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ISBN 978-85-02-15537-4
Marcão, Renato Prisões cautelares, liberdade provisória e medidas cautelares restritivas / Renato Marcão — 2. ed. rev. e ampl., São Paulo : Saraiva, 2012. 1. Liberdade provisória 2. Medidas cautelares restritivas 3. Prisão cautelar I. Título. CDU-343.126
Índice para catálogo sistemático: 1. Prisões cautelares : Liberdade provisória e medidas cautelares restritivas : Direito processual penal 343.126
Diretor editorial Luiz Roberto Curia Gerente de produção editorial Lígia Alves Editor Jônatas Junqueira de Mello Assistente editorial Sirlene Miranda de Sales Produtora editorial Clarissa Boraschi Maria Preparação de originais Ana Cristina Garcia / Maria Izabel Barreiros Bitencourt Bressan / Camilla Bazzoni de Medeiros Arte e diagramação Cristina Aparecida Agudo de Freitas / Isabel Gomes Cruz Revisão de provas Rita de Cássia Queiroz Gorgati / Wilson Imoto Serviços editoriais Camila Artioli Loureiro / Elaine Cristina da Silva Capa Orlando Facioli Design Produção gráfica Marli Rampim Produção eletrônica Ro Comunicação
Data de fechamento da edição: 8-2-2012
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Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida por qualquer meio ou forma sem a prévia autorização da Editora Saraiva. A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na Lei n. 9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código Penal.
Sobre o Autor Membro do Ministério Público do Estado de São Paulo. Mestre em Direito Penal, Político e Econômico. Professor convidado no curso de pós-graduação em Ciências Criminais da Rede Luiz Flávio Gomes e em diversas Escolas Superiores do Ministério Público e da Magistratura. Membro do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), do Ministério da Justiça. Membro da Association Internationale de Droit Pénal (AIDP), do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim), do Instituto de Ciências Penais (ICP) e do Instituto Brasileiro de Execução Penal (IBEP).
À liberdade.
“Não haverá liberdade sempre que as leis permitirem que o homem deixe de ser pessoa e se torne coisa.” Cesare Beccaria
“Na realidade, quem está desejando punir demais, no fundo, no fundo, está querendo fazer o mal; se equipara um pouco ao próprio delinquente.” Evandro Lins e Silva
Abreviaturas Ac.— Acórdão Ap. –– Apelação Ap. Crim. — Apelação Criminal art.(s.) — artigo(s) Boletim IBCCrim —Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais Câm. — Câmara Câm. Crim. — Câmara Criminal Câm. Crim. Extr. — Câmara Criminal Extraordinária Câm. Esp. –– Câmara Especial Câm. Esp. Crim. — Câmara Especial Criminal Câm. Extr. –– Câmara Extraordinária c/c — combinado com CC — Código Civil CF — Constituição Federal CP — Código Penal CPP — Código de Processo Penal CTB — Código de Trânsito Brasileiro DE — Diário Eletrônico Des.(a.) — Desembargador(a) DJ — Diário da Justiça DJe — Diário da Justiça eletrônico DJE — Diário da Justiça do Estado DJU — Diário da Justiça da União DO — Diário Oficial DOE — Diário Oficial do Estado DOESP — Diário Oficial do Estado de São Paulo DOU — Diário Oficial da União ECA — Estatuto da Criança e do Adolescente EDcl — Embargos de Declaração Gr. Câms. — Grupo de Câmaras Gr. Câms. Crims. — Grupo de Câmaras Criminais Gr. da S. Crim. — Grupo da Seção Criminal HC — Habeas Corpus IBCCrim — Instituto Brasileiro de Ciências Criminais j. — julgado(a) JSTF — Julgados do Supremo Tribunal Federal JSTJ — Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça JTACrimSP — Julgados do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo
JTFR — Julgados do Tribunal Federal de Recursos JTJ — Jurisprudência do Tribunal de Justiça (ex-RJTJESP) JTRF — Jurisprudência do Tribunal Regional Federal JUTACrim — Julgados do Tribunal de Alçada Criminal LCP — Lei das Contravenções Penais LEP — Lei de Execução Penal LICC — Lei de Introdução ao Código Civil LOMN — Lei Orgânica da Magistratura Nacional LONMP — Lei Orgânica Nacional do Ministério Público MC — Medida Cautelar Min. — Ministro MS — Mandado de Segurança m.v. — maioria de votos OAB — Ordem dos Advogados do Brasil Pet. RHC — Petição em Recurso de Habeas Corpus Proc. — Processo Prof. — Professor R. — Região RBCCrim — Revista Brasileira de Ciências Criminais Rec. Crim. — Recurso Criminal RE — Recurso Extraordinário Rec. — Recurso RECrim — Recurso Extraordinário Criminal rel.(a.) — Relator(a) Rep. — Representação REsp — Recurso Especial RHC — Recurso de Habeas Corpus RI — Regimento Interno RJTJESP — Revista de Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo RMS — Recurso em Mandado de Segurança RO — Recurso Ordinário ROHC — Recurso Ordinário em Habeas Corpus ROMS — Recurso Ordinário em Mandado de Segurança RSE — Recurso em Sentido Estrito RSTJ — Revista do Superior Tribunal de Justiça RT — Revista dos Tribunais RTJ — Revista Trimestral de Jurisprudência RTJE — Revista Trimestral de Jurisprudência dos Estados RTJRS — Revista Trimestral de Jurisprudência do Rio Grande do Sul S. — Seção S. Crim. — Seção Criminal STF — Supremo Tribunal Federal STJ — Superior Tribunal de Justiça
T. — Turma TACrim — Tribunal de Alçada Criminal T. Esp — Turma Especializada TFR — Tribunal Federal de Recursos TJ — Tribunal de Justiça TP — Tribunal Pleno TRF — Tribunal Regional Federal v. g. — verbi gratia v.u. — votação unânime v.v. — voto vencido
Índice Abreviaturas
Nota à segunda edição
Nota à primeira edição Das prisões cautelares Disposições gerais: da prisão, das medidas cautelares e da liberdade provisória 1. Introdução 2. O novo art. 282 do CPP 3. Arts. 283 a 288 do CPP 4. Prisão a ser executada fora da jurisdição do juiz processante 5. Art. 289-A do CPP: cadastro de mandados de prisão em banco de dados no Conselho Nacional de Justiça 6. Fuga e prisão 7. Art. 300 do CPP 8. Prisão especial Quadro comparativo da legislação Prisão em flagrante 1. Nota introdutória 2. Prisão em flagrante 2.1. Excepcionalidade da prisão em flagrante 2.2. Prisão em flagrante no interior de residência 2.3. Infrações que admitem prisão em flagrante 2.4. Natureza jurídica 2.5. Sujeitos do flagrante 2.5.1. Sujeito ativo 2.5.1.1. Flagrante facultativo 2.5.1.2. Flagrante obrigatório ou compulsório 2.5.2. Sujeito passivo 2.6. Autoridade competente
3. Classificações 3.1. Flagrante em sentido próprio 3.2. Flagrante impróprio 3.3. Flagrante presumido 3.4. Flagrante preparado ou provocado 3.5. Flagrante forjado 3.6. Flagrante esperado 3.7. Flagrante prorrogado, protelado, retardado ou postergado 4. Flagrante em situações particulares 4.1. Flagrante em crime permanente 4.2. Flagrante em crime habitual 4.3. Flagrante em crime continuado 4.4. Flagrante em crime de ação penal pública condicionada 4.5. Flagrante em crime de ação penal privada 4.6. Flagrante nas infrações penais de competência dos Juizados Especiais Criminais 4.7. Flagrante estando o preso hospitalizado e/ou inconsciente 4.8. Apresentação espontânea do autor da infração penal 5. Formalização da prisão em flagrante 5.1. Lavratura do auto de prisão em flagrante 5.1.1. Prazo para a lavratura do auto de prisão em flagrante 5.1.2. Autoridade competente para a lavratura do auto de prisão em flagrante 5.1.3. Condutor 5.1.4. Testemunhas 5.1.5. Interrogatório 5.1.6. Escrivão 5.1.7. Infração penal praticada na presença da autoridade, ou contra esta, no exercício de suas funções 5.1.8. Nota de culpa 6. Recolhimento ao cárcere 6.1. Hipóteses em que o autuado “se livra solto” 6.2. Liberdade provisória mediante fiança 7. Comunicação da prisão: controle imediato 7.1. Controle jurisdicional 7.2. Controle ministerial 8. Prazo máximo de duração da prisão por força de flagrante 9. Uso de algemas Quadro comparativo entre os artigos relacionados com a prisão em flagrante, antes e depois da Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011
Prisão preventiva 1. Notas introdutórias 2. Conceito 3. Natureza jurídica 4. Constitucionalidade 5. Momento da decretação 6. Modalidades 7. Quem pode decretar prisão preventiva 7.1. Prisão preventiva obrigatória 8. Quem pode postular a decretação 8.1. Decretação ex officio 8.2. Requerimento do Ministério Público 8.3. Requerimento do querelante 8.4. Requerimento do assistente 8.5. Representação da autoridade policial 9. Requisitos para a decretação 9.1. Pressupostos 9.1.1. Prova da existência do crime 9.1.2. Indícios suficientes da autoria 9.2. Hipóteses de cabimento 9.2.1. Art. 313, I, do CPP: crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a quatro anos 9.2.2. Art. 313, II, do CPP: reincidência dolosa 9.2.3. Art. 313, III, do CPP: crime de covardia 9.2.4. Art. 313, parágrafo único, do CPP: dúvida sobre a identidade do agente 9.2.5. Descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares 9.3. Retroatividade benéfica 10. Circunstâncias autorizadoras 10.1. Garantia da ordem pública 10.2. Garantia da ordem econômica 10.3. Conveniência da instrução criminal 10.4. Assegurar a aplicação da lei penal 11. Decretação da prisão preventiva 11.1. Contraditório na decretação 12. Condição especial impeditiva da prisão preventiva 13. Conversão da prisão em flagrante em preventiva 13.1. Relaxamento da prisão em flagrante e imediata decretação da prisão preventiva
14. Decretação da prisão preventiva na sentença de condenação ou decisão de pronúncia 15. Art. 366 do CPP 16. Art. 23, caput, I, II e III, do CP 17. Necessidade de decisão fundamentada 17.1. Fundamentação inidônea 18. Prazo de duração da prisão preventiva 19. Revogação e nova decretação 20. Reação defensiva à decretação da prisão preventiva 21. Substituição da prisão preventiva por prisão domiciliar Quadro comparativo entre os artigos relacionados com a prisão preventiva, antes e depois da Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011 Regras relacionadas com a prisão preventiva Prisão cautelar domiciliar, substitutiva da prisão preventiva 1. Nota introdutória 2. Conceito 3. Pressuposto e hipóteses de cabimento 3.1. Pessoa maior de 80 anos 3.2. Pessoa extremamente debilitada por motivo de doença grave 3.3. Pessoa imprescindível aos cuidados especiais de menor de 6 anos de idade ou de pessoa com deficiência 3.3.1. Pessoa menor de 6 anos de idade 3.3.2. Pessoa portadora de deficiência 3.4. Gestante a partir do sétimo mês de gravidez ou sendo esta de alto risco 3.4.1. Gestação a partir do sétimo mês de gravidez 3.4.2. Gestação, a qualquer tempo, de alto risco 3.5. Necessidade de prova idônea 4. Quem pode requerer 5. Substituição ex officio 6. Momento em que pode ser concedida 7. Condições de permanência 8. Domicílio ou residência? 9. Pluralidade de residências 10. Momento de se conceder autorização de saída da residência 11. Descumprimento de condição do benefício 11.1. Descumprimento justificável 11.2. Sustação cautelar do benefício 11.3. Revogação definitiva
12. Detração 13. Preso que não tem defensor 14. Possibilidade de habeas corpus Quadro comparativo das regras Prisão temporária 1. Nota introdutória 2. Prisão temporária 2.1. Conceito 3. Cabimento 3.1. Imprescindibilidade para as investigações 3.2. Quando o indiciado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade 3.3. Quando houver fundadas razões, de acordo com qualquer prova admitida na legislação penal, de autoria ou participação do indiciado nos crimes arrolados no inciso III 3.4. Entendendo a aplicação das hipóteses de cabimento 4. Quem pode solicitar a decretação 5. Quem pode decretar 6. Decisão que aprecia pedido de prisão temporária 7. Procedimento 8. Prazo da prisão 8.1. Generalidade dos casos 8.2. Crimes hediondos e assemelhados 8.3. Término da prisão temporária 8.4. Excesso de prazo na prisão temporária 9. A prisão temporária comporta relaxamento ou liberdade provisória? 9.1. Relaxamento 9.2. Liberdade provisória 10. Reação defensiva à prisão temporária Quadro legal comparativo Prisão resultante de pronúncia ou de sentença condenatória recorrível 1. Introdução
2. Prisão resultante de pronúncia ou de sentença condenatória recorrível 3. Aspectos constitucionais 4. Legislação especial Quadro comparativo entre artigos do CPP, antes e depois da Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011
Da liberdade Relaxamento da prisão 1. Introdução 2. Relaxamento da prisão 3. Prisão temporária 4. Prisão em flagrante 4.1. Necessidade de fato típico 4.2. Nem todo fato típico autoriza prisão em flagrante 4.3. Necessidade de situação que legitime flagrante 4.3.1. Flagrante preparado ou provocado 4.3.2. Flagrante forjado 4.4. Lavratura do auto de prisão em flagrante 4.5. Prazo para a lavratura do auto 4.6. Autoridade competente 4.7. Comunicações da prisão em flagrante 4.8. Nota de culpa 4.9. Causas de exclusão da ilicitude 5. Prisão preventiva 5.1. Quem pode decretar 5.2. Decretação da prisão preventiva 5.3. Requisitos 5.4. Prazo da prisão preventiva 6. Habeas corpus 7. Consequências do relaxamento Quadro comparativo entre os artigos relacionados com relaxamento da prisão Liberdade provisória mediante fiança 1. Introdução 2. Liberdade provisória como gênero 3. Conceito 4. Natureza jurídica 5. Finalidade 6. Cabimento 6.1. Inafiançabilidade por imperativo constitucional 6.2. Inafiançabilidade conforme as regras do CPP 7. Quem pode postular 8. Quem pode arbitrar fiança
8.1. A autoridade policial 8.2. O juiz 8.3. Fiança junto aos Tribunais 9. Momento da concessão 10. Quem pode prestar fiança 11. Destinação da fiança 12. Obrigações do afiançado 13. Valor da fiança 14. Extinção da fiança 14.1. Fiança quebrada 14.1.1. Consequências do quebramento 14.2. Fiança perdida 14.3. Fiança cassada 14.4. Fiança sem efeito 15. Sentença no processo de conhecimento 15.1. Absolvição 15.2. Condenação 16. Fiança dispensada 17. Fiança reduzida e fiança aumentada 18. Fiança restaurada ou restabelecida 19. O Ministério Público e a fiança 20. Extinção da fiança libertadora e impossibilidade de retorno à prisão 20.1. Implicações da extinção 21. Reação defensiva Quadro comparativo da legislação Liberdade provisória sem fiança 1. Introdução 2. Liberdade provisória sem fiança como garantia constitucional 3. Conceito 4. Natureza jurídica 5. Quem pode postular 6. Quem pode conceder 7. Momento da concessão 8. Regulamentação do CPP 8.1. Art. 310 do CPP 8.1.1. Sobre o parágrafo único do art. 310 do CPP
8.2. Art. 321 do CPP 8.3. Art. 350 do CPP 9. A questão da vinculação da liberdade provisória sem fiança 9.1. A vinculação da liberdade provisória conforme o CPP 9.2. Reflexões sobre a prisão decorrente de revogação da liberdade provisória sem fiança 10. Decisão judicial sobre liberdade provisória sem fiança 10.1. A decisão que nega e seus fundamentos 10.2. A decisão que concede e seus fundamentos 11. Crimes hediondos e assemelhados 12. Tráfico de drogas. Art. 44 da Lei n. 11.343/2006 12.1. Breve retrospecto 12.2. O art. 44 da Lei de Drogas 12.3. O enfrentamento da questão no Supremo Tribunal Federal 12.4. A vedação à fiança não exclui a possibilidade de liberdade provisória sem fiança 12.5. Repercussões do art. 310 do CPP 12.6. Conclusão 13. Organizações criminosas 14. Crimes contra a economia popular e de sonegação fiscal 15. Revogação da liberdade provisória sem fiança Quadro comparativo da legislação Das medidas cautelares restritivas Medidas cautelares diversas da prisão 1. Introdução 2. Medidas cautelares diversas da prisão 3. Previsão legal 4. Conceito 5. Pressuposto 6. Cabimento 7. Quem pode decretar 8. Decretação ex officio 9. Quem pode postular a decretação 10. Momento da decretação 11. Critérios para a escolha e decretação da medida 12. Contraditório na decretação 12.1. Exceções ao contraditório prévio 13. Decretação
14. Substituição, revogação e nova decretação 14.1. Suspensão cautelar da medida 14.2. Ampla defesa e contraditório na revogação 14.3. Revogação de medida cautelar e decretação de prisão preventiva 14.4. Revogação de prisão preventiva e imposição de medida cautelar diversa da prisão 15. Modalidades de medidas cautelares diversas da prisão 15.1. Comparecimento periódico em juízo 15.2. Proibição de frequentar determinados lugares 15.3. Proibição de contato com pessoa determinada 15.4. Proibição de ausentar-se da comarca 15.5. Recolhimento domiciliar 15.6. Suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira 15.7. Internação provisória 15.8. Fiança 15.9. Monitoramento eletrônico 15.10. Proibição de ausentar-se do país 16. Fiscalização das medidas 17. Recurso contra a decisão que não acolhe pedido de decretação de medida cautelar 18. Reação defensiva contra a decretação 19. Prazo de duração e extinção da medida cautelar 20. Detração 21. Futuro das medidas cautelares diversas da prisão Quadro comparativo das regras
Referências
Nota à segunda edição De início é preciso enfatizar que esta obra não se restringe a comentar as alterações ao Código de Processo Penal impostas com a Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011. Ao contrário, por ser mais ambiciosa, trata em profundidade de todos os temas relacionados com os institutos que integram seu nome, e para constatação desta informação basta que se faça uma rápida consulta ao detalhado índice, onde se irá verificar o alcance das reflexões trazidas à apreciação do leitor. Tem por escopo prestar-se como fonte de estudo e consulta a todos os que buscam conhecer melhor os temas envolvidos, servindo indistintamente a estudantes e profissionais. Ao final de cada capítulo há quadro comparativo da legislação, indicando como era e como ficou após a vigência da Lei n. 12.403/2011. Há indicação de farta jurisprudência, especialmente do STF e do STJ, e em número menor, mas não menos significativo e importante, de outros Tribunais. Agradecemos a grande aceitação pelo público. A rápida vendagem trouxe a necessidade de adotar uma dentre duas opções possíveis: editar uma segunda tiragem da 1ª edição esgotada ou preparar uma segunda edição. Optamos pela segunda alternativa. Nesta segunda edição — revista e ampliada — apontamos divergências doutrinárias em relação aos temas mais controvertidos e reforçamos nossos argumentos anteriormente lançados, enfrentando, com o respeito de sempre, os argumentos em sentido contrário.
Nota à primeira edição Dados oficiais do Ministério da Justiça apontam que no final do ano 2010 o Brasil ultrapassou a marca dos quinhentos mil presos, passando a figurar em quarto lugar dentre os países que mais encarceram (1º Estados Unidos da América do Norte; 2º China; 3º Rússia), porém, em primeiro lugar, quando se tem em conta o percentual de crescimento da população carcerária nos últimos anos, já que o acréscimo nacional foi de cerca de 450%. Impulsionando os elevados números temos, além da violência crescente, que a todos incomoda, e isso muitas vezes em razão da ausência de políticas públicas inteligentes e efetivas que ofereçam alternativas aos jovens (o maior contingente da população carcerária é composto por jovens entre 24 e 29 anos), o endurecimento das leis penais nas últimas décadas. Destes fatores e de outros é que decorre o déficit atual de cerca de duzentas mil vagas no sistema penitenciário; não sendo demais lembrar que no País existem mais de quinhentos mil mandados de prisão aguardando cumprimento. A superlotação no regime fechado decorre também da falta de investimentos nos Estados, não só visando a criação de vagas no regime fechado, mas também no regime semiaberto, pois é cediço que, mesmo recebendo progressão para o regime semiaberto, em regra os condenados permanecem no regime fechado aguardando vaga para transferência, situação com a qual não compactuam as Turmas Criminais do Superior Tribunal de Justiça, conforme evidenciam suas reiteradas decisões a respeito do tema, até porque, nos termos do art. 3º da Lei de Execução Penal, “ao condenado e ao internado serão assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei”. Mas em regra é preciso ir até à referida Corte Federal para conseguir a melhor interpretação do dispositivo acima transcrito. Há mais. A média nacional de presos cautelares alcançou o inaceitável patamar de 44%, em verdadeiro paradoxo com o ideal constitucional, pois sabe-se que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória (art. 5º, LVII, da CF). A média mundial de presos cautelares gira em torno de 25% nos países democráticos. No Brasil, no início da década de 1990 o percentual de presos cautelares era de 18% e saltou, ao final de 2010, de forma expressiva, para os astronômicos 44%1. É evidente que algo não vai bem neste tema. É claro que estamos diante de flagrante distorção à regra constitucional da presunção de inocência ou não culpabilidade. Pois bem. Este é o quadro: violência crescente na maioria dos Estados; excesso na decretação de prisões cautelares; falta de investimentos suficientes e adequados com vistas à criação de vagas nos regimes fechado e semiaberto; permanência de condenados irregularmente no regime mais severo, quando já promovidos ou inicialmente condenados ao cumprimento de pena no regime intermediário. Estes são alguns dos principais motivos da superpopulação no regime fechado, cujas instalações, em regra, são péssimas e violam todas as garantias elencadas na Constituição Federal, na Lei de Execução Penal, nas Regras Mínimas para o Tratamento do Preso no Brasil, nas Regras Mínimas da
ONU para o Tratamento de Reclusos e em tantos outros diplomas normativos internacionais aos quais o Brasil se vinculou. Neste ambiente é que surgiu a Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011, que alterou sensivelmente o Título IX do Livro I do Código de Processo Penal. Referida Lei criou regras gerais para a aplicação das medidas cautelares pessoais, inclusive com contraditório prévio (arts. 282 e 283); desburocratizou o cumprimento de mandado de prisão e determinou a criação de um banco de dados pelo Conselho Nacional de Justiça visando o registro de mandados de prisão, e sempre que o autuado não informar o nome de seu advogado, sua prisão deverá ser comunicada à Defensoria Pública (arts. 284 a 300); foram feitos pequenos ajustes no art. 306, que trata da comunicação da prisão em flagrante aos familiares do preso ou à pessoa por ele indicada, ao Ministério Público e ao juiz, em respeito ao princípio do controle jurisdicional imediato (e desde então Ministerial também); o art. 310, I, II e III, passou a dispor que ao receber os autos de comunicação da prisão em flagrante o juiz deverá: relaxar a prisão; converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos legais e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão listadas no art. 319; conceder liberdade provisória, com ou sem fiança; foram feitas alterações significativas em relação às hipóteses de cabimento da prisão preventiva (art. 313), ressaltando seu caráter de medida excepcional; foi criada a prisão domiciliar, substitutiva da preventiva (arts. 317 e 318); também foram criadas medidas cautelares diversas da prisão (arts. 319 e 320); terminaram as hipóteses em que o autuado em flagrante “se livrava solto” e a regulamentação da liberdade provisória, com ou sem fiança, sofreu mudanças (arts. 321 a 350). Em linhas gerais foram estas as principais modificações, sendo inegável a relativa complexidade de compreensão dos novos temas e daqueles reformulados. Há que se reconhecer o mérito de alguns em relação à intenção de impor mudanças, mas não podemos deixar de anotar a tardança e as inaceitáveis imperfeições das regras levadas à sanção Presidencial. Seja como for, o que se espera é que estas novas regras determinem, mais que um conjunto de reflexões, uma nova postura de muitos em relação a este sensível e relevante tema, diretamente ligado aos direitos e às garantias fundamentais do cidadão, alcançados ao longo dos tempos com muitos esforços e à custa da integridade, liberdade e vida de tantos. Neste campo, sem uma mudança profunda de cultura e adoção de práticas verdadeiramente democráticas não há política criminal que possa ser exitosa.
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Das Prisões Cautelares DISPOSIÇÕES GERAIS: DA PRISÃO, DAS MEDIDAS CAUTELARES E DA LIBERDADE PROVISÓRIA 1. INTRODUÇÃO As alterações das Disposições Gerais ao Título IX do Livro I do Código de Processo Penal, impostas pela Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011, se restringiram ao que se vê no novo art. 282, que traz regras gerais aplicáveis às medidas cautelares; ao art. 283, que enfatiza que ninguém poderá ser preso senão em flagrante ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, neste caso, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva, deixando claro que não há mais qualquer possibilidade de se pensar em prisão resultante de sentença condenatória recorrível, cumprindo se observe, ainda, o disposto em seu § 2º; ao art. 289, que cuida da prisão quando o acusado estiver no território nacional, porém, fora da jurisdição do juiz processante; à inclusão no CPP do art. 289-A, que trata da criação de um banco de dados pelo Conselho Nacional de Justiça para registro de mandados de prisão1; à revogação do art. 298; ao art. 299, que dispõe regras sobre a requisição da captura daquele contra quem se expediu ordem judicial de prisão, e ao art. 300, que trata da separação entre presos provisórios e definitivos, nos termos da Lei de Execução Penal, e do militar preso em flagrante.
2. O NOVO ART. 282 DO CPP O novo art. 282 estabelece disposições gerais que devem guiar a aplicação das medidas cautelares tratadas no Título IX, Livro I, do Código de Processo Penal, a saber: prisão em flagrante (arts. 301 a 309); prisão preventiva (arts. 311 a 316); prisão domiciliar substitutiva da prisão preventiva (arts. 317 e 318); outras medidas cautelares diversas da prisão (arts. 319 e 320). Na aplicação dessas medidas o juiz deve nortear-se por critérios de legalidade, necessidade, adequação, razoabilidade, proporcionalidade, em conformidade com as diretrizes apontadas. As medidas cautelares serão decretadas pelo juiz, de ofício ou a requerimento das partes ou, quando no curso da investigação criminal, por representação da autoridade policial ou mediante requerimento do Ministério Público (§ 2º do art. 282). Desde a vigência da Lei n. 12.403/2011 só é cabível medida cautelar pessoal ex officio no curso do processo penal. Durante a investigação policial apenas poderá ser decretada mediante provocação. Ressalvados os casos de urgência ou de perigo de ineficácia da medida, em obediência e homenagem ao princípio do contraditório, o juiz, ao receber o pedido de medida cautelar, determinará a intimação da parte contrária, acompanhada de cópia do requerimento e das peças necessárias, permanecendo os autos em juízo (§ 3º do art. 282). Em relação às medidas listadas nos arts. 319 e 320 do CPP, caberá a aplicação isolada ou cumulativa, e no caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas, o juiz, de ofício2 ou mediante requerimento do Ministério Público, de seu assistente ou do querelante, poderá substituir a
medida, impor outra em cumulação, ou, em último caso, decretar a prisão preventiva. Estas medidas cautelares e suas particularidades estão tratadas em capítulos distintos, nesta mesma obra, todavia, dada a relevância da matéria nova cuidada no art. 282, recomendamos que o leitor consulte nossas anotações lançadas no capítulo em que tratamos das “novas medidas cautelares diversas da prisão”, especialmente os itens “12. Contraditório na decretação”; “12.1. Exceções ao contraditório prévio”; “13. Decretação”; “14. Revogação e nova decretação”; “14.1. Suspensão cautelar da medida”; “14.2. Ampla defesa e contraditório na revogação”, onde discorremos longamente sobre inúmeras inquietações.
3. ARTS. 283 A 288 DO CPP O antigo art. 282 do CPP dispunha que, à exceção do flagrante delito, a prisão não poderia efetuarse senão em virtude de pronúncia ou nos casos determinados em lei, e mediante ordem escrita da autoridade competente. Até pouco tempo a legislação processual penal brasileira contemplava as seguintes modalidades de prisão cautelar: prisão em flagrante; prisão temporária; prisão preventiva; prisão resultante de pronúncia e prisão resultante de sentença condenatória recorrível. A Lei n. 11.689, de 9 de junho de 2008, alterou o Código de Processo Penal no tocante aos processos de competência do Tribunal do Júri e deu nova redação ao art. 413, § 3º, do CPP, que passou a permitir somente a prisão preventiva por ocasião da decisão de pronúncia, se atendidos os requisitos da lei. Não há falar, portanto, em prisão resultante de pronúncia propriamente dita, nos moldes em que anteriormente regulada no art. 408, § 2º, do CPP. A Lei n. 11.719, de 20 de junho de 2008, revogou expressamente o art. 594 do CPP, de maneira que não subsiste no ordenamento processual a possibilidade de prisão decorrente de sentença condenatória recorrível, conforme veremos no capítulo que trata exclusivamente da matéria. O atual art. 283 do CPP enfatiza que ninguém poderá ser preso senão em flagrante ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, neste caso, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva, deixando claro que não há mais qualquer possibilidade de se pensar em prisão resultante de sentença condenatória recorrível. Na sistemática atual do Código de Processo Penal, ou ocorre prisão em flagrante (nas hipóteses tratadas no art. 302 do CPP); ou se decreta prisão temporária, quando cabível (Lei n. 7.960, de 21-121989), ou prisão preventiva (arts. 310 a 316 do CPP)3, podendo esta ser substituída por prisão cautelar domiciliar, conforme dispõem os arts. 317 e 318 do CPP. A prisão preventiva somente será decretada se não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar dentre as previstas nos arts. 319 e 320 do CPP, conforme dispõe o § 6º do art. 282. Necessário registrar, entretanto, que há impropriedade na redação deste dispositivo quando diz que a prisão preventiva somente será decretada se não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar dentre as previstas nos arts. 319 e 320 do CPP. O correto seria dizer que a prisão preventiva somente será decretada quando não for cabível, adequada ou suficiente a aplicação de outra medida cautelar dentre as previstas nos arts. 319 e 320 do CPP, isolada ou cumulativamente. Ao dizer que a preventiva não será decretada quando for cabível sua substituição, tecnicamente, o
que se diz enseja antagonismo, pois sua substituição por outra medida cautelar pressupõe sua prévia decretação, o que o dispositivo visa exatamente impedir. A prisão preventiva poderá ser decretada em qualquer fase da investigação policial ou do processo, inclusive no momento da decisão de pronúncia, nos processos de competência do Tribunal do Júri (art. 413, § 3º, do CPP) e da sentença condenatória (parágrafo único do art. 387 do CPP), se presentes os requisitos legais. De resto, só haverá prisão criminal se houver sentença penal condenatória transitada em julgado. Entenda-se: transitada definitivamente em julgado para ambas as partes; prisão-pena, portanto. A prisão poderá ser efetuada em qualquer dia e a qualquer hora, respeitadas as restrições relativas à inviolabilidade do domicílio, regra expressa no § 2º do art. 283 do CPP, que está em consonância com o disposto no art. 5º, XI, da CF, segundo o qual “a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”. Em caso de tentativa de fuga ou resistência à prisão determinada por autoridade competente, ainda que por parte de terceiros, o executor da prisão e as pessoas que o auxiliarem poderão utilizar-se de força física, na medida do indispensável para defender-se, vencer a resistência e efetivar a captura (art. 284)4, do que tudo se lavrará auto subscrito também por duas testemunhas (art. 292)5. A autoridade judiciária que ordenar a prisão fará expedir o respectivo mandado6, sem o qual não poderá a ordem ser cumprida, salvo se a infração for inafiançável, hipótese em que o preso deverá ser levado imediatamente à presença do juiz que decretou a prisão (art. 287)7. O mandado, que deverá observar as regras dos arts. 285, parágrafo único8, e 2869, ambos do CPP, é documento de exibição indispensável ao diretor ou carcereiro do estabelecimento penal que receber o preso, devendo ser passado recibo da entrega deste, com declaração de dia e hora (art. 288), ainda que no próprio exemplar do mandado, se este for o documento exibido (parágrafo único do art. 288)10.
4. PRISÃO A SER EXECUTADA FORA DA JURISDIÇÃO DO JUIZ PROCESSANTE Art. 289. Quando o acusado estiver no território nacional, fora da jurisdição do juiz processante, será deprecada a sua prisão, devendo constar da precatória o inteiro teor do mandado. § 1º Havendo urgência, o juiz poderá requisitar a prisão por qualquer meio de comunicação, do qual deverá constar o motivo da prisão, bem como o valor da fiança se arbitrada. § 2º A autoridade a quem se fizer a requisição tomará as precauções necessárias para averiguar a autenticidade da comunicação. § 3º O juiz processante deverá providenciar a remoção do preso no prazo máximo de 30 (trinta) dias, contados da efetivação da medida. A nova redação do art. 289 do CPP apenas atualizou a linguagem, mas manteve a mesma mensagem de antes, e envolve duas ordens de ideias. No caput, a expressão “réu” foi substituída por “acusado”, e a expressão “lugar estranho ao da jurisdição” por “fora da jurisdição do juiz processante”. Havendo urgência, a regra que antes se encontrava no parágrafo único do art. 289 agora está no § 1º do texto reformulado, e, embora mantida a matéria tratada, a linguagem também foi atualizada, restando sem sentido, contudo, a referência à fiança, conforme veremos no capítulo a ela destinado. Onde constava: “requisitar a prisão por telegrama”, agora consta: “requisitar a prisão por qualquer
meio de comunicação”. Entenda-se: telefone, fax, e-mail etc. Quando a lei fala no caput do art. 289 em deprecar a prisão, determina que será expedida carta precatória de juiz para juiz, na forma regulada. Por outro vértice, o § 1º do art. 289 fala que o juiz poderá requisitar a prisão, e então fica claro que está se referindo à requisição de juiz endereçada à autoridade policial, visto que juiz não requisita de juiz, apenas solicita. O instrumento jurídico para solicitação da prisão daquele que se encontrar fora da jurisdição do juiz processante continua a ser a carta precatória11, se o acusado estiver no território nacional, ou a carta rogatória, quando em território alienígena, contudo, poderá ser enviada mediante utilização de novas tecnologias, assim como a requisição à autoridade policial, em caso de urgência, a quem incumbirá adotar providências no sentido de averiguar a autenticidade da comunicação recebida12. Novidade valiosa é a previsão no sentido de que “o juiz processante deverá providenciar a remoção do preso no prazo máximo de 30 (trinta) dias, contados da efetivação da medida”. Deprecada ou requisitada a prisão na forma do art. 289 e seus parágrafos, após efetivada a captura caberá ao juiz processante, entenda-se, ao juiz que solicitou ou requisitou a prisão, providenciar a remoção do preso para sua comarca — comarca do processo —, para que permaneça sob sua jurisdição. Na prática, o problema da prisão efetivada em local diverso ao do processo tem gerado enormes transtornos, visto que não raras vezes a prisão do acusado se verifica em local muito distante do juízo processante, e diante das dificuldades operacionais encontradas para sua remoção, dificuldades que vão desde a falta de viatura, falta de combustível, falta de pessoal, à falta de responsabilidade e cuidado de alguns, o excesso de prazo da prisão nestes casos tem sido constante. Mas é claro que a previsão legal, pura e simplesmente, não resolve este grave problema, já que a ausência do aparato policial e instrumental para remoção de presos decorre do descaso e da ineficiência de políticas públicas que devem ser executadas pelo administrador público, nos termos da Constituição Federal. É evidente, portanto, que em muitos casos, embora definida em lei a quem incumbe a remoção do preso, e em que prazo isso se deva dar, a remoção não se efetivará por quem de direito e no limite temporal fixado. Qual a consequência jurídica? Nenhuma. Poder-se-ia argumentar ser caso de relaxamento da prisão, mas a afirmação não nos parece adequada. Com efeito, diz o art. 5º, LXV, da CF, que a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária. Na hipótese analisada a prisão é legal, ou pelo menos não se pode aferir ilegalidade na decisão que a determinou ou na prisão mesmo, pelo simples fato de se ver desrespeitado o prazo para remoção do preso. Havendo excesso de prazo na prisão (e não na transferência), poderá ocorrer o seu relaxamento, mas não pela autoridade judiciária de igual estatura.
5. ART. 289-A DO CPP: CADASTRO DE MANDADOS DE PRISÃO EM BANCO DE DADOS NO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA
O art. 2º da Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011, fez acrescer ao CPP o art. 289-A, que determinou a criação e regulamentação de um banco de dados pelo Conselho Nacional de Justiça, onde devem ser registrados os mandados de prisão expedidos contra quem se encontre no território nacional, em lugar estranho ao da jurisdição daquele que fez expedir a ordem13. O dispositivo novo autoriza qualquer agente policial a efetuar a prisão decretada, e dispõe que esta deverá ser imediatamente comunicada ao juiz do local de cumprimento da medida — entenda-se: juiz do local onde a prisão foi efetuada, devendo este, então, providenciar uma certidão que será extraída do banco de dados do Conselho Nacional de Justiça e informar o juízo que a decretou para que providencie a remoção do preso, o que nos termos do § 3º do art. 289 deverá ocorrer no prazo de trinta dias, contados da efetivação da medida.
6. FUGA E PRISÃO Ocorrendo fuga, poderá haver perseguição, na forma do art. 290 do CPP. Conforme o art. 293, “se o executor do mandado verificar, com segurança, que o réu entrou ou se encontra em alguma casa, o morador será intimado a entregá-lo, à vista da ordem de prisão. Se não for obedecido imediatamente, o executor convocará duas testemunhas e, sendo dia, entrará à força na casa, arrombando as portas, se preciso; sendo noite, o executor, depois da intimação ao morador, se não for atendido, fará guardar todas as saídas, tornando a casa incomunicável, e, logo que amanheça, arrombará as portas e efetuará a prisão”. E arremata o parágrafo único: “O morador que se recusar a entregar o réu oculto em sua casa será levado à presença da autoridade, para que se proceda contra ele como for de direito”. “A prisão em virtude de mandado entender-se-á feita desde que o executor, fazendo-se conhecer do réu, lhe apresente o mandado e o intime a acompanhá-lo” (art. 291).
7. ART. 300 DO CPP Conforme a lição de BASILEU GARCIA: “A prisão cautelar (carcer ad custodiam) não se confunde com a prisão penal (carcer ad poenam), porque não objetiva infligir punição à pessoa que sofre a sua decretação. Não traduz, assim, em face da estrita finalidade a que se destina, qualquer ideia de sanção. Constitui, ao contrário, instrumento destinado a atuar em benefício da atividade desenvolvida no processo penal”14. Bem por isso a determinação do art. 300 do CPP, no sentido de que as pessoas presas provisoriamente ficarão separadas das que já estiverem definitivamente condenadas, nos termos da Lei de Execução Penal, que em seu art. 84 determina: “O preso provisório ficará separado do condenado por sentença transitada em julgado”. A previsão, aliás, atende ao disposto nas Regras Mínimas da ONU para o Tratamento de Reclusos, adotadas em 31 de agosto de 1955, pelo Primeiro Congresso das Nações Unidas para a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delinquentes, Parte I, item b, onde se lê que “os presos preventivos devem ser mantidos separados dos condenados”, o que interessa, inclusive, à individualização execucional da pena15. Preso provisório é o preso cautelar, sem sentença penal condenatória com trânsito em julgado definitivo, conforme já analisamos.
8. PRISÃO ESPECIAL
O tema — prisão especial16 — foi o que maior debate causou nos tempos finais de tramitação do projeto que deu origem à Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011, mas a redação do art. 295 do CPP não sofreu qualquer alteração; ficou exatamente como estava. Diz o referido artigo que “serão recolhidos a quartéis ou a prisão especial, à disposição da autoridade competente, quando sujeitos a prisão antes de condenação definitiva: I — os ministros de Estado; II — os governadores ou interventores de Estados ou Territórios, o prefeito do Distrito Federal, seus respectivos secretários, os prefeitos municipais, os vereadores e os chefes de Polícia; III — os membros do Parlamento Nacional, do Conselho de Economia Nacional e das Assembleias Legislativas dos Estados; IV — os cidadãos inscritos no ‘Livro de Mérito’; V — os oficiais das Forças Armadas e os militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios; VI — os magistrados; VII — os diplomados por qualquer das faculdades superiores da República; VIII — os ministros de confissão religiosa; IX — os ministros do Tribunal de Contas; X — os cidadãos que já tiverem exercido efetivamente a função de jurado, salvo quando excluídos da lista por motivo de incapacidade para o exercício daquela função; XI — os delegados de polícia e os guardas-civis dos Estados e Territórios, ativos e inativos”. As possibilidades de prisão especial não se esgotam no Código de Processo Penal, pois existem outras tantas leis dispondo a respeito da matéria. Não se trata de privilégio no cumprimento de pena, mas tão somente recolhimento em local distinto da prisão comum, levando em conta determinadas profissões e atividades profissionais, devendo perdurar apenas durante o tempo de encarceramento cautelar. A prisão especial só é aplicada àqueles que dela se beneficiam por disposição expressa de lei, e somente enquanto presos cautelares. Vale dizer: enquanto não ocorrer o trânsito em julgado definitivo de sentença penal condenatória17. Não havendo estabelecimento específico para o preso especial, diz o § 2º do art. 295 que este deverá ser recolhido em cela distinta do mesmo estabelecimento. A cela especial poderá consistir em alojamento coletivo, atendidos os requisitos de salubridade do ambiente18, pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequados à existência humana (§ 3º). “Não havendo cela especial na Cadeia Pública nem alojamento condigno no quartel em que for recolhido o preso com direito a prisão especial, poderá o juiz determinar que ele fique na Cadeia Pública em cela separada, isolado dos demais detentos”19. Guardando coerência com a disposição que veda a permanência do preso especial no mesmo ambiente que os demais presos, determina o § 4º do art. 295 que o preso especial não será transportado com o preso comum. Quanto ao mais, os direitos e deveres do preso especial serão os mesmos do preso comum (§ 5º do art. 295). Estão também sujeitos a prisão especial: dirigentes de entidades sindicais e o empregado no exercício de representação profissional ou no cargo de administração sindical (Lei n. 2.860/56); servidores do Departamento Federal de Segurança Pública, com exercício de atividade estritamente policial (Lei n. 3.313/57); pilotos de aeronaves mercantes nacionais (Lei n. 3.988/61); funcionários policiais civis da União e do Distrito Federal (Lei n. 4.878/65); funcionários da Polícia Civil dos Estados e dos Territórios, ocupantes de cargos de atividade policial (Lei n. 5.350/67; cf. STJ, 6ª T., rel. Min. Vicente Leal, DJU, de 4-11-1996, p. 42524); oficiais da Marinha Mercante (Lei n. 5.606/70;
cf. STJ, 5ª T., rel. Min. Cid Flaquer Scartezzini, DJU, de 8-6-1992, p. 8624); juízes de paz (Lei Complementar n. 35/79 — LOMN); juízes de direito (Lei Complementar n. 35/79 — LOMN); agentes de segurança privada (Lei n. 7.102/83); professores do ensino de 1º e 2º graus (Lei n. 7.172/83); promotores e procuradores de justiça (Lei n. 8.625/93 — LONMP; no Estado de São Paulo: Lei Complementar n. 734/93 — LOMPSP); os Advogados (Lei n. 8.906/94). A Lei n. 12.403/2011 deu nova redação ao art. 439 do CPP, de maneira a não mais assegurar a possibilidade de prisão especial àquele que tenha exercido efetivamente a função de jurado no julgamento de processo submetido ao Tribunal do Júri. De observar, entretanto, que o art. 295, X, do CPP, continua a assegurar a possibilidade de prisão especial aos que tiverem exercido efetivamente a função de jurado, conforme especifica. Aury Lopes Jr. explica o imbróglio: “O que provavelmente tenha ocorrido foi um vacilo do legislador, pois até a véspera da votação do PL 4208, havia um consenso sobre a extinção da prisão especial e, portanto, haveria uma modificação radical no art. 295. Nesta linha, também teria que ser alterado o art. 439 (para supressão da parte final). Ocorre que, na última hora, decidiu-se pela manutenção da prisão especial e o art. 295 ficou inalterado (e esqueceram do art. 439 que acabou sendo alterado)”20.
Disposições Gerais: da Prisão, das Medidas Cautelares e da Liberdade Provisória Quadro comparativo da legislação
Como era
Como ficou
Sem regras correspondentes na legislação anterior.
Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a: I — necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais; II — adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado. § 1º As medidas cautelares poderão ser aplicadas isolada ou cumulativamente. § 2º As medidas cautelares serão decretadas pelo juiz, de ofício ou a requerimento das partes ou, quando no curso da investigação criminal, por representação da autoridade policial ou mediante requerimento do Ministério Público. § 3º Ressalvados os casos de urgência ou de perigo de ineficácia da medida, o juiz, ao receber o pedido de medida cautelar, determinará a intimação da parte contrária, acompanhada de cópia do requerimento e das peças necessárias, permanecendo os autos em juízo. § 4º No caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas, o juiz, de ofício ou mediante requerimento do Ministério Público, de seu assistente ou do querelante, poderá substituir a medida, impor outra em cumulação, ou, em último caso, decretar a prisão preventiva (art. 312, parágrafo único). § 5º O juiz poderá revogar a medida cautelar ou substituí-la quando verificar a falta de motivo para que subsista, bem como voltar a decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem. § 6º A prisão preventiva será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar (art. 319).
Art. 282. À exceção do flagrante delito, a prisão não poderá efetuar-se senão em virtude de pronúncia ou nos casos determinados em lei, e mediante ordem escrita da autoridade competente. Art. 283. A prisão poderá ser efetuada em qualquer dia e a qualquer hora, respeitadas as restrições relativas à inviolabilidade do domicílio.
Art. 283. Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva. § 1º As medidas cautelares previstas neste Título não se aplicam à infração a que não for isolada, cumulativa ou alternativamente cominada pena privativa de liberdade. § 2º A prisão poderá ser efetuada em qualquer dia e a qualquer hora, respeitadas as restrições relativas à inviolabilidade do domicílio.
Art. 284. Não será permitido o emprego de força, salvo a indispensável no caso de resistência ou de tentativa de fuga do preso.
Não sofreu alteração Art. 284. Não será permitido o emprego de força, salvo a indispensável no caso de resistência ou de tentativa de fuga do preso.
Art. 285. A autoridade que ordenar a prisão fará expedir o respectivo mandado. Parágrafo único. O mandado de prisão: a) será lavrado pelo escrivão e assinado pela autoridade; b) designará a pessoa, que tiver de ser presa, por seu nome, alcunha ou sinais característicos; c) mencionará a infração penal que motivar a prisão; d) declarará o valor da fiança arbitrada, quando afiançável a infração; e) será dirigido a quem tiver qualidade para dar-lhe execução.
Não sofreu alteração Art. 285. A autoridade que ordenar a prisão fará expedir o respectivo mandado. Parágrafo único. O mandado de prisão: a) será lavrado pelo escrivão e assinado pela autoridade; b) designará a pessoa, que tiver de ser presa, por seu nome, alcunha ou sinais característicos; c) mencionará a infração penal que motivar a prisão; d) declarará o valor da fiança arbitrada, quando afiançável a infração; e) será dirigido a quem tiver qualidade para dar-lhe execução.
Art. 286. O mandado será passado em duplicata, e o executor entregará ao preso, logo depois da prisão, um dos exemplares com declaração do dia, hora e lugar da diligência. Da entrega deverá o preso passar recibo no outro exemplar; se recusar, não souber ou não puder escrever, o fato será mencionado em declaração, assinada por duas testemunhas.
Não sofreu alteração Art. 286. O mandado será passado em duplicata, e o executor entregará ao preso, logo depois da prisão, um dos exemplares com declaração do dia, hora e lugar da diligência. Da entrega deverá o preso passar recibo no outro exemplar; se recusar, não souber ou não puder escrever, o fato será mencionado em declaração, assinada por duas testemunhas.
Art. 287. Se a infração for inafiançável, a falta de exibição do mandado não obstará à prisão, e o preso, em tal caso, será imediatamente apresentado ao juiz que tiver expedido o mandado.
Não sofreu alteração Art. 287. Se a infração for inafiançável, a falta de exibição do mandado não obstará à prisão, e o preso, em tal caso, será imediatamente apresentado ao juiz que tiver expedido o mandado.
Art. 288. Ninguém será recolhido à prisão, sem que seja exibido o mandado ao respectivo diretor ou carcereiro, a quem será entregue cópia assinada pelo executor ou apresentada a guia expedida pela autoridade competente, devendo ser passado recibo da entrega do preso, com declaração de dia e hora. Parágrafo único. O recibo poderá ser passado no próprio exemplar do mandado, se este for o documento exibido.
Não sofreu alteração Art. 288. Ninguém será recolhido à prisão, sem que seja exibido o mandado ao respectivo diretor ou carcereiro, a quem será entregue cópia assinada pelo executor ou apresentada a guia expedida pela autoridade competente, devendo ser passado recibo da entrega do preso, com declaração de dia e hora. Parágrafo único. O recibo poderá ser passado no próprio exemplar do mandado, se este for o documento exibido.
Art. 289. Quando o réu estiver no território nacional, em lugar estranho ao da jurisdição, será deprecada a sua prisão, devendo constar da precatória o inteiro teor do mandado. Parágrafo único. Havendo urgência, o juiz poderá requisitar a prisão por telegrama, do qual deverá constar o motivo da prisão, bem como, se afiançável a infração, o valor da fiança. No original levado à agência telegráfica será autenticada a firma do juiz, o que se mencionará no telegrama.
Art. 289. Quando o acusado estiver no território nacional, fora da jurisdição do juiz processante, será deprecada a sua prisão, devendo constar da precatória o inteiro teor do mandado. § 1º Havendo urgência, o juiz poderá requisitar a prisão por qualquer meio de comunicação, do qual deverá constar o motivo da prisão, bem como o valor da fiança se arbitrada. § 2º A autoridade a quem se fizer a requisição tomará as precauções necessárias para averiguar a autenticidade da comunicação. § 3º O juiz processante deverá providenciar a remoção do preso no prazo máximo de 30 (trinta) dias, contados da efetivação da medida.
Sem regra correspondente. Artigo acrescido ao CPP por força do art. 2º da Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011.
Art. 289-A. O juiz competente providenciará o imediato registro do mandado de prisão em banco de dados mantido pelo Conselho Nacional de Justiça para essa finalidade. § 1º Qualquer agente policial poderá efetuar a prisão determinada no mandado de prisão registrado no Conselho Nacional de Justiça, ainda que fora da competência territorial do juiz que o expediu. § 2º Qualquer agente policial poderá efetuar a prisão decretada, ainda que sem registro no Conselho Nacional de Justiça, adotando as precauções necessárias para averiguar a autenticidade do mandado e comunicando ao juiz que a decretou, devendo este providenciar, em seguida, o registro do mandado na forma do caput deste artigo. § 3º A prisão será imediatamente comunicada ao juiz do local de cumprimento da medida o qual providenciará a certidão extraída do registro do Conselho Nacional de Justiça e informará ao juízo que a decretou. § 4º O preso será informado de seus direitos, nos termos do inciso LXIII do art. 5º da Constituição Federal e, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, será comunicado à Defensoria Pública. § 5º Havendo dúvidas das autoridades locais sobre a legitimidade da pessoa do executor ou sobre a identidade do preso, aplica-se o disposto no § 2º do art. 290 deste Código. § 6º O Conselho Nacional de Justiça regulamentará o registro do mandado de prisão a que se refere o caput deste artigo.
Art. 290. Se o réu, sendo perseguido, passar ao território de outro município ou comarca, o executor poderá efetuar-lhe a prisão no lugar onde o alcançar, apresentando-o imediatamente à autoridade local, que, depois de lavrado, se for o caso, o auto de flagrante, providenciará para a remoção do preso.
Não sofreu alteração Art. 290. Se o réu, sendo perseguido, passar ao território de outro município ou comarca, o executor poderá efetuar-lhe a prisão no lugar onde o alcançar, apresentando-o imediatamente à autoridade local, que, depois de lavrado, se for o caso, o auto de flagrante, providenciará para a remoção do preso.
§ 1º Entender-se-á que o executor vai em perseguição do réu, quando: a) tendo-o avistado, for perseguindo-o sem interrupção, embora depois o tenha perdido de vista; b) sabendo, por indícios ou informações fidedignas, que o réu tenha passado, há pouco tempo, em tal ou qual direção, pelo lugar em que o procure, for no seu encalço. § 2º Quando as autoridades locais tiverem fundadas razões para duvidar da legitimidade da pessoa do executor ou da legalidade do mandado que apresentar, poderão pôr em custódia o réu, até que fique esclarecida a dúvida.
§ 1º Entender-se-á que o executor vai em perseguição do réu, quando: a) tendo-o avistado, for perseguindo-o sem interrupção, embora depois o tenha perdido de vista; b) sabendo, por indícios ou informações fidedignas, que o réu tenha passado, há pouco tempo, em tal ou qual direção, pelo lugar em que o procure, for no seu encalço. § 2º Quando as autoridades locais tiverem fundadas razões para duvidar da legitimidade da pessoa do executor ou da legalidade do mandado que apresentar, poderão pôr em custódia o réu, até que fique esclarecida a dúvida.
Art. 291. A prisão em virtude de mandado entender-se-á feita desde que o executor, fazendose conhecer do réu, lhe apresente o mandado e o intime a acompanhá-lo.
Não sofreu alteração Art. 291. A prisão em virtude de mandado entender-se-á feita desde que o executor, fazendo-se conhecer do réu, lhe apresente o mandado e o intime a acompanhá-lo.
Art. 292. Se houver, ainda que por parte de terceiros, resistência à prisão em flagrante ou à determinada por autoridade competente, o executor e as pessoas que o auxiliarem poderão usar dos meios necessários para defender-se ou para vencer a resistência, do que tudo se lavrará auto subscrito também por duas testemunhas.
Não sofreu alteração Art. 292. Se houver, ainda que por parte de terceiros, resistência à prisão em flagrante ou à determinada por autoridade competente, o executor e as pessoas que o auxiliarem poderão usar dos meios necessários para defender-se ou para vencer a resistência, do que tudo se lavrará auto subscrito também por duas testemunhas.
Art. 293. Se o executor do mandado verificar, com segurança, que o réu entrou ou se encontra em alguma casa, o morador será intimado a entregá-lo, à vista da ordem de prisão. Se não for obedecido imediatamente, o executor convocará duas testemunhas e, sendo dia, entrará à força na casa, arrombando as portas, se preciso; sendo noite, o executor, depois da intimação ao morador, se não for atendido, fará guardar todas as saídas, tornando a casa incomunicável, e, logo que amanheça, arrombará as portas e efetuará a prisão. Parágrafo único. O morador que se recusar a entregar o réu oculto em sua casa será levado à presença da autoridade, para que se proceda contra ele como for de direito.
Não sofreu alteração Art. 293. Se o executor do mandado verificar, com segurança, que o réu entrou ou se encontra em alguma casa, o morador será intimado a entregá-lo, à vista da ordem de prisão. Se não for obedecido imediatamente, o executor convocará duas testemunhas e, sendo dia, entrará à força na casa, arrombando as portas, se preciso; sendo noite, o executor, depois da intimação ao morador, se não for atendido, fará guardar todas as saídas, tornando a casa incomunicável, e, logo que amanheça, arrombará as portas e efetuará a prisão. Parágrafo único. O morador que se recusar a entregar o réu oculto em sua casa será levado à presença da autoridade, para que se proceda contra ele como for de direito.
Art. 294. No caso de prisão em flagrante, observarse-á o disposto no artigo anterior, no que for aplicável.
Não sofreu alteração Art. 294. No caso de prisão em flagrante, observarse-á o disposto no artigo anterior, no que for aplicável.
Art. 295. Serão recolhidos a quartéis ou a prisão especial, à disposição da autoridade competente, quando sujeitos a prisão antes de condenação definitiva: I — os ministros de Estado; II — os governadores ou interventores de Estados ou Territórios, o prefeito do Distrito Federal, seus respectivos secretários, os prefeitos municipais, os vereadores e os chefes de Polícia; III — os membros do Parlamento Nacional, do Conselho de Economia Nacional e das Assembleias Legislativas dos Estados; IV — os cidadãos inscritos no “Livro de Mérito”; V — os oficiais das Forças Armadas e os militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios;
Não sofreu alteração Art. 295. Serão recolhidos a quartéis ou a prisão especial, à disposição da autoridade competente, quando sujeitos a prisão antes de condenação definitiva: I — os ministros de Estado; II — os governadores ou interventores de Estados ou Territórios, o prefeito do Distrito Federal, seus respectivos secretários, os prefeitos municipais, os vereadores e os chefes de Polícia; III — os membros do Parlamento Nacional, do Conselho de Economia Nacional e das Assembleias Legislativas dos Estados; IV — os cidadãos inscritos no “Livro de Mérito”; V — os oficiais das Forças Armadas e os militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios;
VI — os magistrados; VII — os diplomados por qualquer das faculdades superiores da República; VIII — os ministros de confissão religiosa; IX — os ministros do Tribunal de Contas; X — os cidadãos que já tiverem exercido efetivamente a função de jurado, salvo quando excluídos da lista por motivo de incapacidade para o exercício daquela função; XI — os delegados de polícia e os guardas-civis dos Estados e Territórios, ativos e inativos. § 1º A prisão especial, prevista neste Código ou em outras leis, consiste exclusivamente no recolhimento em local distinto da prisão comum. § 2º Não havendo estabelecimento específico para o preso especial, este será recolhido em cela distinta do mesmo estabelecimento. § 3º A cela especial poderá consistir em alojamento coletivo, atendidos os requisitos de salubridade do ambiente, pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequados à existência humana. § 4º O preso especial não será transportado juntamente com o preso comum. § 5º Os demais direitos e deveres do preso especial serão os mesmos do preso comum.
VI — os magistrados; VII — os diplomados por qualquer das faculdades superiores da República; VIII — os ministros de confissão religiosa; IX — os ministros do Tribunal de Contas; X — os cidadãos que já tiverem exercido efetivamente a função de jurado, salvo quando excluídos da lista por motivo de incapacidade para o exercício daquela função; XI — os delegados de polícia e os guardas-civis dos Estados e Territórios, ativos e inativos. § 1º A prisão especial, prevista neste Código ou em outras leis, consiste exclusivamente no recolhimento em local distinto da prisão comum. § 2º Não havendo estabelecimento específico para o preso especial, este será recolhido em cela distinta do mesmo estabelecimento. § 3º A cela especial poderá consistir em alojamento coletivo, atendidos os requisitos de salubridade do ambiente, pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequados à existência humana. § 4º O preso especial não será transportado juntamente com o preso comum. § 5º Os demais direitos e deveres do preso especial serão os mesmos do preso comum.
Art. 296. Os inferiores e praças de pré, onde for possível, serão recolhidos à prisão, em estabelecimentos militares, de acordo com os respectivos regulamentos.
Não sofreu alteração Art. 296. Os inferiores e praças de pré, onde for possível, serão recolhidos à prisão, em estabelecimentos militares, de acordo com os respectivos regulamentos.
Art. 297. Para o cumprimento de mandado expedido pela autoridade judiciária, a autoridade policial poderá expedir tantos outros quantos necessários às diligências, devendo neles ser fielmente reproduzido o teor do mandado original.
Não sofreu alteração Art. 297. Para o cumprimento de mandado expedido pela autoridade judiciária, a autoridade policial poderá expedir tantos outros quantos necessários às diligências, devendo neles ser fielmente reproduzido o teor do mandado original.
Art. 298. Se a autoridade tiver conhecimento de que o réu se acha em território estranho ao da sua jurisdição, poderá, por via postal ou telegráfica, requisitar a sua captura, declarando o motivo da prisão e, se afiançável a infração, o valor da fiança.
Artigo revogado pelo art. 4º da Lei n.12.403, de 4 de maio de 2011.
Art. 299. Se a infração for inafiançável, a captura poderá ser requisitada, à vista de mandado judicial, por via telefônica, tomadas pela autoridade, a quem se fizer a requisição, as pre- cauções necessárias para averiguar a autenticidade desta.
Art. 299. A captura poderá ser requisitada, à vista de mandado judicial, por qualquer meio de comunicação, tomadas pela autoridade, a quem se fizer a requisição, as precauções necessárias para averiguar a autenticidade desta.
Art. 300. Sempre que possível, as pessoas presas provisoriamente ficarão separadas das que já estiverem definitivamente condenadas.
Art. 300. As pessoas presas provisoriamente ficarão separadas das que já estiverem definitivamente condenadas, nos termos da lei de execução penal. Parágrafo único. O militar preso em flagrante delito, após a lavratura dos procedimentos legais, será recolhido a quartel da instituição a que pertencer, onde ficará preso à disposição das autoridades competentes.
1 Ver: Resolução n. 137 do Conselho Nacional de Justiça, de 13 de julho de 2011, publicada no DJe n. 130/2011, de 15-7-2011, p. 6/8. 2 Ver: Capítulo “Novas medidas cautelares diversas da prisão”, item 14.3. Revogação de medida cautelar e decretação de prisão preventiva. 3 “A prisão em flagrante e a prisão preventiva constituem modalidades que realizam, no plano de nosso direito positivo, a tutela cautelar penal. Muito embora ambas constituam espécies de prisão provisória, há, entre elas, substanciais diferenças. A prisão preventiva decorre de ato necessariamente judicial que se reveste, quanto ao seu conteúdo, de inquestionável carga decisória. O decreto judicial de prisão preventiva, emanado de autoridade judiciária incompetente, é insuscetível de ratificação. A prisão em
flagrante, mesmo quando executada por particulares, qualifica-se, juridicamente, como ato de índole administrativa, desprovido de qualquer conteúdo decisório. Constitui característica inerente a prisão em flagrante a inexigibilidade, em face de sua natureza mesma, do ‘judicium’ prévio do magistrado. Desse modo, não se desconstitui a prisão em flagrante do réu pelo só fato de a ‘persecutio criminis’ haver sido instaurada contra ele perante órgão judiciário incompetente. Não se revela aplicável a prisão em flagrante, em consequência, a norma inscrita no art. 567 do Código de Processo Penal” (STF, HC 69.509/SP, 2ª T., rel. Min. Celso de Mello, j. 1º-9-1992, DJe de 12-3-1993). 4 Art. 284 do CPP: “Não será permitido o emprego de força, salvo a indispensável no caso de resistência ou de tentativa de fuga do preso”. 5 “Art. 292. Se houver, ainda que por parte de terceiros, resistência à prisão em flagrante ou à determinada por autoridade competente, o executor e as pessoas que o auxiliarem poderão usar dos meios necessários para defender-se ou para vencer a resistência, do que tudo se lavrará auto subscrito também por duas testemunhas.” 6 Art. 285, caput, do CPP: “A autoridade que ordenar a prisão fará expedir o respectivo mandado”. 7 “Art. 287. Se a infração for inafiançável, a falta de exibição do mandado não obstará à prisão, e o preso, em tal caso, será imediatamente apresentado ao juiz que tiver expedido o mandado.” 8 Art. 285 do CPP: “A autoridade que ordenar a prisão fará expedir o respectivo mandado. Parágrafo único. O mandado de prisão: a) será lavrado pelo escrivão e assinado pela autoridade; b) designará a pessoa, que tiver de ser presa, por seu nome, alcunha ou sinais característicos; c) mencionará a infração penal que motivar a prisão; d) declarará o valor da fiança arbitrada, quando afiançável a infração; e) será dirigido a quem tiver qualidade para dar-lhe execução”. 9 Art. 286 do CPP: “O mandado será passado em duplicata, e o executor entregará ao preso, logo depois da prisão, um dos exemplares com declaração do dia, hora e lugar da diligência. Da entrega deverá o preso passar recibo no outro exemplar; se recusar, não souber ou não puder escrever, o fato será mencionado em declaração, assinada por duas testemunhas”. 10 Art. 288 do CPP: “Ninguém será recolhido à prisão, sem que seja exibido o mandado ao respectivo diretor ou carcereiro, a quem será entregue cópia assinada pelo executor ou apresentada a guia expedida pela autoridade competente, devendo ser passado recibo da entrega do preso, com declaração de dia e hora. Parágrafo único. O recibo poderá ser passado no próprio exemplar do mandado, se este for o documento exibido”. 11 “Para o cumprimento de ordem de prisão em lugar fora da jurisdição, é imprescindível a expedição de carta precatória, contendo o inteiro teor do mandado, nos termos do preceito inscrito no art. 289 do CPP” (STJ, RHC 6.988/PR, 6ª T., rel. Min. Vicente Leal, j. 24-11-1997, DJU de 19-12-1997, RT 751/558). 12 Art. 289 do CPP: “Quando o acusado estiver no território nacional, fora da jurisdição do juiz processante, será deprecada a sua prisão, devendo constar da precatória o inteiro teor do mandado. § 1º Havendo urgência, o juiz poderá requisitar a prisão por qualquer meio de comunicação, do qual deverá constar o motivo da prisão, bem como, se afiançável a infração, o valor da fiança. § 2º A autoridade a quem se fizer a requisição tomará as precauções necessárias para averiguar a autenticidade da comunicação”. Art. 299 do CPP: “A captura poderá ser requisitada, à vista de mandado judicial, por qualquer meio de comunicação, tomadas pela autoridade, a quem se fizer a requisição, as precauções necessárias para averiguar a autenticidade desta”. 13 Resolução n. 137 do Conselho Nacional de Justiça, de 13 de julho de 2011, publicada no DJe n. 130/2011, de 15-7-2011, p. 6/8. 14 Comentários ao Código de Processo Penal, Rio de Janeiro: Forense, 1945, v. 3, p. 7. 15 RENAT O MARCÃO, Curso de execução penal, 10. ed., São Paulo: Saraiva, 2012. 16 Ver Leis n. 2.860/56, n. 5.256/67 e n. 10.258/2001. 17 “É incabível prisão especial quando se trata de execução da pena fixada em sentença condenatória irrecorrível” (STJ, HC 821/RS, 6ª T., rel. Min. Carlos Thibau, v.u., DJU, 8-6-1992, p. 8625). “A prisão especial não é uma regalia atentatória do princípio da isonomia jurídica, mas consubstancia providência que tem por objetivo resguardar a integridade física do preso que ocupa funções de natureza pública, afastando-o da promiscuidade com outros detentos comuns” (STJ, HC 3.848/ES, 6ª T., rel. Min. Vicente Leal, j. 31-10-1995, DJU, 4-11-1996, p. 42524). 18 “Local adequado de presídio pode servir de prisão especial, desde que isolado das demais celas e apresente condições de higiene e instalações sanitárias satisfatórias” (STJ, 5ª T., rel. Min. Assis Toledo, DJU, 3-5-1993, p. 7802). 19 STJ, RHC 2.098-6/MG, 5ª T., rel. Min. Edson Vidigal, DJU de 5-10-1992, p. 17112. 20 O novo regime jurídico da prisão processual, liberdade provisória e medidas cautelares diversas, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 114.
PRISÃO EM FLAGRANTE 1. NOTA INTRODUTÓRIA O instituto da prisão em flagrante encontra-se regulado no Capítulo II, Título IX, Livro I do Código de Processo Penal, arts. 301 a 309, e a reforma introduzida com a Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011, alterou apenas parte do art. 306. Como é a proposta deste livro, trataremos a seguir de todas as questões relevantes envolvendo a prisão em flagrante, indicando, inclusive, o entendimento jurisprudencial dominante, especialmente no Supremo Tribunal Federal.
2. PRISÃO EM FLAGRANTE Toda privação cautelar da liberdade é medida de caráter excepcional, que somente se justifica diante de comprovada e absoluta necessidade. Cautelar ou resultante de sentença condenatória irrecorrível, a prisão é um mal necessário. Uma medida extrema, perniciosa e indesejada, da qual a humanidade ainda não conseguiu se livrar, nada obstante os avanços experimentados em termos de penas e medidas alternativas — alternativas à prisão, obviamente. A propósito, a prisão como pena alternativa às penas violentas e cruéis, especialmente de mutilação e capital, contra as quais se insurgiram VOLTAIRE, MONTESQUIEU, BECCARIA e outros iluministas, foi uma medida inteligente e socialmente útil, embora não se possa afirmar, como adverte CEZAR ROBERTO BITENCOURT, “sem ser ingênuo ou excessivamente simplista”, que a prisão tenha surgido “como impulso de um ato humanitário com a finalidade de fomentar a reforma do delinquente”1. É certo, entretanto, que a sociedade atual busca incessantemente alternativas às prisões cautelares e à pena de prisão. Se a prisão como pena é um mal, é evidente que toda prisão que antecede o trânsito em julgado de sentença penal condenatória representa medida ainda mais danosa. Não se pode negar, entretanto, sua utilidade e imprescindibilidade para que se possa alcançar a desejada eficácia do sistema penal, especialmente em relação a determinados tipos de crimes. A propósito do tema, calha citar lição irretocável do Min. CELSO DE MELLO, lavrada nos seguintes termos: “A prisão cautelar não pode — e não deve — ser utilizada, pelo Poder Público, como instrumento de punição antecipada daquele a quem se imputou a prática do delito, pois, no sistema jurídico brasileiro, fundado em bases democráticas, prevalece o princípio da liberdade, incompatível com punições sem processo e inconciliável com condenações sem defesa prévia. A prisão cautelar — que não deve ser confundida com a prisão penal — não objetiva infligir punição àquele que sofre a sua decretação, mas destina-se, considerada a função cautelar que lhe é inerente, a atuar em benefício da atividade estatal desenvolvida no processo penal”2. A prisão em flagrante é modalidade de prisão cautelar, e a palavra “flagrante” procede do latim — flagrans, flagrantis — e significa aquilo que está queimando; que está em chamas; que se faz evidente naquele momento, em situação de atualidade. A lavratura do auto de prisão em flagrante exige como requisito formal a existência de condutor e
testemunhas3 (conforme cuidaremos de expor mais adiante), de forma a evidenciar a necessidade de certeza visual a respeito do delito ou de seu autor, ou de ambos, conforme a modalidade do art. 302 do CPP de que se cuidar. A situação de flagrante delito reclama, em regra, atualidade e visibilidade, daí por que a afirmação de ANTONIO SCARANCE FERNANDES4 no sentido de que para a prisão em flagrante exige-se que alguém, por ter assistido ao fato, possa atestar a sua ocorrência, ligando-o a quem venha a ser surpreendido na sua prática. E esclarece referindo-se à visibilidade tratar-se de “algo externo que se junta à situação de flagrância”. A visibilidade, todavia, não é elemento essencial a toda espécie de flagrante, haja vista a possibilidade de ser efetuada sob tal fundamento a prisão daquele que é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração (art. 302, III, do CPP), bem como daquele que é encontrado, logo depois, em situação que faça presumir ser o autor da infração (art. 302, IV, do CPP). Nestes casos há apenas uma presunção a respeito de quem seja o autor da infração, e isso em razão de particularidades subsequentes ao fato, nas quais a lei preferiu confiar, o que demonstra que não há visibilidade concomitante ou contemporânea à execução do delito, mas posterior. A visibilidade do fato que se imputa a uma determinada pessoa somente integra o flagrante em sentido próprio, assim considerado aquele em que o agente está cometendo a infração penal ou acaba de cometê-la. Em termos jurídicos, e numa fórmula bastante objetiva, flagrante é o delito que está sendo ou que acabou de ser cometido, não sendo possível confundir tal proposição com as situações de flagrante reguladas no art. 302 do CPP e as reflexões que delas se extraem5, as quais serão objeto de análise mais adiante, em momento oportuno. Referindo-se às vantagens da prisão em flagrante, HÉLIO TORNAGHI destacou que ela “tira seu valor não só do interesse em dar relevo à flagrância, como também do fato de que ela, a prisão, nessas circunstâncias, tem tríplice efeito: I — a exemplariedade: serve de advertência aos maus; II — a satisfação: restitui a tranquilidade aos bons; III — o prestígio: restaura a confiança na lei, na ordem jurídica e na autoridade”. E arrematou dizendo: “Eventualmente, a prisão em flagrante logra ainda: a) frustrar o resultado, evitando a consumação do crime ou, pelo menos, o seu exaurimento; b) proteger o preso contra a exasperação do povo”6. Conforme se extrai da Constituição Federal e do CPP, a prisão em flagrante não tem por finalidade a prisão do investigado, mas permitir a colheita da prova disponível, referente a todas as circunstâncias do delito quando ainda permeado de atualidade, o que sem sombra de dúvida representa vantagens em termos de apuração dos fatos. Tanto isso é exato que sempre se permitiu, e ainda se permite, após a lavratura do auto de prisão em flagrante, a subsequente soltura do autuado mediante liberdade provisória — com ou sem fiança a depender da hipótese — salvo quando presentes os requisitos da prisão preventiva. Colhida a prova disponível, em regra o autuado deve ser recolocado em liberdade, o que evidencia a finalidade apontada.
2.1. Excepcionalidade da prisão em flagrante Nos precisos termos do art. 5º, LXI, da CF7, ninguém será preso senão em flagrante delito ou por
ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente. Por ser um mal necessário, que contraria, inclusive, a presunção de inocência (estado de inocência ou presunção de não culpabilidade)8, toda prisão deve ser precedida de ordem expressa e fundamentada de autoridade judiciária competente. A licença constitucional para a prisão em flagrante como exceção (sem ordem judicial prévia)9 atende a uma questão lógica, haja vista ser impossível a quem quer que seja antever o local, dia e hora em que determinada pessoa irá praticar certo tipo de delito, e com base em tais informações obter prévia ordem judicial de prisão10. Não fosse a ressalva constitucional, situações de flagrante delito restariam sem resposta jurídica adequada e imediata. Excepcional que é, a prisão em flagrante só se legitima diante de uma das situações listadas no art. 302 do CPP11.
2.2. Prisão em flagrante no interior de residência Observada a regra contida no art. 5º, XI, da Carta Magna, é possível o ingresso em residência sem mandado judicial, para se efetivar prisão em flagrante12, mesmo à noite13. “A casa é o asilo inviolável do cidadão enquanto respeitada sua finalidade precípua de recesso do lar. Isso porque o direito constitucional de inviolabilidade domiciliar não se estende a lares desvirtuados”14. “A Constituição Federal autoriza a prisão em flagrante como exceção à inviolabilidade domiciliar, prescindindo de mandado judicial, qualquer que seja sua natureza”15.
2.3. Infrações que admitem prisão em flagrante A permissão constitucional para que alguém seja preso em flagrante atende a interesses sociais e de justiça, envolvendo a ideia de necessidade e utilidade, na exata medida em que permite fazer cessar a perturbação da ordem e a atividade criminosa, evitando, em alguns casos, a prática de delito mais grave, e possibilita a colheita de provas no calor dos acontecimentos, tais como a oitiva dos envolvidos e testemunhas, apreensão de arma e objetos que tenham relação com o fato, daí por que a maioria dos casos em que ocorre prisão em flagrante terminar em condenação. Adotado o sistema bipartido, o Direito Penal brasileiro divide as infrações penais em crimes e contravenções. Ao referir-se à prisão em flagrante o texto constitucional fala em “flagrante delito”16, expressão igualmente utilizada no art. 302 do CPP, que também se refere à prática de “infração penal”. Como se vê, é possível a prisão em flagrante pela prática de crime, doloso ou culposo, ou contravenção penal, observadas as restrições que cuidaremos de expor mais adiante. Necessário anotar, desde logo, que não se imporá prisão em flagrante em relação à prática de infração penal a que não for isolada, cumulativa ou alternativamente cominada pena privativa de liberdade, conforme determina o § 1º do art. 283 do CPP introduzido pela Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011.
2.4. Natureza jurídica A prisão em flagrante é ato de natureza administrativa17, muito embora o auto respectivo possa eventualmente ser presidido por autoridade judiciária, conforme dispõe o art. 307 do CPP.
Configura modalidade de medida cautelar de natureza pessoal, privativa da liberdade, e como tal está condicionada à demonstração dos requisitos da cautelaridade. Reclama-se, portanto, a presença de fumus boni juris, que será evidenciado na tipicidade da conduta imputada e existência de indícios da autoria (fumus commissi delicti), e o periculum in mora, que é presumido nos casos típicos de flagrância tratados no art. 302 do CPP. O objetivo da prisão em flagrante — por nós identificado como a colheita da prova ardente18 — é que justifica a afirmação da necessidade dos requisitos apontados, visto que assim compreendida, tem por escopo garantir o resultado final do processo ou ao menos influenciar positivamente na colheita da prova (ou parte dela) que servirá de base para sua instauração. Para AURY LOPES JR.: “A prisão em flagrante é uma medida pré-cautelar, de natureza pessoal, cuja precariedade vem marcada pela possibilidade de ser adotada por particular ou autoridade policial, e que somente está justificada pela brevidade de sua duração e o imperioso dever de análise judicial em até 24 h, onde cumprirá ao juiz analisar sua legalidade e decidir sobre a manutenção da prisão (agora como preventiva) ou não”. E segue: “A instrumentalidade manifesta-se no fato de o flagrante ser uma strumenti dello strumento — a prisão preventiva; ao passo que a autonomia explica as situações em que o flagrante não gera a prisão preventiva ou nos demais casos, em que a prisão preventiva existe sem prévio flagrante. Por isso, qualquer pessoa ou a autoridade policial podem prender em flagrante sem ordem judicial”19. A visão apontada tem em conta que a prisão em flagrante não é uma medida cautelar pessoal, mas sim “pré-cautelar, no sentido de que não se dirige a garantir o resultado final do processo, mas apenas destina-se a colocar o detido à disposição do juiz para que adote ou não uma verdadeira medida cautelar”20. Quer nos parecer, entretanto, que não se desenha razoável a privação da liberdade de quem quer que seja — ainda que por no máximo 24 horas — apenas para que depois o juiz possa verificar a necessidade e adequação de outras providências cautelares, cuja aplicação sabidamente prescinde de tal privação precedente.
2.5. Sujeitos do flagrante 2.5.1. Sujeito ativo Sujeito ativo é quem efetua a prisão. Qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito. É o que diz expressamente o art. 301 do CPP. Nos precisos termos do art. 292 do CPP, “se houver, ainda que por parte de terceiros, resistência à prisão em flagrante ou à determinada por autoridade competente, o executor e as pessoas que o auxiliarem poderão usar dos meios necessários para defender-se ou para vencer a resistência, do que tudo se lavrará auto subscrito também por duas testemunhas”. 2.5.1.1. Flagrante facultativo A lei permite que qualquer pessoa prenda em flagrante aquele que se encontrar numa das situações a que se refere o art. 302 do CPP. Fala-se nesta hipótese em flagrante facultativo, pois não há uma determinação no sentido de que o popular assim proceda. O particular não está obrigado a efetuar a prisão em flagrante, mas apenas
autorizado a assim proceder quando evidenciada situação legitimadora, sem que possa ser responsabilizado pela prática de atos que impliquem restrição à liberdade de outrem — função eminentemente estatal que apenas por exceção pode praticar. Aliás, embora a autorização legal esteja expressa, é sempre melhor que a prisão seja realizada por policiais e seus agentes, treinados que são para o exercício de tal atividade de risco. Nada obstante a ausência de previsão expressa a respeito, não está o particular impedido de realizar a apreensão de objetos e coisas que interessem à apuração do fato, especialmente naquelas hipóteses em que a ausência da cautela for capaz de acarretar o perecimento da prova. Não se deve perder de vista, entretanto, a regra do art. 6º, I e II, do CPP, segundo o qual, logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial deverá dirigir-se ao local e providenciar para que não se alterem o estado e conservação das coisas, até a chegada dos peritos criminais, bem como apreender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais. 2.5.1.2. Flagrante obrigatório ou compulsório A efetivação da prisão em flagrante é providência obrigatória para as autoridades policiais e seus agentes, sempre que se depararem com qualquer das situações delineadas no art. 302 do CPP. Trata-se de dever inerente ao cargo; que decorre do exercício das funções. A ausência das providências cabíveis acarretará consequências de natureza administrativa, por evidenciar falta funcional, podendo ainda ensejar responsabilização criminal, caso fique demonstrado que a desídia teve por escopo à satisfação de interesse ou sentimento pessoal, nos termos do que dispõe o art. 319 do CP (crime de prevaricação) 21. Poderão, ainda, e segundo JULIO F. MIRABETE, responder “eventualmente pelo resultado causado pelo agente se podiam evitar a consumação do crime (art. 13, § 2º, a, do CP)”. E acrescenta: “Não há restrição, evidentemente, ao fato de que os agentes policiais estejam fora de sua circunscrição territorial, mesmo porque qualquer pessoa pode efetuar a prisão em flagrante”22.
2.5.2. Sujeito passivo Sujeito passivo é o indivíduo preso em situação de flagrante delito. Em regra, qualquer pessoa pode ser presa em flagrante, desde que evidenciadas as situações legitimadoras da custódia cautelar de que ora se cuida. A regra, todavia, comporta exceções. De tal sorte, não podem ser presos em flagrante delito: 1º) em razão da inimputabilidade: os menores de 18 anos, sujeitos às normas da legislação especial (art. 228 da CF; art. 27 do CP). Entenda-se, sujeitos às regras do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n. 8.069, de 13-7-1990); 2º) em razão do cargo que ocupa: o Presidente da República (art. 86, § 3º, da CF)23; 3º) em decorrência de tratados e convenções: os diplomatas estrangeiros (art. 1º, I, do CPP); 4º) em decorrência de pronto e integral socorro prestado à vítima: o condutor de veículo, nos casos de acidente de trânsito de que resulte vítima (art. 301 da Lei n. 9.503, de 23-9-1997 — Código de Trânsito Brasileiro)24; 5º) em razão da ausência de condição de procedibilidade: o autor de delito de ação penal pública condicionada à representação do ofendido ou requisição do Ministro da Justiça (art. 24 do CPP; art.
129, I, da CF), e o autor de infração penal sujeita a ação penal privada exclusiva (arts. 19 e 38 do CPP), não poderão ser presos em flagrante sem a manifestação positiva de vontade do ofendido ou seu representante legal, sendo caso (art. 5º, §§ 4º e 5º, do CPP); 6º) em razão da natureza da infração: em se tratando de infração penal da competência dos Juizados Especiais Criminais, dispõe o parágrafo único do art. 69 da Lei n. 9.099, de 26 de setembro de 1995, que: “o autor do fato que, após a lavratura do termo, for imediatamente encaminhado ao juizado ou assumir o compromisso de a ele comparecer”. Deste também não se exigirá fiança. Em caso de violência doméstica, o juiz poderá determinar, como medida de cautela, seu afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a vítima; 7º) também em razão na natureza da infração: aquele que se der à prática de infração penal a que não for isolada, cumulativa ou alternativamente cominada pena privativa de liberdade, conforme determina o § 1º do art. 283; 8º) ainda em razão da natureza da infração: aquele que cometer o delito previsto no art. 28 da Lei de Drogas — Lei n. 11.343, de 23 de agosto de 2006 (caput: posse de droga para consumo pessoal; § 1º: semear, cultivar ou colher plantas tóxicas para consumo pessoal), devendo o autor do fato ser imediatamente encaminhado ao juízo competente ou, na falta deste, assumir o compromisso de a ele comparecer, lavrando-se termo circunstanciado e providenciando-se as requisições dos exames e perícias necessários25. A respeito do flagrante, em se tratando de conduta prevista no art. 28, para melhor ilustrar, pedimos venia para transcrever parte de excelente artigo da lavra de LUIZ FLÁVIO GOMES, onde a matéria foi analisada nos seguintes termos: “O que significa ‘não se imporá prisão em flagrante’? Isso significa duas coisas: (a) que não haverá lavratura do auto de prisão em flagrante; (b) que não haverá recolhimento do sujeito ao cárcere. A correta compreensão do dispositivo exige recordar que a prisão em flagrante conta com quatro momentos distintos: (a) captura do agente (no momento da infração ou logo após a sua realização); (b) sua condução coercitiva até à presença da autoridade policial (ou judicial); (c) lavratura do auto de prisão em flagrante e (d) recolhimento ao cárcere. A locução ‘não se imporá prisão em flagrante’ não alcança os dois primeiros momentos acima referidos, ou seja, mesmo em se tratando da infração sui generis do art. 28, ainda assim, uma vez surpreendido o agente em posse de droga para consumo pessoal (ou em posse de planta tóxica), sua captura será concretizada normalmente. É sempre preciso fazer cessar o ilícito (a situação de ilicitude que retrata uma ofensa ou perigo para o bem jurídico). O agente é capturado e conduzido coercitivamente até à presença da autoridade judicial (ou, na falta, à autoridade policial). Os dois primeiros momentos do flagrante acontecem (captura e condução coercitiva). Já os dois últimos (lavratura do auto de prisão em flagrante e recolhimento ao cárcere) acham-se eliminados, no caso do art. 28 (assim como das demais hipóteses de menor potencial ofensivo, contidas na lei nova)”26. Há que se considerar, ainda, que, levando em conta a relevância dos cargos que ocupam e funções que exercem, somente poderão ser presos em flagrante quando a hipótese tratar de crime inafiançável: 1º) os Membros do Ministério Público (art. 40, III, da Lei n. 8.625, de 12-2-1993 — LONMP)27; 2º) os magistrados (art. 33, II, da Lei Complementar n. 35, de 14-3-1979 — LOMN)28; 3º) os advogados (art. 7º, § 3º, da Lei n. 8.906, de 4-7-1994)29; 4º) os deputados estaduais (art. 27, § 1º, da CF)30;
5º) os membros do Congresso Nacional — senadores e deputados federais, desde a expedição do diploma, devendo o agente ser encaminhado à respectiva Casa Legislativa, que decidirá sobre a prisão pelo voto da maioria absoluta de seus membros (art. 53, § 2º, da CF)31. Conforme ensinou JULIO F. MIRABETE, “é lícita a prisão dos alienados mentais, embora inimputáveis, já que a eles pode ser aplicada medida de segurança, cabendo no caso a instauração do incidente de insanidade mental (art. 149 do CPP)”32.
