Texto - Jogue Fora Sua Vaquinha

Jogue fora sua Vaquinha...

Diz a fábula que um profeta vivia com seu discípulo caminhando pelo mundo levando suas verdades. Certo dia, num país longínquo, aproximaram-se de um casebre de madeira, no alto de uma colina, com o objetivo de pedir abrigo para o pernoite. Reparou o profeta que aquele era um lugar especial. Natureza exuberante, um rio correndo próximo, clima ameno. Apesar disso, não havia plantação ou criação de animais ao redor. Também não se via árvores frutíferas. O profeta e seu discípulo bateram e foram gentilmente acolhidos por um homem magro e envelhecido, olhar caído, sem brilho. A família reunia-se para o jantar. Todos gentis, porém tristes e sofridos. O homem, chefe da família, convidou-os à mesa constrangido. Após a oração, serviu-se apenas um copo de leite a cada um. O chefe da família desculpou-se: “Caro peregrino vivemos tempos difíceis. Não há emprego. Não temos do que viver. Nossa única fonte de alimento é este leite dado pela nossa vaquinha que está pastando lá fora. Se o leite secar nem sei o que faremos.” O profeta pernoitou e pela manhã despediu-se abençoando àquela família. Ao afastar-se da casa, viu a vaquinha pastando. Muito magra, costelas à mostra e tetas fartas. Disse então ao seu discípulo: “João, aproxima-se daquela vaca e empurre-a naquele precipício.” João, muito espantado, mas sem ousar questionar seu mestre, fez o que lhe foi solicitado. A vaca caiu num brejo logo abaixo e morreu. O tempo correu. João sempre se lembrava daquele episódio. A dúvida e a angústia sempre o atormentavam. “Qual o sentido disto?” Perguntava a si mesmo, sem encontrar a resposta. Alguns anos depois, eles voltaram, o profeta e João, ao mesmo lugar longínquo, na mesma casa onde um dia se hospedaram. Encontraram um cenário bastante diferente. A casa era então de alvenaria e bem maior. Ao redor havia plantação, horta, pomar, criação de animais e até uma pequena fábrica de queijo e doces caseiros. Os membros da família, agora mais numerosa, estavam corados e com outro brilho nos olhos. O chefe da casa, tinha a cabeça erguida e um ar de homem realizado. Receberam-lhes com a mesma hospitalidade. Ofereceram-lhes, porém, no jantar uma lauta refeição. O pernoite se fez em camas confortáveis e limpas e em quartos separados. Ao amanhecer, quando se despediram, o profeta perguntou ao chefe da família o que havia mudado desde àquela época. Ao que o homem respondeu: “O senhor não sabe a tragédia que se abateu sobre nós pela época em que o senhor aqui esteve. Nossa vaca caiu do precipício e morreu no brejo. Ficamos desesperados e tivemos que buscar alternativas para não morrer de fome. Como bem podes ver, hoje dou graças ao ocorrido.” O profeta olhou João nos olhos e sorriu, adivinhando-lhe todos os anos de angústia. João agora entendeu tudo.