Uma Alternativa Para O Marxismo (mirela)

  • November 2019
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ANTÔNIO GRAMSCI: UMA ALTERNATIVA PARA O MARXISMO Osvaldo Luís Golfe

INTRODUÇÃO Depois do desmantelamento da estrutura comunista, assistimos a uma grande crise de ideais, ou, em outras palavras, assistimos a uma crise de utopias, modelos; tais modelos e utopias estiveram presentes em toda a história. As utopias fazem parte das aspirações do humano, dos sonhos, dos desejos, da criatividade; fazem parte da ousadia do humano de pensar o novo; algo diferente, capaz de trazer soluções para os problemas que se apresentam na história. Karl Marx, com certeza teve muitos sonhos, muitas aspirações, pensamentos não concretizados, ou concretizados de forma deturpada. Mas seu grande mérito, penso, está em chamar a atenção para os problemas sociais de seu tempo – a Revolução Industrial e as conseqüências decorrentes... De maneira alguma podemos ignorar um sistema amplo, científico, "esta casa com tantos cômodos" como o marxismo. Porém, um sistema que se propõe ser científico, necessariamente precisa auto-renovar-se. A história caminha, novos pensamentos, novas políticas, novas pessoas, novos problemas surgem... Os grandes ideais não podem cristalizarem-se na história, tornarem-se incapazes de compreender o novo. De certa forma foi isto o que aconteceu com o marxismo depois de Marx. Seu pensamento, "levado ao pé-da-letra", ou deturpado tornou-se obsoleto, rígido, "mumificado", cristalizado na história, de certa forma perdido no tempo... É com este "panode-fundo" que apresentamos o grande pensador italiano Antonio Gramsci. Antônio Gramsci (1891-1937), membro do partido socialista italiano, tornou-se, em 1921, fundador do partido comunista, na Itália. Foi eleito deputado em 1924. Em 1926, Mussolini o coloca no cárcere. Fora condenado a 20 anos de prisão. Devido à precariedade de sua saúde fora levado do cárcere à enfermaria onde falecera alguns dias depois. No cárcere escreve suas obras, das quais a mais importante é Cadernos do Cárcere. Dividimos este estudo em três partes, sucintas frente a amplitude do tema. Na primeira parte, apresentamos alguns conceitos do marxismo tradicional como, conceito de ideologia, materialismo histórico, etc. Na segunda e terceira parte tratamos especificamente sobre o pensamento de Gramsci. Nestas duas partes abordamos alguns conceitos fundamentais do pensador italiano como, sua concepção de ideologia, dialética, hegemonia, filosofia da práxis e um pouco do seu pensamento pedagógico. Difusa nos conceitos está a grande e revolucionária proposta de Gramsci. Percebemos que em sua proposta, analisa conceitos do próprio marxismo tradicional – ideologia, dialética... – de uma forma muito mais ampla, mais abrangente. Desta forma, Gramsci devolve a dinamicidade, a vida, dá uma nova face ao sistema. É revolucionário, em Gramsci, por exemplo, o seu pensamento pedagógico. Parece ser a escola uma instituição com pouco valor no marxismo tradicional. A mudança cultural também é uma mudança social. Neste sentido, a escola tem uma enorme influência na formação das consciências. Por isso uma boa reforma social tem início em uma boa reforma do sistema escolar. Oxalá todos pudessem Ter acesso a um mesmo nível cultural! É esta uma grande utopia que hoje, mais do que nunca, nos provoca.

PARTE I: CONCEITOS FUNDAMENTAIS DO MARXISMO O marxismo, poderíamos compará-lo a um grande tronco de uma grande árvore que tem muitos ramos. Cada corrente de pensamento que se diz de inspiração marxista, significa um ramo desta grande árvore. Assim temos uma infinidade de diferentes leituras deste pensamento. Esta primeira parte pretende ser uma introdução ao pensamento. Isto é a base que nos permitirá uma futura análise. Trabalhamos, na presente parte, uma síntese, objetiva, de alguns principais conceitos do marxismo tradicional, para, em seguida apresentarmos a alternativa apresentada por Antônio Gramsci para o marxismo.

