O Julgamento de Jesus Hon. Harry Fogle Editado por Frederick Graves, JD © 2000 by Jurisdictionary Foundation, Inc. Há tanto misticismo e confusão acerca da crucificação e ressurreição que acabamos perdendo de vista o fato de que Jesus de Nazaré foi julgado como homem diante de uma corte de homens sob as leis dos homens, condenado e executado como homem, e que como drama, o julgamento de Jesus supera quaisquer dos grandes julgamentos da história da justiça humana. Abordarei esse assunto como advogado, não como teólogo. Recomendo a pesquisa dos aspectos teológicos dos eventos por conta de cada um. Creio que ter o ponto de vista de um advogado sobre os processos da lei que culminaram na morte de Jesus na cruz cruel do Calvário pode levar a uma melhor compreensão espiritual. De início eu quero enfatizar que não considero que uma raça inteira de pessoas (os Judeus) tenha causado a morte de Jesus. E também não creio que nenhum Cristão inteligente pensaria isto. Minha opinião é que apenas uns poucos homens poderosos em Israel principalmente os sacerdotes superiores daquela nação - foram os responsáveis pela injustiça que ocorreu. Para entender quão grande foi essa injustiça, vamos examinar a lei Judaica como ela existia na época... um verdadeiro e magnífico sistema de justiça criminal. Sob as provisões da lei Judaica não poderia haver condenação por um crime capital baseado no testemunho de menos que duas pessoas. Uma testemunha era considerada a mesma coisa que nenhuma testemunha. Se houvessem apenas duas testemunhas, ambas teriam que concordar em todos os particulares até os mínimos detalhes. Sob a lei rabínica, o acusado tinha o direito de ter um defensor (o precursor da garantia de ter um advogado em processos criminais que é definido pela Sexta Emenda da Constituição dos Estados Unidos). Se o
acusado não pudesse pagar pela defesa, um defensor seria escolhido para ele. Alguém poderia pensar no caso Gideon versus Wainwright, que deu origem ao sistema de defensores públicos como uma inovação. Mas na realidade essa era a prática das cortes desde há 2000 anos atrás! Sob a lei Mosaica, um acusado não poderia ser obrigado a testemunhar contra si mesmo. Esse era o espírito da Quinta Emenda (dos EUA): "Ninguém deve ser obrigado a servir de testemunha contra si próprio em nenhum caso criminal." Eis o conceito de "apelo a Quinta Emenda", que fez parte da justiça criminal desde os tempos de Moisés! Uma confissão voluntária não era suficiente para a condenação sob a lei Judaica. O ônus da prova ainda era do Estado, que tinha que provar que a confissão, se houvesse sido feita, teria sido feita livremente, de forma voluntária e de plena consciência. Hoje em dia, os policiais norte-americanos são obrigados a ler os "direitos Miranda" ("Você tem o direito de ficar calado. Tudo o que disser poderá ser usado contra você.", etc ...) para os acusados de forma que a Corte possa determinar que uma confissão seja feita livremente, voluntariamente e conscientemente. Se uma confissão é feita depois que a lei Miranda foi ouvida e compreendida, a confissão pode ser admitida. Mas não era assim nos tempos de Jesus. A lei Judaica não admitia confissão, sob a crença de que o Estado jamais poderia se basear no que uma pessoa disse de sua própria boca para condená-la. Uma evidência circunstancial é aquela que não está diretamente ligada ao crime, mas sim relacionada à outras evidências, que juntas, servem para que se deduza como um crime foi realizado. Em um julgamento, as impressões digitais da pessoa (evidência circunstancial) servem para deduzir que o acusado esteve em tal local e tocou em tal objeto, mesmo que ninguém tenha visto o acusado. No caso em que uma testemunha diz "ouvi um tiro e quando cheguei à cena segundos depois, vi o acusado com uma arma na mão", essa evidência é circunstancial. O problema é que o acusado pode ter disparado um tiro contra o agressor que fugiu após o crime ou o acusado pode ter sido apenas alguém que pegou a arma depois que o agressor a jogou no chão. Pois bem, as evidências circunstanciais também não eram admitidas. Hoje em dia, raramente se vê um caso nas cortes onde as evidências
circunstanciais não sejam usadas. Atualmente, em muitos casos as únicas evidências existentes são totalmente circunstanciais. Os depoimentos do tipo "ouvi fulano falar isso" (o "ouvir dizer") também não eram admitidos na época. Ainda temos essa regra contra admitir depoimentos de testemunhas que não estão no tribunal e que não podem ser examinadas pessoalmente, mas as exceções à essa regra têm demolido as proteções originais aos acusados. A regra "inocente até prova em contrário" que nossas leis reconhecem hoje (isto é, um acusado é presumido inocente até que sua culpa tenha sido estabelecida por evidências e pela eliminação de qualquer dúvida razoável) também vem da lei Judaica e essa era a regra quando Jesus foi injustamente crucificado. O acusado de um crime capital só podia ser julgado durante o dia e em público. Esse era o precursor da garantia constitucional de um julgamento em público. Nenhuma evidência poderia ser apresentada se o acusado não estivesse presente. Isso deu origem ao atual direito que os acusados têm de estarem face a face com as testemunhas depondo contra eles. As testemunhas não tinham que jurar. O mandamento "Não dirás falso testemunho contra o teu próximo" era considerado suficiente para deter o perjúrio. Mentir na corte era perjúrio - sob juramento formal ou não. E mais ainda, havia dois desestímulos adicionais ao perjúrio: (1) qualquer testemunha em um caso de crime capital que desse falso testemunho recebia a pena de morte, e (2) se o acusado de um crime capital fosse condenado, as testemunhas eram obrigadas a assistir à execução. Sob essa provisão da lei, as testemunhas geralmente escolhiam suas palavras cuidadosamente e só davam testemunho com grande cuidado! O Grande Sinédrio, a Suprema Corte Judaica, era a única corte com jurisdição sobre crimes puníveis com a morte. A criação do Sinédrio é atribuída à Moisés. Foi uma corte de 70 membros composta de um Sumo Sacerdote como juiz principal, uma Câmara Religiosa de 23 sacerdotes, uma Câmara Legal de 23 escribas, e uma Câmara Popular de 23 anciãos. Era a essa corte que Jesus se referia quando ele disse que devia ir a Jerusalém e sofrer nas mãos dos anciãos, sacerdotes e escribas. Ele sabia que pela decisão deles ele seria morto.
