Anota Es Sobre As Diferen As Entre Obriga Es Civis E Comercial

  • November 2019
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ANOTAÇÕES SOBRE AS DIFERENÇAS ENTRE OBRIGAÇÕES CIVIS E COMERCIAL DEILTON RIBEIRO BRASIL Sumário 1.- Resumo 2.- Introdução 3.- Conceito de Obrigação 4.- As regras do direito civil e as obrigações comerciais 5.- Dispositivos do Código Comercial relativos às obrigações 5.1) - Distinções entre o Direito Comercial e o Direito Civil Considerações relevantes. 6) - Obrigações civis e obrigações comerciais 7) - Especialização da obrigação comercial 8) - Conclusão 9) - Bibliografia 1- RESUMO ANTECIPADO. Em magistral análise dedicada à noção de obrigações civis e comerciais Fran MARTINS (1) assevera que muitas vezes, em virtude de um acordo de vontades, pela prática de um ato ilícito ou mesmo pela manifestação unilateral de sua própria vontade, a pessoa se obriga a dar, fazer ou não fazer alguma coisa. Essa obrigação, uma vez assumida, toma sentido jurídico e constitui, daí por diante, um ônus cujo cumprimento não deverá deixar de ser realizado. Em síntese, obrigação, na sua mais larga acessão, é uma palavra que exprime qualquer espécie de vínculo ou de sujeição da pessoa, qualquer que seja a sua fonte ou o seu contéudo, nela se podendo englobar por um lado qualquer obrigação que seja ditada pela moral, conveniência, honra, usos sociais, por outro lado qualquer obrigação imposta pelas normas jurídicas, sejam elas de direito público ou privado. A palavra é aqui empregada para designar apenas as da última espécie e não todas elas, mas somente as que nascem de relações entre pessoas, tem um conteúdo patrimonial e implicam para uma pessoa o dever de fazer a outra uma prestação e, para essa segunda pessoa, a faculdade de a exigir da primeira. Em sentido técnico, pois, a obrigação, como a correspondente obligatio da terminologia romana, exprime em regra principal e geral a relação 1

jurídica pela qual uma pessoa (devedor) está adstrita a uma determinada prestação para com outra (credor), que tem direito de a exigir, obrigando a primeira a satisfazê-la. A noção dada pelo direito moderno da relação obrigatória não difere, nas suas linhas gerais, daquela que foi maravilhosamente construída pelos jurisconsultos romanos. Nesta matéria, mais do que em qualquer outra do direito privado, as doutrinas romanas conservaram toda a sua vitalidade, de modo que não é possível compreender grande parte das normas atuais sem o subsídio dos precedentes romanos. Isto não quer dizer que a matéria não tenha sofrido modificações por influência do direito intermédio, às vezes muito profundas (2). Desapareceu o rigoroso formalismo que impedia à vontade criar vínculos sem a observância de formas solenes ou determinadas; a princípios mais restritivos, substituiu-se o novo, em virtude do qual é decisiva, para a nascença da obrigação, a vontade, manifestada pelo modo vulgar e o simples consenso; também se modificou profundamente o outro princípio, sempre seguido escrupulosamente pelos romanos, segundo o qual a obrigação nunca tinha por efeito transmitir ou constituir direitos reais, pois pelo princípio moderno, que admite a aquisição dos direitos reais por simples consenso, há em muitas relações contratuais (como os contratos de alienação) uma combinação do efeito obrigatório com o efeito real e uma obliteração da distinção entre o título e o modo de aquisição. Mas, substancialmente, o conceito é ainda o romano. Existem dois que ficaram célebres. Um é lembrado por Justiniano (pr. Inst. 3. 13): obligatio est juris vinculum quo necessitate adstringimur alicujus solvendae rei secundum nostrae civitatis jura, onde (à parte as últimas palavras, que revelam a influência do escritor clássico) a relação entre devedor e credor é caracterizada como um vinculum juris, tendo por conteúdo uma prestação (alicujus solvendae rei) e como natureza intrínseca a coercibilidade (necessitate adstringimur). A outra é de Paulo (fr. 3 pr. D. 44, 7): obligationem substantia non io eo consistit, est aliquod corpus nostrum aut servitutem nostram faciat, sed ut alium nobis obstringat ad dandum aliquid vel faciendum vel praestandum, que exprime ao mesmo tempo a mais nítida contraposição entre os direitos reais e os direitos de obrigação e descreve com mais precisão o conteúdo e o objeto do vínculo. A essência ou substância da obrigação é não já aquela de fazer adquirir um direito real, mas sim a de constituir um vínculo entre duas pessoas, e o fato de hoje qualquer obrigação não ter eficácia real não tira o valor das palavras do jurisconsulto, apenas querendo dizer que o efeito real, no direito moderno, pode combinar-se com o obrigatório e é este o que na relação de obrigação nunca falta. O vínculo tem por objeto uma prestação, que pode consistir ou num dare (que romanamente significa transmissão de propriedade), ou num facere, que 2

