Sobre o autor Rodrigo Capella é escritor, palestrante, poeta e jornalista, pós-graduado em comunicação jornalística. Autor de nove livros. Publicou o primeiro, intitulado “Enigmas e Passaportes”, com apenas 16 anos, e não parou mais. Ao longo da carreira, lançou o polêmico “Como mimar seu cão” e o bem-sucedido “Transroca, o navio proibido”, que está sendo adaptado para o cinema pelo diretor gaúcho Ricardo Zimmer. Em 2007, publicou dois livros: “Poesia não vende”, que traz depoimentos de Ivan Lins, Moacyr Scliar, Carlos Reichenbach, Sergio Ferro, Bárbara Paz e Frank Aguiar, e “Rir ou chorar”, que desvenda os bastidores do cinema brasileiro e traz a biografia do cineasta Ricardo Pinto e Silva. Capella é também co-roteirista do curtametragem “Primeira Vez”, que ganhou dois prêmios importantes: melhor curta na categoria voto popular da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo 2006 e menção especial do júri no Festival de Gramado 2007. Colabora com vários jornais brasileiros, escrevendo crônicas, contos e críticas literárias, e suas obras são, constantemente,
comentadas pelos principais veículos, de Norte a Sul. Mais informações: www.rodrigocapella.com.br
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Rodrigo Capella
mistérios em FLORIPA
Capítulo 01
Floripa é sempre uma cidade calma, calma até demais. Com pitadas de interior e boa qualidade de vida, parece resistir aos progressos e à globalização. Essa é a sensação mais comum que se tem ao retornar à ilha ou ao visitá-la pela primeira vez. Tudo – ou quase tudo – parece parar no tempo. E isso é realmente muito bom: belas mulheres, paisagens únicas, lindas praias e tudo muito perto. Por que mudar quando se tem tudo? A pergunta já é uma resposta, simples, mas interrompe qualquer objeção. Até porque a coisa não é tão parada assim: para deleite, a cidade tem uma coisa agitada: lá a bola realmente rola e é disputada. Mas, isso só ocorre mesmo quando os dois principais times da cidade (Avaí e Figueirense) protagonizam jogos decisivos – para ser mais exato: em final de Campeonato Catarinense. Quem não se lembra as vezes em que isto ocorreu? Foram várias, com resultados mais diversos e inexplicáveis. E hoje as diversas camisas e bandeiras azuis, brancas e pretas denunciavam: a rivalidade iria decidir mais um campeonato. No primeiro jogo, deu empate. Quem vencesse este, se consagraria Campeão Catarinense de 2020.
Os dois times estavam completos e a torcida acompanharia os principais craques deste ano. Os atacantes Leleco e Thomas, do Avaí, e os zagueiros Idelbrand e Maicom, do Figueira. Imperdível! Na véspera do clássico, o técnico do Figueira, Edmundo Tavares, destacou: “precisamos parar Leleco. Quero dois jogadores na marcação dele. Façam qualquer coisa para parar este jogador. Caso contrário, perderemos o jogo. Estou avisando”. Agora, dentro do ônibus a caminho da Ressacada, Tavares relembrou: “vamos com força. Parem Leleco. Façam qualquer coisa, mas ele não pode fazer gols. No último jogo, demos sorte com o empate. Mas, agora é no campo dos caras”. O veículo estaciona, perto do vestiário, e os jogares do Figueira entram na Ressacada. Poucos minutos depois, é a vez do Avaí levar seus jogadores ao Estádio. Como o time havia treinado um dia antes, não havia motivos para chegar mais cedo. No aquecimento, Nonato Neves, técnico do Avaí, repassava algumas jogadas ensaiadas: “Matheus, se posicione à esquerda e toque rapidamente para o Marcilio, que conduzirá
até o meio da área e tocará para o Leleco abrir o placar. Precisamos desta jogada o mais rápido possível”. Antes dos jogadores iniciarem a tradicional oração, Neves pontuou: “Fiquem de olho no Leleco, não deixem que ele sofrer uma entrada dura ou qualquer outro tipo de coisa durante o jogo. Conto com vocês. Vamos lá time!!!”. Poucos minutos depois, Avaí e Figueira entram em campo. Após a tradicional foto, com todos os jogadores e cartolas do time, as equipes iniciam o trabalho com bola. Leleco está motivado, como nunca. Contratado junto ao Marcílio Dias, pequeno time do Estado, o atacante tinha como objetivo chegar à Seleção Brasileira. Parecia muito, mas o jovem tinha realmente talento e muito potencial. Defender o time canarinho era, portanto, questão de tempo. O apito inicia a partida e a bola, rapidamente, é lançada, conforme Neves pedira, para a estrela do jogo, Leleco. Com muita habilidade, dribla o goleiro e...... ouve um barulho, algo muito próximo e estranho. Rapidamente, coloca a mão no peito, vê sangue e desmaia dentro do gol adversário. A bola não chega a entrar.
