Entrevista-vegah

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Entrevista EYDA DANTAS

MARCCELA VEGAH

‘‘É preciso mais união para a moda bahiana!’’ A estilista institiva Eyde Dantas fala sobre seus desejos de diversificar a moda na Bahia, com um proposta singular que mescla originalidade, exclusividade a preços acessíveis

I

magine um lugar de frente para o mar, repleto de roupas lindas, coloridas, sóbrias, estampas clássicas como “pois”, coisas fofas cheias de lacinhos, e florais brejeiros que remontam o estilo do tecido chita. Nesse ambiente agradável, cuja decoração muda de acordo com a coleção está a Vestir Arte, loja e atelier das irmãs Eyde e Eneyda Dantas, no Barra Center, Av. Oceânica, em Salvador, Bahia. Donas de um sorriso convidativo e olhares de quem acredita no que faz, as irmãs Dantas administram já há cinco anos essa empreitada e planejam uma expansão, na abertura de uma segunda loja. Eyde Dantas é a estilista e criadora do conceito que é a Vestir Arte, uma mulher que apesar de não possuir formação acadêmica ou técnica, tem um grande talento e paixão pela moda. A seguir, Eyde expõe sua visão sobre a moda da Bahia, sobre si mesma enquanto designer, o mercado de nicho e a proposta de seu negócio. ou acadêmica, te faz falta? Sim, porque chega um momento que você precisa ter um conhecimento maior. O dom é uma coisa muito legal, mas não basta. Eu me inscrevi agora num curso à distância, e pretendo fazer uma pós-graduação em Blumenau, de moda, cujo currículo me interessou muito: desenvolvimento de coleção, marketing de moda, etc.

O que te levou à moda? Desde criança me interesso muito por moda. Procurei sempre fazer artesanato, pulseiras, vendia na escola. Eu sou baiana, mas morei boa parte da vida em Aracaju, e lá sempre busquei trabalhar com moda, mesmo que indiretamente. Fazia bolsas, carteiras, sandálias. Há cinco anos voltei à Bahia, pois minha irmã adoeceu e quis sair do emprego dela, que lhe exigia muito, era muito pesado. Decidimos então trabalharmos juntas, e daí surgiu a idéia de trabalharmos com moda, já que eu tinha esse dom. Porque tem uma coisa: eu não tenho formação de moda, e sim de assistência social.

Os desenhos são seus. Mas a execução é sua também? Não, eu desenvolvo a idéia, mas tenho uma equipe de modelistas, pilotistas, costureiras. Não ponho a mão na massa.

Não ter uma formação mais profunda, seja técnica

Em sua opinião, há o que se possa chamar de uma FACOM/UFBA | outubro, 2009 | 01

Entrevista EYDA DANTAS moda tipicamente baiana, que a torne singular e diferenciada no cenário nacional, num sentido de identidade? Eu acho que ainda não. Tem muita gente boa aqui, mas que faça uma moda tipicamente baiana, não acho que tenha. Ela está se desenvolvendo, cresceu, mas não há essa identidade ainda.Talvez quem chegue mais perto disso é a Márcia Gannen, que faz um trabalho bem bonito, utilizando fibras, coco, mas não é para o grande público, pois suas peças são relativamente caras. Mas acho difícil dissociar a moda baiana da moda brasileira. Hoje em dia o mundo está tão globalizado que é até difícil separar a moda brasileira da mundial: se você pegar revistas italianas, espanholas e brasileiras, você não vai perceber tantas diferenças. Mas se compararmos, por exemplo, a moda feita aqui com a em São Paulo, se notam diferenças no que se refere à estampa, à cor, ter um apelo mais sensual etc. Esses elementos não caracterizariam uma moda mais baiana, por assim dizer? Tem essa questão óbvia da cor no que diz respeito a São Paulo. Mas se a comparação fosse entre Salvador e Rio de Janeiro, haveria mais semelhanças do que diferenças. Então, em sua opinião, há uma diferença entre moda litorânea e moda urbana no cenário fashion brasileiro? Sim, há esse elemento tropical muito forte. Se olharmos em Pernambuco, vemos cores, estampas como aqui. Se te mostro esse vestido florido aqui, você saberia distinguir se ele é feito aqui ou Recife? Acho que não. No Rio as mulheres são mais despojadas, usam vestidos longos com sandálias rasteiras. Aqui na Bahia, as mulheres dificilmente abrem mão do salto alto, independente do comprimento da roupa. A moda urbana, nesse caso, a de São Paulo, já é um pouco mais à parte, ela é mais européia, até por conta do clima, que pede que as pessoas usem muito preto, marrom, cinza. Apesar da moda baiana estar ainda no caminho para se desenvolver e consolidar uma identidade marcante, qual seria a sua estratégia para alavancála e projetá-la, tanto aqui regionalmente como para fora da Bahia e do Nordeste? Nós, criadores, precisaríamos nos unir mais. Tentamos, mas ainda é muito difícil. Não há muito espaço para discussão. Além disso, há uma dificuldade muito grande para encontrar mão de obra qualificada aqui na Bahia. É FACOM/UFBA | outubro, 2009 | 02

