Miguel Branco Press release
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A ssírio & A l vim A ssírio & A l vim
Atelier do artista, 2005
Miguel Branco Press release A Assírio & Alvim tem o prazer de apresentar o livro “Miguel Branco”, 1
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Miguel Branco
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editado em parceria com a ADIAC – Portugal, Associação para a Divulgação
O livro é a primeira monografia sobre a obra do artista, contando com dois textos sobre os 25 anos da sua produção artística. O primeiro, “O Modo Menor” da autoria do crítico Manuel Castro Caldas, faz uma análise dos aspectos estruturais que formam o tecido conceptual da obra, aspectos que se mantêm constantes ao longo de toda a produção e que desenvolvem disAssirio & Alvim
positivos constituintes de um particular ‘tom menor’. O segundo texto, “Measure for Measure”, da autoria do crítico inglês Mark Gisbourne, faz uma leitura exaustiva e cronológica da obra, percorrendo as várias fases, as várias séries temáticas, as diferentes abordagens e influências ao longo dos anos de produção, procurando analisar os aspectos essenciais de uma singular diversidade, constitutivos do trabalho do autor. O design do livro é da autoria de João Brandão. O texto de introdução é de António Veiga Pinto, presidente da ADIAC. O primeiro lançamento do livro realizou-se no Porto no mês de Abril, na Galeria Presença, a par da exposição individual de Miguel Branco “Trabalhos Recentes”, a apresentação do livro foi realizada pelo crítico e escritor Bernardo Pinto de Almeida. O lançamento agora em Lisboa terá lugar na galeria da Assírio & Alvim no dia 7 de Maio às 18h, em simultâneo com a inauguração da segunda parte da exposição “Trabalhos recentes”. Enviamos a imagem da capa, um comjunto de imagens em alta definição para publicação, resumos dos dois textos e um pdf do livro. Agradecemos a melhor divulgação. Exposição e lançamento dia 7 de Maio, 18h, com a presença dos autores na livraria Assírio & Alvim, Rua Passos Manuel, 67 B 1150-258 Lisboa.
Miguel Branco
Internacional da Arte Contemporânea.
Sem título, 1997 Óleo s/ madeira, 17 x 14,5 cm
O modo menor Manuel Castro Caldas (Excertos) Durante cerca de duas décadas, o trabalho de Miguel Branco consistiu sobretudo em pinturas a óleo, figurativas e de pequenas ou muito pequenas dimensões. Um grupo relativamente isolado de esculturas em barro e ferro de 1987-88 antecipa a produção, que a partir de 2005 se tornaria dominante, de coloridos objectos em massa Fimo, também esses enfaticamente pequenos. Bidimensionais ou tridimensionais, dir-se-ia que todas estas obras se caracterizam pelo facto de nelas actuar um dispositivo cénico (e uma disposição retórica): alguém, ou alguma coisa, protagoniza. Mas protagoniza, mais especificamente, de um modo que diríamos “negativo” ou reflexo: como resultado da aridez, pobreza ou inépcia do que é, precisamente, exagerado (o retórico, o cénico, o performativo). Cria-se uma retórica em torno de um silêncio, ou um silêncio em torno de uma retórica – redefinindo, reformulando, os limites e os poderes do protagonismo. (…) Chamamos pintores aos que obsessivamente voltam ao cadáver da Pintura, como a um primeiro ou grande amor, buscando uma plenitude para sempre adiada. Pouco importa se não se encontra isso que no desejo se configura, que no desejo assombra: uma obliquidade habitará a viagem de “retorno”, fará dela uma construção, um construtivismo. Voltar à Pintura contestando-a, abandonando-a, é ainda pouco ou é já demasiado. Antes viver positivamente, produtivamente, a sua falência. Entendendo essa falência como a falência de um “modo maior” – que a pintura de história, com o seu aparato retórico, grandiosas cenas, intrincadas arquitecturas, melhor do que qualquer outra emblematiza – Miguel Branco deixa clara (e quase didacticamente explícita entre 1987 e 1995) a sua dívida para com tradições ditas menores, como a cena de género ou a art animalier. A recusa da escala épica, da proferição empolada ou pomposa, da aliança entre o virtuosismo e o intrincado da composição, é já um gesto político, como é político o correlativo interesse por universos especializados, conotados com uma limitação dos talentos do pintor e implicando uma condescendência relativamente às suas capacidades1. Do estatuto do petit maître, do pintor sem “género definido”, Miguel Branco herda a desvantagem que transformará, com pós-duchampiana intuição, em oblíquo construtivismo.