compreendendo também o non facere abraça qualquer espécie de fato, ato ou omissão, ou num praestare, no qual se englobam prestações particulares que não entram nas duas categorias e geralmente são responsabilidades vulgarmente acessórias de outras obrigações principais (3). O direito das obrigações é que trata dessa matéria, onde se estuda o conteúdo do compromisso - obrigação, na terminologia jurídica - assumido pelo indivíduo, a sua formação, os modos como pode ser satisfeito, o tempo de sua duração. Em princípio, esse direito é de caráter geral e, desse modo, afeta aos comerciantes e aos não comerciantes e dado às características próprias das atividades comerciais, muitas vezes as regras gerais sofrem o impacto da realidade mercantil e são a elas amoldadas e nisto reside a diferença entre obrigações civis e obrigações comerciais. 2 –INTRODUÇÃO. Para Maria Helena DINIZ (4) é de grande importância o direito das obrigações nos dias atuais, ante a freqüência de relações jurídicas obrigacionais. E não é para menos, o homem moderno vive numa "sociedade de consumo", onde os bens ou novos produtos da tecnologia hodierna lhe são apresentados mediante uma propaganda tão bem elaborada, que o leva a sentir necessidades primárias ou voluptuárias nunca antes experimentadas, como, por exemplo a de substituir um carro novo por um "zero km"que, embora supérfluo, virá satisfazer um anseio de status. A ânsia de atender aos mais variados requintes de bem-estar e de vaidade transforma-o num autômato, que age em função de seus desejos e ambições, justificáveis ou artificiais, fazendo-o desenvolver uma atividade econômica intensa. Essa intensificação da atividade econômica, provocada pela urbanização, pelo progresso tecnológico, pela comunicação permanente, causou grande repercussão nas relações humanas, que por isso precisaram ser controladas e regulamentadas por normas jurídicas, que compõem o direito das obrigações. Realmente, é na seara do direito creditório que a atividade econômica do homem encontra sua ordenação, visto que esse ramo do direito civil tem por escopo equilibrar as relações entre credor e devedor, mediante as quais o indivíduo exerce seu direito de contrair certas obrigações para atender às suas necessidades, buscando os bens e os serviços que lhe dêem satisfação. É indubitável que o direito das obrigações intervém na vida econômica não só na produção (compra de matéria-prima; associação da técnica e da mão-de-obra ao capital, mediante contrato de trabalho ou de locação de serviço; reunião do capital da empresa por meio de contrato de sociedade etc...), mas também no consumo de bens (por meio de compra e venda, de troca etc...) e na distribuição ou circulação (mediante contratos de venda, feitos aos armazenistas ou