Mas, afinal, o que aconteceu? A grande revelação do Avaí acabara de levar um tiro direto no coração, sem chance de suspiros e de vida. Por que matariam Leleco? Quem realmente iria lucrar com a morte deste notável jogador?
Capítulo 02 Em poucos segundos, a gritaria da Ressacada se silenciou. Os torcedores buscavam uma resposta para o ocorrido e não conseguiam acreditar que Leleco havia sido baleado. Rapidamente, a partida foi interrompida com três apitos e a ambulância invadiu o campo, quase cantando pneu. Optaram por não utilizar a maca, afinal era completamente dispensável. Aos poucos, os jogadores se sentaram no gramado, um a um, como se estivessem exaustos em participar de uma partida que não passou dos dois minutos de bola rolando. Houve quem desejasse acompanhar Leleco até o hospital, mas os médicos não autorizaram. Após o choque inicial, os torcedores desceram a arquibancada em direção ao campo, como se fossem invadi-lo. Mas, não chegaram a concretizar a ação. O fato é que todos estavam intrigados com o ocorrido. Afinal, quem havia matado Leleco? Por que havia feito isso? As perguntas eram repetidas por vários jogadores, tanto do Avaí quanto do Figueirense. O clima de tensão rapidamente aumentou quando o técnico do Avaí chamou o grupo
para dar a péssima notícia: “Acabaram de me avisar pelo rádio que o Leleco morreu. Infelizmente, perdemos um jogador formidável, que nos fará muita falta. Acho que ele nos deixa uma grande lição: a de acreditar nos nossos sonhos. Ele acreditou e se tornou um grande jogador”. A notícia rapidamente se espalhou entre os jogadores do Figueirense, que, por um minuto, esqueceram-se da rivalidade e trocaram fortes abraços com os defensores do time adversário. O que se viu, então, foram momentos de pura comoção, regados à lágrimas e falsas esperanças. A cena do crime, centrada na grande área, foi rapidamente isolada por autoridades policiais, que distribuíram pelo local cones e faixas amarelas e pretas. Isolaram, com isso, o local do sangue para evitar que alguém se aproximasse do local onde o atacante foi morto. A operação ia ganhando corpo, mas era tudo muito complicado. Afinal, o que deveria ser feito com os torcedores? Será que o assassino ainda estava dentro da Ressacada? Onde ele poderia estar? Será que poderia ser encontrado nas ruas de Floripa ou será que já estava indo rumo ao Rio Grande do Sul?