2.6. Autoridade competente É nulo o auto de prisão em flagrante lavrado por quem não preenche a condição de autoridade33. Autoridade competente é, em regra, o delegado de polícia no exercício de polícia judiciária na circunscrição34. Nos precisos termos do art. 4º do CPP, a polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e respectiva autoria. Ressalva, entretanto, o parágrafo único do art. 4º, que a atribuição de “competência” à polícia judiciária não exclui a de autoridade administrativa diversa, a quem por lei seja cometida a mesma função. Bem por isso o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula 397, que tem a seguinte redação: “O poder de polícia da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, em caso de crime cometido nas suas dependências, compreende, consoante o regimento, a prisão em flagrante do acusado e a realização do inquérito”. O art. 307 do CPP menciona a possibilidade de a prisão em flagrante ser realizada por juiz de direito, a quem competirá a lavratura do auto. Diz o art. 308 do CPP que, não havendo autoridade no lugar em que se tiver efetuado a prisão, o preso será logo apresentado à do lugar mais próximo. No tocante à possibilidade de ser a prisão em flagrante levada a efeito por guardas municipais, cabe ressaltar inicialmente que “a Constituição Brasileira estabelece, de maneira segura, as competências das polícias e impôs séria restrição à atuação das guardas municipais, vedando a realização de policiamento ostensivo, que compete à Polícia Militar, e de atos de apuração de fato criminoso, uma vez que são eles reservados à Polícia Judiciária”35. De tal sorte, não se aplica aos integrantes das guardas municipais a regra que obriga às autoridades e seus agentes a execução da prisão em flagrante quando identificada a hipótese (flagrante obrigatório). Todavia, considerando que a prisão em flagrante pode ser executada por qualquer do povo (flagrante facultativo), é correto entender que os integrantes das guardas municipais podem, como qualquer pessoa, executar prisão em flagrante. O Superior Tribunal de Justiça bem cuidou da matéria por ocasião do julgamento do ROHC 9.142SP, 5ª Turma, de que foi relator o Ministro JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, quando então decidiu não haver ilegalidade na conduta de guardas municipais que, diante da prática de tráfico de drogas, crime de natureza permanente, despidos de mandado judicial, deram voz de prisão e apreenderam a droga que se encontrava em poder do portador ou depositário36.
3. CLASSIFICAÇÕES Com propriedade e de forma objetiva, conceitua GAMA MALCHER que flagrante delito é uma situação
de evidência da prática de uma infração penal, por parte de alguém37.. O rol das situações que autorizam prisão em flagrante é taxativo. O art. 302 do CPP não comporta interpretação extensiva ou integração analógica. A taxatividade decorre da própria necessidade de se restringir as hipóteses de prisão sem pena, e a impossibilidade de se ampliar o alcance do texto legal, por qualquer técnica de interpretação ou expediente diverso, é evidente. Observadas as disposições do art. 302 do CPP e, portanto, levando em consideração a situação em que se encontrar o agente em relação a determinado delito, temos a seguinte classificação: 1º) flagrante em sentido próprio (também chamado de flagrante propriamente dito; real; verdadeiro ou perfeito); 2º) flagrante impróprio (também chamado de quase flagrante; irreal ou imperfeito); e 3º) flagrante presumido (também chamado flagrante ficto; fictício ou assimilado). Fala-se ainda em: flagrante preparado ou provocado; flagrante forjado, flagrante esperado; flagrante prorrogado, protelado, retardado ou postergado. Quanto ao sujeito ativo, assim considerado aquele que efetua a prisão-captura, temos o flagrante facultativo e o flagrante , compulsório, hipóteses já analisadas nos itens “2.5.1.1” e “2.5.1.2”, respectivamente.
3.1. Flagrante em sentido próprio Também chamado de flagrante propriamente dito, real, verdadeiro ou perfeito, está previsto no art. 302, I e II, do CPP, e ocorre quando o agente é surpreendido no momento em que está cometendo a infração penal, ou acabou de cometê-la. Na primeira hipótese, o agente é surpreendido durante o iter criminis, podendo o delito ser consumado ou ficar na forma tentada. Na segunda, o agente acaba de cometer a infração penal, tentada ou consumada, e é igualmente capturado em flagrante. Divergimos de EDILSON MOUGENOT BONFIM38 quando afirma que a segunda hipótese implica que o delito já se tenha consumado39. É perfeitamente possível, e a rotina forense assim demonstra, que alguém seja preso em flagrante por ter acabado de cometer furto tentado, roubo tentado, homicídio tentado etc. De igual maneira discordamos das conclusões do citado jurista quando afirma que a hipótese do inciso II “é de presunção, não configurando, a rigor, flagrante próprio”40. Com efeito, cuida o inciso em testilha de situação em que o autor da infração penal é visto no momento em que acaba de cometer o delito, e não logo após ou logo depois. Há uma relação de imediatidade e, portanto, uma situação de concomitância entre a conduta praticada pelo infrator e a percepção visual daquele que a seguir irá efetuar sua prisão- -captura. Para TOURINHO FILHO, “deve haver uma quase absoluta relação de imediatidade”41, ou, como prefere FERNANDO CAPEZ, “o agente deve ser encontrado imediatamente após o cometimento da infração penal (sem qualquer intervalo de tempo)”42. Em qualquer das situações de flagrante próprio haverá sempre atualidade e visibilidade. Para legitimar o flagrante é imprescindível que o delito seja atual (... está cometendo a infração penal, ou acabou de cometê-la). As situações tratadas pressupõem, ainda, uma certeza visual em relação ao delito e também em
relação à pessoa que a ele se liga como seu autor.
3.2. Flagrante impróprio Também chamado quase flagrante, irreal ou imperfeito. A lei considera em situação de flagrante delito aquele que é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração (art. 302, III, do CPP)43. A perseguição de que ora se cuida deve ser ininterrupta44 e seguir-se logo após a prática da infração penal, “de modo a caracterizar a imediatidade e continuidade que a legitimam como prisão em flagrante”45. Pressupõe certeza a respeito do itinerário do autor do fato, de maneira que a prisão levada a efeito horas depois do ilícito, por agentes que se colocaram na via pública à procura do infrator, mas sem saber exatamente onde este se encontrava, de flagrante impróprio nada tem46, embora possa caracterizar hipótese de flagrante presumido, conforme veremos adiante. “Não se pode confundir flagrância com diligências policiais post delictum, cujo valor probante, por mais forte que pareça, não se encadeie em elos objetivos que entrelacem, indissoluvelmente, no tempo e no espaço, a prisão e a atualidade palpitante do crime”47. É evidente que a prisão levada a efeito no dia seguinte ao delito48 ou vários dias depois49 não pode ser considerada em flagrante se não ocorreu perseguição ininterrupta; incessante50. Havendo perseguição, contudo, a prisão será legítima, ainda quando levada a efeito dias depois do crime, e mesmo em outro Estado da Federação51. Conforme disciplina o art. 290, caput, do CPP, aplicável à hipótese em questão: “Se o réu, sendo perseguido, passar ao território de outro município ou comarca, o executor poderá efetuar-lhe a prisão no lugar onde o alcançar, apresentando-o imediatamente à autoridade local, que, depois de lavrado, se for o caso, o auto de flagrante, providenciará para a remoção do preso”. E acrescenta o § 1º: “Entender-se-á que o executor vai em perseguição do réu, quando: a) tendo-o avistado, for perseguindo-o sem interrupção, embora depois o tenha perdido de vista; b) sabendo, por indícios ou informações fidedignas, que o réu tenha passado, há pouco tempo, em tal ou qual direção, pelo lugar em que o procure, for no seu encalço”. A literalidade do dispositivo acima invocado permite entender que em determinadas situações a perseguição poderá sofrer solução de continuidade e ainda assim justificar prisão em flagrante. A questão não é pacífica na doutrina52 e jurisprudência, e segundo pensamos só a perseguição ininterrupta é que legitima a captura flagrancial. Se durante a perseguição o autor do delito ingressar em residência alheia, o morador será instado a entregá-lo. Se não for obedecido imediatamente, o executor da perseguição convocará duas testemunhas e, sendo dia, entrará à força na casa, arrombando as portas, se preciso; sendo noite, o executor, depois da intimação ao morador, se não for atendido, fará guardar todas as saídas, tornando a casa incomunicável, e, logo que amanheça, arrombará as portas e efetuará a prisão, caso necessário, conforme decorre dos arts. 293 e 294 do CPP. No caso do flagrante impróprio, leciona FERNANDO CAPEZ, “a expressão ‘logo após’ não tem o mesmo rigor do inciso precedente (‘acaba de cometê-lo’). Admite um intervalo de tempo maior entre a prática do delito, a apuração dos fatos e o início da perseguição. Assim, ‘logo após’ compreende todo o espaço de tempo necessário para a polícia chegar ao local, colher as provas elucidadoras da ocorrência do delito e dar início à perseguição do autor”53.
Há que se pensar, contudo, em prazo razoável, não se justificando a prisão em flagrante levada a efeito em razão de perseguição iniciada horas depois do cometimento do delito, fundamentada em dificuldades operacionais da polícia judiciária. “A perseguição não se confunde com a investigação da autoria ou busca da coisa e deve ser iniciada in continenti, sem sofrer solução de continuidade, podendo a prisão distanciar-se um pouco da prática do ilícito”54. É necessário, portanto, que a perseguição se inicie logo após a prática da infração penal (tentada ou consumada), e enquanto durar será possível a prisão em flagrante55. É possível, portanto, que a prisão ocorra horas e mesmo dias depois do cometimento do delito, desde que ocorra perseguição ininterrupta durante todo o período que intermedeia um e outro extremo, daí o acerto de FERNANDO CAPEZ quando afirma que “não tem qualquer fundamento a regra popular de que é de vinte e quatro horas o prazo entre a hora do crime e a prisão em flagrante, pois, no caso de flagrante impróprio, a perseguição pode levar até dias, desde que ininterrupta”56.
3.3. Flagrante presumido Também chamado flagrante ficto; fictício ou “assimilado”57. Pela redação do art. 302, IV, do CPP, legitima-se a prisão em flagrante daquele que é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração58. Neste caso, embora a infração penal deva estar impregnada de atualidade, não se exige certeza visual de quem seja seu autor; não se exige tenha sido surpreendido quando estava cometendo ou acabara de cometê-la. A visibilidade que se pode reclamar, na hipótese, não liga o agente diretamente ao momento da prática do delito, mas a instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele o autor. Ele é encontrado quando tem em sua posse objetos que estão ligados à prática de determinado(s) delito(s), daí o silogismo permitido. O flagrante presumido também não reclama tenha havido a perseguição incessante de que trata o flagrante impróprio. O que a lei exige é que determinada pessoa seja “encontrada” logo depois da prática do delito portando algo que autorize concluir, ainda que num juízo a priori ou de dedução, seja autor ou partícipe do delito. Neste caso, pesará contra o agente “encontrado” nas condições tratadas a existência de indícios veementes de seu envolvimento com a prática delitiva. Na letra da lei, considera-se indício “a circunstância conhecida e provada, que tendo relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se a existência de outra ou outras circunstâncias” (art. 239 do CPP). Embora a lei se refira ao agente que é “encontrado”, o que pode levar alguém a concluir tratar-se de pessoa com identidade conhecida (se foi “encontrado” é porque estava sendo procurado e era conhecido), o correto é que não se exige seja conhecida sua identidade. Pensar o contrário terminaria por reduzir consideravelmente o alcance da regra, impedindo o êxito na prisão em flagrante de inúmeros criminosos. Discordamos de JOSÉ FREDERICO MARQUES, entretanto, para quem, na hipótese do art. 302, IV, do CPP, “não se sabe, ainda, quem é o autor da infração penal”59. O infrator tanto pode ser pessoa desconhecida como não. Não raras vezes, aliás, o autor é conhecido e passa a ser procurado, inclusive dispondo a polícia de
informações detalhadas a seu respeito. Como disse JULIO F. MIRABETE, “para a configuração da flagrância presumida nada mais se exige do que estar o presumível delinquente na posse de coisas que o indigitem como autor de um delito acabado de cometer”60. Há divergência doutrinária e jurisprudencial a respeito do alcance da expressão logo depois. “Logo após” (flagrante impróprio) e “logo depois” (flagrante presumido) são expressões que se equivalem? Cremos que não, muito embora uma interpretação puramente gramatical possa indicar o contrário e apontar o mesmo significado. De longa data a questão vem sendo analisada na doutrina e jurisprudência61, que majoritariamente tem entendido que a expressão “logo após” (flagrante impróprio) determina relação de proximidade e imediatismo com o delito em espaço de tempo inferior ao que determina a expressão “logo depois” (flagrante presumido). É dizer: a expressão “logo depois” é cronologicamente mais elástica que a expressão “logo após” e, portanto, indica maior espaço de tempo entre o delito e a prisão em flagrante. Como afirma FERNANDO CAPEZ: “Temos assim que a expressão ‘acaba de cometê-la’, empregada no flagrante próprio, significa imediatamente após o conhecimento do crime; ‘logo após’, no flagrante impróprio, compreende um lapso temporal maior; e, finalmente, o ‘logo depois’, do flagrante presumido, engloba um espaço de tempo maior ainda”62. Nesta linha de argumentação, por ocasião do julgamento do HC 269.962-3/3, TJSP, 2ª Câm., de que foi relator o Des. CANGUÇU DE ALMEIDA, ficou assentado que “a expressão ‘logo depois’ contida no inc. IV do art. 302 do CPP admite algum elastério interpretativo, de forma que não se entenda como imediatamente, incontinenti ou outra expressão semelhante”63.
3.4. Flagrante preparado ou provocado Também chamado delito de ensaio, delito putativo por obra do agente provocador, ou crime de experiência, na lição de NÉLSON HUNGRIA64, no flagrante preparado ou provocado o agente é insidiosamente levado, induzido, instigado por alguém à prática do delito, ao mesmo tempo que são adotadas providências suficientes para que ele não se consume. Se há induzimento à prática da conduta para que se dê a prisão em flagrante, a hipótese é de crime impossível por obra do agente provocador, sendo insubsistente o flagrante. A matéria já se encontra tratada na Súmula 145 do STF, que tem a seguinte redação: “Não há crime quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação”. Se, não obstante as providências adotadas, o crime se consumar, será legítima a prisão em flagrante, podendo, em certos casos, ser responsabilizado criminalmente também o agente provocador. Imagine-se hipótese em que alguém é induzido por policiais à prática de roubo e, não obstante as cautelas adotadas visando sua prisão em flagrante, de modo a evitar a consumação do crime, durante a tentativa de subtração ou em meio à intervenção policial o agente vem a efetuar disparo de arma de fogo que atinge a vítima do crime patrimonial. É evidente, neste caso, que a instigação ou induzimento foram preponderantes para a prática da conduta ilícita, tanto quanto sem eficácia as cautelas visando à preparação do flagrante, daí a justeza da conclusão que acima apontamos, no sentido da validade do flagrante. Hipótese bastante recorrente na prática judiciária envolve certos casos de tráfico de drogas
ilícitas65, quando policiais simulam a condição de compradores66 a fim de efetuar a prisão em flagrante e apreender a droga que o agente já conservava em seu poder. Em tais casos, comumente insurge-se a defesa com a alegação no sentido de ter ocorrido flagrante preparado. É certo, contudo, que referida tese defensória não pode vingar, pois a situação não enseja o reconhecimento do delito de ensaio67. Há que se distinguir com muito cuidado, em cada caso, a situação de fato tratada. Na hipótese exemplificada não ocorre flagrante preparado, pois o delito já estava caracterizado desde o momento em que o sujeito passivo do flagrante passou a ter em seu poder a droga que era destinada ao consumo de terceiros, de modo a evidenciar crime permanente68, não sendo desarrazoado lembrar que nas infrações permanentes entende-se o agente em flagrante delito enquanto não cessar a permanência (art. 303 do CPP). A conduta policial em nada influenciou na consumação do crime de tráfico, já configurado em sua plenitude com a prática de qualquer outro verbo típico (adquirir; ter em depósito; trazer consigo; guardar etc.). Quando da ação policial simulando condição de comprador, o crime de tráfico já estava consumado, até porque à configuração do referido delito não se exige seja o criminoso surpreendido na venda de droga a terceiros69. Nesta hipótese, conforme já se decidiu, “ainda que se reconhecesse a configuração de flagrante preparado em relação à venda de entorpecentes a policiais70, o mesmo não afetaria a anterior aquisição e a guarda para entregar a consumo a substância entorpecente, razão pela qual se tem como descabida a aplicação da Súmula 145 do STF, a fim de se ver reconhecido o crime impossível”71. Não existe flagrante preparado quando o crime não resulta da ação direta do agente provocador72. Estando a droga em poder e à disposição do traficante, destinada a consumo de terceiros, não há de cogitar de flagrante preparado. Evidencia-se o denominado flagrante esperado73. Diversa, entretanto, é a situação em que o policial induz alguém a adquirir/conseguir droga de que não dispunha, alegando intenção de comprá-la, para depois prendê-lo em flagrante em verdadeira situação de crime impossível74. Com efeito, “um crime que, além de astuciosamente sugerido e ensejado ao agente, tem suas consequências frustradas por medidas tomadas de antemão, não passa de um crime imaginário. Não há lesão, nem efetiva exposição a perigo de qualquer interesse público ou privado”75. “Se a situação de flagrante se dá pela ação do agente provocador, induzindo os réus à prática criminosa pela atuação forjada de policiais, consistente em fazer com que os acusados conseguissem a droga de terceiros para venda posterior, momento em que ocorre a prisão, e se os mesmos não guardavam, não traziam consigo, não tinham em depósito, tampouco expunham à venda substância entorpecente, não há falar na prática do delito de tráfico, mas em crime impossível, posto que, se não fosse a intervenção provocadora da autoridade policial, crime nenhum ocorreria”76.
3.5. Flagrante forjado Também pode ser denominado flagrante arquitetado, fabricado, montado, arranjado ou urdido. No flagrante forjado os policiais ou o particular criam, fabricam provas de um delito inexistente, com o objetivo de vincular e responsabilizar determinada pessoa a um ilícito penal que não cometeu77. Nesta hipótese não há delito, tentado ou consumado, que se possa imputar à pessoa presa em flagrante, daí por que insubsistente o flagrante que decorrer de prova forjada, ilicitamente fabricada.
Haverá, por outro vértice, crime praticado por aquele que forjar a existência de prova contra o terceiro prejudicado, v.g., abuso de autoridade; denunciação caluniosa etc. Situação comumente discutida na prática forense envolve a alegação defensória no sentido de que policiais fabricaram prova visando o êxito do flagrante em casos de apreensão de droga, realidade que somente a instrução criminal será capaz de aclarar. Oportuno registrar, nesse passo, que o testemunho policial goza de presunção de credibilidade. Para restar destituído de valor probante é necessária a demonstração de motivo sério e concreto, não sendo suficiente mera alegação desacompanhada de elementos de convicção. Não havendo comprovação do ânimo de incriminar injustamente, é perfeitamente válido o acréscimo oriundo da prova resultante de depoimentos prestados por agentes policiais. Há presunção juris tantum de que agem escorreitamente no exercício de suas funções78. Conforme irretocável lição do Min. CELSO DE MELLO, “o valor do depoimento testemunhal de servidores policiais — especialmente quando prestados em juízo, sob a garantia do contraditório — reveste-se de inquestionável eficácia probatória, não se podendo desqualificá-lo pelo só fato de emanar de agentes estatais incumbidos, por dever de ofício, da repressão penal. O depoimento testemunhal do agente policial somente não terá valor, quando se evidenciar que esse servidor do Estado, por revelar interesse particular na investigação penal, age facciosamente ou quando se demonstrar — tal como ocorre com as demais testemunhas — que as suas declarações não encontram suporte e nem se harmonizam com outros elementos probatórios idôneos”79.
3.6. Flagrante esperado Hipótese das mais comuns nas rotinas policial e forense, o flagrante esperado é aquele em que a polícia ou o terceiro, em razão de investigações preliminares ou informações anônimas, toma conhecimento prévio de que algum delito irá ocorrer em determinado local, dia e hora, e em razão disso adota providências visando à constatação dos fatos e prisão em flagrante de quem de direito. No flagrante esperado o executor da prisão simplesmente aguarda, espera o melhor momento para efetuar a captura, sem influenciar, de qualquer forma, no desiderato ilícito e na conduta do autor da infração. Sua intervenção não provoca nem induz o autor do fato delituoso a cometê-lo80. Não há, portanto, qualquer irregularidade ou ilegalidade no flagrante assim realizado81. Não se devem confundir as hipóteses de flagrante preparado com o flagrante esperado. Conforme assinala TOURINHO FILHO, citando NÉLSON HUNGRIA82: “Deve-se notar, porém, que já não há falar em crime putativo quando, sem ter sido artificiosamente provocada, mas previamente conhecida a iniciativa dolosa do agente, a este apenas se dá o ensejo de agir, tomando-se as devidas precauções”. E arremata: “Não se pode confundir o agente provocador com o funcionário policial que, informado previamente acerca do crime que alguém está praticando ou vai consumar, diligencie prendê-lo em flagrante, pois em tal hipótese a intervenção da autoridade não provocou nem induziu o autor do fato criminoso a cometê-lo”83. “No flagrante preparado, o agente é estimulado por terceiro para a prática da conduta típica, cuja finalidade é prendê-lo no momento da execução. No flagrante esperado, a autoridade fica atenta à conduta de alguém e a prende em flagrante (sem estimulá-la) quando executada conduta típica”84.
3.7. Flagrante prorrogado, protelado, retardado ou postergado Decorre do disposto no art. 301 do CPP que, em regra, a autoridade policial e seus agentes estão
obrigados a prender imediatamente quem quer se encontre em situação de flagrante delito, sob pena de falta funcional e eventual responsabilização penal (prevaricação, v.g.). Atento à complexidade das investigações envolvendo organizações criminosas, muitas vezes mais bem estruturadas e aparelhadas que o aparato policial, o legislador houve por bem, e acertadamente, instituir no art. 2º, II, da Lei n. 9.034, de 3 de maio de 1995 (Lei de Combate ao Crime Organizado), estratégia investigativa que convencionou denominar ação controlada, que na doutrina também é chamada de flagrante prorrogado, protelado, diferido ou retardado, onde a atuação policial poderá ser postergada estrategicamente, visando melhor êxito na elucidação dos fatos e prisão de outros envolvidos. A regra é aplicável exclusivamente quando a investigação tiver por foco atividades praticadas por “organizações criminosas” ou a elas vinculadas, não se prestando a outras hipóteses de incursões ilícitas. Na expressão da lei a ação controlada “consiste em retardar a interdição policial do que se supõe ação praticada por organizações criminosas ou a elas vinculada, desde que mantida sob observação e acompanhamento para que a medida legal se concretize no momento mais eficaz do ponto de vista da formação de provas e fornecimento de informações”85. Há quem entenda que o art. 53, II, da Lei de Drogas, elenca outra hipótese de flagrante diferido86. Ousamos divergir. De fato, é possível denominar a estratégia investigativa regulada no art. 53, II, da Lei de Drogas, como ação controlada (embora a lei assim não proceda expressamente), mas não para o fim de equipará-la à ideia de flagrante diferido ou protelado. A não atuação policial sobre os portadores de drogas, seus precursores químicos ou outros produtos utilizados em sua produção, que se encontrem no território brasileiro, com a finalidade de identificar e responsabilizar maior número de integrantes de operações de tráfico e distribuição, sem prejuízo da ação penal cabível, permite uma apuração policial mais eficaz no sentido de conseguir um maior conjunto de informações sobre as atividades de todos os envolvidos. De ver-se, entretanto, que não se trata de hipótese de “flagrante protelado”, também conhecido como flagrante prorrogado, flagrante retardado ou ação controlada. O que a lei autoriza, sob as condições que impõe, é a não atuação policial, ou seja, mesmo diante de hipótese de flagrante delito, não ocorrerá a prisão. Haverá inquérito e ação penal, mas não haverá prisão em flagrante precedente. Importante destacar que a não atuação policial só está autorizada em face dos “portadores”. Portar é o mesmo que trazer consigo. Portar e transportar, juridicamente, não significam a mesma coisa87. De tal sorte, os demais envolvidos, “não portadores”, deverão ser presos em flagrante delito, conforme se extrai da combinação do inciso II do art. 53 (Lei de Drogas) com as disposições contidas no art. 301 do CPP.
4. FLAGRANTE EM SITUAÇÕES PARTICULARES 4.1. Flagrante em crime permanente Levando em consideração o momento da consumação, os delitos podem ser classificados em instantâneos e permanentes.
Segundo DAMÁSIO E. DE JESUS, crimes instantâneos são “os que se completam num só momento. A consumação se dá num determinado instante, sem continuidade temporal. Ex.: homicídio, em que a morte ocorre num momento certo”. O mesmo Prof. DAMÁSIO ensina que os crimes permanentes “são os que causam uma situação danosa ou perigosa que se prolonga no tempo. O momento consumativo se protrai no tempo, como se diz na doutrina. Exs.: sequestro ou cárcere privado (art. 148), plágio ou redução a condição análoga à de escravo (art. 149) etc.”88. É preciso não confundir crime permanente com crime instantâneo de efeito permanente, tanto quanto é necessário distinguir consumação de exaurimento etc. O delito permanente se alonga indefinidamente no tempo, podendo seu autor interromper a qualquer momento a atividade ilícita, hipótese em que responderá pelos atos já praticados, daí a afirmação de BASILEU GARCIA no sentido de que: “No delito permanente, é poder do sujeito ativo sustar o procedimento criminoso, embora sem aptidão para fazer desaparecer a infração cometida. Se não lhe resta essa faculdade, é porque o delito é de natureza instantânea”89. Nas infrações permanentes, entende-se o agente em flagrante delito enquanto não cessar a permanência (art. 303 do CPP)90, estando juridicamente autorizada a prisão cautelar de que ora se cuida durante todo o período do iter criminis. Assevera TALES CASTELO BRANCO que “a adoção deste ponto de vista encontra seguro respaldo doutrinário, pois, se a flagrância existe enquanto o delito está sendo cometido, e, nas infrações permanentes, está sendo cometido enquanto dura a atividade criminosa, justifica-se essa ampliação repressiva, que poderá, ademais, trazer, na prática, benefícios sociais, desde que aplicada sem precipitadas generalizações”91. Dentre os mais rotineiros na atividade forense, são exemplos de crimes permanentes: sequestro e cárcere privado (art. 148 do CP); redução a condição análoga à de escravo (art. 149 do CP); violação de domicílio, na modalidade permanecer clandestina ou astuciosamente (art. 150 do CP); extorsão mediante sequestro (art. 159 do CP); posse irregular de arma de fogo de uso permitido (art. 12 da Lei n. 10.826/2003); posse irregular de arma de fogo de uso restrito (art. 16 da Lei n. 10.826/2003); tráfico de droga ilícita, em várias das modalidades previstas (art. 33 da Lei n. 11.343/2006)92; associação para o tráfico (art. 35 da Lei n. 11.343/2006)93. Não obstante a regra contida no art. 5º, XI, da Carta Magna, é possível o ingresso em residência sem mandado judicial para se efetivar prisão em flagrante94. Conforme já citamos, “a casa é o asilo inviolável do cidadão enquanto respeitada sua finalidade precípua de recesso do lar. Isso porque o direito constitucional de inviolabilidade domiciliar não se estende a lares desvirtuados”95.
4.2. Flagrante em crime habitual Crime habitual é aquele que exige pluralidade de ações para sua configuração, como são exemplos os crimes de curandeirismo (art. 284 do CP) e de exercício ilegal da medicina, arte dentária ou farmacêutica (art. 282 do CP). Para DAMÁSIO E. DE JESUS, crime habitual “é a reiteração da mesma conduta reprovável, de forma a constituir um estilo ou hábito de vida”. Daí concluir que “é delito único, constituindo a habitualidade uma elementar do tipo”96. À configuração do crime habitual — parte da doutrina tem apregoado amiúde —, é indispensável a
prática reiterada de determinadas condutas, que somente podem ser consideradas em conjunto para o efeito de implicar o reconhecimento de infração penal. Conforme sustenta este mesmo segmento doutrinário, as ações isoladas que devem somar-se para efeito de conformação típica, de per si, são tidas como indiferente penal97, daí a conclusão no sentido de ser impossível identificar estado flagrancial em crime habitual. Não nos parece correta, todavia, a afirmação no sentido de que é indiferente ao Direito Penal a ação isolada, e isso por pelo menos três razões bem claras: 1ª) Não pode ser considerada indiferente a ação isolada que necessariamente deve integrar o todo. Vale dizer: sem a soma das ações isoladas não se pode chegar ao todo: à afirmação de que houve crime; e isso basta para evidenciar a relevância das ações ditas isoladas. 2ª) Há que se considerar, ainda, que as ações parcelares, em verdade, não são nem podem ser verdadeiramente entendidas como isoladas, haja vista que somente a soma destas mesmas ações, que devem ser praticadas num mesmo contexto (embora em momentos distintos), com o mesmo objetivo, e, portanto, interligadas entre si, é que irá justificar o reconhecimento do crime habitual. 3ª) Admitir que a ação isolada é indiferente ao Direito Penal implicaria jamais poder afirmar o momento em que o crime habitual se consuma, o que evidentemente tem consequências contrárias ao bom senso. Acarretaria, ainda, permitir a prática ilimitada de ações ilícitas imunes à providência emergencial que é a prisão em flagrante, o que não nos parece razoável. Quantas e quais “ações isoladas” são necessárias para que se possa afirmar consumado um crime de curandeirismo? Ou um crime de exercício ilegal da medicina? Em verdade as ditas “ações isoladas” — que de isoladas nada têm, visto que integram objetiva e subjetivamente um todo que converge para finalidade única — integram o iter criminis, daí a prisão em flagrante se apresentar juridicamente possível98 e não ser razoável excluí-la a priori. Bem por isso, ao que parece, a opinião de ROGÉRIO GRECO no sentido de ser possível a tentativa nos crimes habituais99. Ademais, conforme escreveu JULIO F. MIRABETE: “(...) não é incabível a prisão em flagrante em ilícitos habituais se for possível, no ato, comprovar-se a habitualidade. Não se negaria a situação de flagrância no caso da prisão de responsável por bordel onde se encontram inúmeros casais para fim libidinoso, de pessoa que exerce ilegalmente a medicina quando se encontra atendendo vários pacientes etc.”100. De forma similar a outras tantas situações já analisadas, a realidade fática de cada caso concreto é que irá, ao final, revelar o cabimento, ou não, da prisão em flagrante em crime habitual.
4.3. Flagrante em crime continuado É no art. 71 do CP101 que encontramos as balizas para a compreensão do que a lei considera continuidade delitiva. O crime continuado é uma ficção jurídica; uma opção político-jurídica de natureza criminal que tem por escopo minimizar a pena daquele que cometeu dois ou mais delitos da mesma espécie que, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução ou outras semelhantes, devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro. Na lição de NÉLSON HUNGRIA, “historicamente, a continuação proveio de propósito generoso. Hoje, no entanto, deve-se atender, ainda, à finalidade da pena”102.
Para que ocorra continuidade o agente deve praticar, nas condições tipificadas no art. 71 do CP, dois ou mais delitos, sendo cada um deles considerado isoladamente para efeito de prisão em flagrante. Incidem na hipótese tratada as regras comuns do art. 302 do CPP. O reconhecimento da existência de continuidade delitiva em nada influencia no flagrante propriamente dito, contudo, renderá implicações em termos de competência jurisdicional, haja vista a determinação contida no art. 71 do CPP, no sentido de que, “tratando-se de infração continuada ou permanente, praticada em território de duas ou mais jurisdições, a competência firmar-se-á pela prevenção”; além daquelas relativas à pena a ser aplicada em caso de condenação (aplica-se a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços. Em relação aos crimes dolosos contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave ameaça, há regra específica no parágrafo único do art. 71 do CP).
4.4. Flagrante em crime de ação penal pública condicionada A ação pública é promovida pelo Ministério Público, dependendo, quando a lei o exige, de representação do ofendido ou de requisição do Ministro da Justiça103. A ação penal pública é a que se inicia por denúncia do Ministério Público104. Como ensina ROGÉRIO GRECO: “Diz-se incondicionada a ação penal de iniciativa pública quando, para que o Ministério Público possa iniciá-la ou, mesmo, requisitar a instauração de inquérito policial, não se exige qualquer condição. É a regra geral das infrações penais, uma vez que o art. 100 do Código Penal assevera que a ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente a declara privativa do ofendido”105. As ações penais públicas condicionadas se subdividem em: 1º) ações penais públicas condicionadas à requisição do Ministro da Justiça, e 2º) ações penais públicas condicionadas à representação do ofendido. Nas primeiras — públicas condicionadas à requisição do Ministro da Justiça —, não é possível a instauração do inquérito policial, tampouco o oferecimento de denúncia pelo Ministério Público, sem que se obtenha previamente a manifestação positiva de vontade do Ministro da Justiça. Para exemplo de crime de ação penal pública condicionada à requisição do Ministro da Justiça, ver o art. 7º, § 3º, b, do CP. No caso das segundas — ações penais públicas condicionadas à representação do ofendido —, também não é possível a instauração de inquérito policial, tampouco oferecimento de denúncia, sem que se obtenha previamente a manifestação positiva de vontade do ofendido ou seu representante legal. O § 4º do art. 4º do CPP é taxativo ao dispor que o inquérito, nos crimes em que a ação pública depender de representação, não poderá sem ela ser iniciado. São exemplos de crimes de ação penal pública condicionada à representação do ofendido: lesões corporais dolosas de natureza leve (art. 129, caput, do CP); ameaça (art. 147 do CP); lesão corporal resultante de acidente de trânsito (art. 303, caput, da Lei n. 9.503/97 — CTB)106. Lavrado o auto de prisão em flagrante, inicia-se automaticamente a partir dele um inquérito policial. Esta formalização da prisão constitui documento inaugural da investigação que irá se seguir no caderno investigatório que se chama inquérito. Sendo assim, caso o Ministro da Justiça não se encontre presente no momento em que possível a prisão em flagrante de uma determinada pessoa em razão da prática de crime de ação penal pública
condicionada à requisição Ministerial, ou, estando presente, não venha a formular requisição — entenda-se: externar sua manifestação autorizando a prisão por quem e contra quem de direito; a instauração do inquérito pela autoridade competente, e o oportuno oferecimento da denúncia pelo Ministério Público —, não será possível a prisão em flagrante. Neste caso, a efetivação do flagrante está condicionada, portanto, à presença do Ministro da Justiça no local e momento do flagrante, bem como sua manifestação positiva de vontade, autorizadora das providências cabíveis. Em se tratando de ação penal pública condicionada à representação do ofendido, idêntico raciocínio se impõe. É imprescindível que o ofendido, ou seu representante legal (sendo caso), se encontre no local e momento do flagrante, devendo externar, sem hesitação, seu desejo em ver realizada a prisão e instaurado o inquérito que ao final irá permitir eventual ajuizamento de ação penal pelo Ministério Público. A requisição do Ministro da Justiça e a representação do ofendido, nos casos que a lei estabelece, constituem condição de procedibilidade ou perseguibilidade sem a qual não se procede à prisão em flagrante, não se instaura inquérito policial, e não se encontra legitimado o Ministério Público para iniciar a persecução penal em juízo com o oferecimento de denúncia. Titular da ação penal, em ambos os casos, será sempre o Ministério Público (art. 129, I, da CF107; art. 24 do CPP108; art. 100, caput, do CP109), porquanto pública na essência a ação, mas a possibilidade de sua atuação se encontra condicionada ao desejo que deve ser externado por aqueles que a tanto se encontram legitimados.
4.5. Flagrante em crime de ação penal privada Os crimes de ação penal privada são aqueles em que o legislador legitimou o particular ofendido a promover a ação penal110, mediante a apresentação da petição inicial denominada queixa-crime, que deve ser distribuída em juízo, em regra, e sob pena de decadência, no prazo de seis meses a contar da data em que o ofendido tomou conhecimento de quem foi o autor do delito, ou, no caso de ação penal privada subsidiária da pública111, do dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento de denúncia pelo Ministério Público112. São exemplos de crimes de ação penal privada exclusiva: arts. 138, 139 e 140, c/c o art. 145, todos do CP. O auto de prisão em flagrante é peça inaugural de inquérito policial. Diz o art. 4º, § 5º, do CPP que, nos crimes de ação privada, a autoridade policial somente poderá proceder a inquérito se dispuser de requerimento de quem tenha qualidade para intentá-la. Disso decorre que a prisão em flagrante por crime de ação penal privada, como ocorre com as ações públicas condicionadas, também pressupõe a presença da vítima ou seu representante legal (sendo caso) no momento e local da infração, bem como sua oportuna manifestação positiva de vontade autorizando a prisão em flagrante e a instauração do inquérito pela autoridade competente. Não é demais recordar que esta manifestação positiva de vontade não supre a necessidade de que o ofendido, querendo, promova o oferecimento da queixa-crime (petição inicial das ações penais privadas) em juízo, no prazo decadencial. A propósito disso, diz o art. 19 do CPP que nos crimes de ação privada, após concluídas as investigações, os autos do inquérito serão remetidos ao juízo competente, onde aguardarão a iniciativa
do ofendido ou de seu representante legal, ou serão entregues ao requerente, se o pedir, mediante traslado. Fala-se em ação penal privada exclusiva porque a titularidade pertence exclusivamente ao ofendido ou seu representante legal. O Ministério Público é parte ilegítima para oferecer inicial acusatória por crime de ação penal que não seja pública.
4.6. Flagrante nas infrações penais de competência dos Juizados Especiais Criminais É possível a lavratura de prisão em flagrante como decorrência do cometimento de infração penal de menor potencial ofensivo. Nos precisos termos do art. 61 da Lei n. 9.099, de 26 de setembro de 1995 (Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais), consideram-se infrações penais de menor potencial ofensivo as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a dois anos, cumulada ou não com multa. Dispõe o parágrafo único do art. 69 da citada Lei: “Ao autor do fato que, após a lavratura do termo, for imediatamente encaminhado ao juizado ou assumir o compromisso de a ele comparecer, não se imporá prisão em flagrante, nem se exigirá fiança”. A regra determina que, tomando conhecimento do fato, a autoridade policial deverá providenciar a imediata lavratura do termo circunstanciado, que será encaminhado imediatamente com o autor do fato ao Juizado Especial Criminal competente para as providências cabíveis. Se o autor do fato concordar em se dirigir à sede do juizado, a ele não se imporá prisão em flagrante, ainda que cabível na hipótese por força das regras do art. 302 do CPP. Note-se, entretanto, que na grande maioria das comarcas não há Juizado Especial Criminal instituído e em funcionamento na forma da lei, e mesmo onde há Juizado em funcionamento quase sempre não é possível a imediata apresentação do autor do fato e do termo circunstanciado. Diante desta realidade, deverá a autoridade policial colher do autor do fato seu compromisso no sentido de que irá comparecer no juizado no dia e hora designados para ter lugar a audiência preliminar (arts. 70 e s. da Lei n. 9.099/95). Como se vê, em casos tais, somente será possível a prisão em flagrante se o autor do fato, surpreendido nas condições do art. 302 do CPP, após a lavratura do termo circunstanciado não concordar em se dirigir imediatamente à sede do Juizado Especial Criminal, tampouco assumir o compromisso de comparecer à audiência que por lá for designada. A Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011, introduziu um § 1º ao art. 283 do CPP, para dispor que as medidas cautelares previstas no Título IX, Livro I, do CPP, não se aplicam à infração a que não for isolada, cumulativa ou alternativamente cominada pena privativa de liberdade. Logo, estando a prisão em flagrante regulada no Capítulo II do Título IX do Livro I, resulta inaplicável a tais infrações penais. Há que se destacar, ainda, outra exceção, por se tratar de hipótese a que a lei procurou dar regulamentação diversa e impedir expressamente a prisão em flagrante. Cuida-se, in casu, das modalidades típicas previstas no art. 28, caput e § 1º, da Lei de Drogas (Lei n. 11.343, de 23-8-2006). Ocorrendo uma das condutas regradas no art. 28 da Lei n. 11.343/2006, conforme dispõe o § 2º do art. 48, “não se imporá prisão em flagrante, devendo o autor do fato ser imediatamente encaminhado ao
juízo competente ou, na falta deste, assumir o compromisso de a ele comparecer, lavrando-se termo circunstanciado e providenciando-se as requisições dos exames e perícias necessários”. Visando melhor compreensão da matéria, para evitar o enfaro da repetição sugerimos consulta ao item “2.5.2. Sujeito passivo”, deste Capítulo.
4.7. Flagrante estando o preso hospitalizado e/ou inconsciente Imagine-se hipótese em que durante ou logo após a prática da infração penal o preso em flagrante venha a se lesionar (queda ou acidente de trânsito durante a fuga, v.g.), ou ser lesionado (por ação/reação da vítima; de terceiros ou de policiais, mediante disparo de arma de fogo, golpe com instrumento cortante, contundente ou cortocontundente etc.), de maneira que seja necessário receba atendimento médico-hospitalar imediato e, em razão disso, seja levado a algum nosocômio onde deva permanecer internado para tratamento. Imagine-se, ainda, que para o atendimento médico adequado seja ele sedado e em razão disso deva permanecer, por algum tempo, em estado de inconsciência. Nestes casos, deverá a autoridade competente dirigir-se até o local em que se encontrar o autuado e lá efetuar a lavratura do auto de prisão em flagrante, observando as regras que adiante veremos. Estando o autuado inconsciente, ainda assim deverá lavrar o auto, fazendo constar tal particularidade e providenciar a colheita da assinatura de duas testemunhas instrumentárias ou de leitura, conforme regulado no § 3º do art. 304 do CPP, até porque, passada a situação de flagrância, não será possível a lavratura do auto, tampouco a prisão do increpado “por força do flagrante” após recuperar seu estado de consciência.
4.8. Apresentação espontânea do autor da infração penal Ensina TALES CASTELO BRANCO que “A certeza de quem seja o autor da infração é o principal objetivo do flagrante delito”. E segue: “Por isso, é patente o interesse social da imediata constatação do crime e se seu autor, decorrente do surpreendimento em flagrante, com a sua consequente documentação, através da lavratura do auto de prisão em flagrante. Alguns códigos dão mais importância à atualidade do crime, levando em conta o que o flagrante é em si próprio, ou seja, toda evidência no momento mesmo em que o crime estava sendo praticado; outros dão maior relevo à certeza decorrente do flagrante, tendo em vista sua contribuição para formar o convencimento”113. Seja como for, é inegável que o principal objetivo da prisão em flagrante é a colheita da prova prontamente disponibilizada, tanto que, conforme já alinhavamos, a regra impõe que tão logo seja lavrado o auto respectivo, o autuado deve ser colocado em liberdade, salvo se for hipótese de prisão preventiva, quando então deverá ser decretada. É evidente que, de alguma maneira, se presta a garantir o resultado final do processo, e não apenas colocar a pessoa do autuado à disposição do juiz para que este decida sobre a decretação, ou não, da prisão preventiva. Nos termos já destacados, não se desenha razoável a privação da liberdade de quem quer que seja — ainda que por no máximo 24 horas — apenas para que depois o juiz possa verificar a necessidade e adequação de outras providências cautelares, cuja aplicação sabidamente prescinde de tal privação precedente. Conforme a antiga redação do art. 317 do CPP: “A apresentação espontânea do acusado à
autoridade não impedirá a decretação da prisão preventiva nos casos em que a lei a autoriza”. Por força desta disposição legal eram justificados os argumentos daqueles que extraíam conclusão no sentido de que não era possível prisão em flagrante quando o autor da infração se apresentasse espontaneamente à autoridade policial após o cometimento do ilícito. Atualmente não há regra semelhante no CPP. Disso decorre que a apresentação espontânea do preso à autoridade logo após a prática do crime não impede a lavratura do flagrante se presente situação de flagrância114, até porque um dos objetivos desta providência cautelar é colher a prova que está ardente. Dir-se-á que a apresentação voluntária, por iniciativa do próprio autor da infração penal, afasta o periculum in mora. Mas não é bem assim. Na hipótese, deverá ser lavrado o auto de prisão, cumprindo ao juiz competente, e só a ele, analisar e decidir, por ocasião do art. 310 do CPP, qual ou quais providências adotar.
5. FORMALIZAÇÃO DA PRISÃO EM FLAGRANTE A prisão em flagrante compreende quatro momentos distintos: 1º) captura; 2º) condução; 3º) lavratura do auto de prisão em flagrante; e 4º) recolhimento do autuado ao cárcere. Captura é a detenção física do autor da infração penal e ocorre, portanto, no momento em que o agente é detido em uma das situações previstas no art. 302 do CPP. Como visto anteriormente, qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito, respeitadas as ressalvas legais. Feita a captura, na sequência deverá ocorrer a apresentação coercitiva do agente à presença da autoridade competente, caso a infração penal não tenha sido praticada na sua presença, hipótese em que deverá ser observado o que dispõe o art. 307 do CPP115. Condução, portanto, é o ato de apresentar, levar o preso em flagrante até a presença da autoridade competente. Efetivada a captura e a condução, apresentado o agente à autoridade competente, esta, se entender ser mesmo caso de prisão em flagrante, deverá providenciar a lavratura do auto respectivo. Efetivada a captura e a condução, apresentado o agente à autoridade competente, esta, se entender ser mesmo caso de prisão em flagrante, deverá providenciar a lavratura do auto respectivo. Antes de iniciar a lavratura do auto de prisão em flagrante a autoridade policial incumbida deverá comunicar a respeito da prisão a família do preso ou a pessoa por ele indicada (art. 5º, LXII, da CF), para que àquele se providencie a assistência que se julgar adequada e cabível no momento. Deverá a autoridade, ainda, informar o preso a respeito de seus direitos, entre os quais o de contar com assistência de advogado de sua confiança (art. 5º, LXIII, da CF). A ausência de comunicação da prisão à família ou à pessoa indicada pelo preso não acarreta o relaxamento do flagrante116. A ausência de advogado no momento da formalização da prisão também não implica nulidade do auto. Conforme já decidiu o STF: “A documentação do flagrante prescinde da presença do defensor técnico do conduzido, sendo suficiente a lembrança, pela autoridade policial, dos direitos constitucionais do preso de ser assistido, comunicando-se com a família e com profissional da advocacia, e de permanecer calado”117.
5.1. Lavratura do auto de prisão em flagrante
A lavratura do auto de prisão em flagrante consiste na formalização da prisão-captura levada a efeito, na forma e segundo os rituais do art. 304 do CPP. É a documentação diferida da prisão. Diz o art. 5º, LXI, da CF que “ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei”. É correto afirmar, portanto, que a única modalidade de prisão sem prévia ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária, constitucionalmente autorizada, é a decorrente de flagrante delito, e as razões são óbvias, já que não seria possível exigir ordem prévia nas hipóteses de flagrante, pois não se pode saber quem, quando e onde praticará qual delito, para expedir ordem prévia. Embora não se exija a prévia formalização de uma ordem de prisão com expedição de mandado, uma vez realizada a prisão em flagrante, é necessário, para a validade e legalização do ato, sua formalização com a lavratura do respectivo auto, impondo-se para esse mister estrita observância das regras que seguem tratadas. Nos precisos termos do art. 304 do CPP, que deve ser seguido à risca visando evitar irregularidade que fulmine a prisão em flagrante, apresentado o preso à autoridade competente, ouvirá esta o condutor e colherá, desde logo, sua assinatura, entregando a este cópia do termo e recibo de entrega do preso. Em seguida, procederá à oitiva das testemunhas que o acompanharem e ao interrogatório do acusado sobre a imputação que lhe é feita, colhendo, após cada oitiva, suas respectivas assinaturas, lavrando, a autoridade, afinal, o auto.
5.1.1. Prazo para a lavratura do auto de prisão em flagrante O CPP não fixa o prazo dentro do qual, após a prisão-captura, deve ser lavrado o auto de prisão em flagrante. O art. 306, §§ 1º e 2º, do CPP, entretanto, diz que em até vinte e quatro horas após a realização da prisão deverá ser encaminhado ao juiz competente o auto de prisão em flagrante, e entregue a nota de culpa ao preso. Realizada a prisão-captura, deve o condutor providenciar o necessário para a imediata apresentação do preso à autoridade, que deverá providenciar, na sequência, a lavratura do auto, na forma do art. 304 do CPP, para que dele possa enviar uma cópia ao juiz competente e também providenciar a entrega da nota de culpa, no prazo que a lei determina. Temos, pois, que a formalização da prisão deve seguir-se imediatamente à apresentação, que deverá ocorrer antes de vencido o prazo de vinte e quatro horas, contado da prisão-captura. Em algumas situações particulares, inclusive por força de distâncias geográficas, e até por força da situação que é tratada no art. 308 do CPP, poderá ocorrer que a apresentação do preso demande algumas horas para se realizar, o que é compreensível118. Não configura constrangimento ilegal, se diante de fatos complexos, que exigem a realização de diligências complementares, ocorrer demora de algumas horas para a lavratura119. Todavia, se o auto for lavrado após vencido o prazo indicado no § 1º do art. 306, o relaxamento da prisão será inevitável. Frise-se, entretanto, que “o atraso indevido na sua lavratura redunda na ilegitimidade da prisão, mas não na invalidade da condenação”120, até porque eventual nulidade do flagrante contamina apenas a prisão, jamais o processo121. O prazo máximo, portanto, para que a prisão seja formalizada e comunicada ao juiz competente é de vinte e quatro horas.
Disso decorre que, em certas situações muito particulares, a lavratura do auto de prisão poderá ocorrer no dia seguinte à prisão-captura, sem que disso se possa extrair mácula formal justificadora de relaxamento.
5.1.2. Autoridade competente para a lavratura do auto de prisão em flagrante Competente para a lavratura do auto pode ser: 1º) a autoridade do local onde o delito foi praticado; 2º) a autoridade do local onde ocorreu a prisão-captura; 3º) a autoridade da localidade mais próxima do local onde ocorreu a captura; 4º) a autoridade que tenha presenciado a infração; 5º) a autoridade contra quem se tenha praticado a infração, no exercício de suas funções, estando ela presente no momento do ilícito penal. Em regra, praticado o delito e não sendo hipótese de flagrante impróprio, onde há perseguição, ou de flagrante presumido, modalidade em que o agente é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos e papéis que façam concluir ser ele o autor da infração, a prisão em flagrante se verificará no local em que ocorreu o ilícito, devendo o infrator ser conduzido até a presença da autoridade da circunscrição, a quem incumbirá a lavratura do auto, sendo caso. Nas hipóteses de flagrante impróprio (art. 302, III, do CPP) e flagrante presumido (art. 302, IV, do CPP), poderá ocorrer que a prisão se verifique em localidade diversa daquela em que ocorreu a infração penal. Pode ocorrer, por exemplo, que o delito tenha sido praticado em um determinado município e, após perseguição, a efetivação da prisão se verifique em localidade diversa — hipótese de flagrante impróprio. Neste caso, autoridade competente para a lavratura do auto é aquela da circunscrição em que ocorreu a prisão-captura, e não a do local onde a infração penal foi praticada. Se a perseguição ultrapassar os limites de divisas entre Estados da Federação, ainda assim a regra deverá ser observada, pois não há qualquer ressalva a tal título no Código de Processo Penal. “O fato do auto de prisão em flagrante ser lavrado em local diverso da ocorrência não o torna nulo e isto em razão de não estarem as autoridades policiais submetidas à competência jurisdicional ratione loci”122. “Não há nulidade no fato de o auto de prisão em flagrante ter sido lavrado em localidade diversa da cena do delito, pois a polícia não exerce jurisdição, que é própria do Poder Judiciário, de maneira que não está limitada no seu campo de atuação”123. Não havendo autoridade no lugar em que se tiver efetuado a prisão, o preso deverá ser imediatamente apresentado à do lugar mais próximo, a quem incumbirá a formalização do auto respectivo124. Dispõe, por fim, o art. 307 do CPP125, a respeito das hipóteses em que o delito venha ser praticado em presença da autoridade, ou contra esta, no exercício de suas funções. Em ambos os casos, caberá à autoridade-testemunha ou à autoridade-vítima, respectivamente, presidir o auto de prisão em flagrante.
5.1.3. Condutor Condutor é aquela pessoa que faz a apresentação do preso à autoridade competente. A pessoa que leva; que conduz o preso até a autoridade. Por força do disposto no art. 301 do CPP, qualquer pessoa poderá figurar como condutor. Entendase: qualquer do povo; autoridades policiais e seus agentes. Em regra, não é possível imaginar a existência de flagrante válido sem que exista a figura do condutor, que assim deverá ser particularmente identificado no auto de prisão em flagrante, sob pena de nulidade do auto, justificadora do relaxamento da prisão, conforme veremos mais adiante.
Colhido o depoimento do condutor e sua respectiva assinatura, a autoridade deverá entregar-lhe cópia do termo referente às declarações que prestou, bem como recibo de entrega do preso. O art. 307 do CPP excepciona a obrigatoriedade da figura do condutor no auto de prisão em flagrante, nas hipóteses em que o delito for praticado em presença da autoridade, ou contra esta, no exercício de suas funções. Segundo parece óbvio, se a prisão em flagrante for precedida de apresentação espontânea, também não será possível cogitar a figura do condutor. Fora destes casos, a ausência de condutor implicará, sempre, nulidade do auto de prisão. Adotadas as providências em relação ao condutor, sendo caso, em seguida a autoridade incumbida da formalização da prisão deverá proceder à oitiva das testemunhas apresentadas para prestar informações a respeito dos fatos.
5.1.4. Testemunhas Pela palavra testemunha — disse MITTERMAIER —, “designa-se o indivíduo chamado a depor segundo sua experiência pessoal”126. Segundo MALATESTA: “O caráter fundamental do testemunho, aquele que o especifica como uma das formas particulares da afirmação de pessoa, diferenciando-o da outra forma particular chamada documento; o caráter fundamental, repito, do testemunho se baseia na oralidade; oralidade efetiva, em regra, ou também simplesmente potencial, por exceção. É esta a forma essencial, sem a qual a afirmação de pessoa não é testemunho”. E segue o tratadista: “Para que o homem, como pretende a presunção geral da veracidade humana, narre a verdade que percebeu, é necessário que não se tenha enganado percebendo, e que não queira enganar referindo”127. Toda pessoa poderá ser testemunha (art. 202 do CPP). Refere-se o caput do art. 304, entretanto, a testemunhas que tenham conhecimento a respeito do fato: testemunhas da infração. Até onde analisamos, determina o art. 304 do CPP que, por ocasião da lavratura do auto de prisão, devem ser ouvidos o condutor e testemunhas; no plural. Portanto, duas ou mais testemunhas. A jurisprudência, entretanto, admite seja o condutor considerado testemunha, bastando, portanto, para a legalidade formal do auto de prisão, a oitiva do condutor e mais outra testemunha128. Qualquer que seja o tipo de infração: dolosa ou culposa; crime ou contravenção; seja a pena cominada de prisão simples, detenção ou reclusão, a lei não particularizou o número de testemunhas que poderão ser ouvidas quando da lavratura do auto. Prestadas as declarações, que serão reduzidas a termo, as testemunhas deverão assinar os respectivos termos. A falta de testemunha da infração não impedirá o auto de prisão em flagrante; mas, nesse caso, com o condutor, deverão assiná-lo pelo menos duas pessoas que hajam testemunhado a apresentação do preso à autoridade (§ 2º do art. 304 do CPP). Neste caso, não se trata de testemunha da infração, mas de testemunha da apresentação do conduzido à autoridade competente. Bem por isso referidas testemunhas — ditas instrumentais ou indiretas — não prestarão declarações nos autos, mas apenas confirmarão, com suas assinaturas, a apresentação levada a efeito pelo condutor. O art. 304 do CPP não faz qualquer referência à necessidade de oitiva da vítima como requisito
formal do auto de prisão em flagrante, e é até compreensível, visto que em muitos casos não será possível identificar uma vítima certa e determinada, como ocorre nas infrações penais em que o sujeito passivo é a incolumidade pública. Mesmo sem negar esta realidade, entendemos que é de bom-tom que a autoridade proceda, sempre que possível, à oitiva circunstanciada da vítima, sujeito passivo da infração penal de que estará a tratar, e que por certo, no mais das vezes, terá valiosas informações a prestar já no auto de prisão em flagrante. Nos flagrantes envolvendo infrações penais submetidas à ação penal pública condicionada à representação ou ação penal privada exclusiva, a oitiva da vítima se reveste de particular relevância. Pois bem. Como diz o texto da lei, colhidas, reduzidas a termo e assinadas as declarações do condutor e das testemunhas, deve a autoridade passar imediatamente ao interrogatório do conduzido; apontado autor da infração penal.
5.1.5. Interrogatório Interrogatório é o ato pelo qual a autoridade que preside a formalização do flagrante questiona o conduzido a respeito da imputação que lhe é feita. Como providência preliminar ao interrogatório, o preso deverá ser informado a respeito de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado (art. 5º, LXIII, da CF). Como bem observou FLAVIA PIOVESAN129, “a partir da Carta de 1988, importantes tratados internacionais de direitos humanos foram ratificados pelo Brasil”, dentre eles a Convenção Americana de Direitos Humanos, que em seu art. 8º, II, g, estabelece que toda pessoa acusada de um delito tem o direito de não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a confessar-se culpada, consagrando assim o princípio segundo o qual ninguém está obrigado a produzir prova contra si mesmo”. Dando interpretação à regra, SYLVIA HELENA DE FIGUEIREDO STEINER ensina que “o direito ao silêncio diz mais do que o direito de ficar calado. Os preceitos garantistas constitucional e convencional conduzem à certeza de que o acusado não pode ser, de qualquer forma, compelido a declarar contra si mesmo, ou a colaborar para a colheita de provas que possam incriminá-lo”130. Nos termos do art. 15 do CPP, se o conduzido for pessoa menor de 21 anos (e maior de 18, é claro), ser-lhe-á nomeado curador especial pela autoridade policial. Nos dias que correm, entretanto, não há mais necessidade de se nomear curador especial na hipótese mencionada. A cautela legal levava em conta o fato de se considerar o sujeito passivo do flagrante pessoa relativamente incapaz, e seu desatendimento nulificava o auto. Não era necessário, contudo, que o curador especial fosse bacharel em direito ou advogado militante131, mas a nomeação não podia recair em investigador de polícia subordinado à autoridade policial que presidisse o auto132, ou policial lotado na mesma repartição em que formalizada a prisão133. Agora, e desde a vigência do Código Civil atual134, a pessoa maior de 18 anos é considerada absolutamente capaz para todos os atos da vida civil, inclusive para prestar depoimento em investigação contra si instaurada, o que afasta a necessidade de atendimento à regra do art. 15 do CPP. Some-se a isso o fato de que o art. 194 do CPP, que dispunha sobre a necessidade de nomeação de
curador especial ao réu menor quando de seu interrogatório em juízo, foi revogado pela Lei n. 10.792/2003. O civilmente identificado não será submetido à identificação criminal, salvo nas hipóteses excepcionadas em lei135 (art. 5º, LVIII, da CF). Tem também o preso direito à identificação dos responsáveis por sua prisão e por seu interrogatório policial (art. 5º, LXIV, da CF). Na expressão do art. 304, a autoridade policial deverá proceder ao interrogatório do acusado. É evidente que no momento da lavratura do auto não é correto falar em acusado. Neste caso, o termo a ser empregado é conduzido. No processo penal só é correto falar em acusado após o recebimento da inicial acusatória (denúncia ou queixa) em juízo. Portanto, entenda-se: a autoridade policial procederá ao interrogatório do conduzido. Apesar da atual incongruência da redação, não se trata propriamente de erro do legislador na escolha da palavra, embora fosse possível e recomendada a utilização de expressão diversa. Neste caso, o vocábulo acusado foi empregado pelas mesmas razões que no § 1º do art. 304 se fez constar que: a autoridade “prosseguirá nos atos do inquérito ou do processo”, e no § 3º novamente se fez referência ao acusado. A justificativa para a utilização das questionadas expressões remete ao fato de que, antes da Constituição Federal de 1988, os processos criminais envolvendo a prática de contravenções penais e delitos culposos contra a vida ou a integridade corporal tinham início com o auto de prisão em flagrante, portanto, na repartição policial. Bem por isso, e referindo-se às contravenções, disse HÉLIO TORNAGHI: “Em caso de contravenção, o auto de prisão em flagrante não é apenas, como no das demais infrações, peça inicial do inquérito; é o próprio ato iniciador do processo. A polícia, nesse caso, tem função quase jurisdicional, ou melhor, funciona como órgão de instrução”136. Aplicam-se ao interrogatório as regras do interrogatório judicial — arts. 185 a 195 do CPP —, naquilo que for compatível. Tendo o condutor e as testemunhas prestado suas declarações e assinado os termos respectivos, estando encerrado o interrogatório do conduzido, deverá a autoridade que preside a formalização do flagrante colher a assinatura deste, e depois lavrar o auto de prisão em flagrante, que é documento distinto, cuja regularidade e validade formal reclama estar acompanhado dos termos das declarações prestadas pelo condutor e testemunhas da infração (sendo caso) — ou, na falta destas, assinado pelas testemunhas da apresentação —, do termo de interrogatório do conduzido, do recibo de entrega do preso (recibo que é entregue ao condutor) e da nota de culpa. Se o conduzido se recusar a assinar, não souber ou não puder fazê-lo, o auto de prisão em flagrante será assinado por duas testemunhas que tenham ouvido sua leitura na presença deste. Na primeira hipótese o conduzido sabe assinar, mas se recusa a fazê-lo. Na segunda, por ser analfabeto, não sabe, sequer, assinar o próprio nome. Na terceira e última, embora saiba assinar e até se disponha a fazê-lo, assim não poderá proceder, por exemplo, em razão de encontrar-se com os braços quebrados, ou imobilizado sobre uma cama de hospital. Em qualquer das hipóteses acima tratadas, a autoridade que presidir o auto de prisão em flagrante deverá fazer constar a situação específica e providenciar a assinatura de duas testemunhas que tenham ouvido sua leitura na presença do conduzido. Por tais razões, referidas testemunhas são denominadas testemunhas instrumentárias ou de leitura.
5.1.6. Escrivão Oportuno consignar que na falta ou no impedimento do escrivão de polícia que irá redigir a documentação acima tratada, qualquer pessoa designada pela autoridade lavrará o auto, depois de prestado o compromisso legal, conforme regra contida no art. 305 do CPP.
5.1.7. Infração penal praticada na presença da autoridade, ou contra esta, no exercício de suas funções A lavratura do auto de prisão em flagrante ficará sujeita a ritual diverso quando: 1º) a infração penal for praticada em presença da autoridade; 2º) a infração penal for praticada contra autoridade, no exercício de suas funções. Nestes casos, conforme determina o art. 307 do CPP, constarão do auto a narração deste fato, a voz de prisão, as declarações que fizer o preso e os depoimentos das testemunhas, sendo tudo assinado pela autoridade, pelo preso e pelas testemunhas e remetido imediatamente ao juiz a quem couber tomar conhecimento do fato delituoso, se não o for a autoridade que houver presidido o auto. Note-se que não há a figura do condutor, e isso porque a infração penal, em qualquer das hipóteses tratadas, terá sido praticada na presença da autoridade, daí a desnecessidade de que alguém conduza o preso até sua presença. Condutor, se houvesse, seria a própria autoridade... Se a lavratura do auto de prisão em flagrante for presidida por juiz de direito, estará ele impedido de exercer jurisdição no processo criminal correspondente, e isso por força do disposto no art. 252, II e IV, do CPP137.
5.1.8. Nota de culpa Em até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, será entregue ao preso, mediante recibo, a nota de culpa, assinada pela autoridade, com o motivo da prisão, o nome do condutor e os das testemunhas (art. 306, § 2º, do CPP). A previsão atende ao disposto no art. 5º, LXIV, da CF, onde se lê que o preso tem direito à identificação dos responsáveis por sua prisão, bem por isso o acerto de JULIO F. MIRABETE quando diz que “a finalidade da denominada nota de culpa é comunicar ao preso o motivo da prisão, bem como a identidade de quem o prendeu (artigo 5º, LXIV, da CF), num breve relato do fato criminoso de que é acusado”138. Eventuais irregularidades ou deficiências da nota de culpa, tais como a omissão do motivo da prisão139 ou da descrição do fato140, e a equivocada classificação do fato141, não têm o condão de nulificar o auto de prisão em flagrante142, mas a sua ausência ou entrega tardia143, fora do prazo legal, irá provocar o relaxamento da prisão.
6. RECOLHIMENTO AO CÁRCERE Terminada a lavratura do auto de prisão em flagrante, a autoridade encaminhará o autuado ao cárcere. Na letra do art. 304, § 1º, do CPP, o réu deverá ser recolhido preso, salvo se for hipótese em que ele “se livra solto” ou comporte fiança.
6.1. Hipóteses em que o autuado “se livra solto” Conforme diz o art. 309 do CPP, “se o réu se livrar solto, deverá ser posto em liberdade, depois de lavrado o auto de prisão em flagrante”.
As hipóteses em que o autuado “se livrava solto” estavam reguladas nos incisos I e II do art. 321 do CPP, verbis: “Art. 321. Ressalvado o disposto no art. 323, III e IV, o réu livrar-se-á solto, independentemente de fiança: I — no caso de infração, a que não for, isolada, cumulativa ou alternativamente, cominada pena privativa de liberdade; II — quando o máximo da pena privativa de liberdade, isolada, cumulativa ou alternativamente cominada, não exceder a três meses”. Ocorre, entretanto, que estes incisos foram expressamente revogados pelo art. 4º da Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011, e o caput do mesmo artigo recebeu nova redação, sem qualquer referência ao instituto antigo. Em resumo: não há mais previsão alguma no CPP a indicar quais são as hipóteses em que o autuado se livra solto. É verdade que o novo § 1º do art. 283 do CPP diz que não se imporá prisão em flagrante em relação à infração a que não for isolada, cumulativa ou alternativamente cominada pena privativa de liberdade, contudo, note-se que nestes casos o flagrante não será lavrado, daí não ser correto afirmar que nestas hipóteses o agente se livrará solto, como nos moldes em que antes ocorria. Como se percebe, para que houvesse harmonia no trato da matéria o art. 309 do CPP deveria ter sido revogado, e o § 1º do art. 304 deveria ter sido reformulado, para dele se extrair a referência ao “livrar-se solto”. Necessário observar que em razão do advento da Lei n. 9.099, de 26 de setembro de 1995, a possibilidade de prisão em flagrante nos casos que eram listados no art. 321 do CPP praticamente se extinguiu, conforme decorre do disposto no parágrafo único do art. 69, segundo o qual “ao autor do fato que, após a lavratura do termo, for imediatamente encaminhado ao juizado ou assumir o compromisso de a ele comparecer, não se imporá prisão em flagrante, nem se exigirá fiança”. Sobre a possibilidade de prisão em flagrante nas infrações de menor potencial ofensivo e crimes do art. 28, caput e § 1º, da Lei de Drogas, já discorremos em linhas anteriores, para onde remetemos o leitor visando evitar o enfaro da repetição.
6.2. Liberdade provisória mediante fiança Nos precisos termos do art. 322 do CPP: “A autoridade policial somente poderá conceder fiança nos casos de infração cuja pena privativa de liberdade máxima não seja superior a 4 (quatro) anos. Parágrafo único. Nos demais casos, a fiança será requerida ao juiz, que decidirá em 48 (quarenta e oito) horas”. Liberdade provisória, com ou sem fiança, são temas tratados em capítulos distintos, nesta mesma obra.
7. COMUNICAÇÃO DA PRISÃO: CONTROLE IMEDIATO 7.1. Controle jurisdicional Segundo o princípio do controle jurisdicional imediato, a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente (art. 5º, LXII, da CF; art. 306, caput, do CPP). Nas hipóteses em que a prisão cautelar decorre de decisão judicial (prisão temporária e preventiva), há um controle jurisdicional prévio a respeito do cabimento e legalidade da medida privativa de liberdade, feito pelo próprio órgão do Poder Judiciário que a ordena (o que não impede seja a decisão questionada e levada à apreciação de outra instância judiciária).
No caso de prisão em flagrante, ausente o controle prévio, a comunicação de que ora se cuida deve seguir-se imediatamente após a apresentação do conduzido à autoridade que irá providenciar a formalização da prisão, mas normalmente ocorre após a lavratura do auto, com a remessa de que trata o § 1º do art. 306, e tem por objetivo dar cumprimento ao disposto no inciso LXV do art. 5º da CF, segundo o qual a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária. Tem relação, ainda, com a necessidade de observância ao disposto no inciso LXVI do art. 5º da CF, segundo o qual ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança. Bem por isso, dispõe o § 1º do art. 306 do CPP que em até vinte e quatro horas após a realização da prisão, será encaminhado ao juiz competente o auto de prisão em flagrante. Entenda-se: auto de prisão em flagrante acompanhado de cópia das declarações do condutor (exceto na hipótese do art. 307 do CPP), declarações das testemunhas da infração (se houver); interrogatório do autuado, tudo devidamente assinado e com as particularidades acima tratadas (§§ 2º e 3º do art. 304 do CPP), bem como da nota de culpa, que no mesmo prazo — vinte e quatro horas — deve ser entregue ao preso, mediante recibo, antes, contudo, da remessa do expediente ao juiz competente. Caso o autuado não informe por ocasião da lavratura do auto de prisão em flagrante o nome de seu advogado, ou de advogado informe não dispor, a autoridade que presidiu o auto também deverá providenciar o encaminhamento de cópia integral para a Defensoria Pública, onde houver, para conhecimento e providências que se entender cabíveis. A ausência de comunicação à Defensoria, contudo, não implica nulidade do auto e, por isso, relaxamento da prisão. Já se decidiu que, estando regular a prisão em flagrante, “o atraso ou mesmo a falta de comunicação, dentro do prazo legal, à autoridade judiciária, não tem o condão de nulificar a custódia, pois trata-se de ato extrínseco à segregação”144. “Ao receber o auto de prisão em flagrante” — diz o art. 310 do CPP —, “o juiz deverá fundamentadamente: I — relaxar a prisão ilegal; ou II — converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; ou III — conceder liberdade provisória, com ou sem fiança”. E arremata o parágrafo único do art. 310: “Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o agente praticou o fato nas condições constantes dos incisos I a III do caput do art. 23 do Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 — Código Penal, poderá, fundamentadamente, conceder ao acusado liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos processuais, sob pena de revogação”. Relaxamento da prisão, prisão preventiva, liberdade provisória, com ou sem fiança, e medidas cautelares diversas da prisão são temas tratados em capítulos distintos, para onde remetemos o leitor visando melhor análise de cada uma das situações mencionadas no art. 310, respectivamente.
7.2. Controle ministerial O art. 50, caput, da Lei n. 11.343/2006 (Lei de Drogas) inovou em matéria de controle, dispondo que no prazo de vinte e quatro horas o juiz competente deverá dar vista da cópia do auto de prisão em flagrante ao Ministério Público para que se manifeste. Na prática tal providência sempre ocorreu, e cabe ao Ministério Público, por ocasião de tal intervenção e análise, como fiscal da lei, manifestar-se a respeito da legalidade da prisão; se é caso ou não de seu relaxamento; cabimento ou não de
liberdade provisória, com ou sem fiança, cumulada ou não com medidas cautelares diversas da prisão. No CPP não há regra semelhante, e em sua antiga redação o art. 306 determinava a comunicação imediata da prisão ao juiz competente e à família do preso ou pessoa por ele indicada, bem como à Defensoria Pública, quando deixasse de informar o nome de seu advogado. Com a alteração introduzida pela Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011, o legislador determinou que o Ministério Público também seja comunicado a respeito da prisão. A previsão era desnecessária, convenhamos. Bastaria regrar o que na prática já ocorre, para determinar que o Ministério Público tenha vista imediata nos autos da comunicação da prisão em flagrante enviada ao juiz, para que nele se manifeste previamente à decisão judicial a respeito da legalidade da prisão, relaxamento, cabimento de liberdade provisória, com ou sem fiança, necessidade ou não de custódia cautelar e aplicação de outras medidas cautelares diversas da prisão. O problema, na prática, nunca esteve na ausência de conhecimento e/ou manifestação do Ministério Público a respeito de determinada prisão em flagrante levada a efeito, mas sim na ausência de melhor análise da situação fática, neste momento, e manifestação apropriada, levando em conta a real necessidade, ou não, de decretação da prisão preventiva. É condenável a prática daquela singela e conhecida manifestação ministerial que a praxe forense todos os dias evidencia, lavrada nos seguintes termos: “Flagrante formal e materialmente em ordem. Aguardo a vinda do inquérito policial”. Em que prazo deve ocorrer a comunicação ao Ministério Público? Pensamos que no mesmo prazo que deve ser comunicada ao juiz competente, qual seja: imediatamente. No máximo, é de se admitir se verifique em até vinte e quatro horas após a captura, com as particularidades já observadas quando tratamos da comunicação ao juiz. Até que sobrevenha regulamentação específica, problema na aplicação da regra será conhecer quem será o representante do Ministério Público a quem deva ser encaminhada a comunicação imediata nas comarcas onde houver mais de um com idênticas atribuições criminais, salvo se a autoridade policial verificar primeiramente a distribuição da comunicação ao juiz e, ciente das atribuições do Promotor de Justiça que na Vara Judicial correspondente atuar, seguir com o encaminhamento respectivo. Do contrário, a autoridade deverá simplesmente protocolar a comunicação do flagrante junto ao cartório ou Secretaria do Ministério Público, onde houver, ou diretamente com o Promotor de Justiça ou funcionário que fizer as vezes.
8. PRAZO MÁXIMO DE DURAÇÃO DA PRISÃO POR FORÇA DE FLAGRANTE Determina o art. 310 do CPP que o juiz, ao receber o auto de prisão em flagrante, que lhe será encaminhado em até 24 horas após a realização da prisão, não sendo caso de relaxamento, liberdade provisória com ou sem fiança, cumulada ou não com medidas cautelares diversas da prisão, deverá, em decisão fundamentada, “converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código”. Como se vê, combinando o disposto no art. 310, II, com o § 1º do art. 306, ambos do CPP, temos que o prazo máximo da prisão por força de flagrante é de vinte e quatro horas145. Realizada a prisão-captura e formalizado o auto, o juiz deste receberá cópia em vinte e quatro horas. A seguir, ou o agente é colocado em liberdade ou se decreta sua prisão preventiva.
Seja qual for a providência adotada, não subsistirá a prisão em flagrante. Se a prisão persistir, tecnicamente não será por força do flagrante, mas em razão de fundamento diverso. Mudará a natureza e os fundamentos do título da prisão cautelar, daí entendermos que a rigor não se trata de converter uma prisão em outra, mas de verdadeira decretação. Poderá o juiz converter a prisão em flagrante em preventiva ex officio? Claro que não. Quem dá a resposta é o § 2º do art. 282 e o art. 311, ambos do CPP, onde há vedação à decretação de preventiva ex officio na fase de investigação policial, de maneira que a conversão somente poderá ocorrer se neste momento já houver representação da autoridade policial ou requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente. Isso reforça nosso argumento no sentido de que, ao receber a cópia do auto de prisão em flagrante, o correto é o juiz determinar a abertura de vista ao Ministério Público para que se manifeste, antes de sobre ela decidir em sede de aplicação do art. 310 do CPP. Como se vê, além de enfatizar a necessidade de um controle judicial maior do que aquele anteriormente praticado em relação às prisões em flagrante e apresentar alternativas ao encarceramento tradicional, o legislador reforçou a ideia de que um dos maiores objetivos do flagrante é a colheita da prova daquele crime aceso.
9. USO DE ALGEMAS Ordenar ou executar medida privativa de liberdade individual, sem as formalidades legais ou com abuso de poder é crime tipificado no art. 350 do CP, punido com detenção, de um mês a um ano. Determina o art. 284 do CPP que “não será permitido o emprego de força, salvo a indispensável no caso de resistência ou de tentativa de fuga do preso”. Mesmo assim, sempre foram constantes os abusos cometidos na contenção de presos, especialmente em se tratando de flagrante, de forma a evidenciar odioso desrespeito ao dispositivo acima invocado, ao princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), à regra que veda a submissão de quem quer que seja a tratamento desumano ou degradante (art. 5º, III, da CF), à garantia de inviolabilidade da honra e da imagem das pessoas (art. 5º, X, da CF) e do respeito à integridade física e moral do preso (art. 5º, XLIX, da CF). Visando coibir os constantes abusos no uso de algemas, o STF editou a Súmula Vinculante 11, que tem o seguinte teor: “Só é lícito o uso de algemas em caso de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado” (Sessão Plenária de 13-8-2009; DJe n. 157, de 22-8-2008, p. 1; DOU de 22-8-2008, p. 1). Como está claro na súmula, o emprego de algemas, sendo caso, deve contar com justificativa146 expressa no corpo do auto de prisão em flagrante, e a violação da regra acarreta, dentre outras consequências, a nulidade da prisão, de forma a determinar o relaxamento do flagrante.
Prisão em Flagrante Quadro comparativo entre os artigos relacionados com a prisão em flagrante, antes e depois da Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011
Como era
Como ficou
Art. 282. À exceção do flagrante delito, a prisão não poderá efetuar-se senão em virtude de pronúncia ou nos casos determinados em lei, e mediante ordem escrita da autoridade competente. Art. 283. A prisão poderá ser efetuada em qualquer dia e a qualquer hora, respeitadas as restrições relativas à inviolabilidade do domicílio.
Art. 283. Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva. § 1º As medidas cautelares previstas neste Título não se aplicam à infração a que não for isolada, cumulativa ou alternativamente cominada pena privativa de liberdade. § 2º A prisão poderá ser efetuada em qualquer dia e a qualquer hora, respeitadas as restrições relativas à inviolabilidade do domicílio.
Art. 284. Não será permitido o emprego de força, salvo a indispensável no caso de resistência ou de tentativa de fuga do preso.
Não sofreu alteração Art. 284. Não será permitido o emprego de força, salvo a indispensável no caso de resistência ou de tentativa de fuga do preso.
Art. 301. Qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito.
Não sofreu alteração Art. 301. Qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito.
Art. 302. Considera-se em flagrante delito quem: I — está cometendo a infração penal; II — acaba de cometê-la; III — é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração; IV — é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração.
Não sofreu alteração Art. 302. Considera-se em flagrante delito quem: I — está cometendo a infração penal; II — acaba de cometê-la; III — é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração; IV — é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração.
Art. 303. Nas infrações permanentes, entende-se o agente em flagrante delito enquanto não cessar a permanência.
Não sofreu alteração Art. 303. Nas infrações permanentes, entende-se o agente em flagrante delito enquanto não cessar a permanência.
Art. 304. Apresentado o preso à autoridade competente, ouvirá esta o condutor e colherá, desde logo, sua assinatura, entregando a este cópia do termo e recibo de entrega do preso. Em seguida, procederá à oitiva das testemunhas que o acompanharem e ao interrogatório do acusado sobre a imputação que lhe é feita, colhendo, após cada oitiva, suas respectivas assinaturas, lavrando, a autoridade, afinal, o auto. § 1º Resultando das respostas fundada a suspeita contra o conduzido, a autoridade mandará recolhêlo à prisão, exceto no caso de livrar-se solto ou de prestar fiança, e prosseguirá nos atos do inquérito ou processo, se para isso for competente; se não o for, enviará os autos à autoridade que o seja. § 2º A falta de testemunhas da infração não impedirá o auto de prisão em flagrante; mas, nesse caso, com o condutor, deverão assiná-lo pelo menos duas pessoas que hajam testemunhado a apresentação do preso à autoridade.
Não sofreu alteração Art. 304. Apresentado o preso à autoridade competente, ouvirá esta o condutor e colherá, desde logo, sua assinatura, entregando a este cópia do termo e recibo de entrega do preso. Em seguida, procederá à oitiva das testemunhas que o acompanharem e ao interrogatório do acusado sobre a imputação que lhe é feita, colhendo, após cada oitiva, suas respectivas assinaturas, lavrando, a autoridade, afinal, o auto. § 1º Resultando das respostas fundada a suspeita contra o conduzido, a autoridade mandará recolhêlo à prisão, exceto no caso de livrar-se solto ou de prestar fiança, e prosseguirá nos atos do inquérito ou processo, se para isso for competente; se não o for, enviará os autos à autoridade que o seja. § 2º A falta de testemunhas da infração não impedirá o auto de prisão em flagrante; mas, nesse caso, com o condutor, deverão assiná-lo pelo menos duas pessoas que hajam testemunhado a apresentação do preso à autoridade.
Art. 305. Na falta ou no impedimento do escrivão, qualquer pessoa designada pela autoridade lavrará o auto, depois de prestado o compromisso legal.
Não sofreu alteração Art. 305. Na falta ou no impedimento do escrivão, qualquer pessoa designada pela autoridade lavrará o auto, depois de prestado o compromisso legal.
Art. 306. A prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou a pessoa por ele indicada. § 1º Dentro em 24h (vinte e quatro horas) depois da prisão, será encaminhado ao juiz competente o auto de prisão em flagrante acompanhado de todas as oitivas colhidas e, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, cópia integral para a Defensoria Pública. § 2º No mesmo prazo, será entregue ao preso, mediante recibo, a nota de culpa, assinada pela autoridade, com o motivo da prisão, o nome do condutor e o das testemunhas.
Art. 306. A prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente, ao Ministério Público e à família do preso ou à pessoa por ele indicada. § 1º Em até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, será encaminhado ao juiz competente o auto de prisão em flagrante e, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, cópia integral para a Defensoria Pública. § 2º No mesmo prazo, será entregue ao preso, mediante recibo, a nota de culpa, assinada pela autoridade, com o motivo da prisão, o nome do condutor e os das testemunhas.
Art. 307. Quando o fato for praticado em presença da autoridade, ou contra esta, no exercício de suas funções, constarão do auto a narração deste fato, a voz de prisão, as declarações que fizer o preso e os depoimentos das testemunhas, sendo tudo assinado pela autoridade, pelo preso e pelas testemunhas e remetido imediatamente ao juiz a quem couber tomar conhecimento do fato delituoso, se não o for a autoridade que houver presidido o auto.
Não sofreu alteração Art. 307. Quando o fato for praticado em presença da autoridade, ou contra esta, no exercício de suas funções, constarão do auto a narração deste fato, a voz de prisão, as declarações que fizer o preso e os depoimentos das testemunhas, sendo tudo assinado pela autoridade, pelo preso e pelas testemunhas e remetido imediatamente ao juiz a quem couber tomar conhecimento do fato delituoso, se não o for a autoridade que houver presidido o auto.
Art. 308. Não havendo autoridade no lugar em que se tiver efetuado a prisão, o preso será logo apresentado à do lugar mais próximo.
Não sofreu alteração Art. 308. Não havendo autoridade no lugar em que se tiver efetuado a prisão, o preso será logo apresentado à do lugar mais próximo.
Art. 309. Se o réu se livrar solto, deverá ser posto em liberdade, depois de lavrado o auto de prisão em flagrante.
Não sofreu alteração Art. 309. Se o réu se livrar solto, deverá ser posto em liberdade, depois de lavrado o auto de prisão em flagrante.
Art. 310. Quando o juiz verificar pelo auto de prisão em flagrante que o agente praticou o fato, nas condições do art. 19, I, II e III, do Código Penal, poderá, depois de ouvir o Ministério Público, conceder ao réu liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos e termos do processo, sob pena de revogação. Parágrafo único. Igual procedimento será adotado quando o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, a inocorrência de qualquer das hipóteses que autorizam a prisão preventiva (arts. 311 e 312).
Art. 310. Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá fundamentadamente: I — relaxar a prisão ilegal; ou II — converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; ou III — conceder liberdade provisória, com ou sem fiança. Parágrafo único. Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o agente praticou o fato nas condições constantes dos incisos I a III do caput do art. 23 do Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 — Código Penal, poderá, fundamentadamente, conceder ao acusado liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos processuais, sob pena de revogação.
Art. 321. Ressalvado o disposto no art. 323, III e IV, o réu livrar-se-á solto, independentemente de fiança: I — no caso de infração, a que não for, isolada, cumulativa ou alternativamente, cominada pena privativa de liberdade; II — quando o máximo da pena privativa de liberdade, isolada, cumulativa ou alternativamente cominada, não exceder a 3 (três) meses.
Art. 321. Ausentes os requisitos que autorizam a decretação da prisão preventiva, o juiz deverá conceder liberdade provisória, impondo, se for o caso, as medidas cautelares previstas no art. 319 deste Código e observados os critérios constantes do art. 282 deste Código.
1 Falência da pena de prisão, 2. ed., São Paulo: Saraiva, 2001, p. 31. 2 STF, HC 98.821/CE, 2ª T., rel. Min. Celso de Mello, j. 9-3-2010, DJe de 16-4-2010. 3 O condutor pode ser considerado como testemunha, bastando, portanto, para a regularidade formal do auto de prisão em flagrante, a existência do condutor e mais uma testemunha. 4 Processo penal constitucional, 5. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 330. 5 Aqui estamos nos referindo ao delito que é flagrante, evidente, e não às hipóteses de flagrante delito listadas no art. 302 do CPP. 6 Curso de processo penal, 7. ed., São Paulo: Saraiva, 1990, p. 49-50. 7 Art. 5º, LXI, da CF: “Ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei”. 8 Conforme dispõe o art. 5º, LVII, da CF: “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. 9 “A prisão em flagrante, diversamente das outras prisões cautelares, prescinde de ordem judicial” (STJ, HC 140.551/DF, 5ª T., rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 8-9-2009, DJe de 13-10-2009).
10 Não se desconhecem aquelas situações em que a polícia dispõe previamente, em razão de investigações preliminares ou informações de qualquer modo obtidas, de informações a respeito de determinado delito que irá ocorrer. Importante lembrar que, mesmo diante de tais situações, a conduta policial é, em regra, no sentido de colocar-se em condição que permita a prisão em flagrante, e não a obtenção de mandado de prisão contra o(s) envolvido(s). 11 “A inexistência de elementos que indiquem a ocorrência de qualquer das hipóteses do art. 302 do CPP impõe o relaxamento da prisão em flagrante” (STF, RHC 86.535/SP, 2ª T., rel. Min. Cezar Peluso, j. 15-12-2009, DJe de 12-2-2010). 12 “Por força da ressalva inserida no art. 5º, XI, da CF, o ingresso em residência encontra-se expressamente autorizado, em qualquer dia e horário e independentemente de autorização judicial, quando, em seu interior, encontra-se configurado o denominado ‘estado de flagrância’, como na hipótese do crime de tráfico de entorpecentes, sob a modalidade ‘ter em depósito’ ou ‘guardar’, o qual, sendo crime permanente, admite a prisão em flagrante em qualquer momento” (TJAP, HC 488, Conselho da Magistratura, j. 21-1-1999, rel. Des. Luiz Carlos, RT 764/609). 13 TJSP, Ap. 236.434.3/8-00, 6ª Câm. de Janeiro/98, rel. Des. Irineu Pedrotti, j. 28-1-1998, RT 752/576. 14 TJSP, Ap. Crim. 130.489-3, 1ª Câm. Crim., rel. Des. Andrade Cavalcanti, j. 1º-2-1993, JTJ 141/394. 15 STF, RHC 91.189/PR, 2ª T., rel. Min. Cezar Peluso, j. 9-3-2010, DJe de 23-4-2010. 16 Art. 5º, LXI, da CF: “ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei”. 17 “A prisão em flagrante, que resulta da prática de ilícito penal, por constituir dever da autoridade policial e faculdade outorgada a qualquer do povo, é providência de índole administrativa que dispensa ordem judicial, bastando que se cumpra as formalidades constitucionais e legais” (TRF da 4ª Região, HC 93.04.33832-8/RS, 3ª T., rel. juiz Ronaldo Ponzi, j. em 19-10-1993, v.u., DJU de 2-3-1994, JSTJ-TRF 62/549). 18 Ver o que anotamos ao final do item “2. Prisão em flagrante”, neste livro. 19 Ob. cit., p. 31/32. 20 AURY LOP ES JR., Ob. cit., p. 30. 21 Art. 319 do CP: “Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal. Pena — detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano”. 22 Processo penal, 16. ed., São Paulo: Atlas, 2004, p. 408. 23 Art. 86, § 3º, da CF: “Enquanto não sobrevier sentença condenatória, nas infrações comuns, o Presidente da República não estará sujeito a prisão”. 24 Ver: RENAT O MARCÃO, Crimes de trânsito, 3. ed., São Paulo: Saraiva, 2011; FERNANDO CÉLIO DE BRIT O NOGUEIRA, Crimes do Código de Trânsito, 2. ed., São Paulo: Mizuno, 2010. 25 RENAT O MARCÃO, Tóxicos, 8. ed., São Paulo, Saraiva, 2011. 26 Nova Lei de Tóxicos: Qual procedimento deve ser adotado? Disponível em:
. 27 Art. 40, III, da LONMP: “Constituem prerrogativas dos membros do Ministério Público, além de outras previstas na Lei Orgânica: (...) III — ser preso somente por ordem judicial escrita, salvo em flagrante de crime inafiançável, caso em que a autoridade fará, no prazo máximo de vinte e quatro horas, a comunicação e a apresentação do membro do Ministério Público ao Procurador-Geral de Justiça”. 28 Art. 33, II, da LOMN: “São prerrogativas do magistrado: (...) II — não ser preso senão por ordem escrita do Tribunal ou do órgão especial competente para o julgamento, salvo em flagrante de crime inafiançável, caso em que a autoridade fará imediata comunicação e apresentação do magistrado ao Presidente do Tribunal a que esteja vinculado”. 29 Art. 7º, § 3º, da Lei n. 8.906/94: “São direitos do advogado: (...) § 3º O advogado somente poderá ser preso em flagrante, por motivo de exercício da profissão, em caso de crime inafiançável, observado o disposto no inciso IV deste artigo”. 30 Art. 27, § 1º, da CF: “Será de quatro anos o mandato dos Deputados Estaduais, aplicando-se-lhes as regras desta Constituição sobre sistema eleitoral, inviolabilidade, imunidades (...)”. 31 Art. 53, § 2º, da CF: “Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão. (...) § 8º As imunidades de Deputados ou Senadores subsistirão durante o estado de sítio, só podendo ser suspensas mediante o voto de dois terços dos membros da Casa respectiva, nos casos de atos praticados fora do recinto do Congresso Nacional, que sejam incompatíveis com a execução da medida”. 32 Processo penal, 16. ed., São Paulo: Atlas, 2004, p. 409. 33 STF, HC 73.035/DF, Pleno, rel. Min. Carlos Velloso, j. 13-11-1996, DJe de 19-12-1996.
