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QUINTA-FEIRA, 15 DE OUTUBRO DE 2009 O ESTADO DE S.PAULO
VIDA&
Consórcio usou sala sem permissão, diz ministro
Alfabetização fortalece cérebro de adultos
Provas foram roubadas de local utilizado de última hora pelas empresas responsáveis q PÁG.A18
Pesquisadores usaram ex-guerrilheiros colombianos para desenvolver estudo q PÁG.A19
AQUECIMENTO GLOBAL
Força-tarefa estuda meta ambiental de Dilma Ministérios tentam alinhar expectativa de crescimento econômico com redução de emissão de CO2; governador de São Paulo critica a ministra Lígia Formenti Vannildo Mendes João Domingos BRASÍLIA
Estados querem mais recursos Os governadores dos nove Estados da Amazônia Legal e seis ministros ou representantes de ministérios envolvidos no debate sobre as mudanças climáticas, como o do Meio Ambiente, Carlos Minc, e o de Ciência e Tecnologia, Sérgio Rezende, encontramse amanhã no Fórum de Macapá, coordenado pelo governador do Amapá, Waldez Goes (PDT). A tendência, segundo Waldez, será a de incluir na pauta, como prioridade, as áreas de florestas como mercado de carbono. “Temos de pensar num Fundo Ambiental que deverá ser de pelo menos 2% do PIB mundial (cerca de US$ 1,24 trilhão) até 2020”,
disse. “Se isso não for feito agora, a situação chegará a tal ponto que 30% do PIB mundial não resolverão mais o problema.” Para o governador, foi um erro o Protocolo de Kyoto não ter incluído as florestas no crédito de carbono. Ele lembrou que 98% das florestas do Amapá estão preservadas. “Nós queremos receber recursos pela floresta em pé. O tratado de Kyoto prevê benefícios para áreas degradadas, mas para a preservação não existe pagamento”, afirmou. Os governadores amazônicos defendem o REDD, mecanismo que prevê o comércio de créditos de carbono. ● J.D.
sões de CO2, um dos principais causadores do efeito estufa, em relaçãoa2005.MasMincesbarrou no “desenvolvimentismo” da ministra, que quer taxa de 6%. No novo panorama, as metas de redução do desmate podem ficar inalteradas, mas as propostasparadiminuira emissão de CO2 têm de ser recalculadas para patamares menores. O ministro da Justiça, Tarso Genro, até manifestou, publicamente,mas semressonância no
governo, apoio às metas de Minc. “São razoáveis. Eu acho que esse é o destino da humanidade. Um desenvolvimento com sustentabilidade.” Apesar do apoio, o MMA já trabalha com outro panorama. “Havíamos feito um estudo com panorama que achávamos razoável, que era de 4%. Mas, diante do pedido de Dilma, uma série de alterações terá de ser feita”, contou a secretária de Mudanças Climáticas do
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Após o pedido da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, para que as metas ambientais apresentadas pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) fossem revistas com o objetivo de ampliar a previsão de crescimento do País, os ministérios começaram ontem um esforço concentrado de adequação da proposta.OInstitutodePesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea) foi contratado com a missão de adaptar o estudo inicial – que previa crescimento de 4% do País e redução de 40% nas emissões de gás carbônico em 2020 – ao cenário da ministra, que aponta crescimento anual da economia de 5% a 6%. Ontem, o governador de São Paulo, José Serra (PSDB), disse que crescimento econômico não é “incompatível” com a preservação do meio ambiente. “Não é incompatível com um crescimento mais rápido. Os juros siderais e o câmbio megavalorizadosãomuito piores parao crescimento do que qualquer medida de defesa do ambiente”, criticou o governador, provável candidato do PSDB à Presidência da República em 2010. Em viagem pelo Rio São Francisco, Dilma