Dúvidas eram muitas, mas alguma decisão tinha que ser tomada. Escoltado por diversos policiais, o Capitão Matos Junior entrou no campo e logo autorizou: “liberem os torcedores. Mandem eles para casa. Temos muito trabalho para fazer. Tirem a imprensa daqui. Não quero ninguém por perto. Apenas façam a escolta da Ressacada e me ajudem a descobrir quem realmente matou o jogador. Quero uma equipe de balística, quero legistas, quero investigadores. Vamos pessoal, vamos!”. As ordens de Matos Junior foram, aos poucos, atendidas. O campo foi invadido por homens de diversos tamanhos, que seguravam uma infinidade de equipamentos, estranhos e inusitados. O Capitão passou rapidamente as últimas orientações e se dirigiu à cena do crime, levantando as faixas pretas e amarelas que protegiam o local. Olhou, com a cabeça para baixo, à procura de alguma resposta. E não demorou muito para encontrar alguma coisa: ao lado do sangue, deparou-se com uma carta de baralho picotada, em tamanho igual a um polegar. Conseguiu apenas identificar que se tratava de um ás de espadas. Pensou: “maldição! Como ninguém havia descoberto isso antes. O que isso estava fazendo aqui? Maldição”.
Capítulo 03 Olhando de todos os lados e maneiras, Matos Junior analisou o ás de espadas. A carta, muito enigmática, pouco representava e nada revelava ao Capitão. Guardou-a dentro de um saco plástico – o mesmo em que guardamos frutas e legumes cortados em cubos. Novamente vieram as dúvidas: “o que a tal carta estava fazendo ao lado do sangue derramado de Leleco?”; “Por que haviam matado o jogador?”; e “Será que este crime tem alguma solução ou será arquivado, como a maioria dos casos?”. A primeira iniciativa foi ordenar que a equipe de balística tentasse localizar de onde partiram os tiros certeiros. Utilizando equipamentos dignos de filme de ficção científica, os quinze homens vasculharam toda a arquibancada, fizeram medições e concluíram: o assassino estava em cima do telhado das cabines destinadas à cobertura da imprensa. E o mais estranho de tudo: não havia escadas fixas para conduzirem qualquer pessoa ao telhado. Esta e as demais afirmações deixaram Matos Junior com várias pulgas atrás da orelha: “o assassino seria um jornalista?”; “seria um policial especialmente treinado para dar tiros a
longa distância?”; ou ainda “seria alguém que tivesse raiva de Leleco e que investiria na morte do jogador?”. A única certeza de que tinha era que Leleco não havia sido vítima de bala perdida. Alguém, por um motivo qualquer, queria o jogador morto ou fora daquela partida decisiva contra o Figueirense. Após determinar o local do disparo, o Capitão ordenou que a equipe de balística descobrisse qual arma foi utilizada para o disparo. Em poucos minutos, o estudo apontou que o assassino havia utilizado o rifle 7022, de calibre .22 LR, destinado, na maioria das vezes, para a caça de animais. O motivo era simples: a arma oferece ao atirador uma alta velocidade de disparo, liberando vários tiros em menos de dois segundos. O Capitão suspirou aliviado. Afinal, essa era a primeira pista concreta. Pediu rapidamente que um dos policiais checasse quais lojas de Floripa vendiam este tipo de arma. Encontrou apenas três e, juntamente, com a escolta de dois policiais, se dirigiu para uma localizada no bairro de Trindade. Dentro do estabelecimento, encontrou um homem sujo, lambendo um pirulito:
- Sou Capitão e estou investigando a morte do jogador do Avaí. Preciso saber se alguém comprou um rifle 7022 neste mês. - Não senhor. - Não mesmo? - Não. - E alguém comprou bala para esta arma? - Não compraram. Mas, lembro de que um homem jovem, aparentando uns 40 anos, perguntou quanto custa. Falei o preço, ele achou caro e se mandou logo em seguida. O Capitão acenou com a cabeça para baixo, agradecendo, e, sem pensar, conduziu o carro até as outras duas lojas. Na primeira, sem informações acionais. Na segunda, a resposta: sim, um homem de 40 anos, havia comprado balas para o rifle 7022.
