Cultivos Ecologicos - Um Roçado De Alimentos Para A Vida

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Cultivos Ecológicos um roçado de alimentos para a vida

Apresentação A Comissão de Cultivos Ecológicos vem, desde 2001, animando um trabalho em mais de 15 municípios da região do Agreste da Paraíba, resgatando e valorizando os conhecimentos dos agricultores, favorecendo a construção de novos e incentivando a troca de experiências entre as famílias. Essa Comissão, assim como a de Sementes, Água, Saúde e Alimentação, Criação e a Comissão agrária, é parte integrante do Pólo Sindical da Borborema, uma articulação de organizações de agricultoras e agricultores familiares, que vêm juntos construindo coletivamente um novo modelo de desenvolvimento rural, baseados no fortalecimento da agricultura familiar e na agroecologia. Desta forma, a cartilha Cultivos ecológicos: um roçado de alimentos para a vida nasce a partir do acúmulo dos resultados do trabalho dessa Comissão e de um conjunto de agricultoras e agricultores experimentadores que vem testando inúmeras experiências de produção de alimentos sem veneno e sem adubo químico, de diversificação de cultivos, de manejo e conservação do solo, do plantio de árvores, da valorização das plantas nativas, enfim, de experiências de valorização da vida na terra de trabalho.

Pra começo de conversa O modelo de desenvolvimento historicamente proposto pelas elites do país sempre se centrou na forte concentração de terras, na exploração dos trabalhadores e trabalhadoras rurais e no uso indiscriminado dos recursos naturais ao incentivar a monocultura e o uso de agrotóxicos. Aqueles agricultores e agricultoras que tentaram acompanhar esse modelo foram completamente vencidos pela concorrência e acabaram por vender suas terras para saldar suas dívidas. Aqueles que resistiram, tiveram suas terras reduzidas, principalmente por herança e partilha. A redução das terras vem promovendo uma intensa pressão sobre os recursos naturais que, somada ao uso abusivo do pacote tecnológico, se configurou em uma grave crise de insustentabilidade ambiental, social e alimentar. Esse modelo escolhido e executado pelas autoridades do país foi, portanto, retirando dos agricultores e agricultoras seus principais instrumentos de trabalho: a terra e todo seu conhecimento sobre o ambiente e sobre sua forma de trabalhar. Cultivos Ecológicos 01

Diante desse grave quadro de exclusão social ambiental, o Pólo Sindical da Borborema inicia, processo de construção coletiva de um modelo de que os agricultores e agricultoras passam a ser promoção desse desenvolvimento.

e degradação cultural e desde 1996, um intenso desenvolvimento rural em os principais motores da

Dessa forma, o grupo de Cultivos Ecológicos vem contribuindo intensamente com esse processo na medida em que pesquisam, redescobrem, multiplicam e divulgam para todos da comunidade e da região o uso de produtos naturais para o controle e tratamento de pragas e doenças; o reflorestamento a partir do estímulo à produção de mudas em viveiros familiares e comunitários; as estratégias dos agricultores e agricultoras para a recuperação do solo; o uso e manejo das árvores nos diferentes espaços do sítio; a valorização e a conservação das plantas da natureza e daquelas trazidas de fora e que estão adaptadas ao clima da região; a diversificação de cultivos e também as práticas de comercialização dos produtos agroecológicos da agricultura familiar. Para tanto, realizam inúmeras visitas de intercâmbio, participam de reuniões, eventos e encontros de formação, promovem cursos e mutirões. A partilha do conhecimento e a solidariedade entre as pessoas fazem com que essas e muitas outras ações da Comissão de Cultivos Ecológicos e também do Pólo Sindical da Borborema vêm semeando e cultivando um roçado de alimentos para a vida.

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A natureza nossa grande mãe A mata é o roçado de Deus Quando a gente olha para uma mata e vê grandes árvores, muitas outras plantas de médio e pequeno porte, ficamos imaginando quanto adubo foi preciso colocar naquele local, para que todas crescessem em harmonia, sem competição e com saúde. Observamos também que, lá na mata, vive uma grande variedade de animais, sendo muitos insetos. Na mata ninguém colocou adubo, muito menos foi usado agrotóxico para controlar o mato ou matar as pragas. Lá existe capim, cipó, espinheiro, junto com pau-d'arco, cedro, mulungú, angico, côco catolé, umbú, aroeira, jucá, juazeiro, catingueira, feijão bravo, jurema preta, macambira, xique-xique, mandacaru, todos crescendo juntos e produzindo frutos. Na mata, também existem animais. O maior se alimenta do menor e todos vivem juntos. Lá tem formiga para alimentar os pássaros e servir de sobremesa para o tamanduá, tatu, teiú e o peba. Na mata ninguém passa fome e todas as espécies vivem nesse ambiente de competição e equilíbrio. Foi Deus quem criou tudo e colocou cada coisa no seu lugar. Essa perfeição do roçado de Deus deve ser imitada na nossa casa. Devemos criar um ambiente que favoreça a transformação das folhas e galho s em adubo orgânico.