Vista da exposição, “Pinturas Recentes”, Sala Jorge Vieira, Lisboa 2002
Sem título, 1987 Óleo s/ madeira 30 x 27 cm
Na justa medida A obra de Miguel Branco Mark Gisbourne A natureza criativa da escala existe no momento da produção e não no produto acabado. Em sentido mais amplo, a escala existe para “conferir riqueza” ao conteúdo expressivo de um trabalho artístico e menos no sentido do mero produto material. As pinturas em pequena escala de Miguel Branco são exemplos perfeitos quer deste axioma quer do seu processo expressivo. (…) No entanto há que dizer que os trabalhos de Branco em menor escala não podem de modo algum ser associados à história da pintura miniatural.
1987-1996 Na sua primeira exposição individual intitulada ‘Objectos Discretos’, mostrou as pequenas figuras modeladas em caixas iluminadas e acompanhadas por uma série de desenhos complementares. (…) a noção metafórica de ‘discrição ‘(como objectos ou de outro modo), ficou presente como pano de fundo, o que originou um tipo particular de subjectividade artística e um forte sentido de personalização em termos de prática. Isto conduziu Branco a uma expressão sóbria e mais contida, em vez dos exageros clamorosos de um Neo-Expressionismo, indicativos da pintura americana e alemã dominantes nos anos 80. Ele era agora movido por um novo ‘discurso’, não tanto uma proclamação, mas antes um “murmúrio”, tal como ele o descreve. (...) Foi como resultado desta subjectividade altamente personalizada e de experiências casuais, realizadas no atelier, que Branco encontrou o seu caminho para avançar quando, em 1987, começou a usar uma tábua, primeiramente como paleta, onde foi descobrindo formas imaginárias que surgiam à superfície dessa tábua-paleta. Isto introduziu o artista em dois novos aspectos que se tornariam fundamentais: primeiro, a mudança para a pintura sobre madeira; segundo, o interesse pelas formas tratadas e pelos motivos (deslocados) da pintura do século dezoito.
Vista da instalação “Objectos Discretos”, Galeria Monumental, Lisboa 1988
(…) as “figuras de animais começassem a aparecer como um campo de possibilidades”, para se tornarem no principal tema dos anos seguintes. (…) A pintura da série de galinhas e criação começou em 1990, desenvolveu-se ao longo do verão e continuou até 1991. Uma série particularmente intensa e viva: “foi uma série compacta em termos de tempo e foi crucial no meu trabalho.”, manifestando o que o artista considerou ser um não-motivo – qualquer coisa que ele persistentemente andava à procura – algo que aos seus próprios olhos aparecia como sendo “totalmente vazio de significado”. Em termos de escala, Branco sempre evitou os tamanhos médios e algumas pinturas foram de grande formato (dois metros por um e oitenta), embora progressivamente o artista fosse reduzindo a escala, de modo a criar uma sensação de intensidade material que tornava mais relevante, o que ele chamou o “poder pela concentração e discrição”. Esta busca da escala certa ou da sua ‘justa medida’ não esteve isenta de uma certa preocupação ética e/ou estóica que para Branco tinha a ver com a procura de um específico ‘tom de voz’ que “falasse claro mas em baixo tom”.