Capítulo 04 Um homem de 40 anos? Teria sido ele o assassino do atacante do Avaí? Mas, qual seu nome? Por que ele, afinal, tinha um rifle? O Capitão ficou com essas perguntas vagando em sua mente, como um trem desgovernado prestes a cair. O destino não era certo, nem a passagem era validada. Mas, a essa altura, não perderia nada em arriscar. E, pensando assim, o fez, diretamente ao dono da loja: - Qual o nome do senhor que comprou as balas? - Não sei, mas ele era assim. Em poucos minutos, um papel de pão ganhou traços de um rosto com cicatriz e bigode. Aos poucos, a face ganhou também cabelos longos e piercing no nariz. Era o retrato perfeito de um maluco! - Sei que ele mora no centro, perto do Shopping. Não sei se ajuda, mas não custa arriscar. Arriscar era o que o Capitão mais fazia, e com gosto. A vida, para ele, era uma mistura de destino e acaso. Portanto, cabia aos seres humanos o aproveitamento. E foi, pensando assim, que o Capitão, mais uma vez, tomou a iniciativa de ir atrás de um suposto criminoso. O que se viu nas ruas perto do Shopping foi um homem obstinado a procurar um outro
homem. Obviamente, que, nos primeiros dias, o resultado esperado não veio. Mas, a insistência, em momentos como este, colhe bons frutos ou pelo menos traça o caminho mais adequado. Ao mostrar o desenho feito no papel de pão para um taxista, veio a luz: - Sim, conheço. - Mora onde? - É ali. Disse o homem, apontando para uma casa no caminho no Morro da Cruz. E lá foi o Capitão, andando em passos largos. Ao tocar a campainha, ouve: - Entre, estava esperando por você.
Capítulo 05 O que se viu a partir daí foi um senhor, de 40 anos, apoiando-se na bengala, ao caminhar até a porta para permitir a passagem do Capitão. De saúde frágil – como se pôde ver – o homem pronunciou a frase “Entre, estava esperando por você” com uma certa dificuldade, mas conseguiu dar ênfase à palavra “você”, o que assustou ao Capitão logo de imediato. Afinal, este homem conhecia algum segredo? Ele conhecia a pessoa que havia matado Leleco? Era ele quem havia matado o atacante do Avaí? O Capitão descartou essa última hipótese. Sabia que era pouco provável. Com um olhar 360 graus, percorreu toda a ampla sala do homem de 40 anos. Nas paredes, pôsteres do Avaí; no sofá, uma coberta enorme com o logotipo do time da Ilha; nas janelas, uma cortina modesta e empoeirada, também fazendo menção ao Avaí. O Capitão concluiu que tinha a sua frente um torcedor fanático pelo time azul e branco. Um homem que certamente conhecia toda a história do Avaí e que poderia dar uma verdadeira aula sobre as principais conquistas do time. E foi assim que a conversa, meio de supetão, começou. O homem mostrou foto por
foto, fez comentários e ainda eu um tapinha no seu peito: “sou Avaí, com orgulho”. O Capitão, nesta hoje, se arrepiou com tamanha devoção. Mas, conteve-se e deu um passo para trás. Não poderia desviar do fato, não poderia deixar de fazer as perguntas que lhe trouxe até aquela casa. E iniciou a conversa, com um ar de mistério, mas muito paciente para ouvir quaisquer histórias: - Então, você tem um rifle 7022? E recentemente comprou munição para ele? - Sim, é verdade. Aliás, eu tinha. Eu costumava, até a última terça-feira, caçar com este rifle, mas sempre em lugar permitido, é claro. E sempre para a minha alimentação. Gosto apenas de comer determinadas carnes e preciso ir à caça, caso contrário não sobrevivo por muito tempo. Como você vê, a minha saúde está frágil, pois não caço desde a última terça-feira. - E o que aconteceu? - Estava caçando quando levei uma coronhada na cabeça e desmaiei. Quando acordei, o rifle já não estava mais comigo. - Você viu quem fez isso? - Não, de fato não. Acordei e olhei ao redor, mas não vi nada. - E onde ocorreu isso?