34 STJ, RHC 5.650/RS, 6ª T., rel. Min. Vicente Leal, j. 2-6-1997, DJU de 1º-9-1997, RT 749/616. “Não é nulo o auto de prisão em flagrante em razão de ter sido lavrado por autoridade policial que foi testemunha do fato, pois a ele não se aplica a regra proibitiva do art. 252, II, do CPP, que se dirige ao juiz, tendo em vista que são diversas as funções que o juiz e o delegado de polícia exercem” (TJSP, HC 368.773-3/2, 5ª Câm., rel. Des. Dante Busana, j. 28-2-2002, RT 802/570). 35 TJSP, Ap. 990.09.238853-3, 2ª Câm. Crim., rel. Des. Almeida Sampaio, j. 26-4-2010. 36 STJ, ROHC 9.142-SP, 5ª T., j. 22-2-2000, rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, DJU de 20-3-2000, RT 779/524. 37 Manual de processo penal, 2. ed., Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1999, p. 103. 38 Curso de processo penal, 6. ed., São Paulo: Saraiva, 2011, p. 464. 39 Embora sem se posicionar expressamente a respeito, tratando do inciso II do art. 302 do CPP, JULIO F. MIRABET E sustentou que a situação é a “de quem já esgotou os atos de execução, causando o resultado jurídico, de dano ou de perigo (morte, lesões, dano material etc.)” (Processo penal, 16. ed., São Paulo: Atlas, 2004, p. 403), o que autoriza concluir que também pensava como EDILSON MOUGENOT BONFIM . 40 Ob. cit., p. 464. Referindo-se à matéria JULIO F. MIRABET E consignou a existência de entendimento no sentido de que a hipótese do inciso II do art. 302 do CPP cuida de “quase flagrância”, e acrescentou: “(...) pois há apenas uma presunção, embora veemente, de que é o preso o autor do crime, quando até é possível que não seja ele o autor do ilícito (apanhou a arma deixada pelo autor do homicídio, manchou as vestes ao procurar socorrer a vítima etc.)”. E finalizou: “Em geral, porém, a doutrina considera essa hipótese como flagrante próprio” (ob. cit., p. 403). 41 FERNANDO DA COSTA TOURINHO FILHO, Manual de processo penal, 4. ed., São Paulo: Saraiva, 2002, p. 533. 42 Curso de processo penal, 9. ed., São Paulo: Saraiva, 2003, p. 230. 43 “Não é nula a prisão em flagrante realizada após a consumação do delito. Inteligência do art. 302, incisos III e IV, do Código de Processo Penal” (STF, HC 92711/RS, 2ª T., rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 10-6-2008, DJe de 6-3-2009). 44 “Se os autos demonstram que houve perseguição ininterrupta do agente, a hipótese ‘do quase flagrante’ (art. 302, III, do CPP) resulta configurada de modo satisfatório” (STF, RHC 6.934-4/GO, 2ª T., rel. Min. Francisco Rezek, j. 8-11-1988, DJU de 2-121988, RT 639/390). 45 STF, RHC 60.895/GO, 1ª T., rel. Min. Rafael Mayer, j. 6-5-1983, DJe de 26-8-1983. 46 “É nula a prisão em flagrante realizada horas após a prática delitiva e por mero acaso, sem que tivesse havido perseguição, uma vez que tal hipótese não se enquadra nas previsões legais constantes do art. 302 do CPP, de quase flagrante” (TACrimSP, HC 412.780/8, 10ª Câm., rel. Juiz Márcio Bártoli, j. 26-6-2002, RT 806/551). “Não tendo sido o indiciado surpreendido cometendo a infração penal, ou quando acabava de cometê-la, e tampouco perseguido em situação que fizesse presumir fosse o autor da mesma, porém localizado e preso horas depois, em virtude de diligências policiais, não há falar em flagrante delito” (TJSP, HC 17.095-3, 3ª Câm. Crim., rel. Des. Cunha Camargo, j. 18-10-1982, RT 568/256). 47 TACrimSP, HC 109.988, 6ª Câm., rel. Des. Renato Talli, j. 13-10-1981, RT 559/360. 48 Conforme se tem decidido, “não tendo sido o indiciado surpreendido cometendo a infração penal, ou quando acabava de cometê-la, e tampouco perseguido em situação que induzisse a presunção de ser o autor desta, mas, ao contrário, localizado e preso um dia depois, em virtude de diligências policiais, não há como falar-se em flagrante delito” (TJMT, HC 3.626/96, Câm. Esp., j. 8-1-1997, rel. Des. Flávio José Bertin, RT 742/678). “A prisão do infrator em sua própria residência ao anoitecer do dia seguinte à prática da infração penal, após terem sido sua localização e captura determinadas pelo delegado de polícia, não caracteriza flagrante” (TJMS, HC 390/81, rel. Des. Jesus de Oliveira Sobrinho, j. 8-7-1981, RT 567/382). No mesmo sentido: STF, RHC 61.102-8/GO, 2ª T., rel. Min. Aldir Passarinho, j. 16-8-1983, DJU de 27-10-1983, RT 581/402. 49 “É nulo o flagrante lavrado três dias após a ocorrência do crime” (TJMT, HC 549/80, rel. Des. Mílton Figueiredo Ferreira Mendes, j. 17-9-1980, RT 554/420). “É ilegal e, por isso, nulo, o flagrante lavrado vários dias após a prisão do paciente” (TJMS, HC 335/81, rel. Des. Sérgio Martins Sobrinho, j. 25-3-1981, RT 561/407). 50 “A seu turno, perseguição é fato definido normativamente (CPP, art. 290, § 1º) e se deve operar de maneira incessante” (TJBA, HC 14.810-2/99, 2ª Câm., rel. Des. Benito A. de Figueiredo, j. 24-2-2000, RT 778/632). 51 TACrimSP, HC 104.718, 10ª Câm., rel. juiz Jorge Tannus, j. 30-3-1981, RT 558/342. 52 Entendendo que não pode haver solução de continuidade até o instante de pender-se o autor da infração: JOSÉ FREDERICO MARQUES, Elementos de direito processual penal, Campinas: Bookseller, 1997, p. 78. 53 Ob. cit., p. 230. 54 TACrimSP, HC 123.866, C. Férias, rel. juiz Dimas Ribeiro, j. 13-7-1983, RT 591/359. 55 STJ, HC 3.496-1/DF, 5ª T., rel. Min. Flaquer Scartezzini, j. 21-6-1995, DJU de 25-9-1995, RT 724/585. 56 Ob. cit., p. 230.
57 Definição utilizada por FERNANDO CAP EZ (ob cit., p. 230). 58 “Se os agentes foram encontrados algumas horas após o roubo, em circunstâncias suspeitas, aptas a autorizar a presunção de serem os autores do delito, por estarem na posse do automóvel e de objetos da vítima, além do fato de tentarem fugir, ao perceberem a presença da viatura policial, configurada está a hipótese prevista no art. 302, IV, do CPP, que trata do flagrante presumido, pois a expressão ´logo após’ permite a interpretação elástica, havendo margem na apreciação do elemento cronológico, que pode, inclusive, estender-se do repouso noturno até o dia seguinte, se for o caso” (STJ, HC 8.672-SP, 6ª T., rel. Min. Fernando Gonçalves, j. 17-8-1999, DJU 6-9-1999, RT 771/555). 59 Ob. cit., p. 79. 60 Ob. cit., p. 405. 61 STJ, HC 8.672-SP, 6ª T., rel. Min. Fernando Gonçalves, j. 17-8-1999, DJU 6-9-1999, RT 771/555. 62 Ob. cit., p. 230-231. 63 RT 762/621. 64 Comentários ao Código Penal, 3. ed., Rio de Janeiro: Forense, 1955, v. 1, t. 2, p. 105. 65 RENAT O MARCÃO, Tóxicos, 8. ed., São Paulo: Saraiva, 2011. 66 “Cabe ressaltar antes de mais nada, que a conduta do policial que se faz passar por um viciado para adquirir entorpecente do traficante, não caracteriza o flagrante preparado, pelo simples fato de que, em tal hipótese, o infrator não está sendo induzido ao crime, mas apenas renovando um ato que pratica habitualmente e fica então patenteado. Na realidade o que existe é um simples ardil utilizado pela polícia, não só para ensejar a apreensão do entorpecente, como também para evidenciar a prática do comércio ilícito, já caracterizado com a guarda da droga destinada a consumo de terceiros, que é de caráter permanente” (TJSP, Ap. 178.786-3/1, 1ª Câm., j. 10-4-1995, rel. Des. Marcial Hollanda, RT 721/414). 67 “Se o agente trazia consigo a substância entorpecente quando ocorreu a prisão, não há que se falar em flagrante preparado, uma vez que já se encontrava em estado de flagrância. Esta posse da droga basta para a tipificação do tráfico” (STF, HC 72.674-7/SP, 2ª T., j. 26-3-1996, rel. Min. Maurício Corrêa, DJU de 26-3-1996, RT 735/527). “Inocorre flagrante preparado em sede de crime permanente, porquanto o crime preexiste à ação do agente provocador; assim, o policial que comparece ao local e mostra-se interessado na aquisição do entorpecente não induz os acusados à prática do delito, pois o fato de manter guardada a droga destinada ao consumo de terceiros já constitui o crime; portanto, a atuação do agente provocador caracteriza mero exaurimento” (STF, RE 197.571-7/SP, 1ª T., j. 28-6-1996, rel. Min. Octavio Gallotti, DJU de 13-121996, RT 740/539). 68 TJSP, Ap. 334.523-3/9, 3ª Câm., j. 9-10-2001, rel. Des. Gonçalves Nogueira, v.u., RT 797/577. 69 “Para a configuração do crime de tráfico é irrelevante a ausência do estado flagrancial no tocante à venda de tóxico a terceiros, pois trata-se de crime permanente, onde a só detenção pelo agente da substância proibida, para fins de comércio, basta ao reconhecimento da conduta incriminada no art. 33 da Lei n. 11.343/2006” (RENAT O MARCÃO, Tóxicos, 8. ed., São Paulo: Saraiva, 2011). No mesmo sentido: “Para a configuração do delito não se exige qualquer ato de tráfico, bastando que o agente traga consigo, transporte, tenha em depósito ou guarde a substância entorpecente, fazendo-se, também, inexigível, a traditio, para a consumação” (TJSP, Ap. Crim. 899.394-3/0, 6ª Câm. do 3º Gr. da S. Crim., rel. Des. Marco Antonio, j. 25-10-2007, v.u., Boletim de Jurisprudência n. 136). 70 “Tendo policiais simulado serem usuários de entorpecente e mostrando-se pretensamente interessados na compra da droga, induzido pessoa a buscá-la para prendê-la em seu retorno, é de se ter considerada a conduta de vender como de consumação impossível, absolvendo-se o acusado” (TJSP, Ap. 193.439-3/9, 5ª Câm., j. 9-11-1995, rel. Des. Rocha de Souza, RT 730/529). 71 STJ, HC 11.625-SP, 5ª T., j. 6-6-2000, rel. Min. Gilson Dipp, DJU de 21-8-2000, RT 784/558. 72 STJ, REsp 19.436-0-SP, 5ª T., j. 3-3-1993, rel. Min. Flaquer Scartezzini, DJ de 5-4-1993, JSTJ 48/340. 73 TJSP, Ap. Crim. 144.374-3, 5ª Câm. Crim., j. 4-11-1993, rel. Des. Poças Leitão, JTJ 155/297. 74 “Haverá flagrante preparado ou provocado se durante investigação policial o réu é induzido a adquirir substância entorpecente de que não dispunha, não guardava, nem tinha em depósito, não podendo, assim, ser condenado por tráfico nem na conduta ‘trazer consigo’” (TAPR, Ap. 113.886-7, 1ª Câm., rel. desig. Juiz Mendonça de Anunciação, j. 19-3-1998, RT 757/655). 75 TJSP, Ap. Crim. 147.227-3, 5ª Câm. Crim., j. 11-11-1993, rel. Des. Dante Busana, JTJ 150/286. 76 TJSP, HC 278.075-3/6, 6ª Câm., j. 18-3-1999, rel. Des. Lustosa Goulart, RT 766/605. No mesmo sentido: TJSP, Ap. Crim. 151.178-3, 4ª Câm., j. 26-1-1994, rel. Des. Celso Limongi, JTJ 160/326; TJSP, Ap. Crim. 129.500-3, 4ª Câm. Crim., j. 25-8-1994, rel. Des. Celso Limongi, JTJ 171/305; TJSP, Ap. Crim. 199.133-3, 3ª Câm. Crim., j. 28-5-1996, rel. Des. Gonçalves Nogueira, JTJ 182/295; TJSP, Ap. Crim. 211.412-3, 5ª Câm. Crim., j. 20-2-1997, rel. Des. Dante Busana, JTJ 194/285; TJSP, Ap. Crim. 223.597-3, 3ª Câm. Crim., j. 8-7-1997, rel. Des. Segurado Braz, JTJ 197/302; TJSP, Ap. 151.178-3/0, 4ª Câm. Crim., j. 26-1-
1994, rel. Des. Celso Limongi, m.v., RT 707/293 e 757/655. 77 “O flagrante forjado distingue-se por completo do flagrante esperado, pois no primeiro caso, a vítima facilita a ação criminosa, estimulando no agente a intenção de burlar a norma penal, ou agentes policiais contribuem por omissão premeditada para a prática de um delito, que neste caso é putativo, pois o bem objeto da tutela jurídica não está a dispor do desiderato criminoso. Já no flagrante esperado, por se constituir em uma seleção lícita de elementos de prova para uma futura diligência de captura daquele incurso nas penas de algum delito, não há se falar em crime impossível” (TRF, 2ª Região, Ap. 96.02.42015-4/ES, 2ª T., rel. Des. Federal Paulo Espírito Santo, j. 16-11-1998, DJU de 6-4-1999, RT 768/708). 78 TJSP, Ap. Crim. 160.291-3, 2ª Câm. Crim., rel. Des. Devienne Ferraz, j. 30-5-1994, JTJ 159/310. 79 STF, HC 74.608-0/SP, 1ª T., rel. Min. Celso de Mello, j. 18-2-1997. 80 No mesmo sentido: FERNANDO DA COSTA TOURINHO FILHO, ob. cit.,p. 539. 81 “Não caracteriza flagrante preparado, e sim flagrante esperado, o fato de a Polícia, tendo conhecimento prévio de que o delito estava prestes a ser cometido, surpreende o agente na prática da ação delitiva” (STF, HC 78.250/RJ, 2ª T., rel. Min. Maurício Corrêa, j. 15-12-1998, DJe de 26-2-1999). “Não há falar em flagrante preparado, tendo em vista que limitou-se a autoridade policial, alertada da intenção criminosa, a tomar providências necessárias para surpreender o criminoso, no ato da consumação do delito” (STF, HC 76.397/RJ, 1ª T., rel. Min. Ilmar Galvão, j. 16-12-1997, DJe de 27-2-1998). 82 Comentários ao Código Penal, Rio de Janeiro: Forense, 1955, v. I, t. 2, p. 105, apud Fernando da Costa Tourinho Filho, ob. cit., p. 539. 83 Ob. cit., p. 539. 84 STJ, RHC 4.908-MG, 6ª T., j. 28-2-1996, rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, DJ de 17-3-1997, JSTJ 96/273. 85 Art. 2º, II, da Lei n. 9.034, de 3 de maio de 1995. 86 EDILSON MOUGENOT BONFIM , Ob. cit., p. 466. 87 RENAT O MARCÃO, Tóxicos, 8. ed., São Paulo: Saraiva, 2011. 88 Direito penal, 26. ed., São Paulo: Saraiva, 2003, p. 193-194. 89 Comentários ao Código de Processo Penal, Rio de Janeiro: Forense, 1945, v. 3, p. 108. 90 TALES CAST ELO BRANCO apresenta outras denominações possíveis para o flagrante em crime permanente. Segundo o jurista: “Alguns autores também denominam contínuos os delitos permanentes. Assim, também é lícito falar em flagrante contínuo, estado contínuo de flagrância, delito continuadamente flagrante, flagrância contínua ou delito de flagrância contínua para traduzir a noção crepitante, ardente, flamejante, queimante da infração penal” (Da prisão em flagrante, 5. ed., São Paulo: Saraiva, 2001, p. 69). 91 Da prisão em flagrante, 5. ed., São Paulo: Saraiva, 2001, p. 67. 92 Conforme reiteradamente se tem decidido, “tratando-se de prisão em flagrante após os policiais terem recebido reiteradas denúncias anônimas que, em determinada residência, havia comércio de entorpecentes, não há necessidade de se obter, previamente, mandado de busca domiciliar” (TJSP, Ap. 216.007-3/3, 2ª Câm., j. 20-1-1997, rel. Des. Silva Pinto, RT 739/607). “Nos crimes de natureza permanente, em que o estado de flagrância se protrai no tempo, como na hipótese de tráfico de entorpecente nas modalidades de posse, guarda ou depósito, é desnecessária prévia autorização judicial para que a autoridade policial ingresse em casa alheia para efetuar prisão em flagrante” (TJSP, Ap. 334.523-3/9, 3ª Câm., j. 9-10-2001, rel. Des. Gonçalves Nogueira, v.u., RT 797/577). 93 “Os crimes de tráfico de drogas e associação para o tráfico são de natureza permanente” (STF, HC 98.340/MG, 1ª T., rel. Min. Ricardo Lewandovski, j. 6-10-2009, DJe de 23-10-2009). No mesmo sentido: STF, HC 101.095/SC, 2ª T., rel. Min. Gilmar Mendes, 31-8-2010, DJe de 24-9-2010. 94 “Por força da ressalva inserida no art. 5º, XI, da CF, o ingresso em residência encontra-se expressamente autorizado, em qualquer dia e horário e independentemente de autorização judicial, quando, em seu interior, encontra-se configurado o denominado ‘estado de flagrância’, como na hipótese do crime de tráfico de entorpecentes, sob a modalidade ‘ter em depósito’ ou ‘guardar’, o qual, sendo crime permanente, admite a prisão em flagrante em qualquer momento” (TJAP, HC 488, Conselho da Magistratura, j. 21-1-1999, rel. Des. Luiz Carlos, RT 764/609). 95 TJSP, Ap. Crim. 130.489-3, 1ª Câm. Crim., rel. Des. Andrade Cavalcanti, j. 1º-2-1993, JTJ 141/394. 96 Ob. cit., p. 213-214. 97 Nesse sentido, afirma GUILHERME DE SOUZA NUCCI : “Uma única ação é irrelevante para o Direito Penal e somente o conjunto se torna figura típica (...)”. E conclui: “Logo, inexiste precisão para determinar ou justificar o momento do flagrante, tornando inviável a prisão” (Manual de processo e execução penal, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 539). 98 Em sentido contrário, afirma TALES CAST ELO BRANCO: “É indiferente ao Direito Penal a ação isolada. A prática solitária é
irrelevante e dispensa repressão. No crime habitual é necessário que as ações se repitam. Vale dizer que não é possível materializar-se a prisão em flagrante delito enquanto não estiver comprovada a habitualidade” (ob. cit., p. 71). FERNANDO CAP EZ também afirma a impossibilidade de prisão em flagrante nos crimes habituais (ob. cit., p. 233). Na mesma linha de raciocínio que os anteriores citados, FERNANDO DA COSTA TOURINHO FILHO assevera: “Há discussão a respeito da possibilidade, ou não, de se prender em flagrante alguém que esteja cometendo um crime habitual. Sem embargo dessa flutuação jurisprudencial, não concebemos o flagrante no crime habitual. Entendemos que se alguém for preso por um crime habitual, o flagrante vai retratar, apenas, aquele ato insulado. Ora, aquele ato isolado constitui um indiferente legal...” (ob. cit., p. 534). 99 Curso de direito penal, Niterói: Ímpetus, 2006, v. IV, p. 216. 100 Ob. cit., p. 406. 101 CP, art. 71: “Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços. Parágrafo único. Nos crimes dolosos, contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa, poderá o juiz, considerando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo, observadas as regras do parágrafo único do art. 70 e do art. 75 deste Código”. 102 Comentários ao Código Penal, 2. ed., Rio de Janeiro: Forense, 1955, v. II, p. 430-431. 103 Art. 100, § 1º, do CP. 104 JOSÉ FREDERICO MARQUES, Tratado de direito penal, 2. ed., São Paulo: Saraiva, 1966, v. 3, p. 340. 105 ROGÉRIO GRECO, Curso de direito penal: parte geral, Niterói: Ímpetus, 2006, v. 1, p. 744. 106 Em regra a ação penal é pública condicionada à representação do ofendido, contudo, será pública incondicionada, por força do disposto no § 1º do art. 291 do Código de Trânsito Brasileiro (com a redação da Lei n. 11.705, de 19-6-2008), se na ocasião do acidente o agente estiver: I — sob a influência de álcool ou qualquer outra substância psicoativa que determine dependência; II — participando, em via pública, de corrida, disputa ou competição automobilística, de exibição ou demonstração de perícia em manobra de veículo automotor, não autorizada pela autoridade competente; III — transitando em velocidade superior à máxima permitida para a via em 50 km/h (cinquenta quilômetros por hora) (RENAT O MARCÃO, Crimes de trânsito, 3. ed., São Paulo: Saraiva, 2011). 107 Art. 129 da CF: “São funções institucionais do Ministério Público: I — promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei”. 108 Art. 24 do CPP: “Nos crimes de ação pública, esta será promovida por denúncia do Ministério Público, mas dependerá, quando a lei o exigir, de requisição do Ministro da Justiça, ou de representação do ofendido ou de quem tiver qualidade para representálo”. 109 Art. 100, caput, do CP: “A ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente a declara privativa do ofendido”. 110 Art. 100, § 2º, do CP: “A ação de iniciativa privada é promovida mediante queixa do ofendido ou de quem tenha qualidade para representá-lo”. 111 Sobre ação penal privada subsidiária da pública, conferir o art. 5º, LIX, da CF; art. 29 do CPP e o art. 100, § 3º, do CP. 112 Art. 38 do CPP: “Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no direito de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de seis meses, contado do dia em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia”. 113 Da prisão em flagrante, 5. ed., São Paulo: Saraiva, 2001, p. 39/40. 114 Conforme ANDREY BORGES DE MENDONÇA: “Somente a apresentação espontânea fora das hipóteses de flagrância é que impede a lavratura do auto de prisão em flagrante” (Prisão e outras medidas cautelares, São Paulo: Método, 2011, p. 156). AURY LOP ES JR. também acena para a possibilidade de prisão em flagrante quando houver apresentação espontânea e assim escreve: “Até a entrada em vigor da Lei 12.403/2011, o art. 317 do CPP disciplinava a apresentação espontânea, fator impeditivo da prisão em flagrante (mas não de eventual prisão temporária ou preventiva). Isso porque se o réu se apresentasse espontaneamente à autoridade policial, narrando e reconhecendo a autoria de um fato criminoso (muitas vezes desconhecido pela própria polícia), não haveria motivo para lavrar-se o auto de prisão em flagrante. Tratava-se de uma postura incompatível com a intenção de fugir ou ocultar-se, esvaziando os motivos da prisão em flagrante. É uma incompatibilidade genética. Não obstante, com o advento da Lei 12.403/2011, os arts. 317 e 318 foram revogados e agora esses dispositivos disciplinam a
prisão domiciliar. Assim, o instituto da apresentação espontânea deixou, formalmente, de existir. Mas, havendo uma situação fática na qual o imputado se apresenta espontaneamente à polícia, ainda que seja formalizada a prisão em flagrante (desde que exista uma das situações do art. 302 anteriormente explicadas), pensamos que tal circunstância deverá ser bem sopesada pelo juiz ao receber o auto de prisão em flagrante, nos termos do art. 310 do CPP” (O novo regime jurídico da prisão processual, liberdade provisória e medidas cautelares diversas, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 61). 115 Art. 307 do CPP: “Quando o fato for praticado em presença da autoridade, ou contra esta, no exercício de suas funções, constarão do auto a narração deste fato, a voz de prisão, as declarações que fizer o preso e os depoimentos das testemunhas, sendo tudo assinado pela autoridade, pelo preso e pelas testemunhas e remetido imediatamente ao juiz a quem couber tomar conhecimento do fato delituoso, se não o for a autoridade que houver presidido o auto”. 116 STJ, RHC 4.274-5/RJ, 6ª T., rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, RSTJ 12/257. 117 STF, HC 102.732/DF, Pleno, rel. Min. Marco Aurélio, j. 4-3-2010, DJe de 7-5-2010. No mesmo sentido: “A ausência de advogado no momento da lavratura do auto de prisão em flagrante não implica sua nulidade, visto que, sendo um procedimento de natureza inquisitorial, não se aplicam os princípios do contraditório e da ampla defesa, bastando observar-se o disposto no art. 5º, LXIII, da CF e no art. 304 et seq. do CPP” (TJSP, HC 375.127-3/1, 3ª Câm., rel. Des. Gonçalves Nogueira, j. 2-4-2002, RT 802/576). 118 “Não é nulo o auto de flagrante por haver sido lavrado uma hora após a prisão do indiciado” (TJSP, HC 17.537-3, 3ª Câm. Crim., rel. Des. Cunha Camargo, j. 25-10-1982, RT 567/286). 119 “Não é nulo o auto de prisão em flagrante lavrado antes de 24 horas da ocorrência, prazo previsto para a entrega de nota de culpa (art. 306 do CPP), considerado como limite máximo tolerável para a elaboração do referido auto” (TJSP, Ap. 339.249-3/4, 5ª Câm., rel. Des. Dante Busana, j. 21-2-2002, RT 800/597). No mesmo sentido: TJSP, HC 143.860-3, 6ª Câm. Crim., j. 13-51993, rel. Des. Djalma Lofrano, JTJ 145/312. 120 STF, HC 76.935/SP, 1ª T., rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 12-5-1998, DJe de 5-6-1998. 121 “Eventual nulidade do flagrante pode apenas invalidar a prisão, não viciando, contudo, a ação penal, se há prova do crime não conseguida por meios ilícitos e indícios suficientes de autoria. Sobrevindo sentença condenatória, não se permitindo o apelo em liberdade, superada fica qualquer irregularidade da prisão em flagrante” (STJ, ROHC 9.019-MG, 5ª T., j. 26-10-1999, rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, DJU de 29-11-1999, RT 777/554). “As eventuais nulidades do auto de prisão em flagrante não se estendem ipso facto à regularidade da persecução penal em juízo. O processo criminal não se anula por mera irregularidade na confecção do auto de prisão em flagrante” (TJSP, Ap. 206.259-3/4, 3ª Câm., j. 4-6-1996, rel. Des. Segurado Braz, RT 732/622). 122 STJ, HC 11.022-RJ, 5ª T., rel. Min. Jorge Scartezzini, j. 2-3-2000, DJU de 24-4-2000, RT 783/593; STJ, HC 20.743-MS, 5ª T., rel. Min. Jorge Scartezzini, j. 20-6-2002, DJU de 18-11-2002, v.u., RT 810/554. 123 TJSP, HC 269.797-3/0, 4ª Câm., j. 15-12-1998, rel. Des. Hélio de Freitas, RT 762/619; TJSP, HC 265.453-3/1-00, 4ª Câm., j. 311-1998, rel. Des. Hélio de Freitas, RT 763/568. 124 Art. 308 do CPP: “Não havendo autoridade no lugar em que se tiver efetuado a prisão, o preso será logo apresentado à do lugar mais próximo”. 125 “Nos termos do art. 307 do CPP, a autoridade policial que comandou a diligência e capturou os réus pode presidir a lavratura do auto de prisão em flagrante” (TJSP, HC 265.453-3/1-00, 4ª Câm., rel. Des. Hélio de Freitas, j. 3-11-1998, RT 763/568). 126 C. J. A. MIT T ERMAIER, Tratado da prova em matéria criminal, tradução de Herbert Wüntzel Henrich, 3. ed., Campinas: Bookseller, 1996, p. 231. 127 NICOLA FRAMARINO DEI MALAT ESTA, A lógica das provas em matéria criminal, tradução de Alexandre Augusto Correia e anotações de Hélio Pereira Bicudo, São Paulo: Saraiva, 1960, v. II, p. 22 e 42. 128 “Figurando o condutor como primeira testemunha, suficiente a inquirição de mais outra para se cumprir a formalidade na lavratura do auto de prisão em flagrante” (TACrimSP, HC 200.592-0, 10ª Câm., rel. juiz Sérgio Pitombo, j. 21-11-1990, RT 665/297). 129 Direitos humanos e o direito constitucional internacional, 3. ed., São Paulo: Max Limonad, 1997, p. 254. 130 A Convenção Americana sobre Direitos Humanos e sua integração ao processo penal brasileiro, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 125. 131 “Inexiste nulidade do auto de prisão em flagrante em razão do fato de o curador nomeado ao indiciado não ostentar a qualidade de advogado” (TJSP, Ap. Crim. 353.143-3/3-00, 2ª Câm., rel. Des. Almeida Braga, j. 25-3-2002, RT 803/574). 132 TACrimSP, HC 346426/0, 8ª Câm., rel. Juiz René Nunes, j. 19-8-1999, RT 772/591. 133 TACrimSP, HC 351.924/7, 8ª Câm., rel. Juiz Lopes de Oliveira, j. 25-11-1999, RT 775/611.
134 Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. 135 A Lei n. 12.037, de 1º de outubro de 2009, regulamenta o art. 5º, LVIII, da CF, e dispõe sobre a identificação criminal do civilmente identificado. 136 HÉLIO TORNAGHI , Curso de processo penal, 7. ed., São Paulo: Saraiva, 1990, p. 74. 137 “Não é nulo o auto de prisão em flagrante em razão de ter sido lavrado por autoridade policial que foi testemunha do fato, pois a ele não se aplica a regra proibitiva do art. 252, II, do CPP, que se dirige ao juiz, tendo em vista que são diversas as funções que o juiz e o delegado de polícia exercem” (TJSP, HC 368.773-3/2, 5ª Câm., rel. Des. Dante Busana, j. 28-2-2002, RT 802/570). 138 Ob. cit., p. 415. 139 STF, RHC 48.572/SP, 1ª T., rel. Min. Djaci Falcão, j. 15-12-1970, DJe de 26-3-1971. 140 STF, RHC 48.735/SP, 2ª T., rel. Min. Thompson Flores, j. 22-3-1971, DJe de 14-5-1971. 141 STF, RHC 47.838/MG, 2ª T., rel. Min. Adaucto Cardoso, j. 13-4-1970, DJe de 7-8-1970. 142 “A finalidade da nota de culpa é possibilitar à pessoa que seja presa o conhecimento acerca dos motivos que determinaram a sua prisão, bem como outras informações a possibilitar-lhe ampla defesa, devendo conter, segundo o previsto no art. 306 do CPP, a assinatura da autoridade responsável, um breve relato do fato criminoso imputado e o nome do condutor e das testemunhas. Todavia, a deficiência da nota de culpa não acarreta a nulidade do auto de prisão em flagrante, até por que não integra a peça flagratória” (TJSP, HC 334.478.3/2, 4ª Câm., rel. Des. Hélio de Freitas, j. 27-3-2001, RT 791/606). 143 Admitindo a entrega tardia, “algumas horas depois de vencido o prazo”: STF, RHC 62.187/GO, 2ª T., rel. Min. Aldir Passarinho, j. 13-11-1984, DJe de 8-3-1985. 144 TJSP, HC 265.453-3/1-00, 4ª Câm., rel. Des. Hélio de Freitas, j. 3-11-1998, RT 763/568. 145 Neste momento, sugerimos a leitura do item 7 (Momento da concessão) do Capítulo “Liberdade provisória sem fiança”, deste livro. 146 “Se a utilização das algemas na transferência do recorrente da delegacia para o presídio, ocasião em que as autoridades policiais já possuíam algum conhecimento acerca da pessoa com quem estavam lidando, se mostrou válida, com muito maior razão se justifica sua utilização no flagrante, momento em que os policiais ainda não sabiam exatamente quem estavam enfrentando. Recurso ordinário em habeas corpus a que se nega provimento” (STF, RHC 102.962/MG, 2ª T., rel. Min. Ellen Gracie, j. 14-12-2010, DJe de 8-2-2011).
PRISÃO PREVENTIVA 1. NOTAS INTRODUTÓRIAS Na expressão de JOSÉ FREDERICO MARQUES1, a prisão preventiva é a mais genuína das formas de prisão cautelar, ou, como prefere ANTONIO SCARANCE FERNANDES2, é hipótese clássica de prisão cautelar no sistema brasileiro. O instituto da prisão preventiva está regulado no Livro I, Título IX, Capítulo III, do Código de Processo Penal (arts. 311 a 316), que constitui objeto de análise deste Capítulo. A reforma instituída com a Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011, proporcionou mudanças significativas na regulamentação normativa de forma a deixar ainda mais evidente a importância e excepcionalidade desta modalidade de prisão sem pena3, que só terá cabimento quando não for possível a imposição de outras medidas cautelares menos severas (arts. 282, § 6º, e 283, § 1º, ambos do CPP). Enfatizou-se, uma vez mais, que a liberdade é a regra; a prisão, medida excepcional.
2. CONCEITO A prisão preventiva é modalidade de prisão cautelar de natureza processual que decorre de decisão judicial, podendo ser decretada em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, e mesmo no momento da decisão de pronúncia ou da sentença penal condenatória, desde que presentes os requisitos legais.
3. NATUREZA JURÍDICA Por se tratar de modalidade de prisão sem pena, é correto afirmar que a prisão preventiva é prisão provisória (ainda não há uma condenação com trânsito em julgado), de natureza cautelar, que visa assegurar a harmonia da ordem social ou da ordem econômica, o êxito da produção de provas, bem como a efetiva aplicação da lei penal. É providência excepcional privativa de liberdade, cuja decretação somente se faz exercitável quando demonstrados seus requisitos indispensáveis, a saber: fumus boni iuris (fumaça de um bom direito) e periculum in mora (perigo na demora). Tem natureza residual ou subsidiária, visto que em face da regulamentação imposta pela Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011, somente será determinada quando não for adequada e suficiente a aplicação de outra medida cautelar (§ 6º do art. 282 do CPP). “Em virtude do princípio constitucional da não culpabilidade, a custódia acauteladora há de ser tomada como exceção. Cumpre interpretar os preceitos que a regem de forma estrita, reservando-a a situações em que a liberdade do acusado coloque em risco os cidadãos”4. Parte da doutrina entende que o correto em termos de requisitos da cautelaridade é utilizar as denominações fumus commissi delicti (prova da existência do crime e indícios suficientes da autoria) e periculum libertatis (perigo que decorre da permanência de alguém em liberdade). A nosso ver, não é inadequado apontar o fumus boni iuris e o periculum in mora como requisitos gerais da cautelaridade em se tratando de providência de natureza processual penal, em especial no
que toca à prisão preventiva, visto que neste caso o primeiro requisito — fumus boni iuris — corresponde exatamente ao fumus commissi delicti (prova da existência do crime e indícios suficientes da autoria), enquanto o segundo — periculum in mora — tem com o periculum libertatis (perigo que decorre da liberdade de alguém) identidade de escopo. Observado que o art. 312, caput, do CPP apresenta quais são os pressupostos e as circunstâncias autorizadoras da prisão preventiva, o fumus commissi delicti nada mais é do que a fumaça de um bom direito, legitimador da medida extrema, ao passo que o periculum libertatis diz, em outras palavras, que a medida deve ser adotada com brevidade, sem tardança, pois há perigo na demora.
4. CONSTITUCIONALIDADE Na democrática expressão do art. 5º, LVII, da CF, ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. A leitura isolada desta regra fundamental poderia levar à conclusão no sentido de que qualquer forma de prisão cautelar é inconstitucional no sistema jurídico brasileiro. Mas não é bem assim, já que a própria Carta Soberana estabelece a possibilidade de prisão em flagrante (art. 5º, LXI) e trata da inafiançabilidade de certos tipos de delito (art. 5º, XLIII), a demonstrar a possibilidade jurídica das prisões cautelares, conforme dispuser a regra infraconstitucional. “A maior complexidade das relações sociais, bem como a verificação da crescente sofisticação das práticas delituosas mais graves e complexas, inclusive com o desenvolvimento de atividades por organizações criminosas, fazem com que seja essencial o sopesamento dos vários interesses, direitos e valores envolvidos no contexto fático e social subjacente. Os critérios e métodos da razoabilidade e da proporcionalidade se afiguram fundamentais neste contexto, de modo a não permitir que haja prevalência de determinado direito ou interesse sobre outro de igual ou maior estatura jurídicovalorativa”5. Conforme analisou CLAUS ROXIN, “entre as medidas que asseguram o procedimento penal, a prisão preventiva é a ingerência mais grave na liberdade individual; por outra parte, ela é indispensável em alguns casos para uma administração da justiça penal eficiente. A ordem interna de um Estado se revela no modo em que está regulada essa situação de conflito; os Estados totalitários, sob a antítese errônea Estado-cidadão, exagerarão facilmente a importância do interesse estatal na realização, o mais eficaz possível, do procedimento penal. Num Estado de Direito, por outro lado, a regulação dessa situação de conflito não é determinada através da antítese Estado-cidadão; o Estado mesmo está obrigado por ambos os fins: assegurar a ordem por meio da persecução penal e proteção da esfera de liberdade do cidadão. Com isso, o princípio constitucional da proporcionalidade exige restringir a medida e os limites da prisão preventiva ao estritamente necessário”6.
5. MOMENTO DA DECRETAÇÃO O art. 310 do CPP determina que ao receber o auto de prisão em flagrante, não sendo caso de relaxamento ou de conceder liberdade provisória, com ou sem fiança, o juiz deverá, em decisão fundamentada, converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 do CPP, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão. Conforme a redação do novo art. 311 do CPP, a prisão preventiva poderá ser decretada em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal. Pode ser decretada no momento da decisão de
pronúncia (art. 413, § 3º, do CPP) ou da sentença de condenação (art. 387, parágrafo único, do CPP). No que tange à fase pré-processual, a redação anterior do art. 311 dizia que a decretação era possível em qualquer fase do inquérito policial, o que autoriza afirmar que, ao permitir, agora, a decretação em qualquer fase da investigação policial, deu-se enorme e odiosa ampliação das molduras da prisão preventiva neste momento ainda inseguro da apuração, visto poder alcançar investigações que ainda não se materializaram em inquérito policial. A decretação da prisão preventiva no curso das investigações, mesmo durante o inquérito policial, embora permitida, é medida que reclama redobrada cautela. Com efeito, para a decretação deste tipo de prisão exige-se a demonstração inequívoca de prova da existência do crime e indício suficiente da autoria, e é claro que, se estes pressupostos estão evidenciados, o Ministério Público já dispõe de todos os elementos de que necessita para o ajuizamento da ação penal (art. 41 do CPP), quando for o titular do direito de ação (art. 129, I, da CF). Como admitir, então, que o Ministério Público se manifeste dizendo que há prova da existência do crime e indício da autoria; requeira ou endosse representação visando à decretação de prisão preventiva e desde já não ofereça a denúncia, caso seja o titular da ação penal? Mesmo diante de tal quadro é preciso reconhecer que o art. 10 do CPP não sofreu qualquer modificação, textual ou de aplicação, raciocínio que se impõe também em relação aos procedimentos especiais. Quer nos parecer que a prisão temporária — regulada pela Lei n. 7.960/89 — é a modalidade de prisão cautelar a ser utilizada na fase de investigação policial, quando cabível. Note-se que nas infrações a que não for isolada, cumulativa ou alternativamente cominada pena privativa de liberdade não se imporá qualquer das medidas cautelares previstas no Título IX, Livro I, do CPP. Vale dizer: não é possível prisão em flagrante (art. 302), prisão preventiva, ou qualquer outra medida cautelar diversa da prisão (arts. 319 e 320 do CPP).
6. MODALIDADES Observadas as situações reguladas, é possível afirmar a existência das seguintes modalidades de prisão preventiva: prisão preventiva autônoma ou tradicional (art. 311 do CPP); prisão preventiva utilitária (art. 311, parágrafo único, do CPP) e prisão preventiva substitutiva, subsidiária ou por descumprimento (art. 312, parágrafo único, do CPP). Há quem aponte uma quarta classificação: prisão preventiva por conversão, para referir-se à hipótese tratada no art. 310, II, do CPP. Guardada a necessária fidelidade com o que anotamos no capítulo em que cuidamos da prisão em flagrante, calha enfatizar que, segundo pensamos, mesmo se referindo o dispositivo legal à conversão da prisão em flagrante em preventiva, temos que não é correto o emprego da expressão, visto que na hipótese o que ocorre é mesmo a decretação da prisão preventiva, enquadrando-se a situação na modalidade de prisão preventiva autônoma ou tradicional. Prisão em flagrante e prisão preventiva são institutos distintos, com objetivos e regras que não se confundem, daí não ser possível converter a primeira na segunda.
7. QUEM PODE DECRETAR PRISÃO PREVENTIVA Somente a autoridade judiciária competente está apta a decretar prisão preventiva, pois, segundo dispõe o art. 5º, LXI, da CF: “ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e
fundamentada de autoridade judiciária competente...”, regra também disposta no art. 283, caput, do CPP. A propósito, “o decreto judicial de prisão preventiva, emanado de autoridade judiciária incompetente, é insuscetível de ratificação”7.
7.1. Prisão preventiva obrigatória Antes mesmo da reforma introduzida com a Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011, a legislação processual penal não mais contemplava a prisão preventiva obrigatória, modalidade de segregação já regulada no Brasil ao tempo da era totalitária8 e em relação a isso nada mudou. Não se impôs qualquer retrocesso neste tema, até porque incompatível com o ambiente democrático dos dias que correm.
8. QUEM PODE POSTULAR A DECRETAÇÃO A prisão preventiva, nos precisos termos do novo art. 311 do CPP, poderá ser decretada em razão de requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou de representação da autoridade policial.
8.1. Decretação ex officio Antes da reforma introduzida com a Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011, era possível a decretação da prisão preventiva por iniciativa do juiz — ex officio —9 em qualquer fase do inquérito ou da instrução criminal10. Agora, com a atual redação do art. 311 do CPP, caberá prisão preventiva decretada pelo juiz, de ofício, apenas no curso do processo penal. Durante a fase de investigação não mais, e esta regra também está disposta no art. 282, § 2º, do CPP. A redação do art. 311 do CPP está em aparente conflito com o art. 310, II, do mesmo Codex, de onde se extrai a possibilidade de decretação da prisão preventiva já no momento do controle jurisdicional imediato que se estabelece sobre a prisão em flagrante11. Como conciliar estas regras? A possibilidade conciliatória reclama observar o disposto no novo art. 306, caput, do CPP, que agora prevê a necessidade de comunicação da prisão em flagrante também ao Ministério Público, que, segundo pensamos, deverá, sendo caso, a partir dos documentos disponíveis, enviar requerimento de prisão preventiva ao juiz, daí a possibilidade de se pensar na aplicação do art. 310, II, do CPP não como decretação ex officio, mas em razão deste requerimento do Ministério Público ou como decorrência do acolhimento de representação já formulada pela autoridade policial e encaminhada com o auto de prisão em flagrante no momento a que se refere o § 1º do art. 306. Convenhamos: é muito exercício de raciocínio e tudo isso implica agilidade de que a Justiça Criminal não dispõe. Alternativa mais factível e que já ocorre na prática, embora não tratada expressamente no CPP12, é o juiz determinar a abertura de vista ao Ministério Público a fim de que se manifeste previamente no expediente que se formar com a cópia do auto de prisão em flagrante, ocasião em que, entre outras providências, poderá requerer a decretação da prisão preventiva, se presentes os requisitos legais, após o que deverão os autos tornar conclusos ao juiz, que então, observado o cabimento ou não de contraditório prévio, decidirá e, sendo caso, poderá converter a prisão, acolhendo provocação de qualquer dos legitimados. Há mais. O art. 310, II, apenas faz referência à possibilidade de decretação da prisão preventiva,
cujas diretrizes são encontradas nos arts. 282, § 2º, e 311, ambos do CPP, de onde se extrai a absoluta impossibilidade jurídica de decretação ex officio na fase de investigação. Mas não é só. Excetuada a situação de flagrante delito, o art. 5º, LXI, da CF exige ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente para que se possa impor privação de liberdade, o que afasta qualquer possibilidade de prisão preventiva ex lege; obrigatória; automática; em razão da natureza da infração. A fundamentação exigida, in casu, não é aquela mesma apontada no art. 93, IX, da CF — genérica —, que impõe sejam fundamentadas todas as decisões judiciais. Não se trata de reiteração ou mera superfetação de comando. Neste ambiente de tensão com o disposto no mesmo art. 5º, LVII, da CF, segundo o qual “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”, a fundamentação a que se refere o mesmo art. 5º, LXI, é a fundamentação específica, legitimadora da excepcional providência privativa de liberdade. A fundamentação específica da ordem de prisão é requisito constitucional, e o art. 282, I e II, do CPP indica critérios para a decretação, que neste caso devem estar alinhados com os arts. 311 a 313 do CPP. A propósito, observa GUILHERME DE SOUZA NUCCI que: “A previsão de decretação da prisão preventiva como ato de ofício do magistrado, logo, sem que qualquer interessado provoque, é mais uma mostra de que o juiz, no processo penal brasileiro, afasta-se de sua posição de absoluta imparcialidade, invadindo seara alheia, que é a do órgão acusatório, podendo decretar medida cautelar de segregação sem que qualquer das partes, envolvidas no processo, tenha solicitado”13. Ex officio ou em razão de provocação, há que se pensar que a decretação válida só poderá ser lavrada por juiz competente14, pois a incompetência do juízo gera a nulidade do decreto de prisão preventiva15.
8.2. Requerimento do Ministério Público Nada mais aconselhável e correto do que legitimar o Ministério Público, titular da ação penal pública, a requerer a decretação da prisão preventiva quando presentes os requisitos legais e evidenciada a imprescindibilidade da medida excepcional. Por aqui a reforma introduzida com a Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011, nada inovou. Pode o Ministério Público, entretanto, requerer a decretação da preventiva quando o inquérito ou a ação penal tratar de crime de ação penal privada exclusiva? Sim. Muito embora o Ministério Público não esteja legitimado a propor ação penal privada exclusiva, deve intervir em todos os termos do processo que dela resultar, podendo, inclusive e se necessário, aditar a queixa-crime, conforme determina o art. 45 do CPP, daí a evidente possibilidade de postular a decretação de prisão preventiva quando a providência se revelar cabível e necessária. O Ministério Público deve formular sua pretensão por meio de requerimento, que deverá ser endereçado ao juiz competente. Neste caso, ressalvadas as hipóteses de urgência ou de perigo de ineficácia da medida, antes de proferir decisão a respeito, o juiz deverá determinar a intimação da parte contrária (investigado ou réu), a fim de que se manifeste, conforme determina o art. 282, § 3º, do CPP. Indeferido o pedido, a decisão poderá ser atacada por meio de recurso em sentido estrito, conforme
dispõe o art. 581, V, do CPP.
8.3. Requerimento do querelante Denomina-se querelante o autor da petição inicial da ação penal privada — queixa-crime. A considerar a letra da lei, neste caso o pedido somente poderá ser feito após a instauração da ação penal, pois antes não há falar em querelante, mas em ofendido, e a lei não permitiu ao ofendido formular tal pretensão. A decretação a pedido do querelante já era autorizada antes da reforma instituída com a Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011. Parte que é na ação penal privada, pode o querelante requerer a decretação da preventiva, e no caso de desacolhimento da pretensão interpor recurso em sentido estrito (art. 581, V, do CPP). Se no curso do inquérito policial que apure crime de ação penal privada se mostrar cabível e necessária a prisão preventiva, somente o Ministério Público poderá requerer a decretação da custódia, mas isso não retira do ofendido a possibilidade de expor sua pretensão em juízo. Neste caso, o juiz determinará a abertura de vista dos autos ao Ministério Público a fim de que se manifeste antes de proferir sua decisão a respeito, podendo daí resultar as situações que seguem analisadas: a) O Ministério Público entende não ser caso de prisão preventiva e o juiz não a decreta. O ofendido, neste caso, não poderá recorrer da decisão judicial, pois a lei não o legitimou a tanto (só o querelante, conforme vimos). b) O Ministério Público concorda com o ofendido, pura e simplesmente, e o juiz não decreta a prisão. Neste caso, o ofendido não poderá recorrer, pois não é parte legítima, e o Ministério Público também não, pois apenas “concordou” com as razões expostas pelo ofendido, sem formular, a rigor, requerimento expresso com vistas à decretação da prisão preventiva. c) O Ministério Público concorda com o ofendido e em razão disso formula requerimento expresso de decretação da prisão preventiva, mas o juiz não a decreta. Nesta situação o ofendido também não poderá recorrer da decisão, pelos motivos já assinalados, mas o Ministério Público sim, pois formulou requerimento expresso. d) O Ministério Público concorda com o ofendido e por isso formula requerimento expresso, ao final acolhido pelo juiz que então decreta a prisão. Neste caso, não há falar em legitimidade do ofendido, tampouco interesse jurídico do Ministério Público (ou de ambos) em ver modificada a decisão judicial que acolhe a pretensão. Haverá, isto sim, legítimo interesse daquele contra quem se decretou a custódia cautelar, em ver cassada tal decisão, mas a reação defensiva adequada será objeto de apreciação mais adiante, em tópico específico. Deve-se recordar a necessidade de contraditório prévio, ressalvadas as hipóteses de urgência ou de perigo de ineficácia da medida (art. 282, § 3º, do CPP).
8.4. Requerimento do assistente Podem figurar como assistente da acusação no processo penal: a vítima, seu representante legal ou, no caso de morte, qualquer das pessoas indicadas no art. 31 do CPP (v. arts. 268 a 273 do CPP). Até a reforma processual penal introduzida com a Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011, o assistente não se encontrava legitimado a requerer prisão preventiva. Agora está. A previsão, contudo, não está a salvo de críticas, visto que, em regra, o interesse do assistente no
processo penal está direcionado à possibilidade de reparação patrimonial16, podendo ocorrer que o requerimento venha a ser formulado como forma de retaliação ou vindicta. Contra eventuais requerimentos abusivos, entretanto, temos a vocação da magistratura para o equilíbrio na busca e atingimento da Justiça, sempre em condições de impor limitações jurídicas onde as balizas do bom senso não se revelarem suficientes. Apresentado o requerimento do assistente, observado o disposto no art. 282, § 3º, do CPP, antes de sua decisão o juiz determinará se proceda à abertura de vista ao Ministério Público e à defesa a fim de que sobre tal pretensão se manifestem. Negado o requerimento do assistente, a decisão que assim pautar será atacável por recurso em sentido estrito (art. 581, V, do CPP). Necessário anotar que a atuação do assistente ocorrerá, em regra, no curso do processo penal, e não na fase de investigação.
8.5. Representação da autoridade policial A decretação em atendimento à representação da autoridade policial já era prevista no CPP antes da reforma introduzida com a Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011. Autoridade policial, in casu, é a autoridade que preside o inquérito policial. A representação de que ora se cuida nada mais é do que uma manifestação circunstanciada, assinada pela autoridade policial e endereçada ao juiz competente, alertando sobre o cabimento e a necessidade da prisão preventiva diante da excepcionalidade de certo caso. Sobre ela deverá manifestar-se o Ministério Público e a defesa antes da decisão judicial que se irá lançar sobre seus termos (art. 282, § 3º, do CPP). Caso seja indeferida a representação, da decisão não poderá recorrer o Delegado de Polícia, pois lhe falta interesse jurídico recursal. Note-se que ao possibilitar a interposição de recurso em sentido estrito, conforme o inciso V do art. 581 do CPP, o legislador restringiu o cabimento da via de impugnação à hipótese de indeferimento de requerimento visando decretação de prisão preventiva, e não de representação. Preciosismo de linguagem? Claro que não. Conforme advertiu o Min. MARCO AURÉLIO, “Sendo o Direito uma ciência, há de emprestar-se sentido técnico a institutos, expressões e vocábulos”17. Não tem cabimento imaginar possa o Delegado de Polícia recorrer de decisão judicial que desacolhe representação formulada com vistas à decretação de prisão preventiva. Necessário gizar, todavia, que, se o Ministério Público, ao se pronunciar sobre a representação formulada pela autoridade policial, endossar a argumentação por aquela exposta e formular requerimento expresso visando à decretação da prisão preventiva, embora o Delegado de Polícia não tenha legitimidade recursal, poderá o Ministério Público, querendo, interpor recurso em sentido estrito contra a decisão que desacolher a pretensão, com vistas a ver prevalecer as razões de seu requerimento. Por fim, uma pergunta se impõe: A autoridade policial pode formular representação depois de encerradas as investigações a seu cargo e já instaurada a ação penal? Pensamos que sim. O art. 311 do CPP assegura que a prisão preventiva será cabível em qualquer fase da investigação
policial ou da ação penal, e não há qualquer texto legal que determine algum tipo de limitação à referida atividade policial levando em conta o momento da persecução penal.
9. REQUISITOS PARA A DECRETAÇÃO Medida excepcional que é, para a decretação da prisão preventiva se faz imprescindível o atendimento de determinados requisitos18, que devem ser interpretados restritivamente19, sem os quais qualquer decretação a tal título materializará ilegalidade. Como disse o Min. MARCO AURÉLIO : “Ante o princípio constitucional da não culpabilidade, a custódia acauteladora há de ser tomada como exceção, cumprindo interpretar os preceitos que a regem de forma estrita, reservando-a a situações em que a liberdade do acusado coloque em risco os cidadãos”20. Como requisitos, em sentido amplo, podemos mencionar: 1º) os pressupostos indicados no art. 312, caput, parte final, do CPP; 2º) as hipóteses de cabimento, previstas no art. 313, I a III e parágrafo único, e no art. 312, parágrafo único, c/c o art. 282, § 4º, todos do CPP; 3º) e as circunstâncias autorizadoras, listadas no art. 312, caput, primeira parte, do CPP. Há que se ter em mente, sempre, a seguinte advertência do Min. CELSO DE MELLO a respeito da necessidade de apuração criteriosa dos requisitos autorizadores: “A mera suposição, fundada em simples conjecturas, não pode autorizar a decretação da prisão cautelar de qualquer pessoa. A decisão que ordena a privação cautelar da liberdade não se legitima quando desacompanhada de fatos concretos que lhe justifiquem a necessidade, não podendo apoiar-se, por isso mesmo, na avaliação puramente subjetiva do magistrado de que a pessoa investigada ou processada, se em liberdade, poderá delinquir, ou interferir na instrução probatória, ou evadir-se do distrito da culpa, ou, então, prevalecer-se de sua particular condição social, funcional ou econômico-financeira. Presunções arbitrárias, construídas a partir de juízos meramente conjecturais, porque formuladas à margem do sistema jurídico, não podem prevalecer sobre o princípio da liberdade, cuja precedência constitucional lhe confere posição eminente no domínio do processo penal”21. A seguir cuidaremos da análise dos pressupostos e de cada uma destas hipóteses e circunstâncias, que em conjunto apontamos como requisitos indispensáveis para a decretação da prisão preventiva.
9.1. Pressupostos Pressuposto é um antecedente necessário. Neste caso, segundo dispõe o art. 312, caput, parte final, do CPP, os pressupostos são: prova da existência do crime e indício suficiente de autoria. Os pressupostos representam, em verdade, o fumus boni juris ou fumus commissi delicti, indispensável à decretação da prisão preventiva.
9.1.1. Prova da existência do crime Para que se possa cogitar cabível a decretação, é preciso existir nos autos do inquérito ou do processo prova efetiva da existência do crime. De ver, contudo, e nos precisos termos do art. 239 do CPP, que os indícios integram o sistema de provas no sistema processual penal brasileiro. Há que se pensar, contudo, na exigência de indícios veementes (e não meros indícios) a respeito da ocorrência de determinado crime para que se possa continuar no raciocínio a respeito da admissibilidade da prisão cautelar de que ora se cuida.
Para MITTERMAIER indício “é um fato em relação tão precisa com outro fato, que, de um, o juiz chega ao outro por uma conclusão natural”22. Segundo afirmou FREDERICO MARQUES, “o valor probante dos indícios e presunções, no sistema do livre convencimento que o Código adota, é em tudo igual ao das provas diretas”23.
9.1.2. Indícios suficientes da autoria Recaindo a prisão preventiva sobre determinada pessoa, é induvidoso que esta medida extrema e excepcional só poderá ser adotada se, in casu, além de ficar demonstrada a existência de prova da ocorrência do crime, também se evidenciar nos autos do inquérito ou da ação penal a existência de indícios suficientes indicativos da autoria. Indícios suficientes não são meros indícios, mas indícios veementes, conforme já cuidou de diferenciar a doutrina especializada em prova criminal24 e reiteradamente têm decidido nossos tribunais25, desde longa data. É preciso que o juiz disponha de elementos sensíveis de convencimento a respeito da existência do crime e de que aquela determinada pessoa fora o autor (ou partícipe). Não basta, não é suficiente para a decretação da prisão preventiva a presença dos pressupostos indicados. É preciso ir além. Para que se apresente viável prisão preventiva, deverão estar presentes também umas das hipóteses autorizadoras, conforme analisaremos a seguir.
9.2. Hipóteses de cabimento O art. 313 do CPP sofreu modificações substanciais com a Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011. Aprimorou-se o rol das hipóteses de cabimento, ao mesmo tempo que se dificultou, consideravelmente, a admissibilidade da prisão preventiva, conforme trataremos de expor. Nos precisos termos do art. 313 do CPP, caberá prisão preventiva: “I — nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos; II — se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 — Código Penal; III — se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência”. E arremata o parágrafo único: “Também será admitida a prisão preventiva quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecêla, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida”. A prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento injustificado de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares (art. 312, parágrafo único, c/c o art. 282, § 4º, ambos do CPP).
9.2.1. Art. 313, I, do CPP: crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a quatro anos Na redação antiga, dispunha o art. 313, I, do CPP ser cabível a decretação de prisão preventiva em relação aos “crimes punidos com reclusão”. Como se pode concluir, bastava que a pena cominada fosse de reclusão para que estivesse aberta a
possibilidade de prisão preventiva, cuja decretação iria depender, sempre, da conjugação dos demais requisitos (pressupostos + ao menos uma circunstância autorizadora). Era possível, por exemplo, a decretação da prisão preventiva em crime de furto simples (art. 155, caput, do CP: pena — reclusão de 1 a 4 anos); extorsão indireta (art. 160 do CP: pena: reclusão, de 1 a 3 anos); apropriação indébita fundamental (art. 168, caput, do CP: pena — reclusão, de 1 a 4 anos), dentre outros de semelhante repercussão. O legislador abandonou o critério qualitativo (reclusão) e adotou o critério quantitativo da pena. Na redação atual, será cabível a preventiva nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos, de maneira que o crime punido com pena até quatro anos (e quatro anos, inclusive) não mais admite prisão preventiva, salvo se identificada outra hipótese de cabimento. Agora a lei impôs restrições severas à decretação, na medida em que não basta, como antes, ser o crime punido com reclusão. Calcado no fundamento de que ora se cuida, temos que é necessário: 1º) tenha ocorrido a prática de crime; 2º) que o crime seja doloso; 3º) que o crime doloso seja punido com pena privativa de liberdade; 4º) que a pena privativa de liberdade máxima cominada seja superior a quatro anos. Disso se extrai que: 1º) não é possível a prisão preventiva em relação à infração a que não for isolada, cumulativa ou alternativamente cominada pena privativa de liberdade (§ 1º do art. 282); 2º) não é possível prisão preventiva em razão da prática de contravenção penal; 3º) não se admite prisão preventiva nos crimes culposos (sob o fundamento que estamos analisando); 4º) é possível prisão preventiva nos crimes preterdolosos (dolo no antecedente e culpa no consequente); 5º) é possível, a priori, prisão preventiva em razão da prática de crime punido com reclusão ou detenção. Nas hipóteses de concurso de crimes dolosos — arts. 69, 70 e 71 do CP — as repercussões nas penas cominadas deverão ser observadas para efeito de analisar o cabimento de prisão preventiva. De tal sorte, será cabível a custódia quando, em concurso material (art. 69 do CP), a soma das penas mínimas cominadas for superior a quatro anos. Ocorrendo concurso formal, a pena máxima cominada ao crime mais grave deve ser aumentada de metade (máximo permitido no art. 70 do CP). Se o total superar o limite de 4 (quatro) anos caberá a preventiva. Se a hipótese evidenciar crime continuado, a pena máxima cominada ao crime mais grave — se diversos — deve ser aumentada de 2/3 (máximo permitido no art. 71, caput, do CP). De igual maneira, se ultrapassada a barreira dos 4 (quatro) anos, caberá preventiva. As qualificadoras também devem ser consideradas. De tal sorte, o que se deve levar em conta é a correta adequação típica da conduta. Com vistas a apurar a maior pena abstratamente cominada, também as causas de aumento e diminuição de pena repercutem na delimitação tratada. Na primeira hipótese, a pena máxima
cominada ao delito deve sofrer o aumento máximo previsto. Na segunda, a pena máxima cominada sofrerá a diminuição mínima. Na hipótese de crime tentado, observada a pena máxima cominada, aplica-se a menor redução permitida no art. 14, II, do CP: 1/3 (um terço). As circunstâncias agravantes (arts. 61 e 62 do CP) e as atenuantes (arts. 65 e 66 do CP) não devem ser levadas em conta para a finalidade estudada.
9.2.2. Art. 313, II, do CPP: reincidência dolosa Diz o atual art. 313, II, do CPP, que será cabível prisão preventiva: se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 — Código Penal. Cuida o dispositivo da reincidência dolosa. A redação anterior, que basicamente foi mantida, fazia referência ao parágrafo único do art. 46 do CP, que tratava da prescrição da reincidência26. A reforma da Parte Geral do Código Penal imposta com a Lei n. 7.209, de 11 de julho de 1984, remeteu a prescrição da reincidência para o art. 64, I, do CP, daí a modificação na redação do atual art. 313, II, do CPP, para se ajustar à atual posição topológica (ou topográfica) do tipo em questão. Nos precisos termos deste inciso I do art. 64 do CP: para efeito de reincidência, não prevalece a condenação anterior, se entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a cinco anos, computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional, se não ocorrer revogação. A hipótese tratada autoriza, portanto, a decretação da prisão preventiva quando o investigado ou acusado for reincidente em crime doloso, assim reconhecido em sentença penal condenatória da qual não caiba mais recurso, salvo se tiver ocorrido a prescrição da reincidência. Caberá, portanto, prisão preventiva, em relação ao agente que já foi definitivamente condenado por crime doloso e agora praticou outro crime doloso. Satisfeita esta hipótese de cabimento, não é necessário verificar se o novo crime, pelo qual se pretende a decretação da prisão preventiva, tem cominada pena privativa de liberdade máxima superior a quatro anos (art. 313, I, do CPP), pois as hipóteses de cabimento devem ser analisadas isoladamente, e não em conjunto. Muito embora a reincidência nos termos acima analisados seja causa eficiente para a decretação da custódia cautelar tratada, a primariedade e mesmo a ausência de antecedentes desabonadores não impedem a segregação, conforme decisões reiteradas do STF27, quando identificada outra hipótese de cabimento.
9.2.3. Art. 313, III, do CPP: crime de covardia Caberá prisão preventiva, ainda, se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência. A lei que trata da violência doméstica e familiar contra a mulher é a Lei n. 11.340, de 7 de agosto de 2006, a famosa “Lei Maria da Penha”, que segundo consta de seu preâmbulo: “Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a
Mulher”. Outra hipótese de cabimento de prisão preventiva se descortina, agora em relação ao criminoso covarde, autor de crime praticado com violência doméstica contra criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência. Considera-se criança, nos termos do art. 2º da Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), a pessoa até 12 anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre 12 e 18 anos de idade. Idoso, nos termos do art. 1º da Lei n. 10.741, de 1º de outubro de 2003, é aquele com idade igual ou superior a 60 anos de idade. Enfermo é o acometido por algum tipo de moléstia; doente. Pessoa com deficiência é a pessoa portadora de necessidades especiais em razão de alguma deficiência física ou mental, ou de ambas. Violência, neste caso, é somente a violência física. A proteção legal encontra-se robustecida em relação a estas determinadas particularidades em razão de questões humanitárias e por levar em conta a reduzida ou nenhuma capacidade de resistência das vítimas, que assim ficam expostas à crueldade e ausência de parâmetros morais do agressor. Atende, ainda, a princípios constitucionais específicos ligados à preservação da infância e da adolescência, respeito aos idosos, enfermos e pessoas portadoras de deficiência. É necessário observar que o art. 313, III, não autoriza a decretação da prisão preventiva sempre que figurar como vítima pessoa que se encaixe na previsão legal (mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência). Não se trata de modalidade de prisão preventiva obrigatória para tais casos, tampouco pode a custódia ser decretada sem a satisfação de outro requisito. A lei exige mais. Exige que a decretação da prisão preventiva se revele necessária para garantir a execução de medidas protetivas de urgência aplicadas por força de lei. Dispõe o art. 22 da Lei n. 11.340/2006: “Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras: I — suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei n. 10.826, de 22 de dezembro de 2003; II — afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida; III — proibição de determinadas condutas, entre as quais: a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor; b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação; c) frequentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida; IV — restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar; V — prestação de alimentos provisionais ou provisórios.
9.2.4. Art. 313, parágrafo único, do CPP: dúvida sobre a identidade do agente Também será admitida a prisão preventiva quando houver dúvida a respeito da identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida. O art. 1º, II, da Lei n. 7.960, de 21 de dezembro de 1989 — Lei da Prisão Temporária —, estabelece que caberá a decretação da prisão temporária quando o indiciado não tiver residência fixa
ou não fornecer elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade. Enquanto a prisão temporária é possível apenas na fase de investigação e para os crimes taxativamente previstos, a prisão preventiva em relação àquele sobre o qual paire dúvida a respeito de sua identidade pode ser decretada tanto na fase de investigação quanto no curso do processo penal. Uma e outra modalidade de prisão cautelar convivem em harmonia. O fato de o parágrafo único do art. 313 do CPP regular a matéria de maneira semelhante à tratada na Lei n. 7.960/89 não tem qualquer impacto sobre esta. Não ocorreu derrogação da regra especial. É possível o oferecimento e recebimento de denúncia sem que se tenha a completa qualificação do réu, mas tão somente esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, conforme decorre do disposto nos arts. 41 e 259 do CPP, e disso resulta afirmar a possibilidade de prisão preventiva na fase processual sob tal fundamento. A decretação da prisão preventiva com fundamento na hipótese tratada não reclama a presença de qualquer das circunstâncias indicadas no art. 312, caput, do CPP (garantia da ordem pública; garantia da ordem econômica; conveniência da instrução criminal; assegurar a aplicação da lei penal) ou das hipóteses do art. 313, I e II, do CPP (crime doloso28 punido com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 anos; reincidente doloso, ressalvada a prescrição da reincidência)29, e bem por isso pode ser decretada em relação a crime culposo, mas é preciso ter em vista o disposto na Lei n. 12.037/2009, de onde se extrai que, em regra, o civilmente identificado não será submetido a identificação criminal. Diz o art. 2º da Lei n. 12.037/2009 que a identificação civil poderá ser atestada por qualquer dos seguintes documentos: carteira de identidade; carteira de trabalho; carteira profissional; passaporte; carteira de identificação funcional, ou outro documento público que permita a identificação, estando equiparados aos documentos de identificação civis os documentos de identificação militares. Na dicção do art. 3º da mesma lei, embora apresentado documento de identificação, poderá ocorrer identificação criminal quando: I — o documento apresentar rasura ou tiver indício de falsificação; II — o documento apresentado for insuficiente para identificar cabalmente o indiciado; III — o indiciado portar documentos de identidade distintos, com informações conflitantes entre si; IV — a identificação criminal for essencial às investigações policiais, segundo despacho da autoridade judiciária competente, que decidirá de ofício ou mediante representação da autoridade policial, do Ministério Público ou da defesa; V — constar de registros policiais o uso de outros nomes ou diferentes qualificações; VI — o estado de conservação ou a distância temporal ou da localidade da expedição do documento apresentado impossibilite a completa identificação dos caracteres essenciais. Quando houver necessidade de identificação criminal, a autoridade encarregada tomará as providências necessárias para evitar o constrangimento do identificado (art. 4º da Lei n. 12.037/2009). Nos precisos termos do art. 5º da lei citada, a identificação criminal incluirá o processo datiloscópico e o fotográfico, que serão juntados aos autos da comunicação da prisão em flagrante, ou do inquérito policial ou outra forma de investigação.
9.2.5. Descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares Como já foi visto anteriormente, a prisão preventiva somente será determinada quando não for possível a aplicação de outra medida cautelar (art. 282, § 6º, do CPP), entenda-se: quando as medidas cautelares arroladas nos arts. 319 e 320 do CPP, adotadas de forma isolada ou cumulativamente, se revelarem inadequadas ou insuficientes (art. 283, § 1º, do CPP).
Determina o parágrafo único do art. 312 do CPP que a prisão preventiva poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares, situação também referida no § 4º do art. 282 do mesmo Codex. A decretação da prisão preventiva por descumprimento de medida anteriormente aplicada não depende da concorrência de qualquer das hipóteses do art. 313 do CPP, o que permite sua aplicação em relação a crimes culposos, e poderá ocorrer em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, contudo, na primeira hipótese (investigação policial), só poderá ser decretada mediante provocação, portanto, se houver requerimento do Ministério Público, de seu assistente ou do querelante, ou representação da autoridade policial. Por aqui reside uma das maiores polêmicas trazidas pela Lei n. 12.403/2011, conforme se evidencia na doutrina a respeito do tema, pois há quem entenda que o descumprimento injustificado de medida anteriormente aplicada, por si, não autoriza a decretação de prisão preventiva, providência esta que só restará autorizada se identificada uma das hipóteses do art. 313 do CPP30. Sustenta-se que é necessária, ainda, a conjugação das circunstâncias tratadas no art. 312, caput, do CPP: garantia da ordem pública; garantia da ordem econômica; conveniência da instrução criminal; assegurar a aplicação da lei penal. Na verdade, por aqui o legislador buscou disciplinar a matéria à semelhança do que fez em relação aos crimes praticados contra hipossuficientes no ambiente familiar, conforme consta do art. 313, III, parte final, onde há expressa indicação no sentido de que a prisão preventiva em casos tais se presta a garantir a execução de medida protetiva anteriormente aplicada, e não há exigência de conjugação de qualquer outra circunstância autorizadora ou hipótese de cabimento. Conforme justifica ANDREY BORGES DE MENDONÇA: “Buscou-se uma válvula de escape para manter e estabelecer um mínimo de eficácia a todo o sistema de medidas cautelares criado pela nova legislação. Realmente, se não fosse possível a aplicação da prisão preventiva em caso de descumprimento das medidas alternativas, de nada adiantaria estabelecer um amplo leque de medidas cautelares à disposição do juiz para neutralizar o periculum in mora se, uma vez aplicadas e descumpridas, nada pudesse fazer. Sim, porque se o réu pudesse livremente descumprir as medidas alternativas à prisão sempre que a pena fosse igual ou inferior a quatro anos, sem que o magistrado tivesse qualquer instrumento para a proteção dos bens jurídicos indicados no art. 282, inc. I, seria o mesmo que estabelecer e aceitar a completa ineficiência e ineficácia do sistema. Sem a possibilidade de existir a prisão preventiva como ameaça constante ao réu em caso de descumprimento das medidas alternativas, seria negar a própria eficácia às medidas alternativas à prisão, concedendo ao réu uma ‘faculdade’ de cumprir ou não as referidas medidas toda vez que a pena fosse igual ou inferior a quatro anos. Seria aceitar que o réu poderia solenemente desconsiderar a decisão do juiz e a medida alternativa imposta, sem que existisse qualquer instrumento hábil para forçá-lo a não violar os bens jurídicos do art. 282, inc. I (necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e para evitar a prática de infrações penais)”. E arremata: “A observância das condições impostas não pode ficar condicionada à voluntariedade do agente, pois, como estamos diante de medidas cautelares, devem ser medidas coativas. As medidas cautelares são expressão da própria coerção estatal, entendida, segundo JULIO B. MAIER, como o uso de seu poder, de acordo com a lei, para restringir certas liberdades ou faculdades das pessoas, com o fim de alcançar um fim determinado31. Não podem depender da vontade ou da potestatividade do próprio agente para seu cumprimento”32. A implantação exitosa da política criminal pretendida com a reforma processual introduzida com a
Lei n. 12.403/2011 depende da eficácia das medidas cautelares listadas nos arts. 319 e 320 do CPP, pois, se não houver segurança a respeito da coerção e do cumprimento destas medidas cautelares diversas da prisão, por certo os excessos nas decretações de prisões preventivas não serão reduzidos, o que constitui evidente contrariedade ao conhecido e manifesto desejo da lei. Esta é, portanto, a interpretação que melhor atende aos interesses da Lei e do sistema adotado. Contra eventuais excessos patrocinados na decretação de preventivas por descumprimento de medida cautelar anteriormente aplicada existem vias de ataque juridicamente disponibilizadas. A leitura isolada do § 4º do art. 282 pode fazer concluir que a autoridade policial não está legitimada a formular representação visando decretação de prisão preventiva na hipótese tratada, visto que a ela não faz referência. Todavia, o correto é admitir a legitimação, e isso por força do disposto no art. 311 do CPP. Não se admite a decretação ex officio no curso da investigação policial, apesar de o § 4º do art. 282 do CPP permitir que se conclua o contrário. Neste caso há que se buscar uma interpretação sistêmica, que esteja em harmonia com o § 2º do art. 282 e o art. 311, ambos do CPP, em que há vedação expressa à decretação por iniciativa do juiz no curso da investigação policial. Na redação do art. 319 do CPP encontramos as seguintes medidas cautelares: “I — comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades; II — proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações; III — proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante; IV — proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução; V — recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos; VI — suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais; VII — internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semiimputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração; VIII — fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial; IX — monitoração eletrônica”. Conforme o art. 320 do CPP: “A proibição de ausentar-se do País será comunicada pelo juiz às autoridades encarregadas de fiscalizar as saídas do território nacional, intimando-se o indiciado ou acusado para entregar o passaporte, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas”. Estas medidas cautelares diversas da prisão são objeto de estudo em capítulo distinto.
9.3. Retroatividade benéfica Dispõe o princípio da incidência imediata, expresso no art. 2º do CPP, que a lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior. Por outro vértice, o art. 5º, XL, da CF assegura que a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu. Considerando estarmos diante de regras do Código de Processo Penal, pode parecer à primeira vista que os novos parâmetros estabelecidos no art. 313 do CPP não se encontram dotados de eficácia retroativa, mas não é bem assim, visto que “a natureza processual de uma lei não depende do corpo de
disposições em que esteja inserida, mas sim de seu conteúdo próprio”33. Conforme ensinou VICENZO MANZINI, oportunamente lembrado por RÔMULO DE ANDRADE MOREIRA34, “estar una norma comprendida en el Código de Procedimiento Penal o en el Código Penal no basta para calificarla, respectivamente, como norma de derecho procesal o de derecho material”35. Sem entrarmos na discussão a respeito da natureza processual, penal ou mista destas regras, o correto é afirmar que a retroatividade se impõe. Com efeito, a incidência deste novo balizamento legal acarreta repercussões de natureza penal, sujeitando-se, portanto, ao princípio da retroatividade benéfica, de envergadura constitucional. Não deve subsistir, portanto, a prisão preventiva decretada com fundamento em dispositivo que não mais encontra correspondência na legislação.
10. CIRCUNSTÂNCIAS AUTORIZADORAS Não basta para a decretação da prisão preventiva, ainda, que se tenha provado nos autos a presença de uma dentre as hipóteses de cabimento e dos dois pressupostos que acabamos de analisar. É imprescindível, em se tratando das hipóteses do art. 313, I e II, do CPP, que se tenha claramente demonstrada a incidência de ao menos uma das circunstâncias autorizadoras arroladas no art. 312, caput, do CPP, a saber: 1ª) garantia da ordem pública; 2ª) garantia da ordem econômica; 3ª) conveniência da instrução criminal; 4ª) assegurar a aplicação da lei penal. A existência fática de uma destas circunstâncias é suficiente para indicar o periculum in mora, que alguns preferem denominar periculum libertatis. Nestes casos listados, “a liberdade do indiciado ou acusado pode ser perigosa para o processo ou para a sociedade”36. De ver, entretanto, que “A prisão cautelar — que tem função exclusivamente instrumental — não pode converter-se em forma antecipada de punição penal. A privação cautelar da liberdade — que constitui providência qualificada pela nota da excepcionalidade — somente se justifica em hipóteses estritas, não podendo efetivar-se, legitimamente, quando ausente qualquer dos fundamentos legais necessários à sua decretação pelo Poder Judiciário”37. A presença das circunstâncias autorizadoras aqui referidas não é exigida em relação às demais hipóteses de cabimento tratadas nos arts. 313, III e parágrafo único, e 312, parágrafo único, ambos do CPP, não se justificando o pensamento contrário, já que em tal caso bastaria a presença de uma dessas tais circunstâncias para que se fizesse possível a decretação.
10.1. Garantia da ordem pública O que é que podemos considerar como fundamento suficiente para a decretação de uma prisão preventiva sob o argumento da garantia da ordem pública? Em quais situações concretas podemos dizer que a ordem pública se encontra abalada em razão da liberdade do indiciado ou acusado, a ponto de justificar a imposição da segregação cautelar, que é medida excepcional no sistema constitucional vigente? Conforme se tem decidido38, “a garantia da ordem pública visa, entre outras coisas, evitar a reiteração delitiva, assim resguardando a sociedade de maiores danos”39, além de se caracterizar pelo perigo que o agente representa para a sociedade40. “A garantia da ordem pública é representada pelo imperativo de se impedir a reiteração das práticas criminosas (...). A garantia da ordem pública se revela, ainda, na necessidade de se assegurar a credibilidade das instituições públicas quanto à
visibilidade e transparência de políticas públicas de persecução criminal”41. A fundamentação da prisão preventiva consistente na garantia da ordem pública deve lastrear-se na intranquilidade social causada pelo crime, a ponto de colocar em risco as instituições democráticas42. Não se trata, evidentemente, de hipótese em que o crime tenha provocado clamor público43/comoção social ou despertado a atenção da imprensa44. Com efeito, “o estado de comoção social e de eventual indignação popular, motivado pela repercussão da prática da infração penal, não pode justificar, só por si, a decretação da prisão cautelar do suposto autor do comportamento delituoso, sob pena de completa e grave aniquilação do postulado fundamental da liberdade. O clamor público — precisamente por não constituir causa legal de justificação da prisão processual (CPP, art. 312) — não se qualifica como fator de legitimação da privação cautelar da liberdade do indiciado ou do réu”45. “A repercussão social do fato, inerente ao estrépito de sua execução e ao repúdio que a sociedade confere à prática criminosa, não é bastante, por si só, para fazer presente o periculum libertatis e justificar a prisão preventiva”46. De igual maneira, também não se presta à fundamentação adequada a alusão a conceitos abstratos de ofensa às instituições sociais e familiares47, à possibilidade de gerar uma sensação de impunidade na sociedade48, à necessidade de preservação da credibilidade do Poder Judiciário49, ou a uma hipotética possibilidade de cometimento de outras infrações penais50. De ver, ainda, como bem observou o Min. JOAQUIM BARBOSA quando do julgamento do HC 100.863/SP, de que foi relator, que “ninguém pode ser preso para sua própria proteção”51. A necessidade de garantia da ordem pública não se extrai da gravidade da infração penal, pura e simplesmente52. É preciso, por fim, que o magistrado53 demonstre empiricamente54 a necessidade incontrastável da medida excepcional que é a prisão antecipada, e o ato judicial que a formaliza deve conter fundamentação substancial55. Buscamos na jurisprudência os exemplos abaixo, representativos das hipóteses mais comuns na rotina judiciária, e que, segundo pensamos, elucidam suficientemente as indagações precedentes. São eles: Periculosidade do agente: “A periculosidade do réu constitui motivo apto à decretação de sua prisão cautelar, com a finalidade de garantir a ordem pública, consoante precedentes desta Suprema Corte (HC 92.719/ES, rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ de 19-9-2008; HC 93.254/SP, rel. Min. Cármen Lúcia, DJ de 1º-8-2008; HC 94.248/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJ de 27-62008)”56. “A periculosidade do agente para a coletividade, desde que comprovada concretamente, é apta a manutenção da restrição de sua liberdade (HC 89.266/GO, 1ª T., rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJU de 28-6-2007; HC 86.002/RJ, 2ª T., rel. Min. Gilmar Mendes, DJU de 3-2-2006; HC 88.608/RN, 2ª T., rel. Min. Joaquim Barbosa, DJU de 6-11-2006; HC 88.196/MS, 1ª T., rel. Min. Marco Aurélio, DJU de 17-5-2007”57. “A crueldade da prática delituosa aliada a sua torpeza, causando profunda indignação popular, justificam, suficientemente, o decreto de prisão provisória, ainda que o réu seja primário, ostente bons antecedentes, tenha residência fixa e emprego definido”58. Associação ou organização criminosa: “A necessidade de se interromper ou diminuir a atuação
dos traficantes, mediante a desarticulação da associação criminosa, enquadra-se no conceito de garantia da ordem pública, constituindo fundamentação cautelar idônea e suficiente para a prisão preventiva”59. “A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de que a possibilidade de reiteração criminosa e a participação em organização criminosa são motivos idôneos para a manutenção da custódia cautelar, a fim de garantir a ordem pública”60. “A jurisprudência desta Suprema Corte, em situações semelhantes à dos presentes autos, já se firmou no sentido de que se reveste de fundamentação idônea a prisão cautelar decretada contra possíveis integrantes de organizações criminosas”61. “É pacífico o entendimento deste Supremo Tribunal no sentido de que a possibilidade objetiva de reiteração criminosa constitui motivação idônea para fixação da custódia cautelar”62. “Justifica-se a imposição da prisão preventiva para garantia da ordem pública do réu que exerce relevante papel em sofisticada organização criminosa (envolvida notadamente com a prática de delitos contra o sistema financeiro nacional, de lavagem de dinheiro e contra a Administração Pública), de aprimorado modo de atuação (contando, inclusive, com o auxílio de servidores públicos, de forma a dificultar a fiscalização por parte dos órgãos públicos competentes), porquanto, como é cediço, tais quadrilhas ‘não se intimidam com a ação repressora do Estado, no sentido de investigar e punir a ação do grupo. Apesar do inquérito policial, apesar da ação penal, apesar de até saberem que vão ser condenados pelos crimes de que são acusados, os integrantes da organização contam com esse tipo de percalços em suas atividades, sendo estruturada e organizada para superar esses problemas e persistir na prática de crimes. Para que a ação repressora do Estado seja efetiva, é necessário que o grupo seja desestruturado, o que somente se obtém com a prisão dos seus integrantes’ (STJ, HC 33669/RO, rel. Min. Jorge Scartezzini, DJ de 1º-7-2004)”63. “A prisão se mostra justificada quando o julgador, convencido dos indícios e das provas da autoria, demonstra a necessidade de proteção da ordem pública, tendo em vista a extensão da conduta correspondente à organização criminosa”64.
10.2. Garantia da ordem econômica Esta circunstância foi introduzida no art. 312 do CPP com a Lei n. 8.884/94 e está relacionada com o combate aos crimes financeiros, especialmente crimes contra o sistema financeiro nacional65. O que se leva em conta, neste caso, é uma significativa lesão econômica e suas repercussões na ordem financeira, no mercado de ações, na credibilidade das instituições financeiras etc. Nessa mesma linha de pensamento, o art. 30 da Lei n. 7.492/86 trata da possibilidade de prisão preventiva em razão da magnitude da lesão66, o que evidencia a desnecessidade da previsão existente no CPP.
10.3. Conveniência da instrução criminal A conveniência da instrução criminal constitui a terceira circunstância autorizadora, na ordem de disposição do art. 312 do CPP. Neste caso, a prisão do investigado ou acusado tem por objetivo colocar a salvo de suas influências deletérias a prova67 que deverá ser colhida na instrução do feito e avaliada quando do julgamento do processo. Visa à preservação da verdade real, ameaçada por comportamento do agente contrário a este objetivo68. Será cabível a prisão preventiva sob tal fundamento, por exemplo, nas hipóteses em que o agente
passar a ameaçar a vítima ou testemunhas69 visando impedir ou dificultar prova oral em seu desfavor; quando ameaçar ou tentar corromper perito que deva funcionar nos autos do inquérito ou processo; destruir prova documental ou qualquer vestígio ou evidência do crime70; tentar aliciar jurados71 etc.72 É preciso notar que a decretação da prisão preventiva fundada na circunstância em apreço deixará de estar justificada no momento em que advém o encerramento da instrução73. Se a imposição da cautela visava apenas e tão somente à conveniência da instrução criminal, estando ela finda, não deve subsistir a prisão sob tal fundamento decretada74. Se, todavia, a decretação estiver escoltada em mais de uma circunstância, poderá persistir a prisão, notadamente se o outro argumento tiver relação com a necessidade de assegurar a aplicação da lei penal, tema de que cuidaremos a seguir.
