Rpg (role Playing Game) Como Incentivador Da Leitura

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FERNANDO JOSÉ CORREIA

O RPG COMO INCENTIVADOR DA LEITURA

Londrina 2007

FERNANDO JOSÉ CORREIA

O RPG COMO INCENTIVADOR DA LEITURA Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Departamento de Ciência da Informação como parte integrante do curso de Graduação em Biblioteconomia da Universidade Estadual de Londrina para a obtenção do titulo de bacharel. Orientadora: Sueli Bortolin

Londrina 2007

FERNANDO JOSÉ CORREIA

O RPG COMO INCENTIVADOR DA LEITURA

COMISSÃO EXAMINADORA

Sueli Bortolin

Ana Esmeralda Carelli

Oswaldo F. de Almeida Júnior

Londrina, 22 de Novembro de 2007

Do! Or do not. There is no try. Master Yoda (Star Wars: Episode V - The empire strikes back)

AGRADECIMENTOS

À todos os jogadores e amigos que gentilmente cederam sua imagem, seu tempo e sua paciência para que este trabalho fosse concluído com êxito. Às

Revistarias

Batbanca, Odisséia e K2 Mangá Shop por

cordialmente permitir que os incomodássemos com nossa presença. Aos amigos e aventureiros Paulo Noboru Shimamura, Daniel Garcia de Andrade, Victor Savignon, Rogério Francisco de Menezes Ferreira, Flávia Angélica Andrease e a João Paulo Pigari Benvindo que em muito contribuíram neste trabalho, fazendo com que o pesquisador nunca perdesse o foco e sempre olhasse o RPG com outros olhos. Aos

participantes

do

evento

D&D

Day

que

cederam

entusiasticamente sua imagem. À brilhante orientação de Sueli Bortolin, que fez com que meu desânimo se revertesse em trabalho com seus intermináveis rabiscos e sugestões. Aos membros da Brotherhood of the Black Hand, que fizeram o favor de não tocar neste trabalho (http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=5965673). À minha mãe Sirlei de Fátima Ferraz e meu irmão Dyone Felipe Correia, pelo apoio nestes anos de graduação, bem como a todos os outros membros de minha família. E finalmente e hipótese alguma em menor importância, Caroline Junko Fujihara, que me deu todo o suporte emocional e alento nas horas de desespero e desânimo. À todos, o meu muito obrigado.

CORREIA, Fernando José. O RPG como incentivador da leitura. 2007. 62f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Biblioteconomia) – Universidade Estadual de Londrina, Londrina.

RESUMO

Este trabalho tem o intuito de investigar os Jogos de Interpretação ou RPG (Role Playing Game) como incentivador da leitura de múltiplos suportes: textual, imagético, cinematográfico, pictográfico; e avaliar se tais leituras são feitas pelos jogadores de Londrina, no Paraná. A cidade conta com 250 jogadores, número obtido com os organizadores do evento RPG Londrina em 2003, sendo que, a maioria se dedica ao sistema Storyteller, devido à sua liberdade e dinâmica. Verificou-se que eles se utilizam, em grande maioria, das histórias em quadrinhos e filmes para a criação de aventuras e também para enriquecer suas interpretações. Como instrumentos de coleta de dados foram utilizados o questionário além da observação participativa de seções de jogos de forma a subsidiar as respostas dadas pelos jogadores além de confirmá-las. As fontes de informação relacionadas pelos jogadores como fonte de inspiração para interpretação de personagens e criação de aventuras foram relacionadas mídias diversas, em destaque, o cinema e os quadrinhos, seguidos pelos livros; além de formas alternativas, como a observação do cotidiano e de outros jogadores. A crescente utilização da Internet em detrimento das bibliotecas foi outro fato constatado. Palavras Chave: Role Playing Game; RPG; Jogos de Interpretação; Leitura; Jogos Eletrônicos.

CORREIA, Fernando José. O RPG como incentivador da leitura. 2007. 62f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Biblioteconomia) – Universidade Estadual de Londrina, Londrina.

ABSTRACT

This study aims to investigate the Interpretation Games or RPG (Role Playing Game) as a reading encourager in several ways such as: textual, image reading, cinematographic, pictographic; and evaluate if these readings are done by the players from Londrina, in Paraná state. The city has 250 players, number obtained from the organizers of the event RPG Londrina in 2003, and most of them use the Storyteller system because it gives them more freedom and turns the game into a more dynamic experience. It was noticed that they use, most of the times, comic books stories or movies to create their adventures and to enhance interpretation. A questionnaire was used as data collecting instrument, as well as participative observation of game sessions, aiming to subside the answers given by the players and also confirming them. The information sources mentioned by the players as an inspiration source for character interpretation and creation of adventures were various, highlighting the cinema and comic books, followed by books, besides alternative means, as the observation of the daily life as well as the observation of other players. The widespread in Internet using despite of the libraries was another fact noticed. Keywords: Role Playing Game; RPG; Interpretation Games; Reading; Electronic Games.

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 –

Acervo da Batbanca .............................................................................14

Figura 2 –

Tela de Ragnarok, um dos mais famosos MMORPGs. (cada “boneco” na tela representa um usuário online)..................................................21

Figura 3 –

Evento: D&D Day, na Revistaria Odisséia (3 de nov. de 2007) ...........24

Figura 4 –

Cena de ação, o mestre (em pé) descreve a cena, enquanto o jogador (esquerda) brande sua espada, declarando ação de ataque...............26

Figura 5 –

Dados multifacetados (20, 12, 10, 8, 6 e 4 faces) ................................27

Figura 6 –

Parte do acervo da K2 Mangá Point, loja especializada em material nipônico (mangás e animês) mas com espaço para RPG e cardgames ........................................................................................39

Figura 7 –

Garage Kits de fãs de Anime e Mangá ................................................42

Figura 8 –

Aventura de D&D 3a edição utilizando tabuleiro e miniaturas ..............43

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................10

2 PROBLEMA ...........................................................................................................12

3 JUSTIFICATIVA .....................................................................................................13

4 OBJETIVOS ...........................................................................................................17 4.1 OBJETIVO GERAL....................................................................................................17 4.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ........................................................................................17

5 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA .............................................................................18 5.1 DEFINIÇÃO DO RPG ...............................................................................................18 5.2 HISTÓRIA DO RPG .................................................................................................18 5.2.1 O RPG no Brasil ...............................................................................................22 5.2.2 O RPG em Londrina .........................................................................................23 5.3 A PRÁTICA DO RPG................................................................................................25 5.4 A NECESSIDADE DA COMUNICAÇÃO .........................................................................28 5.5 DEFINIÇÕES DE LEITURA .........................................................................................28 5.5.1 O RPG e o mediador da leitura e da informação ..............................................30 5.6 O BIBLIOTECÁRIO E O RPG .....................................................................................31 6 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS...............................................................33 6.1 UNIVERSO E MEIOS DE PESQUISA ............................................................................33 6.2 SUJEITOS DE PESQUISA ..........................................................................................33 7 ANÁLISE DE RESULTADOS ................................................................................34 7.1 QUESTIONÁRIO ......................................................................................................34 7.2 OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE ...................................................................................38 8 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................41

REFERÊNCIAS .........................................................................................................44

APÊNDICES .............................................................................................................46 Apêndice 1 ................................................................................................................47

ANEXOS ...................................................................................................................50 Anexo 1 – Planilha de GURPS ..................................................................................51 Anexo 2 – Planilha de AD&D.....................................................................................53 Anexo 3 – Planilha de Mago: a ascensão .................................................................55 Anexo 4 – Planilha de Leis da Noite (live action) ......................................................57 GLOSSÁRIO .............................................................................................................59