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revendedores. Conclui-se que o direito das obrigações constitui a base não só do direito civil, mas de todo direito. 3 – CONCEITO DE OBRIGAÇÃO. O termo obrigação contém vários significados, o que dificulta sua exata delimitação na seara jurídica, vez que o nosso Código Civil escusou-se em definir. O recurso à etimologia é bom subsídio: obrigação, do latim ob + ligatio, contém uma idéia de vinculação, de liame (5), de cerceamento da liberdade de ação, em benefício de pessoa determinada ou determinável (6). Na linguagem corrente, obrigação corresponde ao vínculo que liga um sujeito ao cumprimento de dever imposto por normas morais, religiosas, sociais ou jurídicas (7). Para Pothier, é a obrigação "um vínculo de direito que nos subordina a respeito de outrem a dar-lhe alguma coisa ou a fazer ou não fazer alguma coisa" (8). Muito extenso, Clóvis BEVILACQUA definiu a obrigação como "a relação transitória de direito, que nos constrange a dar, fazer ou não fazer alguma coisa, em regra economicamente apreciável, em proveito de alguém que, por ato nosso ou de alguém conosco juridicamente relacionado, ou em virtude da lei, adquiriu o direito de exigir de nós essa ação ou omissão"(9). Deste, aproximado é o Prof. Washington de Barros MONTEIRO(10): "obrigação é a relação jurídica, de caráter transitório, estabelecida entre devedor e credor, e cujo objeto consiste numa prestação pessoal econômica, positiva ou negativa, devida pelo primeiro ao segundo, garantindo-lhe o adimplemento através de seu patrimônio". Savigny (11), por exemplo, minucioso e frio, ensina: "A obrigação consiste na dominação sobre uma pessoa estranha, não sobre toda a pessoa (pois que isto importaria em absorção da personalidade), mas sobre atos isolados, que seriam considerados como restrição à sua personalidade, ou sujeição à nossa vontade". Caio Mário da Silva Pereira (12), preleciona que: "obrigação é o vínculo jurídico em virtude do qual uma pessoa pode exigir de outra uma prestação economicamente apreciável". Depreende-se portanto, que a obrigação é a conseqüência de um ato nascido da vontade de uma ou mais pessoas, ou que viole a lei ou os bons costumes. Em virtude desse ato, alguma ou algumas pessoas ficam no dever de dar, fazer ou não fazer alguma coisa em favor de outro ou de outros. Assim, quando alguém, em decorrência de ato anterior, se constitui no dever de dar, fazer ou não fazer alguma coisa em favor de outrem, a relação jurídica existente entre essas duas pessoas, que constrange a primeira a realizar a prestação e faculta a segunda a exigí-la, tem o nome de obrigação. 3.1 - CONCEITO DE OBRIGAÇÃO NO DIREITO COMPARADO. BaudryLACANTINERIE (13), jurista francês citado por Pietro BONFANTE (14) define que: "l’obbligazione, nel senso giuridico della parola, può essere definita un

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vincolo di diritto pel quale una o più persone determinate sono civilmente tenute verso una o più persone, egualmente determinate a dare, fare, o non fare alcuna cosa. Cfr. Articolo 1.101 (Codice civile italiano articolo 1.098). L’effeto dell’obbligazione, abbiamo detto, è di vincolare una o più persone verso una o più altre, a dare, a fare, o non fare alcuna cosa. Queste espressioni sono riprodotte dall’articolo 1.101. La parola dare, come la corrispondente latina significa qui trasferire la proprietà. Obbligarsi a dare, è dunque obbligarsi a trasferire la proprietà di una cosa. Una obbligazione suppone necessariamente due persone almeno: l’una che è vincolata, è il soggetto passivo dell’obbligazione, il debitore; l ‘altra a vantaggio della quale esiste il vincolo, è il soggetto attivo dell’obbligazione, il creditore.L’obbligazione ha dunque due faccie, secondo che si considera in rapporto al debitore o in rapporto al creditore. Per il primo, del quale essa restringe la libertà sottoponendola ad una necessità giuridica, essa costituisce un onere; si chiama allora obbligazione passiva o debito; essa figura al suo patrimonio come una quantità negativa, per conseguenza nel passivo. Per il secondo, il creditore, l’obbligazione costituisce un diritto; essa aumenta il suo patrimonio, nel quale si pone all’attivo, e si chiama credito ovvero obbligazione attiva ". Louis JOSSERAND (15) define que "l’obligation, ou droit personnel, est un rapport juridique qui assigne, à une ou à plusieurs personnes, la position de débiteurs, vis-à-vis d’une ou de plusieurs autres, qui jouent le rôle de créanciers et envers lesquelles elles son tenues à une prestation positive (obligation de donner ou de faire) ou négative (obligation de ne pas faire): visagée du côté du créancier, l’obligation est une créance; considérée du côté du debiteur, elle est une dette. Parfois, l’obligation est envisagée uniquement sous ce second aspect; on dira, en ce sens, que telle personne est tenue de telles obligations envers telle autre. Dans la pratique notariale, on rencontre une troisième acception qui n’est point encommandable: l’obligation devient l’écrit même, l’instrumentum qui est dressé pour constater la naissance du contrat e des rapports juridiques qui en découlent; en ce sens, on dit que le notaire rédige une obligation". 4 – AS REGRAS DO DIREITO CIVIL E AS OBRIGAÇÕES COMERCIAIS. Regem a matéria das obrigações, de modo geral, as normas do direito civil. De fato, os princípios relativos a esse vínculo, que faz com que a pessoa se veja constrangida a dar, fazer ou não fazer alguma coisa a favor de outrem, são regras comuns, do âmbito do direito comum - e, portanto, aplicáveis a todas as pessoas - , que é o direito civil. Valdemar FERREIRA (16) entende que "não difere, com efeito, essencialmente, a obrigação comercial da civil. Não se distingue a 5