Associativismo Vegetal Padre Antonio Vieira, Sertão Bravo, 1968. Muita coisa mexeu com os meus nervos e o meu sentimento na Festa do Agricultor, recentemente realizada na Paróquia de Milhã. Sertanejo, por dentro e por fora, eu vivi o meu clima natural. E tudo foi direto ao coração com grandes dosagens de adrenalina. Uma Musa logo me chamou a atenção. E foi que todos os enfeites das casas, dos carros, do palanque, do altar, não eram flores artificiais ou flores de jardim, Cultivos Ecológicos 01

que tudo isto é requinte de cidade hipercivilizada. Os adornos e enfeites eram pés de milho arrancados do roçado, com todo o seu viço, com pendão, folhas verdes e espigas de cabelos alourados pelo sol. Reparava tudo com gosto e sabor. Ali bem perto do altar, aqueles pés de milho pareciam bandeiras verdes, soltas em atividade triunfal, cantando nas suas folhas, tangidas pelo vento, o Hino Nacional da fartura, da riqueza, do trabalho. No canto esquerdo do altar havia, porém, um pé de milho que não veio à festa sozinho. Trouxera enlaçado, num grande abraço vegetal, um pé de feijão que se enroscava em todo o seu corpo. E a gente fica a imaginar o que aconteceu. Numa manhã rosada de luz, a leguminosa chega para o pé de milho lhe dá um bom dia alegre, fala da chuva que caíra durante a noite e lhe pede confiante uma mãozinha de ajuda para espiar o sol que nasce- E o pé de milho, garoto mais crescido e de coração compassivo, vendo a sua irmã a debater-se friorenta sobre a terra úmida, num gesto de solidariedade vegetal lhe estende a mão, abre os braços e os dois se abraçam num grande momento de alegria e de expansão. Cresceram juntos. Viveram os mesmos sentimentos. Compartilharam de toda a euforia da natureza e, naquela hora, unidos vieram à mesma festa. Unidos como se fossem da mesma família e tivessem o mesmo destino. Tiveram o mesmo regaço. Disputaram a mesma nesga de sol. Comeram no mesmo prato a seiva gostosa da terra e beberam no mesmo caneco as gOtas saborosas de água. E ali estavam para falar aos homens. Para lhes dizer naquela festa que as competições do interesse, as ambições da riqueza, a luta pela vida, não se resolvem pelo choque de classes ou pelo egoísmo do indivíduo. Os dois ali estavam unidos, mostrando saúde, riqueza, felicidade. As diferenciações profundas do caráter, do gênio, do temperamento não impediram aquele consórcio admirável. E que entre as plantas não há egoísmo. Nem ambições. Na flora há sempre uma doação recíproca, uma troca mútua e constante de Cultivos Ecológicos 01

energias, de elementos vitais. Nesta hora trágica para a humanidade, onde o ódio se fez norma pública do agir, valia ouvirmos a linguagem cristã do pé de milho e de feijão da Paróquia de Milhã.

A experiência de Zé Leal e Maria Luzia: um exemplo de preservação e de amor a natureza José Alves Leal e Maria Luiza possuem 4 filhos, hoje todos casados. O casal mora no sítio Floriano, em Lagoa Seca, desde 1976. Quando vieram morar no sítio, as terras eram praticamente ocupadas com roça, feij~ao e milho. Aos poucos e com muita criatividade, a família foi mudando os plantios e o jeito de trabalhar. Passaram a plantar vários tipos de fruteiras, sendo a laranja e o caju as principais frutas para o comércio. Quando chegaram, as terras eram muito fracas, além de serem enladeiradas. Nos períodos de chuva, as águas carregavam a terra fértil e o paú. Conta que em alguns lugares a terra já não produzia mais. Passaram então a plantar cortando as águas e a construir valas para segurar mais a água no chão. Começaram a juntar todo o bagaço do mato e os restos de cultura para proteger e estrumar a terra. Entre as linhas das fruteiras, a família planta os cultivos de inverno como o feijão, coentro, girassol. Plantam também o guandu e o feijão de porco para adubar a terra. Conheceu essas plantas numa visita de intercâmbio em experiências de agrofloresta em Bom Jardim, Pernambuco. Estão deixando crescer uma área de mata. E neste local, eles ainda plantam muitas árvores da natureza como camunzé, pau d´arco, angico, sabiá e louro. Da matinha, eles retiram as folhas que caem e levam para as frutas, para também ajudar a estrumar a terra. No ano de 2001, Cultivos Ecológicos 01