O Homem de 40 anos deu todas as direções e implorou para que o Capitão recuperasse o seu rifle. Ressaltou que, sem esta arma, viveria por muito, muito pouco tempo. Matos Junior disse que se empenharia na busca e saiu rumo a uma nova aventura. Desta vez, para tentar recuperar o rifle. Mas, afinal, o sumiço desta arma tinha alguma coisa a ver com a morte do jogador do Avaí? Qual a ligação? O Capitão sabia que o tempo não poderia mais esperar e saiu correndo rumo à direção indicada pelo Homem.
Capítulo 06 Tudo parecia uma grande caçada para o Capitão. A imagem do rifle 7022 perpetuara em sua mente, como se fosse o último objeto que ele gostaria de encontrar. E lá foi ele, rumo ao local indicado pelo Homem de 40 anos. Sabia que algo estranho cheirava no ar, mas não se preocupava. O Capitão estava armado, tinha experiência e senso de ataque e defesa. Caminhou, em passos largos, e rapidamente chegou à área indicada. Lá, em um bar, observou quando os técnicos adversários – do Avaí e do Figueirense – riam, sorriam e tomavam cerveja juntos, como se o crime não tivesse ocorrido. Estariam os dois envolvidos na morte de Leleco? Por quê? Por qual motivo? As perguntas mais uma vez ocupavam a mente do Capitão, que ficava intrigado por não ter as explicações adequadas. Acelerou os passos e uma casa lhe chamou a atenção por estar sombria, abandonada e entregue à sorte. Matos Junior entrou, sem pedir licença, sem tocar a campainha, apenas entrou. Apoiado em uma tábua parcialmente quebrada,
atravessou um buraco, que ocupava metade do jardim da casa. Acessou a escada, trincada ao meio, e alcançou a porta. Bastou encostar os cinco dedos da mão para ela se abrir e um barulho intrigante ameaçar o Capitão. Matos Junior olhou ao redor e se tranqüilizou: era apenas um gato, que mancava, com muito esforço. Caminhou em direção à sala e lá encontrou sofás cobertos, janelas trancadas com cadeados, estantes de livros empoeiradas e uma bandeira do Brasil hasteada a meio pau. Que loucura, o que faria uma bandeira de nosso país dentro de uma casa? Seria um lunático? Um nacionalista? Andando em direção aos quartos, sem tais explicações, começou a se tranqüilizar, por alguns segundos. Sabia que as respostas veriam com o tempo, por mais acomodado que os minutos estivessem. Ao chegar à cozinha, viu uma sombra humana segurar algo. O coração a ponto de bala sinalizou que algo realmente estava errado. Mas, era tarde, muito tarde. Tentou dar marcha à ré, mas apenas adiou o golpe certeiro na nuca, que o fez desmaiar. O que se viu a partir daí foi um homem grande, gordo e com dentes pretos, carregar o Capitão até uma sala escura, quase sem ventilação.
Capítulo 07 O peso da cabeça impulsionou levemente o corpo para frente. As pernas presas no pé da cadeira e as mãos amarradas não davam qualquer chance ao Capitão. Mas, chance – naquele momento – não era algo que ele desejava. Matos Junior estava inconsciente há pelo menos uma hora e dormiria por algum tempo mais. Aos poucos, conseguiu distinguir alguns ruídos e percebeu que três pessoas aguardavam o seu despertar. Seriam os assassinos de Leleco? Afinal quem poderia ter matado o jogador? Por quê? Iniciou um piscapisca nos olhos, como se fosse uma lâmpada natalina. Mas, realmente acordou quando o homem gordo direcionou um holofote na sua cara. O despertar foi imediato. - Acordou, heim? - Acho que qualquer um acordaria. - Não perguntei isso. - Por que estou preso? - Calma, quem faz as perguntas aqui sou eu. O homem gordo esfregou as mãos e disparou uma sequência: - O que você faz aqui? - Sou o Capitão que investiga a more de Leleco. - Aquele jogador?