Extremo cuidado era usado para selecionar os juízes dessa grande corte. Cada um devia ter pelo menos 40 anos de idade com experiência em pelo menos 3 cargos de dignidade gradativamente maior. Cada um tinha que ser uma pessoa de integridade incontestável e tido em alta estima por seus conterrâneos. Membros do Sinédrio atuavam como juízes e jurados. Eles não tinham um júri separado. Qualquer membro com interesses ou conhecimento pessoal das partes era requerido que se retirasse do julgamento. A Corte tinha que decidir a questão da culpa ou inocência apenas com evidências apresentadas no tribunal. O Sinédrio era encarregado sob a lei rabínica de proteger e defender o acusado. Nenhum membro da corte poderia atuar inteiramente como acusador ou promotor. A lei requeria que a corte desse aos acusados o "benefício da dúvida" para ajudar o acusado a estabelecer sua inocência. Os procedimentos de julgamento eram similares aos nossos. Seguindose à audiência preliminar, um sumário das evidências era dado por um dos juízes. Os espectadores eram então removidos do tribunal e os juízes votavam. Uma maioria era suficiente para condenar ou absolver. Se uma maioria votasse pela absolvição, o julgamento terminava e o condenado recebia a liberdade total. Se uma maioria votasse pela condenação, então um procedimento diferente era seguido. Nenhum anúncio de veredicto poderia ser feito nesse dia. A corte teria que adiar por um dia inteiro. Os juízes recebiam permissão para voltarem às suas casas mas não poderiam ocupar suas mentes em quaisquer atividades sociais ou de negócios. Eles tinham que devotar seu tempo inteiro para a consideração e reconsideração solene das evidências e retornar no dia seguinte para votar de novo. Nesse segundo dia, qualquer juiz que houvesse votado pela absolvição não poderia mudar seu voto, mas qualquer juiz que, na primeira votação, houvesse julgado o acusado como "culpado" poderia mudar seu voto. Durante esse tempo, o acusado ainda era presumido inocente. Uma outra provisão peculiar da lei Judaica era de grande importância, porque um veredicto unânime de culpa resultava na absolvição do acusado! Isso derivava do dever que a corte tinha de proteger e defender o acusado. A lei Mosaica estabelecia que desde que algum membro da corte tinha que fazer a defesa do acusado, um veredicto
unânime de culpa indicava que ninguém teria feito essa defesa, que poderia ter havido uma conspiração contra o acusado, e que ele não teria tido um amigo ou defensor. Tal veredicto unânime era inválido e tinha o efeito de uma absolvição. Israel não era uma democracia com Igreja e Estado separados, mas uma teocracia com Igreja e Estado entrelaçados como uma coisa só. Muitos acreditam que os altos sacerdotes ordenaram a prisão e julgamento ilegal de Jesus, que eles foram quem subornaram Judas, que eles sozinhos é que se sentiram ameaçados pelos ensinamentos de Jesus em público, e que eles sozinhos é que buscaram a morte de Jesus. A prisão foi ilegal porque ela veio de noite, em violação à lei. Ela foi efetuada através das atividades do conspirador Judas Iscariotes em violação à lei rabínica. Ela não foi resultado de um mandado legal, novamente em violação ao código Mosaico. Os guardas romanos que prenderam Jesus no Jardim de Gethsemane e o trouxeram ao tribunal do Sumo Sacerdote não tinham uma ordem de prisão legal. O julgamento noturno é uma evidência adicional de conspiração contra Jesus por esses sacerdotes cuja hipocrisia o Carpinteiro denunciava publicamente. Sob a lei do Sinédrio, o primeiro passo deveria ter sido a audiência prévia com a leitura das acusações para o réu em uma corte aberta. O registro (incluindo os escritos de Mateus, Marcos, Lucas, João, Josephus, Philo e os Manuscritos do Mar Morto) não menciona nenhum audiência prévia. E eu assumo que Mateus, Marcos, Lucas e João são testemunhas com credibilidade. Nós podemos crer em seus testemunhos. O registro diz que a corte procurou testemunhos falsos contra Jesus para justificar condená-lo à morte mas da primeira tentativa não conseguiram, apesar dos várias testemunhos falsos que surgiram. Houve perjúrios entre eles mas ninguém estava disposto a arriscar a terrível conseqüência de mentir contra um homem acusado de crime capital. Mas finalmente surgiram duas falsas testemunhas, e nos disseram Mateus e Marcos que ambos os testemunhos não concordam entre si. A primeira testemunhou para acusação de blasfêmia dizendo que Jesus havia dito "Eu sou capaz de destruir o Templo." A segunda testemunhou que Jesus havia dito "Eu vou destruir esse Templo." Não houve outras testemunhas além dessas duas, e elas não concordavam entre si. Jesus deveria ser absolvido ainda antes de ser
questionado em sua defesa ... e certamente sem ser obrigado a testemunhar contra si próprio. Porém, o sumo sacerdote Caifás invocou Jesus para que se defendesse (contrariando a lei). "E, levantando-se o sumo sacerdote no Sinédrio, perguntou a Jesus, dizendo: Nada respondes ? Que testificam estes contra ti?" Jesus não respondeu. Em vez de proteger e defender o acusado como requerido pela lei deles, o próprio sumo sacerdote se tornou o acusador, em franca violação das regras do julgamento. "Conjuro-te pelo Deus vivo", ele gritou, "que nos digas se tu és o Cristo, o Filho de Deus!" Agora, coloquemo-nos na posição de um carpinteiro humilde diante dos homens mais poderosos do país, no maior tribunal da nação. É difícil imaginar quão grande foi a coerção e a pressão! Embora Jesus pudesse continuar em silêncio, ele decidiu falar. "Se vo-lo disse, não o crereis, e também, se vos perguntar, não me respondereis." Os sacerdotes novamente perguntaram "És tu o Filho de Deus ?" A resposta de Jesus foi apenas "Vós dizeis que eu sou." Caifás então anunciou à Corte "De que mais testemunho necessitamos? Pois nós mesmos o ouvimos da sua boca." O resto dos homens daquela corte terrível, ouvindo essas palavras ditas pelo seu sumo sacerdote, ilegalmente confirmaram seu julgamento gritando "É réu de morte!" A primeira audiência diante do Sinédrio foi concluída por volta das três da manhã. A Corte só adiou o julgamento até o nascer do sol, embora a lei exigisse que cada um deles deliberasse a sós por um dia inteiro antes da segunda audiência. Eles retornaram apenas algumas horas depois, ao amanhecer. Lucas nos conta "E logo que foi dia, ajuntaram-se os anciãos do povo, e os principais dos sacerdotes e os escribas, e o conduziram ao seu concílio." Essa sessão foi superficial. Nenhuma testemunha foi invocada novamente e a lei foi violada ao se exigir que Jesus respondesse à questão repetida "És tu o Filho de Deus?" E novamente Jesus respondeu "Tu o disseste", e então acrescentou "digo-vos, porém, que vereis em breve o Filho do homem assentado à direita do Poder, e vindo sobre as nuvens do céu." Diante disso, a corte gritou "Para que precisamos ainda de testemunhas? Eis que bem ouvistes agora a sua blasfêmia."