relação jurídico-comercial de qualquer outra. A essência é sempre a mesma": É assim porque, "em verdade, o comerciante outro não é senão a mesma pessoa, natural ou jurídica, apta para o exercício de direitos e obrigações de ordem privada, a praticar, habitual e profissionalmente, a atividade mercantil". Isso significa que o que distingue essencialmente o comerciante do não comerciante é a atividade profissional. Enquanto aquele tem por profissão o exercício de atos de intermediação, com intuito de lucro, o não comerciante não exerce essas atividades de maneira profissional. E por tal razão possui o comerciante regras jurídicas próprias para o exercício de sua atividade profissional - regras que constituem o direito comercial -, enquanto que os não comerciantes têm as suas atividades regidas pelo direito comum, isto é, o direito civil. No tocante às obrigações , entretanto, não há regras próprias para os que exercem profissionalmente atividades mercantis e os que não a exercem. Se bem que o direito comercial - ou seja, o direito que regula as atividades profissionais dos comerciantes e os atos de comércio - e o direito civil - o direito que regula as atividades dos não comerciantes ou dos que são comerciantes, quando estiverem estes a praticar atos que não sejam próprios de sua profissão - sejam dois ramos diversos do direito privado, as regras legais concernentes às obrigações são comuns a comerciantes ou não. Ou, como sentencia Valdemar FERREIRA (17) "não é o direito civil... direito comum a comerciantes e não comerciantes. O que a uns e outros é comum é o direitodas obrigações" (18). 5. DISPOSITIVOS DO CÓDIGO COMERCIAL RELATIVOS ÀS OBRIGAÇÕES. O Código Comercial possui vários dispositivos referentes às obrigações. Normalmente, tais dispositivos deveriam constar da lei civil, já que o direito das obrigações é comum a comerciantes e a não comerciantes. Há, contudo, motivos que justificam a inclusão dessas regras no Código Comercial. Em primeiro lugar, ao ser este promulgado, não possuíamos ainda um Código Civil, como aconteceu na França, em que a codificação civil foi anterior à comercial. Regíamo-nos, nessa época, pelas Ordenações e leis esparsas de Portugal e do Brasil-Império. Sendo elaborado um Código Comercial, natural era fossem no mesmo incluídas regras jurídicas que não constavam da nossa desordenada legislação civil de então. Em segundo lugar, apesar de ser o direito das obrigações um só, tanto para os civis como para os atos de natureza comercial, inegável é que, nas obrigações comerciais, muitas vezes os usos e costumes do comércio introduziram inovações dignas de nota. O próprio artigo 121 do Código estabelece que às obrigações comerciais se aplicam as regras e disposições do direito civil, "com as modificações e restrições estabelecidas neste código". Assim, a lei não apenas reconhece como aceita essas modificações e restrições. E, por se tratar de normas específicas relativas ao comércio, natural é