- Isso. - E você acha que eu o matei? - Não, não, de forma alguma. - E por que está aqui? - Estou investigando também o suposto sumiço de um rifle 7022. - Ah tah! Uma boa arma essa. Uso pra caça. O homem gordo, em seguida, pegou a arma, um rifle 7022, e apontou para a cabeça do Capitão: - Sabe, eu costumo caçar muito, todo fim de semana, sempre com um grande amigo meu. - E como ele se chama? - Hum... Já vi que está curioso... O homem gordo dispara uma sequência de risadas e informa: - Nome não direi. Apenas uma dica: não se pode confiar muito em quem nos treina. - O técnico? O técnico do Avaí matou Leleco?
Capítulo 08 No fundo se ouvia mais uma sequência de risadas do homem gordo. O Capitão reforçou a pergunta: - O técnico? O técnico do Avaí matou Leleco? - Se eu contasse, perderia a graça. - Mas, me dá uma dica. O homem afastou a arma, que estava apontada no rosto do Capitão, deu um passo para trás e ironicamente perguntou: - Aceita uma água ou café? - Aceito, com duas pedras de gelo. - Gelo? - Sim, por favor. - Certo. O homem se dirigiu até a cozinha. Quando retornou, o Capitão já não estava mais lá. Havia soltado, primeiramente, as pernas presas no pé da cadeira. E, poucos segundos depois, libertou-se das amarras, que prendiam suas mãos. O homem gordo apenas riu. Havia conseguido o que queria: deixar o Capitão confuso. Mas, por qual motivo? O que ele realmente queria?
Capítulo 09 O Capitão, em passos largos, desceu a rua, todo transtornado. Chamou o primeiro taxi que avistou e deu a ordem: - Para o Centro de Treinamento do Avaí. - O senhor tem certeza? - Claro, por quê? - É que já é tarde, não sei se terá alguém lá. - Vamos tentar. - O senhor é quem manda. E lá foi o Capitão, dentro do taxi, rumo ao Centro de Treinamento. Ele precisava falar, ainda hoje, com o técnico do Avaí para esclarecer algumas dúvidas. O trânsito na ilha estava acima do normal. Logo, o Capitão soube que estavam recapeando uma parte da Av. Beira Mar. A ansiedade aumentava, tudo aumentava, o coração disparava. Ele precisava falar com o técnico do Avaí, o mais rápido possível. Depois de longos e longos minutos no trânsito, chegou ao destino final. Lá, encontrou um funcionário fechando o portão: - Preciso falar com o técnico, o técnico do Avaí, urgente, urgente. - Quem é você?
- O Capitão que está investigando a morte de Leleco. - Ahnnn Você não sabe? - Do quê? - Ele se afastou do clube, por tempo indeterminado. - Mas, e a decisão contra o Figueirense. - A justiça adiou, não sabemos quando irá ser realizada. - Como eu consigo o celular do técnico? - Anota ai, você deu sorte, meu amigo, trabalho no administrativo. O Capitão discou os números, anotados em seu caderninho. Acenou para o homem do administrativo, agradecendo a informação. E, ali ficou, esperando ser ouvido, ser atendido pelo técnico. Uma voz feminina atende: - Alô!
Capítulo 10 - Quem fala? - Aqui é o Capitão. - Capitão? - Isso mesmo. Preciso falar com o técnico do Avaí. - Ele não está. - Como assim? Esse celular é dele! - Sim, mas não está. Nesse momento, o Capitão ouve uma voz masculina. Sabia, tinha a certeza de que essa mulher estava ao lado do técnico e tentar esconder algo. - Eu sei que ele está ai. Passe pra ele, é pro bem dele. - Alô, é o técnico, quer dizer ex-técnico - O que aconteceu? - Estou no Paraná, descansando desta confusão. - E quando volta? - Sem planos para voltar. E a investigação? - Cada vez mais crua, sem sinal de mudanças. Mas, - Mas? Nesse momento, o Capitão teve um estalo, as primeiras peças pareciam se encaixar.