10.4. Assegurar a aplicação da lei penal Esta circunstância tem por escopo impedir que a pena criminal deixe de ser executada em caso de condenação75. É claro que envolve um juízo arriscado, porquanto muitas vezes prematuro a respeito de uma eventual condenação, que poderá ou não acontecer. Mesmo assim, não raras vezes, será a providência cautelar que irá impedir que o investigado ou réu, estando pronto para fugir, não deixe de ser alcançado pela Justiça Criminal. Em certas situações, ciente da gravidade do crime cometido e convencido da correspondente condenação que daí advirá num futuro próximo, seguindo orientação ou mesmo por ideação sua, o increpado começa a se desfazer de seus bens móveis, pede demissão do emprego, coloca sua casa à venda etc. Nestes casos em que a proximidade da fuga se faz evidente e desde que demonstrada nos autos76, tem cabimento a prisão preventiva, se atendidos os demais requisitos legais. A possibilidade de fuga, quando evidenciada em elementos concretos, autoriza e recomenda a decretação da prisão preventiva77; já a mera suspeita, desacompanhada de elementos seguros de convicção, não dá ensejo à segregação excepcional. Ainda que se trate de fuga, o melhor é apreciar, caso a caso, a situação de fato, para que fique evidenciada a real pertinência da prisão78, não servindo de fundamento para a decretação, isoladamente, o fato de o agente ser morador de rua79.
11. DECRETAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA Em linhas gerais, a decretação da prisão preventiva reclama a coexistência e efetiva demonstração do fumus boni juris/fumus commissi delicti e do periculum in mora/periculum libertatis, requisitos da cautelaridade80. O fumus boni juris, já o dissemos, está na constatação empírica de prova da existência do crime e indícios suficientes da autoria, que constituem os dois pressupostos da medida extrema. O periculum in mora identificamos com a presença de uma das circunstâncias autorizadoras. Diante de um caso concreto, para verificar a possibilidade, ou não, de decretação da prisão preventiva impõem-se as seguintes observações: 1º) verificar se estão presentes os dois pressupostos; 2º) analisar se o caso não se encaixa em uma das hipóteses de cabimento;
3º) nas hipóteses do art. 313, I e II, do CPP, identificar a ocorrência de ao menos uma dentre as circunstâncias autorizadoras previstas no art. 312, caput; 4º) em relação às demais hipóteses de cabimento (arts. 313, III e parágrafo único, e 312, parágrafo único), não se exige a presença de qualquer das circunstâncias do art. 312, caput (garantia da ordem pública; garantia da ordem econômica; conveniência da instrução criminal; assegurar a aplicação da lei penal), tampouco a concorrência dos requisitos do art. 313, I e II, o que permite cogitar a admissibilidade da decretação mesmo em se tratando de crime culposo, respeitada a indispensável proporcionalidade e razoabilidade. Caso fosse intenção do legislador restringir a prisão preventiva aos crimes dolosos e assim afastar a possibilidade de aplicação quanto a crimes culposos, por certo a cláusula limitadora — crimes dolosos — estaria no caput do art. 313, e não no inciso I. Presentes esses requisitos, nem mesmo a primariedade e a ausência de antecedentes desabonadores podem servir de argumento contra a decretação, conforme é entendimento tranquilo no STF, apontado nas ementas que seguem transcritas: Primariedade, bons antecedentes e residência fixa: “A circunstância de o paciente ser primário, ter bons antecedentes e residência fixa não se mostra obstáculo ao decreto de prisão preventiva, desde que presentes os pressupostos e condições previstas no art. 312 do CPP”81. “A circunstância de o réu ser primário e de bons antecedentes não é o bastante para impedir a manutenção da sua prisão”82. “A circunstância da paciente ser primária, não ter antecedentes criminais e possuir residência no distrito da culpa, não se mostra obstáculo ao decreto de prisão preventiva, desde que presentes os pressupostos e condições previstas no art. 312, do CPP (HC 83.148/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª T., DJ 02.09.2005)”83. “Primariedade e bons antecedentes não asseguram, por si sós, o direito à liberdade provisória quando há fundamento idôneo justificando a custódia cautelar”84. “As condições subjetivas favoráveis do paciente não obstam a segregação cautelar, desde que presentes nos autos elementos concretos a recomendar sua manutenção, como se verifica no caso presente”85.
11.1. Contraditório na decretação Segundo dispõe o § 3º do art. 282 do CPP, que se refere a todas as medidas cautelares previstas no Título IX, Livro I, do CPP, em que se encontra inserida a prisão preventiva, ressalvados os casos de urgência ou de perigo de ineficácia da medida, o juiz, ao receber o pedido de medida cautelar, determinará a intimação da parte contrária, acompanhada de cópia do requerimento e das peças necessárias, permanecendo os autos em juízo. Embora não esteja expresso no texto da lei, a intimação neste caso tem por escopo proporcionar a manifestação da parte contrária sobre o pedido cautelar, estabelecendo, desta maneira, contraditório prévio à decisão que, todavia, nos casos de urgência ou de perigo de ineficácia da medida poderá anteceder à manifestação da parte contrária, quando então deverá ocorrer o contraditório diferido, assim compreendido aquele que incidirá após a decisão judicial. A questão do contraditório prévio não é tão simples quanto parece e está analisada em profundidade no Capítulo em que tratamos das “Medidas Cautelares Diversas da Prisão”, itens 12. Contraditório na decretação e 12.1. Exceções ao contraditório prévio, para onde remetemos o leitor, com a advertência de considerarmos imprescindíveis profundas reflexões a respeito deste tema.
12. CONDIÇÃO ESPECIAL IMPEDITIVA DA PRISÃO PREVENTIVA Mesmo que num determinado caso se identifique a presença dos requisitos autorizadores da prisão preventiva, ainda assim ela não poderá ser decretada se for possível, adequada e suficiente a aplicação de outra medida cautelar (arts. 319 e 320 do CPP). Como se vê, ainda que presentes os requisitos gerais autorizadores da prisão preventiva, ficará a decretação sujeita a não verificação de condição especial impeditiva, a saber: 1º) não ser possível a aplicação de medida cautelar diversa da prisão, ou, 2ª) sendo possível, elas se revelarem inadequadas ou insuficientes, ainda que cumulativamente pensadas. É o que se extrai do art. 282, § 6º, do CPP. Necessário registrar, entretanto, que há impropriedade na redação do § 6º do art. 282 do CPP quando diz que a prisão preventiva somente será decretada se não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar dentre as previstas no art. 319 do CPP. Conforme assinalamos anteriormente, ao dizer que a preventiva não será decretada quando for cabível sua substituição, tecnicamente, o que se diz revela antagonismo, pois sua substituição por outras medidas cautelares pressupõe sua prévia decretação, o que o dispositivo visa exatamente impedir. O correto seria dizer que a prisão preventiva somente será decretada quando não for cabível, adequada ou suficiente a aplicação de outra medida cautelar dentre as previstas nos arts. 319 e 320 do CPP, isolada ou cumulativamente.
13. CONVERSÃO DA PRISÃO EM FLAGRANTE EM PREVENTIVA A decretação ex officio — pelo juiz — da prisão preventiva continua a ser permitida na legislação processual penal brasileira, contudo, apenas no curso do processo penal. Conforme dispõe o art. 310, II, do CPP86, o juiz, ao receber o auto de prisão em flagrante, que lhe será encaminhado em até 24 horas após a realização da prisão, não sendo caso de relaxamento, liberdade provisória com ou sem fiança, cumulada ou não com a aplicação de medida cautelar diversa da prisão87, deverá, em decisão fundamentada, converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código. Fato é que, mesmo antes das modificações impostas pela Lei n. 12.403/2011, sempre entendemos que a prisão em flagrante não poderia ultrapassar o limite temporal que vai de sua efetivação até a comunicação ao juiz competente, providência obrigatória que deve ocorrer nas 24 horas seguintes à prisão-captura. Essa forma de pensar encontra sua fundamentação no art. 5º, LXVI, da CF, segundo o qual ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança. Do art. 5º, LXI, da CF retiramos autorização para que pessoas possam ser presas em flagrante, mas a interpretação da regra deve ser feita em harmonia com o citado inciso LXVI, de onde se extrai que, após a prisão em flagrante, ninguém poderá continuar preso e, portanto, ser levado ao cárcere, se cabível a liberdade provisória, daí a necessidade de análise dessa situação jurídico-constitucional já no momento do controle jurisdicional imediato, a demonstrar absoluta impropriedade em se afirmar a possibilidade de que alguém possa permanecer, a partir desse instante, preso por força do flagrante. A teor do disposto no art. 310, nesse momento do controle jurisdicional, só poderá subsistir prisão se presentes os requisitos da custódia preventiva, que então deverá ser decretada. A possibilidade jurídica de alguém sofrer restrições à sua liberdade por força de prisão em
flagrante sempre esteve restrita e delimitada no tempo. Nunca pode ultrapassar o lapso temporal que medeia entre a prisão-captura e sua apreciação pelo juiz competente. Isso sempre esteve muito claro no texto constitucional e também no CPP. Em relação a isso o legislador ordinário foi ainda mais enfático, já que o atual art. 310 do CPP evidencia claramente que o juiz deverá, no momento do controle jurisdicional, trabalhar com as variantes indicadas, dentre as quais encontramos a decretação da prisão preventiva. Necessário lembrar, contudo, que o material probatório ordinariamente recolhido pela polícia por ocasião do flagrante nem sempre, ou quase nunca, disponibiliza elementos concretos suficientes para a decretação da prisão preventiva, mesmo diante de casos graves, em que a decretação se apresenta medida de fato imprescindível, o que está a determinar a emergência de uma nova e mais abrangente postura investigativa já neste momento proeminente, por se tratar de dedicação que interessa não só à polícia e ao Ministério Público, mas a toda a sociedade. Muito embora o inciso II do art. 310 se refira à conversão da prisão em flagrante em preventiva, a nosso ver o correto seria referir à decretação desta última, visto que estamos diante de institutos distintos, com regras próprias e finalidades que não se confundem, não sendo caso, portanto, de conversão, mas de decretação.
13.1. Relaxamento da prisão em flagrante e imediata decretação da prisão preventiva A prisão ilegal deve ser imediatamente relaxada pela autoridade judiciária, nos termos do art. 5º, LXV, da CF, c/c o art. 310, I, do CPP. O relaxamento por ilegalidade do flagrante não impede, todavia, a subsequente e imediata decretação da prisão preventiva, quando presentes os requisitos legais. Essa situação, aliás, poderá ocorrer em um único despacho judicial. Conforme se tem decidido, “o relaxamento da segregação provisória, por vício de forma que maculava o auto de prisão em flagrante, não impede a decretação da custódia preventiva”88. As nulidades do flagrante ficam superadas com a superveniência do seu relaxamento e o eventual decreto de prisão preventiva, que passa a ser “o novo título judicial ensejador da custódia cautelar”89.
14. DECRETAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA NA SENTENÇA DE CONDENAÇÃO OU DECISÃO DE PRONÚNCIA A Lei n. 11.719, de 20 de junho de 2008, revogou o art. 594 do CPP, que assim dispunha: “O réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, ou prestar fiança, salvo se for primário e de bons antecedentes, assim reconhecido na sentença condenatória, ou condenado por crime de que se livre solto”90. Em contrapartida, criou um parágrafo único no art. 387 do CPP, dispondo que o juiz, ao proferir sentença condenatória, decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso, imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento da apelação que vier a ser interposta. Como é intuitivo, esta possibilidade de decretação também não cuida de prisão preventiva obrigatória, já banida do ordenamento jurídico nacional de longa data. Quando a lei diz que o juiz decidirá, está a determinar que ele se pronuncie sobre o assunto por ocasião da sentença de condenação, para decretar, ou não, a prisão preventiva.
A lei indicou claramente a abolição no CPP da “prisão para recorrer”, como decorrência da sentença ou por conta da ausência de primariedade e de bons antecedentes. Desde então, pelas regras do CPP, só é possível persistir prisão anteriormente decretada, ou ocorrer decretação cautelar na sentença condenatória, quando presentes os requisitos da prisão preventiva, todos exaustivamente analisados neste capítulo. Também por ocasião da decisão de pronúncia, nos processos de competência do Tribunal do Júri, o juiz poderá decretar a prisão preventiva, conforme dispõe o art. 413, § 3º, do CPP. Esta matéria está tratada de maneira mais ampla no capítulo intitulado “Prisão resultante de condenação recorrível”, nesta mesma obra.
15. ART. 366 DO CPP A Lei n. 9.271, de 17 de abril de 1996, deu nova redação ao art. 366 do CPP, para dizer que, se o acusado, citado por edital, não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional, podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes e, se for o caso, decretar prisão preventiva, nos termos do disposto no art. 312. É evidente, portanto, que a revelia, isoladamente considerada, segundo a jurisprudência do STF, não é suficiente para atingir a finalidade do art. 312 do CPP91. Se não demonstrada a presença do periculum libertatis, a justificar a necessidade da custódia antes de uma condenação definitiva92, a simples revelia do réu não é motivo suficiente para embasar decreto de prisão preventiva. Note-se que o legislador apenas indicou a possibilidade — se for o caso — de decretação da custódia, coisa, aliás, que nem era preciso fazer. Não se trata de modalidade de prisão preventiva obrigatória — inexistente no ordenamento jurídico atual; consequência automática da situação de revelia em que o réu é citado por edital, não comparece tampouco constitui defensor nos autos. Na linha acima esposada é que o STF vem se pronunciando a respeito. Nesse sentido: Impossibilidade de decretação: “A revelia do acusado, mormente quando citado por edital, não justifica, por si só, a prisão preventiva” (STF, HC 80.805-1/SP, lª T., rel. Min. Ilmar Galvão, j. 218-2001, DJU de 19-10-2001, RT 799/522). “Consoante dispõe o artigo 366 do Código de Processo Penal, o fato de o acusado empreender fuga, deixando o distrito da culpa, não conduz à automaticidade da prisão preventiva” (STF, HC 95.483/MT, 1ª T., rel. Min. Marco Aurélio, j. 15-9-2009, DJe de 29-10-2009). “Segundo prevê o artigo 366 do Código de Processo Penal, o abandono do distrito da culpa, sem que o acusado tenha advogado constituído, mostrando-se revel, não é conducente, por si só, à custódia preventiva” (STF, HC 99.252/PE, 1ª T., rel. Min. Marco Aurélio, j. 13-4-2010, DJe de 145-2010).
16. ART. 23, CAPUT, I, II E III, DO CP Diz o art. 314 do CPP, com a redação da Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011, que a prisão preventiva em nenhum caso será decretada se o juiz verificar pelas provas constantes dos autos ter o agente praticado o fato nas condições previstas nos incisos I, II e III do caput do art. 23 do DecretoLei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 — Código Penal.
Refere-se o art. 23, I, II e III, do CP à conduta praticada em estado de necessidade, legítima defesa, estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito, respectivamente. Como é intuitivo, a regra leva em conta o fato de que nas hipóteses indicadas não há crime, o que está expresso no caput do art. 23 do CP. Se não há crime, falta um dos pressupostos para a prisão preventiva: prova da existência do crime, o que implica afirmar que em tais circunstâncias estará ausente o fumus boni juris/fumus commissi delicti.
17. NECESSIDADE DE DECISÃO FUNDAMENTADA No ordenamento jurídico brasileiro, a obrigatoriedade de fundamentação das decisões judiciais decorre da literalidade do art. 93, IX, da CF, e tem absoluta vinculação com o Estado Democrático de Direito. Mesmo diante da clareza da regra constitucional, é comum a edição de súmulas pelos tribunais e também normas infraconstitucionais enfatizando a imprescindibilidade daquilo que assim já se encontra expresso no texto constitucional. Não é diferente com o art. 315 do CPP, cuja redação está lavrada nos seguintes termos: “A decisão que decretar, substituir ou denegar a prisão preventiva será sempre motivada”. A decisão que decretar prisão preventiva deve indicar de onde, nos autos, extraiu seus fundamentos, pois não se sustenta em meras suposições; ilações ou simples repetição do texto legal93, sem apoio em prova válida efetivamente produzida, conforme tantas vezes se tem praticado94. Dada a profundidade, sensibilidade e extrema felicidade com que o texto foi redigido, pedimos vênia para transcrever a lição que segue, de autoria de Sua Excelência o Ministro CELSO DE MELLO, do STF, que melhor do que qualquer outro já disse, tratou de maneira superior da matéria que estamos analisando. É de Sua Excelência o irretocável pronunciamento que segue: “A privação cautelar da liberdade individual reveste-se de caráter excepcional, somente devendo ser decretada ou mantida em situações de absoluta necessidade. A prisão cautelar, para legitimar-se em face de nosso sistema jurídico, impõe — além da satisfação dos pressupostos a que se refere o art. 312 do CPP (prova da existência material do crime e presença de indícios suficientes de autoria) — que se evidenciem, com fundamento em base empírica idônea, razões justificadoras da imprescindibilidade dessa extraordinária medida cautelar de privação da liberdade do indiciado ou do réu. (...) A prisão cautelar não pode — e não deve — ser utilizada, pelo Poder Público, como instrumento de punição antecipada daquele a quem se imputou a prática do delito, pois, no sistema jurídico brasileiro, fundado em bases democráticas, prevalece o princípio da liberdade, incompatível com punições sem processo e inconciliável com condenações sem defesa prévia. A prisão cautelar — que não deve ser confundida com a prisão penal — não objetiva infligir punição àquele que sofre a sua decretação, mas destina-se, considerada a função cautelar que lhe é inerente, a atuar em benefício da atividade estatal desenvolvida no processo penal. (...) A prerrogativa jurídica da liberdade — que possui extração constitucional (CF, art. 5º, LXI e LXV) — não pode ser ofendida por interpretações doutrinárias ou jurisprudenciais que, fundadas em preocupante discurso de conteúdo autoritário, culminam por consagrar, paradoxalmente, em detrimento de direitos e garantias fundamentais proclamados pela Constituição da República, a ideologia da lei e da ordem. Mesmo que se trate de pessoa acusada da suposta prática de crime hediondo, e até que
sobrevenha sentença penal condenatória irrecorrível, não se revela possível — por efeito de insuperável vedação constitucional (CF, art. 5º, LVII) — presumir-lhe a culpabilidade. No sistema jurídico brasileiro, não se admite, por evidente incompatibilidade com o texto da Constituição, presunção de culpa em sede processual penal. Inexiste, em consequência, no modelo que consagra o processo penal democrático, a possibilidade jurídico-constitucional de culpa por mera suspeita ou por simples presunção. Ninguém pode ser tratado como culpado, qualquer que seja a natureza do ilícito penal cuja prática lhe tenha sido atribuída, sem que exista, a esse respeito, decisão judicial condenatória transitada em julgado. O princípio constitucional da presunção de inocência, em nosso sistema jurídico, consagra, além de outras relevantes consequências, uma regra de tratamento que impede o Poder Público de agir e de se comportar, em relação ao suspeito, ao indiciado, ao denunciado ou ao réu, como se estes já houvessem sido condenados, definitivamente, por sentença do Poder Judiciário”95. Embora até desnecessário após a leitura do texto acima, para seguir na linha do que anteriormente já apresentamos neste capítulo, e considerando, ainda, a gravidade e relevância do tema, bem como a necessidade de se implantar, definitivamente, uma cultura (e prática) constitucionalista voltada ao asseguramento do direito à liberdade, coletamos julgados cujas ementas seguem transcritas, suficientes para indicar as balizas de uma decisão judicial que imponha prisão preventiva, conforme o entendimento das Cortes Superiores. É o que segue. Fundamentação idônea: “A prisão preventiva, pela excepcionalidade que a caracteriza, pressupõe decisão judicial devidamente fundamentada, amparada em elementos concretos que justifiquem a sua necessidade, não bastando apenas aludir-se a qualquer das previsões do art. 312 do Código de Processo Penal”96. “Na linha da jurisprudência deste Tribunal, porém, não basta a mera explicitação textual dos requisitos previstos pelo art. 312 do CPP. Precedentes: HC 84.662/BA, rel. Min. Eros Grau, 1ª T, v.u., DJ de 22-10-2004; HC 86.175/SP, rel. Min. Eros Grau, 2ª T., v.u., DJ de 10-11-2006; HC 87.041/PA, rel. Min. Cezar Peluso, 1ª T., m.v., DJ de 24-11-2006 e HC 88.448/RJ, rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª T., por empate na votação, DJ de 9-3-2007”97. “O pronunciamento judicial em que implementada a prisão preventiva ou negada a liberdade provisória há de estar individualizado ante o caso concreto e fundamentado, mostrando-se imprópria a alusão genérica aos artigos que a disciplinam”98. “A prisão preventiva, por atingir o direito de liberdade, exige para sua decretação a demonstração da rigorosa ocorrência dos pressupostos legais que a autorizam, residindo a sua essência na necessidade”99. “Não é necessário que o despacho que decreta a prisão preventiva seja extenso, ou que possua a minudência típica de uma sentença condenatória, bastando que aponte indícios de autoria, e materialidade, além da imprescindibilidade da segregação do agente”100.“Não é necessário que a fundamentação da decisão seja exaustiva, cumprindo assim as exigências do art. 312 do CPP”101.“Pode ser sucinto, desde que adequadamente fundamentado”102.
17.1. Fundamentação inidônea Inúmeras vezes, para não dizer na maioria delas, a prisão preventiva tem sido decretada, ainda hoje, em pleno século XXI, ao arrepio das regras anteriormente analisadas. Para uma demonstração eficiente, colhemos na jurisprudência do STF o material que segue,
elucidativo das situações mais comuns: Necessidade de fundamento baseado em fato concreto: “A mera suposição, fundada em simples conjecturas, não pode autorizar a decretação da prisão cautelar de qualquer pessoa. A decisão que ordena a privação cautelar da liberdade não se legitima quando desacompanhada de fatos concretos que lhe justifiquem a necessidade, não podendo apoiar-se, por isso mesmo, na avaliação puramente subjetiva do magistrado de que a pessoa investigada ou processada, se em liberdade, poderá delinquir, ou interferir na instrução probatória, ou evadir-se do distrito da culpa, ou, então, prevalecer-se de sua particular condição social, funcional ou econômico-financeira. Presunções arbitrárias, construídas a partir de juízos meramente conjecturais, porque formuladas à margem do sistema jurídico, não podem prevalecer sobre o princípio da liberdade, cuja precedência constitucional lhe confere posição eminente no domínio do processo penal”103. Fundamentos inidôneos: “O fato de o crime ser apenado com reclusão não conduz necessariamente à decretação da prisão preventiva — alcance dos artigos 312 e 313, inciso I, do Código de Processo Penal e 5º, inciso LXVI, da Constituição Federal”104. “A gravidade da imputação, consideradas as qualificadoras do tipo penal, não serve à prisão preventiva, havendo de ser elucidada na sentença relativa à culpa. Se a própria lei prevê que, em caso de sentença condenatória, o juiz decidirá fundamentadamente se o réu poderá apelar em liberdade, forçoso é concluir que o enquadramento do crime como hediondo não revela, por si só, base para a prisão preventiva”105. “Não constituem fundamentos idôneos à prisão preventiva a invocação da gravidade abstrata ou concreta do delito imputado, definido ou não como hediondo — muitas vezes, inconsciente antecipação da punição penal”106. “O concurso de crimes, quer na modalidade material, quer na formal, e a continuidade delitiva são dados neutros relativamente à prisão preventiva — interpretação dos artigos 69, 70 e 71 do Código Penal, 311 ao 316 do Código de Processo Penal e 5º, inciso LXVI, da Constituição Federal”107. “O descabimento da fiança não embasa a prisão preventiva”108. “Prisão preventiva: garantia da ordem pública. Afirmação de que ‘a liberdade do paciente representa sério risco ao convívio social’, não amparada em qualquer fato concreto que a comprove, tanto mais quanto a denúncia não abrange o aludido delito de quadrilha ou bando e não se dá notícia sequer de que teriam prosseguido as investigações para apuração desse crime por parte do paciente. (...) Liberdade provisória deferida”109. “O fundamento da garantia da instrução criminal foi apenas formalmente sustentado, nele sendo apontado um intangível ‘temor’ que as testemunhas sempre sentiriam em casos de crime de homicídio, embora, no caso dos autos, nenhuma se tenha recusado a colaborar”110. “A prisão preventiva pressupõe o enquadramento nos permissivos legais e constitucionais. A prova da materialidade do crime e a existência de indícios da autoria não servem, por si sós, a respaldá-la”111. “A pena prevista para o tipo é norteada, em opção político-legislativa, pela gravidade do delito. O potencial ofensivo da conduta não autoriza a custódia precoce, implementada quando ainda em curso o processo revelador da ação penal”112.“O estado de comoção social e de eventual indignação popular, motivado pela repercussão da prática da infração penal, não pode justificar, só por si, a decretação da prisão cautelar do suposto autor do comportamento delituoso, sob pena de completa e grave aniquilação do postulado fundamental da liberdade. O clamor público —
precisamente por não constituir causa legal de justificação da prisão processual (CPP, art. 312) — não se qualifica como fator de legitimação da privação cautelar da liberdade do indiciado ou do réu, não sendo lícito pretender-se, nessa matéria, por incabível, a aplicação analógica do que se contém no art. 323, V, do CPP, que concerne, exclusivamente, ao tema da fiança criminal”113. “É inidônea a motivação do decreto de prisão preventiva que, dedicada unicamente a acentuar os indícios de participação dos acusados no fato criminoso, não declina um só elemento concreto de informação do qual fosse possível extrair algum dos fundamentos cautelares da prisão preventiva: a garantia da ordem pública, a segurança da aplicação da lei penal ou a conveniência da instrução criminal”114. “O fato de ser o crime hediondo, por si, isoladamente, não autoriza a decretação da prisão preventiva”115. Admitir o contrário seria ressuscitar a prisão preventiva obrigatória.
18. PRAZO DE DURAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA Toda pessoa detida tem direito a ser julgada dentro de prazo razoável ou a ser posta em liberdade sem prejuízo de que prossiga o processo (art. 7º da Convenção promulgada pelo Decreto n. 678/92116 e art. 5º, LXXVIII, da CF). Há que se ter em mente, todavia, que “o tempo legal do processo submetese ao princípio da razoabilidade, incompatível com o seu exame à luz de só consideração aritmética, sobretudo, por acolhida, no sistema de direito positivo, a força maior, como fato produtor da suspensão do curso dos prazos processuais”117. Ao contrário do que ocorre com a prisão temporária, que é determinada por prazo certo, já delineado na Lei n. 7.960/89118, o legislador não cuidou de estabelecer prazo mínimo ou máximo de duração para a prisão preventiva. Em relação à prisão em flagrante, é possível dizer que esta modalidade de prisão cautelar também está sujeita a prazo certo, embora não se confunda com a prisão temporária, pois somente irá perdurar do momento da prisão-captura até aquele em que se dá o controle jurisdicional, quando então o juiz deverá adotar uma dentre aquelas medidas previstas no art. 310 do CPP. A prisão preventiva não tem prazo expressamente estabelecido, e o que se tem por base, em regra, é o prazo que a lei confere para o encerramento da instrução criminal, a depender de cada tipo de procedimento. Conforme observa GUILHERME DE SOUZA NUCCI, “a regra é que perdure, até quando necessário, durante a instrução, não podendo, é lógico, ultrapassar eventual decisão absolutória — que faz cessar os motivos determinantes de sua decretação — bem como o trânsito de decisão condenatória, pois, a partir desse ponto, está-se diante de prisão-pena”119. Não pode, entretanto, prolongar-se indefinidamente, “por culpa do juiz ou por atos procrastinatórios do órgão acusatório”120. Excesso de prazo: “O direito ao julgamento, sem dilações indevidas, qualifica-se como prerrogativa fundamental que decorre da garantia constitucional do due process of law. O réu — especialmente aquele que se acha sujeito a medidas cautelares de privação da sua liberdade — tem o direito público subjetivo de ser julgado, pelo Poder Público, dentro de prazo razoável, sem demora excessiva e nem dilações indevidas. Convenção Americana sobre Direitos Humanos (art. 7º, ns. 5 e 6). O excesso de prazo, quando exclusivamente imputável ao aparelho judiciário — não derivando, portanto, de qualquer fato procrastinatório causalmente atribuível ao réu —, traduz situação anômala que compromete a efetividade do processo, pois, além de tornar evidente o
desprezo estatal pela liberdade do cidadão, frustra um direito básico que assiste a qualquer pessoa: o direito à resolução do litígio, sem dilações indevidas e com todas as garantias reconhecidas pelo ordenamento constitucional. (...) A natureza da infração penal não pode restringir a aplicabilidade e a força normativa da regra inscrita no art. 5º, LXV, da Constituição da República, que dispõe, em caráter imperativo, que a prisão ilegal ‘será imediatamente relaxada’ pela autoridade judiciária”121. “Esta Corte tem considerado tratar-se de hipótese de constrangimento ilegal, corrigível via habeas corpus, a prisão cautelar mantida em razão da mora processual provocada exclusivamente em razão da atuação da acusação ou em razão do próprio (mau) funcionamento do aparato judicial (HC 85.237/DF, rel. Min. Celso de Mello, Pleno, DJ de 29-4-2005)”122. “Uma vez constatado o excesso de prazo, impõe-se o relaxamento da prisão, sendo desinfluente o fato de o processo achar-se na fase de alegações finais”123. “Ultrapassado o prazo total alusivo à instrução da ação penal, é de se reconhecer o excesso e a ilegalidade da persistência da custódia, expedindo-se o alvará de soltura. Ao Estado cumpre aparelhar-se objetivando o respeito ao balizamento temporal referente à tramitação da ação penal e julgamento respectivo, nada justificando a permanência do acusado, simples acusado, na prisão, além do período previsto”124. Mesmo nos crimes graves, não se admite o excesso de prazo injustificado e não atribuível à defesa125. É imprescindível que a prestação jurisdicional ocorra em prazo razoável126, pois, ultrapassado o horizonte da razoabilidade127, haverá manifesto constrangimento ilegal128. Nada obstante, o teor da Súmula 52 do STJ, no sentido de que o encerramento da instrução processual afasta eventual constrangimento ilegal por excesso de prazo na formação da culpa129, à luz do ordenamento jurídico vigente, é correto afirmar deva ser reinterpretada, pois, “ainda que encerrada a instrução, é possível reconhecer o excesso de prazo, diante da garantia da razoável duração do processo, prevista no artigo 5º, inciso LXXVIII, da Constituição”130. Ademais, haverá constrangimento ilegal, e mesmo após o encerramento da instrução, se a custódia cautelar não resultar de prisão preventiva concreta131 e adequadamente fundamentada132.
19. REVOGAÇÃO E NOVA DECRETAÇÃO Dispõe o art. 316 do CPP que o juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no correr do processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como decretá-la novamente, se forem apresentadas razões novas, justificadoras da medida. Tanto o juiz que a decretou quanto o tribunal podem revogar a prisão preventiva, quando entenderem insubsistentes os fundamentos da decisão. É o que ocorre, por exemplo, com a prisão decretada exclusivamente por conveniência da instrução criminal, quando encerrada esta. Entretanto, se após a revogação ficar demonstrado que novacustódia se faz imprescindível, agora para assegurar a aplicação da lei penal, nada impede seja ela decretada ao amparo deste novo fundamento. Nos casos de ilegalidade na decretação, o correto é falar em relaxamento, conforme veremos no capítulo específico, pois, como determina o art. 5º, LXV, da CF, “a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária”, regra que, segundo pensamos, não se aplica apenas às situações
de flagrante delito.
20. REAÇÃO DEFENSIVA À DECRETAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA Conforme o art. 5º, LXVIII, da CF, “dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder”, regra também inscrita no art. 647 do CPP. A decisão que decretar prisão preventiva poderá ser atacada pela via do habeas corpus, que também poderá ser eficazmente utilizado sempre que se identificar excesso de prazo na duração do encarceramento cautelar133.
21. SUBSTITUIÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA POR PRISÃO DOMICILIAR Outra inovação importante, extremamente valiosa, trazida com a Lei n. 12.403/2011, é a possibilidade de substituição da prisão preventiva por prisão domiciliar, regulada nos arts. 317 e 318 do CPP. Dada a relevância do tema, esta modalidade de prisão cautelar está tratada detalhadamente no próximo capítulo.
Prisão Preventiva Quadro comparativo entre os artigos relacionados com a prisão preventiva, antes e depois da Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011
Como era
Como ficou
Art. 310. Quando o juiz verificar pelo auto de prisão em flagrante que o agente praticou o fato, nas condições do art. 19, I, II e III, do Código Penal, poderá, depois de ouvir o Ministério Público, conceder ao réu liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos do processo, sob pena de revogação. Parágrafo único. Igual procedimento será adotado quando o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, a inocorrência de qualquer das hipóteses que autorizam a prisão preventiva (arts. 311 e 312).
Art. 310. Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá fundamentadamente: I — relaxar a prisão ilegal; ou II — converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; ou III — conceder liberdade provisória, com ou sem fiança. Parágrafo único. Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o agente praticou o fato nas condições constantes dos incisos I a III do caput do art. 23 do Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 — Código Penal, poderá, fundamentadamente, conceder ao acusado liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos processuais, sob pena de revogação.
Art. 311. Em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público, ou do querelante, ou mediante representação da autoridade policial.
Art. 311. Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, de ofício, se no curso da ação penal, ou a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial.
Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.
Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria. Parágrafo único. A prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares (art. 282, § 4º).
Art. 313. Em qualquer das circunstâncias, previstas no artigo anterior, será admitida a decretação da prisão preventiva nos crimes dolosos: I — punidos com reclusão; II — punidos com detenção, quando se apurar que o indiciado é vadio ou, havendo dúvida sobre a sua identidade, não fornecer ou não indicar elementos para esclarecê-la; III — se o réu tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no parágrafo único do art. 46 do Código Penal; IV — se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos da lei específica, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência.
Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão preventiva: I — nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos; II — se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 — Código Penal; III — se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência; IV — (revogado). Parágrafo único. Também será admitida a prisão preventiva quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida.
Art. 314. A prisão preventiva em nenhum caso será decretada se o juiz verificar pelas provas constantes dos autos ter o agente praticado o fato nas condições do art. 19, ns. I, II ou III do Código Penal.
Art. 314. A prisão preventiva em nenhum caso será decretada se o juiz verificar pelas provas constantes dos autos ter o agente praticado o fato nas condições previstas nos incisos I, II e III do caput do art. 23 do Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 — Código Penal.
Art. 315. O despacho que decretar ou denegar a prisão preventiva será sempre fundamentado.
Art. 315. A decisão que decretar, substituir ou denegar a prisão preventiva será sempre motivada.
Art. 316. O juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no correr do processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como de novo decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem.
Não sofreu alteração Art. 316. O juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no correr do processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como de novo decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem.
Art. 343. O quebramento da fiança importará a perda de metade do seu valor e a obrigação, por parte do réu, de recolher-se à prisão, prosseguindose, entretanto, à sua revelia, no processo e julgamento, enquanto não for preso.
Art. 343. O quebramento injustificado da fiança importará na perda de metade do seu valor, cabendo ao juiz decidir sobre a imposição de outras medidas cautelares ou, se for o caso, a decretação da prisão preventiva.
Art. 387. O juiz, ao proferir sentença condenatória: (...) Parágrafo único. O juiz decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso, imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento da apelação que vier a ser interposta.
Não sofreu alteração Art. 387. O juiz, ao proferir sentença condenatória: (...) Parágrafo único. O juiz decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso, imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento da apelação que vier a ser interposta.
Art. 413. O juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação. (...) § 3º O juiz decidirá, motivadamente, no caso de manutenção, revogação ou substituição da prisão ou medida restritiva de liberdade anteriormente decretada e, tratando-se de acusado solto, sobre a necessidade da decretação da prisão ou imposição de quaisquer das medidas previstas no Título IX do Livro I deste Código.
Não sofreu alterações Art. 413. O juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação. (...) § 3º O juiz decidirá, motivadamente, no caso de manutenção, revogação ou substituição da prisão ou medida restritiva de liberdade anteriormente decretada e, tratando-se de acusado solto, sobre a necessidade da decre- tação da prisão ou imposição de quaisquer das medidas previstas no Título IX do Livro I deste Código.
Regras Relacionadas com a Prisão Preventiva Disposições gerais
Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a: I — necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais; II — adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado. § 1º As medidas cautelares poderão ser aplicadas isolada ou cumulativamente. § 2º As medidas cautelares serão decretadas pelo juiz, de ofício ou a requerimento das partes ou, quando no curso da investigação criminal, por representação da autoridade policial ou mediante requerimento do Ministério Público. § 3º Ressalvados os casos de urgência ou de perigo de ineficácia da medida, o juiz, ao receber o pedido de medida cautelar, determinará a intimação da parte contrária, acompanhada de cópia do requerimento e das peças necessárias, permanecendo os autos em juízo. § 4º No caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas, o juiz, de ofício ou mediante requerimento do Ministério Público, de seu assistente ou do querelante, poderá substituir a medida, impor outra em cumulação, ou, em último caso, decretar a prisão preventiva (art. 312, parágrafo único). § 5º O juiz poderá revogar a medida cautelar ou substituí-la quando verificar a falta de motivo para que subsista, bem como voltar a decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem. § 6º A prisão preventiva será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar (art. 319). Art. 283. Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva. § 1º As medidas cautelares previstas neste Título não se aplicam à infração a que não for isolada, cumulativa ou alternativamente cominada pena privativa de liberdade. § 2º A prisão poderá ser efetuada em qualquer dia e a qualquer hora, respeitadas as restrições relativas à inviolabilidade do domicílio. Art. 289. Quando o acusado estiver no território nacional, fora da jurisdição do juiz processante, será deprecada a sua prisão, devendo constar da precatória o inteiro teor do mandado. § 1º Havendo urgência, o juiz poderá requisitar a prisão por qualquer meio de comunicação, do qual deverá constar o motivo da prisão, bem como o valor da fiança se arbitrada. § 2º A autoridade a quem se fizer a requisição tomará as precauções necessárias para averiguar a autenticidade da comunicação. § 3º O juiz processante deverá providenciar a remoção do preso no prazo máximo de 30 (trinta) dias, contados da efetivação da medida. Art. 299. A captura poderá ser requisitada, à vista de mandado judicial, por qualquer meio de comunicação, tomadas pela autoridade, a quem se fizer a requisição, as precauções necessárias para averiguar a autenticidade desta. Art. 300. As pessoas presas provisoriamente ficarão separadas das que já estiverem definitivamente condenadas, nos termos da lei de execução penal.
Prisão Cautelar Domiciliar Substitutiva da Prisão Preventiva
Art. 317. A prisão domiciliar consiste no recolhimento do indiciado ou acusado em sua residência, só podendo dela ausentar-se com autorização judicial. Art. 318. Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for: I — maior de 80 (oitenta) anos; II — extremamente debilitado por motivo de doença grave; III — imprescindível aos cuidados especiais de pessoa menor de 6 (seis) anos de idade ou com deficiência; IV — gestante a partir do 7º (sétimo) mês de gravidez ou sendo esta de alto risco. Parágrafo único. Para a substituição, o juiz exigirá prova idônea dos requisitos estabelecidos neste artigo.
Medidas Cautelares Diversas da Prisão Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão: I — comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades; II — proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações; III — proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante; IV — proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução; V — recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos; VI — suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais; VII — internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração; VIII — fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial; IX — monitoração eletrônica. § 1º (Revogado). § 2º (Revogado). § 3º (Revogado). § 4º A fiança será aplicada de acordo com as disposições do Capítulo VI deste Título, podendo ser cumulada com outras medidas cautelares. Art. 320. A proibição de ausentar-se do País será comunicada pelo juiz às autoridades encarregadas de fiscalizar as saídas do território nacional, intimando-se o indiciado ou acusado para entregar o passaporte, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas. Art. 321. Ausentes os requisitos que autorizam a decretação da prisão preventiva, o juiz deverá conceder liberdade provisória, impondo, se for o caso, as medidas cautelares previstas no art. 319 deste Código e observados os critérios constantes do art. 282 deste Código. I — (revogado). II — (revogado).
1 Elementos de direito processual penal, Campinas: Bookseller, 1997, v. IV, p. 57. 2 Processo penal constitucional, 5. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 329. 3 “A prisão preventiva deve ser considerada exceção, já que, por meio desta medida, priva-se o réu de seu jus libertatis antes do pronunciamento condenatório definitivo, consubstanciado na sentença transitada em julgado” (STJ, REsp 676.819/RS, 5ª T., rel. Min. Felix Fischer, DJU de 14-2-2005). 4 STF, HC 83.534/SP, 1ª T., rel. Min. Marco Aurélio, j. 18-11-2003, DJ de 27-2-2004, p. 27; STF, HC 91.723/RJ, 1ª T., rel. Min. Marco Aurélio, j. 8-6-2010, DJe de 24-9-2010. 5 STF, HC 94.661/SP, 2ª T., rel. Min. Ellen Gracie, j. 30-9-2008, DJe n. 202, de 24-10-2008. 6 Derecho procesal penal, Buenos Aires: Editores del Puerto, 2000, p. 258. 7 STF, HC 69.509/SP, 2ª T., rel. Min. Celso de Mello, j. 1º-9-1992, DJe de 12-3-1993. 8 Em sua redação original o art. 312 do CPP estava assim grafado: “A prisão preventiva será decretada nos crimes a que for cominada pena de reclusão por tempo, no máximo, igual ou superior a dez anos”. 9 STF, HC 96.445/RJ, 2ª T., rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 8-9-2009, DJe de 2-10-2009. 10 “A prisão preventiva pode ser decretada, de ofício, em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução do processo (CPP, art. 311). Não há, pois, ilegalidade consubstanciada na circunstância de a prisão dos pacientes ter sido decretada de ofício, sem a oitiva do Ministério Público” (STF, HC 98.968/SC, 2ª T., rel. Min. Eros Grau, j. 4-8-2009, DJe n. 200, de 23-10-2009). 11 O art. 310, II, do CPP passou a determinar que ao receber o auto de prisão em flagrante, dentre outras providências, o juiz poderá, em decisão fundamentada, converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão. 12 O art. 50 da Lei de Drogas trata da matéria. 13 Manual de processo e execução penal, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 545. 14 “É inadmissível que o Juiz do Trabalho, que não tem jurisdição criminal, expeça ordem de prisão de natureza penal, embora possa, como qualquer do povo, prender em flagrante, se o crime ocorrer na sua presença” (TRF, 1ª Região, HC 1999.01.00.112146-4-PI, 3ª T., rel. juiz Olindo Menezes, j. 25-4-2000, DJU de 26-6-2000, RT 781/695). 15 STF, HC 97.690/MG, 1ª T., rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 6-10-2009, DJe de 23-10-2009. 16 Conforme lição de FERNANDO DA COSTA TOURINHO FILHO, “a razão de se permitir a ingerência do ofendido em todos os termos da ação penal pública, ao lado do Ministério Público, repousa na influência decisiva que a sentença da sede penal exerce na sede civil” (ob. cit., p. 318). 17 STF, HC 83.439/RJ, 1ª T., rel. Min. Marco Aurélio, j. 14-10-2003, DJe de 7-11-2003. 18 STF, RHC 71.354/PI, 1ª T., rel. Min. Marco Aurélio, j. 13-9-1994, DJ de 27-10-1994, p. 29165. 19 “Cabe ao julgador, ao avaliar a necessidade de decretação da custódia cautelar, interpretar restritivamente os pressupostos do art. 312 do Código de Processo Penal, fazendo-se mister a configuração empírica dos referidos requisitos” (STJ, REsp 700.119/GO, 5ª T., rel. Min. Gilson Dipp, DJU de 27-6-2005). 20 STF, HC 83.439/RJ, 1ª T., rel. Min. Marco Aurélio, j. 14-10-2003, DJe de 7-11-2003. 21 STF, HC 98.862/SP, 2ª T., rel. Min. Celso de Mello, j. 23-6-2009, DJe n. 200, de 23-10-2009. No mesmo sentido: STF, HC 94.404/SP, 2ª T., rel. Min. Celso de Mello, j. 18-11-2008, DJe n. 110, de 18-6-2010. 22 Tratado da prova em matéria criminal, p. 497. 23 Elementos de direito processual penal. 2. ed., v. II, p. 378. 24 C. J. A. MIT T ERMAIER, Tratado da prova em matéria criminal. 3. ed., traduzido para o português por Herbert Wüntzel Heinrich, Bookseller, Campinas-SP, 1996; NICOLA FRAMARINO DEI MALAT ESTA, A lógica das provas em matéria criminal, traduzido por Alexandre Augusto Correia e com anotações de Hélio Pereira Bicudo, São Paulo: Saraiva, 1960, v. I e II. 25 “Os indícios, quando veementes, convergentes e concatenados, não neutralizados por contraindícios ou por álibi comprovado, autorizam condenação” (JUTACrim 51/342, 51/248, 58/192, 59/219, 50/138, 50/395), podendo levar à certeza moral da veracidade do fato pesquisado (JUTACrim 84/411). 26 Art. 46, parágrafo único, do CP, com a redação da Lei n. 6.416/77.
27 “A circunstância de o paciente ser primário, ter bons antecedentes e residência fixa não se mostra obstáculo ao decreto de prisão preventiva, desde que presentes os pressupostos e condições previstas no art. 312 do CPP” (STF, HC 83.148/SP, 2ª T., rel. Min. Gilmar Mendes, DJ de 2-9-2005). No mesmo sentido: STF, HC 82.695/RJ, 2ª T., rel. Min. Carlos Velloso, j. 13-5-2003, DJ de 6-6-2003, p. 42; STF, HC 98.130/RJ, 2ª T., rel. Min. Ellen Gracie, j. 15-12-2009, DJe de 12-2-2010; STF, HC 96.933/RN, 2ª T., rel. Min. Ellen Gracie, j. 28-4-2009, DJe n. 94, de 22-5-2009; STF, HC 95.602/MT, 2ª T., rel. Min. Eros Grau, j. 16-9-2008, DJe n. 241, de 19-12-2008; STF, HC 98.689/SP, 1ª T., rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 6-10-2009, DJe n. 208, de 6-11-2009. 28 Caso fosse intenção do legislador restringir a prisão preventiva aos crimes dolosos e assim afastar a possibilidade de aplicação quanto a crimes culposos, por certo a limitação — crimes dolosos — estaria no caput do art. 313, e não no inciso I. 29 Em sentido contrário, diz AURY LOP ES JR.: “Para que seja decretada a prisão preventiva do imputado por haver dúvida em relação à identidade civil são imprescindíveis o fumus commissi delicti e o periculum libertatis. Mais do que isso, até por uma questão de proporcionalidade, pensamos ser necessária uma interpretação sistemática, à luz do inciso I do art. 313 (topograficamente situado antes, como orientador dos demais), para que se exija um crime doloso punido com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 anos. Impensável decretar uma preventiva com base neste parágrafo único em caso de crime culposo, por exemplo. Da mesma forma, como regra, incabível para crimes de menor gravidade, em que sequer a preventiva seria possível” (ob. cit., p. 78/79). 30 Neste sentido é o pensamento de ROGÉRIO SANCHES CUNHA quando diz: “Mesmo aqui entendemos imprescindível ponderar a presença das condições de admissibilidade previstas no art. 313 do CPP. Raciocínio diverso, além de fomentar a prisão provisória fora dos casos permitidos por lei, não observa que o art. 313 se aplica a todas as hipóteses do art. 312, não excepcionando o seu parágrafo único” (Prisão e medidas cautelares, 2. ed., 2. tir., São Paulo, Revista dos Tribunais, 2011, coord. LUIZ FLÁVIO GOMES e IVAN LUÍS MARQUES, p. 150). 31 Derecho procesal penal, 2. ed., 3. reimp., Buenos Aires: Del Puerto, 2004, t. I, p. 511. 32 Ob. cit., p. 294/295. 33 EDUARDO J. COUT URE , Interpretação das Leis Processuais, 4. ed., Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 36 (tradução de Gilda Maciel Corrêa Meyer Russomano). 34 A prisão processual, a fiança, a liberdade provisória e as demais medidas cautelares — comentários à Lei n. 12.403/11. Disponível na internet em: http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.32169 35 Tratado de Derecho Procesal Penal, Buenos Aires: Ediciones Jurídicas Europa-América, t. I, 1951, p. 108 (tradução do italiano para o espanhol de Santiago Sentís Melendo e Marino Ayerra Redín). 36 EDILSON MOUGENOT BONFIM , Curso de processo penal, 6. ed., São Paulo: Saraiva, 2011, p. 476. 37 STF, HC 80.379/SP, 2ª T., rel. Min. Celso de Mello, j. 18-12-2000, DJ de 25-5-2001, p. 11. 38 STF, HC 96.933/RN, 2ª T., rel. Min. Ellen Gracie, j. 28-4-2009, DJe n. 94, de 22-5-2009. 39 STF, HC 84.658/PE, 2ª T., rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ de 3-6-2005. 40 STF, HC 90.398/SP, 1ª T., rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJ de 18-5-2007. 41 STF, HC 98.143, 2ª T., rel. Min. Ellen Gracie, DJ de 27-6-2008. 42 STJ, HC 32.607/RS, 6ª T., rel. Min. Paulo Medina, DJU de 13-6-2005. 43 “O clamor público, por não estar entre as causas justificadas de custódia preventiva, deve ser analisado com os devidos cuidados, para se evitar injustiças, assim, ausentes os demais pressupostos autorizadores da medida inadmissível a sua decretação” (STJ, HC 4.926-SP, 5.ª T., j. 8-10-1996, rel. Min. Edson Vidigal, DJU de 20-10-1997, RT 750/567). 44 “Se o decreto de prisão preventiva cinge-se a juízos conjecturais despidos de indicação de qualquer base empírica, apenas a passagem folclórica que atraiu a atenção da imprensa, deve ser cassado, pois a existência de um crime e a probabilidade de que o acusado seja o seu autor são requisitos da custódia, mas por si sós não a legitima” (STF, HC 79.204-9/BA, 1ª T., j. 1-6-1999, rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJU de 6-8-1999, RT 769/510). 45 STF, HC 80.379/SP, 2ª T., rel. Min. Celso de Mello, j. 18-12-2000, DJ de 25-5-2001, p. 11. 46 STJ, HC 33.668/SP, 6ª T., rel. Min. Paulo Medina, j. 17-6-2004, DJ de 16-8-2004, p. 288. 47 STJ, HC 40.530/MS, 5ª T., rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJU de 15-8-2005. 48 STJ, HC 38.681/MS, 5ª T., rel. Min. Gilson Dipp, DJU de 7-3-2005. 49 “A preservação da credibilidade do Judiciário não deságua na automaticidade da custódia preventiva, devendo ocorrer, isso sim, em estrita observância ao Direito posto” (STF, HC 95.483/MT, 1ª T., rel. Min. Marco Aurélio, j. 15-9-2009, DJe de 29-102009). 50 STF, HC 100.872/MG, 2ª T., rel. Min. Eros Grau, j. 9-3-2010, DJe de 30-4-2010.
51 STF, HC 100.863/SP, 2ª T., rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 4-12-2009, DJe de 5-2-2010. 52 “A gravidade da imputação, consideradas as qualificadoras do tipo penal, não serve à prisão preventiva, havendo de ser elucidada na sentença relativa à culpa. Se a própria lei prevê que, em caso de sentença condenatória, o juiz decidirá fundamentadamente se o réu poderá apelar em liberdade, forçoso é concluir que o enquadramento do crime como hediondo não revela, por si só, base para a prisão preventiva” (STF, HC 92.299/SP, 1ª T., rel. Min. Marco Aurélio, j. 24-6-2008, DJe n. 177, de 19-9-2008). “Não constituem fundamentos idôneos à prisão preventiva a invocação da gravidade abstrata ou concreta do delito imputado, definido ou não como hediondo — muitas vezes, inconsciente antecipação da punição penal” (STF, HC 90.064/SP, 1ª T., rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 8-5-2007, DJe n. 42, de 22-6-2007). 53 “É dever do Magistrado demonstrar, com dados concretos extraídos dos autos, a necessidade da custódia” (STJ, REsp 676.819/RS, 5ª T., rel. Min. Felix Fischer, DJU de 14-2-2005). 54 “A prisão preventiva para garantia da ordem pública não se justifica sem a demonstração de sua base empírica” (STF, HC 85.036-7/RS, 1ª T., rel. Min. Eros Grau, DJU de 25-2-2005). 55 TACrimSP, HC 463.154-7, 10ª Câm., rel. Juiz Ary Casagrande, DOESP de 12-4-2004. 56 STF, HC 95.685/SP, 2ª T., rel. Min. Ellen Gracie, j. 16-12-2008, DJe n. 43, de 6-3-2009. No mesmo sentido: STF, HC 99.163/SP, 1a T., rel. Min. Marco Aurélio, j. 6-4-2010; STF, HC 95.848/RO, 1ª T., rel. Min. Menezes Direito, rel. p/ o acórdão Min. Ricardo Lewandowski, j. 29-9-2009, DJe n. 208, de 6-11-2009; STF, HC 95.602/MT, 2ª T., rel. Min. Eros Grau, j. 16-9-2008, DJe n. 241, de 19-12-2008; STF, HC 94.872/SP, 2ª T., rel. Min. Eros Grau, j. 30-9-2008, DJe n. 241, de 19-12-2008; STF, HC 93.000/MG, 1ª T., rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 1º-4-2008, DJe n. 74, de 25-4-2008. 57 STJ, HC 153.191/PR, 5ª T., rel. Min. Felix Fischer, j. 15-6-2010, DJe de 23-8-2010. 58 STJ, HC 6.915/CE, 6ª T., j. 14-4-1998, rel. Min. Anselmo Santiago, DJU de 1-6-1998, RT 755/572. No mesmo sentido: STJ, RHC 14.923/PE, 5ª T., rel. Min. Jorge Scartezzini, j. 18-11-2003, DJ de 25-2-2004, p. 190; STJ, HC 8.864/MG, 5ª T., rel. Min. Felix Fischer, j. 18-5-1999, DJ de 21-6-1999, p. 177. 59 STF, HC 95.356/ES, 1ª T., rel. Min. Cármen Lúcia, j. 7-10-2008, DJe n. 25, de 6-2-2009. 60 STF, HC 101.306/MS, 1ª T., rel. Min. Cármen Lúcia, j. 13-4-2010, DJe de 11-2-2011. 61 STF, HC 100.930/GO, 2ª T., rel. Min. Celso de Mello, j. 10-11-2009, DJe de 30-4-2010. 62 STF, HC 98.437/SP, 1ª T., rel. Min. Cármen Lúcia, j. 13-10-2009, DJe de 7-5-2010. 63 TRF 4ª R., HC 2005.04.01.015395-9/RS, 8ª T., rel. Des. Fed. Paulo Afonso Brum Vaz, DJU 1-6-2005. 64 STJ, HC 41.706/RO, 5ª T., rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, DJU de 16-5-2005. 65 Lei n. 7.492, de 16 de junho de 1986. 66 STJ, HC 14.270-SP, 6ª T., j. 12-12-2000, rel. Min. Fernando Gonçalves, DJU de 19-3-2001, RT 790/566. 67 “É legal o decreto de prisão preventiva que, a título de conveniência da instrução criminal, se baseia na existência de risco concreto que a liberdade do réu representa sobre a prova” (STF, HC 89.584/BA, 2ª T., rel. Min. Cezar Peluso, j. 8-9-2009, DJe de 9-10-2009). 68 “A necessidade de impingência da segregação cautelar também se dá com o objetivo de garantir a coleta de provas sem a interferência dos integrantes da organização. Assim, restando presentes elementos concretos demonstrando que o agente vem interferindo na busca da verdade real mediante a intimidação dos demais investigados para que não revelem as informações que possuem, bem como utilizando subterfúgios a fim de obstar a realização de atos investigatórios, faz-se mister a decretação da prisão processual com o escopo de assegurar a regular instrução criminal” (TRF 4ª R., HC 2005.04.01.015395-9/RS, 8ª T., rel. Des. Fed. Paulo Afonso Brum Vaz, DJU 1-6-2005). 69 “Constitui motivo idôneo para o decreto de prisão preventiva a ameaça feita a testemunha pelo acusado, sendo irrelevante indagar do propósito ou não de efetivá-la” (STF, HC 79.838-1-BA, 1ª T., j. 8-2-2000, rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJU de 3-32000, RT 782/522). 70 “A prisão preventiva por conveniência da instrução criminal apresenta-se cabível nos casos em que o agente demonstra estar a perturbar e a impedir a produção de provas, no sentido, inclusive, de apagar vestígios do crime ou mesmo destruir documentos, de molde a dificultar a descoberta da verdade” (TRF 3ª R., HC 2005.03.00016720-0/SP, 5ª T., rel. Des. Fed. Suzana Camargo, DJU de 2-8-2005). 71 “O réu que, às proximidades de seu julgamento pelo Tribunal do Júri, tenta aliciar jurados, deve ter sua prisão preventiva decretada, como medida para assegurar a regularidade do processo, o que se insere no conceito amplo da garantia da ordem pública” (STJ, RHC 6.759-RS, 6ª T., j. 20-10-1997, rel. Min. Anselmo Santiago, DJU de 10-11-1997, RT 751/555). 72 “A custódia preventiva que vise à regular instrução criminal deve calcar-se em dados concretos, não se podendo supor a prática
de atos que objetivem embaraçá-la” (STF, HC 83.534/SP, 1ª T., rel. Min. Marco Aurélio, j. 18-11-2003, DJ de 27-2-2004, p. 27). 73 “Firme a jurisprudência do Supremo Tribunal no sentido de que, de regra, com o fim da instrução criminal, não há falar em sua conveniência para manter a prisão preventiva” (STF, HC 90.063/SP, 1ª T., rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 27-3-2007, DJe n. 18, de 18-5-2007). 74 “Havendo sido efetuada a prisão preventiva em prol da instrução criminal, encerrado o sumário, cumpre afastá-la, devolvendose ao acusado, simples acusado, a liberdade” (STF, HC 77.052/MG, 2ª T., rel. Min. Marco Aurélio, j. 30-6-1998, DJ de 11-91998, p. 5). 75 “A decisão que determina prisão preventiva, limitando-se a afirmar a necessidade de garantia da execução da lei penal, sem indicar nenhum fato concreto que justifique a medida, ofende o requisito da garantia constitucional do art. 93, IX, da CF, já que por fundamentação do ato que determina a prisão se deve entender a efetiva explicitação concreta das razões de convencimento do julgador” (TRF, 5ª Região, HC 1401-PE, 3ª T., j. 14-3-2002, rel. Des. Federal Ridalvo Costa, RT 801/692). 76 “Intenção de fuga demonstrada em prova testemunhal e documental” (STF, HC 100.980/RS, 2ª T., rel. Min. Eros Grau, j. 1-122009, DJe de 12-2-2010). 77 STF, HC 94.661/SP, 2ª T., rel. Min. Ellen Gracie, j. 30-9-2008, DJe n. 202, de 24-10-2008. Entendendo que a fuga, como causa justificadora da necessidade da prisão cautelar, deve ser analisada caso a caso: STF, HC 85.453-2/AL, 1ª T., rel. Min. Eros Grau, DJU de 10-6-2005. 78 STF, HC 96.568/SP, 1ª T., rel. Min. Marco Aurélio, j. 19-10-2010, DJe de 2-12-2010. 79 STF, HC 97.177/DF, 2ª T., rel. Min. Cezar Peluso, 8-9-2009, DJe de 9-10-2009. 80 “A necessidade da segregação cautelar do acusado só é admitida quando baseada em justificação judicial, devidamente fundamentada, nos requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora, sob pena de se transformar em letra morta o direito individual, constitucionalmente assegurado a todos, da liberdade de ir, vir e ficar” (STJ, RHC 6.245-MG, 5ª T., j. 24-6-1997, rel. Min. Cid Flaquer Scartezzini, DJU de 3-11-1997, RT 750/572). 81 STF, HC 83.148/SP, 2ª T., rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª T., DJ de 2-9-2005. 82 STF, HC 82.695/RJ, 2ª T., rel. Min. Carlos Velloso, j. 13-5-2003, DJ de 6-6-2003, p. 42. 83 STF, HC 96.933/RN, 2ª T., rel. Min. Ellen Gracie, j. 28-4-2009, DJe n. 94, de 22-5-2009; STF, HC 98.130/RJ, 2ª T., rel. Min. Ellen Gracie, j. 15-12-2009, DJe de 12-2-2010. 84 STF, HC 95.602/MT, 2ª T., rel. Min. Eros Grau, j. 16-9-2008, DJe n. 241, de 19-12-2008. 85 STF, HC 98.689/SP, 1ª T., rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 6-10-2009, DJe n. 208, de 6-11-2009). No mesmo sentido: STF, HC 102.864/SP, 1ª T., rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 3-8-2010, DJe de 7-9-2010; STF, HC 98.901/PI, 1ª T., rel. Min. Dias Toffoli, j. 4-5-2010, DJe de 4-6-2010. 86 Sobre o conflito aparente que há entre os arts. 310, II, e 311, ambos do CPP, no que tange à possibilidade de decretação ex officio da prisão preventiva durante a fase de investigação, ver nossas anotações no item 7.1. Decretação ex officio, deste mesmo capítulo. 87 As medidas cautelares diversas da prisão são aquelas catalogadas nos arts. 319 e 320 do CPP. 88 STJ, RHC 3.429/RJ, 6ª T., rel. Min. Pedro Acioli, j. 12-4-1994, DJ de 16-5-1994, p. 11787. No mesmo sentido: STJ, RHC 4.757/PB, 5ª T., rel. Min. Cid Flaquer Scartezzini, j. 4-9-1995, DJ de 9-10-1995, p. 33579; RSTJ 84/301; STJ, RHC 9.139/SP, 6ª T., rel. Min. Fernando Gonçalves, j. 14-12-1999, DJ de 21-2-2000, p. 189; STJ, HC 98.491/MG, 5ª T., rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 21-8-2008, DJe de 15-9-2008; STJ, RHC 25.813/RJ, 5ª T., rel. Min. Felix Fischer, j. 23-6-2009, DJe de 17-8-2009. 89 STJ, HC 95.618/SP, 5ª T., rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 22-4-2008, DJe de 19-5-2008. 90 Artigo com a redação da Lei n. 5.941/73. 91 STF, HC 100.184/MG, 1ª T., rel. Min. Ayres Britto, j. 10-8-2010, DJe de 1-10-2010. 92 TJSP, HC 241.079-3/9, 3ª Câm., j. 7-10-1997, rel. Des. Gonçalves Nogueira, RT 750/620. 93 “A simples menção das hipóteses arroladas no art. 312 do CPP não basta para fundamentar decreto de prisão preventiva” (TJSP, HC 379.035-3/0, 2ª Câm., rel. Des. Canguçu de Almeida, j. 29-4-2002, RT 804/573). 94 “Prisão preventiva: garantia da ordem pública. Afirmação de que ‘a liberdade do paciente representa sério risco ao convívio social’, não amparada em qualquer fato concreto que a comprove, tanto mais quanto a denúncia não abrange o aludido delito de quadrilha ou bando e não se dá notícia sequer de que teriam prosseguido as investigações para apuração desse crime por parte do paciente. (...) Liberdade provisória deferida” (STF, HC 90.063/SP, 1ª T., rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 27-3-2007, DJe n. 18, de 18-5-2007). “O fundamento da garantia da instrução criminal foi apenas formalmente sustentado, nele sendo apontado um intangível ‘temor’ que as testemunhas sempre sentiriam em casos de crime de homicídio, embora, no caso dos autos, nenhuma se tenha recusado a colaborar” (STF, HC 85.868/RJ, 2ª T., rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 11-4-2006, DJ de 15-12-
2006, p. 109). 95 STF, HC 98.862/SP, 2ª T., rel. Min. Celso de Mello, j. 23-6-2009, DJe n. 200, de 23-10-2009). No mesmo sentido: STF, HC 93.056/PE, 2ª T., rel. Min. Celso de Mello, j. 16-12-2008, DJe n. 89, de 15-5-2009; STF, HC 80.379/SP, 2ª T., rel. Min. Celso de Mello, j. 18-12-2000, DJ de 25-5-2001, p. 11; STF, HC 94.114/PR¸ 1ª T., rel. Min. Gilmar Mendes, j. 1-6-2010, DJe de 1-7-2010. 96 STF, HC 102.166/SP, 2ª T., rel. Min. Gilmar Mendes, j. 29-6-2010, DJe n. 149, de 13-8-2010. 97 STF, HC 89.238/SP, 2ª T., rel. Min. Gilmar Mendes, j. 29-5-2007, DJe n. 101, de 14-9-2007. No mesmo sentido: STF, HC 101.705/BA, 1ª T., rel. Min. Ayres Britto, j. 29-6-2010, DJe de 3-9-2010; STF, HC 95.125/BA, 1ª T., rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 8-6-2010, DJe de 24-9-2010. 98 STF, HC 83.534/SP, 1ª T., rel. Min. Marco Aurélio, j. 18-11-2003, DJ de 27-2-2004, p. 27. 99 STJ, HC 4.192/SP, 6ª T., rel. Min. Fernando Gonçalves, j. 22-10-1996, DJ de 12-5-1997, p. 18841. 100 STJ, RHC 4.895/RJ, 5ª T., rel. Min. Cid Flaquer Scartezzini, j. 13-12-1995, DJ de 4-3-1996, p. 5.413; RSTJ 85/308. 101 STF, HC 79.237-5-MS, 2ª T., rel. Min. Nelson Jobim, j. 26-10-1999, DJU de 12-4-2002, RT 803/489. 102 STF, HCS 94.498/MS, 2ª T., rel. Min. Ellen Gracie, j. 2-9-2008, DJe n. 202, de 24-10-2008; STJ, HC 32.142/RS, 5ª T., rel. Min. Felix Fischer, j. 2-9-2004, DJ de 27-9-2004, p. 375. 103 STF, HC 98.862/SP, 2ª T., rel. Min. Celso de Mello, j. 23-6-2009, DJe n. 200, de 23-10-2009). No mesmo sentido: STF, HC 94.404/SP, 2ª T., rel. Min. Celso de Mello, j. 18-11-2008, DJe n. 110, de 18-6-2010. 104 STF, HC 83.534/SP, 1ª T., rel. Min. Marco Aurélio, j. 18-11-2003, DJ de 27-2-2004, p. 27. 105 STF, HC 92.299/SP, 1ª T., rel. Min. Marco Aurélio, j. 24-6-2008, DJe n. 177, de 19-9-2008. 106 STF, HC 90.064/SP, 1ª T., rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 8-5-2007, DJe n. 42, de 22-6-2007. 107 STF, HC 83.534/SP, 1ª T., rel. Min. Marco Aurélio, j. 18-11-2003, DJ de 27-2-2004, p. 27. 108 STF, HC 83.534/SP, 1ª T., rel. Min. Marco Aurélio, j. 18-11-2003, DJ de 27-2-2004, p. 27. 109 STF, HC 90.063/SP, 1ª T., rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 27-3-2007, DJe n. 18, de 18-5-2007. 110 STF, HC 85.868/RJ, 2ª T., rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 11-4-2006, DJ de 15-12-2006, p. 109. 111 STF, HC 83.534/SP, 1ª T., rel. Min. Marco Aurélio, j. 18-11-2003, DJ de 27-2-2004, p. 27. 112 STF, HC 83.534/SP, 1ª T., rel. Min. Marco Aurélio, j. 18-11-2003, DJ de 27-2-2004, p. 27. 113 STF, HC 80.379/SP, 2ª T., rel. Min. Celso de Mello, j. 18-12-2000, DJ de 25-5-2001, p. 11. 114 STF, HC 80.168/GO, 1ª T., rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 5-9-2000, DJ de 13-10-2000, p. 11. 115 STF, HC 77.052/MG, 2ª T., rel. Min. Marco Aurélio, j. 30-6-1998, DJ de 11-9-1998, p. 5. 116 Promulga a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), de 22 de novembro de 1969. 117 STJ, HC 41.372/RJ, 6ª T., rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 31-8-2005, DJ de 26-6-2006, p. 204; STJ, HC 79.270/SP, 6ª T., rel. Min. Nilson Naves, rel. p/ o Acórdão Min. Hamilton Carvalhido, j. 16-8-2007, DJ de 31-3-2008. 118 Este tempo será, em regra, e inicialmente, de cinco dias, podendo ser prorrogado por igual período em caso de extrema e comprovada necessidade. Em se tratando de crime hediondo ou assemelhado o prazo é de trinta dias, prorrogável por igual período, conforme tratamos de explicar no capítulo específico, nesta obra. 119 Ob. cit., p. 545. 120 GUILHERME DE SOUZA NUCCI , ob. cit., p. 545. 121 STF, HC 80.379/SP, 2ª T., rel. Min. Celso de Mello, j. 18-12-2000, DJ de 25-5-2001, p. 11. 122 STF, HC 94.661/SP, 2ª T., rel. Min. Ellen Gracie, j. 30-9-2008, DJe n. 202, de 24-10-2008. 123 STF, HC 83.534/SP, 1ª T., rel. Min. Marco Aurélio, j. 18-11-2003, DJ de 27-2-2004, p. 27. 124 STF, HC 79.750-4-RJ, 2ª T., j. 14-12-1999, rel. Min. Marco Aurélio, DJU de 12-4-2002, RT 803/495. 125 “O excesso de prazo para o término do processo quando diligências são requeridas pela Defesa, não serve para fundamentar pedido de relaxamento de prisão ou liberdade provisória” (STJ, HC 34.989/PE, 6ª T., rel. Min. Paulo Medina, j. 6-10-2005, DJ de 26-9-2005, p. 464). 126 STJ, HC 62.759/SP, 5ª T., rela. Mina. Laurita Vaz, j. 28-8-2008, DJe de 29-9-2008; STJ, HC 114.368/PI, 6ª T., rel. Min. Celso Limongi, j. 10-3-2009, DJe de 30-3-2009; STJ, HC 117.687/SP, 6ª T., rela. Mina. Maria Thereza de Assis Moura, j. 6-2-2009, DJe de 27-4-2009; STJ, HC 70.562/SP, 6ª T., rela. Mina. Maria Thereza de Assis Moura, j. 26-5-2009, DJe de 1º-7-2009. 127 STJ, HC 42.835/SP, 6ª T., rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 31-8-2005, DJ de 14-11-2005, p. 409; STJ, HC 44.315/BA, 6ª T., rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 29-11-2005, DJ de 6-2-2006, p. 356. 128 STJ, HC 132.928/SE, 6ª T., rel. Min. Celso Limongi, j. 24-8-2009, DJe de 14-9-2009, LEXSTJ 242/380; STJ, EDcl no HC
122.378/RN, 5ª T., rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 3-12-2009, DJe de 1º-2-2010. 129 STJ, HC 78.511/SC, 6ª T., rela. Mina. Maria Thereza de Assis Moura, j. 30-10-2007, DJ de 26-11-2007, p. 252; STJ, HC 122.397/SP, 6ª T., rel. Min. Celso Limongi, j. 8-9-2009, DJe de 5-10-2009. 130 STJ, RHC 20.566/BA, 6ª T., rela. Mina. Maria Thereza de Assis Moura, j. 12-6-2007, DJ de 25-6-2007, p. 300. 131 STJ, HC 23.738/SP, 5ª T., rel. Min. Gilson Dipp, j. 21-11-2002, DJ de 3-2-2003, p. 336. 132 STJ, HC 18.684/SP, 5ª T., rel. Min. Gilson Dipp, j. 26-2-2002, DJ de 8-4-2002, p. 248; STJ, HC 46.410/SP, 6ª T., rel. Min. Nilson Naves, j. 27-9-2005, DJ de 13-3-2006, p. 381; STJ, RHC 23.760/PI, 6ª T., rela. Mina. Maria Thereza de Assis Moura, j. 28-8-2008, DJe de 22-9-2008; STJ, HC 120.225/SC, 6ª T., rel. Min. Celso Limongi, j. 19-2-2009, DJe de 16-3-2009; STJ, HC 132.952/PI, 6ª T., rel. Min. Celso Limongi, j. 25-6-2009, DJe de 16-11-2009. 133 STF, HC 85.237/DF, Pleno, rel. Min. Celso de Mello, DJ de 29-4-2005; STF, HC 94.661/SP, 2ª T., rel. Min. Ellen Gracie, j. 309-2008, DJe n. 202, de 24-10-2008.
PRISÃO CAUTELAR DOMICILIAR, SUBSTITUTIVA DA PRISÃO PREVENTIVA 1. NOTA INTRODUTÓRIA A prisão cautelar domiciliar substitutiva da prisão preventiva é instituto, introduzido no Brasil com a Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011, e possibilita, dentre outras coisas: 1º) restringir cautelarmente a liberdade do indivíduo preso em razão da decretação de prisão preventiva, sem, contudo, submetê-lo às conhecidas mazelas do sistema carcerário; 2º) tratar de maneira particularizada situações que fogem da normalidade dos casos e que, por isso, estão a exigir, por questões humanitárias e de assistência, o arrefecimento do rigor carcerário; 3º) reduzir o contingente carcerário, especialmente no que diz respeito aos presos cautelares; e 4º) reduzir as despesas do Estado advindas de encarceramento antecipado. Dentre outras vantagens, permite, ainda, respeito à integridade física e moral do preso (art. 5º, XLIX, da CF), bem como assegurar às mulheres presas condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação (art. 5º, L, da CF), além de evitar que em certos casos ocorra tratamento desumano (art. 5º, III, da CF). Antes da reforma determinada pela Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011, a Lei de Execução Penal (Lei n. 7.210, de 11-7-1984) já dispunha da prisão em regime de albergue domiciliar em seu art. 117, todavia, destinada apenas aos condenados com pena a cumprir no regime aberto, nas seguintes condições: a) condenado maior de 70 anos; b) condenado acometido de doença grave; c) condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental; d) condenada gestante. Como se vê, apenas as pessoas já condenadas, e somente nos casos de pena a ser cumprida no regime aberto, é que podem se beneficiar com referida modalidade de cumprimento de pena1, não se prestando tal benefício às pessoas presas em razão de prisão preventiva. Assim como ocorre em relação à regulamentação do art. 117 da LEP, a prisão domiciliar substitutiva da preventiva está condicionada à satisfação de determinados requisitos, claramente expostos no novo art. 318 do CPP, que serão analisados a seguir.
2. CONCEITO A prisão domiciliar substitutiva da preventiva é modalidade de prisão cautelar em regime domiciliar, cuja concessão se encontra condicionada à satisfação de determinados requisitos e sua permanência à satisfação de outros, a ser determinada pelo juiz, em decisão fundamentada, de ofício ou a requerimento das partes ou, quando no curso da investigação criminal, por representação da autoridade policial, mediante requerimento do Ministério Público ou do investigado.
3. PRESSUPOSTO E HIPÓTESES DE CABIMENTO Pressuposto da prisão domiciliar ora tratada é a antecedente decretação da prisão preventiva, e disso resulta ser incogitável a prisão cautelar domiciliar em relação à infração a que não for isolada, cumulativa ou alternativamente cominada pena privativa de liberdade, já que nestes casos não se admite prisão preventiva por força de vedação expressa estampada no § 1º do art. 283 do CPP.
Na fase de investigação a decretação está condicionada à existência de requerimento do investigado, do Ministério Público ou de representação da autoridade policial. Durante o processo, pode ser decretada em razão de provocação ou ex officio (§ 2º do art. 282 do CPP). As hipóteses de cabimento da substituição estão reguladas no art. 318 do CPP, que é taxativo e, portanto, não comporta interpretação extensiva. Segundo o texto legal, poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for: “I — maior de 80 (oitenta) anos; II — extremamente debilitado por motivo de doença grave; III — imprescindível aos cuidados especiais de pessoa menor de 6 (seis) anos de idade ou com deficiência; IV — gestante a partir do 7º (sétimo) mês de gravidez ou sendo esta de alto risco”.
3.1. Pessoa maior de 80 anos A primeira hipótese regulada envolve pessoa maior de 80 anos. A Lei n. 10.741, de 1º de outubro de 2003 (Estatuto do Idoso), diz que “considera-se idoso todo aquele que contar com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos”. O art. 117 da Lei de Execução Penal permite a concessão de albergue domiciliar ao condenado maior de 70 anos que estiver cumprindo pena no regime aberto. O novo art. 318, I, do CPP permite a substituição da prisão preventiva por prisão domiciliar à pessoa maior de 80 anos. O único critério utilizado pelo legislador foi o cronológico, sendo necessário, portanto, que o preso conte com 80 anos completos para que possa postular o benefício. Não se exige, para o cabimento da substituição sob tal fundamento, a conjugação de qualquer outro requisito específico. A previsão tem em conta fins humanitários e de respeito à dignidade da pessoa humana, por considerar que o idoso, em tal fase de sua existência, já não dispõe de condições físicas e emocionais para suportar o ônus do encarceramento tradicional, merecendo, sob tais perspectivas, um abrandamento na forma de cumprir sua prisão cautelar. Quer nos parecer, entretanto, que a previsão não tem muita utilidade prática, já que raras vezes será possível encontrar algum octogenário a tal ponto perigoso que não possa beneficiar-se com a aplicação de medidas cautelares restritivas e que em relação a ele seja necessária, adequada, razoável e proporcional a prisão preventiva, que sabidamente é a medida de ultima ratio, somente manuseável diante de situações que não comportem enfrentamento jurídico menos drástico. Segundo entendemos, deveria ocorrer um alinhamento das regras jurídicas citadas, para que todas se referissem ao maior de 70 (setenta) anos de idade, com vistas a alcançar tratamento linear e coerente, como é de se esperar.
3.2. Pessoa extremamente debilitada por motivo de doença grave A segunda hipótese se refere à pessoa extremamente debilitada por motivo de doença grave. Tem cabimento a prisão domiciliar substitutiva porque a permanência do preso no cárcere concorre para o agravamento de seu estado de saúde. A previsão tem base em fundamentação humanitária, pois não se mostra razoável que alguém que se encontre extremamente debilitado por motivo de doença grave seja colocado ou mantido no ambiente carcerário tradicional para que lá pereça.
A lei não contém palavras inúteis: não basta, portanto, a só demonstração de que se encontra acometido de doença grave para que consiga o benefício. É imprescindível, em regra, a demonstração com base em parecer médico que ateste que, em razão da moléstia grave, o preso se encontra “extremamente debilitado”. Isso não exclui a possibilidade de que, em alguns casos, possa o juiz, “de olho”, verificar e constatar o grave quadro de saúde do preso e dispensar, em razão disso, prévia apresentação de prova documental específica. É claro que a interpretação do que possa ser considerado “extremamente debilitado” não pode levar a exigir que o preso já se encontre próximo da morte, em seus momentos finais. Seria desumano e irracional pensar que a pretensão da lei iria ao ponto de só permitir o benefício em tais casos já praticamente finalizados. Antes da Lei n. 12.403/2011 já se decidiu ser “legalmente admissível a transferência de preso provisório, em estado grave de saúde, para o regime de prisão domiciliar, por força da combinação dos arts. 2º, par. ún., e 117, II, da Lei 7.210/84”2. Agora há regra específica no CPP. Em linhas de execução penal: “Conforme salienta RADBRUCH, ‘o Direito deve se prolongar para fora de nós mesmos, para que façamos coincidir com a realidade, de acordo com as necessidades de sua aplicação ao caso concreto. Por isso, a jurisprudência nem sequer tem princípios estáveis e critérios universais: umas vezes pedirá à própria lei a regra da sua aplicação, reduzindo a lei à letra do texto ou interpretando-a pelo espírito que guiou o legislador; outras vezes abandonará a lei, para invocar os princípios que estão de certo modo consagrados pela doutrina, ou até os sentimentos naturais de equidade, que todos os homens se orgulham de possuir’. Diante de uma doença misteriosa, altamente contagiosa, cujos efeitos maléficos e perniciosos ainda não estão suficientemente conhecidos pela Ciência moderna, concede-se ao condenado aidético o direito de cumprir a pena em prisão domiciliar, ressalvada a hipótese do surgimento de circunstâncias posteriores que aconselhem ou autorizem a revogação ou substituição da medida”3.
3.3. Pessoa imprescindível aos cuidados especiais de menor de 6 anos de idade ou de pessoa com deficiência Duas são as hipóteses reguladas no inciso III do art. 318, nas quais o preso preventivo é imprescindível aos cuidados especiais: 1ª) de pessoa menor de 6 anos, e 2ª) de pessoa com deficiência.
3.3.1. Pessoa menor de 6 anos de idade Permite a lei substituição da prisão preventiva por domiciliar quando ficar demonstrado que o preso tem, sob sua responsabilidade, pessoa menor de 6 anos de idade, sendo ele imprescindível aos cuidados especiais desta. Não há necessidade de que a criança tenha qualquer grau de parentesco com o preso, mas neste caso deverá o juiz fazer uma apuração rigorosa a respeito do alegado, visto que poderá estar diante de expediente escuso que tenha por escopo a obtenção de benefício descabido. Menor de 6 anos é a pessoa que ainda não completou tal idade. Não se exige tenha a criança qualquer problema de saúde ou particular condição física, apesar de o texto da lei referir-se a cuidados especiais. Basta a idade indicada, já que a dependência de infantes em tal fase da vida é presumida. Mas não é só.
Se a criança puder contar com os cuidados de pessoa diversa, prestados por algum familiar ou não, ficará excluído o cabimento do benefício por falta do requisito imprescindibilidade. Embora seja presumível que toda criança menor de 6 anos dependa de um adulto, não há como presumir a dependência exclusiva em relação a uma determinada pessoa, no caso, o preso. A imprescindibilidade não se presume, e cabe ao interessado prová-la em juízo (parágrafo único do art. 318 do CPP).
3.3.2. Pessoa portadora de deficiência A redação do inciso III poderia ser melhor, pois pode levar à confusão no sentido de fazer crer que somente caberá o benefício se a pessoa com deficiência for menor de 6 anos de idade. Mas não é assim. Neste caso, independentemente da idade, se ficar provado que pessoa portadora de deficiência dependa exclusivamente do preso, o benefício comportará acolhimento. Também aqui se exige a demonstração do requisito imprescindibilidade do auxílio, que só pode ser prestado pelo preso, a quem incumbe a demonstração em juízo. Não se pode permitir que nos casos do inciso III do art. 318 o preso preventivo encontre uma porta escancarada para a prisão domiciliar. É preciso que ele demonstre de forma clara atender aos requisitos da lei, pois a dúvida, neste caso, será resolvida em seu desfavor.
3.4. Gestante a partir do sétimo mês de gravidez ou sendo esta de alto risco O inciso IV do art. 318 do CPP envolve duas ordens de ideias: 1ª) gestação a partir do sétimo mês de gravidez, ou, 2ª) gestação, a qualquer tempo, de alto risco. A nova regulamentação tem relação com as recentes “Regras das Nações Unidas para o Tratamento de Reclusas e Medidas não Privativas de Liberdade para Mulheres Delinquentes (Regras de Bangkok)”, que, em sua regra n. 58, dispõe: “Tendo em conta as disposições do parágrafo 2.3 das Regras de Tókio, não se separarão as delinquentes de seus parentes e comunidade sem prestar a devida atenção a sua história e seus vínculos familiares. Quando proceda e seja possível, se utilizarão mecanismos opcionais no caso das mulheres que cometam delitos, como medidas alternativas e outras que substituam a prisão preventiva e a condenação”.
3.4.1. Gestação a partir do sétimo mês de gravidez Nesta hipótese o legislador levou em conta que, a partir do sétimo mês, a qualquer tempo poderá ocorrer parto viável, sendo melhor, portanto, que ocorra fora do ambiente carcerário, que reconhecidamente não atende às especificações da LEP, especialmente em relação às mulheres. O § 3º do art. 14 da LEP assegura o acompanhamento médico à mulher, principalmente no pré-natal e no pós-parto, extensivo ao recém-nascido, mas esta regra é diuturnamente descumprida. O § 1º do art. 82 da LEP determina que a mulher e o maior de 60 anos, separadamente, serão recolhidos a estabelecimento próprio e adequado à sua condição pessoal. O § 2º do art. 83 da LEP tem a seguinte redação, que, em regra, também não é observada: “Os estabelecimentos penais destinados a mulheres serão dotados de berçário, onde as condenadas possam cuidar de seus filhos, inclusive amamentá-los, no mínimo, até 6 (seis) meses de idade”. Conforme o art. 5º, L, da CF, “às presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação”. Mesmo estando diante de prisão cautelar, portanto, prisão sem pena, não é desarrazoado afirmar
que a prisão domiciliar permite corrigir, em parte, distorções evidenciadas no sistema e preserva o princípio da intranscendência ou personalidade da pena, segundo o qual a pena (e também o processo) não passará da pessoa do acusado (art. 5º, XLV, da CF), deixando de atingir diretamente o recémnascido, que poderá vir à luz em ambiente mais saudável e com melhores chances de saúde e felicidade. A propósito, calha citar a advertência de JOSÉ HEITOR DOS SANTOS no sentido de que “o aleitamento materno é de fundamental importância para o desenvolvimento sadio da criança. O colostro, substância que aparece logo depois do parto, possui elementos que protegem o bebê contra a maioria das doenças da primeira infância, sendo, portanto, importante que o recém-nascido mame o colostro, mesmo que a mulher decida não amamentar por muito tempo”4.
3.4.2. Gestação, a qualquer tempo, de alto risco A situação fala por si só. O alto risco do processo gestacional — para a mãe, para o nascituro ou para ambos — justifica, sem delongas, a substituição da prisão preventiva por domiciliar, até porque é sabido que as unidades prisionais não atendem às especificações da Constituição Federal e da Lei de Execução Penal, e por isso não disponibilizam atendimento adequado para tais situações extremas.
3.5. Necessidade de prova idônea Para a substituição da prisão preventiva por prisão cautelar domiciliar, diz o parágrafo único do art. 318 do CPP, o juiz exigirá prova idônea dos requisitos estabelecidos neste artigo.
4. QUEM PODE REQUERER A prisão domiciliar pode ser requerida diretamente pelo preso ou por seu Defensor, estando legitimado, ainda, o Ministério Público. Em casos tais, é de admitir, especialmente em razão das particularidades envolvidas, seja o pedido feito de próprio punho pelo preso. Neste tema, os rigorismos formais devem ser desprezados ou ao menos relativizados. Nenhuma dúvida, é evidente, que o Defensor pode, e deve, requerer o benefício sempre que cabível. Cabe também ao Ministério Público, observado seu perfil constitucional/institucional e suas relevantes funções no Estado Democrático de Direito, formular a pretensão quando entender justificada. A autoridade policial poderá formular representação — mera sugestão — para a finalidade tratada. Independentemente de quem seja o autor do pedido, deverá ser feito, sempre, de forma fundamentada, estando amparada a pretensão em prova que a legitime. Se o pedido não estiver devidamente instruído com as provas necessárias, nada impede, ao contrário, tudo recomenda, que o juiz determine a produção de outras provas, a fim de formar seu convencimento.