1 – Conceito de Ideologia

Marx trata a respeito de ideologia em "Ideologia Alemã". Nesta obra Marx dirige-se a um grupo específico: os filósofos alemães que vieram depois de Hegel; estes são chamados de "ideólogos alemães" (Feuerbach, R. Strauss. Max Stirner, Bruno Bauer...). Marx dirigi-lhes duas críticas principais. "A primeira é a de que esses filósofos tiveram a pretensão de demolir o sistema hegeliano imaginando que bastaria criticar apenas um aspecto da filosofia de Hegel, em lugar de abarcá-la como um todo. Com isto, as chamadas críticas hegelianas apenas substituíram a dialética hegeliana por uma fraseologia sem sentido e sem consistência (com exceção de Feuerbach). A segunda é a de que cada um desses ideólogos tomam um aspecto da realidade humana, convertem este aspecto numa idéia universal e passam a deduzir todo o real desse aspecto idealizado. Com isto, os ideólogos alemães, além de fazerem o que todo o ideólogo faz (isto é, deduzir o real das idéias desse real), ainda imaginaram estar criticando Hegel e a realidade alemã simplesmente por terem escolhido novas idéias que, como demonstra Marx, não criticam coisa alguma, ignoravam a filosofia hegeliana e, sobretudo, ignoravam a realidade alemã".1O pensamento de Marx tem como ponto de partida o pensamento de Hegel. Porém, no seu desenvolvimento encontramos muitos pontos divergentes, ou também usados com sentido diferente. Exemplo clássico disto são as duas concepções divergentes sobre o "motor da história": Hegel acredita ser as idéias as construtoras e movedoras do mundo; as idéias estão antes dos fatos, dos acontecimentos. Sendo assim, a consciência do homem é anterior à realidade que busca conhecer e transformar. A história poderia ser construída pela ação dos grandes homens, pensadores... Marx inverte este processo, acreditando que as idéias surgem a partir das condições reais vividas por indivíduos reais dentro da história. É o confronto do indivíduo com a vida real, da organização por meio da divisão do trabalho que brotam as idéias. O termo ideologia tem vários sentidos: conjunto de idéias, opinião a respeito de algum objeto em discussão, pensamento de um autor, uma doutrina, "organização sistemática dos conhecimentos destinados a orientar a prática, a ação efetiva".2 De qualquer forma "ideologia", no marxismo tradicional, recebe normalmente um sentido pejorativo. Este sentido aprofundaremos ao longo deste primeiro ponto. Marx não separa a produção das idéias e as condições sociais e históricas nas quais são produzidas. As idéias não estão separadas da vida prática, da história real, concreta feita pela ação dos homens. A "Ideologia" pode ser compreendida como um conjunto de idéias. Este sentido pode ser observado, por exemplo, em uma determinada classe, em um determinado grupo social. Podemos dizer que têm as suas idéias, suas convicções, suas gírias, seus objetivos."Ideologia" pode ser entendida como uma organização sistemática dos conhecimento destinados a orientar uma prática, uma ação efetiva. Este é recurso usado para "vender uma idéia"; isto constitui uma propaganda enganosa. Uma formulação é enganosa quando esconde um segundo objetivo. Os objetivos que se quer alcançar permanecem velados. Neste sentido "ideologia" é uma arma muito poderosa dentro de uma sociedade, capaz de formular, e difundir opiniões nocivas à vida social, que jamais seriam pensadas se não existisse a força da difusão ideológica. Sendo assim, "Ideologia", é uma forma subtil de pensamento que pode trazer conseqüências graves. Por exemplo, um trabalhador, passa a não mais se dar conta da situação em que se encontra, da exploração que está sofrendo, do quanto vale o seu trabalho. A ideologia leva o homem a pensar, sentir, agir de uma maneira conveniente com interesses que permanecem velados.

4.1 – Hegel: Lógica Formal X Lógica Dialética As origens da dialética são anteriores a Hegel, mas nos limitaremos a fazer uma abordagem rápida sobre as origens da dialética, mais em Hegel, pois, é daqui que Marx herda o conceito da dialética para aplicar à sua teoria. Hegel percebe que na lógica formal está implícito o princípio da Identidade, isto é, da não contradição. Isto tem origem já em Parmênides: "o ser é, e, o não ser não é". Uma coisa não pode ser e não ser ao mesmo tempo, sob o mesmo aspecto. Uma coisa se identifica somente com ela mesma; tudo é linear; o que não se encaixa dentro desta linearidade é visto como erro. O pensamento até Hegel está orientado para a linearidade. O real, porém, tem contradições, e, se o nosso pensamento exclui a contradição, então, não "podemos conhecer as coisas em si, mas o nosso próprio conhecimento das coisas", como dizia Kant, por que o nosso instrumento mental não possibilita este conhecimento. O conhecimento está limitado ao formal, à identidade. A realidade não se encaixa dentro disto. Hegel propõe a lógica dialética admitindo a realidade contraditória. A dialética seria a nova forma de pensar, resgatando o que foi excluído anteriormente: a contradição. Em Hegel