A votação foi feita, os votos dos juízes foram contados, e Marcos nos conta "todos o consideraram culpado de morte." A importância disso reside naquela provisão peculiar da lei Judaica que requeria a absolvição se houvesse veredicto unânime. Sob a lei Judaica, a morte por apedrejamento era a sentença apropriada para uma ofensa capital. O povo Judeu não crucificava e esse método de executar a pena de morte era de origem Grega ou Romana. Os Judeus executavam os condenados por apedrejamento, decapitação ou estrangulamento de acordo com a natureza do crime. Para a blasfêmia era prescrita a morte por apedrejamento. No entanto, o exército Romano que ocupava Jerusalém na época era o único com poder de anunciar e executar sentenças de morte. O Sinédrio tinha apenas autoridade para levantar a acusação perante um magistrado Romano ou governador militar, o qual tinha o dever de rever o processo inteiro em um julgamento separado tendo poder para decidir. Portanto, "logo ao amanhecer, os principais dos sacerdotes, com os anciãos, e os escribas, e todo o Sinédrio, tiveram conselho; e, ligando Jesus, o levaram e entregaram a Pilatos." Normalmente se diz que o reino de Judah nos deu a religião e a Grécia nos deu as artes, mas Roma nos deu as leis. O sistema judicial Romano era incomparável em matéria de jurisprudência, mas Pilatos não seguiu o sistema Romano. Ele não exerceu julgamento independente de acordo com a lei mas cedeu às pressões políticas dos sacerdotes Judeus, violando assim a própria lei que ele estava encarregado de fazer cumprir. Sua história é um exemplo de como os juízes devem ser sempre livres de pressões políticas, livres para decidir os casos baseando-se apenas na lei e nas evidências. Como Procurador Imperial na Jerusalém ocupada pelos Romanos da época, Pilatos tinha o dever legal de rever todas as evidências e procedimentos nos casos capitais trazidos até ele pelos líderes Judeus. Ele foi um bom juiz (até que a segurança de seu cargo foi ameaçada pela política). Os sacerdotes levaram Jesus para a entrada do palácio de Pilatos. (Eles não poderiam entrar porque se tornariam impuros, sendo uma época de Páscoa.) Pilatos foi até eles dizendo "Que acusação trazeis contra este homem?". Essa pergunta é importante porque demonstra a intenção de Pilatos em levar o caso como um julgamento à parte desde o início, começando a
julgar a própria acusação. Ele não perguntou "Vocês condenaram esse homem de quê?", mas em vez disso perguntou quais eram as acusações. Os sacerdotes sabiam a importância da pergunta de Pilatos, então eles responderam indiretamente "Se este não fosse malfeitor, não to entregaríamos." Em outras palavras, Pilatos perguntou "Qual a acusação contra este homem?" e os sacerdotes responderam "Se ele não fosse culpado não estaria aqui!" Pilatos percebeu essa tentativa de limitar sua jurisdição e induzi-lo a agir de acordo com a vontade deles. Isso o irritou e ele revidou: "Levaio vós, e julgai-o segundo a vossa lei!" Os sacerdotes foram então forçados a admitir "A nós não nos é lícito matar pessoa alguma." Tentemos entender o dilema desses sacerdotes em violação às leis. Se eles apresentassem Jesus como um homem condenado por blasfêmia com o depoimento de apenas duas testemunhas que não concordaram entre si, Pilatos reverteria o veredicto. Se eles apresentassem Jesus como alguém condenado por sua própria confissão, Pilatos também dispensaria o veredicto. E, é claro, se eles informassem que Jesus havia sido condenado por votação unânime, Pilatos entraria com um veredicto de absolvição. Então, os maliciosos sacerdotes apresentaram Jesus a Pilatos sob uma nova acusação que eles inventaram naquele momento: traição contra César. "Havemos achado este, pervertendo a nossa nação", disseram eles, "proibindo dar o tributo a César, e dizendo que ele mesmo é Cristo, o rei." Pilatos chamou Jesus para dentro do palácio e o perguntou em privado "Tu és o rei dos Judeus ?" E Jesus perguntou a Pilatos para saber a origem da nova acusação: "Tu dizes isso de ti mesmo, ou disseram-to outros de mim?" Pilatos replicou "A tua nação e os principais dos sacerdotes entregaramte a mim", explicando com isso de onde havia sido originada aquela acusação de traição. Era uma coisa plausível que um Judeu acusasse um Romano de traição ou que um Romano acusasse um Judeu, mas naquele momento eram os Judeus mais proeminentes da nação acusando um de seus conterrâneos de crime de traição contra Roma!
Jesus disse a Pilatos "O meu reino não é deste mundo." E Pilatos insistiu "Logo tu és rei ?" Jesus respondeu "Tu dizes que eu sou rei. Eu para isso nasci, e para isso vim ao mundo, a fim de dar testemunho da verdade. Todo aquele que é da verdade ouve a minha voz." Pilatos então fez a famosa pergunta "Que é a verdade?" Jesus não deu resposta alguma senão a presença silenciosa de Si, o cordeiro levado ao sacrifício por mentirosos, de forma que Pilatos saiu para onde os sacerdotes estavam e, de acordo com João, pronunciou sua absolvição enfática do carpinteiro Nazareno. Ele disse a eles "Não acho nele crime algum!" Até então, Pilatos havia seguido a lei à risca. A lei era boa. A lei teria libertado Jesus mas pela persistência desses maldosos sacerdotes que não se importavam em nada com as leis pelas quais eles mesmos governavam a terra e seus habitantes. Era intolerável para esses inimigos da verdade que seu complô assassino fosse frustrado dessa maneira. Os sacerdotes soltaram rugidos de indignação "Alvoroça o povo ensinando por toda a Judéia, começando desde a Galiléia até aqui." Essa acusação era a de sedição (revolta, motim, crime contra o Estado), que era menos odiosa que a traição. Ela exigia a prova de uma motivação corrupta para a condenação, mas ainda nenhum motivo maldoso se pode provar que existira em Jesus. Pilatos ignorou essa acusação, mas com a referência à Galiléia, ele encontrou uma oportunidade de escapar do que o esperava. Herodes, o Tetrarca da Galiléia, estava em Jerusalém para a Páscoa. Pilatos viu nisso uma chance de transferir a responsabilidade para Herodes, que tinha jurisdição para julgar acusações de sedição. Jesus era Galileu. Os sacerdotes aprovaram essa ação porque eles pensavam que Herodes faria o que eles quisessem para ganhar seus favores. Jesus foi arrastado até o palácio de Herodes, onde as acusações de traição e sedição foram reiteradas. Herodes, contudo, não se impressionou. Ele havia ouvido a respeito dos ensinamentos de Jesus e o questionou, mas quando Jesus se recusou a responder (um direito de todo acusado), Herodes colocou nele uma túnica branca e o mandou de volta a Pilatos sem dar uma decisão. Se
esse procedimento irregular tivesse qualquer status legal, ele levaria a uma nova absolvição. Pilatos concordou. Lucas nos conta que quando os sacerdotes trouxeram Jesus de volta do palácio de Herodes, Pilatos saiu de encontro a eles e disse "Haveis-me apresentado este homem como pervertedor do povo; e eis que, examinando-o na vossa presença, nenhuma culpa, das de que o acusais, acho neste homem. Nem mesmo Herodes, porque a ele vos remeti, e eis que não tem feito coisa alguma digna de morte. Castigá-lo-ei pois, e soltá-lo-ei." Notemos que Pilatos naquele momento cometeu um erro. Ele declarou "Esse homem é inocente. Herodes o julgou inocente e eu o julguei inocente. Eu vou, portanto, castigá-lo e soltá-lo!" Mas que autoridade legal tinha Pilatos para castigar um homem inocente? Porque ele fez isso? Apesar de contrária à lei Romana, eu creio que Pilatos fez isso na esperança de que o castigo deixaria os sacerdotes satisfeitos de modo que eles cessariam suas exigências de morte. Assim, Pilatos ordenou o castigo de Jesus, não com uma punição branda, mas com o açoitamento até quase matar, com tiras de couro embutidas com pedaços de chumbo! A imposição desse açoitamento ilegal foi, em si, um impedimento para punições ainda piores. Qualquer punição adicional violaria as leis tanto de Roma como de Israel, que estabeleciam que, já tendo o acusado sido condenado e punido, ele não poderia ser julgado novamente pelo mesmo crime. João diz que "desde então Pilatos procurava soltá-lo", mas Jesus foi levado ao quartel dos soldados e despido de sua túnica branca que havia sido dada por Herodes, foi coberto com uma capa púrpura, coroado com uma guirlanda de espinhos, dado uma cana como cetro, e levado para ser confrontado pelos irados sacerdotes novamente. Pilatos anunciou "Eis aqui o homem." Os sacerdotes responderam "Crucifica-o!" Tudo isso por ter Jesus desafiado a autoridade daqueles homens que estavam dispostos a violar as leis para causar sua morte, homens que por esta razão corromperam sua própria autoridade. Pilatos então disse "Tomai-o vós, e crucificai-o; porque eu nenhum crime acho nele." Ali estava um juiz de leis dizendo "este homem é inocente, mas vocês podem matá-lo se o quiserem."