5. SUBSTITUIÇÃO EX OFFICIO Pode o juiz substituir a prisão preventiva por domiciliar sem que haja pedido formulado por terceiro, vale dizer: determinar a substituição ex officio? Pensamos que sim, mas somente no curso do processo penal. Durante a fase de investigação
dependerá sempre de provocação de algum dos legitimados. Com efeito, o § 2º do art. 282 do CPP dispõe que: “as medidas cautelares serão decretadas pelo juiz, de ofício ou a requerimento das partes ou, quando no curso da investigação criminal, por representação da autoridade policial ou mediante requerimento do Ministério Público”.
6. MOMENTO EM QUE PODE SER CONCEDIDA Conforme já analisamos no capítulo anterior, a prisão preventiva pode ser decretada em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal. Disso decorre o acerto da previsão contida no novo art. 317 do CPP, quando dispõe que a prisão domiciliar de que ora se cuida poderá ser concedida ao indiciado e também ao acusado. Indiciado é aquele que como tal figura em inquérito policial. De acusado só se pode falar, tecnicamente, após a instauração do processo com o recebimento da denúncia. O vocábulo acusado, entretanto, comporta ampliação para o fim de alcançar também o querelado. A substituição da preventiva por domiciliar poderá ocorrer, portanto, no curso da investigação policial ou do processo penal. Seja em que momento for, postulada a substituição, é necessário sejam observadas as regras que determinam respeito ao contraditório (art. 282, § 3º, do CPP).
7. CONDIÇÕES DE PERMANÊNCIA Nos termos do art. 317 do CPP, a prisão domiciliar substitutiva será concedida mediante condição legal de não ausentar-se o indiciado ou acusado de sua residência sem autorização judicial. Note-se que a lei não restringiu a permanência domiciliar a um determinado número de horas, de maneira que o beneficiado deverá permanecer todo o tempo — período integral —, no interior de sua residência e dependências, e dela somente poderá se ausentar se contar com autorização judicial prévia e específica. Não se deve perder de vista que a ideia central do instituto é a de que a pessoa se encontra presa, embora em sua residência, por isso a justificada restrição à sua liberdade de locomoção. As medidas cautelares poderão ser aplicadas isolada ou cumulativamente, diz o § 1º do art. 282 do CPP. Sendo assim, guiado pela necessidade e adequação da medida, é permitido ao juiz fixar outras condições além do dever de permanência em residência, especialmente dentre aquelas previstas nos arts. 319 e 320 do CPP.
8. DOMICÍLIO OU RESIDÊNCIA? Residência é o local, espaço físico habitado pelo indivíduo. Domicílio é o lugar onde a pessoa estabelece a sua residência com ânimo definitivo (art. 70 do CC). Se, porém, a pessoa natural tiver diversas residências, onde, alternadamente, viva, considerar-se-á domicílio seu qualquer delas (art. 71 do CC). Muda-se o domicílio, transferindo a residência, com a intenção manifesta de mudar (art. 74 do CC). O art. 317 do CPP diz que a prisão domiciliar consiste no recolhimento do indiciado ou acusado em sua residência.
9. PLURALIDADE DE RESIDÊNCIAS E se o indiciado ou acusado tiver mais de uma residência? Pela letra do art. 71 do CC, considerar-se-á domicílio qualquer delas. Como deve o juiz proceder ao conceder o benefício na hipótese do indiciado ou acusado dispor de duas ou mais residências? Deverá o magistrado fazer consignar em sua decisão em qual delas deverá permanecer o beneficiado, enquanto estiver cumprindo a prisão domiciliar. Poderá o preso domiciliar se deslocar entre uma e outra dentre suas residências? Em regra não, salvo se contar com autorização judicial prévia e específica. Do contrário não seria correto falar em prisão, já que permitido o trânsito livre.
10. MOMENTO DE SE CONCEDER AUTORIZAÇÃO DE SAÍDA DA RESIDÊNCIA A autorização para saída da residência em que deva permanecer sob cumprimento de pena é medida excepcional que, em regra, deverá ser solicitada e concedida previamente a cada saída, até porque demanda a demonstração das hipóteses autorizadoras, que deverão ser analisadas contemporaneamente ao pedido. Nada impede, entretanto, que o juiz autorize determinadas saídas já no momento da concessão do benefício, caso disponha de elementos que permitam formar juízo de valor a tal respeito. Imagine-se, por exemplo, hipótese em que a prisão domiciliar venha a ser concedida por encontrarse a pessoa extremamente debilitada por motivo de doença grave, estando evidenciada a necessidade de saídas regulares para atendimento médico, hemodiálise etc. É possível, portanto, que diante do caso concreto o juiz autorize as saídas necessárias já na decisão que conceder a prisão domiciliar.
11. DESCUMPRIMENTO DE CONDIÇÃO DO BENEFÍCIO É possível, e não raras vezes irá ocorrer, que o preso domiciliar descumpra, justificadamente ou não, condição legal de permanência, do que poderá decorrer a suspensão cautelar do benefício. No caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas, o juiz, de ofício ou mediante requerimento do Ministério Público, de seu assistente ou do querelante, poderá substituir a medida, impor outra em cumulação, ou, em último caso, restabelecer a prisão preventiva, não sendo demais lembrar que a atuação judicial na fase de investigação dependerá sempre da provocação dos legitimados (§§ 2º e 4º do art. 282 do CPP). Igual procedimento será adotado no caso de o agente vir a praticar nova infração penal — o que é possível que faça mesmo no interior de sua residência.
11.1. Descumprimento justificável Necessário enfatizar que nem todo descumprimento poderá ser injustificado, o que está a reforçar a imprescindibilidade do contraditório e da ampla defesa antes da decisão judicial que irá avaliar definitivamente a conduta inquinada de faltosa. Pode ocorrer, por exemplo, que o preso venha a deixar sua residência para prestar socorro a terceira pessoa envolvida em acidente de trânsito ocorrido próximo de sua casa e seja necessário levá-la até um hospital distante para atendimento médico; pode ocorrer que tenha que auxiliar um vizinho enfermo em situação extrema; pode ocorrer, ainda, que venha a ser acometido de mal súbito e
em razão disso ter que se deslocar imediatamente em busca de atendimento específico etc. Seja como for, tendo descumprido justificadamente o dever de permanecer em sua residência, é aconselhável que se antecipe em comunicar o fato ao juiz do feito, apresentando desde logo as provas que a respeito possuir. Nada impede, é claro, que, não procedendo à justificativa antecipada e voluntária, se instado a se justificar posteriormente apresente as provas disponíveis.
11.2. Sustação cautelar do benefício Comunicado o descumprimento oficialmente nos autos do processo, antes da revogação do benefício deverá o juiz, em respeito aos princípios da ampla defesa, do contraditório e do devido processo legal, permitir que o preso domiciliar apresente justificação, e, sendo cabível e necessário/pertinente, produza prova a respeito de seus argumentos. Atuando nos limites do poder geral de cautela, poderá o juiz, diante do caso concreto, determinar a sustação cautelar da prisão domiciliar, restabelecendo os termos da prisão preventiva originária até que se decida a respeito da revogação definitiva do benefício, hipótese em que o preso retornará ao ambiente carcerário. É possível a sustação cautelar ex officio, sem a prévia oitiva das partes, mas não a revogação definitiva.
11.3. Revogação definitiva Comunicado o descumprimento nos autos e determinada ou não a sustação cautelar, deverá o juiz designar dia e hora para a oitiva do preso em audiência de justificação, na qual deverão estar presentes o Ministério Público e a Defesa, que após as explicações do preso, caso queira prestá-las, deverão manifestar-se nos autos, nesta mesma ordem. Em seguida será proferida a decisão judicial definitiva, que eventualmente irá acolher a justificativa apresentada ou, no caso de rejeitá-la, revogar definitivamente a prisão domiciliar. Embora admitida em caso de urgência a sustação cautelar ex officio, a decisão que revogar definitivamente a prisão domiciliar deverá ser sempre precedida de manifestação do Ministério Pública e da Defesa a esse respeito. As providências relacionadas à sustação cautelar e à revogação definitiva são aplicáveis não apenas à hipótese de descumprimento da condição legal de permanência, mas sempre que houver algum fato que possa levar à revogação da prisão domiciliar, como ocorre no caso da prática de nova infração penal no curso do benefício. Conforme dispõe o § 5º do art. 282 do CPP: “O juiz poderá revogar a medida cautelar ou substituíla quando verificar a falta de motivo para que subsista, bem como voltar a decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem”.
12. DETRAÇÃO O tempo de prisão domiciliar comporta detração nos termos do art. 42 do CP, visto que na hipótese a medida é aplicada em substituição à prisão preventiva. O que se está a cumprir, em verdade, é prisão cautelar, embora na forma domiciliar, daí ser admissível o abatimento do tempo de encarceramento antecipado do total a pena ao final aplicada, em caso de condenação.
13. PRESO QUE NÃO TEM DEFENSOR Caso o preso não disponha de defensor constituído nos autos, antes de determinar a revogação definitiva da prisão cautelar domiciliar, deverá o juiz providenciar o necessário visando à efetividade de defesa técnica, que deverá ser intimada para a audiência de justificação. Se o defensor não comparecer à audiência, deverá ser nomeado defensor ad hoc (para o ato).
14. POSSIBILIDADE DE HABEAS CORPUS Se o procedimento adotado em juízo com vistas à revogação da prisão cautelar domiciliar não observar as garantais da ampla defesa, do contraditório, do devido processo legal (art. 5º, LIV, da CF) e da obrigatoriedade de fundamentação das decisões judiciais (art. 93, IX, da CF), terá cabimento a impetração de habeas corpus, pois, conforme dispõe o art. 5º, LXVIII, da CF: “conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder”5.
Prisão Cautelar Domiciliar,Substitutiva da Prisão Preventiva Quadro comparativo das regras Como era
Como ficou
Sem regra correspondente
Art. 317. A prisão domiciliar consiste no recolhimento do indiciado ou acusado em sua residência, só podendo dela ausentar-se com autorização judicial.
Sem regra correspondente
Art. 318. Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for: I — maior de 80 (oitenta) anos; II — extremamente debilitado por motivo de doença grave; III — imprescindível aos cuidados especiais de pessoa menor de 6 (seis) anos de idade ou com deficiência; IV — gestante a partir do 7º (sétimo) mês de gravidez ou sendo esta de alto risco. Parágrafo único. Para a substituição, o juiz exigirá prova idônea dos requisitos estabelecidos neste artigo.
1 Sobre o assunto, conferir: RENAT O MARCÃO, Curso de execução penal, 10. ed., São Paulo: Saraiva, 2012. 2 TJSP, MS 261.151-3/4, 2ª Câm., rel. Des. Canguçu de Almeida, j. 19-10-1998, RT 760/608. 3 TJES, HC 9.218, 1ª Câm., rel. Des. Antônio José Miguel Feu Rosa, j. 3-6-1987, RT 623/334. 4 Aleitamento materno nos presídios femininos. Disponível em: . 5 Arts. 647 e 648 do CPP.
PRISÃO TEMPORÁRIA 1. NOTA INTRODUTÓRIA A reforma do Código de Processo Penal introduzida pela Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011, não alterou a sistemática da prisão temporária, que continua inteiramente regulada pela Lei n. 7.960, de 21 de dezembro de 1989.
2. PRISÃO TEMPORÁRIA Antes da Constituição Federal de 1988 era comum nos meios policiais a prática quase aleatória da detenção temporária de pessoas que, em razão disso, eram levadas até repartições policiais e lá submetidas a toda sorte de constrangimento. A detenção era levada a efeito por autoridades policiais e seus agentes, desprovidos de mandado judicial, sem que estivesse em situação de flagrante delito a pessoa assim detida. Esta prática antidemocrática que fere o Estado de Direito tinha nome conhecido: era denominada “prisão para averiguação”. Com o advento da “Constituição Cidadã” e seu conjunto de princípios e garantias fundamentais, especialmente previstos no art. 5º, tais práticas foram abandonadas, até porque, conforme dispõe o inciso LXI do mencionado artigo, “ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente”. Mas a antiga “prisão para averiguação” acabou ressuscitada por meio da Medida Provisória n. 111, de 24 de novembro de 1989, depois convertida em lei, e passou a se chamar prisão temporária, conforme dispõe a Lei n. 7.960, de 21 de dezembro de 1989. Uma vez normatizada, ingressou no sistema jurídico brasileiro e desde então vem sendo largamente utilizada na prática da Justiça Criminal. É certo que na maioria das vezes a utilização deste importante ferramental tem contribuído de maneira significativa para a apuração de crimes graves, como é seu objetivo, mas é preciso dizer que sua utilização muitas vezes indiscriminada, desnecessária e carente de fundamentação concreta, termina por colocar em risco sua própria existência ou sobrevivência, já que não são poucos os que passaram a defender sua incompatibilidade com o Estado de Direito. Contra os excessos, entretanto, temos soluções jurídicas que vão desde a responsabilização administrativa e criminal de autoridades até a possibilidade de reparação civil, passando, é claro, pela restituição da liberdade muitas vezes cerceada de forma açodada e desnecessária. É deste diploma legal que cuidaremos nas linhas que seguem.
2.1. Conceito A prisão temporária é modalidade de prisão cautelar pré-processual admitida apenas em relação a determinados tipos de crimes e que tem por objetivo permitir a colheita de provas que de outra maneira não se conseguiria êxito na produção1, bem como esclarecimentos a respeito da identificação do investigado. “Nos termos da Lei n. 7.960/89, a prisão temporária tem por única finalidade legítima a necessidade da custódia para as investigações”2.
3. CABIMENTO Desde o início de sua vigência, a Lei n. 7.960/89 tem despertado discussões a respeito das hipóteses em que se faz possível sua decretação, e é claro que esta é uma das preocupações mais relevantes, daí a necessidade de cuidadosa análise do texto legal, da doutrina e da jurisprudência atual a respeito. Constitui ponto de partida, portanto, estabelecer quais são as hipóteses que legitimam seu cabimento, lembrando sempre que tais regras, impositivas de restrição à liberdade individual, devem ser sempre interpretadas restritivamente.
3.1. Imprescindibilidade para as investigações Diz o inciso I do art. 1º da Lei n. 7.960/89 que a prisão temporária será cabível quando imprescindível para as investigações do inquérito policial. Para os fins empregados no texto legal, imprescindível é aquilo sem o que não se pode conseguir algo ou chegar a um determinado ponto. Neste caso, deve a prisão antecipada e excepcional revelar-se imprescindível, e portanto, apresentar-se como única alternativa lógica e possível para se obter determinada prova ou conjunto de informações, sem as quais não chegará a bom termo a investigação criminal iniciada e documentada em inquérito policial regularmente instaurado. Além da demonstração inequívoca da imprescindibilidade, é necessário que, antecedendo o pedido, já exista inquérito policial instaurado, onde se busque apurar os fatos e obter as provas que de outra maneira, por outros meios menos drásticos, não se consiga alcançar. Não é possível, portanto, decretar a prisão temporária sob tal fundamento visando obter prova que poderá dar ensejo à instauração de inquérito, o que de certa forma colide com a atual redação do art. 311 do CPP, que permite a decretação de prisão preventiva em qualquer fase da investigação, não exigindo, como antes, a prévia instauração de inquérito policial. Considerando que nos incisos II e III do art. 1º a Lei 7.960/89 faz referência expressa à pessoa do indiciado, e que tal não ocorre no dispositivo sob análise (inciso I), argumentou-se com a possibilidade de que a decretação da prisão temporária poderia recair sobre qualquer pessoa, investigada ou não, e por conta disso não foram poucas as severas críticas endereçadas à lei. Nunca nos pareceu correta esta leitura que se extrai da análise dos incisos que integram o art. 1º da Lei sob esse enfoque particular, mas é certo que ele conta com o peso da opinião de juristas do quilate do saudoso JULIO F. MIRABETE, que, tratando do tema, assim se expressou: “Draconiana a lei no inc. I, permite a prisão não só do indiciado, como também de qualquer pessoa (uma testemunha, por exemplo), já que, ao contrário dos demais incisos do artigo 1º, não se refere ela especificamente ao ‘indiciado’. Trata-se, portanto, de norma legal odiosa e contrária à tradição do processo penal brasileiro”3. A compreensão que temos a respeito deste dispositivo tão duramente atacado é diametralmente oposta a da acima apontada. Quer nos parecer que ao omitir a palavra “indiciado” o legislador não fez mais do que permitir a decretação da prisão temporária naqueles casos em que o inquérito policial já se encontra instaurado, mas a pessoa investigada ainda não figura como “indiciada”; não ocorreu indiciamento formal. Nada mais. Conforme já enfatizamos, sendo o Direito uma ciência, advertiu o Min. MARCO AURÉLIO , “há de emprestar-se sentido técnico a institutos, expressões e vocábulos”4.
No caso dos demais incisos, onde há menção expressa à figura do “indiciado”, somente caberá a decretação quando já existir o indiciamento da pessoa contra quem se imputa, no inquérito, a prática de determinado ilícito penal. No Estado de Direito minimamente democrático, esta é a interpretação que melhor se ajusta com os princípios e garantias constitucionais.
3.2. Quando o indiciado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade A segunda hipótese de cabimento da prisão temporária está regulada no inciso II do art. 1º da Lei n. 7.960/89, que guarda semelhança, mas não se confunde, com o disposto no art. 313, parágrafo único, do CPP. Nestes termos, caberá também a decretação da prisão temporária quando o indiciado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade. Aqui a lei se refere textualmente à pessoa do “indiciado”. É imprescindível, portanto, que já exista inquérito instaurado a respeito dos fatos e que já tenha ocorrido indiciamento do apontado autor do crime. Não dá para pensar de maneira diversa quando estamos tratando do termo técnico — indiciado —, ainda mais estando relacionado com medida excepcional de tamanha gravidade, como é o caso da prisão temporária, modalidade de prisão cautelar em que, diversamente de outras, não houve situação de flagrante e não se exige, ao contrário do que ocorre com a prisão preventiva, prova da existência do crime e indícios suficientes da autoria. Pois bem. Por primeiro, nos termos da lei, caberá por aqui a decretação da prisão temporária em desfavor do indiciado quando este não tiver residência fixa. É evidente que o fundamento da regra em comento não se confunde com o que está previsto no art. 312, caput, do CPP, que autoriza a decretação da prisão preventiva quando imprescindível para assegurar a aplicação da lei penal. No caso da prisão temporária, o que se busca é a colheita de melhores informações a respeito da completa identificação do indiciado; proporcionar seja submetido a reconhecimento pessoal etc., daí também a sua admissibilidade quando ele não fornecer elementos necessários ao esclarecimento completo de sua identidade. Note-se que uma leitura superficial do que acabamos de afirmar poderia apontar equívoco na nossa forma de pensar, quando sustentamos que nos casos do inciso II a prisão temporária só terá cabimento em face de quem já figure em inquérito policial como indiciado, quando na sequência sustentamos que a prisão autorizada neste inciso tem por finalidade possibilitar o reconhecimento formal; a completa identificação do indiciado etc. Mas a contrariedade na argumentação é só aparente. Não há equívoco algum, visto que é perfeitamente possível hipótese em que determinada pessoa seja indiciada antes mesmo de a polícia dispor de todos seus dados pessoais, da sua completa qualificação. Não é outra a situação tratada no art. 41 do CPP quando se diz que a denúncia ou queixa deverá conter, dentre outras informações, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo. Note-se que é possível não apenas o indiciamento em inquérito policial, mas também a denúncia e
seu recebimento, partindo-se daí com a efetiva instauração de ação penal contra alguém de quem não se disponha da completa qualificação, mas tão somente de esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo (art. 259 do CPP).
3.3. Quando houver fundadas razões, de acordo com qualquer prova admitida na legislação penal, de autoria ou participação do indiciado nos crimes arrolados no inciso III Conforme observou JULIO F. MIRABETE: “Há evidentes impropriedades técnicas no dispositivo. Em primeiro lugar, não é a lei penal que prevê quais as provas admissíveis em juízo. Em segundo era desnecessário referir-se à prova para a decretação da medida já que ‘fundadas razões’ evidentemente só existem com base na prova colhida no inquérito policial. Também ao contrário dos demais incisos, que embasam a prisão temporária, nesta última hipótese não é necessário demonstrar a necessidade da prisão, bastando para ela a existência de indícios suficientes da autoria. Diante da enumeração legal do inciso III, pode-se concluir que tal medida é destinada a aplacar o clamor público e a indignação social diante dos crimes graves mencionados, mas a lei não exige que tais situações estejam presentes no caso particular”5. Diz o art. 29, caput, do CP: “Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade”. Independentemente da “medida da culpabilidade” do indiciado, estará aberta a possibilidade de ver decretada sua prisão temporária sempre que estiver envolvido com a prática de qualquer dos crimes listados e a seguir indicados: a) homicídio doloso (art. 121, caput, e seu § 2º); b) sequestro ou cárcere privado (art. 148, caput, e seus §§ 1º e 2°); c) roubo (art. 157, caput, e seus §§ 1º, 2º e 3º); d) extorsão (art. 158, caput, e seus §§ 1º e 2º); e) extorsão mediante sequestro (art. 159, caput, e seus §§ 1º, 2º e 3º); f) estupro (art. 213, caput, e §§ 1º e 2º); g) epidemia com resultado de morte (art. 267, § 1º); h) envenenamento de água potável ou substância alimentícia ou medicinal qualificado pela morte (art. 270, caput, c/c o art. 285); i) quadrilha ou bando (art. 288), todos do Código Penal; j) genocídio (arts. 1º, 2º e 3º da Lei n. 2.889, de 1º-10-1956), em qualquer de suas formas típicas; k) tráfico de drogas (art. 33 da Lei n. 11.343, de 23-8-2006); l) crimes contra o sistema financeiro (Lei n. 7.492, de 16-61986). Por força do que dispõe o art. 2º, § 4º, da Lei n. 8.072/90, também é cabível a decretação de prisão temporária em relação aos crimes hediondos e assemelhados a que se referem os arts. 1º e 2º da mesma Lei, previsões que contemplam outros delitos não relacionados na Lei n. 7.960/89, tais como: tortura; terrorismo; falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais (art. 273, caput e § 1º, § 1º-A e § 1º-B, do CP) e crime de genocídio previsto nos arts. 1º, 2º e 3º da Lei n. 2.889, de 1º de outubro de 1956, tentado ou consumado.
3.4. Entendendo a aplicação das hipóteses de cabimento Reflexão que se impõe agora é no sentido de buscar saber se para a decretação da prisão temporária é necessária a conjugação — a aplicação simultânea — dos três incisos do art. 1º da Lei; dois deles ou apenas um. É possível pensar que seja necessário atender aos três incisos, conjuntamente; ou dois deles. Também é possível argumentar que a prisão poderá ser decretada desde que satisfeitas as exigências de um único inciso isoladamente, mas calha dizer desde já, com apoio na lição de ANTONIO SCARANCE FERNANDES, que “não é possível exegese no sentido de ser bastante o preenchimento de um só
dos requisitos dos três incisos para a prisão temporária”6. Pois bem. Que a prisão só será possível em razão da apuração de um dos crimes listados no item anterior nos parece intuitivo (art. 1º, III, da Lei n. 7.960/89 + arts. 1º e 2º da Lei n. 8.072/90). Portanto, o ponto de partida será sempre identificar se o crime que está sendo apurado comporta prisão temporária. Feito isso, e sendo caso, o problema que surge reside em saber se, satisfeito aquele requisito, será preciso também identificar as hipóteses dos incisos I e II, ou bastará apenas uma delas. Bastará apenas uma. Como concluiu SCARANCE: “Não se exige, para a prisão, o preenchimento das exigências dos incisos I e II, o que tornaria muito difícil a sua ocorrência. Assim, se alguém tivesse residência fixa e domicílio certo, nunca poderia ser submetido à prisão temporária. Basta, assim, a presença de situação descrita em um dos incisos. Em resumo, seria possível a medida constritiva quando, preenchido o requisito do inciso III, estivesse presente também um dos requisitos dos incisos I e II”7. É possível, entretanto, que em determinadas situações a prisão seja decretada por um dos crimes permissivos deste tipo de custódia cautelar mais as situações dos outros dois incisos do art. 1º.
4. QUEM PODE SOLICITAR A DECRETAÇÃO O delegado de polícia que presidir o inquérito poderá dirigir-se ao juiz competente endereçandolhe representação fundamentada e instruída, em que sugira a decretação da prisão temporária, fazendo a demonstração da imprescindibilidade da medida extrema. O termo representação aqui empregado não se confunde, por exemplo, com a representação que deve ser feita pelo ofendido ou seu representante legal com vistas à instauração de inquérito e oferecimento de denúncia para instauração de ação penal que a tanto esteja condicionada: as ditas ações penais públicas condicionadas à representação. Não. Representação, aqui, nada mais é do que uma simples sugestão formulada pelo delegado, e a distinção que há entre os termos “representação” e “requerimento” é calcada no fato de que requerimento ao juiz só poderá fazer quem for parte interessada no feito e, no caso, o Ministério Público, titular da ação penal pública (condicionada ou incondicionada) é quem está legitimado a formular “requerimento” ao juiz visando a decretação da prisão temporária. Na hipótese de representação da autoridade policial — diz o § 1º do art. 2º da Lei n. 7.960/89 —, o juiz, antes de decidir, determinará a abertura de vista dos autos ao Ministério Público a fim de que se manifeste, concordando, ou não, com a representação.
5. QUEM PODE DECRETAR Somente o magistrado competente, conforme as regras do CPP e de organização judiciária, é que pode decretar prisão temporária. Não pode o juiz decretar prisão temporária por iniciativa própria, ex officio, sem a formal provocação dos interessados. Muito embora o § 2º do art. 282 do CPP permita a decretação de medidas cautelares ex officio, restringe tal possibilidade ao curso da ação penal, momento em que não tem aplicação o instituto da prisão temporária. Ademais, o caput do art. 282 remete sua aplicação às medidas cautelares previstas no Título IX,
Livro I, do CPP, e muito embora o art. 283, caput, faça referência à prisão temporária, não é correto entender esteja este tipo de prisão cautelar previsto no CPP. A previsão está na Lei n. 7.960/89. A decisão judicial deve ser prolatada dentro do prazo de vinte e quatro horas, contadas a partir do recebimento da representação ou do requerimento (§ 2º do art. 2º da Lei n. 7.960/89), e não há necessidade de oitiva prévia da parte contrária, como manda o § 4º do art. 282 em relação a outras medidas cautelares, pelas razões que acabamos de expor (a prisão temporária não está prevista e regulada no CPP). Para dar atendimento ao prazo fixado, determina a lei, em seu art. 5º, que em todas as comarcas e seções judiciárias haverá um plantão permanente de vinte e quatro horas do Poder Judiciário e do Ministério Público para apreciação dos pedidos de prisão temporária.
6. DECISÃO QUE APRECIA PEDIDO DE PRISÃO TEMPORÁRIA A obrigatoriedade de fundamentação das decisões judiciais decorre do que está disposto no art. 93, IX, da CF, onde é possível ler claramente que “todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade (...)”. Medida de exceção que é no Regime Democrático adotado na Constituição Federal vigente, a decisão que decretar a prisão temporária deve vir suficientemente fundamentada, não se prestando a tanto simples referências aos dizeres da lei ou o endosso e repetição cega e muda dos argumentos constantes da representação ou do requerimento, sem indicar, nos autos, de onde foram extraídos os fundamentos de sua convicção, autorizadores da medida extrema. A ausência de adequada fundamentação nulifica a decisão proferida ao arrepio do texto constitucional e autoriza a impetração de habeas corpus, visando pôr fim à ilegal restrição da liberdade. Se a decisão judicial for de indeferimento da prisão temporária, dela somente poderá recorrer o Ministério Público se for ele o autor do requerimento inacolhido. A autoridade policial não tem legitimidade para recorrer da decisão judicial que indefere sua representação (mera sugestão). Pode ocorrer, entretanto, que a autoridade policial venha a formular a representação e por ocasião de sua manifestação que antecede à decisão judicial o representante do Ministério Público endosse os argumentos naquela peça expostos e nesta sua manifestação requeira expressamente a decretação da temporária. Neste quadro, não sendo decretada a prisão, caberá o inconformismo ministerial. O recurso cabível, in casu, é o recurso em sentido estrito (art. 3º c/c o art. 581, V, ambos do CPP).
7. PROCEDIMENTO Chegando em mãos do juiz competente a representação formulada pelo delegado de polícia ou o requerimento da lavra do promotor de justiça, que deverá opinar previamente à decisão judicial na primeira hipótese (quando não for o autor da provocação), o juiz deverá decidir sobre a decretação em decisão fundamentada, no prazo de vinte e quatro horas. Decretada a prisão temporária, expedir-se-á mandado de prisão, em duas vias, uma das quais será entregue ao indiciado e servirá como nota de culpa (§ 4º do art. 2º). A prisão somente poderá ser executada depois da expedição de mandado judicial (§ 5º do art. 2º), até porque, conforme regula a Constituição Federal: “ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente” (art. 5º, LXI).
Efetuada a prisão, a autoridade policial informará o preso dos direitos previstos no art. 5º da CF (§ 2º do art. 2º), dentre eles: inciso LVIII: o civilmente identificado não será submetido a identificação criminal, salvo nas hipóteses previstas em lei; inciso LXII: a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada; inciso LXIII: o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado; inciso LXIV: o preso tem direito à identificação dos responsáveis por sua prisão ou por seu interrogatório policial. Em harmonia com o disposto no art. 84, caput, da Lei de Execução Penal, segundo o qual o preso provisório deve ficar separado do condenado por sentença transitada em julgado, dispõe o art. 3º da Lei n. 7.960/89 que os presos temporários deverão permanecer, obrigatoriamente, separados dos demais detentos. Esta regra determina, a rigor, que os presos temporários não podem permanecer em contato nem mesmo com outros presos cautelares: v.g., presos em flagrante (art. 301 do CPP); presos em razão da decretação de prisão preventiva (art. 311 do CPP). O objetivo da restrição é evitar que o preso temporário tenha contato com outros presos, definitivos ou cautelares, o que poderia atrapalhar as investigações. De ver, todavia, que não se trata de decretar sua incomunicabilidade, por ser esta uma medida já banida do direito brasileiro e constitucionalmente proibida. Desde o momento da decretação da prisão, durante o tempo que ela durar ou após seu vencimento, o juiz poderá, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou da Defesa, determinar que o preso lhe seja apresentado para prestar-lhe informações sobre as condições em que se deu sua prisão e permanência sob cárcere, ou para eventuais constatações que possa o magistrado pretender fazer, por eventualmente dispor de relatos a respeito de práticas violentas contra o preso. Pode ainda o magistrado, de ofício ou em razão de provocação, solicitar informações e esclarecimentos da autoridade policial a respeito da prisão e permanência do preso enquanto custodiado. Se necessário, poderá, ainda, determinar seja o preso submetido a exame de corpo de delito para o fim de demonstrar tenha sido vítima, ou não, de práticas violentas contra sua integridade corporal.
8. PRAZO DA PRISÃO 8.1. Generalidade dos casos Como indica o próprio nome da prisão cautelar de que estamos a tratar, há um tempo previamente delimitado para a duração da custódia. Este tempo será, em regra, e inicialmente, de cinco dias, podendo ser prorrogado por igual período em caso de extrema e comprovada necessidade. Portanto: 5 + 5. Dez, no máximo, para a generalidade dos crimes em que admitida. A prorrogação, contudo, não pode dar-se de forma automática, menos ainda ser determinada ou autorizada no inicial despacho de decretação. Para que possa ser validamente prorrogada será necessário que a autoridade policial que presidir o inquérito ou o Ministério Público formulem pedido expresso, que deve ser endereçado ao juiz competente antes do vencimento do prazo inicialmente fixado, em que se demonstre claramente a extrema e comprovada necessidade a que alude a parte final do art. 2º, caput, da Lei n. 7.960/89. Questão interessante é saber se, tendo a decretação decorrido de decisão proferida em requerimento
formulado pelo Ministério Público, pode o pedido de prorrogação ser feito pela autoridade policial e vice-versa. A resposta a tal indagação só pode ser positiva. Não há qualquer irregularidade em tal proceder, até porque no mais das vezes a autoridade policial terá melhores condições que o Ministério Público de dizer se a prorrogação é ou não necessária, por se encontrar diretamente à frente das investigações. Se o requerimento tiver sido formulado pelo Ministério Público e o pedido de prorrogação pela autoridade policial, sobre este deverá manifestar-se o Ministério Público antes da decisão judicial que irá apreciar o cabimento, ou não, da prorrogação solicitada.
8.2. Crimes hediondos e assemelhados Em se tratando de crimes hediondos, a prática da tortura, o tráfico ilícito de drogas e o terrorismo, assim referidos no art. 2º, § 4º, da Lei n. 8.072, de 25 de julho de 1990, o prazo inicial da prisão temporária será de trinta dias, prorrogável por igual período em caso de extrema e comprovada necessidade. A lei dos crimes hediondos se refere expressamente aos crimes de tortura; tráfico de drogas; terrorismo; homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e homicídio qualificado (art. 121, § 2º, I, II, III, IV e V); latrocínio (art. 157, § 3º, in fine); extorsão qualificada pela morte (art. 158, § 2º); extorsão mediante sequestro e na forma qualificada (art. 159, caput, e §§ lº, 2º e 3º); estupro (art. 213, caput e §§ 1º e 2º); estupro de vulnerável (art. 217-A, caput e §§ 1º, 2º, 3º e 4º); epidemia com resultado morte (art. 267, § 1º); falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais (art. 273, caput e § 1º, § 1º-A e § 1º-B, com a redação dada pela Lei n. 9.677, de 2-71998); o genocídio previsto nos arts. 1º, 2º e 3º da Lei n. 2.889, de 1º de outubro de 1956, tentado ou consumado.
8.3. Término da prisão temporária Por ser a prisão temporária delimitada no tempo — o que seu próprio nome indica —, vencido o prazo inicialmente fixado ou o máximo prorrogado, deve o preso ser colocado imediatamente em liberdade, caso não tenha sido decretada sua prisão preventiva. Não é necessário que o juiz expeça alvará de soltura, até porque a prisão, conforme a decisão judicial, será por prazo fixo. Pode acontecer, também, que, antes do término do prazo determinado para a prisão, as diligências pretendidas venham ser realizadas, não se justificando, por isso e a partir da colheita da prova ou completa identificação do investigado, a continuidade do encarceramento cautelar. Neste caso, mesmo não tendo sido cumpridos todos os dias inicialmente fixados, a desnecessidade da custódia autoriza seja o preso colocado novamente em liberdade.
8.4. Excesso de prazo na prisão temporária O art. 4º da Lei n. 8.072/90 acrescentou a alínea i ao art. 4º da Lei n. 4.898, de 9 de dezembro de 1965 (disciplina os atos que configuram abuso de autoridade e suas correspondentes sanções), com a seguinte redação: “Prolongar a execução de prisão temporária, de pena ou de medida de segurança, deixando de expedir em tempo oportuno ou de cumprir imediatamente ordem de liberdade”. Os atos que configuram abuso de autoridade sujeitam seu autor à sanção administrativa, civil e
penal, na forma do art. 6º da Lei n. 4.898/658.
9. A PRISÃO TEMPORÁRIA COMPORTA RELAXAMENTO OU LIBERDADE PROVISÓRIA? 9.1. Relaxamento Nos precisos termos do art. 5º, LXV, da CF, a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária. Qual autoridade judiciária? O juiz, desembargador ou ministro com competência para o caso. Sendo assim, por imperativo constitucional, não é incorreto falar em relaxamento da prisão temporária ilegal.
9.2. Liberdade provisória O inciso LXVI do art. 5º da CF dispõe que ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança. Tal instituto não se aplica às hipóteses de prisão temporária. Conforme tratamos em capítulos distintos deste livro, a liberdade provisória, com ou sem fiança, é instituto ligado à prisão em flagrante, e não guarda qualquer relação com a prisão temporária.
10. REAÇÃO DEFENSIVA À PRISÃO TEMPORÁRIA Em caso de decretação ou prorrogação abusiva da prisão temporária, entenda-se: fora das hipóteses autorizadoras; decretada ex officio ou em despacho sem fundamentação adequada ou desfundamentado; determinada por prazo acima do previsto etc., o remédio a ser utilizado será sempre o habeas corpus9, com pedido de liminar que vise obstar imediatamente a ilegalidade. Nada impede, entretanto, que a Defesa formule pedido de reconsideração ao juiz que a decretou, apontando os fundamentos pelos quais, sob sua ótica, a prisão não deveria ter sido determinada, ou não deva perdurar (v.g., quando já realizadas as diligências pretendidas com a prisão), podendo o juiz, após a oitiva do Ministério Público, eventualmente acolher o pedido e determinar a soltura do preso.
Prisão Temporária Quadro legal comparativo Como era
Como ficou
Lei n. 7.960, de 21 de dezembro de 1989 (sem alterações).
Lei n. 7.960, de 21 de dezembro de 1989 (sem alterações).
Regras Gerais Relacionadas com a Prisão Temporária
Art. 283. Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva. § 1º As medidas cautelares previstas neste Título não se aplicam à infração a que não for isolada, cumulativa ou alternativamente cominada pena privativa de liberdade. § 2º A prisão poderá ser efetuada em qualquer dia e a qualquer hora, respeitadas as restrições relativas à inviolabilidade do domicílio. Art. 289. Quando o acusado estiver no território nacional, fora da jurisdição do juiz processante, será deprecada a sua prisão, devendo constar da precatória o inteiro teor do mandado. § 1º Havendo urgência, o juiz poderá requisitar a prisão por qualquer meio de comunicação, do qual deverá constar o motivo da prisão, bem como o valor da fiança se arbitrada. § 2º A autoridade a quem se fizer a requisição tomará as precauções necessárias para averiguar a autenticidade da comunicação. § 3º O juiz processante deverá providenciar a remoção do preso no prazo máximo de 30 (trinta) dias, contados da efetivação da medida. Art. 299. A captura poderá ser requisitada, à vista de mandado judicial, por qualquer meio de comunicação, tomadas pela autoridade, a quem se fizer a requisição, as precauções necessárias para averiguar a autenticidade desta. Art. 300. As pessoas presas provisoriamente ficarão separadas das que já estiverem definitivamente condenadas, nos termos da lei de execução penal.
1 “A prisão temporária é uma prisão cautelar de natureza processual que restringe a liberdade de locomoção do indiciado por tempo determinado, a fim de possibilitar as investigações acerca de determinados crimes considerados graves” (STF, HC 102.974/SP, 2ª T., rel. Min. Ellen Gracie, j. 14-12-2010, DJe de 7-2-2011). 2 STF, RHC 92.873/SP, 2ª T., rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 12-8-2008, DJe 19-12-2008. 3 Ob. cit., p. 426. 4 STF, HC 83.439/RJ, 1ª T., rel. Min. Marco Aurélio, j. 14-10-2003, DJe de 7-11-2003. 5 Ob. cit., p. 426. 6 Processo penal constitucional, 5. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 335. 7 Ob. cit., p. 337. 8 Art. 6º O abuso de autoridade sujeitará o seu autor à sanção administrativa civil e penal. § 1º A sanção administrativa será aplicada de acordo com a gravidade do abuso cometido e consistirá em: a) advertência; b) repreensão; c) suspensão do cargo, função ou posto por prazo de cinco a cento e oitenta dias, com perda de vencimentos e vantagens; d) destituição de função; e) demissão; f) demissão, a bem do serviço público. § 2º A sanção civil, caso não seja possível fixar o valor do dano, consistirá no pagamento de uma indenização de quinhentos a dez mil cruzeiros. § 3º A sanção penal será aplicada de acordo com as regras dos artigos 42 a 56 do Código Penal e consistirá em: a) multa de cem a cinco mil cruzeiros; b) detenção por dez dias a seis meses;
c) perda do cargo e a inabilitação para o exercício de qualquer outra função pública por prazo até três anos. § 4º As penas previstas no parágrafo anterior poderão ser aplicadas autônoma ou cumulativamente. § 5º Quando o abuso for cometido por agente de autoridade policial, civil ou militar, de qualquer categoria, poderá ser cominada a pena autônoma ou acessória, de não poder o acusado exercer funções de natureza policial ou militar no município da culpa, por prazo de um a cinco anos. 9 Art. 5º, LXVIII, da CF; arts. 647 e 648 do CPP.
PRISÃO RESULTANTE DE PRONÚNCIAOU DE SENTENÇA CONDENATÓRIA RECORRÍVEL 1. INTRODUÇÃO Diz o art. 5º, LVII, da CF, que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. Quando se pensa na possibilidade de alguém ser preso antes de ter contra si condenação criminal definitiva, logo se percebe a celeuma jurídica, pois, à primeira vista, desde a vigência da atual Constituição Federal não mais seria possível a existência de prisões cautelares, porquanto ausente, em tais hipóteses, o trânsito em julgado de sentença condenatória. Esta forma de pensar seduziu muitos doutrinadores, mas nunca prevaleceu, até porque a mesma Constituição Federal trata expressamente da possibilidade de prisão cautelar, especialmente em alusão ao flagrante (art. 5º, LXI) e à possibilidade de liberdade provisória, com ou sem fiança (art. 5º, LXVI). Na doutrina e jurisprudência o debate sempre foi acalorado, com valiosos argumentos em favor das duas vertentes muito bem defendidas. O entendimento majoritário e adotado no STF1, ao qual nos filiamos, é no sentido de que o ordenamento constitucional não aboliu a possibilidade de prisões cautelares.
2. PRISÃO RESULTANTE DE PRONÚNCIA OU DE SENTENÇA CONDENATÓRIA RECORRÍVEL Proferida sentença no processo criminal, as partes poderão dela recorrer à superior instância enquanto não se verificar o trânsito em julgado, desde que sejam atendidos os pressupostos recursais. A prisão resultante de sentença condenatória recorrível é modalidade de prisão cautelar, porquanto ausente trânsito em julgado definitivo de sentença. A Lei n. 11.719, de 20 de junho de 2008, revogou expressamente o art. 594, e a Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011, por força de seu art. 4º, revogou os arts. 393 e 595, todos do CPP, relacionados com a modalidade de prisão de que ora se cuida. Diziam eles: Art. 393. São efeitos da sentença condenatória recorrível: I — ser o réu preso ou conservado na prisão, assim nas infrações inafiançáveis, como nas afiançáveis enquanto não prestar fiança; II — ser o nome do réu lançado no rol dos culpados. Art. 594. O réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, ou prestar fiança, salvo se for primário e de bons antecedentes, assim reconhecido na sentença condenatória, ou condenado por crime de que se livre solto. Art. 595. Se o réu condenado fugir depois de haver apelado, será declarada deserta a apelação. Não é caso de afirmar, todavia, que por ocasião da sentença o juiz não mais poderá determinar a prisão cautelar do condenado, e que por força de tal decisão deva ele aguardar preso o julgamento de
eventual recurso, até porque vigente o art. 387, parágrafo único, do CPP2. Há muito reclamadas na doutrina e tratadas na jurisprudência, estas mudanças atendem aos reclamos de se compatibilizar a regulamentação da matéria com o texto constitucional, e por aqui andou bem a reforma processual penal. Nos termos do revogado art. 594, a condenação, mesmo sem trânsito em julgado definitivo, determinava, como regra, a prisão do réu, salvo nas seguintes situações: 1ª) era cabível e o réu prestava fiança; 2ª) o réu era primário e de bons antecedentes; 3ª) o réu era condenado por crime de que se livrava solto. A fiança é instituto regulado no Capítulo VI, Título IX do Código de Processo Penal, arts. 322 e seguintes, tendo sofrido profunda e virtuosa reformulação com a Lei n. 12.403/2011, tema do qual nos ocuparemos em capítulo específico. A reincidência é matéria tratada no art. 63 do CP, segundo o qual: “verifica-se a reincidência quando o agente comete novo crime, depois de transitar em julgado a sentença que, no País ou no estrangeiro, o tenha condenado por crime anterior”. De ver, entretanto, que “para efeito de reincidência não prevalece a condenação anterior, se entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a 5 (cinco) anos, computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional, se não ocorrer revogação”, e não se consideram os crimes militares próprios e políticos” (art. 64, I e II, do CP). Ter bons antecedentes — afirma ANTONIO SCARANCE FERNANDES — “significa não ter condenações que, apesar de não gerarem reincidência, revelam propensão ao crime. Não é possível, em face do princípio constitucional de presunção de inocência, admitir como maus antecedentes fatos criminais que ainda não foram julgados ou, pior ainda, fatos em relação aos quais houve arquivamento do inquérito policial ou absolvição”3. A propósito, calha enfatizar que “ações penais ou inquéritos policiais em andamento, ou mesmo condenações ainda não transitadas em julgado, não podem ser considerados como maus antecedentes, má conduta social ou personalidade desajustada, sob pena de malferir o princípio constitucional da presunção de não culpabilidade”4. A reincidência e a presença de antecedentes desabonadores, tantas vezes mal avaliados e mais drasticamente ecoados na ação penal, determinavam invariavelmente a prisão cautelar do réu, que, salvo raras e valiosas exceções, tinha que se recolher preso para poder interpor recurso. As hipóteses em que o réu “se livrava solto”, também referidas no antigo art. 594 do CPP, estavam reguladas no art. 321, I e II, do CPP, mas o art. 321, caput, recebeu nova redação, e seus incisos I e II foram revogados expressamente pelo art. 4º da Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011, de maneira que não existem mais as ditas hipóteses em que o agente “se livra solto”, apesar de a letra isolada do art. 309, que deveria ter sido revogado, mas não foi, e do art. 304, § 1º, ainda conter referência à mesma situação, hoje sem regulamentação no Código de Ritos. Além do entrave ao duplo grau de jurisdição efetivo, se depois de interposto o recurso viesse o réu a fugir, seu desconformismo não era conhecido na Instância Superior, sendo julgado deserto, nos termos do art. 595 do CPP5, e isso levava ao trânsito em julgado definitivo da sentença condenatória, sem apreciação de seu clamor. Contra este estado de coisas, a Lei n. 11.719, de 20 de junho de 2008, mostrou-se instrumento
valioso, já que, entre outras alterações que impôs ao Código de Processo Penal, algumas acertadas, outras nem tanto, contribuiu bem ao revogar o art. 594 precitado, até porque, conforme decidiu o Plenário do STF, este dispositivo não fora recepcionado pela Constituição de 19886. E acertou ainda mais (o que era de esperar, é claro), pois reestruturou o art. 387 do CPP e, dentre outras coisas, a ele fez acrescer um parágrafo único, resultando disso que o juiz, ao proferir sentença condenatória, deverá decidir, “fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso, imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento da apelação que vier a ser interposta”. Destas alterações resultou que a partir da vigência da Lei n. 11.719/2008, por ocasião da sentença necessariamente deverá o juiz se pronunciar, de forma fundamentada, sobre a manutenção, ou não, do réu na prisão. Mas não é só. Poderá, na sentença condenatória, decretar a prisão cautelar do réu. Prisão para recorrer? A rigor não. O objetivo da prisão, neste caso, não é estabelecer entrave a eventual recurso, tampouco impor forçosamente a execução provisória da pena aplicada. Na verdade, por ocasião da sentença condenatória o juiz somente irá manter preso quem assim já se encontrar se persistirem os requisitos para a prisão preventiva, e, de igual maneira, só poderá decretar a prisão preventiva de quem respondeu ao processo em liberdade se estiverem presentes todos aqueles requisitos longamente analisados no capítulo em que tratamos da prisão preventiva. Conforme bem assinalou ANTONIO SCARANCE FERNANDES: “Se o acusado já se encontrava preso antes da sentença condenatória, não poderá apelar em liberdade, ainda que primário e com bons antecedentes, caso persistam os motivos ensejadores de sua custódia cautelar. Essa orientação, aceita pela doutrina e pela jurisprudência, não afronta a Constituição Federal, pois, se o acusado esteve preso até a sentença em face de necessidade cautelar, não haveria razão para que, justamente depois de condenado, viesse a ser libertado”7. Conclui-se, portanto, que a hipótese tratada no parágrafo único do art. 387 não cuida, a rigor, de prisão para recorrer, mas de decretação de prisão preventiva reclamada naquele momento e autorizada nos autos, como de resto poderia ser decretada em qualquer outro instante da instrução ou na fase de investigação policial, se satisfeitos os requisitos legais. É o que também ocorre por ocasião da decisão de pronúncia, nos processos de competência do Tribunal do Júri, onde, na forma do § 3º do art. 413 do CPP, naquele momento processual deverá o juiz decidir “motivadamente, no caso de manutenção, revogação ou substituição da prisão ou medida restritiva de liberdade anteriormente decretada e, tratando-se de acusado solto, sobre a necessidade da decretação da prisão ou imposição de quaisquer das medidas previstas no Título IX do Livro I deste Código”. Para que não reste dúvida, basta verificar que o novo art. 283, caput, do CPP enfatiza que ninguém poderá ser preso senão em flagrante ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, nestes casos, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva, deixando claro que não há mais qualquer possibilidade de se pensar em prisão resultante de sentença condenatória recorrível.
E há mais. Note-se que o parágrafo único do art. 387 diz que no momento da sentença condenatória o juiz deverá decidir sobre a imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, e o § 3º do art. 413 se reporta à prisão ou outra medida restritiva de liberdade. Mas que outra medida cautelar restritiva? Na verdade aqueles dispositivos já antecipavam situação que passou a ser tratada nos arts. 3198 e 3209 do CPP, onde a lei disponibiliza ao juiz a possibilidade de aplicar, isolada ou cumulativamente, medidas cautelares diversas da prisão, inclusive, mas não tão somente, como alternativas à prisão preventiva. Sim, são eventualmente alternativas à prisão preventiva, pois o art. 282, § 6º, do CPP dispõe que: “A prisão preventiva será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar”. Em razão da revogação dos arts. 393, 594 e 595, e da nova redação do art. 283, caput, não há mais, no CPP, qualquer autorização para que se possa falar em prisão cautelar resultante de sentença condenatória recorrível. E mais: eventual fuga não irá acarretar a deserção de recurso interposto.
3. ASPECTOS CONSTITUCIONAIS Nos precisos termos do art. 8º, item “2”, letra “h”, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), ratificada no Brasil pelo Decreto n. 678/92, toda pessoa condenada tem direito de recorrer da sentença para juiz ou tribunal superior. A garantia ao duplo grau de jurisdição é de envergadura constitucional, e não há como negar que o entrave decorrente da necessidade de se recolher preso para poder interpor recurso fere a Carta Magna. Esta modalidade de prisão fere, também, o princípio da igualdade das partes, já que nunca existiu entrave de proporção semelhante para que o Ministério Público ou o querelante possa interpor recurso. Fere, ainda, os princípios da presunção de inocência e da ampla defesa, na exata medida em que antecipa a execução da pena e impõe severa restrição ao exercício pleno da atividade defensória, conforme decidiu o Plenário do STF10. Como afirmou o Min. GILMAR MENDES, “não se pode conceber como compatível com o princípio constitucional da presunção de não culpabilidade qualquer antecipação de cumprimento da pena. Aplicação de sanção antecipada não se compadece com a ausência de decisão condenatória transitada em julgado”. E acrescentou: “Parece evidente, outrossim, que uma execução antecipada em matéria penal configuraria grave atentado contra a própria ideia de dignidade humana, enquadrada como postulado essencial da ordem constitucional (CF, art. 1º, III)”11. De ver, entretanto, que estando presentes os requisitos da prisão preventiva, por isso decretada, não há falar em execução provisória ilegal, nas hipóteses em que se fizer cabível.
4. LEGISLAÇÃO ESPECIAL Na legislação extravagante também temos regras semelhantes àquela do revogado art. 594. Veja-se, a exemplo, o art. 31 da Lei n. 7.492, de 16 de junho de 1986, que define crimes contra o sistema financeiro nacional (Lei do Colarinho-Branco), verbis:
Art. 31. Nos crimes previstos nesta Lei e punidos com pena de reclusão, o réu não poderá prestar fiança, nem apelar antes de ser recolhido à prisão, ainda que primário e de bons antecedentes, se estiver configurada situação que autoriza a prisão preventiva. Este dispositivo, muitas vezes mal interpretado, na verdade sempre condicionou a decretação da prisão cautelar à satisfação dos requisitos necessários para a prisão preventiva. Todas as situações nele tratadas remetem à condição expressamente destacada na parte final do dispositivo. Apesar da redação diversa até certo ponto, no fundo a regra é a mesma que hoje encontramos no parágrafo único do art. 387 do CPP: só poderá haver prisão cautelar no momento da sentença se estiverem presentes os requisitos da prisão preventiva12. Nenhuma mácula, portanto. Em sentido diverso, dispõe o art. 3º da Lei n. 9.613, de 3 de março de 1998 (Lei de Lavagem de Capitais): Art. 3º Os crimes disciplinados nesta Lei são insuscetíveis de fiança e liberdade provisória e, em caso de sentença condenatória, o juiz decidirá fundamentadamente se o réu poderá apelar em liberdade. Observada a letra da lei, por aqui, não há ressalva ou referência expressa à necessidade de verificação dos requisitos da prisão preventiva, ficando a critério do juiz, no caso de proferir sentença condenatória, fazer consignar, com adequada fundamentação, se poderá ou não o réu recorrer em liberdade. Todavia, quando diz o art. 3º que o juiz deve decidir de forma fundamentada a respeito da prisão, da leitura constitucional já construída neste capítulo retiramos conclusão no sentido de que a fundamentação a que se refere, e que deve constar da decisão, é aquela autorizadora da prisão preventiva, pois a obrigatoriedade geral, que impõe o dever de fundamentação de todas as decisões judiciais, está expressa no art. 93, IX, da CF. Já o art. 59 da Lei n. 11.343, de 23 de agosto de 2006 (Lei de Drogas), tem regra mais severa. Diz ele: Art. 59. Nos crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1º, e 34 a 37 desta Lei, o réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, salvo se for primário e de bons antecedentes, assim reconhecido na sentença condenatória. Este dispositivo, literalmente interpretado, tem significado idêntico ao do art. 594 do CPP, já revogado, segundo o qual o condenado por qualquer dos crimes que refere deverá se recolher preso para poder interpor recurso de apelação, salvo se primário e de bons antecedentes. Voltamos, portanto, àquelas reflexões já passadas linhas atrás. É dizer: pode alguém, no ordenamento jurídico nacional, ter seu direito ao duplo grau de jurisdição, à ampla defesa, ao contraditório pleno etc., condicionado na forma do art. 59 da Lei de Drogas? A resposta já foi dada, inclusive em julgamento proferido pelo Plenário da Suprema Corte quando tratou do art. 594 do CPP13, cujas reflexões calçam feito luva na análise do art. 59 da Lei de Drogas sob o enfoque de sua inconstitucionalidade. Há que se concluir, portanto, que o princípio da dignidade da pessoa humana e aqueles outros também já invocados determinam como somente cabível a manutenção ou decretação de prisão cautelar no momento da sentença se estiverem presentes os requisitos da prisão preventiva.
Prisão Resultante de Pronúncia e de Sentença Condenatória Recorrível Quadro comparativo entre artigos do CPP, antes e depois da Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011 Como era
Como ficou
Art. 387. (...) ao proferir sentença condenatória: Parágrafo único. O juiz decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso, imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento da apelação que vier a ser interposta.
Não sofreu alteração. Art. 387. (...) ao proferir sentença condenatória: Parágrafo único. O juiz decidirá, fundamentadamente, sobre a manu- tenção ou, se for o caso, imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento da apelação que vier a ser interposta.
Art. 393. São efeitos da sentença condenatória recorrível: I — ser o réu preso ou conservado na prisão, assim nas infrações inafiançáveis, como nas afiançáveis enquanto não prestar fiança; II — ser o nome do réu lançado no rol dos culpados.
Dispositivo expressamente revogado pelo art. 4º da Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011.
Art. 408. Se o juiz se convencer da existência do crime e de indícios de que o réu seja o seu autor, pronunciá-lo-á, dando os motivos do seu convencimento. § 1º (...) § 2º Se o réu for primário e de bons antecedentes, poderá o juiz deixar de decretarlhe a prisão ou revogá-la, caso já se encontre preso.
Art. 413. O juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação. § 1º (...) § 2º (...) § 3º O juiz decidirá, motivadamente, no caso de manutenção, revogação ou substituição da prisão ou medida restritiva de liberdade anteriormente decretada e, tratando-se de acusado solto, sobre a necessidade da decretação da prisão ou imposição de quaisquer das medidas previstas no Título IX do Livro I deste Código.
Art. 594. O réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, ou prestar fiança, salvo se for primário e de bons antecedentes, assim reconhecido na sentença condenatória, ou condenado por crime de que se livre solto (artigo com a redação da Lei n. 5.941/1973).
Dispositivo expressamente revogado pela Lei n. 11.719, de 20 de junho de 2008.
Art. 595. Se o réu condenado fugir depois de haver apelado, será declarada deserta a apelação.
Dispositivo expressamente revogado pelo art. 4º da Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011.
Medidas Cautelares Diversas da Prisão
Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão: I — comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades; II — proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações; III — proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante; IV — proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução; V — recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos; VI — suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais; VII — internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração; VIII — fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial; IX — monitoração eletrônica. § 1º (Revogado). § 2º (Revogado). § 3º (Revogado). § 4º A fiança será aplicada de acordo com as disposições do Capítulo VI deste Título, podendo ser cumulada com outras medidas cautelares. Art. 320. A proibição de ausentar-se do País será comunicada pelo juiz às autoridades encarregadas de fiscalizar as saídas do território nacional, intimando-se o indiciado ou acusado para entregar o passaporte, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas. Art. 321. Ausentes os requisitos que autorizam a decretação da prisão preventiva, o juiz deverá conceder liberdade provisória, impondo, se for o caso, as medidas cautelares previstas no art. 319 deste Código e observados os critérios constantes do art. 282 deste Código. I — (revogado). II — (revogado).
1 STF, HC 89.501/GO, 2ª T., rel. Min. Celso de Mello, DJU de 16-3-2007. No mesmo sentido: “A prisão ad cautelam, fulcrada na lei, não entra em choque com o disposto no art. 5º, inciso LVIII, da Carta Magna” (STJ, RHC 6.497/SP, 5ª T., rel. Min. Felix Fischer, j. 5-8-1997, DJ de 8-9-1997, p. 42.530). 2 O parágrafo único do art. 387 foi acrescentado pela Lei n. 11.719, de 20 de junho de 2008, que também revogou o art. 594 do CPP, que assim dispunha: “O réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, ou prestar fiança, salvo se for primário e de bons antecedentes, assim reconhecido na sentença condenatória, ou condenado por crime de que se livre solto” (artigo com a redação da Lei n. 5.941/1973). 3 Processo penal constitucional, 5. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 341. 4 STJ, HC 122.065/MS, 5ª T., rel. Min. Jorge Mussi, j. 23-3-2010, DJe de 12-4-2010. “A existência de inquéritos e ações penais em andamento não pode constituir fundamento para a valoração negativa dos antecedentes, da conduta social ou da
personalidade do agente, em respeito ao princípio constitucional da presunção de não culpabilidade” (STJ, HC 151.164/MS, 5ª T., rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 23-2-2010, DJe de 22-3-2010). “Inquéritos policiais e ações penais em andamento não podem ser utilizados como fundamento para majoração da pena-base, a título de maus antecedentes, má conduta social e personalidade voltada para o crime” (STJ, HC 84.586/DF, 5ª T., rel. Min. Laurita Vaz, j. 3-12-2009, DJe de 8-2-2010). No mesmo sentido: STJ, HC 144.728/DF, 5ª T., rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 3-12-2009, DJe de 22-2-2010. 5 Revogado expressamente pelo art. 4º da Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011, verbis: Art. 595 do CPP: “Se o réu condenado fugir depois de haver apelado, será declarada deserta a apelação”. 6 STF, RHC 83.810/RJ, Pleno, rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe de 23-10-2009. Esta decisão contrariou o entendimento anteriormente sedimentado naquela Augusta Corte, conforme segue: “O princípio ínsito no art. 5º, LVII, da CF, não impede a prisão antes do trânsito em julgado da decisão condenatória, mas apenas que o nome do réu seja desde logo lançado no rol dos culpados” (STF, HC 75.077-0/SP, 2ª T., rel. Min. Maurício Correâ, j. 31-3-1998, DJU de 15-5-1998, RT 756/489). “É admissível a ordem de prisão de réu condenado, ainda que pendente de recurso a decisão condenatória, não havendo falar em afronta ao princípio da presunção de inocência, previsto no art. 5º, LVII, da CF” (STF, HC 76.510-0-SP, 2ª T., rel. Min. Carlos Velloso, j. 31-3-1998, DJU de 15-5-1998, RT 755/552). 7 Ob. cit., p. 343. 8 Art. 319 do CPP (com a redação da Lei n. 12.403, de 4-5-2011): “São medidas cautelares diversas da prisão: I — comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades; II — proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações; III — proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante; IV — proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução; V — recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos; VI — suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais; VII — internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração; VIII — fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial; IX — monitoração eletrônica”. 9 “Art. 320. A proibição de ausentar-se do País será comunicada pelo juiz às autoridades encarregadas de fiscalizar as saídas do território nacional, intimando-se o indiciado ou acusado para entregar o passaporte, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas.” 10 “O recolhimento do condenado à prisão não pode ser exigido como requisito para o conhecimento do recurso de apelação, sob pena de violação aos direitos de ampla defesa e à igualdade entre as partes no processo” (STF, RHC 83.810/RJ, Pleno, rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe de 23-10-2009). 11 STF, HC 103.986/SP, 2ª T., rel. Min. Gilmar Mendes, j. 8-2-2011. 12 “Tendo o réu respondido solto ao processo não se justifica seu recolhimento à prisão como condição para apelar, se não estiverem presentes as estritas hipóteses do art. 312 do CPP” (TRF, 4ª Região, Ap. Crim. 002.04.01.004720-4/PR, 8ª T., rel. Des. Federal Amir José Finocchiaro Sarti, j. 25-3-2002, DJU de 5-6-2002, RT 803/719). 13 “O recolhimento do condenado à prisão não pode ser exigido como requisito para o conhecimento do recurso de apelação, sob pena de violação aos direitos de ampla defesa e à igualdade entre as partes no processo” (STF, RHC 83.810/RJ, Pleno, rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe de 23-10-2009).
Da Liberdade RELAXAMENTO DA PRISÃO 1. INTRODUÇÃO O relaxamento da prisão é a primeira forma de restituição da liberdade ao preso cautelar que escolhemos para tratar, na ordem de disposição dos capítulos que seguem daqui por diante, relacionados com a liberdade antes de sentença penal irrecorrível. A razão da escolha é simples: efetivada a prisão cautelar, na prática o que se deve observar primeiramente, com vistas à restituição da liberdade, é se a prisão comporta relaxamento. Sendo caso, há que se providenciar o pedido e endereçá-lo ao juiz competente. Não sendo caso de relaxamento, na sequência o correto é verificar se a hipótese admite liberdade provisória mediante pagamento de fiança. Incabível a fiança, aí sim a liberdade provisória sem fiança terá seu momento, muito embora na prática estas duas últimas opções invariavelmente se invertam, porquanto mais vantajoso para o preso em flagrante receber liberdade provisória sem ter de prestar fiança. A necessidade de relaxamento da prisão, conforme veremos, pode decorrer do próprio fato imputado; da forma como foram praticados determinados atos subsequentes ou da ausência deles, ou, ainda, por força do tempo decorrido desde a prisão-captura até a postulação liberatória.
2. RELAXAMENTO DA PRISÃO Diz o art. 5º, LXV, da CF, que “a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária”, regra expressamente adotada no art. 310, I, do CPP. Disso se extrai e é correto afirmar que somente a prisão ilegal será relaxada, e segundo pensamos o instituto não se aplica apenas às hipóteses de prisão em flagrante. Bem, mas que tipo de prisão ilegal pode ser relaxada? A rigor, toda e qualquer prisão ilegal, como aponta a regra constitucional anteriormente transcrita. Decorre do texto constitucional, ainda, que somente a autoridade judiciária é que poderá determinar o relaxamento da prisão, entendendo-se como tal o juiz, o desembargador ou o ministro com competência para o caso. Consequência do relaxamento é a imediata restituição da liberdade ao preso cautelar. Porque ilegal a prisão, para seu relaxamento não se impõe ao agente a necessidade de atender qualquer condição prévia ou de permanência em liberdade. Não seria correto condicionar a soltura de quem está ilegalmente preso. Não se trata de liberdade exposta à possibilidade de vinculação1, mas plena, e bem por isso o agente somente poderá voltar a sofrer algum tipo de restrição em seu direito de ir e vir em razão da prática de fato superveniente que legitime, por exemplo, sua prisão temporária ou preventiva, ou, pelo mesmo fato passado, se ocorrer o trânsito em julgado definitivo de sentença penal condenatória. Dada a relação existente, trataremos a seguir de algumas hipóteses em que se tem cogitado e outras
vezes reconhecido a possibilidade de relaxamento de prisão temporária (Lei n. 7.960/89), prisão em flagrante (arts. 301 a 309 do CPP) e prisão preventiva (arts. 311 a 316 do CPP).
3. PRISÃO TEMPORÁRIA A prisão temporária é modalidade de prisão cautelar pré-processual regulada na Lei n. 7.960, de 21 de dezembro de 1989, conforme tratamos de detalhar em capítulo específico. Nos precisos termos do art. 1º da Lei n. 7.960/89, caberá prisão temporária: “I — quando imprescindível para as investigações do inquérito policial; II — quando o indicado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade; III — quando houver fundadas razões, de acordo com qualquer prova admitida na legislação penal, de autoria ou participação do indiciado nos seguintes crimes: a) homicídio doloso (art. 121, caput, e seu § 2º); b) sequestro ou cárcere privado (art. 148, caput, e seus §§ 1º e 2º); c) roubo (art. 157, caput, e seus §§ 1º, 2º e 3º); d) extorsão (art. 158, caput, e seus §§ 1º e 2º); e) extorsão mediante sequestro (art. 159, caput, e seus §§ 1º, 2º e 3º); f) estupro (art. 213, caput, e §§ 1º e 2º); g) epidemia com resultado de morte (art. 267, § 1º); h) envenenamento de água potável ou substância alimentícia ou medicinal qualificado pela morte (art. 270, caput, combinado com art. 285); i) quadrilha ou bando (art. 288), todos do Código Penal; j) genocídio (arts. 1º, 2º e 3º da Lei n. 2.889, de 1º de outubro de 1956), em qualquer de suas formas típicas; k) tráfico de drogas (art. 33 da Lei n. 11.343, de 23 de agosto de 2006); l) crimes contra o sistema financeiro (Lei n. 7.492, de 16 de junho de 1986)”. Por força do que dispõe o art. 2º, § 4º, da Lei n. 8.072/90, também é cabível a decretação de prisão temporária em relação aos crimes hediondos e assemelhados a que se referem os arts. 1º e 2º da mesma Lei, previsões que contemplam outros delitos não relacionados na Lei n. 7.960/89, tais como: tortura; terrorismo; falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais (art. 273, caput e § 1º, § 1º-A e § 1º-B, do CP) e crime de genocídio previsto nos arts. 1º, 2º e 3º da Lei n. 2.889, de 1º de outubro de 1956, tentado ou consumado. Imaginemos hipótese versando sobre determinada investigação em que se busque apurar vários crimes de furto simples e o averiguado não tenha residência fixa e não forneça elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade. Caberá prisão temporária? Óbvio que não. O crime de furto não está listado no inciso III do art. 1º da Lei n. 7.960/89. Se ainda assim for decretada a prisão temporária restará evidenciado odioso constrangimento ilegal, justificador do relaxamento da prisão. De igual maneira, haverá ilegalidade se a prisão for decretada ex officio ou por autoridade judiciária incompetente, ou, ainda que competente, em atendimento a pedido formulado pelo ofendido, que para tanto não dispõe de legitimidade. Também comporta relaxamento a prisão temporária que não esteja alicerçada em decisão judicial fundamentada, à luz do disposto no art. 93, IX, da CF. Ainda que convenientemente fundamentada, também estará exposta a relaxamento a prisão que for decretada por prazo superior ao permitido: 5 (cinco) dias para a generalidade dos casos, ou 30 (trinta) dias para hediondos e assemelhados, e bem assim a decisão que determinar a prorrogação da prisão sem observância às limitações temporais impostas pelo art. 2º, caput, da Lei n. 7.960/89, e no art. 2º, § 4º, da Lei n. 8.072, de 25 de julho de 1990 (Lei dos Crimes Hediondos). Se a prisão temporária é ilegal, deve ser imediatamente relaxada pela autoridade judiciária,
conforme determina o art. 5º, LXV, da CF.
4. PRISÃO EM FLAGRANTE A prisão em flagrante é modalidade de prisão cautelar excepcionada pela Constituição Federal, pois segundo o art. 5º, LXI, da CF2, ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente. Embora não se exija a prévia formalização de uma ordem de prisão com expedição de mandado, uma vez realizada a prisão em flagrante, é necessária, para a validade e legalização do ato, sua formalização com a lavratura do respectivo auto, impondo-se para esse mister estrita observância das regras aplicáveis. Enquanto nas demais hipóteses de prisão cautelar a captura do agente só poderá ocorrer após a expedição de ordem judicial, no caso de flagrante a situação se inverte: primeiro prende-se, depois documenta-se a prisão. Disso decorre a necessidade de estrita observância aos rituais da lei.
4.1. Necessidade de fato típico Pressuposto indispensável para que se verifique a prisão em flagrante é a prática de um delito, expressão igualmente utilizada no art. 5º, LXI, da CF e no art. 302 do CPP, que também se refere à prática de “infração penal”. Entenda-se: crime ou contravenção. É possível, em tese, a prisão em flagrante em razão da prática de delito doloso ou culposo. Se a conduta imputada não estiver capitulada como delito no ordenamento jurídico brasileiro a prisão será ilegal, impondo-se seu relaxamento. É o que ocorrerá, por exemplo, se alguém vier a ser preso em flagrante pela prática de incesto. Embora imoral, a relação incestuosa não configura ilícito penal, se levada a efeito entre pessoas maiores e capazes. A autolesão e a destruição total ou parcial, de coisa própria, também não configuram delito, salvo nas hipóteses do art. 171, § 2º, V, do CP. O consumo pretérito de droga não se presta à tipificação de ilícito penal. Para a legalidade do ato flagrancial é indispensável que se verifique em face do cometimento de delito.
4.2. Nem todo fato típico autoriza prisão em flagrante Não basta, entretanto, tenha o agente praticado um delito para que sua prisão em flagrante seja legítima. É possível, em casos determinados, que, mesmo diante de situação de flagrante, se ocorrer a prisão, esta será ilegal e, portanto, comportará relaxamento. A propósito deste tema, em se tratando da conduta prevista no art. 28 da Lei de Drogas — Lei n. 11.343, de 23 de agosto de 2006 (caput: posse de droga para consumo pessoal; § 1º: semear, cultivar ou colher plantas tóxicas para consumo pessoal), não se imporá prisão em flagrante, devendo o autor do fato ser imediatamente encaminhado ao juízo competente ou, na falta deste, assumir o compromisso de a ele comparecer, lavrando-se termo circunstanciado e providenciando-se as requisições dos exames e perícias necessários. Nas infrações penais da competência dos Juizados Especiais Criminais a imposição de flagrante
também sofre restrições, pois, conforme dispõe o parágrafo único do art. 69 da Lei n. 9.099, de 26 de setembro de 1995: “Ao autor do fato que, após a lavratura do termo, for imediatamente encaminhado ao juizado ou assumir o compromisso de a ele comparecer, não se imporá prisão em flagrante, nem se exigirá fiança”. Não se imporá prisão em flagrante, ainda, em relação à prática de infração penal a que não for isolada, cumulativa ou alternativamente cominada pena privativa de liberdade, conforme determina o § 1º do art. 283 do CPP. Há ainda outras exceções à regra de que qualquer pessoa que se encontre em situação de flagrante deva ser submetida à prisão cautelar de que agora se cuida. Nesse sentido, não podem ser presos em flagrante delito: 1º) em razão da inimputabilidade: os menores de 18 anos, sujeitos às normas da legislação especial (art. 228 da CF; art. 27 do CP). Entenda-se, sujeitos às regras do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n. 8.069, de 13-7-1990); 2º) em razão do cargo que ocupa: o Presidente da República (art. 86, § 3º, da CF)3; 3º) em decorrência de tratados e convenções: os diplomatas estrangeiros (art. 1º, I, do CPP); 4º) em decorrência de pronto e integral socorro prestado à vítima: ao condutor de veículo, nos casos de acidente de trânsito de que resulte vítima (art. 301 da Lei n. 9.503, de 23-9-1997 — Código de Trânsito Brasileiro)4: 5º) em razão da ausência de condição de procedibilidade: o autor de delito de ação penal pública condicionada à representação do ofendido ou requisição do Ministro da Justiça (art. 24 do CPP; art. 129, I, da CF), sem a representação do primeiro e a requisição do segundo, bem como o autor de infração penal sujeita a ação penal privada exclusiva (arts. 19 e 38 do CPP), sem a manifestação positiva de vontade do ofendido ou seu representante legal, sendo caso. Há que se considerar, ainda, que, levando em conta a relevância dos cargos que ocupam e funções que exercem, somente poderão ser presos em flagrante quando a hipótese tratar de crime inafiançável: 1º) os Membros do Ministério Público (art. 40, III, da Lei n. 8.625, de 12-2-1993 — LONMP)5; 2º) os magistrados (art. 33, II, da Lei Complementar n. 35, de 14-3-1979 — LOMN)6; 3º) os advogados (art. 7º, § 3º, da Lei n. 8.906, de 4-7-1994)7; 4º) os deputados estatuais (art. 27, § 1º, da CF)8; 5º) os membros do Congresso Nacional — senadores e deputados federais, desde a expedição do diploma, devendo o agente ser encaminhado à respectiva Casa Legislativa, que decidirá sobre a prisão pelo voto da maioria absoluta de seus membros (art. 53, §§ 2º e 8º, da CF)9. Não sendo observadas estas restrições, a prisão em flagrante que se levar a efeito será ilegal e, por isso, deverá ser imediatamente relaxada pela autoridade judiciária competente, conforme determina o art. 5º, LXV, da CF.
4.3. Necessidade de situação que legitime flagrante Não basta; não é suficiente para que se afirme a legalidade da prisão em flagrante tenha ela ocorrido em face da prática de um fato típico e com estrita observância às restrições tratadas no item anterior. É preciso mais. É indispensável que o agente tenha sido capturado em uma das situações previstas no art. 302 do
CPP, segundo o qual, considera-se em flagrante delito quem: “I — está cometendo a infração penal; II — acaba de cometê-la; III — é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração; IV — é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração”. Tendo em consideração a situação em que se encontrar o agente em relação a determinado delito, temos a seguinte classificação: 1º) flagrante em sentido próprio (também chamado de flagrante propriamente dito; real; verdadeiro ou perfeito); 2º) flagrante impróprio (também chamado de quase flagrante; irreal ou imperfeito); e 3º) flagrante presumido (também chamado flagrante ficto; fictício ou assimilado). “A inexistência de elementos que indiquem a ocorrência de qualquer das hipóteses do art. 302 do CPP impõe o relaxamento da prisão em flagrante”10. Já analisamos, no capítulo específico, todas as implicações de cada uma destas modalidades de flagrante, e, para evitar o enfaro da repetição, sugerimos consulta àquilo que já fora dito. Pois bem. É preciso, então, para a legalidade da prisão em flagrante, tenha ocorrido a prática de um delito; tenham sido observadas as restrições anteriormente apontadas, e que o agente se encontre em uma das situações de flagrante apontadas no art. 302 do CPP. Identificada violação a qualquer destas regras, o flagrante será ilegal e, portanto, deverá ser relaxada a prisão.
4.3.1. Flagrante preparado ou provocado Se há induzimento à prática de determinada conduta para que se dê a prisão em flagrante, a hipótese é de crime impossível por obra do agente provocador, sendo insubsistente o flagrante, matéria, aliás, já sumulada no STF, in verbis: “Súmula 145. Não há crime quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação”. Nesse sentido: “Tendo policiais simulado serem usuários de entorpecente e, mostrando-se pretensamente interessados na compra da droga, induzido pessoa a buscá-la para prendê-la em seu retorno, é de se ter considerada a conduta de vender como de consumação impossível, absolvendo-se o acusado”11. “Haverá flagrante preparado ou provocado se durante investigação policial o réu é induzido a adquirir substância entorpecente de que não dispunha, não guardava, nem tinha em depósito, não podendo, assim, ser condenado por tráfico nem na conduta ‘trazer consigo’”12. De ver, entretanto, que “a conduta do policial que se faz passar por um viciado para adquirir entorpecente do traficante, não caracteriza o flagrante preparado, pelo simples fato de que, em tal hipótese, o infrator não está sendo induzido ao crime, mas apenas renovando um ato que pratica habitualmente e fica então patenteado. Na realidade o que existe é um simples ardil utilizado pela polícia, não só para ensejar a apreensão do entorpecente, como também para evidenciar a prática do comércio ilícito, já caracterizado com a guarda da droga destinada a consumo de terceiros, que é de caráter permanente”13. No mesmo sentido: “Se o agente trazia consigo a substância entorpecente quando ocorreu a prisão, não há que se falar em flagrante preparado, uma vez que já se encontrava em estado de flagrância. Esta posse da droga basta para a tipificação do tráfico”14.
“Não caracteriza flagrante preparado, e sim flagrante esperado, o fato de a Polícia, tendo conhecimento prévio de que o delito estava prestes a ser cometido, surpreende o agente na prática da ação delitiva”15.
4.3.2. Flagrante forjado No flagrante forjado os policiais ou o particular criam, fabricam provas de um delito inexistente, com o objetivo de vincular e responsabilizar determinada pessoa a um ilícito penal que não cometeu16, e por isso não há crime que se possa imputar à pessoa presa em flagrante, daí por que insubsistente a restrição que decorrer de prova forjada, ilicitamente fabricada, impondo-se o relaxamento imediato da prisão que deste artifício ilícito decorrer. “Não há que se confundir flagrante forjado com esperado, em que a polícia tão somente espera a prática da infração, sem que haja instigação e tampouco a preparação do ato, mas apenas o exercício de vigilância na conduta do agente criminoso”17.
4.4. Lavratura do auto de prisão em flagrante Como já anotamos, após a prisão-captura deverá ocorrer sua formalização, o que é feito com a lavratura do auto de prisão em flagrante. Preliminarmente à lavratura do auto, o preso deverá ser informado a respeito de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado18, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado (art. 5º, LXIII, da CF). Tem também o preso direito à identificação dos responsáveis por sua prisão e por seu interrogatório policial (art. 5º, LXIV, da CF). Lembre-se, por oportuno, que o civilmente identificado não será submetido à identificação criminal, salvo nas hipóteses excepcionadas em lei19 (art. 5º, LVIII, da CF). O art. 15 do CPP diz que se o conduzido for pessoa menor de 21 anos (e maior de 18, é claro), serlhe-á nomeado curador especial pela autoridade policial. Neste particular, desde a vigência do Código Civil atual20, a pessoa maior de 18 (dezoito) anos é considerada absolutamente capaz para todos os atos da vida civil, inclusive para prestar depoimento em investigação contra si instaurada, o que afasta a necessidade de atendimento à regra do art. 15 do CPP. Ademais, o art. 194 do CPP, que dispunha sobre a necessidade de nomeação de curador especial ao réu menor quando de seu interrogatório em juízo, foi revogado pela Lei n. 10.792/2003. Como se vê, a ausência de nomeação de curador especial ao menor de 21 anos e maior de 18 não é causa de relaxamento do flagrante. Observadas estas considerações preliminares, nos precisos termos do art. 304 do CPP, apresentado o preso à autoridade competente, ouvirá esta o condutor e colherá, desde logo, sua assinatura, entregando a este cópia do termo e recibo de entrega do preso. Em seguida, procederá à oitiva das testemunhas que o acompanharem e ao interrogatório do acusado sobre a imputação que lhe é feita, colhendo, após cada oitiva suas respectivas assinaturas, lavrando, a autoridade, afinal, o auto. A falta de testemunhas da infração não impedirá o auto de prisão em flagrante; mas, nesse caso, com o condutor, deverão assiná-lo pelo menos duas pessoas que hajam testemunhado a apresentação do preso à autoridade (§ 2º do art. 304). “Quando o acusado se recusar a assinar21, não souber ou não puder fazê-lo, o auto de prisão em
flagrante será assinado por duas testemunhas, que tenham ouvido sua leitura na presença deste” (§ 3º do art. 304). Tais regras devem ser observadas à risca, sob pena de irregularidade insanável na formalização da custódia, causa eficiente de relaxamento da prisão22. A questão foi bem analisada por EDILSON MOUGENOT BONFIM, que assim se posicionou a respeito da matéria: “O auto é peça formal, que tem por função documentar a prisão em flagrante. Deve a autoridade cingir-se ao procedimento traçado em lei, como garantia do indivíduo contra qualquer coação ilegal a sua liberdade. Descumpridas as formalidades legais, será nulo o auto, cabendo ao juiz relaxar a prisão nele fundada, o que significa a soltura imediata do preso. O vício, no entanto, não tem o condão de anular o processo, mas apenas o de invalidar a prisão que nele constar, tornando mera peça informativa o respectivo auto”23. A demora24 ou ausência de comunicação da prisão à família25 ou à pessoa indicada pelo preso não acarreta o relaxamento do flagrante26. A ausência de advogado no momento da formalização da prisão também não implica nulidade do auto27. Conforme já decidiu o STF: “A documentação do flagrante prescinde da presença do defensor técnico do conduzido, sendo suficiente a lembrança, pela autoridade policial, dos direitos constitucionais do preso de ser assistido, comunicando-se com a família e com profissional da advocacia, e de permanecer calado”28. “A deficiência de fundamentação na classificação de infração penal realizada pela autoridade policial não gera a nulidade de auto de prisão em flagrante, visto que não diz respeito à documentação da captura, senão ao eventual cabimento da contracautela da liberdade provisória mediante fiança”29.
4.5. Prazo para a lavratura do auto A formalização da prisão em flagrante deve seguir-se imediatamente à apresentação do conduzido, que deverá ocorrer antes de vencido o prazo de vinte e quatro horas, contado da prisão-captura (§ 1º do art. 306 do CPP). Conforme já decidiu o STF, “o atraso indevido na sua lavratura redunda na ilegitimidade da prisão”30. Em algumas situações específicas, inclusive por força de distâncias geográficas, e até por força da situação que é tratada no art. 308 do CPP, poderá ocorrer que a apresentação do preso demande algumas horas para se realizar, o que é compreensível31.
4.6. Autoridade competente Autoridade competente para a lavratura do auto é, em regra, o delegado de polícia no exercício de polícia judiciária na circunscrição32. Nos precisos termos do art. 4º do CPP, a polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e respectiva autoria33. “Não exercendo a autoridade policial jurisdição, a lavratura do auto de prisão em flagrante em comarca diversa daquela em que foi efetuada a captura não o nulifica”34. “Nos termos do art. 307 do CPP, a autoridade policial que comandou a diligência e capturou os réus pode presidir a lavratura do auto de prisão em flagrante”35.
Competente para a lavratura do auto pode ser: 1º) a autoridade do local onde o delito foi praticado; 2º) a autoridade do local onde ocorreu a prisão-captura; 3º) a autoridade da localidade mais próxima do local onde ocorreu a captura; 4º) a autoridade que tenha presenciado a infração; 5º) a autoridade contra quem se tenha praticado a infração, no exercício de suas funções, estando ela presente no momento do ilícito penal. A Súmula 397 do STF dispõe que: “O poder de polícia da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, em caso de crime cometido nas suas dependências, compreende, consoante o regimento, a prisão em flagrante do acusado e a realização do inquérito”. É nulo o auto de prisão em flagrante lavrado por quem não preenche a condição de autoridade36.
4.7. Comunicações da prisão em flagrante A prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente (art. 5º, LXII, da CF). Nos moldes do que dispõe o art. 306, caput, do CPP, a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente, ao Ministério Público e à família do preso ou à pessoa por ele indicada. Em até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, será encaminhado ao juiz competente o auto de prisão em flagrante e, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, cópia integral para a Defensoria Pública (§ 1º do art. 306). A necessidade de comunicação da prisão em flagrante disposta no CPP tem relação direta com o inciso LXV do art. 5º da CF, segundo o qual a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária, e também atende ao que determina o inciso LXVI do mesmo art. 5º, segundo o qual ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança. Considerando que a liberdade é a regra e a prisão exceção37, sempre que verificada esta é preciso que se confirme, de pronto, a legalidade ou não da medida extrema. Todavia, conforme se tem entendido, a tardança ou o descumprimento destas regras não se mostram suficientes para o relaxamento visto configurar medidas externas à formalização da prisão38, constituindo mera irregularidade que não tem o condão de ensejar o relaxamento da segregação39.
4.8. Nota de culpa A obrigatoriedade da nota de culpa, que integra o auto de prisão em flagrante, decorre do disposto no § 2º do art. 306 do CPP. Irregularidades ou deficiências da nota de culpa, tais como a omissão do motivo da prisão40 ou da descrição do fato41, equivocada classificação do fato42, não têm o condão de nulificar o auto de prisão em flagrante43, mas a sua ausência ou entrega tardia44, fora do prazo legal, dará ensejo ao relaxamento da prisão.
