O espetáculo continua: The winner is... Jamile Borges da Silvai O escritor George Orwell (1903-1950) – autor do célebre livro “1984”- acreditava que toda sociedade de massas tende a ser governada tiranicamente, posição compartilhada pela filósofa Hannah Arendt (1906-1975 ) que julgava que o totalitarismo tende a florescer na sociedade de massas seja ela de direita ou de esquerda. A julgar pelos recentes acontecimentos do outro lado do mundo, isto é, a Jihad americana em sua cruzada contra os dragões da maldade do médio oriente, sou obrigada a concordar com ambos. Em meio a investidas furiosas com armamento de última geração e trapalhadas do presidente George Bush junto com seus soldados buscando cumprir a lógica de que soldado mandado não tem culpa, assistimos perplexos a duas guerras: uma que faz vítimas civis e soldados de ambos os lados e, outra, que faz vítimas em todo o mundo, para além das fronteiras da língua: a guerra da informação. O que se vê (na tevê e nas diferentes mídias) é o mais puro exercício da moral cínica, resvalando naquilo que o filósofo francês Jean Baudrillardii (1929- ) chama de vício fundamental, ou seja, os sistemas funcionam melhor quando vão de encontro às próprias regras e a despeito dos próprios princípios. Afinal, do que se trata nesta guerra insana: construção da democracia? Purificação étnica? Exercício de pátrio poder sobre o resto do mundo ou o retorno do recalcado na família Bush? O que vemos é o fim do laço social e o rompimento do pacto civilizatório simbolizados pelo surgimento e sobrevivência de organizações com papel regulador, a exemplo da ONU, hoje descredibilizada diante do mundo. O efeito colateral da desintegração dessa frágil rede que ainda sustentava as relações econômicas entre os países hoje em guerra, revela uma era a que o sociólogo
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polonês Z. Baumant (1925-
) denomina de pós-panóptica, onde o que importa é
que as pessoas que operam as alavancas do poder de que depende o destino do “resto da humanidade” podem fugir do alcance a qualquer momento pelo poder da inacessibilidade ( o efeito das redes midiáticas).
E, é essa rede midiática, que durante todo o tempo, desde a invasão norteamericana ao Iraque, vem tentando convencer o mundo da possibilidade de uma guerra “quase” sem vítimas, isto é, uma guerra cirúrgica, sem muito sangramento e com muita popularidade... mitos e ironias das imagens da guerra, diria Baudrillard. A realidade, entretanto, parece ser outra. Ao nos deixarmos capturar pela sedução da imagem e pelo discurso contundente e parcial dos âncoras dos telejornais, consentimos com o mais puro e cruel exercício de selvageria e barbárie, permitindo que a indiferença tome conta sem refletirmos sobre as origens deste ou de qualquer outro regime de repressão e totalitarismo. Com o uso de sofisticadas tecnologias, a guerra chega até nossas casas como se fosse um jogo em terceira dimensão ou um RPGiii; pela tela colorida de nossas televisões assistimos a espetáculos da guerra noturna provocada pelo fogo amigo (que nenhum amigo resolva me oferecer tal deferência...) e vemos um céu nas cidades iraquianas tingido de tons verdes, amarelos e alaranjados. Bom, como dizia nosso velho amigo Sigmund Freud (1856-1939), infelizmente “não podemos pular fora desse mundo”iv. Assim, o que resta é ficar prostrado diante da tevê e...desligá-la no horário do noticiário, substituindo-a por uma leitura de Tolstoi em Guerra e Paz. i
Antropóloga, Professora da Universidade Estadual de Feira de Santana/UEFS. Baudrillard, Jean. Tela Total. Mito-ironias da era do virtual e da imagem. 1997. iii Roling Playing Game iv Freud, S. O Mal-Estar na Civilização. ii
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