conta José Leal que carregou mais de 100 balaios de folhas secas para as fruteiras. Em 2002, a família mais que dobrou a quantidade, carregaram 250 de balaios para dentro das fruteiras.Nesta área, a família trabalha com as plantas para produzir estacas e ainda serve como um banco de mudas da natureza que levam para outras áreas do sítio. No lugar que não tem fruteira, aproveitam para fazer roçado de milho, fava e feijão conservando as plantas da natureza como camunzé, louro, angico, cabatã e outras. Para plantar, José Leal conta que nunca utiliza o fogo para assim proteger a vida da terra. Seu sítio é cercado com várias plantas: cajá, cajá-umbú, gliricídia, burra leiteira e outras. Forma com isso uma cerca viva que produz alimentos para casa e para terra. Com mesmo prazer e zelo que a família cuida de seu sítio, cuida também de sua casa e do terreiro. Várias qualidades de flores e árvores embelezam e perfumam o seu arredor. E no oitão da casa, construíram a primeira cisterna de placas do município de Lagoa Seca. Assim a família vem dando seu exemplo de como tirar seu sustento preservando a natureza. José Leal, que se considera um ambientalista, conta: onde não tem roça, tem caju, onde não dá caju, bota laranja, onde não dá fruta nem roça, tem árvores como louro, pau d´arco, angico, jatobá, imbaúba, aroeira, coco catolé, bordão de velho. Assim a terra estará sempre revestida. Quem passeia hoje por suas terras pode Cultivos Ecológicos 01

encontrar mais de 75 variedades diferentes de árvores, 17 tipos diferentes de plantas de remédio e mais de 67 tipos diferentes de frutas. E as plantas de enfeite? Ah! essas eles desistiram de contar porque são muitas, trazidas de vários lugares por onde eles passaram.

Plantio Diversificado: a experiência de Robinho Robinho é um jovem agricultor de Lagoa Seca. Ele mora com sua mãe, dona Ordenira no sítio Retiro. Desde que seu pai faleceu, foram os dois que assumiram o comando do sítio e do trabalho. O sítio da família mede 12 hectares de terra. Separaram 3 hectares para conservar uma matinha e, no restante, eles plantam muita mandioca, feijão de várias qualidades, batatinha, milho, fava, cará preto, inhame, coentro, batata doce, ainda tem uma capineira e uma área de pasto. No sítio tem também manga, jaca, jabuticaba, acerola e caju para o consumo da casa. Robinho desenvolve muitas experiências, muitas delas aprendidas com seu pai, que por sua vez, aprendeu com seu avô. O consórcio de plantas é uma delas. Acredita que o consórcio seja uma coisa muito boa, porque tem chance de explorar melhor a terra. Quando arranca a macaxeira, fica o milho e a fava. De outra forma, a terra ficaria 6 meses desocupada, explica Robinho. Em suas terras, faz 3 tipos diferentes de consórcios: No primeiro tipo, quando inicia o inverno, planta feijão preto de 60 dias em dupla no lombo do leirão. E planta milho comum no bucho do leirão do lado da chuva. Planta em 3 ou 4 leirões para não assombrar o feijão. O milho, segundo Robinho, é muito competitivo. Depois de 90 dias, ele passa a enxada sem Cultivos Ecológicos 01

