Assistente Litsconsorcial (rogerio Tadeu)

  • December 2019
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ASSISTENTE LITISCONSORCIAL

ROGÉRIO TADEU ROMANO Procurador da República

Ao tratar do estudo da assistência litisconsorcial, o Mestre Barbosa Moreira esclarecia que essa forma de intervenção se dá “quando a decisão da causa possa produzir efeitos sobre a relação jurídica de que é sujeito um terceiro”. Tal assistência se distingue da assistência simples que por sua vez, se afasta, como forma de intervenção de terceiro, do litisconsórcio. No passado, Lopes da Costa, “Da Intervenção de Terceiros no Processo”, informava que Mello Freire, comentando as Ordenações Filipinas, em linha seguida por João Monteiro e pelo Regulamento n.º 737, dizia que “Assistente é aquele que intervém no processo para defender o seu direito juntamente com o do autor e do réu”, confundindo litisconsórcio e assistência, pois aquele que intervém no feito, para defender seu direito junto com autor ou réu, não é assistente, mas litisconsorte, parte no processo. A matéria em estudo tem sido objeto de diversas conclusões pelos mais autorizados processualistas, em que, geralmente, se confundem assistência simples com assistência litisconsorcial. Guilherme Estelita, em estudo consagrado “Do litisconsórcio no direito brasileiro”, pg. 229, afirma que o ingresso do fiador na lide em que o credor controverte com o devedor principal é exemplo de assistência litisconsorcial. Por sua vez, Pontes de Miranda, em seus “Comentários ao Código de Processo Civil” (1959), t. II, p. 132, apresenta como exemplo de assistente equiparado ao de litisconsorte o caso da intervenção do tabelião na ação em que se discute a validade da escritura pública, por defeito de forma. No direito italiano, Zanzucchi, “Diritto Processuale Civile”, vol. I, § 138, acentua que a assistência litisconsorcial nasce de uma segunda controvérsia entre o interveniente e o adversário de seu litisconsorte e apresenta alguns exemplos:

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a) o ingresso de um credor na lide entre outros credores e o devedor comum em torno da consistência do patrimônio; b) a intervenção de um sócio na lide proposta por outro; c) de um terceiro legitimado a impugnar o matrimônio ou a promover a interdição nessas demandas; d) o ingresso de um filho na causa sobre a validade do casamento dos pais; e) o herdeiro, na lide sustentada por um testamenteiro contra um estranho na linha de W. Kisch e F. Lent (Diritto Processuale Civile Tedesco, § 83, VI).

Na Alemanha, Rosemberg denomina o assistente litisconsorcial, como litisconsorte, afirmando, no “Tratado de derecho processal civil”, I, § 46, IV, 2, que o assistente litisconsorte é das pessoas aos quais a sentença surte efeito de coisa julgada e dá como exemplo a decisão contra o marido ser exeqüível nos bens comuns o que justificaria o ingresso da esposa na causa como assistente litisconsorcial e a intervenção do cessionário de um crédito litigioso contra o qual a sentença proferida na demanda contra o cedente produz coisa julgada. Fabbrini, em seu “Contributto alla dottrina dell’ intervento adesivo”, afirma que o art. 105 do Código Italiano não prevê nada mais que uma forma postergada ou sucessiva de um litisconsórcio facultativo, similar à figura como do litisconsórcio. Para Nelson Néry Júnior, a assistência litisconsorcial assemelha-se, de forma prática, a uma espécie de litisconsórcio facultativo ulterior. Para Arruda Alvim, em seu “Manual de Direito Processual Civil”, o assistente litisconsorcial é alguém que em quase tudo e por tudo equipara-se ao litisconsorte unitário, exceção feita a que o assistido tem legitimidade para agir, em relação à sua própria situação. Segundo Ovídio Baptista, o assistente litisconsorcial será atingido necessariamente pela coisa julgada, e isso é o que basta para colocá-lo como parte (litisconsorte). Instituto jurídico diverso da assistência simples e do litisconsórcio, a assistência litisconsorcial desperta dúvidas, segredos. Parece ser um estranho sujeito no processo.

