Motriz Jul-Dez 2000, Vol. 6 , n. 2, pp. 113-114
Resenha Religiosidade Pós-Moderna na Cidade ou Urbanismo Pós-Moderno nas Religiões? Magnani, J.G.C. (1999). Mystica Urbe: um estudo antropológico sobre o circuito neo-esotérico na metrópole. São Paulo: Studio Nobel. 143 páginas. Paula Rondinelli Universidade Estadual Paulista
“Da crença em duendes nórdicos ao uso de florais canadenses; do consumo de incenso indiano à prática da acupuntura chinesa; da meditação tibetana ao shiatsu japonês; dos livros de auto-ajuda americanos ao xamanismo siberiano; da bruxaria celta dos índios da Amazônia—, surgia a preliminar e básica pergunta: por onde começar?” Este foi o quadro com o qual Magnani—professor do departamento de Antropologia da Universidade de São Paulo—se deparou: emergiam na metrópole paulistana elementos oriundos das mais diversas tradições, que se entrelaçavam na mais perfeita harmonia, ao mesmo tempo em que pareciam envoltos por uma névoa de religiosidade, diferente da tradicional cristã, sendo estas, rapidamente inseridas no estilo de vida de parte da população. Esse movimento o autor denominou de neo-esotérico ou, mais suscintamente, neo-esô. Tal denominação parece bem apropriada, já que se utiliza do prefixo “neo” para fazer as necessárias diferenciações entre outros usos do termo esotérico. Diante da denominação do movimento abordado, o autor toma uma atitude necessária ao proporcionar um esclarecimento, ao leitor mais desavisado, de que outros estudiosos se diferem em torno de tal nomeação: Amaral (1998) utiliza a terminologia Nova Era, Russo (1993) opta por complexo alternativo, e outras opções denominativas como nebulosa místico-esotérica, também persistem. Outros estudiosos do movimento neo-esotérico, ou como quiserem chamar, colaboram no sentido de estudar partes desse movimento, como é o caso de Martins (1998) e Russo (1993) que pesquisaram as terapias alternativas, Tavares (1998) que manteve sua atenção em torno do uso de práticas esotéricas—ou neo-esotéricas—como meio de diagnósticos de futuras doenças, ou como Barroso (1998) que contornou o tema da siddha-yoga. É aí que reside a maior contribuição que a obra de Magnani vem trazer para o leitor, que é um mapeamento generalizado de espaços neo-esotéricos da cidade de São Paulo. O que este autor procura a ordem em meio ao caos em que se apresenta o movimento neo-esô; qualquer tipo de regularidade entre práticas e praticantes representam considerável valia nessa tarefa. E, então, emer-
ge desse quebra-cabeças, a questão que o autor coloca: “por onde começar?”. Com o intuito de desvendar—ou desbravar—o movimento neo-esô, o autor opta, inicialmente, por um levantamento de todos os espaços, na metrópole paulistana dedicados à qualquer espécie de prática neo-esotérica, por meio de jornais, revistas, folders, cartazes, entre outros meios de divulgação. Através da ordenação dos dados coletados, o autor classificou as práticas e os espaços de acordo com suas funções, o que resultou no seguinte quadro: - Espaços: 1) Sociedades Iniciáticas; 2) Centros Integrados; 3) Centros Especializados; 4) Espaços Individualizados; 5) Pontos de Venda. - Práticas: 1) Divulgação e Formação; 2) Terapias; 3) Vivências. Após a catalogação dos espaços existentes, bem como de suas práticas, verificou, o autor, a quantidade deles em cada bairro paulistano, encontrando, dessa forma, uma mancha neo-esô em bairros de camadas média e média alta. Tal resultado se justifica, pois é nesses locais que se encontram pessoas com condições de pagar pelos serviços oferecidos nos espaços. Segundo a pesquisa realizada pelo autor, o bairro neoesô campeão em quantidade de espaços foi a Vila Mariana, já que, além de ser um bairro de camada média, ainda possui acesso direto ao metrô, o que facilitaria a transição de pessoas de outros locais da cidade até a mancha. Ao focalizar o bairro de Vila Mariana, o autor verifica outros tipos de regularidades no movimento estudado, e insere outros conceitos no estudo: o de trajeto e o de circuito. Para ele, a idéia de circuito, como um conjunto de espaços que são identificados na paisagem urbana, apenas se torna “viva” quando encontra a noção de trajeto, visto que essa se mostra quando usuários circulam transitando em diversos pontos do circuito ou da mancha. Outro ponto que merece destaque, é o que o autor chama de “narrativa de base”. Tal denominação tem como objetivo agrupar o discurso presente no movimento neo-esô. Assim, as emergências de uma nova era e de um novo paradigma—
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fruto de uma ligação entre ciência moderna e sabedorias antigas—além da falência de religiões institucionalizadas, pertencem a um discurso presente em todas as mais diversas faces do movimento estudado. Enfim, com tantos pontos esclarecedores acerca do movimento neo-esotérico, a obra Mystica Urbe se mostra de fundamental importância para estudiosos da contemporaneidade, sejam eles antropólogos, psicólogos, sociólogos ou profissionais da área da educação física, pois proporciona um panorama do neo-esoterismo que permanece em constante crescimento na cidade de São Paulo. No caso dos profissionais de educação física, nunca é demais lembrar que as chamadas práticas corporais alternativas se dão nesses locais. Além disso, Mystica Urbe termina por ser um modelo de pesquisa, uma vez que o autor soube se valer tanto de fontes originais, quanto das mais clássicas das ciências sociais.
Referências Amaral, L. (1998). “Sincretismo em movimento: o estilo Nova Era de lidar com o sagrado.” Paper apresentado nas VIII Jornadas sobre Alternativas Religiosas na América Latina. São Paulo. Barroso, M.M. (1998). “Deus é diferente, mas não é desigual de mim: a produção da imanência mas práticas de meditação do Siddha-Yoga.” Paper apresentado nas VIII Jornadas sobre Alternativas Religiosas na América Latina. São Paulo. Martins, P.H. (1998). “As terapias alternativas e a libertação dos corpos.” Paper apresentado nas VIII Jornadas sobre Alternativas Religiosas na América Latina. São Paulo. Russo, J. (1993). O corpo contra a palavra. Rio de Janeiro: UFRJ. Tavares, F.R.G. (1998). “O holismo terapêutico do âmbito Nova Era no Rio de Janeiro.” Paper apresentado nas VIII Jornadas sobre Alternativas Religiosas na América Latina. São Paulo.
Nota do autor Paula Rondinelli é Mestranda em Ciências da Motricidade Humana do Instituto de Biociências da UNESP de Rio Claro. Endereço: Departamento de Educação Física Universidade Estadual Paulista Av. 24-A, 1515, Bela Vista Rio Claro 13506-900, SP e-mail:
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