10

1 INTRODUÇÃO

A cada dia o Brasil tem dado maior importância ao incentivo à leitura do cidadão, mas essa leitura é direcionada à decodificação do texto, não à sua compreensão como um todo, de seu contexto e entrelinhas. Começam a despontar investimentos privados e públicos, além de campanhas e ONGs que trabalham com a temática da disseminação da leitura para a população, entre elas: Alfabetização Solidária e o Adote um Aluno. A leitura por si só, garante sustento, moradia, emprego, uma vez que se faz necessária para que seja possível a interação com outras pessoas e desenvolvimento de atividades remuneradas, entre outros benefícios; mas não traz, imediatamente

a

abrangência

e

o

conhecimento

necessários

para

o

desenvolvimento pessoal, o que se faz com uma verdadeira leitura, aquela em que nos apropriamos das idéias do texto, que busca uma compreensão não só das palavras, mas também de seu significado e contexto, ou seja, do texto como um todo. Os índices de analfabetismo em nosso país diminuem a cada ano, no entanto um outro analfabetismo passa despercebido pelos educadores em geral, e tem seus índices significativos, como aponta o IBGE em sua última pesquisa. Os números mostram em 2002 um índice de 26% no Brasil e 19,7% no sul do país, os analfabetos funcionais, apesar de saberem decodificar o sistema alfanumérico não conseguem compreender o que lêem, é praticamente autômato, decodificam os textos, captando apenas a idéia principal, e ignorando as informações contidas na mensagem, como o contexto, o estilo, o autor, o que muitas vezes agrega sentidos até mesmo opostos à idéia principal do texto. Como uma ferramenta que não só incentiva a leitura pura e simples, a decodifica, como também dá suporte para que se obtenha a leitura completa de um texto, suas entrelinhas, e todo o contexto deste, apresento-lhes o RPG (Role Playing Game). A cada dia mais educadores descobrem a importância do RPG em sala de aula, seu caráter lúdico o deixa flexível para ser usado pelas diferentes disciplinas escolares. Seu uso pode ser observado em várias instituições espalhadas pelo Brasil e pelo mundo, muitas ONGs o defendem e o estudam como didática

11

alternativa, usando, geralmente os trabalhos de Alfeu Marcatto e seu livro: “Saindo do Quadro”. Apesar do público alvo principal do RPG ser os jovens dos 15 aos 26 anos, o seu legado é inestimável, pessoas que começam a ler por causa do jogo adquirem o gosto pela leitura, pois aprendem o quão prazeroso é aventurar-se por outros mundos e lugares por intermédio da leitura; uma vez que ela não é imposta. O jogador começa a se interessar pelos livros, pois estes se tornam uma das principais fontes de informação para a fantasia e para a imaginação. E num segundo momento a maioria começa a relacionar outros tipos de mídia para seu crescimento, entre elas: o cinema, TV e quadrinhos, fontes ricas e abundantes para os que procuram aventura e prazer “enlatados” e rápidos. Neste trabalho avaliamos o RPG como importante fonte na formação dos leitores/jogadores de grupos da cidade de Londrina no Paraná, divididos em três classes de jogadores de acordo com seus sistemas mais comuns de jogo: AD&D (Advanced Dungeons & Dragons), GURPS (Generic Universal Role Playing System) e Storyteller. Estes sistemas foram escolhidos por serem os mais populares entre os jogadores. Seis grupos foram contatados para a pesquisa, mas apenas três grupos completos responderam os questionários.

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2 PROBLEMA

Os problemas que tomamos como ponto de partida para o início deste trabalho foram:

1 – falta de informação sobre o RPG, que gera uma série de preconceitos; 2 – sacralização do livro. Tido como único suporte de leitura aceito pela sociedade em geral; 3 – difícil aceitação de outros meios de disseminação da cultura que extrapolam os modelos tradicionais (teatro, cinema, livro, ópera etc);

Numa sociedade quase que exclusivamente cristã, tudo o que tende a ter uma certa referência a questões místicas ou medievais trazem uma certa desconfiança aos pais e educadores. Os títulos de sistemas de RPG atualmente cotados como mais populares são os Storyteller (Vampiro, Mago, Lobisomem) e Dungeons & Dragons (D&D, que inspirou o seriado de desenho animado Dungeons & Dragons, no Brasil chamado de Caverna do Dragão). Há inúmeros exemplos bem sucedidos no Brasil e no mundo com relação à aplicação do RPG como ferramenta educacional, no entanto há escassez de textos sobre esta ferramenta sendo usada como incentivadora da leitura e escrita no Brasil. Na sociedade, em geral, não se tem real noção de como esse jogo é aplicado e quais os seus benefícios. Começa-se a estudar o RPG com embasamento educacional, graças a seu caráter lúdico, mas são poucas as pessoas que estudam o jogo com o intuito de traçar um perfil dos leitores e o que lêem, por que lêem? quanto lêem? O que produzem com o conhecimento adquirido? Essas são questões para as quais procuraremos resposta neste trabalho.

13

3 JUSTIFICATIVA

Dos jogos citados, o classificado como “adulto” é Storyteller. Ele, entre outras coisas, trata de questões psicológicas, de como o homem vê os mitos do vampiro, do mago e do lobisomem e o que eles representam no inconsciente coletivo, essa análise não é explicitada nos livros, ela só é descoberta com uma observação mais próxima dos títulos e da história dos jogos. Além disso, traz esses conceitos para o mundo real, com um incrível convencimento do leitor/jogador, o que deixa os desavisados um tanto confusos e muitas vezes levados a crer que aquilo possa ser real, quando na verdade não o é; isso é

explicitado logo nas primeiras

páginas dos

livros com o aviso

“desaconselhável para menores [...]”. Muitas vezes a idade indicada pelos livros é de 18, outras vezes de 21 anos, devido ao perigo de causar essa confusão entre o real e a fantasia. Já o D&D enfoca a Idade Média como tema, logo, todas as lendas, histórias e mitos que envolvem este período. O sistema em si pode tratar o medieval pela ótica da fantasia, em que é possível ter mundos/cenários com dragões, orcs, ogros etc., como no aclamado mundo do “Senhor dos Anéis” do lingüista inglês J. R. R. Tolkien (John Ronald Reuel Tolkien), enquanto em outros, o cenário é uma versão fiel à histórica, com todos os problemas e ideais da sociedade da época, bem como sua organização. A ambientação medieval não traz grandes dificuldades de uso em seu histórico, talvez por tratar do medieval, os conceitos abordados são muito distanciados da realidade, o gosto pela leitura de títulos mais fantasiosos se destaca nos jogadores desse sistema, enquanto que em Storyteller, os livros são mais pesados, muitas vezes até obscuros e psicologicamente avançados demais para os jogadores. A leitura é importante para o ser humano em todas as fases de sua vida, desde sempre é necessário termos noção de tudo o que ocorre em nossa volta, isso faz com que possamos interagir com o mundo de forma fácil e cada vez melhor. Os livros nos dão esta noção sim, mas às vezes não são suficientes para descrever de forma objetiva os temas propostos. Outras

mídias

como cinema

e TV

podem esclarecer

tais

impossibilidades de forma simples e fácil, afinal a leitura da imagem em movimento

14

muitas vezes não necessita de explicações. Cabe aqui o clichê “uma imagem vale mais do que mil palavras” e sabendo que um segundo de filme pode variar até 60 quadros (imagens) por segundo assim temos mais do que 60.000 palavras por segundo passando em uma tela de cinema frente aos nossos olhos e nem nos damos conta disso. Outros suportes de leitura comumente usados pelos jovens são os quadrinhos e mangás (revista em quadrinhos japonesa), estas formas de leitura muitas vezes são desconsideradas e rechaçadas pelos educadores e pais, mas muitos deles trazem informações culturais e literárias ricas, como no caso de Hellblazer e Preacher que tratam de questões ligadas a religiosidade, ou como Sandman, que trabalha com a fantasia, mitos, deuses, inconsciente coletivo e psique.

Figura 1 – Acervo da Batbanca1 1

Na primeira estante os títulos de RPG do estabelecimento, o restante são outras fontes de informação ao RPGista, quadrinhos, livros, DVDs, etc.

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Um exemplo clássico de preconceito que é abominado e tido como uma total falta de respeito com os quadrinhos foi o fato de Neil Gaiman, um autor de histórias em quadrinhos, considerado um dos ícones do gênero, ter ganho o prêmio no Fantasy World Award2, e que a partir de então o prêmio exclui a participação de histórias em quadrinhos. Os quadrinhos também são defendidos por um teórico muito importante na Biblioteconomia, Waldomiro Vergueiro, ele atualmente é coordenador do Núcleo de Pesquisas de Histórias em Quadrinhos da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo. Ele considera os quadrinhos como uma forma de arte, que além de retratar o cotidiano e os ideais não só de um grupo, mas muitas vezes de uma nação. Em entrevista ao Rio Mídia afirma: Vivemos num grande contexto globalizado, num grande sistema de comunicação interligado. Neste cenário, as histórias em quadrinhos veiculam modelos e padrões de comportamento que já são transmitidos pelas outras mídias, em todo o mundo. Tudo acaba se repetindo. No Brasil, o quadrinho reflete, de uma forma geral, a realidade urbana dos jovens das grandes cidades do país. Jovens que são influenciados pela cultura pop, pela televisão e pelos meios eletrônicos. Uma realidade que, na verdade, não é tão diferente daquela que vivem os jovens de outros países. O que há de diferente em nossas histórias são algumas características e especificidades que dizem respeito a nossa cultura local, expressa, por exemplo, nos relacionamentos de amizade e de amor e na apresentação e definição dos grupos sociais (VERGUEIRO, 2007).