É claro que isso não satisfez os sacerdotes. Eles não ousariam crucificar Jesus sem uma aprovação inequívoca de uma autoridade Romana, porque fazer isso os sujeitaria a uma represália, possivelmente até a morte, nas mãos dos Romanos. "Nós temos uma lei", eles insistiram, "e, segundo a nossa lei, ele deve morrer porque se fez Filho de Deus." E ao dizer isso, eles revelaram a Pilatos que sua verdadeira queixa contra Jesus era, na verdade, a acusação de blasfêmia. Pilatos, que não havia ouvido ainda essa acusação, mais uma vez levou Jesus à parte e perguntou "Donde és tu?" Essa era a equivalente à nossas modernas perguntas "De onde você vem? Qual é a sua intenção?" Pilatos queria saber o que Jesus poderia ter feito para enraivecer tanto os sacerdotes ao ponto de violarem as leis sagradas de sua nação para condená-lo à morte ilegalmente. Jesus não respondeu nada. Pilatos então vociferou "Não me falas a mim? Não sabes tu que tenho poder para te crucificar e tenho poder para te soltar?" Jesus apenas respondeu "Nenhum poder terias contra mim, se de cima te não fosse dado." Pilatos novamente procurou soltar Jesus, mas os sacerdotes enraivecidos exclamaram "Se soltas este, não és amigo do César." Essa era uma ameaça à Pilatos. Poderia haver graves conseqüências se a mais alta corte de Israel denunciasse Pilatos à César. Pilatos sentiu que uma interpretação errada de seu julgamento poderia chegar aos ouvidos de César. Ele poderia ser visto como se estivesse protegendo alguém que era considerado pelos mais influentes de seus conterrâneos como culpado de traição. Pilatos não teve a coragem de lutar pela justiça contra esses sacerdotes coléricos. Foi então que a esposa de Pilatos lhe enviou uma mensagem: "Não entres na questão desse justo." Seu apelo levou Pilatos a tentar um último esforço para salvar Jesus sem arriscar seu cargo. Era costume durante a Páscoa de libertar um prisioneiro escolhido pelo povo. Pelo voto popular, as pessoas poderiam conceder anistia a qualquer um sentenciado à morte. Eu vejo esse como um dos mais dramáticos momentos de toda a História, mas muito do drama passou despercebido pelos autores e
dramaturgos, e uma lamentável confusão resultou em 2000 anos de animosidade desnecessária entre Cristãos e Judeus. Foram os sacerdotes Judeus que buscaram a morte de Jesus, não o povo. O nome Barrabás em Hebraico significa filho de Abás. Pedro era referido por Mateus como "Pedro bar Jonas", isto é, Pedro filho de Jonas. Bar Mitzvah é traduzido literalmente como Filho da Lei. O nome de Barrabás também era Jesus: Jesus Barrabás. A pergunta de Pilatos aos sacerdotes foi "Qual quereis que vos solte? [Jesus] Barrabás, ou Jesus chamado Cristo?" Eles clamaram, é claro, pela libertação de Barrabás, o notório ladrão e assassino. "Que farei então de Jesus, chamado Cristo?", perguntou Pilatos. Eles gritaram "Seja crucificado!" "Hei de crucificar o vosso rei?", perguntou Pilatos. E aqueles sacerdotes (que odiavam César como só os povos conquistados podiam odiar) disseram a Pilatos "Não temos rei senão o César!" Pilatos enfraqueceu diante daquela ferocidade implacável e entregou Jesus para que o crucificassem. Ele tomou uma bacia de água diante dele, lavou suas mãos nela e anunciou "Estou inocente do sangue deste justo: considerai isso." Pilatos mandou gravar na cruz "Jesus de Nazaré, o Rei dos Judeus". Caifás e os outros sacerdotes foram a Pilatos e pediram "Não escrevas 'Rei dos Judeus', mas que ele disse 'Sou Rei dos Judeus'." E Pilatos respondeu "O que escrevi, escrevi." Jesus foi julgado desde antes de sua audiência. Ele foi acusado de três crimes separados. Os sacerdotes do Sinédrio o condenaram ilegalmente por blasfêmia. Pilatos se recusou a reconhecer esse procedimento inicial. Pilatos, por duas vezes, absolveu Jesus da acusação de traição. Ele foi acusado de sedição diante de Pilatos e Herodes mas foi absolvido por ambos. E ainda assim, Jesus foi executado porque pretensamente se assumiu que ele havia sido considerado culpado de traição. Ameaçado com a possível perda de seu cargo, Pilatos escolheu crucificar Jesus como a maneira mais fácil de calar os coléricos sacerdotes. Antes das doze horas daquele mesmo dia, Jesus foi crucificado em violação às leis de Israel e Roma, fechando o mais tenebroso capítulo da história da administração judicial e invocando o supremo chamado que o mundo jamais ouvira para que humanos obrassem pela justiça. Dois dos sistemas de leis mais esclarecidos que existiram foram prostituídos para destruir o homem mais inocente que já passou pela face da Terra.
Essa história nunca vai morrer, porque de sua verdade sempre nasce a esperança de toda a humanidade. Mais do que qualquer outro episódio na história do mundo, o julgamento de Jesus clama a todos os homens e mulheres de boa vontade para que trabalhem por um sistema de governo humano pelo qual possamos viver juntos em paz e segurança sob um Estado de Direito administrado com reverência pela Verdade e pelo Amor Caridoso.
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O LIVRO DE URANTIA Pág. 1978
DOCUMENTO 184 PERANTE O TRIBUNAL DO SINÉDRIO Os representantes de Anás haviam instruído secretamente ao capitão dos soldados romanos que trouxesse Jesus ao palácio de Anás, imediatamente depois de ter ele sido preso. O antigo sumo sacerdote desejava manter o seu prestígio como autoridade eclesiástica principal dos judeus. Ele também possuía um outro propósito em deter Jesus na sua casa por várias horas, e que era o de dar tempo para convocar legalmente uma reunião da corte do sinédrio. Não era legal convocar um tribunal do sinédrio antes da hora da oferenda do sacrifício matinal no templo, e esse sacrifício era oferecido por volta das três horas da manhã. Anás sabia que uma corte de sinedristas estava aguardando no palácio do seu genro, Caifás. Uns trinta membros do sinédrio encontravam-se reunidos na casa do sumo sacerdote por volta da meia-noite, de modo a estar prontos para julgar Jesus quando ele pudesse ser trazido diante deles. Estavam reunidos apenas aqueles membros que se opunham forte e abertamente a Jesus e aos seus ensinamentos, posto que eram necessários apenas vinte e três deles para que um tribunal de julgamento fosse constituído. Jesus passou cerca de três horas no palácio de Anás, no monte das Oliveiras, não longe do jardim do Getsêmane, onde o haviam capturado. João Zebedeu estava livre e a salvo no palácio de Anás, não apenas por causa da palavra do capitão romano, mas também porque ele e o seu irmão Tiago eram bem conhecidos dos serviçais mais antigos, tendo muitas
vezes sido convidados do palácio, pois o antigo sumo sacerdote era um parente distante da mãe deles, Salomé.