virar a terra. O milho ainda fica e planta novamente o feijão em todos os leirões. Planta macassa no bucho do leirão, do lado da chuva e planta ainda algumas covas de maxixe e batata doce na cabeça dos leirões. Assim, ele acredita aproveitar bem o inverno e o esterco, garantindo uma safra de feijão de inverno e outra de seca. No segundo tipo, planta, no início do inverno, feijão preto ou carioca no lombo de todos os leirões e em fila dupla. Planta milho comum no bucho, pulando 3 a 4 leirões. Planta também maniva 10 dias depois, no lombo do leirão, entre as fileiras do feijão. Depois de 90 dias, planta feijão macassa no bucho do leirão. O milho ainda fica e a mandioca permanece por mais 1,5 ou 2 anos. Quando chega o inverno seguinte, ele decota a mandioca, planta milho com fava. Planta de 4 em 4 leirões. E onde não tem milho, ele coloca feijão macassa. Dessa forma, aproveita melhor a terra de plantar a mandioca, sem deixar de plantar as outras coisas. Um terceiro tipo de consórcio é feito. Desta vez, planta feijão faveta no início do inverno. Depois de passar 50 dias, Robinho vira a terra e planta batatinha no lombo do leirão. Planta também milho de 3 em 3 leirões e o macassa onde não estiver o milho. A batatinha é uma cultura muito exigente, por isso, sempre aproveita a terra e o estrume com outros cultivos. Para manter sua terra sempre forte, Robinho sempre estruma a terra. Antes, costumava comprar 3 carros de estrume, mas recentemente construiu um curral. Segundo ele, assim ficou bem mais fácil, porque seu gado dorme no curral e dá para juntar um carro de esterco a cada 4 meses. Além do estrume, ele usa, desde 1999, o biofertilizante e a calda bordalesa. Tem sentido resultados muito positivos em suas culturas, apesar de achar que ainda precisa melhorar o adubo para batatinha, para elas aumentarem de tamanho. Mas, sobretudo, Robinho que um dia já usou veneno em suas terras, hoje é um dos grandes produtores orgânicos do município de Lagoa Seca. A partir do uso de produtos naturais, ele se diz satisfeito porque economiza e não está envenenando nem a ele, nem seus parentes e nem que Cultivos Ecológicos 01

compra seus produtos. Veja a prova nas contas do que ele gastava quando comprava veneno e agora, usando produtos alternativos.

Semeio: uma experiência de plantio em equilíbrio com a natureza Seu Antônio, dona Maria e Ivete, a filha mais nova do casal, moram no Sítio Várzea Grande, em Massaranduba. Casados a mais de 30 anos, seu Antônio e dona Maria tiveram 7 filhos, 4 rapazes e 3 moças. A família tem a agricultura como o principal sustento. É da terra que eles tiram os frutos que alimentam seus filhos. E é por isso que eles possuem muito zelo por ela. Há mais ou menos 10 anos, eles conheceram o semeio. Uma experiência que um amigo missionário, o Citonho, trouxe lá do Maranhão. Seu Antônio separou duas 25 braças de um terreno coberto por uma capoeira grossa, 30 quilos de feijão e 1 quilo de milho. E para fazer o semeio, chamou um grupo de amigos para um adjunto. Aí é uma manhã de trabalho. Primeiro, eles abriram nessa área umas 25 varedas. Cada pessoa leva um saco com sementes de feijão e milho e saíram semeando para o lado direito até chegar no final da vareda. Então eles voltam pela mesmo caminho, também semeando para o lado direito. Aí, explica seu Antônio, tem até 2 dias para brocar o mato. É uma festa! Enquanto Ivete traz a água e dona Maria prepara o almoço para a turma, seu Antônio Roberto, Luiz Lopes, Bel, José Carlos, Ari, seu Custódio, Everaldo, José Joaquim, seu Manuel, Loro, Bamam e Gilberto vão cortando o mato de baixo para cima. Podam as árvores maiores, cortam os matos, separam a lenha, as estacas e fazem o rebaixamento. Por fim, deixam Cultivos Ecológicos 01