4.9. Causas de exclusão da ilicitude Dispõe o parágrafo único do art. 310 do CPP sobre a possibilidade de se conceder liberdade provisória quando o juiz verificar, de plano, que o agente praticou a conduta em qualquer das condições regradas nos incisos I a III do art. 23 do CP, ou seja: estado de necessidade, legítima defesa, estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito. Nestas circunstâncias, como diz o caput do art. 23, não há crime, e sendo assim, se não há crime,
não é possível manter alguém preso em razão de conduta que não é punida na lei penal. Nestes casos faltará fumus boni juris/fumus commissi delicti para a manutenção da prisão. É lamentável, entretanto, não tenha o legislador aproveitado a oportunidade da Lei n. 12.403/2011 para corrigir o que já vem errado desde o início da vigência do Código de Processo Penal. Conforme visto, o art. 23 do CP diz que não há crime nas hipóteses mencionadas em seus incisos, e sendo assim, se já é possível verificar que não há crime, o correto não é a liberdade provisória, mas o relaxamento da prisão, porquanto ilegal o aprisionamento cautelar em face de conduta que se afigura lícita no ordenamento jurídico, ainda que depois se possa provar o contrário no curso das investigações que se seguirem. Note-se que reconhecer, já no momento do controle jurisdicional imediato, a possibilidade de a conduta estar acobertada por uma das causas de exclusão da antijuridicidade não implica o sepultamento das apurações policiais, visto que a decisão naqueles termos prolatada leva em conta apenas a situação do momento, aparente, estando marcada, portanto, por um juízo a priori, de cognição sumária. Desimporta para a continuidade das investigações se a decisão judicial é concessiva de relaxamento da prisão ou de liberdade provisória. Em qualquer caso o curso investigatório deverá seguir até o final do inquérito. Por outro lado, sendo hipótese de relaxamento, o agente não ficará exposto à possibilidade de aplicação de medidas cautelares restritivas (arts. 319 e 320 do CPP), como ocorre com a liberdade provisória. Note-se, por fim, que a aferição das escusativas de ilicitude do art. 23 do CP, de plano, já no momento da comunicação da prisão em flagrante, é deveras difícil e temerária, daí por que na maioria das vezes sempre foi evitada e continuará sendo, preferindo o Ministério Público e os juízes a alternativa que envolve conhecimento e fundamentação menos complexa e arriscada, que é a liberdade provisória sem fiança tratada no art. 321 do CPP. Nada obstante a letra da lei, se ficar demonstrado que o agente praticou a conduta em qualquer das circunstâncias do art. 23 do CP, ainda que concedida a liberdade provisória, o correto é a defesa pleitear que o juiz reconsidere sua decisão para efeito de decretar o relaxamento, conforme demonstramos no capítulo em que nos ocupamos do estudo da liberdade provisória, item “8.1.1. Sobre o parágrafo único do art. 310 do CPP”.
5. PRISÃO PREVENTIVA A prisão preventiva é modalidade de prisão cautelar que pode ser decretada durante a investigação policial ou no curso do processo penal. É medida de exceção que está regulada nos arts. 311 a 316 do CPP, e que sofre efeitos irradiados de outros dispositivos do mesmo Codex, como ocorre em relação aos arts. 282, 283, 310, II, e 321. Em razão da sua excepcionalidade, está cercada de requisitos bem nítidos, que não podem ser desprezados, pena de se ver configurada ilegalidade na segregação cautelar que dela decorrer.
5.1. Quem pode decretar Somente a autoridade judiciária competente pode decretar prisão preventiva. “O decreto judicial de prisão preventiva, emanado de autoridade judiciária incompetente, é insuscetível de ratificação”45.
5.2. Decretação da prisão preventiva Se durante a fase de inquérito a prisão preventiva for decretada ex officio haverá ilegalidade manifesta na decisão, visto que os arts. 282, § 2º, e 311 do CPP condicionam esta possibilidade da atividade jurisdicional sem provocação à existência de processo penal em curso. Na fase de investigação ela só poderá ser decretada se houver representação da autoridade policial ou requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente visando tal finalidade. Seja em que momento for, a decretação da prisão preventiva reclama a coexistência e efetiva demonstração do fumus boni juris/fumus commissi delicti e do periculum in mora/periculum libertatis, requisitos gerais da cautelaridade46, em decisão que deve estar convenientemente fundamentada, de maneira a deixar claro de onde nos autos o magistrado extraiu as razões de seu convencimento. Bem por isso a decisão que apenas fizer referência ao texto da lei47 ou simplesmente endossar postulação de outrem deverá ser considerada carente de fundamentação adequada, de modo a autorizar o relaxamento da prisão que dela resultar.
5.3. Requisitos Para a decretação da prisão preventiva é imprescindível o atendimento de requisitos certos e determinados48, que só podem ser interpretados restritivamente49. A falta de atendimento aos requisitos autorizadores acarreta a ilegalidade da decretação. Devem ser considerados requisitos, em sentido amplo: 1º) as hipóteses de cabimento, previstas no art. 312, parágrafo único, c/c o art. 282, § 4º, e art. 313, todos do CPP (com a redação da Lei n. 12.403/2011); 2º) os pressupostos indicados no art. 312, caput, parte final, do CPP; 3º) e as circunstâncias autorizadoras, listadas no art. 312, caput, primeira parte, do CPP. Todos estes requisitos foram exaustivamente analisados no capítulo em que discorremos sobre a prisão preventiva, para onde remetemos o leitor visando melhor compreensão de cada uma das regras e seus desdobramentos. É necessário enfatizar, no momento, que ausência de qualquer requisito enseja ilegalidade da prisão preventiva, sanável pela via do relaxamento. No que toca às circunstâncias autorizadoras é que as discussões são sempre mais frequentes, já que não raras vezes a fundamentação utilizada pelos magistrados tem se mostrado inadequada para o desate extremo, especialmente em se tratando da garantia da ordem pública. Com efeito, a fundamentação da prisão preventiva consistente na garantia da ordem pública deve lastrear-se na intranquilidade social causada pelo crime, a ponto de colocar em risco as instituições democráticas50. Não se trata, evidentemente, de hipótese em que o crime tenha provocado clamor público51/comoção social ou despertado a atenção da imprensa52. De igual forma, não se presta à fundamentação adequada a alusão a conceitos abstratos de ofensa às instituições sociais e familiares53, à possibilidade de gerar uma sensação de impunidade na sociedade54, à necessidade de preservação da credibilidade do Poder Judiciário55, ou a uma hipotética possibilidade de cometimento de outras infrações penais56. A necessidade de garantia da ordem pública não se extrai da gravidade da infração penal, pura e simplesmente57. A gravidade abstrata do delito é insuficiente para a manutenção de prisão provisória,
sob pena de afronta à garantia constitucional da presunção de não culpabilidade58. É preciso, por fim, que o magistrado59 demonstre empiricamente60 a necessidade incontrastável da medida excepcional que é a prisão antecipada, e o ato judicial que a formaliza deve conter fundamentação substancial61.
5.4. Prazo da prisão preventiva Toda pessoa detida tem direito a ser julgada dentro de prazo razoável ou a ser posta em liberdade sem prejuízo de que prossiga o processo (art. 7º da Convenção promulgada pelo Decreto n. 678/9262 e art. 5º, LXXVIII, da CF). Há que se ter em mente, todavia, que “o tempo legal do processo submete-se ao princípio da razoabilidade, incompatível com o seu exame à luz de só consideração aritmética, sobretudo, por acolhida, no sistema de direito positivo, a força maior, como fato produtor da suspensão do curso dos prazos processuais”63. A prisão preventiva, em regra, poderá perdurar durante o prazo necessário para a instrução do processo, sem que disso se retire autorização para que possa prolongar-se indefinidamente, “por culpa do juiz ou por atos procrastinatórios do órgão acusatório”64. Por ser absolutamente elucidativa da matéria, pedimos vênia para transcrever a ementa que segue: “O direito ao julgamento, sem dilações indevidas, qualifica-se como prerrogativa fundamental que decorre da garantia constitucional do due process of law. O réu — especialmente aquele que se acha sujeito a medidas cautelares de privação da sua liberdade — tem o direito público subjetivo de ser julgado, pelo Poder Público, dentro de prazo razoável, sem demora excessiva e nem dilações indevidas. Convenção Americana sobre Direitos Humanos (art. 7º, ns. 5 e 6). O excesso de prazo, quando exclusivamente imputável ao aparelho judiciário — não derivando, portanto, de qualquer fato procrastinatório causalmente atribuível ao réu — traduz situação anômala que compromete a efetividade do processo, pois, além de tornar evidente o desprezo estatal pela liberdade do cidadão, frustra um direito básico que assiste a qualquer pessoa: o direito à resolução do litígio, sem dilações indevidas e com todas as garantias reconhecidas pelo ordenamento constitucional. (...) A natureza da infração penal não pode restringir a aplicabilidade e a força normativa da regra inscrita no art. 5º, LXV, da Constituição da República, que dispõe, em caráter imperativo, que a prisão ilegal ‘será imediatamente relaxada’ pela autoridade judiciária”65. Ainda que se trate de crime grave, o excesso de prazo injustificado e não atribuível à defesa66 determina o relaxamento da prisão cautelar67. Há que se pensar em prazo razoável68, pois, ultrapassado o horizonte da razoabilidade69, será manifesto o constrangimento ilegal70. Nada obstante o teor da Súmula 52 do STJ, no sentido de que o encerramento da instrução processual afasta eventual constrangimento ilegal por excesso de prazo na formação da culpa71, à luz do ordenamento jurídico vigente é correto afirmar deva ser reinterpretada, pois “ainda que encerrada a instrução, é possível reconhecer o excesso de prazo, diante da garantia da razoável duração do processo, prevista no artigo 5º, inciso LXXVIII da Constituição”72. Haverá constrangimento, e mesmo após o encerramento da instrução, se a custódia cautelar não resultar de prisão preventiva concreta73 e adequadamente fundamentada74. Note-se, ainda, que a anulação do processo com a reabertura da instrução criminal enseja excesso de prazo justificador do relaxamento da prisão anteriormente decretada, ainda que escoltada em
decisão convenientemente fundamentada75. Conforme dispõe a Súmula 64 do STJ: “Não constitui constrangimento ilegal o excesso de prazo na instrução, provocado pela defesa”.
6. HABEAS CORPUS Nos precisos termos do art. 5º, LXVIII, da CF, conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder. Usado em larga escala na rotina judiciária, o habeas corpus sempre se revelou instrumento eficiente no combate aos excessos diuturnamente praticados na decretação de prisões cautelares. É necessário ter em mente, contudo, que em razão dos limites estreitos de cognição a que se encontra submetido, e por não permitir dilação probatória, não se presta a discutir toda e qualquer matéria. A respeito deste tema coletamos o material que segue, e que deve ser observado como referência para impetração. Limites materiais do habeas corpus: “A concessão de habeas corpus em razão da configuração de excesso de prazo é medida de todo excepcional, somente admitida nos casos em que a dilação (A) seja decorrência exclusiva de diligências suscitadas pela acusação; (B) resulte da inércia do próprio aparato judicial, em obediência ao princípio da razoável duração do processo, previsto no art. 5º, LXXVIII da Constituição Federal; ou (C) implique em ofensa ao princípio da razoabilidade” (STJ, HC 87.741/PE, 5ª T., rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 8-4-2008, DJe de 28-4-2008). “O habeas corpus é marcado por cognição sumária e rito célere, motivo pelo qual não comporta o exame de questões que demandem aprofundado exame do conjunto fático-probatório dos autos” (STJ, HC 130.987/BA, 5ª T., rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 18-6-2009, DJe de 3-8-2009). “Consoante firme entendimento desta Corte, a via do habeas corpus não comporta o profundo exame do material cognitivo” (STJ, RHC 14.616/SC, 5ª T., rel. Min. Jorge Scartezzini, j. 23-9-2003, DJ de 19-12-2003, p. 500). “O habeas corpus constitui-se em meio impróprio para a análise de alegações que exijam o exame do conjunto fático-probatório — como a atipicidade da conduta e de flagrante preparado (STJ, HC 26.086/SP, 5ª T., rel. Min. Gilson Dipp, j. 24-6-2003, DJ de 22-9-2003, p. 347); negativa de autoria (STJ, HC 23.738/SP, 5ª T., rel. Min. Gilson Dipp, j. 21-11-2002, DJ de 3-2-2003, p. 336); inocência do réu (STJ, HC 33.886/RJ, 6ª T., rel. Min. Paulo Medina, j. 9-2-2006, DJ de 12-6-2006, p. 543; STJ, RHC 9.897/SP, 5ª T., rel. Min. Gilson Dipp, j. 19-9-2000, DJ de 23-10-2000, p. 148); a participação, ou não, do agente nos delitos (STJ, HC 12.234/SP, 5ª T., rel. Min. Gilson Dipp, j. 185-2000, DJ de 21-8-2000, p. 155); a prática de tortura levada a efeito por policiais no momento do flagrante (STJ, HC 12.405/GO, 6ª T., rel. Min. Vicente Leal, j. 12-9-2000, DJ de 25-9-2000, p. 142). No mesmo sentido: STJ, HC 33.886/RJ, 6ª T., rel. Min. Paulo Medina, j. 9-2-2006, DJ de 12-6-2006, p. 543; STJ, HC 88.960/SP, 5ª T., rela. Mina. Jane Silva, j. 12-2-2008, DJe de 3-3-2008; STJ, HC 90.807/MG, 6ª T., rela. Mina. Jane Silva, j. 12-2-2008, DJe de 3-3-2008; STJ, HC 149.403/SP, 5ª T., rel. Min. Felix Fischer, j. 2-3-2010, DJe de 26-4-2010.
7. CONSEQUÊNCIAS DO RELAXAMENTO Ocorrendo o relaxamento da prisão cautelar em razão da prática de qualquer ilegalidade na sua
efetivação, não é correto pensar que a decisão judicial que assim pronunciar tenha por efeito anular a investigação policial; o inquérito ou mesmo o processo. Analisando um caso concreto, embora seja possível apontar nulidade no auto de prisão em flagrante76, na prisão temporária e mesmo na prisão preventiva, a única consequência que disso se tira é a liberdade do preso, até porque não há falar em nulidade de inquérito policial, e as irregularidades nele praticadas não fulminam o processo instaurado com base em tais investigações. Isso não pode ser confundido com eventual nulidade de prova colhida na fase de investigação ao arrepio da lei, como ocorre algumas vezes, v.g., com interceptações telefônicas, busca e apreensão de documentos etc. A nulidade de determinada prova colhida ao desamparo da lei na fase de inquérito, embora possa influenciar decisiva e negativamente na busca da verdade perseguida com a instrução processual e, portanto, no julgamento do mérito da demanda, em nenhuma hipótese irá derramar nulidade no processo. Conforme já decidiu o STF, eventual nulidade do flagrante contamina apenas a prisão, jamais o processo77, e esta regra vale para todas as demais prisões cautelares. “A decisão que determinou o relaxamento da prisão, independente da fundamentação utilizada, não obsta a atuação do Estado como titular da ação penal e nem impede que o seu representante proceda ao oferecimento da denúncia, sob pena de negativa de vigência ao art. 24 do Código de Processo Penal”78. É como deve ser.
Relaxamento da Prisão Quadro comparativo entre os artigos relacionados com relaxamento da prisão
Prisão Temporária Como era
Como ficou
Lei n. 7.960, de 21 de dezembro de 1989 (sem alterações).
Lei n. 7.960, de 21 de dezembro de 1989 (sem alterações).
Prisão em Flagrante
Art. 301. Qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito.
Não sofreu alteração Art. 301. Qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito.
Art. 302. Considera-se em flagrante delito quem: I — está cometendo a infração penal; II — acaba de cometê-la; III — é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração; IV — é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração.
Não sofreu alteração Art. 302. Considera-se em flagrante delito quem: I — está cometendo a infração penal; II — acaba de cometê-la; III — é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração; IV — é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração.
Art. 303. Nas infrações permanentes, entende-se o agente em flagrante delito enquanto não cessar a permanência.
Não sofreu alteração Art. 303. Nas infrações permanentes, entende-se o agente em flagrante delito enquanto não cessar a permanência.
Art. 304. Apresentado o preso à autoridade competente, ouvirá esta o condutor e colherá, desde logo, sua assinatura, entregando a este cópia do termo e recibo de entrega do preso. Em seguida, procederá à oitiva das testemunhas que o acompanharem e ao interrogatório do acusado sobre a imputação que lhe é feita, colhendo, após cada oitiva, suas respectivas assinaturas, lavrando, a autoridade, afinal, o auto.
Não sofreu alteração Art. 304. Apresentado o preso à autoridade competente, ouvirá esta o condutor e colherá, desde logo, sua assinatura, entregando a este cópia do termo e recibo de entrega do preso. Em seguida, procederá à oitiva das testemunhas que o acompanharem e ao interrogatório do acusado sobre a imputação que lhe é feita, colhendo, após cada oitiva, suas respectivas assinaturas, lavrando, a autoridade, afinal, o auto.
§ 1º Resultando das respostas fundada a suspeita contra o conduzido, a autoridade mandará recolhêlo à prisão, exceto no caso de livrar-se solto ou de prestar fiança, e prosseguirá nos atos do inquérito ou processo, se para isso for competente; se não o for, enviará os autos à autoridade que o seja. § 2º A falta de testemunhas da infração não impedirá o auto de prisão em flagrante; mas, nesse caso, com o condutor, deverão assiná-lo pelo menos duas pessoas que hajam testemunhado a apresentação do preso à autoridade.
§ 1º Resultando das respostas fundada a suspeita contra o conduzido, a autoridade mandará recolhêlo à prisão, exceto no caso de livrar-se solto ou de prestar fiança, e prosseguirá nos atos do inquérito ou processo, se para isso for competente; se não o for, enviará os autos à autoridade que o seja. § 2º A falta de testemunhas da infração não impedirá o auto de prisão em flagrante; mas, nesse caso, com o condutor, deverão assiná-lo pelo menos duas pessoas que hajam testemunhado a apresentação do preso à autoridade.
Art. 305. Na falta ou no impedimento do escrivão, qualquer pessoa designada pela autoridade lavrará o auto, depois de prestado o compromisso legal.
Não sofreu alteração Art. 305. Na falta ou no impedimento do escrivão, qualquer pessoa designada pela autoridade lavrará o auto, depois de prestado o compromisso legal.
Art. 306. A prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou a pessoa por ele indicada. § 1º Dentro em 24h (vinte e quatro horas) depois da prisão, será encaminhado ao juiz competente o auto de prisão em flagrante acompanhado de todas as oitivas colhidas e caso o autuado não informe o nome de seu advogado, cópia integral para a Defensoria Pública. § 2º No mesmo prazo, será entregue ao preso, mediante recibo, a nota de culpa, assinada pela autoridade, com o motivo da prisão, o nome do condutor e o das testemunhas.
Art. 306. A prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente, ao Ministério Público e à família do preso ou à pessoa por ele indicada. § 1º Em até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, será encaminhado ao juiz competente o auto de prisão em flagrante e, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, cópia integral para a Defensoria Pública. § 2º No mesmo prazo, será entregue ao preso, mediante recibo, a nota de culpa, assinada pela autoridade, com o motivo da prisão, o nome do condutor e os das testemunhas.
Art. 307. Quando o fato for praticado em presença da autoridade, ou contra esta, no exercício de suas funções, constarão do auto a narração deste fato, a voz de prisão, as declarações que fizer o preso e os depoimentos das testemunhas, sendo tudo assinado pela autoridade, pelo preso e pelas testemunhas e remetido imediatamente ao juiz a quem couber tomar conhecimento do fato delituoso, se não o for a autoridade que houver presidido o auto.
Não sofreu alteração Art. 307. Quando o fato for praticado em presença da autoridade, ou contra esta, no exercício de suas funções, constarão do auto a narração deste fato, a voz de prisão, as declarações que fizer o preso e os depoimentos das testemunhas, sendo tudo assinado pela autoridade, pelo preso e pelas testemunhas e remetido imediatamente ao juiz a quem couber tomar conhecimento do fato delituoso, se não o for a autoridade que houver presidido o auto.
Art. 308. Não havendo autoridade no lugar em que se tiver efetuado a prisão, o preso será logo apresentado à do lugar mais próximo.
Não sofreu alteração Art. 308. Não havendo autoridade no lugar em que se tiver efetuado a prisão, o preso será logo apresentado à do lugar mais próximo.
Art. 309. Se o réu se livrar solto, deverá ser posto em liberdade, depois de lavrado o auto de prisão em flagrante.
Não sofreu alteração Art. 309. Se o réu se livrar solto, deverá ser posto em liberdade, depois de lavrado o auto de prisão em flagrante.
Prisão Preventiva
Art. 310. Quando o juiz verificar pelo auto de prisão em flagrante que o agente praticou o fato, nas condições do art. 19, I, II e III, do Código Penal, poderá depois de ouvir o Ministério Público, conceder ao réu liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos do processo, sob pena de revogação. Parágrafo único. Igual procedimento será adotado quando o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, a inocorrência de qualquer das hipóteses que autorizam a prisão preventiva (arts. 311 e 312)
Art. 310. Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá fundamentadamente: I — relaxar a prisão ilegal; ou II — converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; ou III — conceder liberdade provisória, com ou sem fiança. Parágrafo único. Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o agente praticou o fato nas condições constantes dos incisos I a III do caput do art. 23 do Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 — Código Penal, poderá, fundamentadamente, conceder ao acusado liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos processuais, sob pena de revogação.
Art. 311. Em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público, ou do querelante, ou mediante representação da autoridade policial.
Art. 311. Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, de ofício, se no curso da ação penal, ou a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial.
Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.
Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria. Parágrafo único. A prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares (art. 282, § 4º).
Art. 313. Em qualquer das circunstâncias, previstas no artigo anterior, será admitida a decretação da prisão preventiva nos crimes dolosos: I — punidos com reclusão; II — punidos com detenção, quando se apurar que o indiciado é vadio ou, havendo dúvida sobre a sua identidade, não fornecer ou não indicar elementos para esclarecê-la; III — se o réu tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no parágrafo único do art. 46 do Código Penal; IV — se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos da lei específica, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência.
Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão preventiva: I — nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos; II — se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 — Código Penal; III — se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência; IV — (revogado). Parágrafo único. Também será admitida a prisão preventiva quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida.
Art. 314. A prisão preventiva em nenhum caso será decretada se o juiz verificar pelas provas constantes dos autos ter o agente praticado o fato nas condições do art. 19, ns. I, II ou III do Código Penal.
Art. 314. A prisão preventiva em nenhum caso será decretada se o juiz verificar pelas provas constantes dos autos ter o agente praticado o fato nas condições previstas nos incisos I, II e III do caput do art. 23 do Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 — Código Penal.
Art. 315. O despacho que decretar ou denegar a prisão preventiva será sempre fundamentado.
Art. 315. A decisão que decretar, substituir ou denegar a prisão preventiva será sempre motivada.
Art. 316. O juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no correr do processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como de novo decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem.
Não sofreu alteração Art. 316. O juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no correr do processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como de novo decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem.
Disposições Gerais Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a: I — necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais; II — adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado. § 1º As medidas cautelares poderão ser aplicadas isolada ou cumulativamente. § 2º As medidas cautelares serão decretadas pelo juiz, de ofício ou a requerimento das partes ou, quando no curso da investigação criminal, por representação da autoridade policial ou mediante requerimento do Ministério Público. § 3º Ressalvados os casos de urgência ou de perigo de ineficácia da medida, o juiz, ao receber o pedido de medida cautelar, determinará a intimação da parte contrária, acompanhada de cópia do requerimento e das peças necessárias, permanecendo os autos em juízo. § 4º No caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas, o juiz, de ofício ou mediante requerimento do Ministério Público, de seu assistente ou do querelante, poderá substituir a medida, impor outra em cumulação, ou, em último caso, decretar a prisão preventiva (art. 312, parágrafo único). § 5º O juiz poderá revogar a medida cautelar ou substituí-la quando verificar a falta de motivo para que subsista, bem como voltar a decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem. § 6º A prisão preventiva será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar (art. 319). Art. 283. Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva. § 1º As medidas cautelares previstas neste Título não se aplicam à infração a que não for isolada, cumulativa ou alternativamente cominada pena privativa de liberdade. § 2º A prisão poderá ser efetuada em qualquer dia e a qualquer hora, respeitadas as restrições relativas à inviolabilidade do domicílio.
Art. 289. Quando o acusado estiver no território nacional, fora da jurisdição do juiz processante, será deprecada a sua prisão, devendo constar da precatória o inteiro teor do mandado. § 1º Havendo urgência, o juiz poderá requisitar a prisão por qualquer meio de comunicação, do qual deverá constar o motivo da prisão, bem como o valor da fiança se arbitrada. § 2º A autoridade a quem se fizer a requisição tomará as precauções necessárias para averiguar a autenticidade da comunicação. § 3º O juiz processante deverá providenciar a remoção do preso no prazo máximo de 30 (trinta) dias, contados da efetivação da medida. Art. 299. A captura poderá ser requisitada, à vista de mandado judicial, por qualquer meio de comunicação, tomadas pela autoridade, a quem se fizer a requisição, as precauções necessárias para averiguar a autenticidade desta. Art. 300. As pessoas presas provisoriamente ficarão separadas das que já estiverem definitivamente condenadas, nos termos da lei de execução penal.
1 Sobre a impossibilidade de se vincular a liberdade provisória, sem fiança, conferir nossos comentários lançados no capítulo: “Liberdade provisória sem fiança”. 2 Art. 5º, LXI, da CF: “Ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei”. 3 Art. 86, § 3º, da CF: “Enquanto não sobrevier sentença condenatória, nas infrações comuns, o Presidente da República não estará sujeito a prisão”. 4 Ver: RENAT O MARCÃO, Crimes de trânsito, 3. ed., São Paulo: Saraiva, 2011; FERNANDO CÉLIO DE BRIT O NOGUEIRA, Crimes do Código de Trânsito, 2. ed., São Paulo: Mizuno, 2010. 5 Art. 40, III, da LONMP: “Constituem prerrogativas dos membros do Ministério Público, além de outras previstas na Lei Orgânica: (...) III — ser preso somente por ordem judicial escrita, salvo em flagrante de crime inafiançável, caso em que a autoridade fará, no prazo máximo de vinte e quatro horas, a comunicação e a apresentação do membro do Ministério Público ao Procurador-Geral de Justiça”. 6 Art. 33, II, da LOMN: “São prerrogativas do magistrado: (...) II — não ser preso senão por ordem escrita do Tribunal ou do órgão especial competente para o julgamento, salvo em flagrante de crime inafiançável, caso em que a autoridade fará imediata comunicação e apresentação do magistrado ao Presidente do Tribunal a que esteja vinculado”. 7 Art. 7º, § 3º, da Lei n. 8.906/94: “São direitos do advogado: (...) § 3º O advogado somente poderá ser preso em flagrante, por motivo de exercício da profissão, em caso de crime inafiançável, observado o disposto no inciso IV deste artigo”. 8 Art. 27, § 1º, da CF: “Será de quatro anos o mandato dos Deputados Estaduais, aplicando-se-lhes as regras desta Constituição sobre sistema eleitoral, inviolabilidade, imunidades (...)”. 9 Art. 53, §§ 2º e 8º, da CF: “§ 2º Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão. § 8º As imunidades de Deputados ou Senadores subsistirão durante o estado de sítio, só podendo ser suspensas mediante o voto de dois terços dos membros da Casa respectiva, nos casos de atos praticados fora do recinto do Congresso Nacional, que sejam incompatíveis com a execução da medida”. 10 STF, RHC 86.535/SP, 2ª T., rel. Min. Cezar Peluso, j. 15-12-2009, DJe de 12-2-2010. 11 TJSP, Ap. 193.439-3/9, 5ª Câm., rel. Des. Rocha de Souza, j. 9-11-1995, RT 730/529. 12 TAPR, Ap. 113.886-7, 1ª Câm., rel. desig. Juiz Mendonça de Anunciação, j. 19-3-1998, RT 757/655. 13 TJSP, Ap. 178.786-3/1, 1ª Câm., j. 10-4-1995, rel. Des. Marcial Hollanda, RT 721/414. 14 STF, HC 72.674-7/SP, 2ª T., j. 26-3-1996, rel. Min. Maurício Corrêa, DJU de 26-3-1996, RT 735/527. 15 STF, HC 78.250/RJ, 2ª T., rel. Min. Maurício Corrêa, j. 15-12-1998, DJe de 26-2-1999. 16 “O flagrante forjado distingue-se por completo do flagrante esperado, pois no primeiro caso, a vítima facilita a ação criminosa, estimulando no agente a intenção de burlar a norma penal, ou agentes policiais contribuem por omissão premeditada para a prática de um delito, que neste caso é putativo, pois o bem objeto da tutela jurídica não está a dispor do desiderato criminoso. Já no flagrante esperado, por se constituir em uma seleção lícita de elementos de prova para uma futura diligência de captura daquele incurso nas penas de algum delito, não há se falar em crime impossível” (TRF, 2ª Região, Ap. 96.02.42015-4/ES, 2ª T., rel. Des. Federal Paulo Espírito Santo, j. 16-11-1998, DJU de 6-4-1999, RT 768/708). 17 STJ, RHC 20.283/SP, 5ª T., rel. Min. Gilson Dipp, j. 24-4-2007, DJ de 4-6-2007, p. 378. 18 “Tendo o paciente sido cientificado do seu direito constitucional de permanecer em silêncio, não se pode falar em prova colhida de forma ilícita” (STJ, HC 39.786/DF, 6ª T., rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, j. 2-8-2005, DJ de 22-8-2005, p. 347). 19 A Lei n. 12.037, de 1º de outubro de 2009, regulamenta o art. 5º, LVIII, da Constituição Federal, e dispõe sobre a identificação criminal do civilmente identificado. 20 Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. 21 “A recusa do acusado em assinar o auto de prisão em flagrante não o torna inválido, desde que assinado por duas testemunhas, nos termos do art. 304, § 3º, do Código de Processo Penal (Precedente). Ordem denegada” (STJ, HC 44.079/GO, 5ª T., rel. Min. Felix Fischer, j. 11-10-2005, DJ de 19-12-2005, p. 450). 22 “Preenchidas as formalidades legais da prisão em flagrante, e não havendo qualquer irregularidade demonstrada, afastada está a hipótese de seu relaxamento” (STJ, RHC 17.273/SC, 5ª T., rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 17-5-2005, DJ de 1-8-2005, p.
475). “Não havendo qualquer irregularidade na prisão em flagrante, afastada está a hipótese de seu relaxamento” (STJ, RHC 17.060/RJ, 5ª T., rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 3-3-2005, DJ de 18-4-2005, p. 353). “Não se acolhe alegação de nulidade do flagrante, se o respectivo auto atendeu às formalidades legais, não se mostrando, de pronto, ilegal” (STJ, HC 12.234/SP, 5ª T., rel. Min. Gilson Dipp, j. 18-5-2000, DJ de 21-8-2000, p. 155). 23 Ob. cit., p. 468. 24 “Se o auto de prisão em flagrante foi lavrado conforme o ordenamento processual penal, não há que se falar em nulidade do ato simplesmente por eventual atraso na comunicação da detenção a familiar indicado” (STJ, HC 107.564/SP, 5ª T., rel. Min. Jorge Mussi, j. 23-6-2009, DJe de 3-8-2009). 25 “Não constitui irregularidade apta a anular o auto de prisão a comunicação tardia feita à família do paciente quando de sua prisão em flagrante” (STJ, RHC 10.220/SP, 5ª T., rel. Min. Gilson Dipp, j. 13-3-2001, DJ de 23-4-2001, p. 164). 26 STJ, RHC 4.274-5/RJ, 6ª T., rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, RSTJ 12/257. 27 “A ausência de advogado no momento da lavratura do auto de prisão em flagrante não implica sua nulidade, visto que, sendo um procedimento de natureza inquisitorial, não se aplicam os princípios do contraditório e da ampla defesa, bastando observar-se o disposto no art. 5º, LXIII, da CF e no art. 304 et seq. do CPP” (TJSP, HC 375.127-3/1, 3ª Câm., rel. Des. Gonçalves Nogueira, j. 2-4-2002, RT 802/576). 28 STF, HC 102.732/DF, Pleno, rel. Min. Marco Aurélio, j. 4-3-2010, DJe de 7-5-2010. No mesmo sentido: “A ausência de advogado no momento da lavratura do auto de prisão em flagrante não implica sua nulidade, visto que, sendo um procedimento de natureza inquisitorial, não se aplicam os princípios do contraditório e da ampla defesa, bastando observar-se o disposto no art. 5º, LXIII, da CF e no art. 304 et seq. do CPP” (TJSP, HC 375.127-3/1, 3ª Câm., rel. Des. Gonçalves Nogueira, j. 2-4-2002, RT 802/576). 29 TJSP, HC 368.773-3/2, 5ª Câm., rel. Des. Dante Busana, j. 28-2-2002, RT 802/570. 30 “Auto de prisão em flagrante: a nulidade decorrente do atraso indevido na sua lavratura redunda na ilegitimidade da prisão, mas não na invalidade da condenação” (STF, HC 76.935/SP, 1ª T., rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 12-5-1998, DJe de 5-6-1998). 31 “Não é nulo o auto de flagrante por haver sido lavrado uma hora após a prisão do indiciado” (TJSP, HC 17.537-3, 3ª Câm. Crim., rel. Des. Cunha Camargo, j. 25-10-1982, RT 567/286). 32 STJ, RHC 5.650/RS, 6ª T., rel. Min. Vicente Leal, j. 2-6-1997, DJU de 1º-9-1997, RT 749/616. “Não é nulo o auto de prisão em flagrante em razão de ter sido lavrado por autoridade policial que foi testemunha do fato, pois a ele não se aplica a regra proibitiva do art. 252, II, do CPP, que se dirige ao juiz, tendo em vista que são diversas as funções que o juiz e o delegado de polícia exercem” (TJSP, HC 368.773-3/2, 5ª Câm., rel. Des. Dante Busana, j. 28-2-2002, RT 802/570). 33 O art. 307 do CPP menciona a possibilidade de a prisão em flagrante ser realizada por juiz de direito, a quem competirá a lavratura do auto. Diz o art. 308 do CPP que, não havendo autoridade no lugar em que se tiver efetuado a prisão, o preso será logo apresentado à do lugar mais próximo. 34 TJSP, HC 265.453-3/1-00, 4ª Câm., rel. Des. Hélio de Freitas, j. 3-11-1998, RT 763/568. 35 Idem nota anterior. 36 STF, HC 73.035/DF, Pleno, rel. Min. Carlos Velloso, j. 13-11-1996, DJe de 19-12-1996. 37 “No ordenamento constitucional vigente, a liberdade é regra, excetuada apenas quando concretamente se comprovar, em relação ao réu, a existência de periculum libertatis” (STJ, HC 45.541/MS, 6ª T., rel. Min. Paulo Medina, j. 18-10-2005, DJ de 12-12-2005, p. 425). 38 TJSP, HC 265.453-3/1-00, 4ª Câm., rel. Des. Hélio de Freitas, j. 3-11-1998, RT 763/568. 39 STJ, RHC 25.633/SP, 5ª T., rel. Min. Felix Fischer, j. 13-8-2009, DJe de 14-9-2009. 40 STF, RHC 48.572/SP, 1ª T., rel. Min. Djaci Falcão, j. 15-12-1970, DJe de 26-3-1971. 41 STF, RHC 48.735/SP, 2ª T., rel. Min. Thompson Flores, j. 22-3-1971, DJe de 14-5-1971. 42 STF, RHC 47.838/MG, 2ª T., rel. Min. Adaucto Cardoso, j. 13-4-1970, DJe de 7-8-1970. 43 “A finalidade da nota de culpa é possibilitar à pessoa que seja presa o conhecimento acerca dos motivos que determinaram a sua prisão, bem como outras informações a possibilitar-lhe ampla defesa, devendo conter, segundo o previsto no art. 306 do CPP, a assinatura da autoridade responsável, um breve relato do fato criminoso imputado e o nome do condutor e das testemunhas. Todavia, a deficiência da nota de culpa não acarreta a nulidade do auto de prisão em flagrante, até por que não integra a peça flagratória” (TJSP, HC 334.478.3/2, 4ª Câm., rel. Des. Hélio de Freitas, j. 27-3-2001, RT 791/606). 44 Admitindo a entrega tardia, “algumas horas depois de vencido o prazo”: STF, RHC 62.187/GO, 2ª T., rel. Min. Aldir Passarinho, j. 13-11-1984, DJe de 8-3-1985.
45 STF, HC 69.509/SP, 2ª T., rel. Min. Celso de Mello, j. 1º-9-1992, DJe de 12-3-1993. 46 “A necessidade da segregação cautelar do acusado só é admitida quando baseada em justificação judicial, devidamente fundamentada, nos requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora, sob pena de se transformar em letra morta o direito individual, constitucionalmente assegurado a todos, da liberdade de ir, vir e ficar” (STJ, RHC 6.245-MG, 5ª T., j. 24-6-1997, rel. Min. Cid Flaquer Scartezzini, DJU de 3-11-1997, RT 750/572). 47 “A simples menção das hipóteses arroladas no art. 312 do CPP não basta para fundamentar decreto de prisão preventiva” (TJSP, HC 379.035-3/0, 2ª Câm., rel. Des. Canguçu de Almeida, j. 29-4-2002, RT 804/573). 48 STF, RHC 71.354/PI, 2ª T., rel. Min. Marco Aurélio, j. 13-9-1994, DJ de 27-10-1994, p. 29165. 49 “Cabe ao julgador, ao avaliar a necessidade de decretação da custódia cautelar, interpretar restritivamente os pressupostos do art. 312 do Código de Processo Penal, fazendo-se mister a configuração empírica dos referidos requisitos” (STJ, REsp 700.119/GO, 5ª T., rel. Min. Gilson Dipp, DJU de 27-6-2005). 50 STJ, HC 32.607/RS, 6ª T., rel. Min. Paulo Medina, DJU de 13-6-2005. 51 “O clamor público por não estar entre as causas justificadas de custódia preventiva, deve ser analisado com os devidos cuidados, para se evitar injustiças, assim, ausentes os demais pressupostos autorizadores da medida, inadmissível a sua decretação” (STJ, HC 4.926-SP, 5ª T., j. 8-10-1996, rel. Min. Edson Vidigal, DJU de 20-10-1997, RT 750/567). 52 “Se o decreto de prisão preventiva cinge-se a juízos conjecturais despidos de indicação de qualquer base empírica, apenas a passagem folclórica que atraiu a atenção da imprensa, deve ser cassado, pois a existência de um crime e a probabilidade de que o acusado seja o seu autor são requisitos da custódia, mas por si sós não a legitima” (STF, HC 79.204-9/BA, 1ª T., j. 1-6-1999, rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJU de 6-8-1999, RT 769/510). 53 STJ, HC 40.530/MS, 5ª T., rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJU de 15-8-2005. 54 STJ, HC 38.681/MS, 5ª T., rel. Min. Gilson Dipp, DJU de 7-3-2005. 55 “A preservação da credibilidade do Judiciário não deságua na automaticidade da custódia preventiva, devendo ocorrer, isso sim, em estrita observância ao Direito posto” (STF, HC 95.483/MT, 1ª T., rel. Min. Marco Aurélio, j. 15-9-2009, DJe de 29-102009). 56 STF, HC 100.872/MG, 2ª T., rel. Min. Eros Grau, j. 9-3-2010, DJe de 30-4-2010. 57 “A gravidade da imputação, consideradas as qualificadoras do tipo penal, não serve à prisão preventiva, havendo de ser elucidada na sentença relativa à culpa. Se a própria lei prevê que, em caso de sentença condenatória, o juiz decidirá fundamentadamente se o réu poderá apelar em liberdade, forçoso é concluir que o enquadramento do crime como hediondo não revela, por si só, base para a prisão preventiva” (STF, HC 92.299/SP, 1ª T., rel. Min. Marco Aurélio, j. 24-6-2008, DJe n. 177, de 19-9-2008). “Não constituem fundamentos idôneos à prisão preventiva a invocação da gravidade abstrata ou concreta do delito imputado, definido ou não como hediondo — muitas vezes, inconsciente antecipação da punição penal” (STF, HC 90.064/SP, 1ª T., rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 8-5-2007, DJe n. 42, de 22-6-2007). 58 STJ, HC 120.108/ES, 6ª T., rel. Min. Jane Silva, j. 23-6-2009, DJe de 10-8-2009; STJ, HC 122.761/SP, 6ª T., rel. Min. Jane Silva, j. 6-2-2009, DJe de 2-3-2009. 59 “É dever do Magistrado demonstrar, com dados concretos extraídos dos autos, a necessidade da custódia” (STJ, REsp 676.819/RS, 5ª T., rel. Min. Felix Fischer, DJU de 14-2-2005). 60 “A prisão preventiva para garantia da ordem pública não se justifica sem a demonstração de sua base empírica” (STF, HC 85.036-7/RS, 1ª T., rel. Min. Eros Grau, DJU de 25-2-2005). 61 TACrimSP, HC 463.154-7, 10ª Câm., rel. Juiz Ary Casagrande, DOESP de 12-4-2004. 62 Promulga a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), de 22 de novembro de 1969. 63 STJ, HC 41.372/RJ, 6ª T., rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 31-8-2005, DJ de 26-6-2006, p. 204; STJ, HC 79.270/SP, 6ª T., rel. Min. Nilson Naves, rel. p/ o Acórdão Min. Hamilton Carvalhido, j. 16-8-2007, DJ de 31-3-2008. 64 GUILHERME DE SOUZA NUCCI , ob. cit., p. 545. “Não há falar em constrangimento ilegal apto a ensejar o relaxamento da prisão se o retardamento do feito não se credita à atuação do Poder Judiciário” (STJ, HC 51.540/ES, 6ª T., rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 6-9-2007, DJ de 24-9-2007, p. 375). 65 STF, HC 80.379/SP, 2ª T., rel. Min. Celso de Mello, j. 18-12-2000, DJ de 25-5-2001, p. 11. 66 “O excesso de prazo para o término do processo quando diligências são requeridas pela Defesa, não serve para fundamentar pedido de relaxamento de prisão ou liberdade provisória” (STJ, HC 34.989/PE, 6ª T., rel. Min. Paulo Medina, j. 6-10-2005, DJ de 26-9-2005, p. 464). 67 “Para o reconhecimento do excesso de prazo e consequente relaxamento da prisão, a responsabilidade pelo atraso deve recair apenas sobre a atuação estatal” (STJ, HC 64.297/SP, 6ª T., rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 8-3-2007, DJ de 26-3-
2007, p. 290). No mesmo sentido: STF, HC 102.069/PE, 2ª T., rel. Min. Ellen Gracie, j. 4-5-2010, DJe de 21-5-2010. 68 STJ, HC 62.759/SP, 5ª T., rel. Min. Laurita Vaz, j. 28-8-2008, DJe de 29-9-2008; STJ, HC 114.368/PI, 6ª T., rel. Min. Celso Limongi, j. 10-3-2009, DJe de 30-3-2009; STJ, HC 117687/SP, 6ª T., rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 6-2-2009, DJe 27-4-2009; STJ, HC 70.562/SP, 6ª T., rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 26-5-2009, DJe de 1-7-2009. 69 STJ, HC 42.835/SP, 6ª T., rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 31-8-2005, DJ de 14-11-2005, p. 409; STJ, HC 44.315/BA, 6ª T., rel. Min. Hamilton Carvalho, j. 29-11-2005, DJ de 6-2-2006, p. 356. 70 STJ, HC 132.928/SE, 6ª T., rel. Min. Celso Limongi, j. 24-8-2009, DJe de 14-9-2009, LEXSTJ 242/380; STJ, EDcl no HC 122.378/RN, 5ª T., rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 3-12-2009, DJe de 1-2-2010. 71 STJ, HC 78.511/SC, 6ª T., rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 30-10-2007, DJ de 26-11-2007, p. 252; STJ, HC 122.397/SP, 6ª T., rel. Min. Celso Limongi, j. 8-9-2009, DJe de 5-10-2009. 72 STJ, RHC 20.566/BA, 6ª T., rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 12-6-2007, DJ de 25-6-2007, p. 300. 73 STJ, HC 23.738/SP, 5ª T., rel. Min. Gilson Dipp, j. 21-11-2002, DJ de 3-2-2003, p. 336. 74 STJ, HC 18.684/SP, 5ª T., rel. Min. Gilson Dipp, j. 26-2-2002, DJ de 8-4-2002, p. 248; STJ, HC 46.410/SP, 6ª T., rel. Min. Nilson Naves, j. 27-9-2005, DJ de 13-3-2006, p. 381; STJ, RHC 23.760/PI, 6ª T., rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 28-82008, DJe de 22-9-2008; STJ, HC 120.225/SC, 6ª T., rel. Min. Celso Limongi, j. 19-2-2009, DJe de 16-3-2009; STJ, HC 132.952/PI, 6ª T., rel. Min. Celso Limongi, j. 25-6-2009, DJe de 16-11-2009. 75 STJ, HC 85.876/SP, 5ª T., rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, rel. p/ o Acórdão Min. Jane Silva, j. 8-11-2007, DJ de 3-122007, p. 346, LEXSTJ 222/342; STJ, HC 103.451/PB, 6ª T., rel. Min. Jane Silva, j. 5-6-2008, DJe de 22-9-2008. 76 “Eventual nulidade ou irregularidade do auto de prisão em flagrante não contamina a futura ação penal” (STJ, APn 359/PE, Câm. Esp., rel. Min. Aldir Passarinho Junior, j. 4-3-2009, DJe de 26-3-2009, RSTJ 214/21). 77 “Eventual nulidade do flagrante pode apenas invalidar a prisão, não viciando, contudo, a ação penal, se há prova do crime não conseguida por meios ilícitos e indícios suficientes de autoria. Sobrevindo sentença condenatória, não se permitindo o apelo em liberdade, superada fica qualquer irregularidade da prisão em flagrante” (STJ, ROHC 9.019-MG, 5ª T., j. 26-10-1999, rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, DJU de 29-11-1999, RT 777/554). “As eventuais nulidades do auto de prisão em flagrante não se estendem ipso facto à regularidade da persecução penal em juízo. O processo criminal não se anula por mera irregularidade na confecção do auto de prisão em flagrante” (TJSP, Ap. 206.259-3/4, 3ª Câm., j. 4-6-1996, rel. Des. Segurado Braz, RT 732/622). 78 STJ, REsp 1.202.969/SC, 5ª T., rel. Min. Gilson Dipp, j. 15-2-2011, DJe de 28-2-2011.
LIBERDADE PROVISÓRIA MEDIANTE FIANÇA 1. INTRODUÇÃO Decorre da presunção de inocência ou de não culpabilidade explicitada no art. 5º, LVII, da CF, a necessidade de se assegurar que alguém preso em flagrante delito possa aguardar as investigações policiais e o julgamento de eventual processo criminal em liberdade. Sendo regra a vida livre e a contenção prisional exceção, somente em casos realmente extremos, excepcionais por excelência, é que se poderá admitir, validamente, que a prisão cautelar vença e se imponha. Disso resulta a necessidade e grandiosidade do instituto denominado liberdade provisória, que poderá materializar-se com ou sem a prestação de fiança. É bem verdade que o surgimento da possibilidade de liberdade provisória sem fiança, cabível em relação aos crimes inafiançáveis, criou aparente situação de injustiça, apontando para uma equação onde, nos crimes mais leves, o agente paga fiança para aguardar em liberdade, enquanto naqueles mais graves, por isso inafiançáveis, pode aguardar em liberdade sem ter que prestar qualquer garantia real; sem desembolsar nada. Esta situação, entretanto, foi em parte superada com as modificações introduzidas pela Lei n. 12.403/2011, que ampliou consideravelmente as hipóteses de cabimento de fiança, conforme veremos em tópico específico. Até a reforma, o instituto da fiança vinha sendo pouco e mal utilizado, especialmente porque na generalidade dos casos o manejo da lei sempre entornou para a liberdade provisória sem fiança, o que é compreensível se olharmos apenas para os interesses daquele que recebe a favorável decisão judicial. Se considerarmos, entretanto, que a fiança não se presta apenas à restituição da liberdade, como adiante veremos, fica fácil concluir pela necessidade de melhor cuidado com o assunto. O que se espera é que, com a revitalização da fiança, a realidade do passado se transforme em simples lembrança de como não se deve agir com esta valiosa alternativa libertária. Seja como for, há que se pensar na exigência de fiança sempre que cabível, ficando a liberdade provisória sem fiança em segundo plano.
2. LIBERDADE PROVISÓRIA COMO GÊNERO Ao tratarmos do tema liberdade provisória é preciso não confundir gênero com espécie. Liberdade provisória, em sentido amplo, é o gênero, do qual extraímos as espécies: 1º) liberdade provisória com fiança, e, 2º) liberdade provisória sem fiança. Não é outra a interpretação que se extrai do art. 5º, LXVI, da CF, quando diz que: “ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança”. Não foi por razão diversa, aliás, que a Lei n. 6.416, de 24 de maio de 1977, introduziu um parágrafo único no art. 310 do CPP. A ideia foi exatamente permitir a liberdade provisória, sem fiança, para aqueles casos de crimes inafiançáveis. A distinção está clara, inquestionavelmente delineada, e por conta disso, até pouco tempo a
discussão era meramente acadêmica, não divergindo os manuais a este respeito. Sempre se admitiu que após efetivada a prisão em flagrante, não sendo caso de relaxamento ou liberdade provisória mediante fiança, era possível a concessão de liberdade provisória sem fiança. A Constituição Federal, por seu turno, dispõe no art. 5º, XLII, XLIII e XLIV1, a respeito da inafiançabilidade de determinados crimes, mas isso não implica dizer que estes mesmos crimes não comportam liberdade provisória sem fiança. Conforme enfatiza EUGÊNIO PACELLI DE OLIVEIRA “A inafiançabilidade não pode e não deve — considerados os princípios da presunção de inocência, da dignidade da pessoa humana, da ampla defesa e do devido processo legal — constituir causa impeditiva da liberdade provisória”2. Nada obstante esta evidente diferença que há, permanece majoritária a corrente jurisprudencial no sentido de que a inafiançabilidade imposta pela Constituição Federal impede a liberdade provisória sem fiança3. Há quem chegue a afirmar que “o inciso II do art. 2º da Lei 8.072/90, quando impedia a ‘fiança e a liberdade provisória’, de certa forma incidia em redundância, dado que, sob o prisma constitucional (inciso XLIII do art. 5º da CF/88), tal ressalva era desnecessária. Redundância que foi reparada pelo art. 1º da Lei 11.464/07, ao retirar o excesso verbal e manter, tão somente, a vedação do instituto da fiança”4. Com todo respeito, se a intenção do legislador fosse corrigir excessos e proibir a liberdade provisória, por certo teria retirado do inciso II do art. 2º da Lei n. 8.072/90 não a expressão “liberdade provisória”, como fez, mas sim a referência à “fiança”. Aí resultaria vedado, ao menos na lei referida, o gênero, e não a espécie. Para nós, inafiançabilidade é a característica daquilo que não comporta fiança. Se a pretensão do legislador constituinte era dizer mais que isso, deveria ter dito que aqueles crimes a que se refere são insuscetíveis de liberdade provisória. Mas não disse, e por isso não podemos dar interpretação mais larga ao dispositivo que impõe restrição ao sagrado direito à liberdade, valor de extração máxima no texto constitucional. Ademais, como disse o Min. MARCO AURÉLIO , “sendo o Direito uma ciência, há de emprestar-se sentido técnico a institutos, expressões e vocábulos”5. É acertada, portanto, a visão do Min. CELSO LIMONGI quando aponta a distinção que há entre as situações tratadas, para concluir que “a proibição da liberdade provisória com fiança não compreende a da liberdade provisória sem a fiança”6. Nesta mesma linha é que decidiu o ex-Ministro EROS GRAU, conforme segue: “A inafiançabilidade, por si só, não pode e não deve constituir-se em causa impeditiva da liberdade provisória. Não há antinomia na Constituição do Brasil. Se a regra nela estabelecida, bem assim na legislação infraconstitucional, é a liberdade, sendo a prisão a exceção, existiria conflito de normas se o artigo 5º, inciso XLII estabelecesse expressamente, além das restrições nele contidas, vedação à liberdade provisória. Nessa hipótese, o conflito dar-se-ia, sem dúvida, com os princípios da dignidade da pessoa humana, da presunção de inocência, da ampla e do devido processo legal”7. Trataremos neste capítulo da liberdade provisória mediante fiança. Da outra cuidaremos no capítulo seguinte.
3. CONCEITO A fiança aqui tratada, espécie ligada ao gênero liberdade provisória, é uma garantia real que se
presta como contracautela de escorreita prisão em flagrante levada a efeito, com a finalidade de ter restituída a liberdade do autuado e para que assim permaneça durante o transcurso da investigação policial e de eventual processo criminal relacionados ao delito que se lhe imputa. Pode ser efetivada mediante pagamento em dinheiro ou entrega de bens e valores. Na dicção do art. 330 do CPP, a fiança consistirá em depósito de dinheiro, pedras, objetos ou metais preciosos, título da dívida pública, federal, estadual ou municipal, ou em hipoteca inscrita em primeiro lugar8. O conceito de fiança libertadora/liberadora aqui apresentado não se confunde com aquele emprestado à fiança restritiva que está listada entre as medidas cautelares diversas da prisão, no art. 319, VIII, do CPP.
4. NATUREZA JURÍDICA É modalidade de garantia real; espécie do gênero caução, e constitui direito subjetivo constitucionalmente assegurado. Na lição de MARIA HELENA DINIZ, “a garantia real apresenta-se como um direito acessório, uma vez que sua existência só se compreende se houver uma relação jurídica obrigacional, cujo adimplemento assegura”9. Há que se enfatizar a necessária distinção que se deve fazer entre a fiança liberadora ou libertadora, que se presta após prisão em flagrante, daquela que pode ser imposta como medida cautelar, regulada no art. 319, VIII, do CPP, que implica restrição ou ônus, embora algumas vezes se apresente como alternativa à prisão preventiva. Em relação à fiança na modalidade de medida cautelar restritiva, não é correto entender constitua direito subjetivo do indiciado ou réu. Enquanto uma restitui a liberdade de quem fora preso em flagrante e só pode ser manuseada até o momento do art. 310 do CPP, a outra significa restrição, e poderá ser imposta em qualquer fase da investigação ou do processo, à luz do disposto no art. 334 do CPP.
5. FINALIDADE A finalidade da fiança é permitir que alguém aguarde as investigações policiais e o curso de eventual processo criminal em liberdade, daí a definição: liberdade provisória, mediante fiança. Necessário anotar, entretanto, que, a rigor, provisória será sempre a prisão — seja ela fundada em que título for — e a liberdade sempre será definitiva. Mas não é só. Também se presta à garantia do pagamento das custas do processo acaso existentes; eventual indenização do dano causado com o delito, se o réu for condenado, bem como pagamento da pena de prestação pecuniária ou da pena de multa, quando impostas.
6. CABIMENTO A apuração das hipóteses de cabimento de fiança impõe se estabeleça raciocínio de exclusão. É dizer: para se chegar às hipóteses em que cabível é preciso antes conhecer as vedações. Onde não for vedada, será permitida a fiança, e as vedações estão expressas na legislação. Portanto, onde não há vedação legal, admite-se fiança.
6.1. Inafiançabilidade por imperativo constitucional
Nos precisos termos do art. 5º, XLII, XLIII e XLIV, da CF: XLII — a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei; XLIII — a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem; XLIV — constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático. São estas as hipóteses de inafiançabilidade por imperativo constitucional, e o catálogo dos crimes bem demonstra a necessidade de tratamento penal mais rigoroso para casos tais. Ocorre, entretanto, que embora não seja possível liberdade provisória mediante fiança em casos tais, poderá ser concedida liberdade provisória sem fiança, salvo se presentes os requisitos da prisão preventiva, que então deverá ser decretada. Isso demonstra, sem dúvida, que o correto e mais justo seria acabar com o instituto da liberdade provisória sem fiança e permitir a fiança para todos os casos — salvo quando presentes os requisitos da prisão preventiva — alcançando assim os crimes mais graves, dentre os quais se destacam os hediondos e assemelhados. Pela nossa proposta, só seria possível a liberdade provisória sem fiança nos casos de comprovada hipossuficiência econômico-financeira. Para todos os demais, fiança.
6.2. Inafiançabilidade conforme as regras do CPP As hipóteses que não comportam fiança segundo o CPP estão listadas nos arts. 323 e 324. Antes da reforma introduzida com a Lei n. 12.403/2011, não se concedia fiança: nos crimes punidos com reclusão em que a pena mínima cominada fosse superior a dois anos; nas contravenções tipificadas nos arts. 59 e 60 da LCP; nos crimes dolosos punidos com pena privativa da liberdade, se o réu já tivesse sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado; em qualquer caso, se houvesse no processo prova de ser o réu vadio; nos crimes punidos com reclusão, que provocassem clamor público ou que tivessem sido cometidos com violência contra a pessoa ou grave ameaça; aos que, no mesmo processo, tivessem quebrado fiança anteriormente concedida ou infringido, sem motivo justo, qualquer das obrigações a que se refere o art. 350; em caso de prisão por mandado do juiz do cível, de prisão disciplinar, administrativa ou militar; ao que estivesse no gozo de suspensão condicional da pena (art. 77 do CP) ou de livramento condicional (art. 88 do CP), salvo se processado por crime culposo ou contravenção que admitisse fiança; quando presentes os requisitos autorizadores da decretação de prisão preventiva (art. 312). O instituto da fiança existia para quase nada, por isso seu descrédito até ser reformulado. Na redação vigente encontramos as seguintes vedações nos arts. 323 e 324 do CPP: Art. 323. Não será concedida fiança: I — nos crimes de racismo; II — nos crimes de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, terrorismo e nos definidos como crimes hediondos; III — nos crimes cometidos por grupos armados, civis ou militares, contra a ordem
constitucional e o Estado Democrático; IV — (revogado); V — (revogado). O atual art. 323, I, II e III, do CPP relaciona as mesmas proibições contidas na Constituição Federal, art. 5º, XLII, XLIII e XLIV, na exata mesma ordem10. Sobre os crimes de racismo, consultar a Lei n. 7.716, de 5 de janeiro de 1989, e a Lei n. 9.459, de 13 de maio de 1997. Dos crimes hediondos cuida a Lei n. 8.072, de 25 de julho de 1990. O tráfico de drogas é tratado na Lei n. 11.343, de 23 de agosto de 2006. A Lei n. 7.170, de 14 de dezembro de 1983, disciplina os crimes contra a segurança nacional, a ordem política e social. Com a reformulação do inciso I do art. 323, deixou de ter sentido a Súmula 81 do STJ, com o seguinte teor: “Não se concede fiança quando, em concurso material, a soma das penas mínimas cominadas for superior a dois anos de reclusão” (DJ de 29-6-1993, p. 12982). Art. 324. Não será, igualmente, concedida fiança: I — aos que, no mesmo processo, tiverem quebrado fiança anteriormente concedida ou infringido, sem motivo justo, qualquer das obrigações a que se referem os arts. 327 e 328 deste Código; II — em caso de prisão civil ou militar; III — (revogado); IV — quando presentes os motivos que autorizam a decretação da prisão preventiva (art. 312)11. A teor do art. 324, não será arbitrada uma segunda fiança no mesmo processo àquele que dela se mostrou desmerecedor, por ter ensejado o quebramento de outra anteriormente arbitrada. Embora com alguns ajustes na redação, o inciso I do art. 324 tem o mesmo conteúdo de antes, até porque a referência que fazia ao art. 350, e agora não faz, era absolutamente desnecessária, porquanto redundante, já que as obrigações do art. 350 se referem exatamente àquelas dos arts. 327 e 328, que tratam do quebramento de fiança. As hipóteses de quebramento estão listadas nos arts. 327, 328 e 341 do CPP, e serão analisadas detidamente em tópico distinto, neste mesmo capítulo. A redação do atual inciso II do art. 324 diz menos que sua redação anterior, quando então referia à proibição de fiança “em caso de prisão por mandado do juiz do cível, de prisão disciplinar, administrativa ou militar”. A inafiançabilidade no caso de prisão civil foi mantida, com redação mais adequada e objetiva, e tem visceral relação com a prisão do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia, conforme autoriza o art. 733, § 1º, do CPC, lastreado no art. 5º, LXVII, da CF. Dada a natureza constritiva da prisão civil, não teria sentido algum permitir a fiança, que neste caso seria até mesmo imoral. É bem verdade que o dispositivo constitucional citado faz referência à prisão por dívida de alimentos e à prisão do depositário infiel. De ver, entretanto, que o STF já aboliu do ordenamento esta modalidade de prisão por dívida ao editar a Súmula Vinculante n. 25, que tem o seguinte teor: “É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito”.
A ausência de referência à prisão administrativa era necessária visto que esta modalidade de prisão já foi extinta do ordenamento jurídico brasileiro, que somente admite prisão em razão de flagrante ou por ordem escrita da autoridade judiciária, ressalvados os casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei, nos termos preconizados no art. 5º, LXI, da CF. Foi mantida a inafiançabilidade da prisão militar, dadas as suas peculiaridades, natureza e regulamentação específica. Também não será concedida fiança quando presentes os motivos que autorizam a decretação da prisão preventiva, e aqui as razões são óbvias, pois, se é caso de manter preso o agente, não teria sentido algum liberá-lo mediante fiança para em seguida decretar sua prisão preventiva. Acrescente-se a este rol a proibição contida no art. 7º da Lei n. 9.034, de 3 de maio de 1995, segundo o qual “não será concedida liberdade provisória, com ou sem fiança, aos agentes que tenham tido intensa e efetiva participação na organização criminosa”.
7. QUEM PODE POSTULAR A fiança pode ser postulada pelo próprio preso ou alguém por ele, diretamente ou por meio de defensor, sendo esta a hipótese mais comum. Também o Ministério Público pode, e deve, quando cabível, postular a liberdade provisória do investigado mediante fiança.
8. QUEM PODE ARBITRAR FIANÇA O termo “conceder fiança” já era utilizado desde o início da vigência do CPP e foi mantido nos arts. 322, 323, 324, 325 etc. Quer nos parecer, todavia, que a autoridade não concede fiança, mas reconhece o direito a que alguém preste este tipo de caução. Direito previsto na Constituição Federal, a propósito. De forma mais objetiva, preferimos dizer que a autoridade policial arbitra a fiança, cujo valor também deverá estipular. O art. 325 do CPP diz que o valor da fiança será fixado pela autoridade que a conceder. Que autoridade é esta a que a lei se refere? Autoridade policial e judiciária. Ambas poderão arbitrar fiança, ex officio ou em razão de provocação, conforme segue.
8.1. A autoridade policial Efetuada a prisão em flagrante, após a lavratura do respectivo auto a autoridade policial que o presidiu12 poderá reconhecer o direito do agente à obtenção da liberdade provisória mediante fiança. Só é possível pensar na possibilidade de fiança em sede de repartição policial em se tratando de prisão em flagrante. Neste tema a Lei n. 12.403/2011 ampliou consideravelmente as hipóteses, pois na redação antiga do art. 322 a autoridade policial somente poderia conceder fiança nos casos de infração punida com detenção ou prisão simples. Nos dias que correm, poderá conceder fiança nos casos de infração cuja pena privativa de liberdade máxima não seja superior a quatro anos. Entenda-se: quatro, inclusive. Nas hipóteses de concurso de crimes — arts. 69, 70 e 71 do CP — as repercussões nas penas cominadas deverão ser observadas.
Assim, nos moldes do que dispunha a fulminada Súmula 81 do STJ13, a autoridade policial não poderá arbitrar fiança quando, em concurso material (art. 69 do CP), a soma das penas mínimas cominadas for superior a quatro anos. Ocorrendo concurso formal, a pena máxima cominada ao crime mais grave deve ser aumentada de metade (máximo permitido no art. 70 do CP). Se o total superar o limite de 4 (quatro) anos, a autoridade policial não poderá arbitrar fiança. Se a hipótese evidenciar crime continuado, a pena máxima cominada ao crime mais grave — se diversos — deve ser aumentada de 2/3 (máximo permitido no art. 71, caput, do CP). De igual maneira, se ultrapassada a barreira dos 4 (quatro) anos, a autoridade policial não poderá arbitrar fiança. As qualificadoras também devem ser consideradas para efeito de apurar a alçada da autoridade policial. De tal sorte, o que se deve levar em conta é a correta adequação típica da conduta. Com vistas a apurar a maior pena abstratamente cominada, também as causas de aumento e diminuição de pena repercutem na delimitação da alçada policial. Na primeira hipótese, a pena máxima cominada ao delito deve sofrer o aumento máximo previsto. Na segunda, a pena máxima cominada sofrerá a diminuição mínima. Na hipótese de crime tentado, observada a pena máxima cominada, aplica-se a menor redução permitida no art. 14, II, do CP: 1/3 (um terço). As circunstâncias agravantes (arts. 61 e 62 do CP) e as atenuantes (arts. 65 e 66 do CP) não devem ser levadas em conta para fins de delimitação da alçada da autoridade policial no arbitramento de fiança. A partir da Lei n. 12.403/2011 a autoridade policial passou a ter atribuições para tratar de fiança nos crimes punidos com reclusão, coisa que antes não ocorria. É salutar a alteração do art. 322, visto que em relação aos delitos com pena cominada até quatro anos, em caso de condenação, poderá ocorrer imposição de penas restritivas de direitos (art. 44 do CP), não sendo razoável tampouco proporcional manter preso, ainda que brevemente, quem poderá, se condenado for, não ficar um único dia na prisão. De ver, ainda, a possibilidade de suspensão condicional do processo (art. 89 da Lei n. 9.099/95) a quem, por exemplo, for preso em flagrante por furto simples (art. 155, caput, do CP), dentre outros delitos que integram a rotina das repartições policiais, o que também justifica seja desde logo colocado em liberdade mediante fiança, imediatamente após a lavratura do auto de prisão em flagrante. Por força do disposto no art. 325, I, do CPP, na fixação do valor da fiança a autoridade policial deverá observar os parâmetros mínimo e máximo, de um a cem salários mínimos.
8.2. O juiz Se a autoridade policial não fixar a fiança quando cabível, caberá ao juiz competente estabelecê-la, devendo assim proceder no momento do art. 310 do CPP, conforme decorre do art. 5º, LXVI, da CF, segundo o qual “ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança”. Não é por outra razão que o art. 5º, LXII, da CF manda que a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre sejam comunicados imediatamente ao juiz competente. O conhecimento imediato da prisão pelo juiz tem por objetivo eventual relaxamento, quando ilegal (art. 5º, LXV, da CF), ou concessão de liberdade provisória, com ou sem fiança (art. 5º, LXVI, da CF), nas hipóteses em que admitida. A própria ordem topográfica dos incisos referidos assim informa,
quando nem seria preciso no Estado de Direito. Mesmo diante do imperativo constitucional, que determina ao juiz apreciar o cabimento de liberdade provisória, com ou sem fiança, já no primeiro instante em que se defrontar com situação de prisão em flagrante, dispõe o art. 335 do CPP que: “Recusando ou retardando a autoridade policial a concessão da fiança, o preso, ou alguém por ele, poderá prestá-la, mediante simples petição, perante o juiz competente, que decidirá em 48 (quarenta e oito) horas”. Também caberá ao juiz a fixação da fiança naqueles casos que extrapolam a alçada da autoridade policial — pena cominada superior a quatro anos. Apresentado o pedido, sobre ele o juiz deverá decidir em 48 (quarenta e oito) horas, conforme regra contida no parágrafo único do art. 322 do CPP. Registre-se que a previsão de tal prazo evidencia uma vez mais a falta de visão sistêmica do legislador, considerando o disposto no art. 310, III, c/c o § 1º do art. 306, ambos do CPP. Na busca conciliatória, a melhor interpretação faz concluir que após receber o auto de prisão em flagrante (§ 1º do art. 306 do CPP) o juiz deverá decidir sobre as situações tratadas no art. 310 no prazo de 48 (quarenta e oito) horas (art. 322, parágrafo único, do CPP). Somente após a decisão judicial é que se abrirá vista dos autos ao Ministério Público (art. 333 do CPP) para que se manifeste, requerendo o que entender de direito. O juiz poderá fixar fiança, ainda, em qualquer momento da investigação ou do processo, e mesmo por ocasião da sentença condenatória ou decisão de pronúncia, quando se tratar de medida cautelar, conforme regulada no art. 319, VIII, do CPP. A autorização para que assim proceda no momento da sentença condenatória ou da decisão de pronúncia se extrai do disposto no parágrafo único do art. 387 e do § 3º do art. 413 do CPP, respectivamente. Não é correto dizer, portanto, que o instituto da fiança está relacionado exclusivamente com a prisão em flagrante. Para a autoridade policial sim, mas para o juiz não.
8.3. Fiança junto aos Tribunais Dispõe o art. 581, V, do CPP, que caberá recurso em sentido estrito contra a decisão que conceder, negar, arbitrar, cassar ou julgar inidônea a fiança. Nada obstante a literalidade do texto da lei, a demora na apreciação de eventual recurso em sentido estrito fará impor, convenhamos, reluzente e lastimável constrangimento ilegal naquelas hipóteses em que negada a fiança na instância inferior quando permitida a cautela, daí a necessidade e adequação de providência mais célere, como é o caso do habeas corpus. A fixação da fiança junto aos Tribunais, portanto, poderá decorrer do provimento de eventual inconformismo contra decisão judicial de instância inferior. Nos processos de competência originária também poderá ser fixada fiança junto aos Tribunais, hipótese em que caberá ao relator do processo assim proceder.
9. MOMENTO DA CONCESSÃO Na dicção do art. 334 do CPP, a fiança pode ser concedida e, portanto, prestada, em qualquer fase do inquérito ou do processo, até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória14, mas esta afirmação reclama uma reflexão maior, já que o art. 310 do CPP determina que no momento do controle jurisdicional que se segue à prisão em flagrante (art. 306, § 1º, do CPP), o juiz deverá:
relaxar a prisão, se ilegal; converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos do art. 312 do CPP, e se acenar insuficiente ou inadequada a aplicação de medidas cautelares diversas da prisão; ou conceder liberdade provisória, com ou sem fiança. Nestes termos, a fiança libertadora da prisão em flagrante, a rigor, só terá cabimento dentro do período que medeia a lavratura do auto de prisão e a materialização do art. 310 do CPP. Exceto nos casos de provimento de recurso em sentido estrito ou concessão de habeas corpus por negativa do direito na instância inferior, daquele momento em diante só será correto pensar em fiança enquanto medida cautelar do art. 319, VIII, do CPP, sendo possível, neste caso, que, mesmo depois de decretada a prisão preventiva por ocasião do art. 310, II, do CPP, reconsidere o juiz a respeito da necessidade e utilidade do encarceramento, ocasião em que poderá substituir a privação cautelar da liberdade pela medida restritiva denominada fiança. Conforme assinalado anteriormente, a fiança como medida cautelar restritiva poderá ser fixada até mesmo no momento da sentença condenatória ou da decisão de pronúncia, a teor do disposto no parágrafo único do art. 387 e do § 3º do art. 413 do CPP, respectivamente.
10. QUEM PODE PRESTAR FIANÇA O indiciado ou réu ou alguém por ele, conforme decorre do art. 335 do CPP, estão legitimados a prestar fiança. A propósito, dispõe o art. 329 do CPP que, nos juízos criminais e delegacias de polícia, haverá um livro especial, com termos de abertura e de encerramento, numerado e rubricado em todas as suas folhas pela autoridade, destinado especialmente aos termos de fiança. O termo será lavrado pelo escrivão e assinado pela autoridade e por quem prestar a fiança, e dele extrair-se-á certidão para juntar-se aos autos. E arremata o parágrafo único: o réu e quem prestar a fiança serão pelo escrivão notificados das obrigações e da sanção previstas nos arts. 327 e 328, o que constará dos autos.
11. DESTINAÇÃO DA FIANÇA Prestada a fiança, o valor em que consistir será recolhido à repartição arrecadadora federal ou estadual, ou entregue ao depositário público, juntando-se aos autos os respectivos conhecimentos. Nos lugares em que o depósito não se puder fazer de pronto, o valor será entregue ao escrivão ou pessoa abonada, a critério da autoridade, e dentro de três dias dar-se-á ao valor o destino, devendo tudo constar do termo de fiança, conforme disciplina o art. 331 do CPP. O dinheiro ou objetos dados como fiança servirão ao pagamento das custas, da indenização do dano, da prestação pecuniária e da multa, se o réu for condenado, mesmo no caso de prescrição depois da sentença condenatória (art. 110 do Código Penal), conforme dispõe o art. 336 do CPP.
12. OBRIGAÇÕES DO AFIANÇADO A fiança tomada por termo obrigará o afiançado a comparecer perante a autoridade, todas as vezes que for intimado para atos do inquérito e da instrução criminal e para o julgamento (art. 327 do CPP). O réu afiançado não poderá mudar de residência, sem prévia permissão da autoridade processante, ou ausentar-se por mais de oito dias de sua residência, sem comunicar àquela autoridade o lugar onde será encontrado. A violação das regras acima implicará quebramento da fiança, cujas consequências serão analisadas mais adiante.
13. VALOR DA FIANÇA Para determinar o valor da fiança, a autoridade policial ou judiciária levará em consideração a natureza da infração; as condições pessoais de fortuna e vida pregressa do indiciado ou acusado, as circunstâncias indicativas de sua periculosidade, bem como a importância provável das custas do processo, até final julgamento (art. 326 do CPP). A Lei n. 12.403/2011 alterou consideravelmente os parâmetros para fixação do valor da fiança. Foram revogadas as alíneas a, b e c do art. 325, que escalonavam a fiança entre um e cinco salários mínimos quando a infração penal fosse punida em grau máximo com pena privativa de liberdade até dois anos; entre cinco e vinte salários mínimos quando a infração fosse punida em seu grau máximo com pena privativa de liberdade até quatro anos, e de vinte a cem salários mínimos quando a pena, em grau máximo, fosse superior a quatro anos. Atualmente são apenas dois os parâmetros introduzidos pelos incisos I e II do art. 325, também reformulados pela Lei n. 12.403/2011, a saber: 1º) de um a cem salários mínimos, quando se tratar de infração cuja pena privativa de liberdade, no grau máximo, não for superior a quatro anos; 2º) de dez a duzentos salários mínimos, quando o máximo da pena privativa de liberdade cominada for superior a quatro anos. Estes valores poderão sofrer modificações, para menor ou para maior, podendo, ainda, em último caso, ser dispensado o pagamento integral da fiança arbitrada, sempre que assim recomendar a situação econômica do investigado ou acusado. Nestes termos é que a fiança poderá ser: dispensada, na forma do art. 350 do CPP; reduzida até o máximo de 2/3; ou, aumentada em até mil vezes. Nos dias que correm, o valor mínimo da fiança será de um salário mínimo reduzido até o máximo de 2/3. Já o valor máximo poderá chegar até duzentos mil salários mínimos. Conforme a redação antiga do art. 325 do CPP, a redução era no mesmo patamar de agora, mas o aumento permitido era no máximo até o décuplo, salvo nos casos de prisão em flagrante pela prática de crime contra a economia popular ou de sonegação fiscal, quando então havia regras particulares, conforme dispunha o § 2º, II, também do art. 325, expressamente revogados pelo art. 4º da Lei n. 12.403/2011. Como se vê, foram consideravelmente ampliadas as hipóteses de cabimento de liberdade provisória mediante fiança e também os seus valores. Tudo de forma a revigorar o instituto que sempre esteve em péssimas condições de regulamentação jurídica e, bem por isso, amesquinhado na realidade prática, inclusive em decorrência da possibilidade de liberdade provisória sem fiança, conforme anunciamos na introdução a este capítulo e retomaremos no capítulo seguinte.
14. EXTINÇÃO DA FIANÇA A fiança será considerada extinta quando for julgada: quebrada, perdida, cassada ou sem efeito.
14.1. Fiança quebrada A quebra da fiança decorre do descumprimento de condição imposta. Antes da Lei n. 12.403/2011, conforme o art. 341 do CPP, considerava-se quebrada a fiança quando o réu, legalmente intimado para ato do processo, deixasse de comparecer, sem provar, incontinenti, motivo justo, ou quando, na vigência da fiança, praticasse outra infração penal.
Como se vê, na regulamentação passada bastava o desatendimento a um chamado judicial para o processo criminal ou a prática de nova infração penal, de qualquer natureza — crime ou contravenção, dolosa ou culposa —, para que a fiança fosse julgada quebrada. Havia excessivo rigor, até certo ponto injustificado, especialmente em relação à possibilidade de quebra em razão da prática de infração penal de natureza culposa15. A atual regulamentação das hipóteses de quebramento é mais acertada e restritiva, embora não esteja longe de merecer crítica. Nos precisos termos do novo art. 341 do CPP, julgar-se-á quebrada a fiança quando o acusado: “I — regularmente intimado para ato do processo, deixar de comparecer, sem motivo justo; II — deliberadamente praticar ato de obstrução ao andamento do processo; III — descumprir medida cautelar imposta cumulativamente com a fiança; IV — resistir injustificadamente a ordem judicial; V — praticar nova infração penal dolosa”. De início é preciso anotar que, embora o art. 341, caput, fale em acusado, as hipóteses de quebramento não estão vinculadas tão somente à fase judicial, alcançando também a fase de investigação policial — fase de inquérito, conforme veremos adiante. A primeira hipótese está relacionada com o descaso do acusado em relação ao andamento do processo. Refere-se exclusivamente à fase processual e não à fase preliminar, de investigação. Somente o descaso injustificado é que poderá implicar quebramento de fiança. Portanto, não é correto deduzir o abandono a partir de qualquer comportamento, devendo, antes da decisão judicial a respeito, proceder-se à intimação do afiançado para que apresente justificativa, caso não se tenha antecipado a fazê-lo. Após, deverá ser providenciada a abertura de vista dos autos ao Ministério Público, a fim de que se manifeste previamente à decisão judicial que em seguida será proferida. De ver, entretanto, que nos precisos termos do art. 327 do CPP, cuja redação não foi alcançada pela Lei n. 12.403/2011, a fiança tomada por termo obrigará o afiançado a comparecer perante a autoridade todas as vezes em que for intimado para atos do inquérito e da instrução criminal e para o julgamento. Como se vê, o descaso injustificado para com o inquérito ou o processo, por um ou outro fundamento legal, poderá levar à quebra da fiança. A segunda hipótese de quebramento trata de situação em que o afiançado deliberadamente praticar ato de obstrução ao andamento do processo. Mais uma vez a referência ao andamento do processo, de modo a restringir o alcance da situação regulada. Ocorrerá obstrução deliberada ao andamento do processo, por exemplo, quando o afiançado criar algum empecilho à realização de determinado exame pericial imprescindível ou à colheita de prova oral; arrolar testemunha “de antecedentes” com endereço em localidade distante e inacessível, bem como substituí-la por outra em igual situação geográfica, de forma a evidenciar condenável chicana processual; contratar e destituir defensor, repetidas e seguidas vezes, visando a morosidade da marcha procedimental etc. O art. 328 do CPP, que não foi modificado pela Lei n. 12.403/2011, tem relação com a situação tratada, na medida em que também determina o quebramento da fiança se o réu afiançado mudar de residência, sem prévia permissão da autoridade processante, ou ausentar-se por mais de oito dias de sua residência, sem comunicar àquela autoridade o lugar onde será encontrado. A terceira hipótese de quebramento consiste no descumprimento de medida cautelar imposta
cumulativamente com a fiança, o que poderá ocorrer tanto na fase de inquérito quanto na fase do processo criminal. As medidas cautelares diversas da prisão encontram-se listadas nos arts. 319 e 320 do CPP. A quarta hipótese — resistir injustificadamente a ordem judicial — pode ser verificada tanto na fase de inquérito quanto na fase de processo. Expedida a ordem judicial, seja ela para que finalidade for, seu descumprimento injustificado resultará em quebramento da fiança. A quinta hipótese, última dentre as listadas no art. 341, refere-se à prática de nova infração penal dolosa. Adotada no Direito Penal brasileiro a classificação bipartida, por infração penal entenda-se: crime ou contravenção, e aqui, segundo pensamos, há exagero praticado pelo legislador. Esta hipótese de quebramento deveria referir-se apenas à prática de crime doloso, de maneira a não alcançar as contravenções. De qualquer forma, já houve alguma evolução em relação ao sistema anterior, onde a prática de infração penal culposa permitia o quebramento.
14.1.1. Consequências do quebramento O quebramento da fiança não acarreta, por si, o recolhimento ao cárcere. Não implica na expedição de mandado de prisão, o que autoriza dizer que não há prisão por quebra de fiança16. O quebramento importará, entretanto, na perda de metade do seu valor, cabendo ao juiz decidir sobre a imposição de outras medidas cautelares dentre aquelas reguladas nos arts. 319 e 320 do CPP, ou, se for o caso, a decretação da prisão preventiva. Conforme o art. 324, I, do CPP, não será arbitrada nova fiança aos que, no mesmo processo, tiverem quebrado fiança anteriormente concedida ou infringido, sem motivo justo, qualquer das obrigações a que se referem os arts. 327 e 328 do mesmo Codex. No caso de quebramento de fiança, deduzidas as custas e demais encargos a que o acusado estiver obrigado, o valor restante será recolhido ao fundo penitenciário, na forma da lei (art. 346 do CPP).
14.2. Fiança perdida A fiança perdida está ligada à fuga constatada após o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. Entender-se-á perdido, na totalidade, o valor da fiança, se, condenado, o acusado não se apresentar para o início do cumprimento da pena definitivamente imposta (art. 344 do CPP). No caso de perda da fiança, deduzidas as custas e demais encargos a que o condenado estiver obrigado, seu valor será recolhido ao fundo penitenciário.
14.3. Fiança cassada A fiança que se reconheça não ser cabível na espécie será cassada em qualquer fase do processo (art. 338 do CPP). Imagine-se hipótese em que logo após a lavratura do auto de prisão em flagrante por crime de tráfico de drogas na sua forma fundamental (art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006), a autoridade policial que presidiu o ato arbitrar fiança e o autuado, por ter pago, for colocado em liberdade. Neste caso, diante da evidente violação ao disposto nos arts. 323, II, do CPP, e art. 5º, XLIII, da CF, a fiança deverá ser cassada pelo juiz competente. Caso tenha sido arbitrada de forma equivocada em juízo, poderá ser cassada pelo tribunal em sede
de recurso em sentido estrito que deverá ser interposto pelo Ministério Público (art. 581, V, do CPP). Será também cassada a fiança quando reconhecida a existência de delito inafiançável, no caso de inovação na classificação do delito (art. 339 do CPP). Esta outra hipótese trata de situação em que inicialmente mostrou-se cabível a fiança em razão da interpretação dada ao fato, e por isso foi arbitrada e prestada, mas depois, por força de nova capitulação jurídica que se impôs sobre o mesmo fato, deixou de ser17. É o que ocorrerá, por exemplo, se o delegado de polícia arbitrar fiança por conduta que entenda ajustar-se à figura do art. 140, § 3º, do CP — injúria racial —, mas depois, no curso do processo, ficar apurado que na verdade ocorreu crime de racismo (Lei n. 7.716, de 5-1-1989, e Lei n. 9.459, de 13-51997), para o qual a concessão de fiança está proibida por disposição expressa do art. 5º, XLII, da CF, e do art. 323, I, do CPP. Cassada a fiança, seu valor será atualizado e devolvido integralmente a quem a tenha prestado.
14.4. Fiança sem efeito Fiança sem efeito é a fiança que não foi reforçada. Pode ocorrer, em alguns casos, de a fiança ser mesmo cabível, e por isso acertado o arbitramento levado a efeito pela autoridade policial ou judiciária, mas depois, em razão das situações listadas no art. 340 do CPP, que não foi alterado pela Lei n. 12.403/2011, ser necessário se proceda à complementação de seu valor. Nestes casos, ao contrário do que ocorre com a fiança cassada, ela será cabível desde o início, e continuará sendo, mesmo que ocorra nova interpretação jurídica do fato. As hipóteses previstas são as seguintes: “I — quando a autoridade tomar, por engano, fiança insuficiente; II — quando houver depreciação material ou perecimento dos bens hipotecados ou caucionados, ou depreciação dos metais ou pedras preciosas; III — quando for inovada a classificação do delito”. Na fixação do valor da fiança a autoridade deverá levar em consideração a natureza da infração, as condições pessoais de fortuna e vida pregressa do acusado, as circunstâncias indicativas de sua periculosidade, bem como a importância provável das custas do processo, até final julgamento (art. 326 do CPP). Fixadas estas premissas, não fica difícil imaginar a necessidade de reforço da fiança por força de uma posterior reavaliação das variantes atreladas aos incisos I e III do art. 340. No que tange ao inciso II do art. 340, o reforço se mostrará necessário não em razão da conduta, de nova capitulação ou circunstâncias de caráter pessoal, mas pela depreciação do bem dado em garantia. Dispõe o parágrafo único do art. 340 que “a fiança ficará sem efeito e o réu será recolhido à prisão, quando, na conformidade deste artigo, não for reforçada”, mas sobre este retorno à prisão, que entendemos impossível, trataremos em item específico, mais à frente. Se a fiança for declarada sem efeito, o valor que a constituir, atualizado, será restituído sem desconto a quem a tenha prestado.
15. SENTENÇA NO PROCESSO DE CONHECIMENTO 15.1. Absolvição Se passar em julgado sentença que houver absolvido o acusado ou declarado extinta a ação penal, salvo, neste caso, se tiver ocorrido prescrição da pretensão executória18, o valor da fiança, atualizado,
será restituído sem desconto, conforme determina o art. 337 do CPP.
15.2. Condenação O dinheiro ou objetos dados como fiança servirão ao pagamento das custas, da indenização do dano19, da prestação pecuniária20 e da multa21, se o réu for condenado22. Feitas as destinações acima apontadas, na medida em que cabíveis, se houver saldo remanescente o valor deverá ser atualizado e devolvido a quem prestou a fiança.
16. FIANÇA DISPENSADA Fiança dispensada é aquela que, embora cabível e por isso arbitrada, não pode ser prestada em razão da situação de pobreza do agente, que então deverá receber liberdade provisória na forma do art. 350 do CPP. Sobre a impossibilidade de vinculação do agente às obrigações dos arts. 327 e 328 do CPP, consultar nossos comentários no capítulo seguinte, item “9. A questão da vinculação da liberdade provisória sem fiança”.
17. FIANÇA REDUZIDA E FIANÇA AUMENTADA Nos precisos termos do art. 325, § 1º, II e III, do CPP, respectivamente, se assim recomendar a situação econômica do preso, a fiança poderá ser: reduzida até o máximo de 2/3, ou aumentada em até mil vezes.
18. FIANÇA RESTAURADA OU RESTABELECIDA A fiança cassada poderá eventualmente ser restaurada ou restabelecida em razão de provimento a recurso em sentido estrito interposto contra a decisão (art. 581, V, do CPP).
19. O MINISTÉRIO PÚBLICO E A FIANÇA Apresentado o pedido em juízo, o Ministério Público somente terá vista dos autos após arbitrada e paga a fiança. Se fixada pela autoridade policial por ocasião da lavratura do auto de prisão em flagrante, após a comunicação da prisão ao juiz competente e ao próprio Ministério Público, providência introduzida pela Lei n. 12.403/2011, que alterou o art. 306 do CPP neste sentido, deverá manifestar-se a respeito. Nesta mesma linha de raciocínio, se fixada em juízo, determina o art. 333 do CPP que, depois de prestada a fiança, o Ministério Público terá vista dos autos a fim de requerer o que julgar conveniente. Bem, mas se já foi arbitrada e prestada fiança, o que restará ao Ministério Público fazer? Analisando o caso concreto, poderá requerer, por exemplo, reforço (art. 340) ou cassação (art. 338) da fiança, bem como a imposição de medidas cautelares restritivas (arts. 319 e 320 do CPP). Há que se considerar, ainda, hipótese em que lavrado o auto de prisão em flagrante tenha a autoridade policial deixado de arbitrá-la, em desconformidade com a lei, quando então o Ministério Público deverá requerer o arbitramento ao juiz competente. Dispõe o art. 348 do CPP que, nos casos em que a fiança tiver sido prestada por meio de hipoteca, a execução será promovida no juízo cível pelo órgão do Ministério Público.