1. O INTERROGATÓRIO DE ANÁS Enriquecido com os impostos do templo, tendo o seu genro como sumo sacerdote em exercício e mantendo lá as suas relações com as autoridades romanas, Anás era de fato o indivíduo mais poderoso da comunidade judaica. Ele era um planejador e um manipulador político bem educado. Desejava ter o controle dessa questão ligada a Jesus; pois decisões muito importantes ele temia confiá-las integralmente ao seu genro, que era brusco e precipitado. Anás queria assegurar-se de que o julgamento do Mestre fosse mantido nas mãos dos saduceus; temia a possível simpatia de alguns dos fariseus, vendo que praticamente todos os membros do sinédrio, que tinham esposado a causa de Jesus, eram fariseus. Anás não via Jesus há vários anos, desde a época em que o Mestre, ao apresentar-se na sua casa, saiu imediatamente dali ao deparar com a frieza e a reserva com que fora recebido. Anás chegou a pensar em prevalecer-se dessa antiga relação e então intentou persuadir Jesus a abandonar as suas pretensões e deixar a Palestina. Ele estava relutante em participar do assassinato de um bom homem e supunha que Jesus chegasse a escolher deixar o país em lugar de Pág. 1979 ter de submeter-se à morte. Mas, quando Anás se pôs diante do valente e decidido galileu, ele soube imediatamente que seria inútil fazer tais propostas. Jesus estava ainda mais majestoso e bem equilibrado do que antes, segundo Anás conseguia recordar-se dele. Quando Jesus era jovem, Anás tivera um grande interesse por ele, mas agora as suas rendas estavam sendo ameaçadas por aquilo que Jesus havia feito, muito recentemente, afastando os cambistas e outros comerciantes do templo. Esse ato havia despertado a inimizade do antigo sumo sacerdote muito mais do que os ensinamentos de Jesus. Anás adentrou-se na sua espaçosa sala de audiências, sentou-se em uma grande cadeira, e mandou que Jesus fosse trazido diante dele. Após observar silenciosamente o Mestre por uns momentos, ele disse: “Tu compreendes que algo deverá ser feito quanto aos teus ensinamentos, já que estás perturbando a paz e a ordem do nosso país”. E quando Anás olhou inquisidoramente para Jesus, o Mestre examinou fundo nos olhos dele, mas não deu nenhuma resposta. De novo Anás falou: “Quais são os nomes dos teus discípulos, além de Simão zelote, o agitador?” De novo Jesus olhou-o de cima para baixo, mas nada respondeu. Anás ficou consideravelmente perturbado com a recusa de Jesus a responder às suas perguntas, tanto que lhe disse: “Tu te importas com o quanto estou sendo amigável contigo, ou não? Não tens nenhum respeito pelo poder que eu detenho para definir sobre as questões do teu futuro julgamento?” Depois de ouvir isso, Jesus disse: “Anás, sabes que poderias não ter nenhum poder sobre mim se assim não fosse permitido pelo meu Pai. Alguns gostariam
de destruir o Filho do Homem porque são ignorantes, de nada sabem direito, mas tu, amigo, tu sabes o que estás fazendo. Como podes, pois, rejeitar a luz de Deus?” A maneira amável com a qual Jesus falou a Anás quase o confundiu. Mas ele havia já determinado na sua mente que Jesus devia deixar a Palestina, ou morrer; e assim tomou coragem para perguntar: “O que exatamente estás tentando ensinar ao povo? O que tu alegas ser?” Jesus respondeu: “Tu sabes muito bem o que eu tenho falado abertamente ao mundo. Eu tenho ensinado nas sinagogas e muitas vezes no templo, onde todos os judeus e muitos dos gentios têm ouvido a mim. Nada eu disse secretamente; por que, então, me perguntas sobre os meus ensinamentos? Por que não convocas aqueles que me ouviram e não perguntas a eles? Sabes bem que toda Jerusalém ouviu aquilo que eu disse, ainda que não tenhas ouvido esses ensinamentos por ti mesmo”. Antes, entretanto, que Anás pudesse replicar, o administrador dirigente do palácio, que estava bem perto, estapeou Jesus no rosto com a própria mão, dizendo: “Como ousas responder ao sumo sacerdote com tais palavras?” Anás nada disse para repreender o seu administrador, mas Jesus dirigiu-se a ele, dizendo: “Meu amigo, se o que eu tiver dito é o mal, então dá testemunho contra o mal; mas se eu tiver dito a verdade, por que deverias golpear-me?” Embora Anás lamentasse que o seu administrador tivesse batido em Jesus, ele era orgulhoso demais para levar em conta essa questão. Na sua confusão ele retirou-se para uma outra sala, deixando Jesus sozinho com os criados da casa e os guardas do templo por quase uma hora. Quando voltou, indo até o lado do Mestre, ele disse: “Tu alegas ser o Messias, o Libertador de Israel?” Disse Jesus: “Anás, tu me conheces desde a época da minha juventude. Sabes que eu não pretendo ser nada, a não ser o que o meu Pai designou; e que eu fui enviado a todos os homens gentios, tanto quanto aos judeus”. Então Anás disse: “Foi dito para mim que tu pretendes ser o Messias; isso é verdade?” Jesus olhou para Anãs; todavia, respondeu apenas: “Assim o disseste tu”. Pág. 1980 Por volta desse momento, chegavam mensageiros do palácio de Caifás para perguntar a que horas Jesus seria levado diante da corte do sinédrio e, já que estava próximo o alvorecer do dia, Anás julgou ser melhor enviar Jesus amarrado e sob a custódia dos guardas do templo, até Caifás. Ele próprio seguiu um pouco atrás deles.