o basculho ali mesmo. Ele vai virar adubo para a terra. Depois é só esperar a chuva molhar o chão e fazer o feijão e o milho nascer, florar e render os grãos. Segundo seu Antônio, uma das grandes vantagens dessa experiência é que o camarada não precisa limpar o terreno, voltando na área só para colher. Ainda explica que para uma terra laderosa como a dele, o semeio é uma experiência muito boa porque assim a água bate e não leva o caroço nem a terra por causa da cobertura das folhas e garranchos. E são eles, as folhas e garranchos, que apodrecem e viram estrume para a terra. E quanto mais coberto ficar a terra, melhor para segurar o molhado e evitar que nasça mato. É por isso que seu Antônio sempre recomenda fazer o semeio em áreas de capoeira grossa. Como resultado, tem sempre um feijão forte e sadio. Espera colher 4 sacos de feijão dessa área, mais o milho. Mas, segundo seu Antônio, o principal resultado é a união da turma na hora do adjunto ou mutirão como outros preferem chamar. Depois da colheita, seu Antônio deixa a área repousando por 1 ano. Só no ano seguinte é que repete o semeio naquele local. Assim, dependendo do inverno, permite que a capoeira engrosse novamente. A família ainda faz outras experiências em suas terras sem usar o fogo. Em um espaço entre duas capoeiras grossas, seu Antônio abriu um terreno espalhando as folhas no chão, separando os garranchos no aceiro . Ele explica que o tempo transforma tudo em adubo. Neste local, plantou milho em linhas atravessadas. Plantou numa terra escura, úmida, cheirosa e cheia de vida. Seu Antônio ainda cuida com muito zelo de seus cortiços de abelha uruçu que cria desde o tempo de seu pai. Além de seus cortiços, ainda possui um apiário com 7 colméias.

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A experimentação de produtos naturais Manipueira e Urina de Vaca: a experiência de Zezinho Plácido José Plácido do Nascimento, mais conhecido como Zezinho Plácido, é agricultor e desenvolve importante trabalho de experimentação e divulgação de experiências junto ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Lagoa Seca. Zezinho é casado com Maria e juntos tiveram 9 filhos. Moradores do Sítio Lagoa do Barro, possuem uma área de 5 hectares. Em suas terras, a família planta muito amendoim, feijão macassa consorciado com maxixe, feijão mulatinho, feijão preto. Possuem mandioca e macaxeira. Plantam milho, fava e várias verduras. No sítio ainda tem caju, manga, mamão, café de sombra, sementes selecionadas e guardadas desde a época de seus avós. Tem capim na área da barragem e possuem várias plantas de remédio. A família ainda possui gado e uma porca. E no curral, fizeram uma cerca viva de gliricídia. Para manter toda essa diversidade de plantas sempre sadias e produtivas, a família desenvolve várias experiências. Neste folheto, eles irão explicar o uso da manipueira e da urina de vaca. Zezinho conta que aprendeu usar a manipueira para combater a formiga com seu avô. Ensina que para usar devemos tomar algumas providências. Devemos guardar a manipueira em um recipiente tampado. Deixar em repouso por 3 dias para azedar. E na hora de abrir, devemos colocar uma bacia em baixo porque ela espuma. Cultivos Ecológicos 01

Para aplicar nas culturas, Zezinho sempre dilui 1 litro de manipuiera em 20 litros de água quando vai aplicar no feijão. E para as verduras novas, ele usa ½ litro de manipueira para os 20 litros de água, depois vai aumentando a dosagem até chegar 1 litro. Aplica sempre como prevenção, ou seja, antes que a praga se espalhe pela cultura. Zezinho observou que a manipueira, além de controlar a formiga, serve para acabar com a lêndea do feijão macassa, a lagarta da couve, usa ainda no coentro, alface e pimentão. Além de ter percebido que é um ótimo adubo. Há dois anos, Zezinho também vem usando a urina de vaca na batatinha, feijão, tomate, pimentão, alface e no coentro. Pega sempre a urina da vaca que está dando leite. Geralmente, recolhe a urina com um balde logo cedo quando o bezerro vai mamar. Tem sempre o trabalho de colocar um pano no fundo do balde para que o barulho não assuste a vaca. Depois, engarrafa a urina e deixa em um local escuro por 4 dias. É comum que a urina mude de cor. Zezinho afirma que pode guardar a urina por 1 ano. Para aplicar a urina de vaca nas culturas, deve-se misturar 300 mililitros de urina em 20 litros de água. Ou seja, uma garrafinha de 600 mililitros dá para fazer duas bombas de 20 litros. Zezinho explica que serve para todas as culturas e hortaliças e aplica de 8 em 8 dias. E para as culturas de roçado, conta que pode misturar a manipueira com a urina. A urina de vaca é muito rica em nutrientes para as plantas, desta forma, torna-se um excelente adubo. Para usar a urina é bem simples. Na hora da ordenha, leve um balde com um pano no fundo para que o animal não se assuste com o barulho. Depois é só guardar a urina em uma vasilha fechada por pelo menos 3 dias. Na hora de usar, misture meio litro de urina a 100 litros de água para que não queime as plantas. A urina pode ser utilizada em qualquer cultura.