a contradição é mais abrangente que a identidade. Sendo assim ela engloba, abrange também a identidade como um momento, uma parte da dialética. Existe a identidade dentro da dialética mas ela é provisória: o ser é movimento. Para Hegel a realidade é o espírito; a realidade física é manifestação do espírito. O mundo físico é uma verdadeira negação do espírito; é o espírito alienado de si mesmo. O Espírito Absoluto subsiste por si mesmo; o espírito alienado de si mesmo, o mundo, é pura emanação do Espírito Absoluto. Entre estas duas realidades (Espírito e espírito alienado) existe um conflito que só será superado por intermédio do homem, através da consciência. À medida que a consciência do homem se desenvolve dentro da história vai ocorrendo a superação da alienação do espírito. Disto surge este esquema:

ESPÍRITO (Afirmação)

MUNDO (Negação)

CONSCIÊNCIA (Síntese)

O mundo é o espírito de forma oposta; é a materialização do espírito, mas sem consciência. O espírito também não reconhece o mundo como sendo parte dele, por isto o mundo é o espírito alienado de si mesmo.

Dentro do mundo está o homem, que por sua vez também é mundo. O homem têm a capacidade de desenvolver a consciência de si mesmo e das coisas: é como se dentro do mundo houvesse uma sementinha do Espírito Absoluto. Esta sementinha é a consciência do homem. O mundo vai se espiritualizando à medida que a consciência cresce. Isto ocorre através da cultura que se desenvolve dentro da história: é a síntese. A síntese é a união daquilo que estava separado, alienado, oposto, contraditório. A partir deste momento a contradição não é mais vista como um erro; a contradição é vista como a essência do desenvolvimento. O processo de desenvolvimento é o movimento triádico descrito acima: afirmação, negação e a negação da negação (nova síntese). Este movimento continua se repetindo infinitamente até chegar o momento em que não haja mais contradições. Este momento é representado por Hegel pelo perfeito desenvolvimento cultural, isto é, cultura desenvolveria tanto que não haveria mais nada para ser explicado. Seria o fim da dialética. Comparando a lógica formal com a lógica dialética temos dois princípios distintos e que tem sua aplicação prática distinta. Por um lado, a lógica formal, tem como base o princípio da não contradição; sempre trabalha com aspectos parciais: analisa as partes. Isto podemos perceber, por exemplo, na medicina quando a preocupação está somente em tratar os efeitos, os sintomas e não se procura a causa de tais efeitos; do ponto de vista da lógica formal o corpo não é visto como um todo mas como partes. Como neste, em muitos outros casos a sociedade se deixa levar unicamente pelo formal, legal; às vezes sabe orientar-se só dentro do pré-escrito. Por outro lado a lógica dialética admite a contradição; já pressupõe uma totalidade (Espírito Absoluto). Assim os fenômenos que ocorrem não são analisados isoladamente (formal). Na medicina, como falamos acima, o tratamento deveria ir em busca da causa de determinada doença. Quando falamos, por exemplo, de desemprego, não podemos entendê-lo como um fato isolado; precisamos analizá-lo como participante de um conjunto que não tem uma única causa e também não tem um único efeito. Muitas coisas são causa e efeito uma das outras. Este segundo modo de ver a realidade parece mais adequado para a modernidade globalizada e holística. 5 – Luta de Classes