20. EXTINÇÃO DA FIANÇA LIBERTADORA E IMPOSSIBILIDADE DE RETORNO
À PRISÃO Questão de suma importância é saber se a extinção da fiança pode ensejar o retorno do agente ao cárcere. Na vigência da regulamentação passada sempre se praticou a volta do afiançado à prisão quando quebrada a fiança; julgada sem efeito ou cassada, situação com a qual jamais concordamos. Havia previsão expressa determinando o retorno à prisão na hipótese de fiança quebrada, conforme dizia o art. 343 do CPP, mas este artigo foi reformulado com a Lei n. 12.403/2011, e hoje não mais contempla tal consequência. Com relação à fiança sem efeito, o parágrafo único do art. 340 do CPP, que infelizmente não foi modificado pela Lei n. 12.403/2011, diz que se assim for declarada pelo juiz o agente será recolhido à prisão. Como se vê, mais um lamentável equívoco do legislador, que andou bem em relação à nova redação do art. 343, mas que não adotou a mesma postura em relação ao art. 340, quando deveria e era de esperar, inclusive com vistas à necessária harmonia sistêmica em relação a este tema. Se aplicada a lei como está, quando o afiançado descumprir as obrigações assumidas, a fiança será quebrada e ele não voltará para a cadeia, mas se deixar de complementar o valor da fiança que inicialmente pagou conforme exigido, aí sim, retornará para a cadeia. Há bom senso nisso? Claro que não. A proposta da lei é imoral, irrazoável, desproporcional, desinteligente e injusta. O certo é que em hipótese alguma o afiançado deverá retornar para a prisão, e já era assim mesmo antes da reforma imposta pela Lei n. 12.403/2011, isso por força do disposto no art. 5º, LXVI, da CF, segundo o qual ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança, mas é preciso reconhecer que na prática judiciária, com apoio da doutrina, a situação sempre foi tratada de maneira diversa. Com efeito, ainda que se tenha por quebrada, insuficiente ou cassada a fiança, se não estiverem presentes os requisitos da prisão preventiva o agente não poderá ser levado à prisão. Ainda que se queira argumentar com a literalidade do parágrafo único do art. 340 do CPP será preciso reconhecer que no mesmo despacho que decidir pela fiança sem efeito o magistrado deverá conceder liberdade provisória, sem fiança, pois não é razoável imaginar que a ausência de reforço do valor da fiança seja causa impeditiva à liberdade provisória mais ampla, cujo dever de observância decorre de imperativo constitucional. Em reforço ao alegado, imagine-se a seguinte hipótese: “Carlos Henrique”, preso em flagrante, pagou fiança e foi colocado em liberdade. Posteriormente a fiança foi julgada sem efeito e apenas por isso ele retornou à prisão. Estando preso, e ausentes os requisitos da prisão preventiva, o que poderia impedir sua liberdade provisória sem fiança? Nem se queira dizer que as hipóteses de quebramento, cassação ou fiança sem efeito, por si, legitimam a decretação da prisão preventiva. É óbvio que não. Se houver alguma dúvida quanto a isso, basta analisar o que escrevemos a respeito da necessidade de fundamentação concreta da decisão que decreta prisão preventiva, no capítulo respectivo.
20.1. Implicações da extinção Se a fiança for julgada quebrada, sem efeito ou cassada, deverá o magistrado decidir sobre a imposição de medidas cautelares restritivas, diversas da prisão, conforme catalogadas no art. 319 do
CPP, que somente não serão aplicadas, isolada ou cumulativamente, se a situação revelar insuficientes e inadequadas, hipótese em que poderá ser decretada a prisão preventiva, se presentes os requisitos legais.
21. REAÇÃO DEFENSIVA Cabe recurso em sentido estrito, com fundamento no art. 581, V, do CPP, contra a decisão que conceder, negar, arbitrar, cassar ou julgar inidônea a fiança. Nos casos em que se fizer evidente o constrangimento ilegal, especialmente por força de decisão que negar, cassar ou julgar inidônea a fiança, será mais eficaz e apropriado o manejo do habeas corpus, com fundamento no art. 5º, LXVIII, da CF, c/c os arts. 647 e 648 do CPP, desde que não seja necessário revolver profundo exame do material cognitivo23.
Liberdade Provisória Mediante Fiança Quadro comparativo da legislação
Como era
Como ficou
Art. 321. Ressalvado o disposto no art. 323, III e IV, o réu livrar-se-á solto, independentemente de fiança: I — no caso de infração, a que não for, isolada, cumulativa ou alternativamente, cominada pena privativa de liberdade; II — quando o máximo da pena privativa de liberdade, isolada, cumulativa ou alternativamente cominada, não exceder a três meses.
Art. 321. Ausentes os requisitos que autorizam a decretação da prisão preventiva, o juiz deverá conceder liberdade provisória, impondo, se for o caso, as medidas cautelares previstas no art. 319 deste Código e observados os critérios constantes do art. 282 deste Código. I — (revogado) II — (revogado).
Art. 322. A autoridade policial somente poderá conceder fiança nos casos de infração punida com detenção ou prisão simples. Parágrafo único. Nos demais casos do art. 323, a fiança será requerida ao juiz, que decidirá em 48 (quarenta e oito) horas.
Art. 322. A autoridade policial somente poderá conceder fiança nos casos de infração cuja pena privativa de liberdade máxima não seja superior a 4 (quatro) anos. Parágrafo único. Nos demais casos, a fiança será requerida ao juiz, que decidirá em 48 (quarenta e oito) horas.
Art. 323. Não será concedida fiança: I — nos crimes punidos com reclusão em que a pena mínima cominada for superior a 2 (dois) anos; II — nas contravenções tipificadas nos arts. 59 e 60 da Lei das Contravenções Penais; III — nos crimes dolosos punidos com pena privativa da liberdade, se o réu já tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado; IV — em qualquer caso, se houver no processo prova de ser o réu vadio; V — nos crimes punidos com reclusão, que provoquem clamor público ou que tenham sido cometidos com violência contra a pessoa ou grave ameaça.
Art. 323. Não será concedida fiança: I — nos crimes de racismo; II — nos crimes de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, terrorismo e nos definidos como crimes hediondos; III — nos crimes cometidos por grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático; IV — (revogado); V — (revogado).
Art. 324. Não será, igualmente, concedida fiança: I — aos que, no mesmo processo, tiverem quebrado fiança anteriormente concedida ou infringido, sem motivo justo, qualquer das obrigações a que se refere o art. 350; II — em caso de prisão por mandado do juiz do cível, de prisão disciplinar, administrativa ou militar; III — ao que estiver no gozo de suspensão condicional da pena ou de livramento condicional, salvo se processado por crime culposo ou contravenção que admita fiança; IV — quando presentes os motivos que autorizam a decretação da prisão preventiva (art. 312).
Art. 324. Não será, igualmente, concedida fiança: I — aos que, no mesmo processo, tiverem quebrado fiança anteriormente concedida ou infringido, sem motivo justo, qualquer das obrigações a que se referem os arts. 327 e 328 deste Código; II — em caso de prisão civil ou militar; III — (revogado); IV — quando presentes os motivos que autorizam a decretação da prisão preventiva (art. 312).
Art. 325. O valor da fiança será fixado pela autoridade que a conceder nos seguintes limites: a) de 1 (um) a 5 (cinco) salários mínimos de referência, quando se tratar de infração punida, no grau máximo, com pena privativa da liberdade, até 2 (dois) anos; b) de 5 (cinco) a 20 (vinte) salários mínimos de referência, quando se tratar de infração punida com pena privativa da liberdade, no grau máximo, até 4 (quatro) anos; c) de 20 (vinte) a 100 (cem) salários mínimos de referência, quando o máximo da pena cominada for superior a 4 (quatro) anos. § 1º Se assim o recomendar a situação econômica do réu, a fiança poderá ser: I — reduzida até o máximo de dois terços; II — aumentada, pelo juiz, até o décuplo. § 2º Nos casos de prisão em flagrante pela prática de crime contra a economia popular ou de crime de sonegação fiscal, não se aplica o disposto no art. 310 e parágrafo único deste Código, devendo ser observados os seguintes procedimentos: I — a liberdade provisória somente poderá ser concedida mediante fiança, por decisão do juiz competente e após a lavratura do auto de prisão em flagrante; II — o valor de fiança será fixado pelo juiz que a conceder, nos limites de dez mil a cem mil vezes o valor do Bônus do Tesouro Nacional — BTN, da data da prática do crime;
Art. 325. O valor da fiança será fixado pela autoridade que a conceder nos seguintes limites: a) (revogada); b) (revogada); c) (revogada). I — de 1 (um) a 100 (cem) salários mínimos, quando se tratar de infração cuja pena privativa de liberdade, no grau máximo, não for superior a 4 (quatro) anos; II — de 10 (dez) a 200 (duzentos) salários mínimos, quando o máximo da pena privativa de liberdade cominada for superior a 4 (quatro) anos. § 1º Se assim recomendar a situação econômica do preso, a fiança poderá ser: I — dispensada, na forma do art. 350 deste Código; II — reduzida até o máximo de 2/3 (dois terços); ou III — aumentada em até 1.000 (mil) vezes. § 2º (Revogado): I — (revogado); II — (revogado); III — (revogado).
III — se assim o recomendar a situação econômica do réu, o limite mínimo ou máximo do valor da fiança poderá ser reduzido em até nove décimos ou aumentado até o décuplo. Art. 326. Para determinar o valor da fiança, a autoridade terá em consideração a natureza da infração, as condições pessoais de fortuna e vida pregressa do acusado, as circunstâncias indicativas de sua periculosidade, bem como a importância provável das custas do processo, até final julgamento.
Dispositivo sem alteração Art. 326. Para determinar o valor da fiança, a autoridade terá em consideração a natureza da infração, as condições pessoais de fortuna e vida pregressa do acusado, as circunstâncias indicativas de sua periculosidade, bem como a importância provável das custas do processo, até final julgamento.
Art. 327. A fiança tomada por termo obrigará o afiançado a comparecer perante a autoridade, todas as vezes que for intimado para atos do inquérito e da instrução criminal e para o julgamento. Quando o réu não comparecer, a fiança será havida como quebrada.
Dispositivo sem alteração Art. 327. A fiança tomada por termo obrigará o afiançado a comparecer perante a autoridade, todas as vezes que for intimado para atos do inquérito e da instrução criminal e para o julgamento. Quando o réu não comparecer, a fiança será havida como quebrada.
Art. 328. O réu afiançado não poderá, sob pena de quebramento da fiança, mudar de residência, sem prévia permissão da autoridade processante, ou ausentar-se por mais de 8 (oito) dias de sua residência, sem comunicar àquela autoridade o lugar onde será encontrado.
Dispositivo sem alteração Art. 328. O réu afiançado não poderá, sob pena de quebramento da fiança, mudar de residência, sem prévia permissão da autoridade processante, ou ausentar-se por mais de 8 (oito) dias de sua residência, sem comunicar àquela autoridade o lugar onde será encontrado.
Art. 329. Nos juízos criminais e delegacias de polícia, haverá um livro especial, com termos de abertura e de encerramento, numerado e rubricado em todas as suas folhas pela autoridade, destinado especialmente aos termos de fiança. O termo será lavrado pelo escrivão e assinado pela autoridade e por quem prestar a fiança, e dele extrair-se-á certidão para juntar-se aos autos. Parágrafo único. O réu e quem prestar a fiança serão pelo escrivão notificados das obrigações e da sanção previstas nos arts. 327 e 328, o que constará dos autos.
Dispositivo sem alteração Art. 329. Nos juízos criminais e delegacias de polícia, haverá um livro especial, com termos de abertura e de encerramento, numerado e rubricado em todas as suas folhas pela autoridade, destinado especialmente aos termos de fiança. O termo será lavrado pelo escrivão e assinado pela autoridade e por quem prestar a fiança, e dele extrair-se-á certidão para juntar-se aos autos. Parágrafo único. O réu e quem prestar a fiança serão pelo escrivão notificados das obrigações e da sanção previstas nos arts. 327 e 328, o que constará dos autos.
Art. 330. A fiança, que será sempre definitiva, consistirá em depósito de dinheiro, pedras, objetos ou metais preciosos, títulos da dívida pública, federal, estadual ou municipal, ou em hipoteca inscrita em primeiro lugar. § 1º A avaliação de imóvel, ou de pedras, objetos ou metais preciosos será feita imediatamente por perito nomeado pela autoridade. § 2º Quando a fiança consistir em caução de títulos da dívida pública, o valor será determinado pela sua cotação em Bolsa, e, sendo nominativos, exigir-se-á prova de que se acham livres de ônus.
Dispositivo sem alteração Art. 330. A fiança, que será sempre definitiva, consistirá em depósito de dinheiro, pedras, objetos ou metais preciosos, títulos da dívida pública, federal, estadual ou municipal, ou em hipoteca inscrita em primeiro lugar. § 1º A avaliação de imóvel, ou de pedras, objetos ou metais preciosos será feita imediatamente por perito nomeado pela autoridade. § 2º Quando a fiança consistir em caução de títulos da dívida pública, o valor será determinado pela sua cotação em Bolsa, e, sendo nominativos, exigir-se-á prova de que se acham livres de ônus.
Art. 331. O valor em que consistir a fiança será recolhido à repartição arrecadadora federal ou estadual, ou entregue ao depositário público, juntando-se aos autos os respectivos conhecimentos. Parágrafo único. Nos lugares em que o depósito não se puder fazer de pronto, o valor será entregue ao escrivão ou pessoa abonada, a critério da autoridade, e dentro de três dias dar-se-á ao valor o destino que lhe assina este artigo, o que tudo constará do termo de fiança.
Dispositivo sem alteração Art. 331. O valor em que consistir a fiança será recolhido à repartição arrecadadora federal ou estadual, ou entregue ao depositário público, juntando-se aos autos os respectivos conhecimentos. Parágrafo único. Nos lugares em que o depósito não se puder fazer de pronto, o valor será entregue ao escrivão ou pessoa abonada, a critério da autoridade, e dentro de três dias dar-se-á ao valor o destino que lhe assina este artigo, o que tudo constará do termo de fiança.
Art. 332. Em caso de prisão em flagrante, será competente para conceder a fiança a autoridade que presidir ao respectivo auto, e, em caso de prisão por mandado, o juiz que o houver expedido, ou a autoridade judiciária ou policial a quem tiver sido requisitada a prisão.
Dispositivo sem alteração Art. 332. Em caso de prisão em flagrante, será competente para conceder a fiança a autoridade que presidir ao respectivo auto, e, em caso de prisão por mandado, o juiz que o houver expedido, ou a autoridade judiciária ou policial a quem tiver sido requisitada a prisão.
Art. 333. Depois de prestada a fiança, que será concedida independentemente de audiência do Ministério Público, este terá vista do processo a fim de requerer o que julgar conveniente.
Dispositivo sem alteração Art. 333. Depois de prestada a fiança, que será concedida independentemente de audiência do Ministério Público, este terá vista do processo a fim de requerer o que julgar conveniente.
Art. 334. A fiança poderá ser prestada em qualquer termo do processo, enquanto não transitar em julgado a sentença condenatória.
Art. 334. A fiança poderá ser prestada enquanto não transitar em julgado a sentença condenatória.
Art. 335. Recusando ou demorando a autoridade policial a concessão da fiança, o preso, ou alguém por ele, poderá prestá-la, mediante simples petição, perante o juiz competente, que decidirá, depois de ouvida aquela autoridade.
Art. 335. Recusando ou retardando a autoridade policial a concessão da fiança, o preso, ou alguém por ele, poderá prestá-la, mediante simples petição, perante o juiz competente, que decidirá em 48 (quarenta e oito) horas.
Art. 336. O dinheiro ou objetos dados como fiança ficarão sujeitos ao pagamento das custas, da indenização do dano e da multa, se o réu for condenado. Parágrafo único. Este dispositivo terá aplicação ainda no caso da prescrição depois da sentença con-denatória (Código Penal, art. 110 e seu parágrafo).
Art. 336. O dinheiro ou objetos dados como fiança servirão ao pagamento das custas, da indenização do dano, da prestação pecuniária e da multa, se o réu for condenado. Parágrafo único. Este dispositivo terá aplicação ainda no caso da prescrição depois da sentença condenatória (art. 110 do Código Penal).
Art. 337. Se a fiança for declarada sem efeito ou passar em julgado a sentença que houver absolvido o réu ou declarado extinta a ação penal, o valor que a constituir será restituído sem desconto, salvo o disposto no parágrafo do artigo anterior.
Art. 337. Se a fiança for declarada sem efeito ou passar em julgado sentença que houver absolvido o acusado ou declarada extinta a ação penal, o valor que a constituir, atualizado, será restituído sem desconto, salvo o disposto no parágrafo único do art. 336 deste Código.
Art. 338. A fiança que se reconheça não ser cabível na espécie será cassada em qualquer fase do processo.
Dispositivo sem alteração Art. 338. A fiança que se reconheça não ser cabível na espécie será cassada em qualquer fase do processo.
Art. 339. Será também cassada a fiança quando reconhecida a existência de delito inafiançável, no caso de inovação na classificação do delito.
Dispositivo sem alteração Art. 339. Será também cassada a fiança quando reconhecida a existência de delito inafiançável, no caso de inovação na classificação do delito.
Art. 340. Será exigido o reforço da fiança: I — quando a autoridade tomar, por engano, fiança insuficiente; II — quando houver depreciação material ou perecimento dos bens hipotecados ou caucionados, ou depreciação dos metais ou pedras preciosas; III — quando for inovada a classificação do delito. Parágrafo único. A fiança ficará sem efeito e o réu será recolhido à prisão, quando, na conformidade deste artigo, não for reforçada.
Dispositivo sem alteração Art. 340. Será exigido o reforço da fiança: I — quando a autoridade tomar, por engano, fiança insuficiente; II — quando houver depreciação material ou perecimento dos bens hipotecados ou caucionados, ou depreciação dos metais ou pedras preciosas; III — quando for inovada a classificação do delito. Parágrafo único. A fiança ficará sem efeito e o réu será recolhido à prisão, quando, na conformidade deste artigo, não for reforçada
Art. 341. Julgar-se-á quebrada a fiança quando o réu, legalmente intimado para ato do processo, deixar de comparecer, sem provar, incontinenti, motivo justo, ou quando, na vigência da fiança, praticar outra infração penal.
Art. 341. Julgar-se-á quebrada a fiança quando o acusado: I — regularmente intimado para ato do processo, deixar de comparecer, sem motivo justo; II — deliberadamente praticar ato de obstrução ao andamento do processo; III — descumprir medida cautelar imposta cumulativamente com a fiança; IV — resistir injustificadamente a ordem judicial; V — praticar nova infração penal dolosa.
Art. 342. Se vier a ser reformado o julgamento em que se declarou quebrada a fiança, esta subsistirá em todos os seus efeitos.
Dispositivo sem alteração Art. 342. Se vier a ser reformado o julgamento em que se declarou quebrada a fiança, esta subsistirá em todos os seus efeitos.
Art. 343. O quebramento da fiança importará a perda de metade do seu valor e a obrigação, por parte do réu, de recolher-se à prisão, prosseguindose, entretanto, à sua revelia, no processo e julgamento, enquanto não for preso.
Art. 343. O quebramento injustificado da fiança importará na perda de metade do seu valor, cabendo ao juiz decidir sobre a imposição de outras medidas cautelares ou, se for o caso, a decretação da prisão preventiva.
Art. 344. Entender-se-á perdido, na totalidade, o valor da fiança, se, condenado, o réu não se apresentar à prisão.
Art. 344. Entender-se-á perdido, na totalidade, o valor da fiança, se, condenado, o acusado não se apresentar para o início do cumprimento da pena definitivamente imposta.
Art. 345. No caso de perda da fiança, depois de deduzidas as custas e mais encargos a que o réu estiver obrigado, o saldo será recolhido ao Tesouro Nacional.
Art. 345. No caso de perda da fiança, o seu valor, deduzidas as custas e mais encargos a que o acusado estiver obrigado, será recolhido ao fundo penitenciário, na forma da lei.
Art. 346. No caso de quebramento de fiança, feitas as deduções previstas no artigo anterior, o saldo será, até metade do valor da fiança, recolhido ao Tesouro Federal.
Art. 346. No caso de quebramento de fiança, feitas as deduções previstas no art. 345 deste Código, o valor restante será recolhido ao fundo penitenciário, na forma da lei.
Art. 347. Não ocorrendo a hipótese do art. 345, o saldo será entregue a quem houver prestado a fiança, depois de deduzidos os encargos a que o réu estiver obrigado.
Dispositivo sem alteração Art. 347. Não ocorrendo a hipótese do art. 345, o saldo será entregue a quem houver prestado a fiança, depois de deduzidos os encargos a que o réu estiver obrigado.
Art. 348. Nos casos em que a fiança tiver sido prestada por meio de hipoteca, a execução será promovida no juízo cível pelo órgão do Ministério Público.
Dispositivo sem alteração Art. 348. Nos casos em que a fiança tiver sido prestada por meio de hipoteca, a execução será promovida no juízo cível pelo órgão do Ministério Público.
Art. 349. Se a fiança consistir em pedras, objetos ou metais preciosos, o juiz determinará a venda por leiloeiro ou corretor.
Dispositivo sem alteração Art. 349. Se a fiança consistir em pedras, objetos ou metais preciosos, o juiz determinará a venda por leiloeiro ou corretor.
Art. 350. Nos casos em que couber fiança, o juiz, verificando ser impossível ao réu prestá-la, por motivo de pobreza, poderá conceder-lhe a liberdade provisória, sujeitando-o às obrigações constantes dos arts. 327 e 328. Se o réu infringir, sem motivo justo, qualquer dessas obrigações ou praticar outra infração penal, será revogado o benefício. Parágrafo único. O escrivão intimará o réu das obrigações e sanções previstas neste artigo.
Art. 350. Nos casos em que couber fiança, o juiz, verificando a situação econômica do preso, poderá conceder-lhe liberdade provisória, sujeitando-o às obrigações constantes dos arts. 327 e 328 deste Código e a outras medidas cautelares, se for o caso. Parágrafo único. Se o beneficiado descumprir, sem motivo justo, qualquer das obrigações ou medidas impostas, aplicar-seá o disposto no § 4º do art. 282 deste Código.
1 Art. 5º da CF: “XLII — a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei; XLIII — a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem; XLIV — constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático”. 2 Processo penal, 14. ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. No mesmo sentido AURY LOP ES JR. (Ob. cit., p. 164).
3 “Apesar de o tema ainda não ter sido analisado definitivamente pelo Plenário deste Tribunal, a atual jurisprudência é firme no sentido de que é legítima a proibição de liberdade provisória nos crimes de tráfico ilícito de entorpecentes, uma vez que ela decorre da inafiançabilidade prevista no art. 5º, XLIII, da Carta Magna e da vedação estabelecida no art. 44 da Lei 11.343/2006” (STF, HC 103.406/SP, 1ª T., rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 24-8-2010, DJe n. 168, de 10-9-2010). No mesmo sentido: STF, HC 104.616/MG, 1ª T., rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 21-9-2010, DJe n. 215, de 10-11-2010; STF, HC 102.715/MG, 1ª T., rel. Min. Dias Tóffoli, j. 3-8-2010, DJe n. 200, de 22-10-2010; STF, HC 101.259/MS, 1ª T., rel. Min. Dias Tóffoli, j. 1-12-2009, DJe n. 22, de 5-2-2010; STF, HC 98.548/SC, 1ª T., rel. Min. Cármen Lúcia, j. 24-11-2009, DJe n. 232, de 11-12-2009; STF, HC 103.399/SP, 1ª T., rel. Min. Ayres Britto, j. 22-6-2010, DJe n. 154, de 20-8-2010; STF, HC 95.671/RS, 2ª T., rel. Min. Ellen Gracie, j. 3-3-2009, DJe n. 53, de 20-3-2009; STF, HC 102.558/PR, 2ª T., rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 92-2010, DJe n. 45, de 12-3-2010. 4 STF, HC 103.399/SP, 1ª T., rel. Min. Ayres Britto, j. 22-6-2010, DJe n. 154, de 20-8-2010. 5 STF, HC 83.439/RJ, 1ª T., rel. Min. Marco Aurélio, j. 14-10-2003, DJe de 7-11-2003. 6 STJ, AgRg no HC 111.250/SP, 6ª T., rel. Min. Celso Limongi, j. 19-2-2009, DJe de 16-3-2009. No mesmo sentido: STJ, AgRg no HC 111.250/SP, 6ª T., rel. Min. Celso Limongi, j. 19-2-2009, DJe de 16-3-2009. 7 STF, HC 97.579/MT, 2ª T., rel. Min. Ellen Gracie, rel. para o Acórdão Min. Eros Grau, j. 2-2-2010, DJe n. 86, de 14-5-2010. 8 Art. 330 do CPP: “§ 1º A avaliação de imóvel, ou de pedras, objetos ou metais preciosos será feita imediatamente por perito nomeado pela autoridade. § 2º Quando a fiança consistir em caução de títulos da dívida pública, o valor será determinado pela sua cotação em Bolsa, e, sendo nominativos, exigir-se-á prova de que se acham livres de ônus”. 9 Código Civil anotado, 11. ed., São Paulo: Saraiva, 2005, p. 1136. 10 O inciso I do art. 323 tem relação com o inciso XLII do art. 5º da CF. O inciso II corresponde ao inciso XLIII do art. 5º da CF. O inciso III do art. 323 tem relação com o inciso XLIV do art. 5º da CF. 11 STF, HC 86.066/PE, 1ª T., rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 6-9-2005, DJe de 21-10-2005. 12 Art. 332 do CPP. “Em caso de prisão em flagrante, será competente para conceder a fiança a autoridade que presidir ao respectivo auto (...)”. 13 “Não se concede fiança quando, em concurso material, a soma das penas mínimas cominadas for superior a dois anos de reclusão” (DJ de 29-6-1993, p. 12982). 14 Art. 334 do CPP: “A fiança poderá ser prestada enquanto não transitar em julgado a sentença condenatória”. 15 O comportamento culposo tem como seu núcleo, assevera MIGUEL REALE JÚNIOR, “a omissão de necessária diligência, no desrespeito ao dever de cuidado objetivo” (Instituições de direito penal: parte geral, Rio de Janeiro: Forense, 2002, v. I, p. 234). “Na culpa em sentido estrito, a vontade não é propriamente dirigida à produção do evento proibido em lei” (Direito penal: parte geral, trad. de P AULO JOSÉ DA COSTA JR. e ADA P ELLEGRINI GRINOVER, com notas de EUCLIDES CUST ÓDIO DA SILVEIRA, São Paulo: Saraiva, 1964, p. 266). “A culpa consiste na omissão voluntária das diligências necessárias para não causar as consequências prováveis e possíveis do próprio fato” (BENT O DE FARIA, Código Penal brasileiro interpretado: parte geral, 2. ed., Rio de Janeiro: Record, 1958, v. II, p. 159). Consiste, “segundo a conceituação clássica de COSTA E SILVA, em proceder o agente sem a necessária cautela, deixando de empregar as precauções indicadas pela experiência como capazes de prevenir possíveis resultados lesivos (Comentários ao Código Penal, 2. ed., 1967, pág. 15)” (TACrimSP, Ap. 407.063-0, 11ª Câm., rel. Juiz Sidnei Beneti, j. 11-11-1985, JACrimSP 87/241). Culposos são, portanto, os crimes “em que o resultado provém de imprudência, negligência ou imperícia do agente” (ANÍBAL BRUNO, Direito penal: parte geral, 3. ed., Rio de Janeiro: Forense, 1967, t. 2, p. 223). 16 Antes das mudanças introduzidas com a Lei n. 12.403/2011, o quebramento injustificado da fiança acarretava, nos termos do art. 343 do CPP, a perda de metade do seu valor e a obrigação, por parte do réu, de recolher-se à prisão, prosseguindo-se, entretanto, à sua revelia, no processo e julgamento, enquanto não fosse preso. 17 Na primeira hipótese, a fiança não era cabível desde o início, na segunda, ela era cabível, mas depois deixou de ser, em razão de nova capitulação jurídica do fato. 18 Ver art. 110 do CP. 19 Ver art. 387, IV, do CPP. 20 Ver arts. 43, I, e 45, §§ 1º e 2º, ambos do CP. 21 Ver art. 49 do CP. 22 Ver art. 387 do CPP. 23 STJ, HC 130.987/BA, 5ª T., rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 18-6-2009, DJe de 3-8-2009; STJ, RHC 14.616/SC, 5ª T., rel. Min. Jorge Scartezzini, j. 23-9-2003, DJ de 19-12-2003, p. 500.
LIBERDADE PROVISÓRIA SEM FIANÇA 1. INTRODUÇÃO Há quem entenda que o instituto da liberdade provisória sem fiança passou a ter, a partir da vigência da Lei n. 12.403/2011, reduzido espaço de tempo e campo de incidência para sua utilização. A bem da verdade, na regulamentação anterior das medidas cautelares, no que tange à forma e momento de se obter liberdade provisória sem fiança, as regras eram exatamente as mesmas, contudo, rotineiramente malferidas e por isso fonte de reiteradas situações de constrangimento ilegal, o que por certo empolgou o legislador ordinário a ser mais específico, enfático mesmo, quanto à imperiosidade de se apurar, desde o primeiro momento possível, a necessidade, ou não, da permanência no cárcere daquele que tenha sido preso em flagrante. É possível dizer isso porque a liberdade provisória é instituto visceralmente ligado à prisão em flagrante, não sendo aplicável em relação a quem se encontre preso por força de prisão temporária1 ou preventiva2. Não se presta, portanto, como contracautela em relação a qualquer outra forma de prisão provisória. Como veremos adiante, a liberdade provisória sem fiança não perdeu sua relevância no cenário democrático; não teve amesquinhada ou diminuída sua importância dentro do sistema de garantias constitucionalmente adotado. Ao contrário, tornou-se instrumento de maior amplitude libertária. Calha anotar, por oportuno, que não há lógica e proporcionalidade no sistema em que, para os crimes mais brandos, se concede liberdade provisória mediante fiança e para os crimes mais graves — por isso inafiançáveis na determinação constitucional — se permite a liberdade pura, sem fiança, como hoje ocorre. Segundo pensamos, visando corrigir esta distorção, deveria o ordenamento jurídico ser ajustado de forma linear, para passar a permitir liberdade provisória mediante fiança, independentemente da natureza da infração penal — salvo quando presentes os requisitos da prisão preventiva — restando a liberdade provisória sem fiança apenas para os casos de comprovada hipossuficiência econômicofinanceira do agente.
2. LIBERDADE PROVISÓRIA SEM FIANÇA COMO GARANTIA CONSTITUCIONAL Decorre do princípio da presunção de inocência, albergado no art. 5º, LVII, da CF, a necessidade de se estabelecer também como garantia constitucional que “ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança”, conforme se vê no art. 5º, LXVI, da CF. A rigor, toda e qualquer prisão, independentemente de seu fundamento, será sempre provisória, visto que no Brasil não há possibilidade jurídica de prisão perpétua3 e a liberdade é a regra constitucional. Disso decorre que provisória será sempre a prisão, e não a liberdade, daí por que o correto é dizer que o investigado poderá aguardar os rituais do inquérito ou do processo em liberdade, com ou sem o
pagamento de fiança (em não em liberdade provisória), mas na doutrina convencionou-se adotar o nomem juris liberdade provisória para o instituto que estamos a tratar, e nesta linha nos manteremos. Diz-se liberdade provisória porque poderá ser revogada a qualquer tempo, se identificada situação que legitime a decretação de prisão preventiva, e mesmo em razão da possibilidade de futura condenação que resulte em prisão, ou de absolvição, que neste caso a tornará definitiva, do que decorre sua limitação no tempo e no espaço e sua provisoriedade em relação à situação jurídica a que momentaneamente se entrelaça. Falava-se antes da Lei n. 12.403/2011 em liberdade provisória, vinculada, sem fiança, mas sob a égide da atual regulamentação normativa ela deixou de ser vinculada ou precária como era antes, quando então o investigado ou acusado ficava obrigado ao comparecimento a todos os atos e termos do processo, sob pena de revogação, conforme veremos mais adiante, no tópico específico em que trataremos exclusivamente da ausência de “vinculação” nesta modalidade de liberdade provisória. É dita “sem fiança” porque, neste caso, não se exige qualquer caução para que a liberdade seja restituída, o que é bastante evidente, pois, se cabível fiança4, nestes termos e sob a força de tal regulamentação é que a liberdade será concedida, conforme já analisamos no capítulo anterior.
3. CONCEITO A efetivação de prisão em flagrante que não comporte relaxamento constitui pressuposto para o manuseio do instrumento jurídico denominado liberdade provisória. A liberdade provisória é uma contracautela cabível após prisão em flagrante revestida de legalidade5, que tem por objetivo restituir à vida livre aquele contra quem não se faz justificada a decretação de prisão preventiva. Nestes termos, conforme concebidas, em sua forma básica e original, a concessão e fruição da liberdade provisória não estão condicionadas ou vinculadas à satisfação de qualquer obrigação (nem mesmo de comparecimento aos atos do processo), mas eventualmente poderá o juiz, se entender cabível, no ato de concessão impor uma ou mais dentre as medidas cautelares diversas da prisão alinhadas nos arts. 319 e 320, observados os critérios do art. 282, ambos do CPP. Muito embora o parágrafo único do art. 310 e também o art. 350, ambos do Código de Ritos, acenem para a possibilidade de liberdade provisória, sem fiança, mediante condições de permanência, disso não se retira autorização para concluir continue a liberdade provisória a ser vinculada após a Lei n. 12.403/2011, até porque a redação daqueles dispositivos está equivocada, em dissonância com o art. 321 do mesmo Codex, conforme analisaremos mais à frente. Na sua forma mais pura, a liberdade provisória é e sempre será incondicionada.
4. NATUREZA JURÍDICA É medida cautelar de natureza jurisdicional, liberatória ou permissiva, que tem por escopo a liberdade física de quem fora legalmente preso em flagrante delito.
5. QUEM PODE POSTULAR Qualquer pessoa pode postular, em nome próprio, sua liberdade provisória, mas o usual é que ocorra por iniciativa de Defensor, entenda-se: advogado ou Defensor Público. Também o Ministério Público tem legitimidade para postular concessão de liberdade provisória, embora na prática este proceder seja pouco usual, e até por isso adequado lembrar que à Instituição
incumbe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, bem como zelar pelos direitos assegurados na Constituição Federal6.
6. QUEM PODE CONCEDER Somente o juiz competente é que pode conceder liberdade provisória sem fiança. Pode, e deve, ser concedida ex officio, sempre que recomendada, inclusive por força de interpretação sistêmica. Muito embora a liberdade provisória seja uma dentre as medidas cautelares tratadas no Livro I, Título IX, do CPP, a ela não se aplica a restrição que determina o contraditório prévio (art. 282, § 3º, do CPP), até porque sempre estará evidenciada a urgência que permite, neste caso, o contraditório diferido. Não é por outra razão que o art. 333 do CPP determina que nos casos de liberdade provisória mediante fiança o juiz, sendo caso, arbitrará a fiança sem a oitiva prévia do Ministério Público, que terá vista dos autos após a decisão judicial. Podem os Tribunais conceder liberdade provisória sem fiança? A rigor, somente nos processos de competência originária, e mesmo assim apenas quando ocorrer prisão em flagrante. Note-se que dentro em vinte e quatro horas após a prisão em flagrante o juiz deverá relaxar a prisão, conceder liberdade provisória ou decretar a prisão preventiva (art. 310 do CPP), e o juiz somente negará liberdade provisória na instância inferior quando entender ser caso de prisão preventiva7, que então será decretada (art. 310, II), e como já anotamos linhas atrás, o pedido de liberdade provisória não se presta ao ataque de prisão preventiva. A liberdade, neste caso, somente será alcançada por força de relaxamento da prisão preventiva (quando ilegal a decretação) ou de sua revogação (quando não mais presentes os requisitos que outrora autorizaram a decretação).
7. MOMENTO DA CONCESSÃO Mesmo antes das modificações impostas pela Lei n. 12.403/2011, sempre entendemos que a prisão por força de flagrante não pode ultrapassar o limite temporal que vai de sua efetivação até a avaliação imediata de sua legalidade em linhas de controle jurisdicional, providência obrigatória que deve ocorrer nas vinte e quatro horas seguintes à prisão-captura. Esta forma de pensar encontra sua fundamentação no art. 5º, LXVI, da CF, segundo o qual ninguém será levado à prisão ou nela mantido quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança. Do art. 5º, LXI, da CF, retiramos autorização para que pessoas possam ser presas em flagrante, mas a interpretação da regra deve ser feita em harmonia com o citado inciso LXVI, de onde se extrai que, após a prisão em flagrante, a pessoa não poderá continuar presa e, portanto, ser levada ao cárcere, se cabível a liberdade provisória, daí a necessidade de análise desta situação jurídico-constitucional já no momento do controle jurisdicional, a demonstrar absoluta impropriedade em se afirmar a possibilidade de que alguém possa permanecer preso por força do flagrante. Neste momento primeiro do controle jurisdicional, só poderá subsistir prisão se presentes os requisitos da custódia preventiva, que então deverá ser decretada, ou da prisão temporária, admitida, por exemplo, após decisão de relaxamento fundamentada na inobservância dos requisitos do art. 304 do CPP. A possibilidade jurídica de alguém sofrer restrições à sua liberdade por força de prisão em flagrante sempre esteve restrita e delimitada no tempo, até porque constitui exceção da exceção, na
exata medida em que a liberdade é a regra e a exceção é a prisão mediante ordem prévia, escrita e fundamentada de autoridade judiciária, sendo a prisão em flagrante exceção a esta última exceção8. Nunca pode ultrapassar o lapso temporal que medeia entre a prisão-captura e sua primeira apreciação pelo juiz competente. Isto sempre esteve muito claro no texto constitucional e também no CPP. A propósito deste tema a lúcida visão do Min. CELSO DE MELLO é suficientemente esclarecedora quando afirma: “Aquele que foi preso em flagrante, embora formalmente perfeito o auto respectivo (CPP, arts. 304 a 306) e não obstante tecnicamente caracterizada a situação de flagrância (CPP, art. 302), tem, mesmo assim, direito subjetivo à obtenção da liberdade provisória, desde que não se registre, quanto a ele, qualquer das hipóteses autorizadoras da prisão preventiva (...)”9. Disso resulta que, a rigor, a contracautela que é a liberdade provisória sem fiança só pode ser manuseada dentro do limite temporal que vai da prisão-captura até a avaliação do auto de prisão em flagrante pelo juiz (§ 1º do art. 306, c.c. o art. 310 do CPP). Em relação a isso o legislador foi ainda mais específico, já que o atual art. 310 do CPP evidencia claramente que o juiz deverá, no momento que indica, trabalhar com as variantes apontadas10, conforme trataremos a seguir.
8. REGULAMENTAÇÃO DO CPP O instituto da liberdade provisória, que é de envergadura constitucional, conta com regulamentação específica no CPP conforme seus arts. 310, III, parágrafo único; 321 e 350, que devem ser analisados em conjunto com o art. 282.
8.1. Art. 310 do CPP Art. 310. Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá fundamentadamente: I — relaxar a prisão ilegal; ou II — converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; ou III — conceder liberdade provisória, com ou sem fiança. Parágrafo único. Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o agente praticou o fato nas condições constantes dos incisos I a III do caput do art. 23 do Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 — Código Penal, poderá, fundamentadamente, conceder ao acusado liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos processuais, sob pena de revogação. Efetuada e formalizada a prisão em flagrante (arts. 301 a 309), em vinte e quatro horas após a realização da prisão deverá ser encaminhada ao juiz competente cópia do respectivo auto. Segundo pensamos, registrada e autuada a comunicação, deverá o magistrado providenciar para que se dê vista dos autos respectivos ao Ministério Público a fim de que se manifeste, devendo, em seguida, proceder na forma do art. 310, na seguinte ordem, lembrando que a adoção de uma dentre as opções exclui automaticamente a incidência das demais, na forma que segue: 1º) relaxar a prisão em flagrante, se ilegal (art. 5º, LXV, da CF); 2º) conceder liberdade provisória, com ou sem fiança (art. 5º, LXVI, da CF), podendo ainda impor,
ou não, medida(s) cautelar(es) dos arts. 319 e 320 do CPP, isolada ou cumulativamente; 3º) converter a prisão em flagrante em preventiva (art. 312 do CPP). A liberdade provisória, com ou sem fiança, é modalidade de medida cautelar liberatória, e por isso submetida às regras do art. 282 do CPP, no que couber. Se interpretássemos ao pé da letra o disposto no § 2º do art. 282 do CPP, não poderia o juiz conceder liberdade provisória ex officio, no curso da investigação criminal, o que representaria um verdadeiro absurdo, especialmente em face do que dispõe o art. 5º, LXVI, da CF, e isso reforça a certeza de que o art. 282 não foi devidamente pensado, refletido, tampouco concebido para a totalidade das medidas cautelares previstas no Título IX do Livro I do CPP, ao contrário do que anuncia seu caput. As medidas listadas nos arts. 319 e 320 do CPP, que podem ser impostas com a liberdade provisória já na ocasião do art. 310, obviamente também são medidas cautelares, mas pela letra do § 2º do art. 282, de igual maneira não poderão ser fixadas ex officio neste momento11. Note-se a ausência de visão sistêmica do legislador neste tema, pois o art. 321, caput, do CPP dispõe que: “Ausentes os requisitos que autorizam a decretação da prisão preventiva, o juiz deverá conceder liberdade provisória, impondo, se for o caso, as medidas cautelares previstas no art. 319 deste Código e observados os critérios constantes do art. 282 deste Código”. Lembrou-se o legislador de condicionar a decretação aos critérios norteadores indicados nos incisos I e II do art. 282, mas se esqueceu da restrição imposta no § 2º do mesmo dispositivo (e também deixou de fazer referência ao art. 320 do CPP). O que pensar a respeito disso? O que dizer? Note-se que o Projeto de Lei n. 4.208, do qual se originou a Lei n. 12.403/2011, é datado de 2001. Portanto, dez anos de debates e discussões se passaram para “dar no que deu”, e todos sabem que sua aprovação para chegar a uma redação final no dia 7 de abril de 2011 ocorreu “às pressas”, mesmo depois de tanto tempo. Isso mesmo: às pressas; açodadamente. Discutiu-se se era caso de acabar ou não com a prisão especial — que não acabou — e se esqueceu do principal: todo o resto. Pois bem. Disso se extrai que, por ocasião do art. 310 do CPP: 1º) o juiz não só pode, como deve, relaxar a prisão ilegal ex officio; 2º) o juiz não só pode, como deve, conceder liberdade provisória, com ou sem fiança, ex officio; 3º) o juiz não pode decretar medida cautelar diversa da prisão (arts. 319 e 320 do CPP) ex officio no ato de concessão da liberdade provisória e então só poderá fazê-lo se contar com provocação neste sentido, devendo observar, neste caso, o disposto no § 3º do art. 28212; 4º) o juiz não pode converter a prisão em flagrante em prisão preventiva, ex officio, e só poderá fazê-lo se contar com provocação neste sentido, devendo observar, neste caso, o disposto no § 3º do art. 282.
8.1.1. Sobre o parágrafo único do art. 310 do CPP O atual parágrafo único do art. 310 trata da matéria que antes era regulada em seu caput, e o que antes estava no parágrafo único agora está no art. 321. Dispõe o parágrafo único sobre a possibilidade de se conceder liberdade provisória quando o juiz
verificar, de plano, que o agente praticou a conduta em qualquer das condições regradas nos incisos I a III do art. 23 do CP, ou seja: estado de necessidade; legítima defesa; estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito. Nestas circunstâncias, como diz o caput do art. 23, não há crime, e sendo assim, se não há crime não é possível manter alguém preso em razão de conduta que não é punida na lei penal. Nestes casos faltará fumus boni juris/fumus commissi delicti para a manutenção da prisão. É lamentável, entretanto, não tenha o legislador aproveitado a oportunidade da Lei n. 12.403/2011 para corrigir o que já vem errado desde o início da vigência do CPP. Conforme visto, o art. 23 do CP diz que não há crime nas hipóteses mencionadas em seus incisos, e sendo assim, se já é possível verificar que não há crime, o correto não é a liberdade provisória, mas o relaxamento da prisão, porquanto ilegal o aprisionamento cautelar em face de conduta que se afigura lícita perante o ordenamento, ainda que depois se possa provar o contrário no curso das investigações que se seguirem. Note-se que reconhecer, já no momento do controle jurisdicional desenvolvido por ocasião do art. 310 do CPP, a possibilidade de a conduta estar acobertada por uma das causas de exclusão da antijuridicidade não implica o sepultamento das apurações policiais. Desimporta para a continuidade das investigações se a decisão judicial é concessiva de relaxamento da prisão ou de liberdade provisória. Em qualquer caso o curso investigatório deverá seguir até o final do inquérito. Por outro lado, sendo hipótese de relaxamento o agente não ficará exposto à possibilidade de aplicação de medidas cautelares restritivas, como ocorre com a liberdade provisória. Note-se, por fim, que a aferição das escusativas de ilicitude do art. 23 do CP, de plano, já no momento do art. 310 do CPP, é deveras difícil e temerária, daí por que na maioria das vezes sempre foi evitada e continuará sendo, preferindo o Ministério Público e os juízes a opção pela alternativa que envolve conhecimento e fundamentação menos complexa e arriscada, que é a liberdade provisória tratada no art. 321 do CPP. Em resumo, a redação do parágrafo único do art. 310 do CPP é duplamente equivocada: primeiro porque a hipótese não é de liberdade provisória, mas de relaxamento; segundo porque ainda que fosse correto falar em liberdade provisória na hipótese tratada, não há falar em vinculação — obrigatoriedade de comparecimento a todos os atos do processo, sob pena de revogação — conforme veremos no item 9 deste capítulo.
8.2. Art. 321 do CPP Art. 321. Ausentes os requisitos que autorizam a decretação da prisão preventiva, o juiz deverá conceder liberdade provisória, impondo, se for o caso, as medidas cautelares previstas no art. 319 deste Código e observados os critérios constantes do art. 282 deste Código. Para a concessão da liberdade provisória sob tal fundamento é necessário que não estejam presentes os requisitos da prisão preventiva (arts. 311 a 313), sobre os quais já refletimos detidamente no capítulo específico. A regra é lógica e até óbvia, pois, se estão presentes os requisitos da prisão preventiva, o agente deve ser preso ou assim permanecer. Não tem sentido imaginar que alguém preso em flagrante deva ser beneficiado com a liberdade provisória para em seguida ver contra si decretada a prisão preventiva, no mesmo despacho.
É claro que eventualmente — e não raras vezes isso acontece — o preso em flagrante obtém liberdade provisória e depois, em razão de conduta posterior, se evidencia a necessidade de sua prisão preventiva. Nestas circunstâncias as medidas cautelares — liberatória e privativa de liberdade, respectivamente — estarão sendo tratadas em tempos distintos, por razões e fundamentos diversos. Nenhum problema, portanto. O que não se pode admitir, e a lei não admite, por absoluta ilogicidade, é conceder a liberdade provisória a quem no momento da concessão já se sabe deva permanecer preso porque presentes os requisitos da prisão preventiva. A presença dos requisitos que autorizam a decretação da prisão preventiva constitui questão prejudicial à liberdade provisória, com ou sem fiança, conforme também se extrai do disposto no art. 310, II, do CPP. De ver, entretanto, que não basta que o juiz negue a liberdade provisória a quem está preso em flagrante, sob o fundamento da presença dos requisitos da prisão preventiva. É imprescindível seja decretada a prisão preventiva, ou, na letra da lei, a prisão em flagrante deve ser convertida em preventiva para que se legitime a continuidade da custódia. Imaginemos o seguinte exemplo: “Carlos Henrique”, marginal de péssima índole e altíssima periculosidade, é preso em flagrante por crime inafiançável e sua defesa rapidamente elabora pedido de liberdade provisória sem fiança que é endereçado ao juiz competente. Ao decidir sobre o pedido, não basta que o juiz negue a liberdade provisória para que “Carlos Henrique” permaneça preso. Para que isso ocorra, deverá decretar a prisão preventiva (ou, como diz a lei, a prisão em flagrante deverá ser convertida em prisão preventiva).
8.3. Art. 350 do CPP Art. 350. Nos casos em que couber fiança, o juiz, verificando a situação econômica do preso, poderá conceder-lhe liberdade provisória, sujeitando-o às obrigações constantes dos arts. 327 e 328 deste Código e a outras medidas cautelares, se for o caso. Na hipótese tratada, o agente é preso em flagrante regular (aquele que não comporta relaxamento, portanto), é cabível e arbitrada fiança (arts. 322 a 349 do CPP), mas sua situação de pobreza não permite seja prestada a caução para que aguarde a investigação criminal e eventual ação penal em liberdade. Nada mais razoável que nestes casos se conceda a liberdade provisória sem fiança, afastando a possibilidade de prisão cautelar por força de pobreza. De ver, entretanto, que o manuseio do art. 350 do CPP só estará justificado se diante do caso concreto nem mesmo a redução do valor da fiança13 permitir seja ela eficazmente prestada, por decorrência da hipossuficiência econômica. Se, ao contrário, for possível o pagamento de valor menor, deverá ser ajustado às condições econômicas do agente. Concedida liberdade provisória com fundamento no art. 350 do CPP, pela letra da lei ficará o beneficiado sujeito às obrigações anotadas nos arts. 327 e 328 do CPP, a saber: comparecimento perante a autoridade, todas as vezes que for intimado para atos do inquérito e da instrução criminal e para o julgamento; não mudar de residência, sem prévia permissão da autoridade processante, ou ausentar-se por mais de oito dias de sua residência, sem comunicar àquela autoridade o lugar onde
será encontrado, e o descumprimento injustificado de qualquer destas condições fará retornar o agente ao status quo ante, mas este regramento não resiste a uma análise sistêmica do CPP, tampouco aos olhos da Constituição Federal, conforme trataremos de expor no item que segue.
9. A QUESTÃO DA VINCULAÇÃO DA LIBERDADE PROVISÓRIA SEM FIANÇA 9.1. A vinculação da liberdade provisória conforme o CPP Falava-se antes da Lei n. 12.403/2011 em liberdade provisória, vinculada sem fiança, estando a ideia de vinculação atrelada à necessidade de cumprimento de certas obrigações ou condições a que ficava vinculado o liberado, sendo o descumprimento causa eficiente de revogação do benefício e determinante do retorno ao cárcere. Antes da reforma também havia no CPP hipóteses expressas em que a liberdade após o flagrante não era vinculada a qualquer obrigação. Eram aquelas situações em que o autuado se “livrava solto”, reguladas nos revogados incisos I e II do art. 321. Naquelas hipóteses, em seguida à lavratura o auto de prisão em flagrante a autoridade policial já liberava o autuado, imediatamente, não ficando sua liberdade vinculada a qualquer condição de permanência. Não havia obrigação em contrapartida. Nas situações em que praticada, o fundamento jurídico da vinculação era extraído do art. 310, caput, do CPP, onde constava que nas hipóteses de estado de necessidade, legítima defesa, estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito, o juiz, depois de ouvir o Ministério Público, deveria conceder liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos do processo, sob pena de revogação. De contornos mais amplos, o parágrafo único14 do art. 310 do CPP determinava que o juiz deveria adotar igual procedimento àquele do caput, quando verificasse, pelo auto de prisão em flagrante, a inocorrência de qualquer das hipóteses autorizadoras da prisão preventiva. Portanto, por força das circunstâncias do caput, ou do parágrafo único, ambos do art. 310 do CPP (na redação antiga), a liberdade provisória sempre seria concedida mediante a obrigação de atender a certas condições, pena de revogação do benefício. Era, portanto, vinculada. Também o art. 350 do CPP dispunha, e continua dispondo, mesmo após sofrer mudança em sua redação15, a respeito de condições que vinculam a liberdade provisória, sem fiança, nas situações tratadas. Mas a sistemática exposta no CPP após a Lei n. 12.403/2011 é diversa, embora capenga a regulamentação, que carece de coerência entre os dispositivos. Vejamos se não. O art. 310, III, indica que se não for caso de relaxamento da prisão, ou de decretação da prisão preventiva, deverá o magistrado conceder liberdade provisória, com ou sem fiança, podendo ser cumulada ou não com medida cautelar diversa da prisão (art. 321 do CPP), se for caso. Este dispositivo não faz qualquer referência à imposição de obrigações a que deva estar sujeito o agente enquanto em liberdade. Não vincula, portanto, a permanência da liberdade provisória sem fiança a qualquer causa superveniente. Já o parágrafo único do art. 310 trata da liberdade provisória aos que praticarem a conduta, em tese e a priori, acobertados por causa de exclusão da ilicitude, quando então a liberdade provisória deverá ser concedida mediante termo de comparecimento a todos os atos do processo, sob pena de revogação. Vinculada, portanto.
Dir-se-á que o art. 310, III, apenas anuncia ou indica a necessidade de assim proceder o magistrado, diante da situação de fato identificada, devendo a questão da vinculação ou não da liberdade provisória ser retirada de dispositivo diverso, onde se encontre especificamente regulada a matéria. Pois bem. De forma central, a liberdade provisória está regulada no art. 321, que tem a seguinte redação: Art. 321. Ausentes os requisitos que autorizam a decretação da prisão preventiva, o juiz deverá conceder liberdade provisória, impondo, se for o caso, as medidas cautelares previstas no art. 319 deste Código e observados os critérios constantes do art. 282 deste Código. Alguma vinculação por força exclusiva da liberdade provisória? Claro que não. Como dito no início deste capítulo e agora reiteramos, conforme concebida, em sua forma básica e original, a liberdade provisória sem fiança não está condicionada ou vinculada à satisfação de qualquer obrigação (nem mesmo ao comparecimento aos atos do processo), mas eventualmente poderá o juiz, se entender cabível, no ato de concessão impor uma ou mais dentre as medidas cautelares listadas nos arts. 319 e 320 do CPP, observados os critérios do art. 282. Contudo, disso não se retira autorização para concluir continue a liberdade provisória sem fiança a ser vinculada após a Lei n. 12.403/2011. Na sua forma mais pura, ela é e sempre será incondicionada. Mas o que pensar a respeito do parágrafo único do art. 310, que condiciona a liberdade provisória nos casos que elenca ao cumprimento de obrigações, sob pena de revogação do benefício (que de benefício nada tem, pois se trata de um direito constitucionalmente assegurado), ou, ainda, do art. 350 do CPP, que também sujeita o pobre às condições dos arts. 327 e 328 do CPP, sob pena de revogação da liberdade provisória. Admitir a sensatez e a valia jurídica destas regras seria o mesmo que admitir que para a generalidade dos casos em que se conceder liberdade provisória não haverá qualquer vinculação, mas na hipótese de ser o indivíduo pobre ou ter praticado conduta que aparentemente não configura ilícito penal se imporá legitimamente condição. Na generalidade não será vinculada, mas para os casos particularizados sim. Tal fórmula proposta é tão ridícula que dispensa maiores comentários. Imaginem-se as seguintes fórmulas propostas no CPP, em pleno Estado de Direito: 1ª) preso em flagrante + situação de pobreza = liberdade provisória, sem fiança, vinculada ao cumprimento de condições, sob pena de revogação; 2ª) preso em flagrante + evidente causa de exclusão da ilicitude = liberdade provisória, sem fiança, vinculada ao cumprimento de condições, sob pena de revogação16; 3ª) preso em flagrante abastado + generalidade dos casos = liberdade provisória, sem fiança, sem qualquer obrigação adicional e, portanto, sem possibilidade de revogação por descumprimento. É claro que a aplicação cega das regras do CPP, conforme expostas, acarretaria odioso e injustificável tratamento desigual. É inconcebível que apenas o pobre e aquele que aparentemente não praticou crime algum — e que deveria, a rigor e exatamente por isso, ter a prisão em flagrante relaxada — tenham suas situações agravadas em relação aos demais. A regulamentação geral da liberdade provisória sem fiança está tratada no art. 321 do CPP, de onde
se extrai que, por ocasião de sua concessão, na generalidade dos casos, não será lícito ao magistrado impor qualquer vinculação, obrigação ou condição de permanência. Poderá o juiz, todavia, na mesma decisão determinar a submissão do liberado a uma ou mais dentre as medidas cautelares dos arts. 319 e 320, observadas as regras do art. 282, todos do CPP. Mas isso é coisa bem diversa de vinculação ex lege. Em síntese, seja qual for o fundamento da liberdade provisória sem fiança, não se imporá vinculação, mesmo nas hipóteses do art. 310, parágrafo único, ou do art. 350, ambos do CPP.
9.2. Reflexões sobre a prisão decorrente de revogação da liberdade provisória sem fiança Viemos de dizer que não mais existe no ordenamento jurídico brasileiro autorização para que a liberdade provisória sem fiança seja concedida mediante vinculação. Mesmo para aqueles que pensam em sentido contrário, não nos parece razoável, data venia, defender a possibilidade de que alguém volte ao cárcere cautelarmente por força exclusiva da revogação da liberdade provisória outrora deferida, pois isso é o mesmo que dizer possa esta pessoa ser presa sem que contra ela exista real e efetiva situação de flagrante; sem que tenha sido decretada sua prisão temporária ou preventiva, que sabidamente são as únicas modalidades de prisões cautelares admitidas no ordenamento jurídico brasileiro. Seria admitir, em síntese, a existência de uma modalidade de prisão cautelar que decorra pura e simplesmente do descumprimento de uma obrigação fixada. Sim. É claro que não desconhecemos o argumento no sentido de que a liberdade provisória fora concedida mediante o compromisso de cumprir certas obrigações, portanto, condicionada, sendo razoável que o desatendimento implique o retorno ao cárcere, afinal... E segue por aí o discurso. No sistema vigente, contudo, esta preocupação é válida apenas enquanto discurso ético, mas não no plano jurídico. O que agora estamos a discutir é a razoabilidade e natureza jurídica desta “nova prisão” por descumprimento de obrigação. Note-se que pelo crime praticado, em conformidade com a Constituição Federal e o CPP, o agente teve reconhecido seu direito de aguardar as investigações e o processo em liberdade, e diante deste quadro não parece razoável, tampouco proporcional, deva retornar ao cárcere porque, embora regularmente intimado para atos do inquérito, da instrução criminal ou para o julgamento, tenha deixado, alguma vez, de comparecer perante a autoridade; ou ainda, por ter mudado de residência, sem prévia permissão da autoridade processante, ou se ausentado por mais de oito dias de sua residência, sem comunicar àquela autoridade o lugar onde poderia ser encontrado17. Ressalvadas as situações em que cabível a decretação da prisão preventiva18, não é razoável concluir possa o agente retornar ao cárcere após o reconhecimento judicial de seu direito a aguardar os rituais de investigação e do processo em liberdade. Pelo crime em tese praticado: a liberdade provisória, sem fiança. Pelo descumprimento de uma determinada restrição: a prisão cautelar. Alguma proporcionalidade ou razoabilidade nestas proposições? Mas ainda que admitido o retorno à prisão por força exclusiva da revogação da liberdade provisória, e não da decretação de prisão preventiva, cairíamos num círculo vicioso. Imagine-se: revogada a liberdade provisória, a consequência seria o retorno à prisão.
E então impõe perguntar: qual a natureza jurídica desta prisão cautelar? Qual o título desta prisão? Prisão temporária não é. De prisão preventiva também não estamos a tratar. Prisão em flagrante? Claro que não, pois ausentes os requisitos do art. 302 do CPP. Seria ela uma prisão cautelar inominada ou sui generis? Argumenta-se na doutrina e jurisprudência que a revogação da liberdade provisória faz restabelecer os efeitos do flagrante, e então, a considerar este posicionamento construído e consentido por muitos, estaríamos novamente diante de uma prisão decorrente de flagrante. Esta a sua natureza jurídica, portanto. Única, aliás, minimamente compreensível para efeito de se estabelecer alguma discussão lógica. Mas, se estamos diante de prisão por força do flagrante outrora levada a efeito, o remédio jurídico para que alguém nestas condições possa ter sua liberdade restituída é exatamente o pedido de liberdade provisória, e a Constituição Federal assegura que ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança (art. 5º, LXVI, da CF). Neste caso, pela força do texto constitucional, o agente, mesmo tendo a liberdade provisória revogada pelo juiz, não poderá ser levado à prisão, exceto na hipótese de se encontrarem presentes os requisitos da prisão preventiva19, que por isso deveria ser decretada. Mas não é este o caso — de preventiva —, estamos tratando de prisão por força exclusiva da revogação da liberdade provisória. E mais. Se por determinação judicial houver violação à regra que diz que ninguém será levado à prisão quando cabível liberdade provisória, constatada a prisão por força do flagrante restabelecido e cientes da autorização constitucional de liberdade provisória para casos de prisão decorrente de flagrante, olharemos no art. 321 do CPP e verificaremos que: “Ausentes os requisitos que autorizam a decretação da prisão preventiva, o juiz deverá conceder liberdade provisória, impondo, se for o caso, as medidas cautelares previstas no art. 319 deste Código e observados os critérios constantes do art. 282 deste Código”. Notem: o juiz deverá conceder liberdade provisória20. Isso implica dizer que: revogada a liberdade provisória, ainda que se admita possa o agente ser recolhido ao cárcere como decorrência desta decisão que irá restabelecer o flagrante em sua força privativa de liberdade, deverá o juiz novamente conceder a liberdade provisória a este mesmo preso. E ficaríamos assim, neste círculo vicioso, concedendo e revogando liberdade com o restabelecimento da prisão por força do flagrante outrora levado a efeito até que decretada eventual prisão preventiva, único óbice legal à liberdade provisória sem fiança. Isso demonstra que não é lógico, nem juridicamente possível, o recolhimento ao cárcere por força exclusiva da revogação de liberdade provisória. A revogação e o retorno ao cárcere, propriamente, só poderão ocorrer se houver a decretação de prisão preventiva ou o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. Mesmo no caso de decretação da prisão temporária, após vencido seu prazo de duração, o agente deverá voltar à vida livre, salvo se houver algum fundamento para a decretação da prisão preventiva, que então deverá ser providenciada. Não é compreensível imaginar possa esta dita prisão por força do restabelecimento do flagrante espraiar efeitos indefinidamente e em razão disso estender-se o encarceramento cautelar, até porque o art. 310 do CPP deixa evidente que, após a prisão por força de flagrante, a privação da liberdade somente subsistirá se for decretada a prisão preventiva, regra que também é válida para aquelas
hipóteses em que se admitir a prisão por revogação de liberdade provisória, já que neste caso, em última análise, a “prisão em flagrante seria restabelecida”, fazendo-se a partir daí indispensável sua avaliação pelo juiz nos moldes do art. 310, pois o encarceramento decorrente de prisão em flagrante não poderá ir além do prazo de sua comunicação ao juiz, como se extrai do art. 310 c/c o art. 306, § 1º, do CPP. É preciso ter em mente que a liberdade é garantia de extração máxima, do preâmbulo ao epílogo da Carta Magna. A prisão em flagrante ou por força de flagrante, repetimos, constitui exceção da exceção, na exata medida em que a liberdade é a regra e a exceção é a prisão mediante ordem prévia e escrita de autoridade judiciária, sendo a prisão em flagrante exceção a esta última exceção21. Neste conjunto de garantias e reflexões é que se deve realizar a análise dos institutos acima tratados.
10. DECISÃO JUDICIAL SOBRE LIBERDADE PROVISÓRIA SEM FIANÇA 10.1. A decisão que nega e seus fundamentos A liberdade provisória somente poderá ser negada quando estiverem presentes os requisitos que autorizam a prisão preventiva, que então deverá ser decretada, e mesmo assim, ao final de 2010, 44% da população carcerária no Brasil era de presos cautelares22, o que é inaceitável, especialmente quando se sabe que nos países democráticos este índice não ultrapassa 20 a 25%. A redação do art. 321 do CPP é suficientemente clara a respeito, o problema, entretanto, decorre da interpretação que se tem dado a determinados fatos e situações, bem como à fundamentação utilizada — ou a ausência dela, nas decisões que negam liberdade provisória e/ou decretam prisão preventiva. Não é por outra razão que o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução n. 66, de 27 de janeiro de 2009, para determinar a revisão periódica dos feitos criminais em que houver prisão cautelar decretada23. Na sistemática atualmente adotada está claro no CPP que a prisão por força do flagrante não subsistirá após o controle jurisdicional, e que a partir daí a prisão cautelar somente persistirá se for decretada a preventiva, ou, na letra da lei, se for convertida a prisão em flagrante em preventiva (art. 310, II, do CPP). Não basta, portanto, que o juiz negue pedido de liberdade provisória para que alguém preso em flagrante permaneça cautelarmente privado de sua liberdade. É imprescindível que o juiz decrete a prisão preventiva. Disso surge a necessidade de fundamento real, concreto, para que a liberdade provisória seja negada, e a prisão preventiva decretada. Tudo o que se sabe em termos de necessidade de fundamentação para a decretação da prisão preventiva vale exatamente e na mesma proporção para a necessidade de fundamentação do despacho que analisar pedido de liberdade provisória, e disso já tratamos longamente no capítulo referente à prisão preventiva, para onde remetemos o leitor em busca de informações substanciosas, com vistas a evitar o enfaro da repetição. O fato de ser o agente reincidente, ou mesmo portador de maus antecedentes, isoladamente, não é fundamento suficiente para negar liberdade provisória. Também o fato de ser estrangeiro, apenas, não determina negar o benefício24. A fundamentação consistente na garantia da ordem pública deve lastrear-se na intranquilidade
social causada pelo crime, a ponto de colocar em risco as instituições democráticas25. Não se trata, evidentemente, de hipótese em que o crime tenha provocado clamor público26/comoção social ou despertado a atenção da imprensa27. De igual forma, não se presta à fundamentação adequada a alusão a conceitos abstratos de ofensa às instituições sociais e familiares28, à possibilidade de gerar uma sensação de impunidade na sociedade29, à necessidade de preservação da credibilidade do Poder Judiciário30, ou a uma hipotética possibilidade de cometimento de outras infrações penais31. A gravidade abstrata do delito é insuficiente para a negativa de liberdade provisória32, sob pena de afronta à garantia constitucional da presunção de não culpabilidade33. É preciso, por fim, que o magistrado34 demonstre empiricamente35 a necessidade incontrastável da medida excepcional que é a prisão preventiva36, e a decisão judicial a este respeito deve conter fundamentação substancial37, lastreada em elementos concretos dos autos. A imprescindibilidade de adequada fundamentação38 das decisões judiciais exsurge clara do art. 93, IX, da CF. Mas no Brasil muitas vezes parece que não basta, não é suficiente estar na Constituição Federal, daí talvez o fato de leis ordinárias e súmulas sempre se referirem à necessidade de fundamentação das decisões judiciais. Bem por isso, aliás, a Suprema Corte tem decidido reiteradamente que, em matéria de liberdade provisória e prisão preventiva, não basta a mera explicitação textual dos requisitos previstos pelo art. 312 do CPP39. “A privação cautelar da liberdade individual reveste-se de caráter excepcional (STF, HC 90.753/RJ, 2ª T., rel. Min. Celso de Mello, DJU de 22-11-2007), sendo exceção à regra (STF, HC 90.398/SP, 1ª T., rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJU de 17-5-2007). Assim, é inadmissível que a finalidade da custódia cautelar, qualquer que seja a modalidade, seja deturpada a ponto de configurar uma antecipação do cumprimento de pena (STF, HC 90.464/RS, 1ª T., rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJU de 4-5-2007). O princípio constitucional da não culpabilidade se por um lado não resta malferido diante da previsão no nosso ordenamento jurídico das prisões cautelares, por outro não permite que o Estado trate como culpado aquele que não sofreu condenação penal transitada em julgado (STF, HC 89.501/GO, 2ª T., rel. Min. Celso de Mello, DJU de 16-3-2007). Desse modo, a constrição cautelar desse direito fundamental (art. 5º, inciso XV, da Carta Magna) deve ter base empírica e concreta (STF, HC 91.729/SP, 1ª T., rel. Min. Gilmar Mendes, DJU de 11-10-2007). Assim, a prisão preventiva se justifica desde que demonstrada a sua real necessidade (STF, HC 90.862/SP, 2ª T., rel. Min. Eros Grau, DJU de 27-4-2007) com a satisfação dos pressupostos a que se refere o art. 312 do Código de Processo Penal, não bastando, frise-se, a mera explicitação textual de tais requisitos (STF, HC 92.069/RJ, 2ª T., rel. Min. Gilmar Mendes, DJU de 9-11-2007). Não se exige, contudo, fundamentação exaustiva, sendo suficiente que o decreto constritivo, ainda que de forma sucinta, concisa, analise a presença, no caso, dos requisitos legais ensejadores da prisão preventiva (STF, RHC 89.972/GO, 1ª T., rela. Mina. Cármen Lúcia, DJU de 29-6-2007)”40.
10.2. A decisão que concede e seus fundamentos A necessidade de fundamentação da decisão judicial que concede liberdade provisória sem fiança não fica excluída pelo fato de ser concessiva de liberdade e não o contrário. Da mesma maneira que nas demais decisões, a necessidade de fundamentação decorre do art. 93,
IX, da CF.
11. CRIMES HEDIONDOS E ASSEMELHADOS A Constituição Federal veda a concessão de liberdade provisória mediante fiança, conforme dispõe no art. 5º, XLII, XLIII e XLIV, mas não proíbe, em relação a qualquer tipo de delito, a liberdade provisória sem fiança. Em sua redação original o art. 2º, II, da Lei n. 8.072/90 dispunha ser insuscetíveis de fiança e liberdade provisória os crimes hediondos, a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo. Entrou em vigor no dia 29 de março de 2007, data de sua publicação, a Lei n. 11.464, de 28 de março de 2007, que deu nova redação ao art. 2º da Lei n. 8.072, de 25 de julho de 1990. Com as modificações impostas, o art. 2º da Lei n. 8.072/90 deixou de proibir expressamente a concessão de liberdade provisória em se tratando da prática dos crimes que menciona41. Doutrina e jurisprudência sempre foram divergentes a respeito da validade da regra proibitiva. De um lado, havia entendimento no sentido de que a vedação estava expressa e por isso não se deveria conceder liberdade provisória, sendo dispensável a análise de outros requisitos, bastando, portanto, o enquadramento na Lei n. 8.072/90 para ficar obstado o benefício. Para outros, dentre os quais nos incluímos, se ausentes os requisitos que autorizavam a decretação da prisão preventiva, era cabível a liberdade provisória, independentemente da gravidade do crime. No sentido do descabimento da liberdade provisória, antes da mudança, confira-se: “Diante do disposto no art. 2º, II, da Lei n. 8.072/90, ao réu preso em flagrante e denunciado pela prática de tráfico de entorpecentes, crime considerado hediondo, inadmite-se a concessão de liberdade provisória”42. Em sentido contrário, também se decidiu que o simples fato de estar listado na Lei dos Crimes Hediondos não era causa impeditiva da liberdade provisória, cumprindo ao magistrado a análise de cada caso concreto43. Por aqui, a compreensão que se impõe não pode ser diversa daquela a que chegaram os Ministros do Supremo Tribunal Federal quando do reconhecimento da inconstitucionalidade do art. 21 do Estatuto do Desarmamento (Lei n. 10.826/2003), conforme cuidaremos de expor no item seguinte. A discussão, entretanto, perdeu relevância, visto que, após a vigência da Lei n. 11.464/2007, a liberdade provisória não está mais proibida expressamente, e seu cabimento deverá ser analisado em cada caso concreto. Mesmo diante dessa irrecusável realidade, há decisões no Supremo Tribunal Federal no sentido de que “o inciso II do art. 2º da Lei n. 8.072/90, quando impedia a ‘fiança e a liberdade provisória’, de certa forma incidia em redundância, dado que, sob o prisma constitucional (inciso XLIII do art. 5º da CF/88), tal ressalva era desnecessária. Redundância que foi reparada pelo art. 1º da Lei n. 11.464/2007, ao retirar o excesso verbal e manter, tão somente, a vedação do instituto da fiança”44. Com todo respeito, fosse realmente a opção política do legislador corrigir o excesso e acabar com a alegada redundância, mas manter a proibição à liberdade provisória e finalizar a discussão, por certo, na ocasião da Lei n. 11.464/2007 teria retirado da Lei n. 8.072/90 a proibição à fiança, e não à liberdade provisória, até porque ao tempo da mudança a matéria já era discutida na doutrina e jurisprudência, não havendo qualquer ignorância dos Poderes Legislativo e Executivo quanto ao particular assunto.
12. TRÁFICO DE DROGAS. ART. 44 DA LEI N. 11.343/2006 12.1. Breve retrospecto A Lei n. 8.072, de 25 de julho de 1990 (Lei dos Crimes Hediondos), em seu art. 2º, II, passou a considerar insuscetíveis de liberdade provisória os crimes hediondos, a prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, bem como terrorismo. São do conhecimento geral, e até por isso desnecessário discorrer a respeito, as discussões que desde então se estabeleceram na doutrina e jurisprudência tratando da (in)constitucionalidade da referida proibição genérica, ex lege. No STF prevaleceu por longo período entendimento no sentido da constitucionalidade da vedação. Com a vigência da Lei n. 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento), a discussão adquiriu novo impulso em razão do disposto em seu art. 21, que passou a considerar insuscetíveis de liberdade provisória os crimes previstos nos arts. 16 (posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito), 17 (comércio ilegal de arma de fogo) e 18 (tráfico internacional de arma de fogo) daquele Estatuto. Contra tal vedação expressa, genérica e antecipada, foi ajuizada ação direta de inconstitucionalidade45, que resultou procedente, ficando reconhecida afronta aos princípios constitucionais da presunção de inocência e do devido processo legal (CF, art. 5º, LVII e LXI). Na ocasião, destacou-se que “a Constituição não permite a prisão ex lege, sem motivação, a qual viola, ainda, os princípios da ampla defesa e do contraditório (CF, art. 5º, LV)”46. Resolvendo a controvérsia, a Lei n. 11.464, de 28 de março de 2007, deu nova redação ao art. 2º da Lei n. 8.072/90, e retirou a vedação antes expressa no inciso II do art. 2º, que proibia a concessão de liberdade provisória nos crimes mencionados.
12.2. O art. 44 da Lei de Drogas Dentro do quadro anteriormente apresentado se insere a Lei n. 11.343/2006 (Lei de Drogas), que em seu art. 44 passou a dispor que os crimes previstos em seus arts. 33, caput e § 1º, e 34 a 37 são inafiançáveis e insuscetíveis de liberdade provisória, dentre outros benefícios também expressamente vedados47. Conforme sempre sustentamos48, a Lei n. 11.464, de 28 de março de 2007, que deu nova redação ao disposto no inciso II do art. 2º da Lei 8.072/90, retirando a proibição genérica, ex lege, de liberdade provisória, em se tratando de crimes hediondos, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e terrorismo, derrogou o art. 44 da Lei n. 11.343/2006 (Lei de Drogas), de maneira que a vedação antecipada e genérica ao benefício da liberdade provisória não subsiste no ordenamento jurídico vigente. Ainda que assim não fosse, as razões que fundamentaram o reconhecimento da inconstitucionalidade do art. 21 da Lei n. 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento) servem na mesma medida para fundamentar a inconstitucionalidade da vedação à liberdade provisória contida no art. 44 da Lei de Drogas. Se as situações são idênticas, como realmente são e isso não se pode negar, não há razão lógica ou jurídica para interpretações distintas e conclusões díspares, geradoras de condenável tratamento desigual. Mesmo assim, parte considerável da jurisprudência continua inclinada a admitir a vigência e constitucionalidade da vedação à liberdade provisória contida no art. 44 da Lei de Drogas49.
Nestes termos, tem decidido o STJ que “a vedação expressa do benefício de liberdade provisória aos crimes de tráfico ilícito de entorpecentes, disciplinada no art. 44 da Lei n. 11.343/06, é, por si só, motivo suficiente para impedir a concessão da benesse ao réu preso em flagrante por crime hediondo ou equiparado, nos termos do disposto no art. 5º, inciso LXVI, da Constituição Federal, que impõe a inafiançabilidade das referidas infrações penais”50.
12.3. O enfrentamento da questão no Supremo Tribunal Federal Em novembro de 2008, ao denegar a ordem no julgamento do HC 95.539/CE (STF, 2ª T.), o Min. EROS GRAU destacou que a jurisprudência do STF estava alinhada no sentido do não cabimento da liberdade provisória no caso de prisão em flagrante por tráfico de drogas. Seguindo a mesma linha de argumentação, o Min. RICARDO LEWANDOWSKI indeferiu liminar no HC 100.831/MG, nos seguintes termos: “Em que pese o tráfico ilícito de drogas ser tratado como equiparado a hediondo, a Lei 11.343/2006 é especial e posterior àquela — Lei 8.072/90. Por essa razão, a liberdade provisória viabilizada aos crimes hediondos e equiparados pela Lei 11.464/2007 não abarca, em princípio, a hipótese de tráfico ilícito de drogas”51. Contudo, ainda que tardiamente, o STF vem revendo seu posicionamento, de maneira a reconhecer a inconstitucionalidade da vedação a priori à liberdade provisória, e, de consequência, a insubsistência da negativa ao benefício com fundamento exclusivo na literalidade do art. 44 da Lei de Drogas. Nessa linha argumentativa já decidiu o Min. CELSO DE MELLO que a “vedação apriorística de concessão de liberdade provisória, reiterada no art. 44 da Lei 11.343/2006 (Lei de Drogas), tem sido repelida pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que a considera incompatível, independentemente da gravidade objetiva do delito, com a presunção de inocência e a garantia do ‘due process’, dentre outros princípios consagrados pela Constituição da República”52. Tal forma de pensar foi novamente adotada pelo Min. CELSO DE MELLO ao deferir liminar no HC 97.976/MG (DJ de 11-3-2009)53, e tem se mantido. Em ocasião posterior, embora tenha novamente destacado que o STF vem adotando o entendimento de que o preso em flagrante por tráfico de drogas não tem direito à liberdade provisória, por expressa vedação do art. 44 da Lei n. 11.343/2006, o então Min. EROS GRAU reformulou seu posicionamento e concedeu liminar em habeas corpus, consignando que o Min. CELSO DE MELLO, ao deferir a liminar requerida no HC 97.976/MG, já havia destacado que o tema está a merecer reflexão pelo STF, e terminou por decidir que “a vedação da concessão de liberdade provisória ao preso em flagrante por tráfico de entorpecentes, veiculada pelo art. 44 da Lei n. 11.343/06, é expressiva de afronta aos princípios da presunção de inocência, do devido processo legal e da dignidade da pessoa humana (arts. 1º, III, e 5º, LIV e LVII da Constituição do Brasil). Daí resultar inadmissível, em face dessas garantias constitucionais, possa alguém ser compelido a cumprir pena sem decisão transitada em julgado, além do mais impossibilitado de usufruir benefícios da execução penal”. E arrematou: “A inconstitucionalidade do preceito legal me parece inquestionável”54.
12.4. A vedação à fiança não exclui a possibilidade de liberdade provisória sem fiança É inaceitável e incompreensível a confusão que se tem feito amiúde, evidenciada inclusive em inúmeros acórdãos oriundos das Cortes Superiores55, quando se tem entendido que a Constituição Federal, ao dispor no art. 5º, XLIII56, sobre a impossibilidade de liberdade provisória mediante fiança para determinados tipos de crimes, também impossibilitou a liberdade provisória sem fiança nestes
mesmos casos. Este tipo de interpretação, em última análise, contraria não só o instituto da liberdade provisória em suas duas vertentes bem distintas — com ou sem fiança —, mas também ignora a letra da Lei n. 8.072/90, que foi modificada pela Lei n. 11.464/2007, quando então passou a permitir liberdade provisória sem fiança a casos inafiançáveis. Esta forma de enxergar o instituto contraria, aliás, o disposto no art. 5º, LXVI, da CF, onde se encontram bem delineadas as possibilidades de liberdade provisória, com ou sem fiança, como espécies que pertencem a um mesmo gênero; ramos distintos de uma mesma árvore libertária. Fato é que esse entendimento estranho, data venia, tem grassado junto aos tribunais, majoritariamente, e bem por isso o acerto do Min. CELSO LIMONGI quando aponta a distinção que há, para concluir que “a proibição da liberdade provisória com fiança não compreende a da liberdade provisória sem a fiança”57. A inafiançabilidade, por si só — disse o então Ministro EROS GRAU —, “não pode e não deve constituir-se em causa impeditiva da liberdade provisória. Não há antinomia na Constituição do Brasil. Se a regra nela estabelecida, bem assim na legislação infraconstitucional, é a liberdade, sendo a prisão a exceção, existiria conflito de normas se o artigo 5º, inciso XLII, estabelecesse expressamente, além das restrições nele contidas, vedação à liberdade provisória. Nessa hipótese, o conflito dar-se-ia, sem dúvida, com os princípios da dignidade da pessoa humana, da presunção de inocência, da ampla defesa e do devido processo legal”58.
12.5. Repercussões do art. 310 do CPP Dispõe o art. 310 do CPP, com a redação da Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011, que, “ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá fundamentadamente: I — relaxar a prisão ilegal; II — converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; ou III — conceder liberdade provisória, com ou sem fiança. Parágrafo único. Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o agente praticou o fato nas condições constantes dos incisos I a III do caput do art. 23 do Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 — Código Penal, poderá, fundamentadamente, conceder ao acusado liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos processuais, sob pena de revogação”. A obrigatoriedade de relaxar a prisão ilegal já estava prevista no art. 5º, LXV, e a obrigatoriedade de se conceder liberdade provisória, com ou sem fiança, no art. 5º, LXVI, ambos da CF. Pelo que se conclui do art. 310, ou a prisão é relaxada e o autuado é colocado em liberdade, ou converte-se a prisão em flagrante em prisão preventiva, quando presentes os requisitos legais e não se revelarem adequadas e suficientes as medidas cautelares dos arts. 319 e 320 do CPP, ou concede-se liberdade provisória, com ou sem fiança. Ao tratarmos do tema liberdade provisória, é preciso não confundir gênero com espécie. Liberdade provisória, em sentido amplo, é o gênero, do qual extraímos as espécies: 1º) liberdade provisória com fiança; e 2º) liberdade provisória sem fiança. Não é outra a interpretação que se extrai do art. 5º, LXVI, da CF, quando diz: “ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança”. Não foi por razão diversa, aliás, que a Lei n. 6.416, de 24 de maio de 1977, introduziu um parágrafo único na antiga redação do art. 310 do CPP. A ideia foi exatamente permitir a liberdade provisória, sem fiança, para aqueles casos de crimes inafiançáveis.
Pois bem. Efetuada a prisão e lavrado o respectivo auto, deste se enviará cópia ao juiz competente no prazo de 24 horas (art. 306, § 1º, do CPP). Recebendo o expediente, nos precisos termos do art. 310 do CPP, deverá o juiz relaxar a prisão, se for ilegal. Não sendo ilegal, deverá converter prisão em flagrante em prisão preventiva quando presentes os requisitos legais (arts. 311 a 313 do CPP) e se a tanto provocado, pois não poderá fazê-lo ex officio durante a fase de investigação criminal. Não sendo caso de preventiva, deverá conceder liberdade provisória, com ou sem fiança, podendo cumular, se for o caso, medida cautelar restritiva prevista dentre as hipóteses dos arts. 319 e 320 do CPP. Como se vê, na letra do art. 310, após o momento do controle jurisdicional, somente subsistirá custódia cautelar se ocorrer decretação de prisão preventiva. Porém, e se após a prisão em flagrante por crime hediondo ou assemelhado o juiz verificar que não estão presentes os requisitos da prisão preventiva? Poderá assim mesmo manter o agente preso? Claro que não! Bem, então, deverá soltá-lo a que título? Liberdade provisória é evidente, pois estamos tratando de hipótese em que não se afigura cabível o relaxamento da prisão. Ocorre, entretanto, que a Constituição Federal lista crimes que considera inafiançáveis, e, sendo assim, em relação a eles não será possível conceder liberdade provisória mediante fiança, restando, apenas, a possibilidade de liberdade provisória sem fiança, o que demonstra o desacerto em se afirmar que a inafiançabilidade tratada na Carta Magna impede a liberdade provisória sem fiança. Esta distinção, aliás, já havia sido reafirmada pela Lei n. 11.464/2007, conforme apontamos anteriormente, coisa que a Lei n. 12.403/2011, mais uma vez, cuidou de explicitar. Sustentar que a inafiançabilidade tratada expressamente na Constituição Federal também significa vedação à liberdade provisória sem fiança implica reconhecer a inconstitucionalidade do art. 310 do CPP quando determina que ninguém deverá permanecer preso cautelarmente se não estiverem presentes os requisitos da prisão preventiva. Dessas reflexões, resultam duas vertentes possíveis: 1ª) ou se reconhece, definitivamente, a possibilidade de liberdade provisória, sem fiança, em relação a todos os crimes inafiançáveis; 2ª) ou se reconhece a inconstitucionalidade do inciso II do art. 310 do CPP. A primeira linha de pensamento é a correta.
12.6. Conclusão Na linha do que já afirmamos em outras ocasiões, ao se permitir a liberdade provisória e condenar pela inconstitucionalidade toda e qualquer vedação ex lege ao benefício, não se está a homenagear a criminalidade, tampouco aqueles que a patrocinam. É preciso admitir que “há traficantes e traficantes”. O que se busca, em verdade, é a plenitude do irrenunciável Estado Democrático de Direito e a efetividade das garantias constitucionais alcançadas ao longo dos tempos não sem muitos esforços. Busca-se restaurar a presunção de inocência, a dignidade da pessoa humana, o devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório, rotineira e impunemente violados. Com tal proceder, renovam-se os votos de confiança na Magistratura brasileira, acreditando na
capacidade de discernimento na avaliação que deve ser feita por seus ilustrados integrantes, caso a caso, na análise da possibilidade, ou não, de se conceder a liberdade provisória. Em última análise, busca-se a tratativa do humano pelo humano no enfrentamento de questões individuais que cada caso traz, sem olvidar do valor Liberdade. Não se olvidando, ainda, que “não haverá liberdade sempre que as leis permitirem que o homem deixe de ser pessoa e se torne coisa”59. No campo em que gravitam reflexões que conduzem às discussões mais elevadas não há espaço para discursos rasteiros e mofados; calcados em doutrina penal baseada no felizmente superado Ato Institucional n. 5. Aos leitores, uma reflexão de ARISTÓTELES: “o ignorante afirma, o sábio duvida, o sensato reflete”.
13. ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS A Lei n. 9.034, de 3 de maio de 1995, que dispõe sobre a utilização de meios operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações criminosas, em seu art. 7º, proíbe a concessão de liberdade provisória, com ou sem fiança, “aos agentes que tenham tido intensa e efetiva participação na organização criminosa”. Por aqui, os mesmos fundamentos que serviram de base para o reconhecimento da inconstitucionalidade do art. 21 da Lei n. 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento)60 se prestam a afirmar a inconstitucionalidade da vedação.