A família fez a experiência de adubar a batatinha só com a urina de vaca. Plantaram uma caixa de 15 quilos de batatinha em 12 leirões. Depois de três aplicações, tiveram como resultado 100 quilos de batatas para venda e mais 20 quilos de batatas deixadas para sementes. Zezinho analisa que é considerada uma produção normal, principalmente por causa da qualidade da batata Cultivos Ecológicos 01

plantada, a baraka, uma variedade que produz pouco, mas que é importante para os agricultores por ser de ciclo curto.

Calda de Fumo: experiência de Otávio Otávio Pequeno Gangorra é casado com Maria e possuem 4 filhos. Moradores do sítio Oiti, em Lagoa Seca, plantam de tudo um pouco em 1,5 hectare de terra. Plantam banana, coco, goiaba, milho, feijão vagem, flores, pimentão, pepino, chuchu, berinjela e muito mais. Otávio estruma sempre o solo com palhada de banana e com bagaços para manter a terra forte e proteger suas plantas. Faz uma cobertura para a terra que, com o tempo, vira adubo. Otávio ensina que essa prática é muito boa para combater a erosão e segurar o molhado na terra. Para manter a saúde de suas plantas, utiliza alguns produtos naturais. Usa a calda de fumo para evitar o ataque de rosca na raiz do pimentão. Coloca ½ quilo de péia de fumo em 5 litros de água. Deixa de molho na água por 4 dias. Depois, quando vai mudar o pimentão, passa somente as raízes na calda pura por 2 minutos. Já utilizou a calda de fumo para pulverizar a lêndea preta na folha do pepino. E o controle foi positivo. Para o controle da lagarta e da lêndea do milho, usa também a folha do angico. Coloca aproximadamente 1 quilo de folha de angico em 5 litros de água. Depois de 3 dias, côa-se as folhas. Depois tem que diluir essa água em 20 litros para então pulverizar. Os resultados foram as plantas de milho bem limpa. Otávio conta que aprendeu com o professor Sebastião Pinheiro que laranjas podres podem controlar as formigas. Coloca 8 laranjas podres em 4 litros de águas. Depois de 3 dias, ele machuca as laranjas e coa. Otávio aplicou ½ litro deste água no formigueiro. No dia seguinte, observou que as formigas estavam mortas. Então repetiu a aplicação, assim acabou matando o formigueiro. Cultivos Ecológicos 01

Calda Bordalesa: a experiência dos irmãos Maciel Severino é agricultor familiar e também representante da Comissão Água e Meio Ambiente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Lagoa Seca. Ele, sua esposa e seus três filhos moram na vila Alvinho. E, quando não vai participar das reuniões no Sindicato, Severino sai sempre bem cedo para trabalhar nas terras de sua família no sítio Almeida. Em 1 hectare de terra, trabalham, além de sua família, outras 4. Sob os olhares atentos de sua mãe, dona Domerina, trabalham os irmãos em um exemplo único de união e partilha. Lá, eles desenvolvem muitas experiências. Plantam inhame, macaxeira, feijão, milho, cará. Produzem, vendem ou doam mudas de várias qualidades como o nim, guandu, leucena e várias fruteiras. Possuem um pequeno pomar com bananas, graviola, manga, caju e uma horta com vários tipos de plantas de remédio e de enfeite. São instrutores de cisternas de placas e estudam diversas formas de melhor aproveitar a água que passa pelo sítio. Possuem uma barragem subterrânea onde estão plantando verduras e feijão vagem. Ainda possuem uma pequena área de mata que estão preservando. Criam cabras e uma garrota. E Severino e seus irmãos têm se especializado na enxertia de limão. Uma técnica que permite colocar uma qualidade diferente de limão no seu pé. Uma experiência que a família de Severino tem usado com sucesso é a calda bordalesa para controlar as doenças das plantas. Contam que aprenderam há dois anos quando José Lichesck, um agricultor do Paraná, veio dar um curso no Sindicato de Lagoa Seca. Desde então, eles vêm usando principalmente nas mudas de limão e no plantio de inhame. Quando suas plantas apresentam os primeiros sinais de ataque, aplicam imediatamente uma combinação de calda bordalesa com o biofertilizante. A experiência tem mostrado bons resultados. Além de acabar com a doença, Severino conta queAs plantas Cultivos Ecológicos 01

