado de moda baiano? Super importante. Antigamente, quem fazia a FACOM | 8 de OUTRUBRO, 2009 | 5
Fazemos moda pra vender, não adianta fazer moda apenas para mostrar. Não dá para ter idéias mirabolantes, porque não vai ter um consumidor final
Entrevista
CAROLINA VIANNA HOISEL
moda, fazia de maneira empírica, batendo a cabeça. A faculdade te dá um know how , um caminho. Te ensina como fazer sem errar tanto. As pessoas pensam que o estilista só precisa desenhar e fazer modelinho. Isso não é verdade. Tem um processo que você tem que fazer antes de chegar ao produto final que é complicado. As faculdades ajudam nisso. A chegada desses cursos ajudou a mudar o conceito de “futilidade” que se tinha de moda? As pessoas valorizam mais, vêem a profissão como qualquer outra. Essa ‘futilização’ da moda acabou. É necessário usar roupa, você não anda pelado. Por que não comprar uma roupa bonita e andar na moda? Quando digo andar na moda não é somente usar porque é tendência, mas ver as tendências que estão de acordo com o seu estilo, com a sua personalidade.
Deveria ter mais eventos, como feiras especializadas. As realizadas aqui em Salvador, só comportam gente de fora. Quem produz aqui não tem espaço para participar preparada para, a partir daí, seguir a carreira. É preciso saber fazer bem feito. Isso faz com que as pessoas corram atrás de uma profissionalização para crescer.
No cenário local existem apenas dois grandes eventos de moda: a Semana Iguatemi de Moda e o Barra Fashion. E poucas publicações direcionadas a área. Falta investimento ou o mercado ainda não oferece uma demanda para que surjam novas publicações e eventos? No ano passado você foi uma das fiFalta um pouco de material, não de nalistas do concurso “Novos Talentos”, interesse. Ou talvez exista matedo Barra Fashion. Como avalia esse rial, mas muita gente é anônima. tipo de evento para sua carreira e para De repente até falte eventos abertos o mercado baiano como um todo? para novos estilistas. Existem alguns O ponto principal de entrar no conalternativos, a exemplo do Bazar dos curso é a visibilidade. Você entra, Nômades. Poderiam existir eventos sai na mídia, te chamam para fazer menos ‘alternativos’, que ajudassem entrevista e as pessoas te vêem de na divulgação do trabalho de pequeoutra forma. Tem gente muito boa nas indústrias também. por aí, mas ninguém sabe que existe. O Barra Fashion é uma oportunidade Você resolveu criar sua própria marca de abrir as portas, ficar conhecido, porque não se sentia a vontade para mostrar o seu trabalho, conseguir ousar nas suas criações na empresa contratos e fechar bons negócios. onde trabalhava. E hoje, você tem liberEsse tipo de eventos é rigoroso dade total? O público baiano aceita na seleção do candidato. Eles não peças mais diferentes? vêem só o estilo, a criação, mas o Tento fazer tudo ao meu estilo, mas acabamento. Vêem se a pessoa está há preocupação com o comercial FACOM | 8 de OUTRUBRO, 2009 | 6
também. É muito difícil para o estilista que tem o seu próprio estilo ficar criando coisas que não gosta, que não acredita naquilo. Em outras capitais, como São Paulo, Rio e Belo Horizonte, os estilistas conseguem ousar mais, porque a população consome. Aqui as mulheres ainda são muito tradicionais. Você também não pode ir muito além, criar demais, ser muito moderno, senão não tem público para consumir esse produto. Fazemos moda pra vender, não adianta fazer moda apenas para mostrar. Não dá para ter idéias mirabolantes, por que não vai ter um consumidor final. As pessoas se preocupam muito com o que os outros vão pensar. Mas isso até que está mudando, as pessoas estão aderindo à moda mais arrojada de maneira gradual. Em quanto tempo você conseguiu se firmar no mercado? Eu comecei devagarzinho, em outubro de 2005 comprando matéria prima, produzindo e vendendo para pagar as despesas. Fiquei pé no chão. Eu tive a sorte de fazer bons contatos de lojas conceituadas em Salvador. Daí já comecei a ser bem vista. Não demorou muito e a crítica foi muito boa. Sabemos que seu nome está em crescimento na área. Você encontrou dificuldades em termos de mão de obra qualificada? E a aceitação pelos críticos de moda locais? A principal dificuldade é a mão de obra e matéria-prima. Você tem que viajar para conseguir material. E não temos mão-de-obra de qualidade, aqui existem poucas modelistas, costureiras e cooperativas. Há profis-
