Palavras para Adolescentes Alguns extractos do livro:
O que é a adolescência “A Adolescência é o período de transição que separa a infância da idade adulta, tendo por centro a puberdade.” “A mudança de voz é dolorosa para os rapazes. É duro resignar à voz, aquela que há dez anos se conhecia. Paira a insegurança no ar, há o desejo de nos desembaraçarmos e falta confiança em nós. Temos ao mesmo tempo necessidade de controlo e de liberdade, não é fácil encontrar um bom equilíbrio entre as duas. Tanto para os pais como para os filhos a dosagem ideal é diferente consoante os dias e as circunstâncias.” “Quereríamos falar como adultos mas ainda não dispomos dos meios. Gostaríamos de tomar a palavra e ser verdadeiramente ouvidos. Quando nos deixam tomá-la, é com demasiada frequência para nos julgarem sem nos ouvirem. Atrevemo-nos a falar e deparamos com uma armadilha.” “Em Bando sentmo-nos bem, temos as mesmas marcas, uma linguagem codificada própria que nos permite não utilizar a dos adultos. Era bem bom que não houvesse o tu e o você, que não houvesse mais do que um tu de fraternidade, que bem gostaríamos de usar sempre e que não é o tu dos adultos, por vezes, condescendente.” Céline, 16 anos escreveu: “É difícil esta passagem da vida. É tão cansativo viver na incerteza e na dúvida, sofremos ao ponto de querer morrer com o que nos rodeia, revoltados, infelizes numa pele que não sentimos nossa, infelizes também por já não comprendermos o que se passa e por estarmos sós [...] O nosso aspecto exterior, queremo-lo intocável, impenetrável. Então fazemo-nos duros, ordinários e maus. [...] Adultos, pessoas grandes, vou-vos confiar uma coisa que vocês sabem por certo: nós nunca estamos acabados, prontos... e todos, sempre em premente carência de coisas essenciais.”
As transformações “A puberdade, passagem da infância à adolesceência, é uma transformação do corpo (transformação fisiológica), do espírito e dos sentimentos (transformação psíquica).” “O nosso espírito deve adaptar-se às transformações do corpo, e nem sempre é fácil levar isso avante. Tudo isto produz uma subversão em todas as pessoas, que cada um de entre nós atravessa como pode, de forma única.” “A armadilha é imaginar que a erecção quer dizer desejoou sentimento amoroso. Por vezes, isso é simultâneo, mas outrs, isso não tem nada a ver.” Stéphanie, 15 anos escreveu: “É interessante ser médico porque se trata da vida dos homens. Eles sabem como são feitos os homens, como um corpo funciona e isso tudo. Sabem tudo sobre o corpo humano. Se eu fosse casada
com um médico, por exemplo, fazia-lhe perguntas sobre o corpo, ele ensinavame coisas sobre o meu e o dos outros.”
Sentirmo-nos bonitos ou feios “Por vezes, já nem sabemos sequer quem somos, nem o que de nós queremos mostrar. Sentimo-nos em dificuldade com o nosso ser (aquilo que somos) e com a nossa aparência (aquilo que de nós queremos mostrar).” “O jogo consiste em usar aquilo de que dispomos e evidenciá-lo. É importante ousarmos pôr-nos em evidência, nunca nos esquecendo que a beleza e a sedução são duas coisas completamentes.” “De qualquer modo, a beleza e a fealdade no absoluto não existem. Pode sofrer-se muito ao descobrir a fealdade interior em alguém cuja beleza física nos tinha seduzido. Enganámo-nos acerca dele pensando que era tão bonito interior como exteriormente. Inversamente, basta apaixonarmo-nos por alguém que pensávamos achar feio para nos apercebermos que a partir do momento em que amamos, tudo deixa de querer dizer seja o que for.” Antoine, 15 anos escreveu: “Pavoroso, sinto-me pavoroso, as borbulhas, que horror. Parece-me que toda a gente olha para mim, já não sei o que inventar como look para ficar melhor e para me esconder. Não sei , espero que isto passe depressa porque bem preciso... os meus pais dizem – enfim, a minha mãe – que isto passa, mas enquanto espero a angústia está cá.”
A Sexualidade “A sexualidade é importante para toda a gente, mas não é fácil para ninguém. Mesmo para os adultos. Tal não acontece por si, e é por isso que é difícil falar dela com simplicidade. Há também uma questão de maturidade. Pensar na sexualidade, quando nos sentimos impreparados para viver, é coisa que constrange, mas as coisas mais complicadas simplificam-se por si mesmas quando chegam à altura certe, isto é, quando nos sentimos capazes de as viver.” “Uma relação sexual feliz permite uma comunicação muito íntima, única. Vivem-se em conjunto coisas que estão para além das palavras, que não se podem descrever, e este prazer partilhado cria laços muito fortes que vos transformam a um e ao outro.” “Por detás de tudo o que é humano há sempre o encontro do outro. As carícias são uma linguagem, a ternura pelo outro guia as mãos. Para as mulheres, as carícias antes e depois da penetração são muito importantes, mas muitas vezes os homens não o sabem e não podem descobrir se se lhes não disser. No amor, é sempre melhor guiar o outro, sobretudo quando nos descobrimos. Não há que ter medo de nos deixarmos observar ou de abrir os olhos para o outro. Fim à passividade e ao silêncio. Aprender a fazer amor, para uma rapariga, é aprender a orientar o seu parceiro para que ele a conduza ao prazer. Para o rapaz, é aprender a dar prazer à sua companheira, a prolongar esse prazer, e a mostrar-lhe como acariciá-lo, a ele que tem um sexo tão diferente do seu.”