- Mas? - Deixa pra lá. O Capitão desligou e saiu correndo....
Capítulo 11 As primeiras peças pareciam se encaixar na cabeça do Capitão. O rifle 7022 utilizado, normalmente, para caça, dificilmente mataria alguém a longa distância. Afinal, o que realmente havia matado o jogador Leleco, do Avaí? O Capitão correu, como sempre gostava de fazer. Foi em direção ao laboratório da polícia. E lá foi barrado: - Como assim não posso entrar? - O senhor não tem credencial especial. Aqui só entra com essa credencial. - Mas, eu estou investigando uma morte. - Não. Aqui só entra com credencial especial. O guarda não deixou o Capitão entrar no Laboratório da Polícia. Tudo parecia, agora, se encaixar. O mistério, ou melhor, a chave para solucioná-lo estava dentro daquele laboratório e o Capitão precisava entrar de qualquer maneira e o mais rápido possível. Rapidamente, esticou os seus braços nas grades e tentou escalá-las. Quando chegou ao topo, ouviu: - Ei, ei, ei. O que você faz ai?
Capítulo 12 O Capitão se assustou, quase caiu, ficou estático, permaneceu sem respirar, por alguns segundos. Olhou para frente: - Desculpe, eu estava.... - Desculpar o quê? exercitando, certo?
Você
estava
se
O Capitão riu: - Claro, sempre me exercito. - Venha comigo. Eu posso te ajudar. Mas, venha rápido. - Agora mesmo. O Capitão se aproximou do homem, após pular toda a grade, desprotegida e alvo fácil. - Então, quem é você? - Capitão, sem perguntas. Apenas me siga.
Capítulo 13 O Capitão seguiu a ordem, calado, sem saber o que dizer. Queria apenas encontrar pistas, descobrir o mistério que assombrava a ilha de Floripa. Afinal, quem havia matado o jogador do Avaí? O que havia realmente acontecido com o Leleco? - Capitão.. - Sim. - Vamos entrar agora no laboratório da polícia. Você terá cinco minutos para investigar tudo, encontrar pistas e fazer anotações. Daqui a pouco, irão trocar o turno e eu irei para casa. Portanto, corra. - Obrigado. - Não agradeça, apenas investigue. O Capitão tirou fotos, muitas fotos. Também sacou o seu caderno de anotações e registrou algumas coisas. Sabia que esse era um grande passo e que a investigação estava realmente começando.
Capítulo 14 Com um leve impulso, o Capitão abriu o sorriso. Havia encontrado o que precisa encontrar. Uma bala do rifle 7022, dentro de um pote, todo lacrado, pronto para análise. Constatou que era totalmente diferente da bala encontrada no corpo de Leleco. Mas, o que havia acontecido? Alguém estava jogando com o Capitão? Tudo isso parecia uma verdadeira palhaçada! Caminhou laboratório adentro, atrás de vestígios, pistas ou qualquer outro tipo de sinais. Encontrou, grudado na parede, um bilhete pequeno, mas muito revelador: “Derrame Cerebral e hipertensão: preste atenção”. O Capitão pensou e logo conseguiu ligar os fatos. Bom aluno de biologia e de química no período escolar, ele sabia que a mensagem estava fazendo referência às cobras, mais precisamente ao veneno delas, utilizado para combater o derrame cerebral e também para combater a hipertensão na gravidez. Era um veneno de combate!! Um veneno de luta e de morte! Ele abriu um sorriso. O guarda disse: - Pelo visto já captou a mensagem. - É verdade.
- Venha rápido, o meu turno, está acabando, preciso colocar você para fora daqui, rápido, venha. O Capitão obedeceu.