reafirmou que não vê razões para calcular o crescimento do Brasil em torno de 4% nos próximos 20 anos, como fizera o Ministério do Meio Ambiente. “Dá para fazer cenários com o crescimento de 5%, 6%”, disse a ministra. O cenário de crescimento real de 4% havia sido apresentado pelo ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, durante reunião com Dilma e o presidente Luiz InácioLulada Silva,anteontem,para tratar da proposta que o Brasil levará em dezembro para a conferência sobre o clima. Mincsugeriuumprojetoprevendo redução de 80% no desmatamento da Amazônia até 2020 e congelamento nas emis-
Os maiores emissores
Países industrializados e emergentes estão na liderança
O efeito estufa
Processo natural, que permite à Terra manter uma temperatura adequada ao desenvolvimento da vida Como era
5,8 bi (t/ano) A geração de energia por queima de carvão é a principal causa, mas o modo de vida dos americanos colabora substancialmente
ENERGIA SOLAR
Parte da radiação volta ao espaço
Parte da radiação volta ao espaço
MMA, Suzana Khan. Técnicos terão de correr. A ideia é que, até o dia 20, o plano esteja com todos os detalhes acertados. O empenho em cumprir essa meta vai além da contratação de trabalho externo. Hoje será realizada a terceira reunião sobreotema nestasemana.E,desta vez, em terreno da ministra: a Casa Civil. Com a nova projeção de crescimento, há dois caminhos. O mais provável é o de reduzir as metas de queda do ritmo de emissão de CO2 até 2020. A alternativa restante seria aumentar os esforços – o que incluiria mais recursos e mais áreas abrangidas – para manter a meta de congelar as emissões nos níveis de 2005. No plano inicial foram estudadas medidas nas áreas de energia, indústria, desmatamento e resíduos. Duas áreas consideradas de alto potencial demelindrepolítico–agricultura e transportes – estavam intocadas. Mas, como agora há o aval de Dilma, o Ipea recebeu recomendações do MMA de incluir medidas nessas áreas. Até anteontem, a ala desenvolvimentistadogoverno considerava razoável reduzir a emissão de carbono entre 20% e 30% até 2020. Pelos cálculos do MMA, esse porcentual poderia chegar a 40%. ● COLABOROU SILVIA AMORIM
Termômetro
Aumento de temperatura em relação a 1980-99
CONSEQÜÊNCIAS (SEM AÇÕES DE ADAPTAÇÃO)
+4ºC +3,8ºC
+3,5ºC
Mais de 40% das espécies terão desaparecido Um quinto da população mundial será vulnerável a enchentes Haverá perdas na agricultura em latitudes altas e baixas
+3ºC
30% das áreas alagadas costeiras terão sumido 30 milhões a 120 milhões de pessoas a mais sofrerão fome
China*
+2ºC
6,2 bi
(t/ano)
Até 2 bilhões de pessoas sofrerão com escassez de água
+3,2ºC
+2,5ºC
2,29 bi
União Européia** 3,88 bi (t/ano)
Com o excesso de gases na atmosfera, mais radiação solar fica presa e leva ao aquecimento
ERA OSF AT TR ERA F ES OS OP TR
ENERGIA SOLAR
Rússia**
EUA*
Com a ação do homem
Uma parte da radiação do Sol refletida pela Terra é retida na atmosfera
20% a 30% das espécies estarão sob risco de extinção Os recifes de corais estarão mortos em praticamente todo o mundo
Milhões de pessoas estarão expostas a inundações nas costas
(t/ano)
143,170 1.312,253
Japão**
489,686
1,26 bi
Índia***
(t/ano)
127,449
1,23 bi
302,741
(t/ano)
População em milhões de habitantes (em 2005)
Brasil***
1,48 bi (t/ano)
186,075 O País é um dos maiores emissores do mundo, especialmente pelo desmatamento e queima da floresta amazônica
*Dados referentes a 2006, de acordo com levantamento da Agência Holandesa de Avaliação Ambiental
1.130,618
Capitalpaulista instala novo comitê demudanças climáticas