2. PEDRO NO PÁTIO Quando a companhia de guardas e de soldados aproximou-se da entrada do palácio de Anás, João Zebedeu estava caminhando ao lado do capitão dos soldados romanos. Judas havia ficado a uma certa distância para trás, e Simão Pedro estava ainda mais atrás. Depois que João entrou no jardim do palácio, com Jesus e os guardas, Judas veio ao portão, mas, vendo Jesus e João, ele dirigiu-se para a casa de Caifás, onde sabia que o verdadeiro julgamento do Mestre teria lugar mais tarde. Logo depois que Judas saiu, Simão Pedro chegou e, como ficou diante do portão, João o avistou exatamente quando iam levar Jesus
ao palácio. A porteira que tomava conta da entrada conhecia João e, quando ele falou com ela, pedindo que deixasse Pedro entrar, ela prontamente consentiu. Pedro, ao entrar no pátio do jardim, foi até a lareira de carvão, buscando aquecer-se, pois a noite estava muito fria. Ele sentia-se deslocado ali entre os inimigos de Jesus e, de fato, não estava no seu lugar. O Mestre não instruíra a ele que ficasse perto e disponível como pedira a João. Pedro deveria estar com os outros apóstolos, que tinham sido especificamente avisados para não colocar as suas vidas em perigo durante esses momentos de julgamento e de crucificação do seu Mestre. Pedro jogou fora a sua espada pouco antes de chegar ao portão do palácio, de modo que entrou no jardim de Anás desarmado. A sua mente estava em um redemoinho de confusão; e ele mal podia conceber que Jesus tinha sido preso. Não captava a realidade da situação – que ele estava ali no jardim de Anás, aquecendo-se diante dos serviçais do sumo sacerdote. Ficava imaginando o que os outros apóstolos estariam fazendo e, ao revolver na sua mente como é que João havia sido admitido no palácio, concluiu que isso se devesse ao fato de João ser conhecido dos servos, já que havia pedido à porteira para deixa-lo entrar. Pouco depois que a porteira deixou Pedro entrar e, enquanto ele estava aquecendo-se junto à lareira, ela foi até ele e disse maliciosamente: “Não és também tu um dos discípulos deste homem?” Ora, Pedro não devia ter-se surpreendido com esse reconhecimento, pois fora João que havia requisitado da moça que o deixasse passar pelo portão do palácio; mas ele estava em um estado tal de tensão nervosa que essa identificação como um discípulo deixou-o desequilibrado e, com um só pensamento dominando a sua mente – o de escapar com vida –, prontamente ele respondeu à pergunta da porteira dizendo: “Não, eu não sou”. Logo um outro serviçal veio a Pedro e perguntou: “Eu não te vi no jardim, quando eles prenderam este homem? Não és um dos seus seguidores?” Pedro estava agora profundamente alarmado; ele não via nenhum modo de escapar com segurança desses acusadores; e, assim, veementemente negou qualquer ligação com Jesus, dizendo: “Eu não conheço este homem, e não sou um dos seus seguidores”. Nesse momento a porteira chamou Pedro a um lado e disse: “Eu estou certa de que tu és um discípulo desse Jesus, não apenas porque um dos seus seguidores pediu-me que te deixasse entrar aqui no jardim, mas a minha irmã aqui tem te visto no templo com esse homem. Por que negas isso?” Quando Pedro ouviu a criada acusá-lo, ele negou qualquer ligação com Jesus, com muito praguejar e com juramentos, dizendo novamente: Pág. 1981 “Eu não sou um seguidor deste homem; eu sequer o conheço; eu nunca ouvi falar dele antes”. Pedro saiu de perto da lareira por um momento, enquanto caminhava pelo jardim. Ele gostaria de ter fugido dali, mas temia atrair as atenções sobre si. Sentindo frio, ele voltou para perto da lareira, e um dos homens ali perto disse: “Certamente tu és um dos discípulos
deste homem. Esse Jesus é galileu, e a tua fala te trai, pois também falas como um galileu”. E novamente Pedro negou qualquer ligação com o seu Mestre. Pedro estava tão perturbado que buscou escapar do contato com os seus acusadores, saindo de perto do fogo e permanecendo só próximo à entrada. Depois de uma hora nesse isolamento, a porteira e a sua irmã tiveram a oportunidade de passar por ele, e ambas de novo acusaram-no provocadoramente de ser um seguidor de Jesus. E de novo ele negou a acusação. E exatamente depois de que ele tinha negado uma vez mais qualquer ligação com Jesus, o galo cantou, e Pedro lembrou-se das palavras de aviso faladas a ele pelo seu Mestre, mais cedo naquela mesma noite. Enquanto ele estava ali, de coração pesado e esmagado pelo sentimento de culpa, as portas do palácio abriram-se para que passassem os guardas que levavam Jesus para a casa de Caifás. Quando o Mestre passou por Pedro, ele viu, sob a luz dos tocheiros, a marca de desespero no rosto do anteriormente tão seguro de si mesmo e aparentemente valente apóstolo, e ele voltou e olhou para Pedro. Pedro nunca se esqueceu daquele olhar enquanto ele viveu. Era um olhar de piedade misturada a um amor tal que nenhum homem mortal jamais contemplou na face do Mestre. Depois que Jesus e os guardas passaram para fora dos portões do palácio, Pedro seguiu-os, mas só até uma certa distância. Ele não podia ir mais longe. E sentou-se ao lado da estrada e chorou amargamente. E depois de ter derramado essas lágrimas de agonia, ele se pôs a caminhar para o acampamento, esperando encontrar o seu irmão André. Ao chegar no acampamento, ele encontrou apenas Davi Zebedeu, que enviou um mensageiro para conduzi-lo até onde o seu irmão estava escondido em Jerusalém. Toda experiência de Pedro aconteceu no jardim do palácio de Anás, no monte das Oliveiras. Ele não seguiu Jesus ao palácio do sumo sacerdote Caifás. O fato de Pedro ter sido levado à constatação, pelo canto de um galo, de que tinha negado repetidamente ao seu Mestre, indica que tudo isso ocorreu fora de Jerusalém, pois era contra a lei manter criações domésticas de aves dentro da cidade propriamente dita. Antes que o cantar do galo tivesse levado Pedro de novo ao seu bom senso, ele havia pensado apenas, enquanto andava para cima e para baixo da entrada à lareira a fim de se aquecer, em quão espertamente ele tinha esquivado-se das acusações dos serviçais, e como ele havia frustrado o propósito deles de identificá-lo com Jesus. Até então, ele tinha considerado apenas que esses servos não possuíam nenhum direito moral ou legal de questioná-lo assim, e ele repetidamente havia congratulado-se a si próprio pela maneira com a qual ele julgava ter evitado ser identificado e possivelmente submeter-se a ser preso. E não ocorrera a Pedro, antes do galo cantar, que ele tinha negado o seu Mestre. E só quando Jesus olhou para ele é que ele deu por si, que tinha deixado de estar à altura dos seus privilégios como um embaixador do Reino. Tendo dado o primeiro passo ao longo do caminho do compromisso e da menor resistência, não parecia a Pedro que houvesse outra saída a não ser continuar no curso da conduta pela qual havia optado. É necessário um caráter grande e nobre, tendo começado errado, para voltar e retomar o caminho certo. Com muita freqüência a própria mente tende a justificar a continuidade no caminho do erro, uma vez que se tenha entrado nele.
Pág. 1982 Pedro nunca acreditou plenamente que pudesse ser perdoado, até que ele encontrou o seu Mestre, depois da ressurreição, e viu que ele estava sendo recebido exatamente como antes das experiências dessa noite trágica das negações.