Hoje, considerando o grande volume de informação que possuímos, percebemos o quanto é importante termos uma sociedade de indivíduos que lêem mais e tornem-se culturalmente melhorados. Não é necessário discursar páginas e páginas sobre a importância da leitura e da cultura, esses fatos estão ligados ao diaa-dia da maior parte da população mundial. [...] em um processo educativo, o aluno dever ser incentivado a participar, buscar o conhecimento e a tirar conclusões baseado nos fatos que observa, ou seja, o aluno tem que construir seus conhecimentos, em vez de adquiri-los prontos, como acontece geralmente no ensino tradicional (MACHADO, 2007). 2

Um conjunto de prêmios anuais, internacionais, existente desde 1975 e concedido a escritores e artistas que tenham apresentado proeminentes realizações no campo da fantasia.

16

Partindo dos parâmetros de Marcatto (1996), temos uma nova forma de aprender. Na verdade uma velha forma, já que estes preceitos eram utilizados na academia da Antigüidade, em que o método consistia no discurso e no debate, ou seja, se explanava um tema baseado nos conhecimentos prévios de cada pessoa envolvida. Assim, era possível analisar o fato de vários ângulos e de modos diferentes. Temos um modelo bem parecido com esse na tradição dos mitos e lendas espalhados pelo mundo, desde tempos imemoriais, as histórias eram passadas oralmente, e delas, muitas vezes se retirava os conceitos de vida, necessários para a formação de um indivíduo melhor. Nos jogos de RPG é resgatado o prazer por contar histórias, um tanto diferente dos métodos clássicos, em que as histórias eram da responsabilidade dos avós e pais, e passaram depois para filmes de cinema e televisão, agora essa magia voltou ao gosto popular, por intermédio do RPG. Na concepção piagetiana, segundo Faria (1995), os jogos consistem numa assimilação funcional, num exercício das ações individuais já aprendidas, gerando, ainda, um sentimento de prazer pela ação lúdica em si e pelo domínio sobre as ações. Portanto, os jogos podem ter dupla função: consolidar os conhecimentos adquiridos e dar prazer ou equilíbrio emocional. A contribuição do RPG para a sociedade é procurar unir o útil ao agradável, já que para adolescentes em formação, ou adultos em busca de conhecimento e lazer, certo estímulo é necessário. A atividade lúdica trata isso com maestria, faz com que os indivíduos aprendam, sem perceber, valores e regras sociais, e nesse caso específico, o prazer da leitura e o aprendizado para acessar fontes de informação, às vezes até desconhecida.

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4 OBJETIVOS

4.1 OBJETIVO GERAL

Estudar se o RPG ajuda no estímulo à leitura, se ele serve para que o jogador consulte e leia outras fontes de informação além dos livros de regras, usando o jogo como ferramenta de disseminação; além disso, verificar se os jogadores se tornam produtores de textos e outras formas de manifestação cultural.

4.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS



Caracterizar o jogador de RPG londrinense, bem como sua origem escolar;



Identificar os tipos e mídias de leituras utilizados pelos jogadores de RPG em Londrina;



Arrolar as mídias diversas em que os jogadores buscam informações para o jogo;



Sondar a opinião dos jogadores sobre o que é ler;



Verificar quais são os principais interesses culturais e literários dos jogadores londrinenses;



Levantar as produções culturais realizadas por estes indivíduos, caso existam.

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5 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

5.1 DEFINIÇÃO DO RPG

RPG é a sigla do termo inglês Role Playing Game, que em livre tradução significa “Jogo de Interpretação”. Apesar de atualmente existir mais de uma forma de se jogar o RPG, aqui será abordado o chamado “RPG de mesa”, que consiste em contar uma história de uma forma mais lúdica e interativa, uma vez que os jogadores podem interferir a qualquer momento por meio de seus personagens; podendo fazer qualquer coisa desde que não fujam dos parâmetros do que é considerado “normal” no ambiente proposto. Para a visualização das ações, não se dispõem de nenhum artefato senão a própria mente e a descrição oral delas. Para a construção imaginária do cenário, algumas vezes são utilizadas miniaturas, mapas, ilustrações; além de materiais de áudio (para inserir uma trilha sonora, por exemplo), e audiovisuais para uma visualização mais próxima do ambiente, muitas vezes influenciado por terceiros, como no caso de filmes que proporcionam referenciais para as ações e formas de “ver” determinada cena de jogo.

5.2 HISTÓRIA DO RPG

A maioria dos livros de RPG começa com uma pequena introdução contando a história do jogo e suas propostas, podem ser encontrados em sites de livrarias especializadas como a Devir3 e outros grupos como grupo Ludus Culturalis4 que trazem uma retrospectiva mais detalhada de como surgiu este gênero de jogo. Ele surgiu por volta de 1974, nos Estados Unidos; um grupo de amigos costumava jogar wargames, (jogos de guerra), muito parecidos com o nosso 3 4

www.devir.com.br www.ludusculturalis.com.br

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“War” vendido em lojas de brinquedos de todo o país. Numa sessão de jogo em especial, foi plantada a semente para a criação de uma das mais interativas formas de se contar histórias. Segundo as fontes encontradas, entre elas o site da Livraria Devir e Pavão (2000), são tidos como os precursores do jogo um grupo de rapazes que jogavam wargames5 há anos, entre eles Gary Gygax e Dave Arneson. Como o inverno em algumas partes da América do Norte costuma ser bem rigoroso, a diversão preferida deles nessa época era ficar em casa jogando. Um dia resolveram adaptar o jogo, que tratava da 2a Guerra Mundial, para um tema mais fantástico, então, influenciados pela trilogia de livros: “O Senhor dos Anéis”. Assim levaram suas guerras para o ambiente mítico da Terramédia6. Montaram miniaturas representando os vários povos envolvidos na batalha e também seus castelos, fortes e florestas, dando ao jogo um ar mais realista. Após algumas sessões, um dos jogadores havia perdido uma batalha e quando foi declarada a vitória por seu oponente notou que uma das miniaturas de seu exército havia caído debaixo de uma estrutura, sendo assim, não estava participando da batalha e, como não tomou parte da luta não havia morrido. Uma discussão se seguiu após isso e acabaram chegando ao consenso de que realmente ele não havia perdido totalmente a batalha, pois um dos seus sobrevivera e não era prisioneiro, resolveu então que atacaria o exército do oponente se infiltrando pelo castelo e derrubando o líder. Aquilo nunca havia sido tentado, apenas grandes exércitos eram comandados pelos jogadores, um soldado atacar um complexo militar inimigo seria suicídio, e por isso, julgaram, muito mais divertido. Resolveram então re-adaptar o jogo para criar este tipo de missão. Assim, surge o primeiro RPG da história. Mais tarde com a evolução das regras foram criados outros tipos de personagens: magos, bárbaros, clérigos, entre outros; e também outras raças; como os elfos, anões e halflings (chamados de hobbits por Tolkien), além de uma infinidade de criaturas que habitariam este novo mundo, monstros, dragões, entidades, espíritos elementais e deuses. Algum tempo depois resolveram publicar este trabalho que se tornou “febre” entre os amigos da escola e da vizinhança e em 1974 era publicado pela 5 6

Jogos de guerra: no Brasil temos o War da empresa Grow como representante deste tipo de jogo. Mundo em que se passa a história de “O Senhor dos Anéis”.

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TSR o RPG Dungeons & Dragons, sob autoria de Gary Gygax e Dave Arneson, e que hoje se encontra na versão 3.5. Após a criação do D&D outros sistemas começaram a surgir, GURPS (Generic Universal Role Playing System) da Steve Jackson Games e Shadowrun da FASA, entre outros de menor relevância. Nesta época o Dungeons & Dragons ainda era o mais jogado, o que mudou com a invenção do Storyteller criado por Mark Rain-Hägen e editado pela White Wolf em 1991 e que disputa até hoje o mercado acirradamente com o D&D. Na

década

de

1980

também

despontaram

os

primeiros

computadores pessoais, e com eles os primeiros jogos eletrônicos com maior interatividade, tais máquinas possibilitavam ao usuário não só controlar um carro com um joystick, mas também inserir novos dados no jogo por meio de teclado ou mais tarde com o mouse. Isso fez com que o RPG também fosse incorporado por essa nova tecnologia. Era possível, por exemplo, inserir uma resposta a uma pergunta proposta pelo jogo, se a mesma estivesse correta, avançava-se mais um passo na aventura. Na década de 1990 a tecnologia dos PCs7 e dos videogames evoluíram, com isso a qualidade dos jogos também melhorou, de simples perguntas e respostas, passou à visualização do mundo, com gráficos em 3D e outras técnicas, mas a interatividade era restrita ao que fora programado no jogo, o que mudaria com a criação e popularização da Internet. A Internet revolucionou o modo como interagimos com o mundo, as distâncias diminuíram mudando também o RPG e fazendo com que amigos que se apresentam em um local físico para jogar, possam ser também transportados para dentro da rede. E nesse espaço virtual, se encontrar e jogar, mesmo sendo de um modo um pouco diferente. Apesar de o jogo continuar com o mesmo nome, foram adicionadas mais três letras, criando a sigla MMORPG (Massive Multiplayer Online Role Playing Game).