O conceito como tal não é de criação de Marx. Desde muito tempo antes de Marx já havia este conceito. Aristóteles na POLÍTICA divide a sociedade em classe pobre, média e rica. "Nesta mesma obra, Aristóteles estabelece relações entre formas de governo e predomínio de certas classes sociais".14 No século XIX o conceito de classe se identifica com o próprio fundamento da sociedade. "O que Marx vai fazer é exatamente dar ao conceito de classe não só uma dimensão científica, mas também atribuir-lhe o papel de base de explicação da sociedade e de sua história".15 A luta de classes, na da teoria marxista, é como um motor poderoso capaz de "dinamizar a história"16. O conflito, a dialética do real que gera o movimento ocorre entre as classes; e, é isto que dinamiza a história. Em toda a história podemos observar este fato. "Segundo Marx, as raízes da evolução social não se situam numa mudança de idéias ou valores, mas nos fatos econômicos e tecnológicos. A dinâmica da mudança é a de uma interação dialética de opostos decorrente de contradições que são intrínsecas a todas as coisas. Marx tirou essa idéia da filosofia de Hegel e adaptou-a à sua análise da mudança social, afirmando que todas as transformações que ocorrem na sociedade provém de suas contradições internas. Considerou que os princípios contraditórios da organização social estão consubstanciados nas classes da sociedade e que a luta de classes é uma consequência de sua interação dialética. Para Marx, a luta de classes é a força propulsora da história. Ele sustentava que todo progresso histórico importante nasce do conflito, da luta e da revolução violenta. O sofrimento e o sacrifício humanos eram um preço que tinha de ser pago para se chegar à mudança social".17 Diz Marx/Engels no Manifesto do Partido Comunista: "A história da sociedade se confunde até hoje com a história das lutas de classes. O homem livre e escravo, patrício e plebeu, senhor e servo, mestre de corporação e companheiro, em outros termos, opressores e oprimidos em permanente conflito entre si, não cessam de se guerrearem em luta aberta ou camuflada, luta que, historicamente, sempre terminou numa restruturação revolucionária da sociedade inteira ou no aniquilamento das classes em choque".18 As relações entre os homens resultam das relações de oposição, antagonismo, exploração e complementariedade entre as classes sociais. Há uma relação de exploração entre a classe dos proprietários, a burguesia, e a dos trabalhadores – o proletariado – porque a posse dos meios de produção, sob a forma legal de propriedade privada, faz com que os trabalhadores, para assegurar a sobrevivência, tenham que vender sua força de trabalho ao empresário capitalista, o qual se apropria do produto do trabalho de seus operários. Estas relações são também de oposição e antagonismo, porque os interesses de classe são inconciliáveis. O capitalista deseja preservar seus direitos, isto é, a propriedade dos meios de produção e a máxima exploração do trabalho do operário. Isto acontece seja através da redução dos salários ou ampliando a jornada de trabalho. O trabalhador, por sua vez, procura diminuir a exploração ao lutar por menor jornada de trabalho, melhores salários e participação nos lucros. Por outro lado, as relações entre as classes são complementares, pois uma só existe em relação à outra. Só existem proprietários porque há uma massa de despossuídos cuja única propriedade é sua força de trabalho, que precisam vender para assegurar a sobrevivência. As classes sociais são, pois, complementares e interdependentes. A Luta de Classes, a divisão, sempre existiu durante toda a história. Na antiga Roma encontramos os patrícios, cavaleiros, plebeus, escravos. Na Idade média encontramos as figuras do senhor, dos vassalos, servos... A nossa sociedade moderna (sua estrutura) está fundamentada em toda a história. O que vemos hoje na sociedade é que ela está se dividindo cada vez mais em duas grandes classes, dois grandes grupos (Burguesia moderna e Proletariado19), opostos que lutam entre si: classe rica e classe pobre. Estes dois grupos, um domina, outro é dominado; uma classe é opressora e outra oprimida, seja pelas armas da ideologia ou pela repressão. O que importa é manter-se no domínio.

A História do homem é, segundo Marx, a história da "luta de classes", uma luta constante entre interesses opostos, embora nem sempre se manifeste socialmente sob a forma de guerra declarada. As divergências, as aposições e antagonismos de classes estão implícitos em todas as relações sociais, nos mais diversos níveis da sociedade, em todos os tempos, desde o surgimento da propriedade privada. A burguesia é uma classe proveniente da decadência feudal. Esta gerou uma outra classe; desta mesma forma que o feudalismo gerou a burguesia, assim também a burguesia moderna gerou uma classe: os proletários. O próprio feudalismo gerou uma classe que foi a sua ruína: "Assim como para o Senhor Feudal foi inútil defender os direitos feudais diante daquela sua criatura que era a burguesia, agora também é inútil para a burguesia trabalhar em prol da conservação de seus direitos sobre o proletariado. A realidade é que a burguesia não apenas fabricou as armas que a levarão à morte, mas também gerou os homens que empunharão aquelas armas: os operários modernos, os proletários".20

II PARTE

ANTÔNIO GRAMSCI Nesta segunda parte deste estudo enfocamos o pensamento de Antônio Gramsci. Queremos dar maior acento a alguns principais conceitos, pois entendemos que neles aparece uma nova leitura, uma crítica sutil do marxismo, segundo o pensados que nos propomos a estudar.