3. PERANTE O TRIBUNAL DOS SINEDRISTAS Eram por volta de três e meia da madrugada, dessa sexta-feira, quando o sacerdote principal, Caifás, declarou constituído o tribunal dos sinedristas, para a investigação, e pediu que Jesus fosse trazido perante eles para que fosse julgado formalmente. Em três ocasiões prévias, o sinédrio tinha decretado a morte de Jesus; com uma ampla maioria de votos, havia decidido que ele merecia a morte por acusações informais de usurpar a lei, de blasfêmia e de insultar as tradições dos pais de Israel. Não se tratava de uma reunião do sinédrio convocada regularmente e não estava sendo realizada no local habitual, a sala de pedra lavrada no templo. Esse era um tribunal especial de uns trinta sinedristas e que foram convocados ao palácio do sumo sacerdote. João Zebedeu estava presente junto com Jesus durante este assim chamado julgamento. Como esses sacerdotes principais, escribas, saduceus e alguns dos fariseus gabavam-se de que Jesus, o perturbador da sua posição e o desafiador da sua autoridade, estava agora detido seguramente nas suas mãos! E eles estavam decididos a não deixá-lo escapar vivo das suas garras vingativas. Normalmente, ao julgarem um homem sob uma acusação capital, os judeus procediam com uma grande prudência e providenciavam toda a garantia de eqüidade na seleção de testemunhas e em toda a conduta do tribunal. Mas, nessa ocasião, Caifás era mais um promotor do que um juiz imparcial. Jesus apareceu perante esse tribunal com as suas vestes habituais e com as suas mãos atadas juntas nas suas costas. Toda a corte estava espantada e um tanto confusa com o seu porte majestoso. Nunca em toda a sua vida tinham eles colocado os seus olhos sobre um prisioneiro como este, nem presenciado a uma tal compostura em um homem cuja vida estava sob julgamento. A lei judaica exigia que ao menos duas testemunhas devessem concordar sobre qualquer ponto antes que uma acusação pudesse ser feita contra o prisioneiro. Judas não podia ser usado como uma testemunha contra Jesus porque a lei judaica proibia especificamente que a testemunha fosse um traidor. Mais de vinte testemunhas falsas estavam à mão para atestarem contra Jesus, mas os seus testemunhos eram tão contraditórios e tão visivelmente fraudulentos que os próprios sinedristas muito se envergonhavam de toda aquela situação. Jesus permaneceu lá, olhando benignamente para esses perjuros, e a sua própria compostura desconsertava as testemunhas mentirosas. Durante todos esses testemunhos falsos, o Mestre em nenhum momento disse sequer uma palavra; não respondeu às várias acusações falsas.
A primeira vez que dois dos testemunhos apresentaram sequer a semelhança de estarem de acordo foi quando dois homens atestaram que tinham ouvido Jesus dizer durante um dos seus discursos no templo que ele “destruiria esse templo feito com as mãos do homem e em três dias faria um outro templo sem empregar mãos humanas”. Isso não era exatamente o que Jesus dissera, independentemente do fato de que apontara para o seu próprio corpo ao fazer aquele comentário. Embora o sumo sacerdote tivesse gritado para Jesus: “Não repondes a nenhuma dessas acusações?” Jesus não abriu a boca. Permaneceu ali em silêncio, enquanto todas essas testemunhas falsas faziam as suas declarações. O ódio, o fanatismo e o exagero inescrupuloso de tal modo caracterizaram as palavras desses perjuros, que os seus testemunhos Pág. 1983 desmoronavam nos próprios embaraços. O melhor modo de refutar às suas acusações falsas foi o silêncio calmo e majestoso do Mestre. Pouco depois do início das declarações das testemunhas falsas, Anás chegou e tomou o seu assento ao lado de Caifás. Anás agora se levantava e argumentava que essa ameaça feita por Jesus de destruir o templo era suficiente para justificar três acusações contra ele: 1. Que era ele um perigoso desacreditador para o povo. Que ele ensinava a eles coisas impossíveis e os enganava de outros modos. 2. Que ele era um revolucionário fanático, pois advogava que se colocasse mãos violentas no templo sagrado, ou então como poderia destruí-lo? 3. Que ele ensinava magia, posto que prometera construir um novo templo, e ainda sem a ajuda das mãos. O sinédrio inteiro já tinha concordado que Jesus era culpado por transgressões das leis judaicas que exigiam a sua morte, mas eles estavam agora mais preocupados em desenvolver acusações a respeito da sua conduta e dos ensinamentos que servissem como justificativa a Pilatos para pronunciar a sentença de morte ao prisioneiro. Eles sabiam que deviam assegurar o consentimento do governador romano antes que Jesus pudesse legalmente ser levado à morte. E Anás estava decidido a continuar na linha de fazer parecer que Jesus era um instrutor perigoso para ser deixado em liberdade junto ao povo. Mas Caifás não podia mais suportar a visão do Mestre ali com um perfeito domínio de si e em um silêncio inquebrantável. Ele pensava saber ao menos um modo pelo qual o prisioneiro pudesse ser induzido a falar. E assim, ele acorreu até o lado de Jesus e, sacudindo o seu dedo acusador no rosto do Mestre, disse: “Eu te conjuro, em nome do Deus vivo, a que nos diga se és o Libertador, o Filho de Deus”. Jesus respondeu a Caifás: “Eu sou. Logo irei para o Pai, e em breve o Filho do Homem será investido com o poder e uma vez mais reinará sobre as hostes do céu”.
Quando o sumo sacerdote ouviu Jesus dizendo essas palavras, ficou excessivamente enraivecido e, rasgando a sua veste externa, exclamou: “Que necessidade temos de mais testemunhos? Vede, agora todos vós ouvistes a blasfêmia deste homem. O que pensais agora que deve ser feito com esse blasfemo e usurpador da lei?” E eles todos responderam em uníssono: “Ele é digno de morte; que seja crucificado”. Jesus não manifestou nenhum interesse por qualquer pergunta feita a ele quando diante de Anás ou dos sinedristas, exceto pela pergunta relativa à sua missão de auto-outorga. Quando perguntado sobre se ele era o Filho de Deus, respondeu instantânea e inequivocamente de modo afirmativo. Anás desejava que o julgamento continuasse ainda, e que as acusações de uma natureza definida a respeito da relação de Jesus com a lei e com as instituições romanas fossem formuladas para uma apresentação subseqüente a Pilatos. Os conselheiros estavam ansiosos para levar essas questões a um fim rápido, não apenas porque era o Dia da Preparação para a Páscoa, e nenhum trabalho secular devia ser feito depois do meio-dia, mas também porque eles temiam que Pilatos pudesse a qualquer momento voltar a Cesaréia, capital romana da Judéia, pois ele estava em Jerusalém apenas para a celebração da Páscoa. Contudo, Anás não teve êxito em manter o controle da corte. Depois que Jesus tinha de um modo inesperado respondido a Caifás, o sumo sacerdote se adiantou e esbofeteou-o no rosto com a própria mão. Anás ficou verdadeiramente chocado quando viu os outros membros da corte, ao passarem por ele antes de sair da sala, cuspindo no rosto de Jesus e muitos deles, de um modo zombeteiro, estapeando-o no rosto com a palma das suas mãos. E assim, em desordem e Pág. 1984 confusão inaudita, essa primeira sessão do julgamento sinedrista de Jesus terminou, depois das quatro e meia da manhã. Trinta falsos juízes cheios de preconceitos e cegos pelas tradições, com as suas testemunhas falsas, têm a pretensão de julgar o justo Criador de um universo. E esses acusadores extremados ficam exasperados com o silêncio majestoso e com a presença magnífica desse Deus-homem. O seu silêncio é terrível de suportar; a sua palavra é destemidamente desafiante. Ele permanece inarredável diante das ameaças deles e não se intimida com os seus ataques. O homem julga a Deus, e mesmo assim Ele os ama e os salvaria se pudesse.