Capítulo 15 O Capitão ficou pensando, horas e horas seguidas, na frase “Derrame Cerebral e hipertensão: preste atenção”. Não sabia se as palavras eram verdadeiras ou falsas, mas tinha leve e firme sensação de que ela representava alguma coisa. Precisava agir e, em um impulso grande, mas contido, ordenou, via rádio, aos seus auxiliares para que fizessem uma análise precisa e objetiva do corpo. O atacante Leleco, do Avaí, estava congelado no freezer, com um furo no peito, provocado por uma bala, até então não claramente identificada. O resultado, depois de algumas horas de angústia do Capitão, chegou via SMS – coisas da modernidade. - Sério? Não diga! Envenenado mesmo? - Foi veneno de rato. Provavelmente, colocado na comida ou em algo que ele bebeu antes de entrar em campo. - E o tiro? - Esqueça, foi só para disfarçar. O Leleco foi envenenado. O Capitão abriu um sorriso. Não era veneno de cobra, mas de rato. A mensagem estava parcialmente certa!
Capítulo 16 Tudo parecia fazer sentido, tudo parecia se encaixar. O Capitão estava vivendo bons momentos – pelo menos, até assistir ao noticiário: - Jogadores do Avaí entram em greve. Eles cobram uma resposta para a morte do principal jogador do time, Leleco. O Capitão pôs a mão direita na testa. Refletiu: “tudo que está ruim pode pirar”. E piorou mesmo: - Tentamos falar com o Capitão, que investiga o caso. Mas, ele preferiu não falar. Era mentira! O Capitão não havia sido consultado. Alguém, de dentro da polícia, estava tentando atrapalhar as investigações. Mas, quem? Correu em direção à emissora de televisão.
Capítulo 17 Na emissora, o Capitão encontrou um velho amigo. Nos tempos de faculdade, ele e Tavares eram “unha e carne”, grandes irmãos verdadeiros. A relação, obviamente, causava inveja nos outros. Afinal, na vida, qualquer coisa boa e duradoura causa inveja. Capitão não precisou perguntar; Tavares deu a letra: - Querem acabar com você. Fique alerta. - Quem? Tavares contou, tudo, com a maior sinceridade. O Capitão registrou em seu caderno, cada palavra, cada suspiro do amigo. Anotou também o nome dos eventuais suspeitos. Eram poucos e um deles era o verdadeiro assassino. O Capitão tinha certeza!
Capítulo 18
O leitor diz: “Esse livro acaba ou não acaba? Estou curioso para ler o final. Daqui a pouco eu vou pegar o rifle e.....”.
Capítulo 19 Faltavam poucos detalhes, muito poucos. O Capitão tinha quase certeza de quem havia matado Leleco, o excelente atacante do Avaí. Precisava, somente, dar um pulo até a sede do Figueirense, clube rival. E sob um sol escaldante, foi isso que fez. Lá, conversou com os principais jogadores do clube – que atuaram naquela fatídica partida -, mas que agora estavam sem jogar há vários dias - o campeonato estava interrompido. Em um ato brutal, levantou o técnico do Figueirense e o empurrou contra a parede, assustando os demais jogadores. Disse e repetiu: - Eu sei de tudo. Eu sei de tudo. Vou tomar minhas providências!
Capítulo 20 O Capitão disse mais uma vez: - Eu sei de tudo. Eu sei de tudo. Vou tomar minhas providências! Empurrou novamente o técnico do Figueirense em direção à parede. Desta vez, com mais força. Mas, foi interrompido pelos jogadores, que seguraram o Capitão pelos braços. Soltaram, poucos segundos depois, deixandoo livre para correr e fazer o que disse: tomar as providências.
Capítulo 21 O Capitão se remexeu na cama, indo literalmente de um lado para o outro. Suava frio, as mãos tremiam, mordia os lábios. Olhava para o teto, onde as estrelinhas – recordação de sua infância – brilhavam intensamente. Estava naturalmente confuso. Avaí, Figueirense, rifle, jogo de futebol e outras coisas mais. Mexeu-se novamente na cama. Em um impulso acordou, passou a mão no rosto e suspirou: - Ufa! Virou para o lado e dormiu novamente, torcendo apenas para não ter outro pesadelo.