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que fossem compendiadas na lei comercial. Referem-se, de modo geral, às obrigações e aos contratos comerciais os artigos 121 a 139 do Código. A partir do artigo 140 encontramos regras especiais para alguns tipos de contratos. Os artigos 428 a 456, que constituem os títulos XVII e XVIII da 1a parte do Código, também dizem respeito às obrigações. O primeiro desses títulos, n.º XVII, que compreende os artigos 428 a 440, trata dos modos por que se dissolvem e extinguem as obrigações comerciais, e o segundo, de n.º XVIII, que vai dos artigos 441 a 456, contém normas relativas à prescrição. A leitura e aplicação dos dispositivos do Código que se referem às obrigações comerciais devem ser feitas com cuidado. Necessário será ao estudioso averiguar onde há uma regra geral e onde se trata de uma norma modificadora dessa regra, específica do direito comercial. Em princípio, as normas de caráter geral devem ser interpretadas de acordo com os atuais dispositivos do direito civil, já contidos no Código Civil, já legislados posteriormente a este. Só as regras que modificam a norma geral é que devem prevalecer para aplicação específica ao direito comercial (19). 5.1 DISTINÇÕES ENTRE O DIREITO COMERCIAL E O DIREITO CIVIL – CONSIDERAÇÕES RELEVANTES. Esses princípios tomam importância maior devido à complexidade da atividade econômica, que, para o direito comercial, como que compensa o aparente esvaziamento do seu campo de atuação, ocasionado pela migração dos seus institutos para o direito civil. Esse fenômeno, que Broseta PONT (20) encara sob dois ângulos, o progressivo robustecimento e a maior complexidade do exercício profissional de certas atividades econômicas, levando pelo lado quantitativo, portanto, nos atos praticados em massa, à repercussão no status dos empresários e nos contratos, e pelo lado qualitativo pressupondo uma organização, que é a empresa, evidentemente que restaura, por assim dizer, a grandeza do direito comercial, restituindo-lhe, com as transformações havidas, um campo perfeitamente delimitado de atuação, que pode ser regido não apenas por normas específicas, mas também orientadas por princípios próprios. A propósito, assinalava Carvalho de MENDONÇA (21), a respeito do problema no direito brasileiro, que "as diferenças que subsistem (após a unificação do processo) entre o direito civil e o direito comercial nada tem de essencial. Bem poderíamos fundir as matérias que lhes são comuns, isto é, os contratos e obrigações e ainda a falência, estendendo-a, oportunamente, aos nãocomerciantes. Como muito bem acentua o Prof. Oscar BARRETO FILHO (22) "não são apenas as diferenças de estrutura, de critérios de pesquisa e de método que devem ser consideradas, em relação ao tema da autonomia do direito comercial. Pode até acontecer que, formalmente, não haja diferença estrutural entre um negócio jurídico 7

celebrado para obter o gozo de um bem e outro negócio jurídico visando à obtenção de bens para o mercado, mas, substancialmente, há uma diferença fundamental de posições. A satisfação das necessidades do mercado exige não só uma organização especializada e diferençada, como também reclama uma instrumentação técnica, e, ainda mais, uma atividade criadora que não existe na vida civil comum. Na atividade mercantil, as relações econômicas apresentam-se, e são reguladas tendo em vista sua atuação dinâmica, não sua posição estática". 6. OBRIGAÇÕES CIVIS E OBRIGAÇÕES COMERCIAIS. Esse fato nos leva a indagar se realmente existem obrigações civis e obrigações comerciais. Carvalho de MENDONÇA (23) notou que é comum a expressão obrigação comercial no sentido de contrato comercial. Inegavelmente, a obrigação é uma só, sendo diversos apenas os atos que deram lugar ao nascimento dessa obrigação. Poderão esses atos ser de natureza civil ou de natureza comercial. Quando de natureza civil, diz-se, comumente, que as obrigações deles decorrentes são obrigações civis; quando comercial, chama-se a conseqüência do ato de obrigação comercial. Deve-se, desse modo, entender a expressão obrigação comercial como sendo a obrigação que resulta de um ato de natureza comercial; civil será a obrigação resultante de um ato de natureza civil (24). Para Maria Helena DINIZ (25) na obrigação civil há um vínculo jurídico que sujeita o devedor à realização de uma prestação positiva ou negativa no interesse do credor, estabelecendose um liame entre os dois sujeitos, abrangendo o dever da pessoa obrigada (debitum) e sua responsabilidade em caso de inadimplemento (obligatio), o que possibilita o credor recorrer à intervenção estatal para obter a prestação, tendo como garantia o patrimônio do devedor. A obrigação civil, portanto, no caso de inexecução, possibilita que o devedor seja constrangido ao seu adimplemento. Se o devedor (ou alguém por ele) cumprir voluntariamente a obrigação, o credor terá o direito de recebê-la, a título de pagamento, por gozar da soluti retentio; porém, se o devedor for inadimplente, o credor está autorizado a exigir judicialmente o seu cumprimento e a executar o patrimônio do devedor, se este insistir em não cumpri-la. 7. ESPECIALIZAÇÃO DA OBRIGAÇÃO COMERCIAL. Se, em regra geral, a obrigação é uma só, decorra de atos de natureza civil ou comercial, inegável é que as resultantes dos atos comerciais sofrem a influência deles e, por isso mesmo, em determinados aspectos divergem das obrigações civis. Sabe-se que o direito comercial tem características próprias, que tratam justamente o dinamismo do comércio, em contraste com a posição conservadora, de certo modo estática, dos atos de natureza civil. Assim, enquanto o direito civil é um direito tradicional, preso a antigas regras, de lenta evolução, o 8

