Zamignani, D. R. (2000). 31-Uma tentativa de entendimento do comportamento obsessivocompulsivo: Algumas variáveis negligenciadas. In R. C. Wielenska (Org.), Sobre Comportamento e Cognição: (Vol. 6, pp. 256-266). para Salkovskis e Kirk (1997), as caracteristicas centrais do problema obsessivo-compulsivo seriam: (a) evitacao de objetos ou situacoes que desencadeiam obsessoes (os autores defendem que toda obsessao seria desencadeada por estimulos ambientais); (b) obsessoes; e (c) comportamentos compulsivos e/ou rituais encobertos. Os comportamentos compulsivos ou rituais e as respostas de evitacao seriam respostas de fuga-esquiva a estimulacao aversiva gerada pela obsessao e pela ansiedade e a proposta de tratamento teria como foco esta resposta de esquiva. Para tanto, o procedimento de exposicao com prevencao de respostas seria a principal estrategia (Salkovskis e Kirk, 1997). O seguinte esquema ilustra a sequencia de eventos envolvidos no TOC conforme esses autores:
No entanto, diversas outras consequencias, alem da eliminacao da estimulacao aversiva, podem exercer controle operante e, portanto, atuar na selecao e manutencao da classe de respostas obsessivo-compulsiva. Por exemplo, um profissional que apresente um comportamento obsessivo de hiper-responsabilidade pode ter um desempenho profissional muito superior por conta desse comportamento. No caso de uma crianca, em funcao de seu comportamento “estranho", sua mae pode pega-lo no colo e perguntar se esta tudo bem. Pode ainda pedir para seu pai conversar um pouco com ele, para ver se ele se abre mais com o pai - que geralmente chega cansado do trabalho e nao tem tempo para nada. Uma outra pessoa poderia, em funcao de seu problema, ser afastada do trabalho com o qual esta bastante insatisfeita. Ao longo do tempo, a variacao e selecao continuam ocorrendo e outras consequencias diversas podem adquirir controle operante sobre a resposta. Essas consequencias (o desempenho profissional, o carinho da mae, a atencao do pai, a esquiva de situacoes desagradaveis e outras) poderiam tambem exercer controle operante, nao so sobre respostas compulsivas, mas sobre toda a cadeia de respostas (a obsessao, a ansiedade e a resposta de esquiva), levando ao aumento da sua frequencia. Ainda o controle exercido pelos estimulos antecedentes e consequentes pode ser transferido para outros estimulos atraves da formacao de classes de estimulos equivalentes ou de generalizacao de estimulos (Catania,1999). Depois de um certo tempo, a resposta que aparece como queixa em nosso consultorio pode nao ter mais nenhuma conexao com a contingencia original (Skinner, 1953). O trabalho de Guedes (1997) ilustra algumas possiveis variaveis que podem atuar sobre o comportamento do paciente portador de TOC Essa autora pesquisou o envolvimento da familia nos casos do transtorno obsessivo-compulsivo, demonstrando como a acao dos integrantes do grupo familiar pode agir na manutencao deste tipo de problema. Os dados de Guedes indicam que a familia age de maneira inconsistente com o paciente portador de TOC, em alguns momentos, participando do ritual juntamente com o paciente, em outros, antecipando o ritual e, em outros, ignorando ou mesmo punindo o ritual. Esse padrao da familia tenderia a manter o quadro obsessivo-compulsivo. Possivelmente devido a historia de reforcamento, a resposta compulsiva pode passar a ocorrer sem a presenca de ansiedade ou mesmo sem a obsessao. E comum observarmos clientes que relatam “nao se lembrarem" ou nao terem obsessoes que antecedem as compulsoes ou ainda que
relatam nao sentir ansiedade. Uma das hipoteses que poderia explicar esse fenomeno estaria relacionada a caracteristicas proprias da contingencia de esquiva e da vigencia de esquemas concorrentes. Numa contingencia de esquiva, a consequencia reforcadora e a eliminacao do estimulo preaversivo que sinaliza a apresentação de um aversivo. O individuo que responde a uma contingencia deste tipo, portanto, nao "ve” a consequencia de sua acao que, em ultima analise, e a eliminacao do aversivo, ou seja, "a conseqüência de uma resposta de esquiva efetiva é que nada acontece: o evento aversivo é esquivado com sivcesso”(Catania, 1999, p. 121). Como agem sobre a resposta diversas consequencias diferentes.