claro que você acha costureiras, se eu puser um anúncio vão aparecer bem umas cem, mas que realmente saibam executar um trabalho bem feito, com qualidade, essas são muito poucas. Você desenha para a Vestir Arte há cinco anos. Qual o seu conceito estético, sua proposta enquanto designer? Minha proposta é não seguir uma tendência. Por exemplo, eu abro revistas e só vejo balonês, não é bem por aí que eu vou. Eu faço uma roupa atemporal, que ela seja relevante tanto agora quanto daqui dez anos. Uma roupa versátil, que você esteja bonita, seja com acessórios mais arrumados, ou com um sapatinho baixo, a idéia é usar o mesmo vestido para qualquer proposta que você tenha. Claro que seguimos algumas tendências; no verão a estampa de lei é o floral, por exemplo, eu não vou fazer uma coleção baseada em listras, afinal eu quero vender. Mas o mais importante é o bom gosto, pode ser “pois”, listra, floral, liso, tendência ou não, vai vender. Quais são suas influências enquanto designer? Com certeza seria Vera Arruda (estilista de Maceió, eleita melhor designer da Semana Brasileira de Moda

Entrevista EYDA DANTAS em NY, grande estimuladora do nacionalismo na moda, conhecida por seu trabalho colorido e estampado, morta vitima de uma hepatite fulminante medicamentosa, decorrente de um câncer de fígado, aos 38 anos em 2004). Ah, Coco Chanel tem de ser sempre citada, porque ela fez coisas muito clássicas, tubinhos, cortes retos, ternos bem cortados, peças de alfaiataria. Mas Vera Arruda é quem realmente me inspira. Tem alguma década da qual você beba mais para criar seus desenhos? Década de 70, pelo colorido, né. Mas a minha modelagem que usamos acaba sendo bem inspirada nos anos 40 e 50, principalmente 50. O que mais me chama atenção aqui nessa loja é a influência do Vintage. Não dá pra classificar vocês como vintage, mas tem uma proposta mais retro aqui, não é? Como é que você vê uma moda vintage baiana? Como é que dá para juntar as duas coisas? Sim, com certeza, e minha vontade maior é que a loja fique cada vez mais vintage. Ainda não está do jeito que eu quero. Pois é, mudar conceitos dá trabalho, afinal a mulher baiana não é vintage por natureza. É um trabalho de todo o dia ir tentando algo novo, nesses cinco anos fomos mudando, experimentando, para encontrar um caminho. Então, de repente, uso um corte mais vintage, com um tecido colorido, estampado, porque isso é algo que não só a baiana, mas a brasileira como um todo gosta. Temos de fazer uma coisa mais baiana, sim, afinal estamos aqui, mas também uma coisa bem vintage, não dá para ficar só no regional, no brejeiro. Qual o público que vocês pretendem atingir? E qual o que vocês de fato atingem? Qual o perfil? No início achamos que nossa clientela seria de garotas novas, nos seus vinte e poucos anos, mais retro, mas acabou não sendo. Temos algumas clientes nesse perfil e para elas caprichamos no vintage, bastante laço, fitas, mas não tanto quanto gostaríamos, porque esse é um público que precisa ser formado ainda, e talvez a melhor maneira de formá-lo seria uma parceria com as faculdades de moda de Salvador. Uma idéia seria que a cada mês, cederíamos uma arara aqui da loja para que um estudante de moda produzisse uma pequena coleção, e assim ele atrairia seu próprio público, e nós poderíamos ao mesmo tempo difundir o nosso produto para uma possível nova clientela. Contudo, a maior

parte de nossas clientes é de mulheres acima de 35, cansadas daquela modinha de malhas, estampas padronizadas, que querem uma coisa mais exclusiva, clássica e ao mesmo tempo graciosa, que rejuvenesça. Também mulheres mais gordinhas, que queiram uma modelagem no corpo, porque quem veste de 48 em diante só consegue comprar em lojas para gordinhos, que são aquelas batas sem corte. A Vestir Arte tem um caráter exclusivista, no sentido que cada desenho tem poucas reproduções nos diferentes tamanhos. Essa proposta mercadológica da exclusividade surgiu espontaneamente ou foi o conceito fundamental no surgimento da Vestir Arte, para dar à consumidora aquela sensação de que a peça que ela está usando é única? Foi uma coisa pensada desde o início, porque já existe muita coisa feita em série, e mesmo que quiséssemos produzir em grande escala não saberíamos como, porque começamos sem saber muito, testando as coisas, encontrando uma série de desafios. Por exemplo, desenvolver uma coleção, parece simples, mas não é, porque é necessário saber o que comprar, quanto comprar, quantos de cada tamanho fazer, e isso a prática depois de um tempo até te dá. Além disso, uma coleção precisa ter uma história, uma coesão, ter uma identidade. E como é sobreviver e prosperar com a moda na Bahia? É muito complicado. Muita gente que começou na mesma época que nós não está mais produzindo. Acho que somos as últimas teimosas. FACOM/UFBA | outubro, 2009 | 03

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