7

Personal Computers: nome criado pela IBM como marca para seus computadores pessoais, mas que hoje designa computadores de mesa (desktops).

21

Fonte: www.levelupgames.com

Figura 2 – Tela de Ragnarok, um dos mais famosos MMORPGs (cada “boneco” na tela representa um usuário online).

A estrutura que antes era mestre e jogadores passa a ser, servidor e jogadores. O jogo é programado pelo administrador do sistema, que faz o papel do mestre, indicando aventuras e missões aos jogadores, que por sua vez podem resolver os “problemas” do mundo sozinhos, em grupos ou em clãs. Uma das diferenças básicas do RPG online, é que há milhares de jogadores em um mesmo mundo ao mesmo tempo, o que era impossível no RPG de mesa, e que possibilita um jogo sem tumultos e confusões com 3 a 12 jogadores. Apesar da atração visual dos jogos eletrônicos, o jogo “de papel” ou “de mesa”, não perdeu seu valor, e ainda é amplamente comercializado em todo o mundo, pois nem todos os desejos do jogador podem ser traduzidos em bytes e polígonos.

22

5.2.1 O RPG no Brasil

O RPG chegou ao Brasil na década de 80, por meio de jovens que faziam intercâmbio nos Estados Unidos, e mais tarde foi reconhecido pelas editoras nacionais como uma fonte rentável de entretenimento sendo em 1989 traduzido pela Grow. O único jogo disponível na época era Dungeons & Dragons, criado pela norteamericana TSR, e comercializado aqui em uma caixa contendo os manuais básicos, os dados multifacetados8 e alguns personagens prontos para o jogo e que também eram utilizados como referência para a criação de novos, esta no entanto era a primeira versão. Anos depois, chegava a versão mais popular; e completa, com relação a regras, suplementos e ambientação. Advanced Dungeons & Dragons, editado pela Editora Abril Jovem, era composto basicamente de três livros: Livro do Mestre, Livro do Jogador e Livro de Monstros. Como esta versão era razoavelmente cara para o público brasileiro, foi lançada uma versão menor, First Quest. Onde havia uma aventura pronta e alguns personagens, bem como fichas de alguns monstros, os dados em acrílico e miniaturas dos personagens, o suficiente para se ter noção de como o jogo funcionava, e com isso atrair o jogador a comprar a versão completa. Com o passar dos anos, mais e mais títulos foram criados, e como a tradução e publicação deste material demorava a acontecer, os jogadores começaram a importá-lo por intermédio de livrarias especializadas. Dessa forma, segundo Pavão (2000, p.76) temos três gerações de jogadores: 1a geração – são jogadores com maior poder aquisitivo, trouxeram o D&D para o Brasil após intercâmbio nos Estados Unidos, ou por meio de sua importação, é uma geração de leitores de textos, pois as referências para a criação do D&D parte de livros como “O Senhor dos Anéis”.

8

Os dados utilizados neste sistema são seis: 4, 6, 8, 10, 12 e 20 faces.

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2a geração – esta geração possui um poder aquisitivo menor, seu jogo é o GURPS, primeiro RPG lançado em português. O domínio do inglês não é mais um item extremamente necessário para a utilização dos livros, sendo um sistema genérico pode ser adaptado para diversos cenários, sendo assim, não se prende mais aos livros como fonte de inspiração das aventuras, os itens mais lidos são quadrinhos e filmes. 3a geração – é a geração atual, como característica deste grupo, temos uma visão do RPGista hoje, pouco ligado a livros, estes tendem a se basear em filmes e no visual de bandas de rock, já que esta proposta “dark” é também englobada pelo jogo9, o sistema é focado mais no Role Playing do que no Game, ou seja, mais interpretação e menos regras, o que acabou por deixá-lo mais receptivo para novos jogadores. Neste período é possível ter uma inclusão maior de adeptos (inclusive mulheres, excluídas até então das mesas de jogo).

Esta mesma convenção também se aplicada ao RPGista londrinense, uma vez que em conversas informais com a maioria deles é possível verificar as diferentes gerações e até mesmo qual identificação eles tem sobre si mesmos e sobre os outros.

5.2.2 O RPG em Londrina

A história do RPG em Londrina se inicia com grupos isolados que, de alguma forma, têm contato com o jogo, mais tarde, quando ocorre uma disseminação maior a respeito do assunto, criam-se grupos mais organizados e

9

O sistema Storyteller também chamado de World of Darkness (mundo das trevas).

24

também revistarias começam a comercializar este tipo de material, como é o caso da Batbanca, que vende este tipo de material desde 1992. Acreditamos que Londrina possui hoje cerca de 250 jogadores10, mas esse dado não é muito preciso, pois há muitos grupos isolados.

Figura 3 – Evento: D&D Day, na Revistaria Odisséia (3 de novembro de 2007)11.

A cidade abriga duas revistarias especializadas em RPG, a Batbanca, fundada em 1992 e a Odisséia aberta desde 2002, embora não seja difícil encontrar livros e suplementos para o jogo em qualquer livraria.

10

Este número foi fornecido pela comissão organizadora do último evento oficial na cidade, o “RPG Londrina” realizado em 2003 pela revistaria Odisséia, sendo que a maioria dos participantes eram iniciantes. 11 Os mestres são facilmente identificáveis nesta foto, são os únicos que estão levantados, que é devido á natureza do seu ofício.

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5.3 A PRÁTICA DO RPG

O RPG é basicamente a interação entre os jogadores e o mestre, que também é chamado de narrador, pois ele conta a história em que os jogadores estão inseridos, relatando as conseqüências de seus atos e os efeitos que causaram (ou que futuramente possam causar) no ambiente de jogo, bem como as reações geradas a partir deste ato. Após a criação do ambiente e da história por parte do mestre, os jogadores planejam e montam os seus personagens. Para isso dispõem de uma ficha com os atributos do mesmo, sejam físicos ou mentais, e também suas habilidades e aparência, e imaginam como o personagem deveria ser, agir e pensar, desde que isto esteja de acordo com o mundo proposto pelo mestre. Diferente do que se pode pensar, o mestre não tem como planejar tudo o que vai acontecer no jogo, ele cria situações para a confrontação dos jogadores. O resultado deste embate depende das atitudes de cada um dos envolvidos, sendo assim é impossível fazer um roteiro do que acontecerá a cada cena da história. Existem dois tipos de personagens no jogo: os interpretados pelos jogadores, ou players, e os interpretados pelo mestre, ou NPCs (non-player characters). Enquanto os jogadores interpretam apenas os seus próprios personagens e suas ações, o mestre interpreta todas as outras criaturas contidas no cenário. Ele é como um deus que controla todas as probabilidades e o destino em si, mas não pode interferir diretamente nas ações dos players, pois existe o livrearbítrio, cada personagem é dono de suas ações.

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Figura 4 – Cena de ação, o mestre (em pé) descreve a cena, enquanto o jogador (esquerda) brande sua espada, declarando ação de ataque.

O mestre também atua como um árbitro das ações do jogo, ele controla quem primeiro tem ação, e quem atuará depois. Em muitos casos isso é feito utilizando o fator sorte, rola-se um dado e quem tirar o maior ou menor número, dependendo da regra, começa a ação. O momento em que cada personagem tem para fazer suas ações é chamado de “rodada”. Cada rodada tem a duração dentro do jogo de poucos segundos, isso no caso de uma rodada de combate, ou até de anos, no caso de outros tipos de ação. Por exemplo: se um personagem (ou um grupo) faz uma viagem do Brasil para a China de navio, e esta durar dois anos, esse tempo correrá de forma instantânea fora do jogo, para os jogadores, e de forma natural para os personagens, que sofrem todos os efeitos do tempo e da viagem. Os dados multifacetados são usados em jogo, para determinar sucesso ou falha, em suma, o fator sorte; se um jogador que interpreta um caçador

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experiente tenta atirar contra uma gazela correndo em uma savana, ele deve verificar em sua ficha qual a sua habilidade em atirar, essa habilidade é medida em números, esses números serão utilizados como parâmetro para o sucesso ou falha da ação, rola-se os dados, se o número obtido for satisfatório de acordo com a habilidade do personagem ele então tem sucesso na ação, caso contrário há uma falha.

