Livro
Águias na mira do fotógrafo A editora Má-Criação está a ultimar o terceiro volume da sua colecção dedicada à fauna ibérica ameaçada de extinção. Depois dos abutres e dos lobos, chegou a vez das águias de Bonelli terem direito a um álbum próprio. Nestas páginas iremos perceber como caçam estas nobres águias. Texto Paulo Caetano, fotos João Cosme
O
desafio era imenso. Mas tinha de ser enfrentado e ganho. É que, na realização de um álbum sobre a vida das águias de Bonelli e sobre os desafios que se colocam à sua sobrevivência, era obrigatório ter imagens sobre uma das suas principais características: a caça! O que distingue as Bonelli
– e todas as águias – é o seu espírito caçador. Estas grandes rapaces são superpredadores, ágeis e mortíferas. E possuir imagens das suas investidas sobre as presas, captadas em plena Natureza, era uma obrigação. Uma difícil obrigação. O fotógrafo João Cosme – um dos co-autores deste livro – não podia ignorar este repto. E empenhou-se ao máximo para conseguir captar as belíssimas imagens que ilustram estas páginas e que irão brilhar no álbum que será editado até ao final de 2007. Uma
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das suas primeiras preocupações foi a autorização para fotografar esta espécie protegida e sensível. Enquanto esperava pelo documento oficial, emitido pelo Instituto de Conservação da Natureza e Biodiversidade (ICNB), falou com biólogos e naturalistas especializados nestas rapinas. Depois, avançou para o campo. Visitou os territórios de vários casais de águias, à procura dos seus poisos favoritos. O objectivo era identificar os locais onde,
após um lanço de caça bem-sucedido, as rapinas se instalavam para comer. Foram dias a fio pelos montes e obteve um sucesso invejável: encontrou vários poisos, mas infelizmente nem todos serviam. Uns tinham uma paisagem de fundo feia, outros estavam em sombra nas horas do dia que são mais favoráveis para as fotografias e ain-
da encontrou alguns que não permitiam a instalação de um abrigo nas proximidades. Foram semanas até – finalmente – encontrar dois ou três bons locais para tentar a sua sorte e exibir a sua arte. Nesses sítios, depois de ter estudado bem a sua localização, João Cosme instalou abrigos camuflados. E, no poiso onde as águias habitualmente comiam, deixou o isco. Depois foram as intermináveis horas de espera – de manhã à noite – para conseguir um vislumbre de escassos minutos ou, no pior dos casos, de segundos. Nesses momentos decisivos,
o motor da máquina fotográfica não parava. Mas compensavam toda a espera. Usar isco para atrair as águias não foi apenas bom para a fotografia. Como poderão ler, em detalhe, nas páginas do livro, muitos casais de Bonelli estão no limiar da sobrevivência por falta de presas e a única forma de lhes fornecer proteínas suplementares que os ajudem a viver e a terem sucesso na reprodução é dar-lhes, com alguma regularidade, alimento. Os casais visitados por João Cosme obtiveram essa benesse. Ficaram mais fortes e nunca se sentiram incomodados com a presença do cuidadoso fotógrafo de Natureza. Como fica provado nestas imagens. O contributo que os biólogos deram para a realização deste trabalho foi inegável. Mas estes profissionais não são os únicos empenhados em defender esta espécie ameaçada. Nos últimos anos, têm-se realizado várias parcerias público-privadas com o objectivo de melhor conhecer estas rapaces e de contribuir para a sua preservação. Os parques naturais – e o
próprio Instituto de Conservação da Natureza e Biodiversidade (ICNB) – têm estabelecido acordos e protocolos com empresas que financiam investigações de médio prazo ou projectos de intervenção. E as águias de Bonelli têm sido uma das espécies mais beneficiadas com esta nova postura das entidades privadas. Empresas com enraizado espírito de cidadania, comprometidas com o desenvolvimento sustentado e com a conservação do património natural do País – como a EDF Energies Nouvelles, que actua na produção de energia eólica – são um bom exemplo desta recente realidade. O seu objectivo não é negar os impac-
tos negativos que a sua actividade possa ter. Pelo contrário: são os primeiros a estar interessados na sua confirmação ou em provar que se trata apenas de especulações sem fundamento científico. E, caso sejam reais, estão disponíveis para os minimizar e – se possível – erradicá-los. Toda a informação e as melhores imagens obtidas ao longo de muitos meses de trabalho irão enriquecer o livro “Águias de Bonelli em Portugal”, que a Má-Criação irá lançar antes do final do ano. Com textos de Paulo Caetano e fotos de Joaquim Pedro Ferreira e João Cosme, a obra irá cobrir todos os aspectos fundamentais da vida desta rapace. V
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