2 – Conceito de Ideologia em Antônio Gramsci O tema da "ideologia" é um tema muito conturbado dentro da teoria marxista. O marxismo tradicional usa este termo em sentido pejorativo. Gramsci resgata, além do pejorativo, um sentido positivo para este termo. Portanto, Gramsci trata deste assunto sob dois aspectos. Este é um primeiro ponto que distingue Gramsci como revisionista do marxismo. Diz Gramsci: "a ideologia foi um aspecto do "sensismo"21"22, tendo como significado original "origem das idéias". Como no Século XVIII, no Sensismo, a análise era o único método aplicado à ciência, ideologia significava a análise das idéias; análise sobre sua origem, quais os elementos originais de uma idéia. Segundo o Sensismo, as idéias derivam das sensações. Com o passar do tempo, o conceito de ideologia como análise sobre a origem das idéias passou a significar, a ideologia, um sistema de idéias. "Com a filosofia da práxis, ideologia ganhou um novo conceito capaz de superar o antigo. Tal conceito "exclui que para os fundadores (da Filosofia da Práxis) a origem das idéias tivesse que procurar-se nas sensações"23. Segundo a Filosofia da Práxis, ideologia, tem que ser analisada historicamente como uma superestrutura24. Segundo Gramsci, o erro no ato de considerar o valor das ideologias, é que se dá o nome de "Ideologia" tanto à uma superestrutura que é necessária a uma determinada estrutura, como à iniciativas individuais. Com isto, ideologia, ganhou um sentido pejorativo e este sentido estendeu-se muito mais que o não pejorativo. O processo de tal erro pode ser dito em três pontos: Ideologia é identificada como algo diferente ou separado da estrutura e diz-se que não são as ideologias que modificam as estruturas, mas sim, o contrário. "Afirma-se que uma determinada solução política é ideológica e que, embora se julgue poder modificar a estrutura, é insuficiente para modificar; afirma-se que é inútil, estúpida, etc."25 Passa-se a afirmar que toda a ideologia é pura aparência, inútil e estúpida. Entre as ideologias é preciso distinguir dois grupos: 1) as que são historicamente orgânicas e que surgiram conforme a necessidade que a história apresenta; 2)as que surgiram por iniciativas individuais e racionalistas. "Na medida em que são historicamente necessárias, têm uma validade "psicológica", "organizam" as massas

humanas, formam o terreno em que os homens se movem, adquirem consciência de sua posição, lutam, etc.".26 Ao contrário, quando são proveniente de iniciativas individuais criam movimentos individuais, polêmicas sem muita duração, e, que não trazem solução para os problemas apresentados pela história. O marxismo tradicional, de modo geral, como um modo de pensar determinado pela estrutura econômica. Gramsci, considerado um revisionista do marxismo, concebe ideologia como uma concepção de mundo; combate energicamente qualquer "determinismo"27: "A pretensão de apresentar e expor cada flutuação da política e da ideologia como uma expressão imediata da estrutura, deve ser combatida teoricamente como um infantilismo primitivo"28. Gramsci ao falar de "ideologia" não está preocupado somente com sua definição e sua origem; está também preocupado com a difusão de uma determinada ideologia. O processo de difusão da ideologia há basicamente dois momentos progressivos: num primeiro momento é natural que uma determinada concepção de mundo seja mais difundida entre a classe dirigente; num segundo momento a ideologia difunde-se na cultura popular. "Ideologia" pode ser caracterizada como uma concepção de mundo. A concepção mais bem elaborada recebe o nome de filosofia; no nível mais baixo recebe o nome de folclore, e, em último lugar se encontra o senso comum. A filosofia sendo o estágio mais elaborado da concepção do mundo deve possuir um alto grau de coerência: "o filósofo não somente pensa com maior coerência, rigor lógico e espírito sistemático que os outros homens, mas conhece toda a história do pensamento, ou seja, é capaz de explicar o desenvolvimento que o pensamento sofreu até ele; assume, no plano do pensamento, a mesma função assumida pelos especialistas nos diversos domínios científicos".29 O papel essencial da filosofia é difundir a concepção de mundo dentro do senso comum. Uma filosofia que nasceu dentro da história, isto é, orgânica deve estender-se até ao senso comum. Qualquer pensamento, superior ao senso comum (cientificamente coerente), deve permanecer em contato com as camadas populares, "os simples" e assim ver a origem dos problemas a serem resolvidos visando a melhor direção ideológica. "Realmente apesar deste contato, Gramsci constata que a verdadeira relação entre filosofia 'superior' e senso comum é garantida pela política, que assim assegura a unidade ideológica do bloco histórico".30