direito comercial, para atender às exigências do desenvolvimento do comércio, é um direito que se renova a cada instante, rescindindo, quando necessário, de fórmulas solenes, adaptando-se ao progresso e, de certa forma, procurando acompanhar as contingências econômicas dos diversos povos. E porque as relações comerciais exigem prontas soluções para fatos que surgem a cada momento, o direito mercantil procura dar ao comerciante maior elasticidade de ação, mais ampla liberdade, mais facilidade para que os casos surgidos sejam resolvidos com a rapidez que as transações comerciais requerem.Caracteriza-se, assim, o direito comercial, como já anteriormente refrisado, pela simplicidade de suas fórmulas, pela internacionalidade de suas regras e institutos, pela rapidez de sua aplicação, pela elasticidade dos seus princípios e também pela onerosidade de sua operações. Dentro desse sentido, distancia-se grandemente o direito comercial do civil, em regra formalístico, nacional, lento, restrito. Esses princípios característicos, necessários para que o direito comercial possa acompanhar a permanente evolução do comércio, não poderiam deixar de se refletir nas obrigações resultantes dos contratos comerciais. Estes e aquelas, em muitos casos, fogem à regra geral prescrita no direito civil para adotar soluções próprias, condizentes com os atos de que se originaram, de natureza comercial. Assim, por exemplo, as obrigações resultantes dos atos de natureza cambiária, comerciais por força da lei, fogem, em geral, às normas estatuídas pela legislação civil. Esclarece Valdemar FERREIRA (26) que "destinada a obrigação mercantil a facilitar o problema circulatório da riqueza, não podia, em geral, acomodar-se às formas hieráticas e solenes dos contratos civis. Nem o processo, para torná-las eficazes, poderia ser amplo e severo como o civil". A simples assinatura de uma pessoa em uma letra de câmbio dá-lhe responsabilidade solidária pelo pagamento de referida letra, sem que lhe seja permitido indagar se a origem desse título foi ou não revestida das formalidades legais. Ainda mesmo que o título seja imediatamente transferido a terceiro, perdura a obrigação daquele que o possuiu e nele após o seu nome. Também os usos e costumes comerciais influenciam a obrigação que resulta de ato mercantil. Se, por acaso, em determinada praça de comércio há um costume geralmente seguido por todos os comerciantes, esse costume influi sobre a obrigação comercial, fazendo com que esta a ele se adapte, muito embora não esteja o uso amparado pela lei ou, mesmo, aparentemente, esteja contra os princípios da lei. 8 .CONCLUSÃO. O Direito das Obrigações exerce grande influência na vida econômica, uma vez que conforme já infirmado regula relações da infra-estrutura social, dentre as quais se salientam, por sua 9

relevância política, as de produção e as de troca. É através de relações obrigacionais que se estrutura o regime econômico, sob formas definidas de atividade produtiva e permuta de bens. Tanto basta para atestar sua importância no conjunto das normas constitutivas da ordem jurídica. O funcionamento de um sistema econômico prende-se à sua disciplina jurídica, variando conforme o teor e a medida das limitações impostas à liberdade de ação dos particulares (27). Em síntese, o direito das obrigações consiste num complexo de normas que regem relações jurídicas que afetam aos comerciantes e aos não comerciantes e dado às características próprias das atividades comerciais e isso é a pedra fundamental entre obrigações civis e obrigações comerciais - diferenças. NOTAS DE RODAPÉ: (1) MARTINS, Fran. Contratos e Obrigações Comerciais, 2a ed., Edição Universitária, p. 03. (2) Cfr SALVIOLI, Storia del diritto italiano, Turim, 1921, parágrafos 610 e segs; SOLMI, Storia del diritto italiano, parágrafos 72 e segs., 131 e segs. (3) RUGGIERO, Roberto de. Instituições de Direito Civil, v. 3o, p. 7/10. (4) DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, v. II. (5) GIORGI, Obbligazioni, I, nº 49 (6) PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil, v. II, p. 2. (7) SOUZA, Ernani Vieira de. Obrigação in Enciclopédia Saraiva do Direito, v.55, p. 265 (8) POTHIER, Tratado de las obligaciones, Ed. Atalaya, Buenos Aires, 1947. (9) BEVILÁQUA, Clóvis. Direito das Obrigações, 5a ed., Liv. Ed. Freitas Bastos, Rio de Janeiro, 1940, p. 14. (10) BARROS MONTEIRO, Washington de. Curso de Direito Civil, v. IV, p. 12. (11) SAVIGNY, Le Obbligazioni, parágrafo 2, p. 8.

