Volume 03 - 56

  • December 2019
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56

EXERCÍCIO

MEDICINA,

ARTE

ILEGAL

DA

DENTÁRIA

OU

FARMACÊUTICA

____________________________ 56.1 CONCEITO, OBJETIVIDADE JURÍDICA E SUJEITOS DO CRIME O art. 282 do Código Penal contém o seguinte tipo: “exercer, ainda que a título gratuito, a profissão de médico, dentista ou farmacêutico, sem autorização legal ou excedendo-lhe os limites”. A pena é detenção de seis meses a dois anos. A proteção da norma dirige-se à saúde pública. Sujeito ativo é qualquer pessoa, e em relação à segunda parte da norma, só o médico, dentista ou farmacêutico. Sujeito passivo é o Estado.

56.2 TIPICIDADE 56.2.1 Conduta, elementos objetivos e normativos O tipo descreve duas condutas distintas. A primeira é exercer a profissão de médico, dentista ou farmacêutico, sem autorização legal. Exercer uma profissão é praticar de forma constante ou reiterada suas atividades próprias. É desempenhar as funções inerentes à profissão. As profissões de médico, dentista e farmacêutico encontram-se regulamentadas em lei e só podem exercê-las as pessoas que tiverem a autorização do órgão competente, que são os conselhos regionais, de medicina, odontologia e farmácia. Na legislação específica é que se encontram as normas atinentes não só ao exercício da profissão, mas também sobre as atividades privativas de cada profissional.

2 – Direito Penal III – Ney Moura Teles A Lei nº 3.268, de 30-9-57, dispõe sobre os Conselhos de Medicina e foi regulamentada pelo Decreto nº 44.045/58. A Lei nº 5.081, de 24-8-66, regula o exercício da odontologia, e a Lei nº 4.324, de 14-4-64, instituiu os Conselhos de Odontologia. A Lei nº 9.120, de 26-10-95, alterou vários dispositivos da Lei nº 3.820/60, que instituiu os Conselhos de Farmácia. Exerce a profissão de médico quem atende pessoas apresentando-se como médico, examinando-as, prescrevendo medicamentos, recomendando a realização de exames, realizando cirurgias, mantendo consultório aberto ao público ou atuando em estabelecimento, público ou privado, enfim, praticando atos inerentes à profissão de médico. Exerce a profissão de dentista aquele que se apresenta como tal, tratando das moléstias que acometem os dentes, prescrevendo medicamentos ou promovendo intervenções cirúrgicas etc. A profissão de farmacêutico diz respeito com a preparação de medicamentos, a manipulação de substâncias visando à criação de produtos com fins terapêuticos ou medicinais. Não se confunde com a profissão de vender remédios. Aquele que exercer uma dessas profissões sem que esteja previamente habilitado legalmente, autorizado, portanto, para o exercício da profissão, e mesmo quando já tenha concluído o respectivo curso de graduação, realizará a conduta típica. A habilitação legal para o exercício da profissão é o registro no órgão competente, não o diploma, que é requisito daquele. Já a falta de registro em órgão estadual constitui mera irregularidade, quando o médico, dentista ou farmacêutico tenha registro em outro órgão de outro estado ou o federal. Não comete o crime a parteira que exerce sua atividade, porque a simples realização de parto não constitui exercício de medicina. A segunda modalidade típica é exercer a profissão excedendo seus limites. É crime próprio do médico, dentista ou farmacêutico. O exercício de cada uma dessas profissões encontra limitações nas normas legais e regulamentares próprias, daí que o profissional não pode extrapolar, realizando atos para os quais não se encontra devidamente habilitado. Costuma-se dizer que comete o crime o médico que manipula substâncias com vista na preparação de medicamento, atividade própria de farmacêutico, e o dentista que realiza intervenção cirúrgica, ainda que na boca, atividade própria do médico, ou o farmacêutico que prescreve medicamentos para o paciente, substituindo-se ao médico.