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Não é o assistente litisconsorcial um assistente simples porque, como bem preceitua J. E. Carreira Alvim, “Elementos de Teoria Geral do Processo”, quando o direito que está sendo objeto de discussão pertence também ao terceiro, então, a assistência é litisconsorcial ou qualificada, como se lê dos direitos descritos nos art. 623 do Código Civil, em que se fala que o condômino pode reivindicar coisa de terceiro, sendo interesse dos demais condôminos o ingresso na demanda. Já, na assistência simples, o direito de terceiro não está sendo discutido em juízo. Assim, se o assistido desistir da ação, cessa a assistência simples. Se o assistido não recorrer, porque expressamente renunciou ao recurso, o assistente não pode recorrer. Se o assistido reconhece o direito da outra parte, o assistente nada pode fazer. Se o assistido manifestar sua aquiescência da decisão, renunciar ao direito, restará prejudicado ao recurso do assistente. Se o assistido não contesta, o assistente é gestor de negócios, pura e simples, sem poder praticar atos de disposição de direito (art. 52, p. único do Código de Processo Civil). Se o assistente simples é considerado para uns, como Liebman, Carnelluti, Allorio, parte subordinada ou acessória, para outros, como Frederico Marques, sujeito processual secundário, terceiro, pois, não parte, ou, quando muito sujeito do processo (Arruda Alvim, no Manual), o assistente litisconsorcial equipara-se ao litisconsorte (art. 54 do Código de Processo Civil), pois seu direito está sendo objeto de debate em juízo. A assistência simples é ainda admitida em qualquer fase do processo, ainda que, em Tribunal, se se encontrar a causa em grau de recurso. Já a intervenção voluntária litisconsorcial não é admissível em qualquer fase do processo, não sendo admitida, após a citação. O assistente simples está vinculado à justiça da decisão (art. 55 do CPC), que é o fato jurídico tido como processualmente verdadeiro, na premissa menor do silogismo sentencial, os fundamentos da decisão. Já, na assistência litisconsorcial, o terceiro assume a posição de parte, desde que também a relação jurídica que o vincula ao adversário do assistido será decidida pela sentença, com força de coisa julgada, pois a influência, mencionada timidamente no art. 54 do CPC, corresponde a coisa julgada. O artigo 55 do CPC refere-se apenas ao assistente simples, como lembram Celso Agrícola Barbi, “Comentários ao CPC”, tomo I, pg. 308/309; Ernani dos Santos, Tornaghi, “Comentários ao Código de Processo Civil”, vol. I, p. 236, contra posição de Arruda Alvim, Pontes de Miranda e Sérgio Ferraz, certamente convencidos por Rosemberg e Schönke, à luz do § 68 da ZPO alemã. A coisa julgada, em se tratando de assistência litisconsorcial alcança tanto o assistido como o assistente. Aliás, Moacyr Lobo da Costa entende que, quando a sentença puder produzir coisa julgada na referida relação, é que se legitima tal outorga de assistente litisconsorcial.

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Assim, data vênia, o fiador e o tabelião, que possuem interesse mediato como terceiros, na lide, não são assistentes litisconsorciais, mas adesivos, tanto quanto o sublocatário (interesse imediato) em relação ao locatário, na medida em que auxiliam a parte, e tem interesse jurídico na sua vitória.

Outra conseqüência é de que na assistência litisconsorcial, os efeitos da sentença entre as partes principais afetam a relação jurídico do assistente com o adversário do assistido, isso porque o interesse jurídico a legitimar sua atuação decorre de sua vinculação com a relação jurídica deduzida em juízo, pois marcante a intensidade do seu interesse jurídico que se revela direto diante do objeto do litígio.

Tese correta é aquela que defende que a assistência litisconsorcial não é hipótese de litisconsórcio superveniente, porque a posição processual do assistente é parte.

Não pode o assistente litisconsorcial requerer ação declaratória incidental, pois não tem essa autonomia, não pode reconvir ou alterar o pedido ou a causa de pedir, pois sua intervenção não afeta o objeto litigioso.

Seu campo é do processo de cognição, podendo-se visualizá-lo no processo cautelar e nos embargos à execução.