passam a desenvolver mais sadias, fortes, ficam mais verdes e, conseqüentemente, produzem mais. Severino ensina como é fácil fazer a calda bordalesa. O produto é feito com sulfato de cobre, que pode ser comprado em casa de agricultura, cal e água. Primeiro, pegamos uma vasilha de plástico com 10 litros de água e misturamos 200 gramas de sulfato de cobre. A vasilha deve ser de plástico porque o sulfato de cobre corrói o ferro. Em outra vasilha, colocamos mais 10 litros de água para dissolver os 400 gramas de cal. Se preferir fazer como Severino, temos que colocar menos água para interar com o líquido do biofertilizante. Misturamos o conteúdo das vasilhas muito bem, para só então misturar os dois líquidos. Mas antes de aplicar nas plantas, temos que fazer o teste do ferro. Para isso, pegamos um pedaço de ferro qualquer, uma faca, por exemplo, e molhamos com o produto. Temos que esperar uns dois minutos e se enferrujar significa que a calda ficou muito forte. Então, temos que colocar mais umas 150 gramas de cal. Devemos fazer o teste novamente. Só devemos aplicar nas plantas quando parar de enferrujar o metal, senão queimará as folhas. Severino recomenda aplicar a calda nos momentos mais frios do dia, ou seja, pela manhã cedinho ou no final da tarde. Segundo ele, é que nos momentos mais quentes o produto evapora e perde o seu efeito. As aplicações devem ser feitas uma vez em cada 15 em 15 dias. Severino ainda observa que a calda deve ser feita na hora em que for aplicar. Ingredientes para 20 litros - 200 gramas de sulfato de cobre - 200 gramas de cal comum - 20 litros de água limpa Material necessário - 3 baldes de plástico - 1 pá de madeira - 1 peneira - 2 canecas de plástico - 1 coador

Modo de preparo da calda bordalesa Em um balde plástico, penere o cal; depois despeje aos poucos um copo de água e mexa bem até formar uma pasta. Espere a cal queimar por 8 a 12 minutos. Em seguida, acrescente 10 litros de água, sempre mexendo bem. Em outro balde, coloque o sulfato de cobre e acrescente dois copos deágua quente. Mexa bem. Acrescente 10 litros de água fria, sempre mexendo bem. Encha uma caneca com calda de cal e a outra caneca com a calda de sulfato de cobre. Depois vá despejando as duas ao mesmo tempo em um terceiro balde. Mexa com a pá de madeira. Faça assim até passar toda a calda de cal e de cobre para o terceiro balde, sempre mexendo. Desta forma, a calda ficará bem misturada. Por fim, é só coar a calda.

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Óleo de Nim: a experiência de seu Guimarães João Guimarães, mais conhecido por seu Guimarães, possui quase 3 hectares de terra no sítio Oiti, em Lagoa Seca. Nascido há 67 anos no Ceará, seu Guimarães se considera meio cearense e meio paraibano. Depois de ter rodado quase todo o Brasil, já conheceu do Rio Grande do Norte ao Rio Grande do Sul, do Acre à João Pessoa, seu Guimarães resolveu vender suas terras no Piauí para se mudar para Lagoa Seca. Faz três anos que deixou de usar veneno e tudo na sua terra é natural. Apesar de morar em Campina Grande com sua esposa, dona Alzira, seu Guimarães vai ao sítio todos os dias. Planta cebolinha, rabanete, pimentão amarelo e verde, cenoura, chicória, alface crespo, alface liso, alface roxo, alface americano, quiabo, fava, brócolis, rúcula, mastruz, manga, coco, abacaxi. Em outra parte do sítio também tem agrião, espinafre, muitas qualidades de alface, cana. Ainda tem um bosque de nim. Suas plantas são muito bem tratadas. Onde não tem canteiro de horta, ele protege a terra com capim para não dar erosão. Sempre atento às novidades, seu Guimarães planta hortaliças que quase ninguém tem. Atualmente, ele está lançando na Feira de Produtos Orgânicos de Lagoa Seca o fruto da palma, que é muito nutritivo. Desenvolveu um serviço especial de entrega de cestas com seus produtos. Já tem 150 fregueses certos, além de fornecer verduras para 8 restaurantes diferentes de Campina Grande. Seus fregueses podem escolher entre os quase 30 produtos diferentes que produz. Sempre inovando, entrega as macaxeiras já descascadas, só precisa cozinhar. Grande admirador da planta chamada nim, seu Guimarães possui mais de 40 pés em sua propriedade. Eles são plantados como quebra vento na horta, como bosque perto do açude. Nunca deixa de plantar novos pés. Aprendeu a apreciar e usar esta planta com uma Cultivos Ecológicos 01