14. CRIMES CONTRA A ECONOMIA POPULAR E DE SONEGAÇÃO FISCAL Dispunha o § 2º do art. 325 do CPP que, nos casos de prisão em flagrante pela prática de crime contra a economia popular ou de crime de sonegação fiscal, não se aplicava o disposto no art. 310 e parágrafo único do CPP, sendo certo que a liberdade provisória somente poderia ser concedida mediante fiança, por decisão do juiz competente e após a lavratura do auto de prisão em flagrante. A previsão foi introduzida no CPP pela Lei n. 8.035, de 27 de abril de 1990, e segundo pensamos era inconstitucional. A discussão, entretanto, deixou de ser relevante, já que o art. 4º da Lei n. 12.403/2011 revogou expressamente o § 2º, e seus incisos I, II e III, do art. 325 do CPP.
15. REVOGAÇÃO DA LIBERDADE PROVISÓRIA SEM FIANÇA Embora não seja possível vincular ou condicionar a liberdade provisória sem fiança ao cumprimento de certas obrigações, é cabível pensar na sua revogação, contudo, apenas no caso de decretação de prisão preventiva61, absolvição ou condenação definitiva, com trânsito em julgado, e disso não se extrai autorização para afirmar que houve enfraquecimento do sistema de proteção social contra condutas desviantes. Praticado pelo agente qualquer daqueles comportamentos que para muitos autorizavam no passado a revogação da liberdade provisória e o retorno ao cárcere, caberá ao juiz verificar se é caso, ou não, de aplicar uma ou mais dentre as medidas cautelares anotadas nos arts. 319 e 320 do CPP. Dependendo da gravidade do que se fizer ou deixar de fazer poderá ser aplicada apenas uma inicialmente, mas se acaso se revelar insuficiente ou ocorrer novo comportamento que justifique, outra ou outras poderão ser aplicadas, em substituição ou cumulativamente. Igual procedimento se verificará quando no gozo da liberdade provisória já estiver o agente submetido a outra medida restritiva, hipótese em que outras poderão ser fixadas, se demonstrada a
necessidade, utilidade, razoabilidade e proporcionalidade da providência, sendo certo que o descumprimento injustificado de tais medidas poderá levar à decretação de prisão preventiva, conforme autorização que se extrai do parágrafo único do art. 312 do CPP. Nada impede, entretanto, que estando presentes os requisitos legais, seja a prisão preventiva a qualquer tempo decretada, independentemente da prévia imposição de cautelares restritivas, mas é preciso reforçar que esta providência extrema somente poderá ser determinada quando não for cabível outra medida cautelar (§ 6º do art. 282 do CPP). Este sistema gradativo de resposta estatal é eficiente e condiz com a Constituição Federal, onde a liberdade exala como valor supremo a se preservar, e a prisão providência de ultima ratio.
Liberdade Provisória sem Fiança Quadro comparativo da legislação
Como era
Como ficou
Art. 310. Quando o juiz verificar pelo auto de prisão em flagrante que o agente praticou o fato, nas condições do art. 19, I, II e III, do Código Penal, poderá, depois de ouvir o Ministério Público, conceder ao réu liberdade provisória, mediante ter- mo de comparecimento a todos os atos do processo, sob pena de revogação. Parágrafo único. Igual procedimento será adotado quando o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, a inocorrência de qualquer das hipóteses que autorizam a prisão preventiva (arts. 311 e 312).
Art. 310. Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá fundamentadamente: I — relaxar a prisão ilegal; ou II — converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; ou III — conceder liberdade provisória, com ou sem fiança. Parágrafo único. Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o agente praticou o fato nas condições constantes dos incisos I a III do caput do art. 23 do Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 — Código Penal, poderá, fundamentadamente, conceder ao acusado liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos processuais, sob pena de revogação.
Art. 310. Quando o juiz verificar pelo auto de prisão em flagrante que o agente praticou o fato, nas condições do art. 19, I, II e III, do Código Penal, poderá, depois de ouvir o Ministério Público, conceder ao réu liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos do processo, sob pena de revogação. Parágrafo único. Igual procedimento será adotado quando o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, a inocorrência de qualquer das hipóteses que autorizam a prisão preventiva (arts. 311 e 312).
Art. 321. Ausentes os requisitos que autorizam a decretação da prisão preventiva, o juiz deverá conceder liberdade provisória, impondo, se for o caso, as medidas cautelares previstas no art. 319 deste Código e observados os critérios constantes do art. 282 deste Código.
Art. 350. Nos casos em que couber fiança, o juiz, verificando ser impossível ao réu prestá-la, por motivo de pobreza, poderá conceder-lhe a liberdade provisória, sujeitando-o às obrigações constantes dos arts. 327 e 328. Se o réu infringir, sem motivo justo, qualquer dessas obrigações ou praticar outra infração penal, será revogado o benefício. Parágrafo único. O escrivão intimará o réu das obrigações e sanções previstas neste artigo.
Art. 350. Nos casos em que couber fiança, o juiz, verificando a situação econômica do preso, poderá conceder-lhe liberdade provisória, sujeitando-o às obrigações constantes dos arts. 327 e 328 deste Código e a outras medidas cautelares, se for o caso. Parágrafo único. Se o beneficiado descumprir, sem motivo justo, qualquer das obrigações ou medidas impostas, aplicar-se-á o disposto no § 4º do art. 282 deste Código.
1 Lei n. 7.960, de 21 de dezembro de 1989. 2 Arts. 311 a 316 do CPP. “A liberdade provisória é instituto próprio da prisão em flagrante delito, não sendo cabível quando se trata de prisão preventiva” (STJ, HC 105.171/SE, 6ª T., rel. Min. Jane Silva, j. 26-8-2008, DJe de 8-9-2008). 3 Ver: art. 5º, XLVII, b, da CF. 4 Ver arts. 323 e 324 do CPP. 5 Se for ilegal será cabível o relaxamento, por força do disposto no art. 5º, LXV, da CF, segundo o qual: “A prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária”. 6 Conforme os arts. 127, caput, e 129, II, da CF. 7 É evidente, neste caso, não estarmos diante de hipótese de relaxamento da prisão em flagrante ou de cabimento de prisão temporária. 8 Art. 5º, LXI, da CF: “Ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei”. 9 STF, HC 94.157/SP, 2ª T., rel. Min. Celso de Mello, j. 10-6-2008, DJe de 28-3-2011. 10 E que já estavam claras na Constituição Federal e no CPP, a nosso ver. 11 Art. 282, § 2º, do CPP: “As medidas cautelares serão decretadas pelo juiz, de ofício ou a requerimento das partes ou, quando no curso da investigação criminal, por representação da autoridade policial ou mediante requerimento do Ministério Público”. 12 Art. 282, § 3º, do CPP: “Ressalvados os casos de urgência ou de perigo de ineficácia da medida, o juiz, ao receber o pedido de medida cautelar, determinará a intimação da parte contrária, acompanhada de cópia do requerimento e das peças necessárias, permanecendo os autos em juízo”. 13 Sobre a possibilidade de redução do valor da fiança, conferir o art. 325, § 1º, II, do CPP. 14 Incluído pela Lei n. 6.416, de 24 de maio de 1977. 15 Imposta pela Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011. 16 Não perder de vista que nestes casos entendemos que a hipótese é de relaxamento, e não de liberdade provisória, apesar do texto da lei. 17 A este propósito, veja os arts. 327 e 328 do CPP. 18 Se o descumprimento de condição que se queira impor ao arrepio da lei, por si, não é suficiente para a decretação da prisão preventiva, não pode ser causa eficiente de nova prisão cautelar inominada. 19 Hipótese em que a lei não admite liberdade provisória, com ou sem fiança, em conformidade com a Carta Magna. 20 Sem referência a qualquer condição obrigatória. 21 Art. 5º, LXI, da CF: “Ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei”. 22 Em alguns Estados da Federação já se constataram 70% de presos cautelares. 23 Em atendimento ao art. 3º da Resolução n. 66 do CNJ, a Presidência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, a Corregedoria-Geral da Justiça e a Presidência da Seção Criminal expediram o Comunicado n. 164/2011, onde diz ser imperiosa e permanente a revisão da necessidade na manutenção das prisões provisórias, determinando aos magistrados de 1ª instância que, no prazo de 30 dias, contado da primeira publicação do próprio comunicado, reexaminem, por despacho fundamentado nos autos, a necessidade da custódia cautelar dos réus presos há mais de 3 meses, informando por ofício à Corregedoria-Geral da Justiça a quantidade de processos analisados e de benefícios concedidos. 24 “O fato de o paciente ser estrangeiro não é obstáculo à concessão de sua liberdade provisória, até porque a Constituição Federal garante aos brasileiros e estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à liberdade” (TRF, 1ª Região, HC 2002.01.00.023747-5/BA, 3ª T., rel. Juiz Federal Plauto Ribeiro, j. 13-8-2001, DJU de 30-8-2002, RT 805/699). 25 STJ, HC 32.607/RS, 6ª T., rel. Min. Paulo Medina, DJU de 13-6-2005. 26 “O clamor público por não estar entre as causas justificadas de custódia preventiva deve ser analisado com os devidos cuidados, para se evitar injustiças, assim, ausentes os demais pressupostos autorizadores da medida inadmissível a sua decretação” (STJ, HC 4.926/SP, 5ª T., j. 8-10-1996, rel. Min. Edson Vidigal, DJU de 20-10-1997, RT 750/567). 27 “Se o decreto de prisão preventiva cinge-se a juízos conjecturais despidos de indicação de qualquer base empírica, apenas a passagem folclórica que atraiu a atenção da imprensa, deve ser cassado, pois a existência de um crime e a probabilidade de que o acusado seja o seu autor são requisitos da custódia, mas por si sós não a legitimam” (STF, HC 79.204-9/BA, 1ª T., j. 1-6-1999, rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJU de 6-8-1999, RT 769/510).
28 STJ, HC 40.530/MS, 5ª T., rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJU de 15-8-2005. 29 STJ, HC 38.681/MS, 5ª T., rel. Min. Gilson Dipp, DJU de 7-3-2005. 30 “A preservação da credibilidade do Judiciário não deságua na automaticidade da custódia preventiva, devendo ocorrer, isso sim, em estrita observância ao Direito posto” (STF, HC 95.483/MT, 1ª T., rel. Min. Marco Aurélio, j. 15-9-2009, DJe de 29-102009). 31 STF, HC 100.872/MG, 2ª T., rel. Min. Eros Grau, j. 9-3-2010, DJe de 30-4-2010. 32 “A gravidade da imputação, consideradas as qualificadoras do tipo penal, não serve à prisão preventiva, havendo de ser elucidada na sentença relativa à culpa. Se a própria lei prevê que, em caso de sentença condenatória, o juiz decidirá fundamentadamente se o réu poderá apelar em liberdade, forçoso é concluir que o enquadramento do crime como hediondo não revela, por si só, base para a prisão preventiva” (STF, HC 92.299/SP, 1ª T., rel. Min. Marco Aurélio, j. 24-6-2008, DJe n. 177, de 19-9-2008). “Não constituem fundamentos idôneos à prisão preventiva a invocação da gravidade abstrata ou concreta do delito imputado, definido ou não como hediondo — muitas vezes, inconsciente antecipação da punição penal” (STF, HC 90.064/SP, 1ª T., rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 8-5-2007, DJe n. 42, de 22-6-2007). “A concessão ou não de liberdade provisória ao réu preso em flagrante não está relacionada à gravidade do delito e sua repercussão no meio social, mas sim à verificação da inocorrência de qualquer das hipóteses que autorizam a prisão preventiva” (TJSP, HC 275.853-3/5, 3ª Câm., rel. Des. Gonçalves Nogueira, j. 23-2-1999 RT 764/564). 33 STJ, HC 120.108/ES, 6ª T., rel. Min. Jane Silva, j. 23-6-2009, DJe de 10-8-2009; STJ, HC 122.761/SP, 6ª T., rel. Min. Jane Silva, j. 6-2-2009, DJe de 2-3-2009. 34 “É dever do Magistrado demonstrar, com dados concretos extraídos dos autos, a necessidade da custódia” (STJ, REsp 676.819/RS, 5ª T., rel. Min. Felix Fischer, DJU de 14-2-2005). 35 “A prisão preventiva para garantia da ordem pública não se justifica sem a demonstração de sua base empírica” (STF, HC 85.036-7/RS, 1ª T., rel. Min. Eros Grau, DJU de 25-2-2005). 36 “Somente se admite o cerceamento à liberdade de locomoção se presentes os requisitos do fumus boni iuris, consubstanciado nos indícios de autoria e de materialidade, e do periculum in mora, lastreado na garantia da ordem pública e econômica, por conveniência da instrução criminal ou como instrumento para assegurar a aplicação da lei penal. Ausentes quaisquer desses pressupostos é de rigor a liberdade provisória, uma vez que o seu cerceamento é medida excepcional que deve ser interpretada restritivamente e em consonância com os princípios constitucionais” (TRF, 2ª Região, HC 2001.02.01.028967-7, 1ª T., rel. Des. Federal Ricardo Regueira, j. 25-3-2002, DJU de 18-6-2002, RT 803/707). 37 TACrimSP, HC 463.154-7, 10ª Câm., rel. Juiz Ary Casagrande, DOESP de 12-4-2004. 38 “A simples referência à sofisticação dos meios empregados no contrabando, ou ao valor das mercadorias, não é motivo para o indeferimento da liberdade provisória com base no art. 7º da Lei 9.034/95, que cuida da organização criminosa, principalmente se o réu é primário, tem bons antecedentes, ocupação lícita e reside no distrito da culpa” (TRF, 3ª Região, HC 97.03.0257801/MS, 2ª T., rel. Juíza Sylvia Steiner, j. 25-11-1997, DJU de 17-12-1997, RT 750/742). 39 STF, HC 84.662/BA, rel. Min. Eros Grau, 1ª T, v.u., DJ de 22-10-2004; HC 86.175/SP, rel. Min. Eros Grau, 2ª T., v.u., DJ de 10-11-2006; HC 87.041/PA, rel. Min. Cezar Peluso, 1ª T., m.v., DJ de 24-11-2006 e HC 88.448/RJ, rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª T., por empate na votação, DJ de 9-3-2007” (STF, HC 89.238/SP, 2ª T., rel. Min. Gilmar Mendes, j. 29-5-2007, DJe n. 101, de 14-9-2007). No mesmo sentido: STF, HC 101.705/BA, 1ª T., rel. Min. Ayres Britto, j. 29-6-2010, DJe de 3-9-2010; STF, HC 95.125/BA, 1ª T., rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 8-6-2010, DJe de 24-9-2010. 40 STJ, HC 127.036/SP, 5ª T., rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, rel. p/ o acórdão Min. Felix Fischer, j. 19-8-2009, DJe de 8-3-2010. 41 Esta mesma lei também acabou definitivamente com o regime integral fechado (art. 2º, § 1º) e estabeleceu novos prazos para progressão de regime em se tratando dos crimes a que se refere (§ 2º). 42 STF, RE 240.782-3-MA, 2a T., rel Min. Néri da Silveira, j. 25-9-2001, v.u., DJU de 26-10-2001, RT 797/532. No mesmo sentido: STJ, HC 5.347-RJ (96.0078628-3), 5ª T., rel. Min. José Arnaldo, j. 4-3-1997, DJ de 14-4-1997, JSTJ 97/330; STJ, HC 470-AM, 6ª T., rel. Min. Willian Patterson, j. 6-11-1990, v.u., DJU de 26-11-1990, RT 671/373. 43 STJ, HC 12.714-SP, 5ª T., j. 15-6-2000, rel. Min. Gilson Dipp, DJU de 21-8-2000, RT 784/573. 44 TJSP, HC 157.378-3, 3ª Câm. Crim., j. 27-12-1993, rel. Des. Luiz Pantaleão, JTJ 155/320. No mesmo sentido: TJBA, hc 12.935-8/2003, 1ª Câm., j. 17-2-2004, rel. Des. Antônio Lima Farias, RT 829/613; TJRS, RSE 7000.88.22.298, 2ª Câm. Crim., j. 2-12-2004, rel. Des. José Antônio Cidade Pitrez, Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal, n. 3, p. 138. 45 RENAT O MARCÃO, Estatuto do Desarmamento, 4. ed., São Paulo: Saraiva, 2012. 46 RENAT O MARCÃO, Estatuto do Desarmamento, 4. ed., São Paulo: Saraiva, 2012. 47 RENAT O MARCÃO, Tóxicos, 8. ed., São Paulo: Saraiva, 2011.
48 RENAT O MARCÃO, Tóxicos, 8. ed., São Paulo: Saraiva, 2011. 49 Neste sentido: STF, HC 92.747-5/SP, 1ª T., rel. Min. Menezes Direito, DJ de 25-4-2008, Revista IOB de Direito Penal e Processual Penal, n. 50, p. 146; STJ, RHC 22.379-SP, 5ª T., rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJU de 22-4-2008, Revista Jurídica, n. 366, p. 197; STJ, RHC 22.623-MT, 5ª T., rel. Min. Felix Fischer, DJU de 22-4-2008, Revista Jurídica, n. 366, p. 192. 50 STJ, RHC 23.083/SP, 5ª T., rel. Min. Laurita Vaz, DJU de 22-4-2008, Revista Jurídica, n. 366, p. 192. 51 STF, HC 100.831/MG, rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 30-9-2009. 52 STF, MC em HC 96.715-9/SP, 2ª T., rel. Min. Celso de Mello, j. 19-12-2008. Informativo STF n. 533. Na mesma linha de pensamento já havia se posicionado a Desembargadora do TJMG Jane Silva, enquanto Ministra Convocada no Superior Tribunal de Justiça, conforme ementa que segue transcrita: “A gravidade abstrata do delito atribuído ao agente é insuficiente para a manutenção de sua prisão provisória, sob pena de afronta à garantia constitucional de presunção de não culpabilidade. Precedentes. Da mesma forma, a invocação da repercussão social do delito não se presta para a justificação da constrição cautelar, sob pena de antecipação do cumprimento da reprimenda, vedada pelo ordenamento jurídico pátrio, notadamente quando a quantidade de drogas encontrada em poder dos agentes não se mostra expressiva. Precedentes. Unicamente a vedação legal contida no artigo 44 da Lei 11.343/2006 é insuficiente para o indeferimento da liberdade provisória, notadamente em face da edição da Lei 11.464/2007, posterior e geral em relação a todo e qualquer crime hediondo e/ou assemelhado. Precedentes. Dado provimento ao recurso para deferir ao recorrente os benefícios da liberdade provisória” (STJ, RHC 24.349, 6ª T., rel. Min. Jane Silva, j. 11-11-2008, DJU de 1-12-2008; Boletim IBCCrim n. 194, Jurisprudência, p. 1228). 53 No v. Acórdão ficou consignado: “(...) o princípio da proporcionalidade visa a inibir e a neutralizar o abuso do Poder Público no exercício das funções que lhe são inerentes, notadamente no desempenho da atividade de caráter legislativo. Dentro dessa perspectiva, o postulado em questão, enquanto categoria fundamental de limitação dos excessos emanados do Estado, atua como verdadeiro parâmetro de aferição da própria constitucionalidade material dos atos estatais. Isso significa, dentro da perspectiva da extensão da teoria do desvio de poder ao plano das atividades legislativas do Estado, que este não dispõe de competência para legislar ilimitadamente, de forma imoderada e irresponsável, gerando, com o seu comportamento institucional, situações normativas de absoluta distorção e, até mesmo, de subversão dos fins que regem o desempenho da função estatal. A jurisprudência constitucional do Supremo Tribunal Federal, bem por isso, tem censurado a validade jurídica de atos estatais, que, desconsiderando as limitações que incidem sobre o poder normativo do Estado, veiculam prescrições que ofendem os padrões de razoabilidade e que se revelam destituídas de causa legítima, exteriorizando abusos inaceitáveis e institucionalizando agravos inúteis e nocivos aos direitos das pessoas (RTJ 160/140-141, rel. Min. Celso de Mello; RTJ 176/578-579, rel. Min. Celso de Mello; ADI 1.063/DF, rel. Min. Celso de Mello v.g.)”. 54 STF, HC 100.745/SC, rel. Min. Eros Grau, j. 17-9-2009. 55 “Apesar de o tema ainda não ter sido analisado definitivamente pelo Plenário deste Tribunal, a atual jurisprudência é firme no sentido de que é legítima a proibição de liberdade provisória nos crimes de tráfico ilícito de entorpecentes, uma vez que ela decorre da inafiançabilidade prevista no art. 5º, XLIII, da Carta Magna e da vedação estabelecida no art. 44 da Lei 11.343/2006” (STF, HC 103.406/SP, 1ª T., rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 24-8-2010, DJe n. 168, de 10-9-2010). No mesmo sentido: STF, HC 104.616/MG, 1ª T., rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 21-9-2010, DJe n. 215, de 10-11-2010; STF, HC 102.715/MG, 1ª T., rel. Min. Dias Tóffoli, j. 3-8-2010, DJe n. 200, de 22-10-2010; STF, HC 101.259/MS, 1ª T., rel. Min. Dias Tóffoli, j. 1-12-2009, DJe n. 22, de 5-2-2010; STF, HC 98.548/SC, 1ª T., rel. Min. Cármen Lúcia, j. 24-11-2009, DJe n. 232, de 11-12-2009; STF, HC 103.399/SP, 1ª T., rel. Min. Ayres Britto, j. 22-6-2010, DJe n. 154, de 20-8-2010; STF, HC 95.671/RS, 2ª T., rel. Min. Ellen Gracie, j. 3-3-2009, DJe n. 53, de 20-3-2009; STF, HC 102.558/PR, 2ª T., rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 92-2010, DJe n. 45, de 12-3-2010. 56 Art. 5º, XLIII, da CF: “a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem”. 57 STJ, AgRg no HC 111.250/SP, 6ª T., rel. Min. Celso Limongi, j. 19-2-2009, DJe de 16-3-2009. No mesmo sentido: STJ, AgRg no HC 111.250/SP, 6ª T., rel. Min. Celso Limongi, j. 19-2-2009, DJe de 16-3-2009. 58 STF, HC 97.579/MT, 2ª T., rela. Mina. Ellen Gracie, rel. para o acórdão Min. Eros Grau, j. 2-2-2010, DJe n. 86, de 14-5-2010. 59 CESARE BECCARIA, Dos delitos e das penas, 3. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. 60 RENAT O MARCÃO, Estatuto do desarmamento, 4. ed., São Paulo: Saraiva, 2012. 61 Situação em que a liberdade provisória estaria revogada, de forma a demonstrar sua provisoriedade ou precariedade.
Das Medidas Cautelares Restritivas MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO 1. INTRODUÇÃO A população carcerária brasileira alcançou no final de 2010 a soma de quinhentos mil presos, dos quais, segundo dados oficiais, aproximadamente 44% são presos cautelares. Presos que ainda aguardam a solução definitiva de um processo criminal, algumas vezes nem sequer instaurado. Somos o quarto maior país encarcerador do planeta, ficando atrás apenas dos Estados Unidos da América do Norte, da China e da Rússia, nesta mesma ordem. É claro que excessos existem, e não são poucos. É evidente que o aumento da população nacional e dos conflitos sociais, aliados à ausência de políticas públicas e investimentos inteligentes, quantitativa e qualitativamente pensados e executados de forma profissional, contribui decisivamente para o grave problema carcerário. O aumento da clientela criminal decorre de inúmeros fatores, mas o aumento nas cifras de encarceramento, especialmente do encarceramento provisório, tem estreita relação com o desrespeito às garantias constitucionais nitidamente expostas na Carta Magna, e é surpreendente que no mais das vezes os exageros e a ausência de observância destas regras democráticas decorram do labor daqueles que por dever de ofício se obrigaram a contribuir com o desiderato de implantação definitiva do Estado de Direito. Não é de data recente que a sociedade brasileira reclama e espera por medidas alternativas à prisão. Alternativas à prisão pena e também à prisão cautelar. De longa data, doutrina e jurisprudência vêm expondo os excessos na utilização descontrolada de prisões cautelares, quase sempre lastreadas em decisões que não resistem a uma melhor análise, sob o enfoque constitucional. Aos poucos, entretanto, o legislador vem demonstrando alguma predisposição a cuidar melhor do tema, mas infelizmente este olhar político tem se justificado muito mais em critérios econômicos e pela necessidade de evitar investimentos, entenda-se, despesas, do que em fundamentos humanitários e valores albergados no Estado de Direito formal sob o qual nos encontramos desde a Constituição Federal de 1988. Claro que melhor seria se contássemos com o olhar político e ações consequentes efetivas pautadas por valores que a Constituição Federal exalta já em seu preâmbulo e adota como fundamento do Estado Democrático de Direito, especialmente a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), que se entrelaça e dialoga com o direito à cidadania, exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e justiça etc., mas assim não é, e sabemos disso. Seja como for, independentemente das razões de fundo que se tenha por base e fundamento, e ainda que tardiamente, o importante é que tenhamos, enquanto sociedade, alguma atenção de nossos representantes políticos — legitimados pelo voto mas tantas vezes desautorizados e deslegitimados pelas ações ou pela inércia —, a devida atenção e respostas às justas expectativas.
A sociedade brasileira sempre se mostrou digna merecedora de melhores cuidados.
2. MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO A possibilidade de aplicação de medidas cautelares diversas da prisão já havia sido objeto de aceno quando a Lei n. 11.689, de 9 de junho de 2008, reformulou o processo dos crimes de competência do Tribunal do Júri, na medida em que o § 3º do art. 413 do CPP passou a dispor que, por ocasião da decisão de pronúncia, o juiz deverá decidir, “motivadamente, no caso de manutenção, revogação ou substituição da prisão ou medida restritiva de liberdade anteriormente decretada e, tratando-se de acusado solto, sobre a necessidade da decretação da prisão ou imposição de quaisquer das medidas previstas no Título IX do Livro I deste Código”. Igual abordagem, aliás, também decorreu da Lei n. 11.719, de 20 de junho de 2008, que, dentre outras alterações, deu um parágrafo único ao art. 387 do CPP com a seguinte redação: “O juiz decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso, imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento da apelação que vier a ser interposta”. Consultávamos o Título IX do Livro I do CPP, e lá não encontrávamos qualquer previsão relacionada às medidas cautelares cogitadas, mas a partir da vigência da Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011, este quadro mudou completamente e o CPP passou a contar com regulamentação específica a respeito da matéria que constitui objeto de análise neste capítulo. Estas novas medidas cautelares, diversas da prisão, podem ser chamadas de medidas cautelares restritivas, muito embora a medida de internação seja, de fato, privativa da liberdade. Também é possível denominá-las medidas cautelares alternativas. Neste caso, apenas por se apresentarem como opções; variantes dispostas na lei. Não é possível pensá-las em sentido restrito, como alternativas à prisão, ao contrário do que ocorre com as penas alternativas, pois embora algumas vezes possam ser utilizadas com vistas a evitar a decretação de prisão preventiva, em boa parte das vezes não. Eventual referência ao designativo — medidas cautelares alternativas —, portanto, só poderá ser compreendida como acertada se entendida a expressão em sentido amplo.
3. PREVISÃO LEGAL O art. 282 do CPP anuncia a existência de medidas cautelares que estão tratadas no Título IX do Livro I do CPP, e fixa regras, critérios e parâmetros para aplicação. As medidas cautelares referidas, que fixam obrigações, determinam restrições à liberdade ou a direitos, são as seguintes: prisão em flagrante (arts. 301 a 309); prisão preventiva (arts. 311 a 316); prisão domiciliar substitutiva da prisão preventiva (arts. 317 e 318) e medidas cautelares diversas da prisão (arts. 319 e 320). As medidas cautelares diversas da prisão são as seguintes: “I — comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades; II — proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações; III — proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante; IV — proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução; V — recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos; VI — suspensão do exercício de função pública ou de atividade de
natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais; VII — internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração; VIII — fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial; IX — monitoração eletrônica” (art. 319). O art. 320 do CPP refere-se destacadamente à proibição de ausentar-se do país, dizendo que a imposição de tal medida será comunicada pelo juiz às autoridades encarregadas de fiscalizar as saídas do território nacional, intimando-se o indiciado ou acusado para entregar o passaporte, no prazo de 24 horas. Logo se vê que não é possível conceber a aplicação indiscriminada destas medidas cautelares, que, embora não privativas de liberdade1, determinam obrigações ou sérias restrições a direitos constitucionalmente assegurados. São medidas constritivas ou restritivas de direitos, e exatamente por isso de imposição excepcional, como toda e qualquer restrição cautelar, cumprindo que se observe a taxatividade do rol disponibilizado.
4. CONCEITO As medidas cautelares diversas da prisão são restrições ou obrigações que podem ser fixadas de forma isolada ou cumulativa em detrimento daquele a quem se imputa a prática de determinada infração penal, durante a fase de investigação policial, no curso do processo penal e mesmo por ocasião de sentença condenatória ou decisão de pronúncia, com vistas a permitir a aplicação da lei penal; o êxito da investigação ou instrução criminal, bem como evitar a prática de novas infrações penais e o encarceramento cautelar tradicional.
5. PRESSUPOSTO Pressuposto indispensável à imposição de qualquer das medidas arroladas nos arts. 319 e 320 é a existência de imputação relacionada à prática de delito, que pode ser doloso ou culposo. Há que se ter em mente, entretanto, que nem sempre a prática de delito sujeitará seu suposto autor a qualquer das restrições, na medida em que dispõe o § 1º do art. 283 que as medidas cautelares previstas no Título IX não se aplicam à infração a que não for isolada, cumulativa ou alternativamente cominada pena privativa de liberdade. Disso decorre, por exemplo, a absoluta impossibilidade de aplicação de uma das medidas catalogadas àquele que for surpreendido na prática do crime de porte ilegal de droga para consumo pessoal (art. 28 da Lei n. 11.343/2006 — Lei de Drogas)2.
6. CABIMENTO Discute-se a respeito do cabimento de medida cautelar restritiva, para saber em qual situação jurídica o juiz poderá determinar a imposição de uma ou mais dentre aquelas taxativamente previstas. Por aqui, não estamos nos referindo aos conhecidos parâmetros ditados pelo art. 282, I e II, do CPP. A questão tem outro enfoque. Segundo o sempre fundamentado entendimento de AURY LOPES JR., “A medida alternativa somente deverá ser utilizada quando cabível a prisão preventiva, mas, em razão da proporcionalidade, houver
uma outra restrição menos onerosa que sirva para tutelar aquela situação”. Justifica o renomado jurista: “É importante compreender que as medidas do art. 319 têm o caráter substitutivo em relação à prisão preventiva e, portanto, não podem ser desconectadas dos seus limites, requisitos e pressupostos”. E conclui: “Em suma: as medidas cautelares diversas são alternativas à prisão preventiva e devem ser aplicadas com caráter substitutivo, nos limites e casos em que couber aquela”3. Ousamos divergir. As medidas cautelares restritivas podem ser impostas mesmo nos casos em que ausentes os requisitos da prisão preventiva. Não é preciso que se estabeleça, antes, toda a análise das regras ditadas pelos arts. 312 e 313 do CPP, para, então, só depois de identificada hipótese de decretação da prisão, determinar uma das restrições. De início cumpre ressaltar que estas medidas catalogadas nos arts. 319 e 320 não são meras alternativas ao encarceramento preventivo, conforme expusemos no “item 2” deste capítulo, podendo ser aplicadas em casos outros. Mas não é só. Para afastar definitivamente o argumento no sentido de que apenas se faz possível a imposição de medida cautelar restritiva quando presentes os requisitos da prisão preventiva basta verificar que ditas medidas podem ser aplicadas no momento em que o juiz concede liberdade provisória, como decorre do disposto no art. 321 do CPP. Vale dizer: é juridicamente possível conceder liberdade provisória cumulada com medida cautelar restritiva. Ora, é sabido que prisão preventiva e liberdade provisória são institutos que se antagonizam. Onde cabe prisão preventiva não cabe liberdade provisória. Diante dessa realidade jurídica inarredável, não há como aceitar o argumento no sentido de que só cabe a aplicação dos arts. 319 e 320 do CPP quando presentes os requisitos da prisão preventiva, já que isso implicaria dizer que na hipótese de cabimento da liberdade provisória o juiz não poderia fixar cumulativamente medida cautelar restritiva. Disso resulta afirmar que as medidas listadas nos arts. 319 e 320 podem ser aplicadas em razão da prática de delito doloso ou culposo, exceto quando em relação a este não for cominada, isolada, cumulativa ou alternativamente, pena privativa de liberdade, conforme decorre do art. 283, § 1º, do CPP.
7. QUEM PODE DECRETAR Somente o juiz natural, o juiz competente é que poderá submeter o agente à medida cautelar restritiva, cumprindo que assim proceda em decisão convenientemente fundamentada.
8. DECRETAÇÃO EX OFFICIO Com vistas ao fortalecimento do processo de modelo acusatório, é cabível a imposição de medidas cautelares restritivas ex officio apenas no curso do processo penal. Na fase de investigação policial é preciso ocorra provocação por quem de direito. Muito embora o juiz não possa aplicá-las por iniciativa própria durante a fase de investigação, no caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas poderá, de ofício ou em razão de requerimento do Ministério Público, de seu assistente ou do querelante, substituir a medida ou impor outra em cumulação (§ 4º do art. 282). Não seria razoável deixar de permitir ao juiz a possibilidade de melhor ajustar, ainda que por
iniciativa própria, a imposição de outrora.
9. QUEM PODE POSTULAR A DECRETAÇÃO O § 2º do art. 282 diz que as medidas cautelares serão decretadas pelo juiz, de ofício ou a requerimento das partes ou, quando no curso da investigação criminal, por representação da autoridade policial ou mediante requerimento do Ministério Público. São duas as situações reguladas, levando em conta o momento da postulação: 1ª) durante a fase de investigação criminal: a autoridade policial poderá formular representação e o Ministério Público requerimento visando a aplicação de medidas cautelares; 2ª) no curso da ação penal: pode ocorrer decretação ex officio ou em razão de requerimento das partes. Pois bem. É correto a autoridade policial formular representação visando à aplicação de medidas cautelares no curso do processo penal? Não. Só está autorizada a assim proceder durante a investigação criminal. Apresentada a representação da autoridade policial em juízo, após o registro e autuação o juiz deverá determinar a abertura de vista ao Ministério Público e à defesa para que sobre ela se manifestem, e só depois de colhidos os pronunciamentos ou vencidos os prazos assinalados é que decidirá a respeito. Apesar de não estar expressamente autorizada a representação da autoridade policial no curso do processo penal, nada impede que, tomando conhecimento de fatos que julgar relevantes, a autoridade comunique formalmente o Juízo ou o Ministério Público a respeito, para conhecimento e providências que entender cabíveis. Têm o autor do delito e seu defensor legitimidade para postular a aplicação de medida cautelar? Pensamos que sim, e em qualquer momento que se mostre cabível a fixação destas medidas. Cumpre aqui observar que, muito embora a redação do § 2º do art. 282 permita concluir que o requerimento do ofendido ou do Defensor só será possível durante a ação penal, após, portanto, a instauração do processo, pois diz que na fase policial poderá ocorrer representação da autoridade policial e requerimento do Ministério Público, enquanto reserva à instrução criminal a possibilidade de decretação ex officio ou em razão de requerimento das partes, o correto é dizer que a qualquer tempo o agente ou seu defensor se encontrará legitimado a formular tal postulação, dentro dos limites da cautelaridade. A imperfeição do texto legal não pode acarretar tamanha restrição a direito, até porque admitir o contrário esbarraria em inconstitucionalidade. A interpretação literal do § 2º do art. 282 poderia fazer concluir que estando o agente preso no curso da investigação policial, em razão de prisão preventiva, não estaria legitimado a postular a substituição do cárcere por medida alternativa de natureza restritiva, dentre as listadas nos arts. 319 e 320 do CPP, devendo esperar o momento do processo para assim proceder, pois só após a instauração do processo penal é que se pode tecnicamente falar na existência de partes. Seria absurdo admitirmos tal forma de interpretação.
10. MOMENTO DA DECRETAÇÃO As medidas restritivas podem ser determinadas durante a investigação policial ou no curso do
processo penal (§ 2º do art. 282); no momento da sentença condenatória (parágrafo único do art. 387) ou da decisão de pronúncia (§ 3º do art. 413). Dispõe o art. 310 do CPP que, ao receber o auto de prisão em flagrante, o que deverá ocorrer em até 24 horas após a realização da prisão, o juiz deverá relaxar a prisão, se ilegal, ou conceder liberdade provisória, com ou sem fiança, podendo cumular, ou não, medidas cautelares diversas da prisão, salvo se estas se revelarem inadequadas ou insuficientes, quando então deverá decretar a prisão preventiva, se presentes os requisitos do art. 312 do CPP. Neste momento inicial tratado no art. 310, em que os fatos ainda se encontram na fase de investigação policial, a imposição da prisão preventiva ou de medida diversa da prisão não poderá decorrer de iniciativa exclusiva do juiz. É necessário observar o que dispõem, respectivamente, os arts. 311 e 282, § 2º, ambos do CPP, de onde se extrai que nesta fase só poderá ocorrer decretação de uma ou outra medida em razão de provocação, jamais ex officio.
11. CRITÉRIOS PARA A ESCOLHA E DECRETAÇÃO DA MEDIDA O primeiro critério a ser observado é o da necessidade da medida, que tem relação com a utilidade da restrição para a investigação ou instrução criminal, ou ainda, nos casos expressos em lei, para evitar a prática de infrações penais, como ocorre nas situações que envolvem violência doméstica e familiar contra a mulher; violência em estádios de futebol por integrantes das denominadas torcidas organizadas etc. Outro critério expresso é o da adequação. Por aqui, adequação tem o sentido de proporcionalidade e razoabilidade, remetendo à ideia de individualização da medida, que deverá ser escolhida levando em conta a gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado, sob pena de revelar-se inócua. Não se pode perder de vista, ainda, que a imposição de medidas cautelares reclama observância ao princípio da legalidade, pois não se admite a fixação de alternativas outras, diversas daquelas taxativamente listadas, cuja execução está limitada à pessoa do agente por força de interpretação extensiva que se deve dar ao princípio da intranscendência, segundo o qual a pena não poderá passar da pessoa do acusado. Com vistas a atender aos critérios de necessidade e adequação, as medidas cautelares poderão ser aplicadas isolada ou cumulativamente, razão que se buscará aferir mediante critérios de proporcionalidade e suficiência. Estes mesmos critérios deverão ser observados no caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas, quando então o juiz poderá, na forma do disposto no § 4º do art. 282 do CPP, substituir a medida ou impor outra em cumulação. Necessidade e adequação são critérios cumulativos, e não alternativos.
12. CONTRADITÓRIO NA DECRETAÇÃO Diz o art. 5º, LV, da CF: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”. É a adoção expressa dos princípios do contraditório e da ampla defesa, de status constitucional, tão caros a toda democracia. Nesta mesma linha, dispõe o § 3º do art. 282 do CPP que: “Ressalvados os casos de urgência ou de
perigo de ineficácia da medida, o juiz, ao receber o pedido de medida cautelar, determinará a intimação da parte contrária, acompanhada de cópia do requerimento e das peças necessárias, permanecendo os autos em juízo”. A previsão é anêmica e fonte de inquietações. Problemas à vista! Pela nova regra, apresentado em juízo pedido de aplicação de medida cautelar, dele previamente deverá a parte contrária ser intimada, antes da decisão judicial, na forma acima indicada. A regra comporta exceção em duas hipóteses: 1ª) casos de urgência; 2ª) perigo de ineficácia da medida caso se aguarde a prévia intimação da parte contrária. O objetivo desta intimação não é outro senão permitir o contraditório prévio. Ou seria apenas dar conhecimento? Embora a lei não diga expressamente, é acertado entender que não. Fosse intenção apenas dar conhecimento seria a regra absolutamente desnecessária, e não podemos acreditar que o legislador pudesse chegar a tanto. (Será que não mesmo...? Os resultados da produção legislativa em matéria criminal, em regra, não são dos melhores...) Note-se que a lei não fala em prazo para a decisão do juiz, que neste caso deverá ser de cinco dias (art. 800, II, do CPP). Também não fala se o juiz aguardará a manifestação da parte contrária para depois decidir, e, neste caso, em que prazo deverá a parte contrária manifestar-se. Mas é certo que o dispositivo ressalva que nos casos de urgência ou de perigo de ineficácia da medida o juiz decidirá antes de intimar a parte contrária. Ora, se é assim, só podemos compreender que a intimação visa exatamente permitir o contraditório prévio, que somente será dispensado nas situações excepcionais indicadas. Fosse a intenção apenas dar ciência, não haveria por que excepcionar os casos de urgência ou de perigo de ineficácia da medida. É fato, entretanto, que na maioria das vezes a decretação de uma medida cautelar, exatamente por contar a situação com a presença dos requisitos gerais da cautelaridade — fumus boni juris/fumus commissi delicti e periculum in mora/periculum libertatis —, se encontrará impulsionada pela urgência, pena de ineficácia absoluta da medida. Tome-se a título de exemplo situação, infelizmente corriqueira, em que as ameaças constantes e o comportamento violento de determinado cidadão indiquem à saciedade a iminência de mal maior já prometido contra sua esposa, companheira ou ex. É evidente que em casos tais a necessidade de imposição de medidas cautelares emergenciais autoriza a dispensa do contraditório prévio, sem que disso se possa extrair qualquer violação a princípio constitucional e, portanto, ilegalidade na decisão e da medida que se aplicar. Permitir o contraditório, ademais, não é o mesmo que pressupor, daí não ser correto afirmar que a decretação de cautelar deverá ser sempre precedida de contraditório, que será apenas possível, mas não imprescindível, portanto.
12.1. Exceções ao contraditório prévio São duas as hipóteses em que permitida exceção justificada ao contraditório prévio, a saber: 1ª) casos de urgência; 2ª) perigo de ineficácia da medida caso se aguarde a prévia intimação da parte contrária. Somente diante do caso concreto é que se poderá aferir uma ou outra dentre as justificativas
excepcionais; entretanto, quer nos parecer que os casos de urgência serão também aqueles casos em que haverá perigo de ineficácia da medida caso se aguarde outro momento para a decretação, e viceversa. Há mais. Se não há urgência e perigo de ineficácia, como sustentar a cautelaridade da medida? Esse raciocínio leva a outro complicador: se toda cautelar pressupõe urgência e perigo de ineficácia, sempre que não estiverem presentes não será possível falar, legitimamente, em cautelaridade. E mais: raciocinando em sentido inverso, sempre que identificada situação de cautelaridade — exatamente na constatação de urgência e perigo de ineficácia da medida — seria dispensado o contraditório prévio. A que ponto chegamos! Seja como for, a regra é que se respeite o contraditório prévio e, portanto, sempre que o juiz entender estar diante de uma dentre as hipóteses de exceção deverá justificar destacadamente em sua decisão, apontando, com fundamentos concretos, as razões que o levaram a conhecer diretamente do pedido. Este conteúdo decisório é imprescindível para que se tenha por legítima a decretação que assim se verificar, sem a intimação prévia da outra parte.
13. DECRETAÇÃO A decisão que impõe medida cautelar deve ser sempre fundamentada, como devem ser fundamentadas todas as decisões judiciais, a rigor do disposto no art. 93, IX, da CF. A decretação pode ocorrer nas seguintes hipóteses, depois de aferido o cabimento: 1ª) Durante a investigação policial, desde que postulada4: a) O investigado está solto desde o início da investigação: algum legitimado postula a aplicação da medida e o juiz acolhe o pedido. b) O investigado foi preso em flagrante: o juiz concede liberdade provisória, mediante fiança, cumulada com medida(s) cautelar(es) restritiva(s). c) O investigado foi preso em flagrante: pagou fiança que depois foi julgada quebrada e o juiz acolhe pedido de decretação de medida cautelar restritiva (art. 343 do CPP). d) O juiz concede liberdade provisória sem fiança ao preso em flagrante: mas aplica medida cautelar restritiva, se houver provocação em relação a esta, pois não poderá decretá-la ex officio. A este respeito, diz o art. 321 do CPP que, “ausentes os requisitos que autorizam a decretação da prisão preventiva, o juiz deverá conceder liberdade provisória, impondo, se for o caso, as medidas cautelares previstas no art. 319 deste Código e observados os critérios constantes do art. 282 deste Código”. Diante da amplitude da matéria tratada no art. 310 do CPP, só podemos pensar na concessão de liberdade provisória no momento do controle jurisdicional, onde deverá ocorrer relaxamento da prisão, concessão de liberdade provisória, com ou sem fiança, com ou sem imposição de medida cautelar, ou a decretação da prisão preventiva. Se a prisão preventiva for então decretada, a partir daí não há falar em liberdade provisória, mas apenas em revogação (por não subsistirem os fundamentos da decretação) ou relaxamento (por ilegalidade na decretação). e) O investigado teve sua prisão preventiva decretada e depois revogada para a aplicação de medida cautelar diversa da prisão, atendendo a pedido. 2ª) Durante o processo criminal:
a) O acusado estava solto, mas no momento de se receber a denúncia, ou durante a instrução, verifica-se a necessidade de aplicação e o juiz decreta, de ofício ou mediante provocação. b) O acusado estava preso em razão de prisão preventiva e o juiz, já no despacho de recebimento da denúncia, revoga a preventiva e aplica medida cautelar restritiva, ou assim procede no curso da instrução, ex officio ou em razão de provocação. c) O acusado responde ao processo em liberdade em razão de ter prestado fiança que é julgada quebrada e então o juiz impõe medida cautelar restritiva (art. 343 do CPP). d) O acusado respondeu a todo o processo em liberdade e sem estar submetido a qualquer medida cautelar, mas por ocasião da sentença o juiz entende ser caso e decreta a aplicação (parágrafo único do art. 387 do CPP), situação que também poderá ocorrer por ocasião da decisão de pronúncia nos processos de competência do Tribunal do Júri (§ 3º do art. 413 do CPP).
14. SUBSTITUIÇÃO, REVOGAÇÃO E NOVA DECRETAÇÃO Dispõe o § 5º do art. 282 do CPP que “o juiz poderá revogar a medida cautelar ou substituí-la quando verificar a falta de motivo para que subsista, bem como voltar a decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem”. Revogar a medida cautelar é o mesmo que torná-la sem efeito, fazendo ressurgir o status quo. Substituí-la quando verificar a falta de motivo para que subsista significa, in casu, retirar as restrições cautelares anteriormente impostas, e decretar, em contrapartida, a prisão preventiva. O que a lei está a regular é a substituição de uma medida cautelar por outra de natureza diversa e não a simples mudança da modalidade de restrição imposta. As possibilidades de substituir uma medida restritiva por outra ou de impor outra em cumulação já estão reguladas no § 4º do art. 282. Aqui, no § 5º, a substituição implica a aplicação de medida cautelar de natureza diversa, e neste caso só podemos pensar na aplicação de prisão preventiva (arts. 311 a 316 do CPP), que posteriormente até poderá ser substituída por prisão domiciliar (arts. 317 e 318 do CPP), sendo caso, mas esta substituição pressupõe a prévia decretação daquela mais severa. Dito isto, é possível a cessação das restrições e a decretação de prisão preventiva por conveniência da instrução criminal, por exemplo, quando comprovadamente autorizada e presentes todos os requisitos legais. Neste caso, nada impede que após o término da instrução, ao proferir sentença condenatória, o juiz revogue a prisão preventiva — até porque encerrada a instrução e, portanto, insubsistente a circunstância autorizadora5, e na mesma decisão volte a decretar a aplicação de medida cautelar diversa da prisão, conforme autoriza o parágrafo único do art. 387 c/c o § 5º do art. 282, ambos do CPP.
14.1. Suspensão cautelar da medida Não raras vezes o agente irá descumprir restrição cautelarmente imposta, e com isso revelar seja caso de revogá-la e impor medida mais severa. É possível que antes da revogação definitiva da medida o juiz determine sua suspensão cautelar e decrete a prisão preventiva, quando satisfeitos os requisitos, é claro. Esta forma de agir está autorizada pelo poder geral de cautela que a lei confere aos magistrados6, e deve decorrer de fatos que realmente justifiquem sua excepcional adoção. Neste caso não haverá contraditório prévio, contudo, a revogação definitiva não poderá ocorrer
sem observância a este princípio constitucional, sob pena de nulidade do ato decisório que malferir o disposto no art. 5º, LV, da CF.
14.2. Ampla defesa e contraditório na revogação A necessidade de observância à ampla defesa e ao contraditório para a revogação definitiva da medida cautelar impõe que antes de determiná-la o juiz deverá providenciar a designação de audiência de justificação e mandar que se providencie a intimação do agente para que nela compareça e preste, querendo, seus esclarecimentos, após o que deverá o Ministério Público e a defesa lançarem suas respectivas manifestações, nesta mesma ordem, seguindo-se com a decisão judicial que irá, ou não, revogar definitivamente a medida cautelar. Um olhar apressado sobre a situação narrada poderia fazer concluir pela desnecessidade desta audiência de justificação, na medida em que o que se visa é a revogação de restrições cautelares impostas a determinada pessoa, o que poderia sugerir ser algo vantajoso e, por isso, desnecessária a oitiva prévia do increpado. Mas não é bem assim. É preciso ter em mente que, neste caso, estamos a cogitar hipótese em que imediatamente à revogação da medida cautelar poderá ocorrer a decretação de prisão preventiva, providência que tem autorização no parágrafo único do art. 312 do CPP.
14.3. Revogação de medida cautelar e decretação de prisão preventiva Como já visto anteriormente, a prisão preventiva somente será determinada quando não for possível a aplicação de outra medida cautelar (art. 282, § 6º, do CPP), entenda-se: quando as medidas cautelares arroladas nos arts. 319 e 320, adotadas de forma isolada ou cumulativamente, se revelarem inadequadas ou insuficientes (art. 283, § 1º, do CPP). Determina o parágrafo único do art. 312 do CPP que a prisão preventiva poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares, situação também referida no § 4º do art. 282 do mesmo Codex. A decretação da prisão preventiva por descumprimento de medida cautelar anteriormente aplicada poderá ocorrer em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, contudo, na primeira hipótese (investigação policial) só poderá ser decretada mediante provocação, portanto, se houver requerimento do Ministério Público, de seu assistente ou do querelante, ou representação da autoridade policial. Não se admite a decretação ex officio no curso da investigação policial, apesar de o § 4º do art. 282 do CPP permitir que se conclua o contrário. Neste caso há que se buscar uma interpretação sistêmica, que esteja em harmonia com o § 2º do art. 282 e o art. 311, ambos do CPP, onde há vedação expressa à decretação por iniciativa do juiz no curso da investigação policial. A decretação da prisão preventiva fundada no parágrafo único do art. 312 do CPP pressupõe a demonstração inequívoca de prova da existência do crime e de indícios suficientes da autoria, mas não reclama a presença de qualquer das hipóteses tratadas no art. 313, I e II, do CPP, tampouco das circunstâncias apontadas no art. 312, caput, do mesmo Codex (garantia da ordem pública; garantia da ordem econômica; conveniência da instrução criminal; assegurar a aplicação da lei penal), daí a possibilidade de sua decretação quando se tratar da prática de crime culposo.
14.4. Revogação de prisão preventiva e imposição de medida cautelar diversa da
prisão Observadas as peculiaridades de cada caso concreto, cabe anotar, por aqui, que a prisão preventiva pode ser substituída por prisão domiciliar, nos termos dos arts. 317 e 318 do CPP, como também pode ser revogada para a finalidade de se impor medidas restritivas diversas, quando os critérios de necessidade e adequação indicarem a suficiência.
15. MODALIDADES DE MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO Na redação do art. 319 do CPP encontramos as seguintes medidas cautelares: “I — comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades; II — proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações; III — proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante; IV — proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução; V — recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos; VI — suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais; VII — internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semiimputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração; VIII — fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial; IX — monitoração eletrônica”. O art. 320 do CPP refere-se destacadamente à proibição de ausentar-se do País, dizendo que a adoção de tal medida será comunicada pelo juiz às autoridades encarregadas de fiscalizar as saídas do território nacional, intimando-se o indiciado ou acusado para entregar o passaporte, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas.
15.1. Comparecimento periódico em juízo A primeira medida cautelar catalogada no art. 319, I, do CPP é branda, porém, suficiente para determinados casos de menor gravidade: comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades. Sob tal condição, deverá o agente apenas comparecer no cartório do juízo que fixou a obrigação a cada mês, bimestre, trimestre ou prazo que se determinar, tal como ocorre com o sursis (art. 78, § 2º, c, do CP) e o livramento condicional (art. 131 da LEP). O comparecimento é pessoal e obrigatório. A finalidade da medida é fazer com que o agente preste contas a respeito de suas atividades profissionais e sociais. É uma espécie de monitoramento que se estabelece, mas que não se confunde com o monitoramento eletrônico, é claro. Na prática, em relação ao sursis e ao livramento condicional o cumprimento desta obrigação tem se revelado sem muito sentido ou efeito, pois tudo não passa de um simples “carimbar a carteirinha”.
15.2. Proibição de frequentar determinados lugares Prevista no inciso II do art. 319 do CPP, consiste esta medida na proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado
permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações. O que se busca é evitar o cometimento de nova infração penal nas mesmas circunstâncias que a anteriormente praticada, critério de necessidade da medida também apontado no art. 282, I, do CPP. A restrição pode ser aplicada com vistas a evitar a prática de crime contra a vida, a integridade física, a incolumidade pública, o patrimônio etc., bem por isso muitas vezes estará relacionada com a proibição de frequentar estádios de futebol, bares, casas noturnas e estabelecimentos do gênero. Não se trata de restringir a presença do agente em determinado bairro ou cidade, mas a local específico, particularizado. Sem prejuízo da aplicação de outras medidas previstas na legislação em vigor, o art. 22 da Lei n. 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) permite a aplicação de medida protetiva de urgência consistente na proibição do agressor de frequentar determinados lugares, a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida. Em relação ao sursis, o art. 78, § 2º, a, do CP tem disposição semelhante, o mesmo ocorrendo quanto ao livramento condicional, conforme o art. 132, § 2º, c, da LEP.
15.3. Proibição de contato com pessoa determinada Não raras vezes, especialmente nos casos de crimes praticados contra a mulher no ambiente familiar, para os quais a Lei n. 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) já dispõe de regras particulares, a proibição de manter contato com pessoa determinada é medida imprescindível, com vistas a evitar o cometimento de novos ilícitos e a intranquilidade da vítima. Não é diferente, por exemplo, nos casos de crimes contra a dignidade sexual7, especialmente aqueles praticados contra vulnerável, onde a distância do agressor é sempre recomendada. É preciso, entretanto, que esta medida se justifique por circunstâncias relacionadas com o fato que deu ensejo à instauração da investigação policial ou processo penal de onde se extrai a necessidade de sua aplicação. Não se trata de imposição aleatória, sem qualquer vinculação com o fato passado. É imprescindível a existência de nexo entre a conduta pretérita e o comportamento futuro que agora se busca evitar, reduzindo as oportunidades de contato entre os envolvidos, por iniciativa do investigado ou acusado, daí referir a lei que sua aplicação só terá cabimento quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante da vítima. A propósito da Lei Maria da Penha acima citada, diz seu art. 22, III, a e b, que: Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras: I — (...) II — (...) III — proibição de determinadas condutas, entre as quais: a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor; b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação. Estas medidas podem ser aplicadas sem prejuízo da concomitância de outras medidas previstas na legislação em vigor, especialmente aquelas listadas no art. 319 do CPP.
15.4. Proibição de ausentar-se da comarca Esta proibição de ausentar-se da comarca, prevista no inciso IV do art. 319 do CPP, não tem por objetivo evitar a prática de novo delito, mas influenciar de forma positiva na apuração dos fatos passados, ou, como diz a lei, “quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução”. A avaliação da necessidade e adequação de sua imposição deve passar pela apuração das reais vantagens para os destinos da investigação ou instrução criminal, sem o que não estará justificada. Note-se que o afastamento proibido não é do município em que residir o agente, mas da comarca, que pode ser composta por um, dois ou vários municípios. O trânsito nos limites territoriais da comarca está permitido. E que comarca é esta na qual deve permanecer? Embora a lei não diga expressamente, devemos entender que é a comarca em que residir o agente, à semelhança da condição do sursis prevista no art. 78, § 2º, b, do CP, e a comarca em que residir o agente nem sempre coincidirá com a comarca em que tramitarem as investigações ou o processo. Caso seja necessário que o investigado ou acusado se ausente da comarca, deverá formular requerimento prévio, devidamente instruído, e encaminhar ao juiz competente, que antes de decidir deverá determinar a abertura de vista dos autos ao Ministério Público a fim de que se manifeste. Na hipótese de afastamento da comarca sem autorização prévia, mas por alguma razão emergencial, motivo de força maior, como é caso a necessidade de prestar socorro imediato a terceira pessoa ou mesmo buscar atendimento médico-hospitalar específico, logo após a violação deverá o agente antecipar-se em justificar o descumprimento ao juiz competente, por petição instruída com documentos, sempre que possível, a fim de que não se exponha à possibilidade de suspensão cautelar da medida restritiva até que aguarde audiência de justificação, prévia à revogação definitiva. Esta restrição tem limitação lógica e temporal: o término da instrução processual. Encerrada a instrução, não haverá fundamento para mantê-la ou aplicá-la por ocasião do parágrafo único do art. 387 ou do art. 413, § 3º, ambos do CPP.
15.5. Recolhimento domiciliar O recolhimento domiciliar está previsto no inciso V do art. 319 do CPP e pode revelar-se restrição de imensa valia na contenção de determinados infratores. Consiste em determinar a permanência em domicílio no período noturno e nos dias de folga, quando o investigado ou acusado tiver residência e trabalho fixos. Considera-se período noturno aquele compreendido entre as 18 horas de um dia e as 6 da manhã seguinte. É o tempo que, em regra, se destina ao repouso noturno, quando então as pessoas se recolhem aos seus lares depois de longa jornada diária, segundo os costumes sociais. Domicílio é o lugar onde a pessoa estabelece a sua residência com ânimo definitivo (art. 70 do CC). Residência é o local, espaço físico habitado pelo indivíduo. Se, porém, a pessoa natural tiver diversas residências, onde, alternadamente, viva, considerar-se-á domicílio seu qualquer delas (art. 71 do CC). Muda-se o domicílio, transferindo a residência, com a intenção manifesta de mudar (art. 74 do CC). E se o indiciado ou acusado tiver mais de uma residência? Pela letra do art. 71 do CC, considerar-se-á domicílio qualquer delas.
Nesta hipótese, quando da imposição da medida, o juiz fará consignar no ato decisório em qual delas deverá permanecer. Em tais casos não poderá ocorrer deslocamento entre uma e outra dentre as residências, salvo se o agente contar com autorização judicial prévia e específica. Ficará sem sentido a imposição da restrição caso o agente não disponha de residência tampouco emprego fixo. Se o agente estiver ativado em trabalho noturno a restrição não poderá ser imposta, por representar medida desnecessária, inadequada e limitadora da subsistência do increpado e de seus eventuais dependentes. É indispensável, ademais, que exista nexo entre o delito praticado e a restrição, sem o que não estará evidenciada a necessidade e adequação da medida. O art. 317 do CPP trata da prisão cautelar domiciliar, modalidade distinta, que não se confunde com a medida cautelar de que ora se cuida. A prisão cautelar domiciliar criada com a Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011, é medida substitutiva à prisão preventiva, cabível somente naquelas hipóteses taxativamente listadas no art. 318 do CPP. O ordenamento jurídico também contempla a limitação de fim de semana como pena restritiva de direitos (art. 43, VI, do CP), que deve ser cumprida na forma dos arts. 151 a 153 da LEP8. O art. 36, § 1º, parte final, do CP, quando disciplina regras para o regime aberto, estabelece que o preso deverá permanecer recolhido durante o período noturno e nos dias de folga. O Código Penal brasileiro também fala em repouso noturno quando trata de regras do regime fechado (art. 34, § 1º) e de modalidade de furto com aumento de pena (art. 155, § 1º). O art. 132, § 2º, b, da LEP lista como condição facultativa do livramento condicional o recolhimento à habitação em hora fixada.
15.6. Suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira O inciso VI do art. 319 do CPP estabelece virtuosa restrição, consistente na suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais. A suspensão não se confunde com a perda da função pública, que constitui efeito da sentença penal condenatória (art. 92, I, a e b, do CP), tampouco com a pena de interdição temporária de direitos prevista no art. 43, V, do CPP, cuja execução está regulada nos arts. 154 e 155 da LEP. Nesta mesma linha9, o art. 56, § 1º, da Lei de Drogas (Lei n. 11.343/2006) instituiu a possibilidade de afastamento cautelar do funcionário público de suas atividades, por ocasião do despacho de recebimento da denúncia que imputar contra ele a prática de qualquer das condutas tipificadas nos arts. 33, caput e § 1º, e 34 a 37. O conceito de funcionário público, para efeitos penais, extrai-se do art. 327 do CP, onde encontramos: “Considera-se funcionário público, para efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública”. Por atividades de natureza econômica ou financeira tome-se a título de exemplo, dentre outras, aquelas ligadas ao Ministério da Fazenda; Secretarias Estaduais e Municipais da Fazenda Pública; bancos; bolsa de valores, mercado de capitais etc.
Como nas demais situações, e aqui um pouco mais evidente, é imprescindível que exista nexo entre o delito praticado e a medida restritiva, mas não é necessário que o delito tenha sido praticado no exercício das funções, bastando que em razão delas. O inciso II do art. 282 do CPP estabelece como critério para fixação de medidas cautelares: 1º) a necessidade para aplicação da lei penal; 2º) a necessidade para a investigação ou a instrução criminal; 3º) e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais. Pois bem. Parece claro que a medida de suspensão poderá ser extremamente valiosa e até mesmo imprescindível para o êxito de determinada investigação ou instrução criminal, com vistas a preservar e garantir a fidelidade da prova10. Mas neste caso, estranhamente, o legislador preferiu restringir a aplicação da medida de suspensão apenas para as hipóteses em que houver justo receio da utilização da função pública, da atividade de natureza econômica ou financeira, para a prática de infrações penais. A propósito, deveria ter dito: justo receio de sua utilização para a prática de nova infração penal, porque a já verificação de infração penal é pressuposto para a aplicação da medida. Mas não é difícil arruinar esta tentativa de limitar o alcance da restrição, esta mazela da lei, de forma a permitir seja aplicada em busca da preservação da prova, já que o art. 347 do CP tipifica o crime de fraude processual11, que consiste em inovar artificiosamente, na pendência de investigação policial ou processo penal, o estado de lugar, de coisa ou de pessoa, com o fim de induzir a erro o juiz ou o perito. Por força deste raciocínio, portanto, e sob a perspectiva da prática do crime referido, é possível se imponha a restrição que, deste modo, em última análise servirá para a idoneidade da investigação ou da instrução criminal, sob o fundamento único de evitar a prática de novas infrações penais. Contra a malícia, a inteligência. Não admitir a medida cautelar com vistas à preservação da idoneidade da prova, no mais das vezes irá significar expor o agente à possibilidade de prisão preventiva, por conveniência da instrução criminal, quando presentes os demais requisitos da lei. A suspensão cautelar não é inconstitucional, e quando determinada não poderá ensejar prejuízo no recebimento de vencimentos. Determinada a suspensão, sendo caso, a autoridade judiciária fará providenciar para que o órgão público a que o imputado esteja vinculado seja oficialmente comunicado quanto ao teor da decisão, inclusive para que não se ofenda o princípio da continuidade dos serviços, inerente às atividades da Administração Pública.
15.7. Internação provisória A internação provisória, prevista no art. 319, VII, do CPP, é medida de aplicação restrita aos autores de ilícitos praticados mediante emprego de violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser ele inimputável ou semi-imputável (art. 26 do CP) e houver risco de reiteração. Ao contrário das demais reguladas no art. 319, é medida cautelar privativa da liberdade. Não tem por objetivo preservar a idoneidade da prova, mas evitar a reiteração delitiva. Embora a lei não diga expressamente, só tem pertinência em relação aos delitos praticados mediante violência ou grave ameaça à pessoa, e não contra objetos e coisas. Pressuposto, ainda, é a existência de laudo pericial atestando ser o agente inimputável ou semi-
imputável, na forma do art. 26 do CP. Mas não é só. Também se faz imprescindível que no laudo os peritos apontem claramente a possibilidade de reiteração na conduta, afirmação que, convenhamos, não é nada fácil se fazer com responsabilidade após uma única entrevista, quiçá com muitas, em verdadeiro e questionável exercício de futurologia. A regulamentação é falha. O legislador disse menos do que deveria dizer. Com efeito, a internação provisória só se justifica em relação aos casos de inimputabilidade, pois, para os casos de semi-imputabilidade basta, em regra, o tratamento ambulatorial. Se considerarmos, entretanto, que quem pode o mais pode o menos, é de admitir a imposição de tratamento ambulatorial, que, em última análise, traduzirá benefício ao agente, se comparada esta com a medida de internação, que é privativa da liberdade. Aplica-se aqui a interpretação in bonam partem, sem que disso decorra violação à taxatividade das medidas. Em que local deverá ocorrer a internação? Embora a lei processual penal não diga, a resposta é apresentada no art. 96, II, do CP: internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou, à falta, em outro estabelecimento adequado. Permite-se, portanto, diante da omissão do Estado, internação em hospital particular especializado. Como diz o art. 99 do CP, “o internado será recolhido a estabelecimento dotado de características hospitalares e será submetido a tratamento”. O tratamento ambulatorial é feito em meio livre, em clínica ou hospital especializado. A qualquer tempo poderá ser realizada nova avaliação pericial para verificação da necessidade de manutenção ou adequação da medida restritiva.
15.8. Fiança O art. 319, VIII, do CPP estabelece a fiança como medida cautelar diversa da prisão, a qual denominamos “fiança restritiva”, em contraste com a “fiança libertadora ou liberadora”, que se pode prestar como contracautela à prisão em flagrante. Na aferição da adequação, necessidade e suficiência, deverá o juiz pautar sua decisão com vistas a: 1º) assegurar o comparecimento a atos do processo; 2º) evitar a obstrução do seu andamento; ou 3º) em caso de resistência injustificada à ordem judicial. A fiança pode ser concedida e, portanto, prestada, em qualquer fase do inquérito ou do processo, mas esta afirmação reclama uma reflexão maior, já que o art. 310 do CPP determina que no momento do controle jurisdicional que se segue à prisão em flagrante (art. 306, § 1º, do CPP), o juiz deverá: relaxar a prisão, se ilegal; conceder liberdade provisória, com ou sem fiança, cumulada ou não com medidas cautelares; ou converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos do art. 312 do CPP, e não se revelarem suficientes ou adequadas as medidas cautelares diversas da prisão. Nestes termos, a fiança libertadora da prisão em flagrante, a rigor, só terá cabimento dentro do período que medeia a lavratura do auto de prisão e a materialização do art. 310 do CPP. Daí por diante só será possível pensar em fiança enquanto medida cautelar regulada no art. 319, VIII, do CPP, sendo possível, neste caso, que mesmo depois de decretada a prisão preventiva por ocasião do art. 310 ou durante o processo, reconsidere o juiz a respeito da necessidade e utilidade do encarceramento, ocasião em que poderá fazer cessar a privação cautelar da liberdade e aplicar a medida diversa denominada fiança.
É preciso distinguir, portanto, a fiança que está vinculada ao instituto da liberdade provisória, que se segue à prisão em flagrante, da fiança regrada no art. 319, VIII, do CPP, pois, embora ambas estejam moldadas pelos arts. 322 e seguintes, na essência, a aplicação de cada uma tem fundamento de fato e de direito distinto. Enquanto uma pressupõe, sempre, a existência de prisão em flagrante, a outra não, e poderá ser aplicada na fase de investigação ou do processo, até mesmo em relação a quem não tenha sofrido qualquer privação de liberdade.
15.9. Monitoramento eletrônico Isolada ou cumulativamente, uma das medidas mais eficientes, se bem aplicada e executada, é a cautelar de monitoramento eletrônico, autorizada no inciso IX do art. 319 do CPP, e são muitas as vantagens que decorrem da utilização adequada das tecnologias relacionadas, conforme aponta CÉSAR BARROS LEAL12. Segundo EDMUNDO OLIVEIRA, o monitoramento eletrônico “evita os efeitos nefastos da dessocialização do encarceramento — principalmente para os delinquentes primários — e facilita a manutenção dos elos familiares e o exercício de uma atividade profissional. Esse sistema permite, também, diminuir a taxa de ocupação nos estabelecimentos penitenciários, acolhendo réus e condenados, a pequenas ou médias penas, a um custo bem menor. A prisão domiciliar sob monitoramento eletrônico afasta de seus beneficiários a promiscuidade e as más condições de higiene, a ociosidade e a irresponsabilidade, encontradas em tantas prisões. Trata-se de um tipo de punição que não acarreta o estigma associado ao encarceramento, assegurando a continuação de uma vida ‘normal’ aos olhos do empregador e junto da família”13. Existem várias tecnologias disponíveis no mercado, prontas para este tipo de monitoramento, em regra feito por GPS (Global Positioning System, ou Sistema de Posicionamento Global), e que pode ocorrer pelo uso de pulseira; tornozeleira, implante de chip no corpo humano etc. No Brasil a Lei n. 12.258, de 15 de junho de 2010, instituiu a possibilidade de monitoramento eletrônico em relação a condenados, durante a execução da pena14. Em razão dos vetos a que fora submetido o Projeto que deu origem à Lei n. 12.258/2010, no processo executório o monitoramento eletrônico somente poderá ser aplicado nas duas hipóteses taxativamente previstas. São elas: 1ª) em relação àqueles beneficiados com saídas temporárias no regime semiaberto (arts. 122 a 125 c/c o art. 146-B, II, todos da LEP); 2ª) aos que se encontrarem em prisão domiciliar (art. 117 c/c o art. 146-B, IV, ambos da LEP).
15.10. Proibição de ausentar-se do país Dispõe o art. 320 do CPP que “A proibição de ausentar-se do País será comunicada pelo juiz às autoridades encarregadas de fiscalizar as saídas do território nacional, intimando-se o indiciado ou acusado para entregar o passaporte, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas”. A redação descompromissada com a técnica dá a entender que não se trata de instituto novo; que não tenha sido anteriormente tratado. Mas não é bem assim. Segundo pensamos, o art. 320 regula medida cautelar distinta, e não se presta simplesmente à execução da medida tratada no inciso IV do art. 319 — proibição de ausentar-se da comarca15 — com a qual não tem relação, mas de restrição diversa, que tem por finalidade assegurar a aplicação da lei penal, enquanto aquela, por disposição expressa, tem cabimento quando for conveniente ou necessária para a investigação ou instrução.
Necessário observar que o simples recolhimento do passaporte não é suficiente para evitar a saída do país, visto que é factível que tal ocorra com a utilização de meio de transporte que não seja avião, e, mesmo que a opção seja a fuga por via aérea é possível embarcar para países do Mercosul apenas com a apresentação de documento oficial de identificação (RG, v.g.), daí a imprescindibilidade da comunicação pelo Juízo às autoridades encarregadas de fiscalizar as saídas do território nacional, como forma de tentar assegurar a aplicação da lei penal.
16. FISCALIZAÇÃO DAS MEDIDAS A aplicação das medidas cautelares anteriormente tratadas reclama e pressupõe efetiva fiscalização para que se busque a pretendida eficácia. No que tange à medida de comparecimento periódico esta fiscalização já ocorre com o próprio cumprimento da restrição, podendo eventual descumprimento ser facilmente constatado e comunicado pela serventia ao juiz competente para as providências cabíveis. Em relação às medidas de proibição de frequentar determinados lugares, proibição de ausentar-se da comarca, recolhimento domiciliar e suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira, sempre que aplicadas deverá ocorrer comunicação à polícia militar para efetiva fiscalização e comunicação ao juízo em caso de constatado descumprimento. Especialmente em relação à medida de suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira, deverão ser comunicados os órgãos a que as atividades do agente estiverem relacionadas, a fim de que tomem conhecimento da medida aplicada e informem o Juízo a respeito de eventual descumprimento. A medida de proibição de contato com pessoa determinada, caso descumprida, poderá ser formalmente comunicada pela pessoa interessada ao juiz competente, ao Ministério Público ou à polícia, hipóteses em que estes últimos deverão providenciar a imediata comunicação ao juiz da causa para as providências consequentes. O descumprimento da internação provisória ou do tratamento ambulatorial deverá ser comunicado ao juiz pela administração do local em que se der, e que, para tal finalidade, deverá ser previamente alertada por ofício do juízo. Isso não exclui, é claro, a possibilidade de que a comunicação do descumprimento seja feita por terceiros, especialmente familiares. As condições de permanência sob monitoramento eletrônico são de fácil fiscalização e, bem por isso, agilmente comunicada ao juiz competente qualquer violação, o que não desaconselha seja feita comunicação à polícia militar para que também fiscalize sua execução. Por fim, para a fiscalização da proibição de ausentar-se do país é imprescindível que as autoridades encarregadas de fiscalizar as saídas do território nacional sejam comunicadas a respeito da imposição da medida, bem como para que informem o Juízo em caso de eventual constatação violadora da determinação judicial, o que não exclui a possibilidade de ser fiscalizada pelas polícias militar ou federal e comunicada nos autos inclusive por terceiros.
17. RECURSO CONTRA A DECISÃO QUE NÃO ACOLHE PEDIDO DE DECRETAÇÃO DE MEDIDA CAUTELAR Se o pedido constar de representação da autoridade policial, o desacolhimento não poderá ser questionado pela autoridade solicitante por meio de recurso, pois a lei não lhe confere tal legitimação. Se o indeferimento desacolher pretensão do Ministério Público ou de qualquer dentre os demais
legitimados à postulação, pensamos que o ataque adequado deve ocorrer pela via do recurso em sentido estrito, conforme interpretação extensiva a se emprestar ao art. 581, V, do CPP.
18. REAÇÃO DEFENSIVA CONTRA A DECRETAÇÃO Decretada a medida cautelar restritiva, a decisão poderá ser atacada por habeas corpus (art. 5º, LXVIII, da CF16, c/c os arts. 64717 e 64818 do CPP) ou por recurso em sentido estrito (art. 581, V, do CPP), a depender da natureza da restrição imposta, não sendo possível descartar, também, a utilização de mandado de segurança19, especialmente em face da suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira (art. 319, VI, do CPP).
19. PRAZO DE DURAÇÃO E EXTINÇÃO DA MEDIDA CAUTELAR A lei não diz qual o prazo de duração de uma medida cautelar restritiva, o que evidentemente pode levar ao cometimento de excessos. O prazo máximo, a rigor, é o previsto para o término da instrução, que varia de acordo com a natureza do procedimento a ser seguido, cumprindo nesse passo que se observem as regras estabelecidas para o procedimento comum, que pode ser ordinário, sumário ou sumaríssimo (art. 394 do CPP). Nos processos de competência do Tribunal do Júri, o procedimento observará as disposições estabelecidas nos arts. 406 a 497 do CPP. As regras para procedimentos especiais, como é o caso da Lei de Drogas (Lei n. 11.343/2006), devem ser buscadas na lei reguladora. Há que se considerar, entretanto, a possibilidade de aplicação de cautelar restritiva após o encerramento da instrução, conforme decorre do disposto nos arts. 387, parágrafo único, e 413, § 3º, ambos do CPP, que autorizam a imposição no momento da sentença condenatória e da decisão de pronúncia, respectivamente. Observada a natureza cautelar e provisória das medidas listadas nos arts. 319 e 320, é evidente que todas têm início e fim, mas a extinção pode ocorrer por diversas razões, a depender de cada caso. Aplicada uma determinada medida, com o passar do tempo e dos acontecimentos pode ocorrer que sua permanência não mais se justifique, devendo o investigado ou acusado permanecer em liberdade, porém, sem qualquer restrição cautelar de natureza penal. É o que ocorre, por exemplo, na hipótese do inciso IV do art. 319, com a superveniência do término da instrução. Pode a extinção decorrer, ainda, da necessidade de revogação da medida cautelar e decretação de prisão preventiva, como irá ocorrer se houver descumprimento injustificado de qualquer das restrições impostas (art. 312, parágrafo único). A superveniente absolvição impõe a extinção da medida cautelar a qualquer tempo aplicada. Por fim, o trânsito em julgado de sentença penal condenatória faz cessar a medida cautelar anteriormente aplicada, para dar lugar à execução definitiva do título judicial nos termos da Lei de Execução Penal.
20. DETRAÇÃO A única medida cautelar restritiva que admite detração é a internação provisória (art. 319, VII, do CPP), e isso por força do disposto no art. 42 do CP, que tem previsão expressa a respeito. A discussão na doutrina é acirrada e tem valiosos argumentos em sentido contrário, para afirmar a possibilidade de detração também em relação a outras medidas.
Com a devida venia, é imperioso concluir que a única possibilidade lógica autorizada é a acima indicada, e a omissão sintomática do legislador não pode ser suprida pelas variadas proposições que se têm apresentado a respeito do tema, ora para abater na mesma proporção dos dias de medida cautelar restritiva, ora para achar uma equação de proporcionalidade entre a cautelar e a definitiva. As medidas cautelares restritivas não têm natureza de privação da liberdade — que visam exatamente evitar — daí a impossibilidade de detração.
21. FUTURO DAS MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO A adoção das medidas cautelares listadas nos arts. 319 e 320 do CPP sugere a possibilidade de que, no futuro próximo, algumas dentre elas, além de outras que escaparam da regulamentação trazida com a Lei n. 12.403/2011, passem a ser tratadas pelo legislador como pena alternativa, a ser imposta, portanto, no momento da condenação, especialmente quando a aplicação em sede de cautelaridade mostrar sua adequação e suficiência em termos de resposta penal definitiva. É preciso evoluir na regulamentação do sistema de penas e medidas alternativas. Esperamos que assim seja.
Medidas Cautelares Diversas da Prisão Quadro comparativo das regras Como era
Como ficou
Sem regra correspondente
Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observandose a: I — necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais; II — adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado. § 1º As medidas cautelares poderão ser aplicadas isolada ou cumulativamente. § 2º As medidas cautelares serão decretadas pelo juiz, de ofício ou a requerimento das partes ou, quando no curso da investigação criminal, por representação da autoridade policial ou mediante requerimento do Ministério Público. § 3º Ressalvados os casos de urgência ou de perigo de ineficácia da medida, o juiz, ao receber o pedido de medida cautelar, determinará a intimação da parte contrária, acompanhada de cópia do requerimento e das peças necessárias, permanecendo os autos em juízo. § 4º No caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas, o juiz, de ofício ou mediante requerimento do Ministério Público, de seu assistente ou do querelante, poderá substituir a medida, impor outra em cumulação, ou, em último caso, decretar a prisão preventiva (art. 312, parágrafo único). § 5º O juiz poderá revogar a medida cautelar ou substituí-la quando verificar a falta de motivo para que subsista, bem como voltar a decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem. § 6º A prisão preventiva será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar (art. 319).
Art. 310. Quando o juiz verificar pelo auto de prisão em flagrante que o agente praticou o fato, nas condições do art. 19, I, II e III, do Código Penal, poderá, depois de ouvir o Ministério Público, conceder ao réu liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos do processo, sob pena de revogação. Parágrafo único. Igual procedimento será adotado quando o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, a inocorrência de qualquer das hipóteses que autorizam a prisão preventiva (arts. 311 e 312).
Sem regra correspondente.
Art. 310. Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá fundamentadamente: I — relaxar a prisão ilegal; ou II — converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; ou III — conceder liberdade provisória, com ou sem fiança. Parágrafo único. Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o agente praticou o fato nas condições constantes dos incisos I a III do caput do art. 23 do Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 — Código Penal, poderá, fundamentadamente, conceder ao acusado liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos processuais, sob pena de revogação.
Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão: I — comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades; II — proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações; III — proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante; IV — proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução; V — recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos; VI — suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais; VII — internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semiimputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração; VIII — fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial; IX — monitoração eletrônica. § 1º (Revogado). § 2º (Revogado). § 3º (Revogado). § 4º A fiança será aplicada de acordo com as disposições do Capítulo VI deste Título, podendo ser cumulada com outras medidas cautelares.
Art. 320. A proibição de ausentar-se do País será comunicada pelo juiz às autoridades encarregadas de fiscalizar as saídas do território nacional, intimando-se o indiciado ou acusado para entregar o passaporte, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas. Art. 310. Quando o juiz verificar pelo auto de prisão em flagrante que o agente praticou o fato, nas condições do art. 19, I, II e III, do Código Penal, poderá, depois de ouvir o Ministério Público, conceder ao réu liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos do processo, sob pena de revogação. Parágrafo único. Igual procedimento será adotado quando o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, a inocorrência de qualquer das hipóteses que autorizam a prisão preventiva (arts. 311 e 312).
Art. 321. Ausentes os requisitos que autorizam a decretação da prisão preventiva, o juiz deverá conceder liberdade provisória, impondo, se for o caso, as medidas cautelares previstas no art. 319 deste Código e observados os critérios constantes do art. 282 deste Código. I — (revogado) II — (revogado).
Art. 343. O quebramento da fiança importará a perda de metade do seu valor e a obrigação, por parte do réu, de recolher-se à prisão, prosseguindo-se, entretanto, à sua revelia, no processo e julgamento, enquanto não for preso.
Art. 343. O quebramento injustificado da fiança importará na perda de metade do seu valor, cabendo ao juiz decidir sobre a imposição de outras medidas cautelares ou, se for o caso, a decretação da prisão preventiva.
Art. 387. O juiz, ao proferir sentença condenatória: (...) Parágrafo único. O juiz decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso, imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento da apelação que vier a ser interposta.
Não sofreu alteração Art. 387. O juiz, ao proferir sentença condenatória: (...) Parágrafo único. O juiz decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso, imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento da apelação que vier a ser interposta.
Art. 413. O juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação. (...) § 3º O juiz decidirá, motivadamente, no caso de manutenção, revogação ou substituição da prisão ou medida restritiva de liberdade anteriormente decretada e, tratando-se de acusado solto, sobre a necessidade da decretação da prisão ou imposição de quaisquer das medidas previstas no Título IX do Livro I deste Código.
Não sofreu alteração Art. 413. O juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação. (...) § 3º O juiz decidirá, motivadamente, no caso de manutenção, revogação ou substituição da prisão ou medida restritiva de liberdade anteriormente decretada e, tratando-se de acusado solto, sobre a necessidade da decretação da prisão ou imposição de quaisquer das medidas previstas no Título IX do Livro I deste Código.
1 Exceto a medida prevista no art. 319, VII, do CPP, consistente em internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, onde por força da internação a liberdade de locomoção para fora do estabelecimento estará privada, ainda que a finalidade da medida seja terapêutica; de tratamento. 2 Sobre constituir ou não crime a conduta indicada, ver: RENAT O MARCÃO, Tóxicos, 8. ed., São Paulo: Saraiva, 2011. 3 Ob. cit., p. 119 e 121. 4 Art. 282, § 2º, do CPP: As medidas cautelares serão decretadas pelo juiz, de ofício ou a requerimento das partes ou, quando no curso da investigação criminal, por representação da autoridade policial ou mediante requerimento do Ministério Público. 5 “Firme a jurisprudência do Supremo Tribunal no sentido de que, de regra, com o fim da instrução criminal, não há falar em sua conveniência para manter a prisão preventiva” (STF, HC 90.063/SP, 1ª T., rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 27-3-2007, DJe n. 18, de 18-5-2007). 6 Admitindo regressão cautelar na execução penal, conferir: STJ, RHC 6.905-0/RJ, 6ª T., rel. Min. Vicente Cernicchiaro, j. 26-101993, DJU, 13-12-1993, p. 27489; STJ, REsp 53.794, rel. Min. José Dantas, DJU, 17-10-1994, p. 27914; STJ, REsp 61.567, rel. Min. Jesus Costa Lima, DJU, 29-5-1995, p. 15537; STJ, REsp 66.314/RJ, 5ª T., rel. Min. José Dantas, j. 7-8-1995, DJU, 28-81995, p. 26667; STJ, HC 5.090/RJ, 6ª T., rel. Min. Anselmo Santiago, j. 10-12-1996, v.u., DJU, 3-3-1997; STJ, RHC 112.410/RJ, 5ª T., rel. Min. José Dantas, j. 25-11-1997, v.u., DJU, 15-12-1997, p. 66483; STJ, HC 7.659/GO, 5ª T., rel. Min. Edson Vidigal, j. 3-9-1998, DJU, 28-9-1998, RT 759/566; RJDTACrimSP 7/32, 23/421; RJDTACrimSP 40/333 e 63/33; RT 712/418, 735/548, 743/667, 748/621, 749/668, 759/559, 762/630, 763/485, 824/598. 7 Sobre o tema, conferir: RENAT O MARCÃO e P LÍNIO GENT IL , Crimes contra a dignidade sexual, São Paulo: Saraiva, 2011. 8 Sobre o assunto, consultar nosso: Curso de execução penal, 10. ed., São Paulo: Saraiva, 2012. 9 Conferir nossos comentários a respeito, lançados quando das anotações ao art. 56 da Lei de Drogas, no livro: Tóxicos, 8. ed., São Paulo: Saraiva, 2011. 10 Secundariamente, ainda, atenderia a interesses da administração pública afastando temporariamente de suas atividades o funcionário envolvido em acusação de intensa gravidade e danosa repercussão. 11 Art. 347 do CP: “Inovar artificiosamente, na pendência de processo civil ou administrativo, o estado de lugar, de coisa ou de pessoa, com o fim de induzir a erro o juiz ou o perito: Pena — detenção, de três meses a dois anos, e multa. Parágrafo único. Se a inovação se destina a produzir efeito em processo penal, ainda que não iniciado, as penas aplicam-se em dobro”. 12 Vigilância eletrônica à distância, Curitiba: Juruá, 2011. 13 Direito penal do futuro: a prisão virtual, Rio de Janeiro: Forense, 2007. 14 A esse respeito, conferir: RENAT O MARCÃO, Curso de execução penal, 10. ed., São Paulo: Saraiva, 2012. 15 Em sentido contrário, conferir o sempre abalizado entendimento de AURY LOP ES JR. (ob. cit., p. 127/128). 16 Art. 5º, LXVIII, da CF: “Conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder”. 17 Art. 647 do CPP: “Dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar na iminência de sofrer violência ou coação ilegal na sua liberdade de ir e vir, salvo nos casos de punição disciplinar”. 18 Art. 648 do CPP: “A coação considerar-se-á ilegal: I — quando não houver justa causa; II — quando alguém estiver preso por mais tempo do que determina a lei; III — quando quem ordenar a coação não tiver competência para fazê-lo; IV — quando houver cessado o motivo que autorizou a coação; V — quando não for alguém admitido a prestar fiança, nos casos em que a lei a autoriza; VI — quando o processo for manifestamente nulo; VII — quando extinta a punibilidade”. 19 Sobre mandado de segurança, consultar: RENAT O MARCÃO e outros. Comentários à Lei do Mandado de Segurança, 2. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, coord. LUIZ MANOEL GOMES JUNIOR, 2011.
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