4. A HORA DA HUMILHAÇÃO A lei judaica exigia que, na questão da declaração da sentença de morte, houvesse duas sessões do tribunal. Essa segunda sessão devia ser efetuada no dia seguinte ao da inicial, e o tempo entre as duas deveria ser passado em jejum e reclusão pelos membros do tribunal. Mas esses homens não podiam esperar até o dia seguinte para a confirmação da sua decisão de que Jesus devia morrer. Eles esperaram apenas uma hora. Nesse meio tempo, Jesus foi deixado na sala do tribunal sob a custódia dos guardas do templo, que, com os servos do
sumo sacerdote, se divertiam em lançar todas as espécies de indignidades sobre o Filho do Homem. Eles zombaram dele, cuspiram nele e esbofetearam-no com crueldade. Eles batiam no rosto dele com um vergalhão e então diziam: “Faça uma profecia, tu Libertador, sobre quem foi que bateu em ti”. E assim eles continuaram por uma hora inteira, insultando e maltratando esse homem da Galiléia que não opunha resistência. Durante essa trágica hora de sofrimento, de provações e de zombaria perante os guardas e os servos ignorantes e insensíveis, João Zebedeu esperou com um terror solitário em uma sala adjacente. Logo que esses abusos começaram, Jesus indicou a João, com um aceno de cabeça, que ele devia retirar-se. O Mestre bem sabia que, se ele permitisse ao seu apóstolo permanecer na sala e testemunhar essas indignidades, o ressentimento dentro de João seria tão forte a ponto de produzir uma explosão de indignação e protesto que iria provavelmente resultar na sua morte. Durante essa hora terrível, Jesus não murmurou uma palavra sequer. Para essa alma humana branda e sensível, unida, em uma relação de personalidade ao Deus de todo esse universo, não houve nenhum momento mais amargo no cálice da sua humilhação do que essa hora terrível à mercê desses guardas e servos ignorantes e cruéis, que tinham sido estimulados a abusar dele pelo exemplo dos membros desse chamado tribunal sinedrista. O coração humano não pode certamente conceber o estremecimento de indignação que varreu todo um vasto universo quando as inteligências celestes testemunharam o seu amado soberano sendo submetido à vontade das suas criaturas ignorantes e desviadas na esfera desafortunada de Urântia, obscurecida pelo pecado. Qual então é esse vestígio do animal no homem que o leva a querer insultar e agredir fisicamente aquilo que não pode alcançar espiritualmente, nem conceber intelectualmente? No homem meio-civilizado ainda espreita uma brutalidade maldosa que busca liberar-se sobre aqueles que são superiores em sabedoria e em alcance espiritual. Vede a maldosa grosseria e a ferocidade brutal desses homens supostamente civilizados, que sentem uma certa forma de prazer animal com esse ataque físico ao Filho do Homem, que não opunha resistência. Enquanto esses insultos, sarcasmos e golpes caíam sobre Pág. 1985 Jesus, ele não se defendia, mas ele não estava sem defesa. Jesus não foi vencido, ele meramente não lutou no sentido material. Esses são os momentos das maiores vitórias do Mestre em toda a sua carreira longa e importante de criador, sustentador e salvador de um universo vasto e variegado. Tendo vivido na sua plenitude uma vida para revelar Deus ao homem, Jesus está agora engajado em fazer uma revelação nova e sem precedentes do homem para Deus. Jesus está agora revelando aos mundos o triunfo final sobre todos os medos do isolamento da personalidade da criatura. O Filho do Homem finalmente conseguiu a realização da identidade como Filho de Deus. Jesus não hesita em afirmar que ele e o Pai são Um; e, na base do fato e da verdade dessa experiência suprema e superna, ele exorta todo o crente do Reino a tornar-se
um com ele, como ele e o seu Pai são Um. A experiência viva na religião de Jesus assim passa a ser a técnica segura e certa por meio da qual os mortais, espiritualmente isolados e cosmicamente solitários, da Terra, tornam-se capazes de escapar do isolamento de personalidade, com todas as suas seqüelas de medo e de sentimentos associados de desamparo. Nas realidades fraternas do Reino do céu, os filhos de Deus pela fé encontram a libertação final do isolamento do eu, tanto pessoal quanto planetariamente. O crente conhecedor de Deus experimenta crescentemente o êxtase e a grandeza da socialização espiritual em uma escala universal – a cidadania no alto, associada à realização eterna do destino divino de alcance da perfeição.
5. A SEGUNDA REUNIÃO DO TRIBUNAL Às cinco horas e trinta minutos, o tribunal retomou os trabalhos, e Jesus foi levado à sala adjacente onde João estava esperando. Ali o soldado romano e os guardas do templo vigiaram Jesus, enquanto a corte começava a formulação das acusações que deviam ser apresentadas a Pilatos. Anás deixou claro para os seus companheiros que a acusação de blasfêmia não deveria ter nenhuma importância para Pilatos. Judas estava presente durante essa segunda reunião do tribunal, mas não testemunhou. Essa sessão do tribunal durou apenas meia hora e, quando suspenderam-na para irem diante de Pilatos, eles haviam delineado a acusação de Jesus, para fazê-lo merecedor da pena de morte, resumindo-a em três razões: 1. Que era um pervertedor da nação judaica; ele enganara o povo e incitara-o à rebelião. 2. Que ensinava o povo a recusar pagar o tributo a César. 3. Que, com a pretensão de ser um rei e o fundador de uma nova espécie de reino, incitava à traição contra o imperador. Todo esse procedimento era irregular e totalmente contrário às leis judaicas. Não havia duas testemunhas que tivessem concordado em qualquer questão, exceto aqueles que testemunharam a respeito da afirmação de Jesus sobre destruir o templo, edificando-o novamente em três dias. E mesmo a respeito desse ponto, nenhuma testemunha falou pela defesa, nem foi Jesus chamado a explicar a intenção do que havia dito. O único ponto sobre o qual o tribunal poderia tê-lo julgado com consistência era o da blasfêmia, e o julgamento dela teria que repousar inteiramente no próprio testemunho dele. Mesmo no que concernia à blasfêmia, eles deixaram de proceder a uma votação formal sobre a pena de morte. E agora presumiam formular três acusações, com as quais ir perante Pilatos, e sobre as quais nenhuma testemunha tinha sido ouvida, e que foram decididas quando da ausência do prisioneiro acusado. E quando isso foi feito, três dos fariseus deixaram Pág. 1986
o tribunal; eles queriam ver Jesus destruído, mas eles não formulariam acusações contra ele sem testemunhas e na sua ausência. Jesus não apareceu novamente perante o tribunal sinedrista. Eles não queriam ter de olhar novamente para o seu rosto enquanto julgavam a sua vida inocente. Jesus não sabia (como homem) das acusações formais deles até tê-las ouvido de Pilatos. Enquanto Jesus encontrava-se na sala com João e os guardas, e enquanto o tribunal estava na sua segunda sessão, algumas das mulheres do palácio do sumo sacerdote, junto com as suas amigas, vieram para ver o estranho prisioneiro, e uma delas perguntou-lhe: “Tu és o Messias, o Filho de Deus?” E Jesus respondeu: “Se eu te disser, tu não crerás em mim; e se eu te perguntar, tu não responderás”. Às seis horas naquela manhã Jesus foi levado da casa de Caifás para comparecer perante Pilatos, a fim de ver-se confirmada a sentença de morte que esse tribunal sinedrista tinha, assim, injusta e irregularmente decretado.