Em um certo reino um rei a beira da morte e sem nenhum sucessor direto a coroa, decide, como reza a tradição, promover um desafio para definir quem irá sucedê-lo. A prova aconteceria no jardim do palácio em um imenso labirinto incrustado por um emaranhado ferrenho de espinhos, tão resistentes e afiados como a lâmina da espada de um guerreiro espartano. Foram então enviados mensageiros reais para os quatro cantos do reino a fim de espalhar a notícia sobre o evento. Chegado o grande momento, o bom senso alertava sobre o discrepante contraste que banhava a relva daquele dia de glória ou fatalidade. Seja na indumentária ou no caráter, o fato era que os conglomerados humanos se aglutinavam mais e mais a ponto de sobrepujar as expectativas da corte. Quando o sol perpassou a atmosfera de tal modo que a incidência de seus raios fitou a terra face a face, uma trombeta ao longe, situada em uma torre à oeste do jardim, tocou indicando o fim do alistamento dos pretendentes ao desafio, estava ali sacramentado o destino do vencedor. De um palanque posto de fronte ao conglomerado surge um sujeito de feições áridas e voz altiva, sua entonação lembrava o deslize súbito da lâmina de uma guilhotina enferrujada. Seu discurso elocubrava o teor do desafio que consistia em cruzar o imenso labirinto e trazer uma rosa, de um número limitado, que havia no centro deste. - "O desafiante que trouxer a rosa mais bela se casará com a filha do rei sucedendo-o". Estando todos os desafiantes preparados deu-se inicio a prova. Cada pretendente se utilizou uma tática peculiar, uns resolveram andar em equipe oferecendo suporte mútuo até chegar ao centro do labirinto, outros preferiram agir como lobos solitários, seguindo seus instintos e teve ainda os mais abastados, guerreiros possuidores de títulos de nobreza que desembainhando suas espadas nas arestas mais frágeis atravessavam em linha reta rumo ao objetivo almejado. Como a morte ceifadora de esperanças, de súbito a noite cai e com ela todos os terríveis pressentimentos crescem na medida em que a insegurança insurge na alma dos seres. Os mais precavidos resolveram pernoitar no ponto em que estavam, aqueles cuja veia de coragem pulsava com mais ardor simplesmente marchavam impiedosamente, desvelando os caminhos entre aquele tortuoso labirinto. Soprados pelo vento, gritos e lamurios rasgavam a escuridão, as pernas já não correspondiam aos anseios do corpo e a estadia ali estava se tornava deveras penosa, de tal modo que se estreitava cada vez mais à distância entre uma parede e outra, instigando uma sensação cada vez mais claustrofóbica. Fora uma noite longa e nenhum dos que ali estava poderia dizer se alguém já possuía a tal rosa situada no meio do jardim, muitos nem descansaram, e grande parte já havia percebido que estava andando em círculos. Nada havia naquele local, nem comida, nem água, nem ao menos poderia se vislumbrar o horizonte, os céus se encaixavam nos pilares verdes e longilíneos e o
calor tolhia a razão dos mais prudentes homens que ali poderiam estar. Dois dias e duas noites já se foram desde o inicio do desafio, os nobres que realizavam um banquete nas proximidades do jardim se questionavam por quanto tempo ainda os candidatos permaneceriam nesta empreitada, não demorou muito tempo e fora percebido uma agitação vinda das paredes do labirinto, eram gritos ferozes, esbravejando repentinamente certo hino de uma província próxima ao reinado. Após deixar um rastro de destruição na estrutura do jardim, apareceu então um guerreiro com uma rosa nas mãos, este caminhou em direção ao pequeno palanque e lá despejou sua rosa. Fitando-o superficialmente não parecia haver sequer um arranhão nesse guerreiro, ele estava imaculado, sua soberba e sua postura arrogante intimidava todos a sua volta. Pouco tempo depois surge por entre os espinhos uma triste figura. Era um jovem rapaz de aparência mediana, mas de uma situação física deplorável, e fora caminhando lentamente até o palanque, mas, diferente do candidato anterior não despejou a rosa que segurava com tanto apreço por entre as mãos. Então passadas muitas horas após a chegada dos dois candidatos, os nobres que ali estavam decidiram dar por encerrado o desafio, deixando o julgamento para uma comissão recém formada para aquela circunstância. Foi pedido ao jovem que entregasse sua rosa, mas este se recusou a fazê-lo. Os nobres se escandalizaram com a postura do rapaz e resolveram desclassificá-lo, no entanto antes que tal medida fosse tomada, se levanta por entre a multidão à princesa, que até então ouvia a um ensaio musical e fora perturbada com o calor da discussão. Interpondo-se a favor do jovem ela lhe indaga sobre o que estaria acontecendo para o surgimento de tal alvoroço, o jovem se ajoelha e estende a mão, e ao faze-lo, murmura o último ato dizendo: -
Não é uma bela rosa
Na tentativa de proteger a rosa dos espinhos do labirinto o jovem usou seu corpo como escudo, mas seu sangue corrompeu a beleza da rosa. O perfume mórbido das pétalas agora vaga no ar, a vitalidade escorre entre os dedos como se o sangue fosse a própria rosa... Vai Desfazendo-se Esmiuçando-se Desintegrando-se ...O amor é um paradoxo, para tê-lo é preciso se sacrificar, mas ao se sacrificar não poderá mais tê-lo.