2.5.1- A função dos intelectuais De certa forma a função dos intelectuais vem aparecendo ao longo deste trabalho, principalmente quando abordamos a questão das ideologias em Antônio Gramsci e a questão do intelectual "orgânico". "Orgânico" é aquele que está junto, trabalha em conjunto, movimenta-se, relaciona-se com aqueles que representa; não está separado. Os intelectuais não formam um grupo a parte. Os intelectuais são encarregados pela elaboração e pela difusão das novas concepções de mundo, das novas ideologias. Sendo assim, a principal função do intelectual, além de ser a de elaborar novas idéias, é ser o elo de ligação entre estrutura e superestrutura ideológica. Esta última só é válida se for "historicamente orgânica, isto é, necessária a uma certa estrutura"59. Dizendo de outra forma, uma ideologia só é válida se for historicamente orgânica, necessária, que nasceu com um objetivo. Assim como uma ideologia também são os intelectuais: se não movimentarem-se organicamente, a exemplo de um organismo, na concepção de Gramsci, serão inúteis, sem nenhuma validade; as ideologias que produzem terão o mesma validade, isto é, nenhuma. Isto porque não tem vínculo orgânico; o intelectual perde o seu sentido. As ideologias produzidas pelos intelectuais desligados das massas são qualificadas por Gramsci de "elocubraçõezinhas individuais"60

Intelectuais, em Gramsci, está intimamente ligado com o conjunto de sua teoria, em especial, o conceito de hegemonia. Intelectuais e hegemonia relacionam-se mutuamente, ou melhor, os intelectuais são "funcionários" de uma classe que aspire à hegemonia, à direção. O intelectual, além de formular a ideologia da classe que representa, é encarregado de sua difusão, para que a ideologia se torne hegemônica.

CONCLUSÃO O que deu grande impulso para a teoria de Marx foi ter ele presenciado na Inglaterra a miséria, a fome, menores trabalhando em troca de sua subsistência, enfim, ver toda a situação de exploração e precárias condições de vida, produtos da dupla Revolução e do capitalismo nascente. No decorrer deste estudo procuramos responder à questão proposta "Gramsci: Uma Alternativa para o Marxismo? Depois de ter estudado o marxismo tradicional e o pensamento de Gramsci, depois de uma análise e comparação dos conceitos de um e de outro, concluímos por uma resposta afirmativa a esta questão: Gramsci constitui uma alternativa para o marxismo. Isto não significa que este estudo quer ser a última palavra neste assunto, mas quer ser uma tentativa de ressaltar a importância deste pensador que tem tido muita influência no Brasil, também no meio acadêmico, principalmente a partir da década de 60. Gramsci direciona sua crítica mais ao rumo que o marxismo tomou depois de Marx, isto é, à cristalização da teoria marxista. Com isto, Gramsci reacende dentro do marxismo o conceito de revolução. A transformação – revolução – proposta por Gramsci é lenta, gradativa e sólida. A transformação social tem sua base no crescimento do nível cultural, na formação da consciência, na formação intelectual e moral. Isto explica a grande importância que Gramsci dá ao intelectuais orgânicos, o partido político e à escola como um lugar de formação intelectual e moral igual para todos. Com certeza, Gramsci é muito atual, fala diretamente para a realidade brasileira, ou melhor, para todos os países não oferece educação para todos, tem um sistema escolar que reproduz as desigualdades sociais. Gramsci nos inspira a trabalhar para que todos tenham acesso à escola, ao desenvolvimento da consciência, ao desenvolvimento cultural.

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