Sem título, 1992 Óleo s/ madeira, 22,5 x 30 cm
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Sem título, 1990 Óleo s/ madeira, 24 x 38 cm
1997-2000 O período de dois anos em Londres (1996-98) constituiu uma transição problemática para Miguel Branco. (…) As pinturas reaparecem em 1997 e estas obras reflectem a passagem por um período de dúvida e ansiedade que Branco, como artista, atravessava. (…) No entanto, em cada caso, ao longo do período londrino, a pintura tinha de facto evoluído para uma forma muito mais solta no tratamento da tinta, com reforço nas formas figurativas onde se destacavam cada vez mais as pinceladas. Mas o que foi particularmente importante em Londres foi a mudança radical para uma escala ainda menor das superfícies, que tinham sido cortadas e preparadas por Branco ao deixar Portugal. A sua intenção original era usar estas tábuas menores como primeiros blocos de esboços, sobre os quais registaria apontamentos e/ou imagens das suas experiências em Inglaterra. As pequenas pranchas eram quadradas ou rectangulares, não excedendo a dimensão de um postal ilustrado. É importante perceber-se que este encurtar de escala foi uma mudança vital, estrutural e formal, que lhe permitiu, considera Branco, maior liberdade: “Deu-me uma espécie de ‘distância’ que achava necessária, uma certa reserva e ‘distância crítica’. Isto veio abrir um novo campo de possibilidades: podia pintar o que quisesse através deste meio ‘críptico’ e condensado.”
Sem título, 1997 Óleo s/ madeira, 9 x 12 cm
Sem título, 1997 Óleo s/ madeira, 9 x 12 cm
2000-2004 O mundo de Miguel Branco é um verdadeiro arquivo de ideias e fontes, abarcando tudo, desde a Arte da Renascença até aos cartoons Manga, do horror Gótico até aos espectáculos do bizarro ou à ficção do fantástico. (…) No pensamento de Branco estão mais próximas da noção de mystère de Magritte, no sentido em que trazem referências pictóricas enquanto, ao mesmo tempo, negam qualquer significado visual associado. Mais do que a leitura psicológica ou psico-analítica do Surrealismo francês, Magritte e os surrealistas belgas davam explicações paralógicas do que chamavam mystère, como “a arte evoca o mistério, sem o qual o mundo não existiria” ou “o vazio é o único mistério deixado ao homem”. Na verdade, é este aspecto oculto e/ou este sentido de questão visual que tem que ser entendido, quando Miguel Branco se apropria de imagens históricas de arte ou de outras fontes, em que essas origens diversas de assimilação formam um tipo de equivalência pessoal, tal como foi em Magritte com a justaposição de objectos e palavras sem ligação entre si. Isto faz sentido, quer se fale de Piero della Francesca, vulgares cartoons, ou fotografias extraídas da National Geographic. Nos anos 2000-2002, Branco desenvolveu uma série de imagens em tamanho postal sobre os seus painéis de madeira, servindo-se da tradição pictórica da famosa fête-galante, associada a Antoine Watteau (1684-1721). (…) (…) desmontou todas as referências explícitas da narrativa e fez de cada trabalho nada mais que simples figuras apresentadas em duas ou três poses básicas e frontais. O que restou dos registos Rococó ficou assim reduzido à sua coloração pastel. (…) Depois de 2000, a sua pintura passa a referir e a englobar o extravagante, o pseudo-grotesco e o fantástico. De especial interesse para estes trabalhos figurativos de Branco foram os filmes de Tod Browning (1880-1962), nomeadamente o filme Freaks, realizado em 1932. A ideia de usar formas bizarras, anões, gigantes e outras anomalias fisionómicas como meio-torsos ou cabeças desproporcionadas foi extremamente radical na época desse filme. Na série seguinte de pinturas (2003--2004), Branco passou das figuras para a pintura de rostos(…)
Sem título, 2000 Óleo s/ madeira, 10,5 x 14 cm
Sem título, 2000/02 Óleo s/ madeira, 9 x 12 cm
Contudo, o facto destas possíveis fontes serem pouco visíveis na série de rostos de Branco só reforça o seu distanciamento (expresso já antes) ao dizer, “com todos estes trabalhos, mesmo com os animais, embora menos notório, quis criar qualquer coisa vazia e sem expressão, não uma máscara sarcástica, mas sim um equilíbrio delicado.” Tanto a execução como a coloração da série de rostos são mais sombrias e as personagens disfarçadas criam por certo uma dada mudez visual, que obriga a olhar mais de perto para ver o modo como estão pintadas. (…) toda a superfície está em consonância com os olhos, que por sua vez aparecem apenas como buracos, meras cavidades vazias.