A assistência litisconsorcial abarca hipóteses em que o terceiro sequer poderia ser litisconsorte por ausência de legitimidade ad causam.

Por fim, trago exemplos de assistência litisconsorcial, no direito brasileiro:

a) co-titularidade do direito material ou co-legitimidade para agir;

b) concorrência de legitimados extraordinários, como o caso em que terceiro intervém como assistente litisconsorcial do cidadão que moveu ação popular;

c) terceiro adquirente de coisa litigiosa (art. 42, § 1.º, CPC);

d) ação de cobrança movida pelo espólio, representado pelo inventariante, na qual o herdeiro apenas pode intervir como assistente litisconsorcial;

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e) a legitimidade extraordinária do acionista para mover a ação indenizatória contra um diretor da companhia, em caso de inércia desta. Na hipótese, movida a ação por algum acionista, podem intervir, como assistente litisconsorcial, a sociedade bem como o acionista (art. 159, § 3.º da Lei n.º 6.404, de 15.12.76), em plurissubjetividade extraordinária, em que a co-titularidade não está relacionada com o objeto substancial da demanda, mas com a co-titularidade da ação única, como na co-legitimidade para se propor ação de anulação de casamento do menor. Lembre-se que a legitimidade extraordinária tem como magno ponto o substituto processual, parte no sentido formal (só ocorre nos casos previstos na lei ao contrário da assistência simples), pois que defende em nome próprio, o direito alheio;

f) o denunciado é assistente litisconsorcial do denunciante, na denunciação da lide (art. 70 do CPC), em hipótese de assistência excepcionalmente provocada (Dinamarco, “Intervenção de Terceiros” – pg. 146). Observo, porém, que sob o Regulamento n.º 737 o instituto da denunciação da lide, aparecia sob a rubrica autoria com as mesmas características gerais que trouxe das ordenações (art. 111117). No artigo 115, dizia-se que “vindo a juízo o chamado à autoria, com ele prosseguirá a causa, sem que seja lícito ao autor a escolha de litigar com o réu principal, ou com o chamado à autoria (art. 115). Repercutiu tal dispositivo no artigo 97 do Código de 1939, que dizia ser defeso ao autor litigar com o denunciante. Aliás, no Código de Processo Civil revogado, art. 101, a ação do denunciante ao denunciado para condenação a prestação da garantia é proposta separadamente, em processo sucessivo, como na Alemanha, § 74, o denunciado, comparecendo será o assistente do denunciante. No Brasil, com o Código de 1973, temos uma sentença complexa, quando se julga a denunciação da lide, onde a demanda inicial do processo é prejudicial em relação a de garantia onde se poderá ter condenação do terceiro e sem que se possa falar em garantia própria (Chiamata in garantia) e garantia imprópria (intervento coatto), o que seria distinguir ação de garantia e ação de regresso (garantia imprópria), como aduz o Professor Greco Filho, “A denunciação da lide e sua extensão”. Tal ilação foi objeto de censura por parte do Professor Dinamarco, “Intervenção de Terceiros”, interpretando o art. 70, III, do CPC, que mantendo firme posição liberal com relação a esse dispositivo legal vê a possibilidade de denunciação da lide ao funcionário e, inclusive, a aplicação do artigo 273 do CPC (tutela antecipada) para a vítima, sem a inconveniência de privar o Estado do regresso, a teor do art. 37, § 6.º , da CF/88, como se isso fosse confessar a causalidade entre a conduta do funcionário e o dano;

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g) ingresso de um sócio na ação sustentada por outro para invalidar deliberação de Assembléia Geral de S/A;