sionais, mas a maioria já trabalha para grandes fábricas. Assim fica difícil para quem está começando. A competitividade está no preço. Conseguir um preço razoável com um acabamento bom é muito difícil. Pior é enfrentar as grandes empresas que tem o custo menor. Às vezes você tem a mesma qualidade, mas as pessoas dão valor ao que está na revista. Há espaço para novos estilistas no mercado? Acho que existe espaço. O mercado está crescendo, aparecendo agora, tem espaços para novos estilistas. Deveria ter mais eventos, como feiras especializadas. As realizadas aqui em Salvador, só comportam gente de fora. Quem produz aqui não tem espaço para participar. O que um novo estilista deve fazer para mostrar seu trabalho? E como continuar em evidência? Primeiro tem que encarar um concurso desses como o Novos Talentos ou, se o estilista tiver condição, bancar um desfile, um evento. Tem que estar no “metiê”. Para se manter tem que trabalhar direito e ser profissional. Sempre tentar divulgar de alguma forma: mídia, internet, ter uma boa assessoria de imprensa, para está sempre na mídia. Fazer sempre novidade, desenhos, coquetéis... Para os pouco entendidos no assunto, o que parece é que para um estilista fazer sucesso é preciso que siga o padrão do que é feito no eixo Rio - São Paulo. Você concorda? Não, de jeito nenhum. Ao contrário. Se o estilista mostra um estilo
Aqui se mostra mais o corpo. A moda baiana tem um apelo sensual. Se for comportadinho, não vende. Se for bege, não vende. É isso que vejo na moda baiana próprio, um jeito diferente de fazer, eles fazem sucesso. Hoje em dia é tudo igual, é cópia, muitos copiam estilos vistos na novela e dizem que é ser estilista. Eu não acho que isso é ser estilista. Temos vários estilistas baianos como Luciana Galeão, Márcia Ganem, Vitorino Campos com estilos totalmente próprios e estão fazendo sucesso e longe de imitarem o estilo Rio - São Paulo. Você acredita na singularidade de uma Moda Baiana? Como ela se caracteriza? Existe uma singularidade sim. O diferencial da moda baiana está nas cores e estampas. O baiano é um povo muito alegre. Existe essa diferença. Eu viajo bastante, vou a outros estados e vejo como a baiana gosta de decote, estampas e cores. Aqui se mostra mais o corpo. A moda baiana tem um apelo sensual. Se for comportadinho, não vende. Se for bege, não vende. É isso que vejo na moda baiana. Como você mesma citou, o mercado baiano tem lançado alguns nomes no mercado nacional e até internacional. Qual a importância de vocês, novos estilistas, para alavancar uma moda
genuinamente baiana? A importância do nosso trabalho é mostrar aos estudantes de Moda, quem está começando a entrar no mercado de trabalho, que dá para seguir adiante. Existem estilistas que estão dando certo. É importante, para quem estuda, quem quer seguir carreira ou atuar nas indústrias de tecido e aviamentos, ver que tem mercado. É difícil fazer moda aqui. Temos sempre que comprar material fora. Isso atrai as indústrias de tecido e aviamentos a chegar aqui. E ver que tem consumidor. Movimenta a economia também. Dê um breve panorama da situação atual da moda na Bahia e o que fazer para melhorar? Não posso dizer que o mercado é fácil. Existe um mercado sim. Ele está crescendo muito, inclusive em Salvador, e as pessoas estão ficando cada vez mais interessadas por moda. No Brasil, sempre foram São Paulo e Rio de Janeiro os pólos da moda. Com a globalização, a internet, a facilidade de informações, as pessoas estão mais ligadas e antenadas a moda, estão pedindo e querendo também. Antigamente a moda demorava a chegar aqui. Lançava em São Paulo e só chegava tempos depois. Quando as pessoas já estavam cansadas lá, começavam a usar aqui. Agora está tudo no mesmo time. Hoje em dia as pessoas estão mais exigentes como consumidoras. E a partir daí começaram a surgir novos profissionais pra atender essa demanda. A gente não está nos melhores momentos, falando de consumo. Falando em termos de criação, tudo que existe para divulgar ajuda muito. FACOM | 8 de OUTRUBRO, 2009 | 7