Figura 5 – Dados multifacetados (20, 12, 10, 8, 6 e 4 faces)

Existem fatores externos ao personagem que podem elevar ou diminuir o sucesso de uma ação, ainda no exemplo do caçador: se a gazela estiver parada seria mais fácil acertá-la do que se estivesse correndo. Isto também é traduzido em números, no caso de haver algo que facilite a ação, o player ganha um bônus para realizar a ação, por exemplo, se ele necessitasse rolar um dado de seis faces e obtivesse um número superior a cinco para acertar um tiro à longa distância, esta ação seria facilitada se ele pudesse dispor de uma scope12 acoplada à sua arma reduzindo a probabilidade de acerto, alterando o número a ser obtido (por exemplo, para três ou mais), o inverso se daria se ele tentasse a mesma ação usando uma pistola 380 à longa distância. Este tipo de arma não é ideal para esta ação ele teria um redutor (ou penalidade) ao desenvolver a ação e o número desejado para um sucesso poderia subir de cinco para seis, ou seja, muito mais difícil de se conseguir.

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Luneta utilizada para visualizar alvos à distância, geralmente acoplados a armas de longo alcance para aumentar a precisão do tiro.

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5.4 A NECESSIDADE DA COMUNICAÇÃO

O existir do homem só é possível por meio da comunicação. Ela permeia toda a vida cotidiana, desde o nascimento ela influencia o modo de viver do indivíduo, pois a criança percebe que, pelos sons e atitudes pode obter as coisas que deseja além de poder exprimir o que sente em cada situação. O homem encontra-se em constante interação com o seu meio e, para isso, ele se utiliza da comunicação. Ela envolve fenômenos, como elementos sociais que ocorrem entre as pessoas e dentro de cada uma delas, em contextos interpessoais, grupais, organizacionais e de massa. A comunicação interpessoal ocorre no contexto da interação face a face. Entre os aspectos envolvidos nesse processo estão as tentativas de compreender o outro comunicador e de se fazer compreendido. Incluem-se ainda percepções pessoais, a possibilidade de conflitos e de persuasão entre comunicadores, que podem ser intensificados ou reduzidos pela comunicação. não existe apenas um agente emissor e um receptor, mas uma troca entre as pessoas, tornando um sistema de interação e reação, ou seja, um processo recíproco, que provoca, a curto ou longo prazo, mudanças na forma de sentir, pensar e atuar dos envolvidos (SILVA, 2005, p.2).

Ainda de acordo com Silva (2005, p.18) a comunicação existe no momento em que se estabelece uma relação, pois se entende por relação todo o processo de entendimento entre duas pessoas com conhecimentos familiares ou parecidos, entre outros, e tais conhecimentos podem ser facilmente agregados ao indivíduo por meio da leitura.

5.5 DEFINIÇÕES DE LEITURA

A idéia da palavra leitura nos desperta geralmente a noção de que o que vai ser lido está escrito em palavras, “o ato de ler é usualmente relacionado com

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a escrita, e o leitor visto como decodificador da letra” (MARTINS, 1990, p. 11). Mas “isto não é verdade”, lemos o mundo a nossa volta a todo o momento, lemos sinais de trânsito, o clima, os sintomas de uma doença, uma obra de arte, uma peça, um filme entre outras coisas, além da palavra escrita propriamente dita. A aprendizagem da leitura começa logo nos primeiros momentos da vida: Desde os nossos primeiros contatos com o mundo, percebemos o calor e o aconchego de um berço diferentemente das mesmas sensações provocadas pelos braços carinhosos que nos enlaçam [...]. Começamos assim a compreender, a dar sentido ao que e a quem nos cerca. Esses também são os primeiros passos para aprender a ler (MARTINS, 1990, p.10).

Ainda de acordo com Martins, a leitura pode ser feita de três formas:



sensorial: quando apenas registramos o que está escrito (isto se aplica a qualquer suporte de texto);



emocional: quando entra em jogo o envolvimento do leitor com o “texto” lido;



racional: quando o que vai ser lido ganha um status elevado à condição de arte, de coisa séria, quase científica.

Martins ainda defende que: a leitura racional acrescenta à sensorial e à emocional o fato de estabelecer uma ponte entre o leitor e o conhecimento, a reflexão, a reordenação do mundo objetivo, possibilitando-lhe, no ato de ler, dar sentido ao texto e questionar tanto a própria individualidade como o universo das relações sociais. E ela não é importante por ser racional, mas por aquilo que o seu processo permite, alargando os horizontes de expectativa do leitor e ampliando as possibilidades de leitura do texto e da própria realidade social (1990, p.66).

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No RPG vemos que essas três formas de leitura se misturam, sendo que o jogador “enxerga” o texto (ou a situação), que caracteriza a forma sensorial; esta leitura desperta sentimentos, pois o leitor não só está construindo o texto, mas ele, de certa forma, é o texto, e o que é lido tem importância fundamental para o desenvolvimento do jogo e sua conclusão.

5.5.1 O RPG e o mediador da leitura e da informação

Em uma mesa de RPG, existem pessoas com diferentes vivências, às vezes culturas e idades também diversas, sendo assim os seus personagens são influenciados por essas vivências e experiências extra-jogo, isso contribui para o crescimento intelectual de todos que participam do jogo. Em uma ambientação ou descrição de ações dentro do jogo é possível sempre ouvir frases como: “igual aquele filme”, “assim como ele fez naquele livro”, “sabe aquela música?”, “na parede tem um quadro assim”. Esse tipo de adendo faz com que desperte nos jogadores, ou no mestre, a vontade de querer saber mais para que possa interpretar ou visualizar melhor a imagem ou a ação a ser descrita oralmente. Isso não apenas no RPG, é comum o emprego de outras fontes como auxiliares para a explicação de algo, principalmente em uma sala de aula onde o professor se utiliza de aparatos para fazer com que sua explanação se torne mais inteligível. Conceitos de física, química e outras ciências são empregados também com freqüência. Na maioria das mesas de RPG é convencionado que o que você sabe, o seu personagem também sabe. Com exceção somente se este conhecimento acabe por cair em discordância com o mundo criado, por exemplo, um cavaleiro medieval não conseguiria projetar um motor a combustão, no entanto saberia os princípios de se selar um cavalo. Outra contribuição do jogo para a formação de novos leitores e o incentivo a leitores pouco assíduos, é tirar deles a “preguiça mental” e a falta de motivação apontada por Ezequiel Theodoro da Silva em seu livro “Leitura na escola e na biblioteca” de 1986.

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O RPG faz com que o indivíduo leia quase sem perceber, pois faz isso para superar desafios propostos por um ambiente dinâmico e fantástico, a vontade de ser um herói ou de fazer com que a história não acabe.

5.6 O BIBLIOTECÁRIO E O RPG

Ao buscar em bases de dados e acervos de bibliotecas do Brasil e até internacionais, notamos uma escassez de trabalhos que mostram como o RPG pode ajudar em uma unidade de informação, ou como o uso deste jogo por um profissional bibliotecário colabora no incentivo à leitura ou escrita. O Manifesto da UNESCO sobre Bibliotecas Públicas traz em seu texto os seguintes itens, que consideramos o cerne do RPG: As missões da biblioteca pública relacionadas com a informação, a alfabetização, a educação e a cultura são as seguintes: [...] – estimular a imaginação e criatividade das crianças e dos jovens. [...]. – apoiar a tradição oral [...] (UNESCO, 1998, p.3).

Já em 1986, 8 anos antes de ser redigido este Manifesto, Faria (1995) indicava que a freqüência com que os cidadãos utilizavam a biblioteca caia cada vez mais, talvez porque nesta época estava se propagando o uso da TV e do rádio com maior intensidade. Neste período também tinha-se o livro como o principal produto da biblioteca, o que não mudou muito desde então, pois não é raro encontrarmos audiotecas, videotecas, pinacotecas e outras “tecas”, desvinculadas totalmente do sistema de bibliotecas, seja no meio acadêmico ou nas demais redes de bibliotecas públicas espalhadas pelo Brasil. Um outro problema que enfrentamos nas bibliotecas brasileiras é a falta de leitura dos profissionais, uma vez que a grande maioria não lê, não tem como indicar para os usuários informações pertinentes as áreas que não sejam as mais procuradas e/ou consultadas. Mas essa é uma discussão para ser feita em outro momento.