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(12) PEREIRA, Caio Mário da Silva. Ob. e v. cits, v. II, p. 5. (13) BAUDRY-LACANTINERIE, G. Trattato Teorico-Pratico Diritto Civile delle Obbligazioni, p. 1 (14) BONFANTE, Pietro. Trattato Teorico-Pratico Diritto Civile delle Obbligazioni, p. 1. (15) JOSSERAND, Louis. Cours de Droit Civil Positif Français, 3a ed., 2o v., p. 2. (16) FERREIRA, Valdemar. Instituições de Direito Comercial, 4a ed., 3o v., t. I. (17) FERREIRA, Valdemar. Instituições de Direito Comercial, 4a ed., 3o v., t. I. (18) MARTINS, Fran, ob. e v. Cits., p. 7. (19) MARTINS, Fran, ob. e vol. Cits., p. 8 (20) PONT, Manuel Broseta. La Empresa, La Unificación del Derecho de Obligaciones y el Derecho Mercantil. Madrid, Ed. Techos, 1.965 (21) MENDONÇA, de Carvalho. Brasileiro, v. VI, 1a parte, n. 258

Tratado

de

Direito

Comercial

(22) BARRETO FILHO, Oscar. Direito Comercial. 2o ano, 2o fascículo, ed. XI de Agosto. (23) Ob. cit. (24) MARTINS, Fran. Ob e vol. cits., p. 10. (25) DINIZ, Maria Helena. Ob e vol cits., p. 62. (26) FERREIRA, Valdemar, ob e vol. cits., p. 7. (27) GOMES, Orlando. Obrigações, p. 4. 9. BIBLIOGRAFIA MARTINS, Fran. Contratos e Obrigações comerciais. 2a Ed., Rio de Janeiro, Editora Forense, 1.990. FIÚZA, César. Direito Civil Curso Completo.1a edição, Belo Horizonte, Livraria Del Rey Editora, 1.998.

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DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. Teoria Geral das Obrigações,10a Edição, 2o volume, São Paulo, Editora Saraiva, 1.996. BEVILÁQUA, Clóvis. Código Civil Comentado. volumes. 3 e 4. MENDONÇA, Carvalho de. Introdução aos direitos reais. Rio de Janeiro, 1.915. PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. 15a edição, 2o volume, Rio de Janeiro, Editora Forense, 1.997. BAUDRY-LACANTINERIE, G. Trattato Teorico-Pratico Diritto Civile delle obbligazioni -, 1o volume, Casa Editrice Dottor Francesco Vallardi, Milano. GOMES, Orlando. Obrigações. 8a edição, Rio de Janeiro, Editora Forense, 1988. RUGGIERO, Roberto de. Instituições de Direito Civil. 6a edição, 3o volume, Lisboa, Livraria Clássica Editora, 1.937. JOSSERAND, Louis. Cours de Droit Civil Positif Français. 3a edição, 2o volume, Paris, Editora Librairie du Recueil Sirey, 1.939. BULGARELLI, Waldirio. Direito Comercial. 9a edição, São Paulo, Editora Atlas, 1.992. PONT, Manuel Broseta. La Empresa, La Unificación del Derecho de Obligaciones y el Derecho Mercantil. Madrid, Ed. Techos, 1.965. BARRETO FILHO, Oscar. Teoria do Estabelecimento Comercial, 1.969. FERREIRA, Waldemar. Instituições de Direito Comercial, volume I, 1.951

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