Outros fatores ambientais ainda podem aumentar o poder de controle operante dessas consequencias sobre o responder. Grande parte dos clientes que apresentam este tipo de comportamento possuem um repertorio social bastante limitado. Por conta disso, sua acao no ambiente pode produzir poucas consequencias reforcadoras sociais ou de outra natureza. Com um ambiente pobre de reforcadores, existe pouca probabilidade de que outras consequencias (sociais ou nao) mantenham uma resposta alternativa a resposta-problema. Sabemos que a privacao aumenta a probabilidade de emissao de qualquer resposta que produza o estimulo reforcador do qual o organismo esta privado (mesmo que esta resposta envolva estimulacao aversiva). Se os poucos reforcadores ambientais disponiveis se originam das consequencias ao padrao obsessivo-compulsivo (cuidado, atencao especial, isencao de responsabilidades, proximidade dos familiares, bom rendimento profissional) esse padrao tendera a reproduzir-se. Um dos paradigmas de ansiedade e o de supressao condicionada. Nesse paradigma, um estimulo discriminativo (pre-aversivo) sinaliza que, apos a passagem de um determinado tempo, sera apresentado um estimulo aversivo. O proprio estimulo pre-aversivo toma-se aversivo devido ao pareamento com o estimulo aversivo. A presenca do pre-aversivo e estimulo discriminativo que controla a emissao de respostas - paralisa o comportamento operante que estava em andamento - e, se for possivel, a eliminacao do estimulo discriminativo atraves de resposta operante, estas aparecem, mesmo que o aversivo nao seja suspenso ao final do tempo programado. Um ambiente rico em estimulacao aversiva produz, portanto, individuos ansiosos em relacao a varios pre-aversivos. Se o processo terapeutico nao conseguir levar ao desenvolvimento de um repertorio que produza interacoes menos aversivas, a fonte de ansiedade continuara presente e, por conseguinte, ficara presente a ansiedade. Em minha experiencia clinica (e de outros colegas) no atendimento de clientes com queixa de TOC, o comum o cliente relatar a diminuicao consideravel da frequencia e intensidade de seus comportamentos obsessivo-compulsivos quando estao em ferias ou quando estao afastados de seu ambiente habitual. Isso sugere que a) a obsessao nao e desconectada dos estimulos ambientais - nao e autodeterminada; b) a funcionalidade da resposta pode desempenhar um papel importante na manutencao e frequencia dos comportamentos obsessivo-compulsivos; c) a intensidade e a frequencia dos comportamentos obsessivo-com- pulsivos podem estar relacionadas a estimulacao aversiva presente no ambiente.
Concluindo, as observacoes informais e os dados apontados pela literatura apontam para o fortalecimento das seguintes hipoteses: - A importancia das variaveis encobertas na determinacao do comportamento obsessi- vo-compulsivo pode estar sendo superdimensionada; - A contingencia de reforcamento negativo pode nao ser a unica condicao que mantem a cadeia obsessivo-compulsiva; - O controle operante exercido por variaveis ambientais pode prevalecer sobre o controle por consequencias de reforcamento negativo; - O trabalho do terapeuta, portanto, poderia ter maior eficacia caso houvesse maior atencao a alteracao destas outras relacoes ambientais; - Como decorrencia desta ultima, o procedimento de exposicao com prevencao de respostas pode nao ser a melhor alternativa no tratamento do TOC, pois age unicamente sobre a contingencia de esquiva que compoe o comportamento obsessivo-compulsivo.