Exercício Ilegal da Medicina, Arte Dentária ou Farmacêutica - 3 A realização do tipo exige habitualidade no exercício da medicina, arte dentária ou farmacêutica. Assim, quem recomenda a alguém o uso de determinado medicamento, para a cura de determinada moléstia, uma única vez ou algumas vezes, esporadicamente, não comete o crime. O crime é de perigo abstrato. Não precisa ser demonstrado, nem ter existido, porque há presunção da norma. Desnecessário, assim, que tenha ocorrido a situação de perigo, bem como qualquer dano à saúde de alguém. Modernamente, as profissões de médico e dentista tendem, cada vez mais, à especialização. Cirurgia cardiovascular, cirurgia plástica, neurocirurgia, obstetrícia, pediatria, neuropediatria etc. Enfim, a medicina torna-se cada vez mais especializada. O mesmo vem ocorrendo com a odontologia. De se perguntar: o médico cardiologista que se apresenta como cirurgião plástico, anunciando-se para a comunidade como apto a realizar cirurgia estética ou reparadora, estaria realizando o tipo do art. 282, por exercer a profissão de médico “excedendo-lhe os limites”? A resposta há de ser negativa enquanto não houver, no ordenamento, normas que restrinjam ou imponham limites às atividades de médico especialista. É necessário que, para a proteção da saúde pública, apenas os especialistas possam exercer as atividades próprias de sua especialidade.

56.2.2

Elemento subjetivo

É crime doloso. O agente, na primeira modalidade típica, atua com consciência de que não está habilitado para exercer a profissão, sabendo que não está autorizado pelo órgão respectivo. E deve agir com vontade livre de exercer a profissão ilegalmente. Não age com dolo o médico graduado e habilitado no exterior que, vindo para o país, passa a exercer a medicina sem obter o prévio registro. Há erro de tipo, que exclui o dolo. Na segunda modalidade típica, o médico, dentista ou farmacêutico deve saber que excede os limites impostos para o exercício de sua profissão e agir com vontade livre de excedêlos, sem qualquer outra finalidade.

56.2.3

Consumação e tentativa

A consumação ocorre quando o exercício da profissão seja considerado habitual, o que

4 – Direito Penal III – Ney Moura Teles vai ocorrer após tempo juridicamente relevante, com a reiteração dos atos inerentes à profissão que o agente não está autorizado a exercer, ou dos atos que excedem os limites da profissão, quando praticados por médico, dentista ou farmacêutico. Por ser crime habitual, não é possível reconhecer-se a tentativa.

56.2.4

Forma qualificada

Quando o agente realiza a conduta típica com a finalidade de obtenção de lucro, ainda que não o obtenha efetivamente, além da pena privativa de liberdade será aplicada a pena de multa. É o que determina a norma do parágrafo único do art. 282.

56.2.5

Formas qualificadas pelo resultado

Dispõe o art. 285 do Código Penal que serão aplicadas ao exercício ilegal da medicina, arte dentária ou farmacêutica as formas qualificadas pelo resultado descritas no art. 258. Se do fato resultar lesão corporal de natureza grave a pena será aumentada de metade. Se resultar morte, será aplicada em dobro. São crimes preterdolosos. Há dolo na realização da conduta e culpa na produção do resultado não desejado nem aceito pelo agente. Se o agente tiver realizado a conduta com a finalidade de causar o resultado mais grave, haverá o crime contra a pessoa, integralmente doloso.

56.3 ILICITUDE E CULPABILIDADE Num país de miséria epidêmica é possível reconhecer a exclusão da ilicitude pelo estado de necessidade nas condutas de quem, em determinadas localidades, pratica, com habitualidade, atos próprios de dentistas e farmacêuticos, quando para salvar de perigo a saúde de pessoas miseráveis, extraindo dentes, prescrevendo medicamentos contra moléstias, distribuindo-os a quem deles necessita ou em situações de urgência ou emergência. A inexigibilidade de conduta diversa, princípio geral de Direito excludente do crime e também da culpabilidade, pode incidir em situações como as descritas e outras em que não se puder exigir do agente conduta diferente da que realiza, mormente quando age por

Exercício Ilegal da Medicina, Arte Dentária ou Farmacêutica - 5 motivo nobre e de solidariedade com pessoas desassistidas pelo poder público.

56.4 AÇÃO PENAL A ação penal é de iniciativa pública incondicionada. A competência é do juizado especial criminal, possível a suspensão condicional do processo penal.

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