“Ter pais companheiros que querem saber demasiado sobre a nossa sexualidade, torna-se a longo prazo muito mais prejudicial do que ter pais muito rígidos que dela não querem ouvir falar.” “A sexualidade não é algo que se possa partilhar com os pais, mesmo sendo maravilhoso pedir-lhes, de tempos a tempos, um conselho.” Anne, 16 anos escreveu: “A sexualidade para mim é um pouco como crescer. É a fase em que o nosso corpo se torna corpo de mulher e em que pelo acto de fazer amor com um rapaz, nos afirmamos. E, além disso, a sexualidade são também os contraceptivos, o medo de fazer um filho sem o ter querido, mesmo que com amor.”
O Amor “Aborda-se a vida adulta descobrindo que é o espaço de todas as contradições, enquanto se pensava que ela estava carregada de sentido, de plenitude, de certezas e de liberdade. Nesta confusão, precisamos de referências, somos sensíveis as todas as influências, e os encontros fora da família assumem uma grande importância.” “A vida põe com frequência o nosso ideal de liberdade à prova. Quando dois seres são feitos um para o outro, a felicidade tem um só sentido. Mas há que não confundir amor com experiências amorosas. Quando nos enganamos no parceiro e quando não existe ou deixou de existir amor, a imposição da fidelidade, em nome de um ideal, é uma doença” “Se nos sentirmos constrangidos numa relação, se não ousarmos ser como somos, é porque há qualquer coisa que não pertence à categoria do amor. Há que ter a coragem de o comprender com rapidez suficiente em vez de continuar a arrastar uma relação que já não tem sentido, só por economia de sofrimento.” “Utilizar a chantagem para trapacear o outro, fazê-lo creer que se está com alguém para o tornar ciumento, é o contrário do amor. Tal atitude é simplesmente imatura.” “A Adolescência é a época das paixões. Confunde-se frequentemente a paixão com amor, mas na paixão não há ternura. A paixão é feita de desejo e de possessão tanto imaginária como real. O apaixonado quer possuir até os pensamentos da pessoa que diz amar.” Françoise, 17 anos escreveu: “É o amor que me torna bela... o amor dá-me confiança em mim, enfim, em grande parte. É muito agradável sentirmos que precisam de nós e que confiam em nós e que ao mesmo tempo temos alguém em quem nos apoiar, com quem contar.” Guilhaume, 17 anos escreveu: “Compreendi uma coisa, que nas relações amorosas, o físico pouco importa. Quando amamos e conhecemos uma pessoa realmente bem, acabamos por achar toda a gente bonita.”
A Amizade “A amizade é absolutamente essencial, sobretudo durante um período ao longo do qual mudamos as relações que mantemos com a nossa família.”
“A verdadeira amizade, aquela que pode durar, começa quando se pode dizer ao outro: «Tu não és como eu, tens razão em ser como és, e eu gosto de ti por seres diferente de mim».” “A confiança é um valor essencial na história da Humanidade porque constitui um apoio que o outro vos dá e sobre o qual se fundamenta um sentimento de segurança. A ferida que se experimenta quando se é traído na confiança é muito dolorosa.” “A fidelidade é outro pilar sobre o qual repousa a amizade. É no sentimento da fidelidade do outro que baseamos a nossa confiança, mas é com frequência apenas nos momentos difíceis que lhe podemos avaliar a dimensão.” “Na amizade, como no amor, gostar verdadeiramente de alguém, é permitir-lhe a liberdade, permitir-lhe o direito a ser diferente de nós. Se temos medo de o perder, temos de aprender a ultrapassar esse medo. Nem sempre é fácil. Mas haverá outra solução? Celine, 16 anos escreveu: A Amizade É uma palavra emprestada. São duas palavras dadas. É um coração a nú simplesmente. É um grito, incontido magnificamente. É um Verão. É um espelho. É tudo, é nada. São laços, é loucura. É a maior obra de cumplicidade. Não se manobra, porque não é calculada. É um fascínio tranquilizador. É bela e sólida, como a árvore no campo. É quente e viva, como os apelos do vento. É longa como estrada ao sol. É calma como o menino que dorme. É bela, muito para além das palavras. É infinita. É enfim, A AMIZADE. Do livro “Palavras para Adolescentes” de Françoise Dolto, Editado pela Bertrand em 1991