**Dados de 2005 ***Dados de 1994
Impactos no Brasil do aumento da temperatura Tomou posse ontem o Comitê Municipal de Mudança do Clima e Ecoeconomia de São Paulo, responsável por organizar e fiscalizar a implantação das medidas previstas na Lei Municipal de Mudança do Clima na capital paulista. Aprovada em junho, a lei reúne diretrizes e ações para reduzir em 30% a emissão de gases-estufa até 2012. A referência é o ano de 2005, quando foram emitidas 15.738.241 toneladas de gás carbônico na cidade. Segundo a Prefeitura, o trabalho do grupo será garantir a redução de 10% dos gases, porque 20% das emissões teriam
sido cortadas com a instalação de usinas de biogás nos aterros Bandeirantes e São João. Anteontem, na Assembleia Legislativa de São Paulo foi aprovada a Política Estadual de Mudanças Climáticas. O projeto prevê redução de 20% das emissões de CO2 até 2020 em relação a 2005. O governador José Serra (PSDB-SP) comemorou a aprovação e chamou de “ultrapassada” a visão de que desenvolvimento significa necessariamente menos cuidado com a preservação. “É uma lei importante e útil de ser levada em conta no momento.” ● FELIPE GRANDIN e SILVIA AMORIM
A temperatura brasileira já subiu 0,75ºC no século 20
O que já aconteceu
O que pode acontecer
A linha costeira já retrocedeu ENTRE 1915 E 1950
COSTA
80 m
ENTRE 1985 E 1995
A Ilha de Marajó pode perder de 28% a 36% da área para o mar
ILHA DE MARAJÓ
25 m NORDESTE
RECIFE CENTRO-OESTE
Chuvas mais intensas
SUDESTE
SUL
Teve 35% a mais de noites quentes e 10% a menos de noites frias Praias em São Vicente, Santos e Guarujá correm risco de perder boa parte da faixa de areia COSTA ATUAL
COSTA ORIGINAL
Menos chuvas no Pantanal; espécies de peixes, jacarés e tuiuiús ficarão ameaçados
SUL
Primeira ocorrência de furacão, o Catarina, em 2004
Recifes de corais podem morrer e o clima pode passar de semiárido para árido
Alterações de migrações de aves Uma elevação do mar de 50 cm provocaria a inundação de 30% das áreas com matas nativas da Ilha dos Marinheiros, na planície costeira do RS INFOGRÁFICO/AE
Crescimento emite 200 milhões de t a mais Com taxa de 6%, CO2 extra equivaleria a 50% do desmatamento anual Afra Balazina
Se nada for feito para frear as emissõesnacionais degases-estufa e o crescimento do País for de 6% ao ano, o Brasil deve ter uma emissão anual em 2020 de pelo menos 3 gigatoneladas de
CO2. No cenário apresentado anteontem pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que considera um crescimento de 4% ao ano, as emissões seriam de 2,8 gigatoneladas de CO2 em 2020.
Portanto, elevar de 4% para 6% o crescimento, na avaliação preliminar do MMA significaria um aumento do lançamento do principal gás de efeito estufa em ao menos 200 milhões de toneladas – o equivalente a cerca de metade do desmatamento
atual da Amazônia por ano. Areduçãodasemissõesévista como necessária mundialmente,pois asmudanças climáticas já afetam diversos países e ilhas e podem gerar efeitos trágicos para as pessoas nos próximosanos.Sãoprevistosaumen-
tos da desertificação, do nível do mar, do número de enchentesedaseveridadedetempestades. Mas, enquanto países industrializadosdevemter metas obrigatórias de redução global de emissão, espera-se de países em desenvolvimento, como o Brasil, que continuem crescendo, mas que reduzam a taxa de aumento de emissões. Na proposta do MMA, o desmatamento deveria ser reduzido em 80% até 2020 e as emissões, diminuídas em 40% sobre
a projeção de 2,8 gigatoneladas de CO2. Mas a ministra Dilma Rousseff solicitou que fossem feitosnovosestudos,comprojeções de crescimento do País de 5% e 6% ao ano. Se com o cenário de 4% de crescimento as emissões voltariam a ficar perto do patamar de 1994, com 6% devem ficar no nível atual. O MMA optou por utilizar em seus cenários a média de 4% de crescimento ao ano porque o Plano Decenal de Energia também utiliza esse valor. ●