2005-2009
Sem título, 2002 Óleo s/ madeira, 10,5 x 9,1 cm
O ano 2005 foi um ano crucial para o artista. Já vimos em períodos anteriores, momentos de ansiedade e dúvida e, em cada uma dessas ocasiões, ele regressou à escultura antes de encontrar o seu caminho para voltar à pintura. (…) Branco frequentemente fala de filmes, especialmente nos de David Cronenberg, como uma influência especial no desenvolvimento destas esculturas. O realizador desde há muito se tem interessado por todos os tipos de mutação animal, uma mistura que funde visualmente o horror e a ficção científica, o bizarro e o anómalo. Acontece também que Branco associa o seu trabalho ao inquietante e ao fantástico, tal como aparecem em David Lynch. Há também referências transversais a Francis Bacon, artista que admira particularmente. A dicotomia grande arte / arte menor é completamente dissolvida nestas esculturas em cores vivas. Peças tiradas da História Natural, como o extinto Dodo (2005), rivalizam com criaturas fantásticas, como um cavalo sem cabeça e sem cauda, Sem Título (Cavalo Negro) (2005) (…) Algumas peças são semi-abstractas enquanto outras são especificamente homenagens a artistas e trabalhos que Branco admira. Neste caso estão dois exemplos em miniatura segundo o ‘colchão’ Mike Kelley, (2005, 2007) e um pequeno busto de Federico Da Montefeltro, Sem Título (segundo Piero de la Francesca), a partir do díptico famoso do artista italiano (1465-66).
Sem título (a partir de Pierro de la Francesca) 2005 Massa Fimo, madeira e arame, 11,8 x 9,5 x 5,9 cm
Na foto de 2005, no estúdio pode ver-se, na verdade, as diferentes etapas que o Fimo sofre à medida que é trabalhado. O fio metálico forma o esqueleto e a armação; o Fimo vermelho é usado para construir o corpo da peça e dar um tom de carne (não muito diferente da função da base na pintura medieval); e por fim é aplicado o tom definitivo numa fina camada. (…) Os “objectos” contêm várias realidades contrárias de modo que (…) se tornam um compósito de múltiplas camadas de conotações e interferências. Quando se olha para os muitos exemplos de peças presentes na fotografia do estúdio, de 2005, encontramos uma diversidade, que vai do fantástico à maneira de Cronenberg por um lado, até ao naturalista e delicado, no extremo oposto. Os trabalhos criam um universo pictórico do racional e do irracional, um mundo de associações conscientes e/ou de inconscientes estados oníricos. Desde a segunda metade de 2008, Miguel Branco tem experimentado escalas maiores nas suas esculturas (…) e tem voltado à investigação em pintura. As pinturas mais recentes parecem jogar com uma realidade intermédia: umas vezes com o humano e o animal, outras com a deslocação histórica. (…)
Sem título (cavalo negro), 2005 Massa Fimo, madeira e arame, 13,8 x 15 x 4,1 cm
Ao longo deste ensaio tenho tentado dar relevo ao sentido de tensão que percorre a obra de Miguel Branco. Isto é, assinalei o alcance da produção, enquanto ao mesmo tempo tentei dar uma visão (embora parcial) do espelho de consciência em que o artista se empenha. Aquilo que poderia parecer uma contínua mudança persiste, no entanto, dentro de certos parâmetros e aí permanece como um padrão de constância interna. (…) Falei também numa linguagem cifrada e críptica, o que implica por si uma forma de deslocação ou substituição mental e visual. Vimos ainda a vasta quantidade de fontes e o número de possíveis referências lançadas pelo trabalho artístico de Miguel Branco. (…)
www.miguelbranco.com
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