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Conseqüentemente questionamos se é possível implementar um jogo como o RPG em uma unidade de informação cujos bibliotecários não têm noção nenhuma do que é o jogo, ou mesmo dos assuntos relacionados a ele, e ainda, como se utilizar desta ferramenta multitextual, se temos na prática apenas uma “biblíon téké13”, com pessoas tidas como guardiãs do conhecimento e da informação, que não conhecem o acervo tão bem como deveriam. Se isto continuar acontecendo, teremos cada vez mais a Internet, a TV e o cinema empurrando o que quiserem aos nossos usuários, e estes as terão como únicas fontes de informação. Afinal os bibliotecários, em sua grande maioria, não sabem mostrar o que possuem em seus acervos, se prendem a eles de forma desesperadora, em busca da construção do conhecimento, tornando-se “geeks14”.

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Do grego: biblíon: livro e téké: caixa, depósito. Sinônimo de NERD, nomes dados aos aficionados por ficção científica e afins (Jornada nas Estrelas, Star Wars, Matrix, quadrinhos, etc.), geek soa mais como aficionados em tecnologias e internet. 14

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6 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

6.1 UNIVERSO E MEIOS DE PESQUISA

Nessa pesquisa utilizamos o questionário como forma de coleta de dados, na execução de observação participante para melhor entendimento do jogo, além das fotografias dos locais para documentação dos suportes utilizados para leitura. A observação nos trouxe informações sobre a realidade dos sujeitos em seus próprios contextos e o questionário identificou esses indivíduos e seus hábitos de busca, coleta de informação e demais dados específicos. Fotos dos locais de jogo, evidenciaram o RPGista e os locais repletos

de

livros, filmes, revistas, material sonoro, entre

muitas

outras

representações artísticas como esculturas, pinturas, maquetes, em sua maioria realizadas pelos próprios jogadores, com o objetivo de uma melhor visualização dos ambientes construídos mentalmente durante as sessões de jogo.

6.2 SUJEITOS DE PESQUISA

Os sujeitos desta pesquisa foram seis mesas de RPG, sendo duas de Storyteller, outras duas de AD&D e mais duas de GURPS, para comparar os sistemas e os tipos de leitura que cada grupo opta ao longo do desenvolvimento do jogo. Os sistemas escolhidos foram os mais populares e conhecidos pelos jogadores e outros pesquisadores, e apresentavam distinções fundamentais entre elas, Storyteller trabalha com o período atual, mas fantástica, e privilegia a interpretação; AD&D é um sistema medieval, épico, privilegia a aventura e o heroísmo, como todo conto épico. Já GURPS é um sistema genérico e que engloba diversos gêneros de ambientação e cenário. Foram contatadas 29 pessoas, de ambos os sexos, de idades variadas, tendo também formações distintas, apenas 16 responderam ao questionário (Apêndice 1) estas foram separadas de acordo com o sistema de jogo que se identificavam quando abordadas pelo pesquisador.

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7 ANÁLISE DE RESULTADOS

Após a aplicação do questionário podemos confirmar alguns fatos afirmados pela literatura disponível e outros completamente opostos.

7.1 QUESTIONÁRIO

Um dos itens avaliados no questionário foi a população de jogadores de RPG de Londrina, que segundo as respostas, é jovem, caracteriza-se em maioria dos 21 aos 30 anos, e de gênero quase exclusivamente masculino, com exceção de uma pessoa apenas do gênero feminino. A idade dos jogadores em comparação com outros trabalhos, como o de Pavão (2000) e Rodrigues (2004), feitos em São Paulo, mostra que a faixa etária e gênero dos participantes do jogo não se alterou tanto nos últimos anos, o jogador continua sendo jovem, com formação escolar acima do ensino médio ou cursando ensino superior. Sobre a pluralidade de culturas que falávamos anteriormente, podemos ter uma nítida noção deste fato com as respostas dos mesmos em relação a sua formação educacional; dentro dos grupos temos acadêmicos de diversas áreas: Serviço Social, Filosofia, Direito, Administração de Empresas, Física, Engenharia Elétrica, Letras, Design Gráfico e História. Os graduados são dos cursos de: Computação, Psicologia, Direito e Direito/Filosofia15, sendo a maioria de instituições públicas. Para tornar um pouco mais interessante estes dados apresentaremos os grupos, tal qual são na realidade, uma vez que os questionários foram identificados de acordo com o grupo que este pesquisador abordou. Alguns pertencem a mais de um grupo, sendo assim, estes serão identificados em negrito.

Grupo de AD&D Estudantes - Física (mestre) - Administração 15

Este jogador cursou duas faculdades.

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Graduados - Direito e filosofia (dupla formação) - Direito - Computação - Ensino médio

Grupo de Storyteller: módulo Mago: a ascensão Estudantes - Física (mestre) - Filosofia - História - Serviço Social - Letras - Direito Grupo de GURPS, suplemento Space: Estudantes - Não informou (mestre) - Letras - Física e Engenharia Elétrica - Física Graduados - Psicologia Outro dado interessante com relação à escolaridade foi a ocorrência de cinco dos respondentes terem tido completa formação em instituições públicas, diferente do que imaginávamos quando começamos este estudo; o que pressupõe uma renda menor e, sendo assim, uma quebra no estigma de que seria um jogo para classe média/alta, que é uma das características da primeira geração de jogadores. Os indivíduos apontaram que foram apresentados ao jogo, em sua maioria, por amigos, em conversas informais e nas anotações da observação participativa, os mesmos relataram fatos como: “[...] eu via os caras jogando e achava coisa de doido, meu amigo passava a noite fazendo isso, daí um dia fui com ele, montei um personagem bobinho e tô jogando com ele há dois anos, apaixonei.” Até meados dos anos 2000 tinha-se o AD&D como sistema mais popular entre os jogadores, no entanto este quadro mudou, Storyteller aparece como favorito dos respondentes, entre as alegações de preferência pelo sistema, em linhas gerais, foram destacados a sua liberdade e dinamismo.

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O sistema Storyteller conta com um sistema de regras simples e dinâmico, prima-se pela interpretação, não pela sorte, os dados em muitos casos são raramente usados, ou dispensados, como no caso de um live action16. Em

anexo

trazemos

exemplos

das

planilhas

para

melhor

visualização, a primeira mostra a ficha de GURPS (Anexo A), considerado por muitos jogadores como um sistema complexo, mas também completo e realista, os cálculos de peso, carga, dano, precisão de ataque etc. são feitos com freqüência. Diferente do AD&D este sistema permite que se ataque membros do corpo de um oponente, por exemplo, danos a partes do corpo nem sempre são letais ao personagem, tal complexidade é compensada, só são utilizados neste sistema dados de seis faces. A seguir a ficha de AD&D17, (Anexo B) também considerada complexa, nela são necessários cálculos para cada ação de ataque, defesa contra magia, além de trabalhar com porcentagens para inúmeras ações, estas são obtidas com a rolagem de um dado de 10 faces da seguinte forma: o dado é arremessado duas vezes, uma para a dezena e outra para a unidade, muitas destas regras são ignoradas por mestres que preferem dar uma maior liberdade ao jogador. Outro fator que complica o AD&D é o fato de utilizar dados de 20, 12, 10, 8, 6 e 4 faces, os dados de 20 faces são utilizados geralmente para testes de atributos (força, inteligência, sabedoria, carisma, constituição e destreza), é também utilizado em jogadas de ataque e testes de resistência. O freqüente uso deste dado deu ao sistema o apelido de D20 System18. A ficha de Storyteller (Anexo C), aqui representada pelo suplemento Mago: a ascensão, é considerada simples, pois trabalha com uma disposição visual dos pontos de atributos, já que ao invés de anotar números em campos, o jogador preenche as bolinhas (também chamada de catotos) referentes a cada habilidade. Para as ações é utilizado o sistema de paradas de dados, em que o jogador soma os “catotos” de um atributo, com os pontos da habilidade a ser testada e o mestre determina uma dificuldade de acordo com a ação a ser realizada, por exemplo: para 16

Live action: do inglês ação ao vivo, quando os participantes do jogo se caracterizam e encenam o jogo, são seções separadas, ou seja, não ocorrem ao mesmo tempo que o RPG jogado “em mesa”, são eventos que reúnem os praticantes deste estilo ocasionalmente; possui regras e até planilha diferenciada. 17 O jogo AD&D não é mais editado, foi substituído pelo D&D (Dungeons & Dragons) que já está na quarta edição, o AD&D corresponde à 2ª edição deste, mas devido a problemas de direitos autorais, e uma completa revisão das regras, subtraíram o Advanced do titulo. 18 D é a abreviatura para dado, sendo assim, D20 é a abreviatura de dado de 20 faces.