h) intervenção de co-credor ou do co-devedor em obrigação indivisível, na demanda sobre relação obrigacional. Aliás, Barbosa Moreira critica, nessa hipótese, os que costumam dar como assistência litisconsorcial casos de intervenção como litisconsorte. Porém, a doutrina, consagra a hipótese do servidor que se habilita na lide na demanda de indenização proposta contra o Poder Público (art. 70, III), como assistência simples, como se lê de Ovídio Baptista, Assistência Litisconsorcial, RePro, 30/1983, pg. 36. Discute-se inclusive, se nesses casos cabe denunciação (contra: ACO 2160-8, Rel. Min. Celso de Mello, DJU 31/10/94 – STF – 2.ª turma, RE 93.880, Rel. Min. Décio Miranda, 1/12/82, RTJ 100/135, STF, 2.ª turma, RE 95.091-RJ, dentre outros e a favor: STJ, 2.ª turma, REsp 4.338-0-SP, Rel. Min. Américo Luz, 03.10.92, dentre outros). Preferimos a linha restritiva de autores como Nelson Nery Jr., pela lição de Lopes Meirelles, em seu “Direito Administrativo Brasileiro”, na medida em que se introduz fundamento novo (responsabilidade subjetiva quando a ação movida aponta responsabilidade objetiva);

i) caso em que a irmã dos interditos assiste o Ministério Público em ação que este propõe para destituir o atual curador daquele, isto porque, tendo legítimo interesse na pretensão destitutória, poderia ela litigar como parte (TJMT – 1.ª t – Ap. 9.305, j. 17.10.77);

j) em ação de usucapião pode ser admitido o pedido de assistência litisconsorcial formulado por aquele que, sendo titular de interesse jurídico próprio sobre a relação em litígio, possuiria legitimidade para ser parte na relação processual (TJSP – 3.ª t – AI 23.070-1, j. 31.8.82);

k) se a União é co-titular de crédito com empresa pública ou sociedade de economia mista, pode ingressar no feito, como assistente litisconsorcial, não se a entidade da Administração Indireta atua como agente de Programa de Desenvolvimento do Governo (T. Pleno – CJ 6.275, j. 18.11.82 – STF). Quanto ao interesse da União Federal, decidiu-se que não pode a Justiça Estadual emitir pronunciamento quanto a esse interesse (STF, 1.ª turma, RE 88.985-SP, Rel. Ministro Rafael Moreira, j. 18.12.79); l) ingresso do usufrutuário na demanda reivindicatória de que participe o nãoproprietário;

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m) o locador poderá ser assistente litisconsorcial de seu inquilino na ação por perdas e danos movida pelo proprietário do prédio vizinho sob alegação de que as reformas feitas no prédio locado com o consentimento do locador, lhe causaram danos (Sérgio Ferraz, in “Assistência Litisconsorcial no Direito Processual Civil”, pg. 89); n) na ação de anulação de casamento proposta por outro legitimado, assim como em outras ações constitutivas de modificação de estado ou situação jurídica;

o) os acertadores de determinado teste lotérico assistentes qualificados da Caixa Econômica Federal quando outro apostador postula seu direito também de participar do rateio (STF – 2.ª turma, RE 81.848, j. 29.5.79, RTJ 93/172);

p) vizinhos interessados na vitória da Municipalidade em causa instaurada por um proprietário que pretende ser considerado liberto de determinadas limitações administrativas ao direito de construir (A. I. n.º 273.922, j. 5.10.78, RT 524/99);

q) ações referentes a silvícolas sobre as terras que habitam, em que a União Federal, por força da Lei n.º 6001/73, art. 36, p. único, se apresentava como assistente litisconsorcial (Dinamarco, Litisconsórcio, 4.ª edição); r) assistência do construtor do imóvel, com interesse na vitória do proprietário do veículo, quando acionado este em virtude de acidente com ele ocorrido, ou inversamente.

O instituto tem traços misteriosos. Por certo, o assistente litisconsorcial não se alça à condição de litisconsorte, pois o direito postulado na demanda inicial não é seu. Mas que se dirá da situação trazida no art. 42, § 2.º do CPC, diante da proibição do assistente litisconsorcial dispor do direito material ou do processo? Certamente, não pode a parte principal (substituto processual) dispor de direitos sem consenso do substituído processual, titular da relação processual e parece certo que o assistente, apesar de tal, pode dispor de tal direito, desde que, de acordo com a parte contrária. O assistente litisconsorcial é terceiro titular de legitimidade a litigar com o adversário do assistido. Intervém, sempre, sem alterar o objeto do processo, mas com poderes para contrariar a vontade da parte a quem assiste, ao contrário do assistente, que não tem esses poderes, mas sem figurar como autor ou réu.

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