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uma maratona, o jogador deve somar seu atributo “vigor” à sua habilidade “esportes” este resultado é a quantidade de dados que o jogador irá rolar; a dificuldade, dada pelo mestre, pode variar de 5 (fácil) a 10 (difícil), sendo este o número que o player terá que obter para realizar a ação com êxito, a quantidade de sucessos obtidos nos dados, somada, dará a perfeição com que o ato foi realizado. A ficha para live action (Anexo D) é uma adaptação da ficha comum, ela é impressa em folha única e com a metade inversa para que se possa dobrar, e tornar-se mais portátil, o sistema de definição de sorte é o “jan-ken-po”19, que não necessita uma superfície para a rolagem dos dados, o que também é uma adaptação para tornar o jogo possível em locais diferentes, sendo o jogo dinâmico e não estático, ou seja, os personagens andam, saem do lugar, não há um palco. Ele pode ser jogado em qualquer espaço. A popularidade do sistema Storyteller se confirma também quando questionados sobre a habilitação dos mesmos para conduzir uma aventura (mestrar), 6 indivíduos responderam que mestram. Seis ocorrências do sistema Storyteller foram contadas, sendo assim, todos narram o referido sistema e um outro, estando empatados os sistemas GURPS, D&D e AD&D com duas ocorrências cada. A inspiração para jogar RPG, nos grupos estudados, quase foram equiparadas entre cinema (15 ocorrências), quadrinhos e livros (14 ocorrências). Em

conversa

com

os

mesmos,

constatamos

que

quando

responderam cinema, nem sempre se referiam à mídia do cinema, mas também transmissões de filmes pela televisão e aqueles no formato de DVD. Os mesmos não aparentaram fazer distinção do cinema (a sala escura onde filmes são projetados) e das produções em si. Na resposta ao item outros, os jogadores relataram ainda outras fontes de inspiração interessantes:

- Cotidiano; - De minha imaginação deturpada; - Conversas de bar; - Dia-a-dia; - Atuação de outros players; - Outros jogadores e dia a dia. 19

No Brasil conhecido como “pedra, papel e tesoura”

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Tendo em vista estas respostas, afirmamos que os jogadores têm uma propensão à leitura de mundo como aporte para as sessões de jogo, dizemos isto verificando que os mesmos buscam inspiração no cotidiano (também dito dia-adia), para melhor interpretar seus personagens e/ou conduzir e criar aventuras. Um dado preocupante aparece na questão que se refere ao “como” os questionados obtém o material que usam para o jogo. Empatados em 12 ocorrências temos a Internet como uma dessas fontes e os amigos. Bibliotecas aparecem com apenas 3 ocorrências e acervo pessoal 8. Este fato constata um “temor” dos profissionais das áreas de Ciência da Informação. Que esse usuário está mudando sua mídia de pesquisa, deixando o livro e partindo para algo mais imediato do ponto de vista de busca e recuperação mais ágeis. Mas, a nossa sugestão para o futuro da Biblioteconomia, é não no sentido de apenas criar métodos para atrair esses usuários de volta aos meios tradicionais, mas também encontrar formas de entrar neste espaço novo que os usuários estão buscando sua informação, adentrar nestes meios e orientá-los, mostrando novos caminhos e apontando novas formas de enxergar a realidade informacional. Quanto à produção de textos, 4 dos 6 mestres participantes redigem as aventuras antes ou depois de jogadas e 4 jogadores informaram ter produzido algo relacionado ao jogo recentemente, no caso: sites (3), contos (3) e artigos (2). Detectamos ainda que 50% dos jogadores mantêm um diário das aventuras jogadas. Questionados sobre o que é ler, os RPGistas, responderam basicamente o mesmo, a maioria lê para adquirir conhecimento e informações, poucos o fazem por lazer, apenas 2 ocorrências que utilizam a leitura para ambos; os casos: construção do conhecimento e entretenimento.

7.2 OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE

Durante o processo de coleta dos dados, foram observadas as mesas de AD&D e Storyteller, mas não houve a possibilidade de acompanhar seções de jogo do sistema GURPS.

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A observação foi utilizada como apoio ao questionário, de certa forma serviu para verificar se as respostas eram condizentes ou não. Ela foi realizada durante três seções de jogo de cada sistema. Notamos

uma

completa

conformidade

com

as

respostas,

principalmente com relação à fonte de inspiração para as aventuras. É comum ouvir os jogadores citarem frases de filmes, trechos de livros, ações de determinado personagem em determinada série de TV ou filme, além de personagens de quadrinhos (tanto de quadrinhos americanos como quadrinhos japoneses). É evidente também uma invasão cultural grande do Oriente no cotidiano dos jovens, camisetas, nomes de personagens e citações a diversas animações nipônicas estão presentes durante todas as seções de jogo dos sistemas observados, a saber, as animações identificáveis: Naruto, Uchuu Senkan Yamato (no Brasil com o nome Patrulha Estelar), Pokémon, Dragon Ball, Akira, Samurai X, entre muitos outros.

Figura 6 – Parte do acervo da K2 Mangá Point, loja especializada em material nipônico (mangás e animês) mas com espaço para RPG e cardgames

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Também percebemos que durante as seções de jogo não é comum ver jogadores escrevendo as aventuras, os que mantêm diários escrevem-nos após as seções em suas casas, mas pontos importantes e tópicos para sua redação são anotados quando se faz necessário. O mestre observado era o mesmo nas duas mesas, ele sempre trazia consigo algumas anotações e textos, além dos livros básicos do jogo e alguns suplementos. Este também fazia anotações pontuais e não redigia nada muito longo. Na fala e comentários dos participantes do jogo, ficou evidente uma boa freqüência em atividades culturais, tais como cinema e teatro além de um dos participantes da mesa de AD&D ter assistido uma apresentação do Festival de Dança de Londrina Não ficou evidente a utilização da biblioteca nas ações de preparo para o jogo ou até mesmo em atividades cotidianas. Quando levantada a questão ambos os grupos relataram que preferem a Internet, era mais fácil de achar o que se quer e muito mais prático do que se deslocar a lugares que nem sempre dispõe de materiais atualizados, muito menos em termos de lançamentos literários e outras mídias. Um dos jogadores até citou que certa vez tentou achar algo na videoteca da UEL mas não obteve êxito. Vale ressaltar que devido ao fato do pesquisador ser um jogador de RPG há mais de 10 anos, podemos inferir que tenha se “cegado” para certos acontecimentos dentro do jogo, fazendo com que muitos dados possam passar despercebidos, porém um esforço de imparcialidade e neutralidade foi feito, mesmo sabendo que tal neutralidade na poderia ser alcançada completamente.

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8 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Após analisados os dados coletados em campo e a literatura disponível concluímos que o RPG em Londrina realmente contribui para o incentivo à leitura, mas de forma indireta. A comunidade RPGista da cidade é composta em sua maioria por membros da terceira geração de jogadores, isto é evidente quando observamos a quantidade de jogadores que relatam a preferência pelo sistema Storyteller, e como afirma Pavão (2000), a inclusão das mulheres neste segmento. Os jogadores londrinenses buscam informações acerca de outras culturas e mídias que extrapolam os limites do jogo, assistem filmes e consultam diversas produções com o intuito de enriquecer suas interpretações, seja como mestre ou como jogador. A amizade é a grande motivadora, tanto do jogo quanto do tipo de leitura consultada pelos jovens. A leitura está, grande parte do tempo, relacionada com quadrinhos e material “fantástico”, e estes servem para que os players possam ter um “leque” de opções quando inseridos no jogo. Ações de heróis de quadrinhos são reproduzidos na maioria das seções de jogo. Apesar de não termos consultado nenhum jogador nesta pesquisa que tenha produções culturais não literárias, como escultura, pintura, desenho, entre outros; é de conhecimento deste pesquisador diversas produções relacionadas a outros suportes. Um exemplo que destacamos na Figura 07, que ilustra a produção de fãs de animê e mangá na revistaria K2, especializada neste tipo de material. São esculturas feitas em resina, chamadas Garage Kits20.

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Do inglês: kit de garagem – feitos por escultores amadores e fãs de certa produção pop, são muito relacionados a fãs de animê e mangá, mas podem ser de entusiastas de outros gêneros de cultura popular.

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Figura 7 – Garage Kits de fãs de animê e mangá da K2 Mangá Point

Antigamente eram comuns miniaturas de chumbo que eram vendidas sem pintura; feita posteriormente pelo comprador, mas sendo o chumbo um material tóxico seu comércio foi suprimido, atualmente há pessoas que produzem suas próprias miniaturas de chumbo artesanalmente.

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Na atualidade o RPG começou a reviver os wargames com o D&D 3a edição, que trouxe de volta a miniatura para as batalhas, tornando as ações mais visualizáveis e criando um outro gênero, chamado de: Jogo de miniaturas.

Figura 8 – Aventura de D&D 3a edição utilizando tabuleiro e miniaturas.

A figura acima (figura 08) mostra como se mesclam o jogo de miniaturas e o RPG tradicional, onde além de declaradas as movimentações, elas também podem ser observadas no tabuleiro. Findamos aqui um trabalho que visa engrandecer não só a visão dos bibliotecários sobre o jogo, mas também de todos aqueles que com ele tiverem contato, desmistificando o jogo e abrindo novos caminhos para a leitura no Brasil e quiçá no mundo.

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APÊNDICES

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APÊNDICE 1

48 Questionário Sou aluno de Biblioteconomia da UEL e estou desenvolvendo o meu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) cujo tema é: O RPG como incentivador da leitura. Agradeço a sua colaboração no sentido de responder este questionário. Fernando José Correia

1 Idade:

10 a 15 16 a 20 21 a 30 31 a 50 mais que 50

2 Gênero: 3 Escolaridade:

masculino  feminino  ensino básico incompleto  ensino básico completo  ensino médio incompleto  ensino médio completo  ensino superior incompleto  ensino superior completo Curso:__________________________________

3.1 Sua formação vem de: Ensino básico  Instituição pública Ensino médio  Instituição pública Ensino superior  Instituição pública

 Instituição privada  Instituição privada  Instituição privada

4 Como conheceu o RPG? Feira, evento Internet Faculdade Amigos Jornal, revista Outro______________________ TV Colégio  básico  médio _____________________________ 5 Que sistema prefere?  Storyteller  GURPS  AD&D  3D&T  D&D (3a/3.5)  Porquê?_____________________________________________________ 6 Mestra algum sistema?  Sim (assinale apenas os mais freqüentes)  Não  Storyteller  AD&D  3D&T  D&D (3a/3.5)  GURPS  Outro________________________________ 7 Onde busca inspiração para interpretar e/ou mestrar RPG? (esta questão admite múltiplas respostas)  TV Quadrinhos  Cinema  Teatro  Livros  Outro________________________________________________________

49 8 Tem acesso a esse material por meio de:  Bibliotecas  Amigos  Acervo pessoal  Outro_______________________  Internet 9 Redige as aventuras antes ou depois de jogadas? (No caso do mestre)  Sim  Não 10 Possui alguma publicação ou produção artística recente relacionada com o RPG?  Sim  Não  Fanzine  Artigos  Escultura  Blog  Contos  Direção/produção de teatro/cinema  Site  Pintura  Outros________________________________________________ 11 Mantém um diário das aventuras jogadas?  Sim Não 12 Para você, ler é: ________________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________________

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ANEXOS

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ANEXO A Planilha de GURPS

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ANEXO B Planilha de AD&D

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ANEXO C Planilha de Mago: a ascensão

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ANEXO D Planilha de Leis da Noite (live action)

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GLOSSÁRIO

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GLOSSÁRIO

Animê – Desenho animado de origem japonesa. Ex.: Dragon Ball, Pokémon, etc.

Anões – Diferente da vida real, onde o nanismo é uma característica genética rara, nos livros de Tolkien, existe uma raça inteira com características peculiares chamados de Anões, estes também possuem estatura diminuta, mas uma estrutura óssea e muscular mais resistente do que os humanos. A história dos anões é baseada na mitologia nórdica. Tal raça possui um desentendimento com a raça dos Elfos, outra raça existente apenas em universos de fantasia. Aventura – cada história criada pelo narrador/mestre tem o nome de aventura, um conjunto de aventuras usando o mesmo sistema, o mesmo mundo e os mesmos personagens é chamada de campanha. Bushidou – código de conduta do samurai.

Campanha – uma seqüência ou conjunto de aventuras ligadas por alguma característica em comum (geralmente personagens). Cardgames – em tradução livre: jogos de cartas. São jogos de estratégia, complexos em sua maioria, e que basicamente são duelos entre os jogadores. A marca mais conhecida de tais jogos é Magic: the gathering, que possui uma versão online outro mais recente mas de notória presença entre os jovens de todas as idades é Pokémon. Cenário – pano de fundo para as histórias, é o ambiente em que se desenvolvem as histórias narradas.

Dados multifacetados – para se jogar RPG se utilizam dados com várias faces, são encontrados dados com: 4, 6, 8, 10, 12 e 20 faces. Alguns sistemas se utilizam apenas de um ou mais, outros como o D&D de todos eles.

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Dungeons & Dragons – primeiro sistema de RPG do mundo, seu cenário é a Era Medieval, mas sob o olhar da fantasia e não da realidade, embora possa ser adaptada para uma maior realidade.

Elfos – o povo dos Elfos, é considerado muito belo, muito semelhantes aos humanos, porém com uma beleza inconfundível e podem ser facilmente reconhecidos pois possuem orelhas pontudas, são característicos de cenários medievais, como D&D, e remontam a mitologias européias; o fato destes serem inseridos no RPG se deve basicamente a Tolkien, e seus livros “O Senhor dos Anéis”. Grupo – designa uma equipe de aventureiros dentro e fora do jogo, ou seja, um grupo de jogadores, ou um grupo de personagens. GURPS – Generic Universal Roleplay System, sistema de RPG.

Halflings – os Halflings são um povo do mundo de fantasia de Dungeons & Dragons, de estatura diminuta mas ágeis e astutos, geralmente são espiões, ladrões e outros tipos de aventureiros que necessitem da astúcia e habilidades de ocultamento que esta raça proporciona.

Hobbits – habitantes da Terramédia criada por Tolkien, são a base para a criação dos halflings de D&D, são considerados um povo pacato que nunca abandona o lugar onde vivem, O Condado. Bon vivants por natureza, são ligados ás coisas simples da vida, á erva de tabaco, cerveja e boa comida. Jogador – quem interpreta os personagens dentro das histórias criadas pelo mestre.

Mangá – nome que utilizado para designar revistas em quadrinhos originárias do Japão. Mestre – também chamado de narrador, o mestre tem a função de criar as histórias nas quais os jogadores irão interpretar seus personagens. O mestre atua como

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deus, juiz e júri em uma história, ele sabe tudo a respeito do mundo em questão e do sistema, bem como a vida e o que pensa cada personagem. Pode-se dizer que ele é onipresente e onisciente. Mundo – é a união de vários cenários de uma mesma época, é mais comum o uso de mundos em RPGs de fantasia medieval, uma vez que em títulos de cenário contemporâneo (Vampiro, por exemplo), o mundo é o mesmo em que vivemos, apenas com poucas adaptações. NPC – non-player character: em livre tradução, personagem não jogador. Este termo é utilizado para designar os personagens controlados pelo mestre, ou seja, qualquer personagem que não é interpretado pelos jogadores.

Orc, ogro – monstros comuns em histórias medievais de fantasia e também nos contos populares da Europa. Personagem – cada jogador tem seu personagem, o papel do jogador é interpretar seu personagem baseado nos conhecimentos que tem sobre si mesmo sobre o sistema utilizado, sobre o mundo e outros fatores. RPG (Role Playing Game) – jogo de interpretação, jogo composto por mestre e jogadores, onde o mestre é responsável por criar uma história em que os jogadores irão inserir seus personagens e interpretá-los de acordo com o cenário e o sistema. Criado na década de 70 nos Estados Unidos. Samurai – guerreiro medieval japonês.

Sistema – é o conjunto de regras utilizado em cada tipo de jogo, dois sistemas se destacam atualmente Vampiro e D&D, há sistemas nacionais como o 3D&T, que diferente dos sistemas citados anteriormente, é mais simples e também genérico.

Storyteller – sistema popular de RPG realista tem como principais títulos: Vampiro: a máscara, Lobisomem: o apocalipse e Mago: a ascensão.

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