sobrinha que mora no Ceará. Ela tem plantado 322 pés e usa para fazer chapéus, sabonete e pasta de dente. Seu Guimarães usa o extrato ou o óleo de nim sempre que precisa para combater o pulgão, lagarta e a mosca branca. E suas estacas dão um ótimo cabo de enxada. O óleo de nim é comprado. Para usar ele pega um litro de óleo e acrescenta 200 litros de água. Para fazer o extrato, ele pega 1 quilo de folha, bate no liquidificador com água. Côa e coloca numa bomba de 20 litros. Para combater o cachorrinho d´água, seu Guimarães usou dipel. Misturou dipel com açúcar e fubá de milho. Jogou no canteiro e ele nos conta que ou os bichos morreram ou eles foram embora. Usou esse produto também para evitar a broca do pepino. Pulverizou uma vez e 15 dias depois. Segundo ele, os resultados foram muito bons.

Extrato de Melão de São Caetano: a experimentação participativa Está sendo realizado, pelos agricultores experimentadores em parceria com professores e alunos da Universidade Federal da Paraíba UFPB e a AS-PTA, um estudo sobre o uso do extrato de melão de São Caetano no controle do pulgão da erva-doce e do feijão macassa. Mais recentemente agricultores do sítio Araçá, Joab e seu Tota, iniciaram um teste no ácaro do jiló e no pulgão do pepino e do feijão macassa. O melão de São Caetano, também conhecido por melão Caetano ou erva de lavadeira, é uma planta muito comum na região. Nasce com facilidade dentro dos aceiros do roçado. É uma planta trepadeira, ou seja, gosta de subir em árvores, muros e cercas. Essa planta é conhecida pelos agricultores pelo seu uso medicinal. É utilizada no tratamento de pano branco, coceiras, sarnas, impinge. E agora está se estudando um novo uso, o de controle de pragas e doenças das culturas. Cultivos Ecológicos 01

Para se fazer o extrato do melão de São Caetano são necessários alguns equipamentos, como o extrator (foto ao lado). Primeiro, pega-se 1 quilo de ramas que foram secas à sombra. Tritura-se bem. Coloca-se tudo dentro de um balão de vidro com 3,5 litros de álcool de farmácia. O balão é então aquecido por 2 horas. Retira-se as ramas que foram fervidas deixando apenas o líquido que é composto de álcool e extrato. Continua-se aquecendo o balão até o álcool virar gás e subir por um tubo de vidro. Neste momento, por ser o tubo mais frio, o álcool vira novamente líquido e cairá dentro de um pote ao lado. Dentro do balão, só irá ficar aquelas substâncias que foram retiradas das ramas, o que nós chamamos de extrato. No final deste processo tem-se por volta de meio litro de extrato. E depois do extrato pronto, é melhor se guardar dentro da geladeira. Para aplicar, recomenda-se pegar um litro de extrato e acrescentar mais 20 litros de água. Logo que perceber o ataque das pragas, deve-se iniciar a pulverização. Deve-se aplicar em um intervalo de 8 dias, mas se o ataque estiver forte o ideal é que seja realizado de 5 em 5 dias. Os experimentadores ainda ensinam que deve-se pulverizar nos horários mais frios do dia, logo pela manhã ou no final de tarde. E que o extrato deve ser pulverizado bem em cima da praga. Para quem não tem todo esse equipamento em casa, os experimentadores ensinam que pode-se fazer e testar o macerado. Pega-se 1 quilo de ramas verdes, pisa bastante e coloca água e meio litro de álcool para sair o sumo. Deixe as ramas na água por 2 dias. Depois é só espremer bem as ramas, colocar o líquido na bomba e pulverizar. Alguns agricultores já estão testando o macerado. Os primeiros resultados mostraram-se positivos. O estudo do extrato de melão de São Caetano, ainda em fase de testes, está sendo desenvolvido por professores da UFPB de Bananeiras, alunos da UFPB de Areia e diversos agricultores experimentadores da região. Acredita-se que esse produto possa ser utilizado em outras pragas e doenças. Aqueles agricultores e agricultoras que se interessarem Cultivos Ecológicos 01

por experimentar o extrato e participar desta pesquisa deverão entrar em contato com o STR de seu município, com a AS-PTA ou na UFPB de Bananeiras com o professor Paulo Wanderley.

Produção de Sementes de horta João Miranda e Terezinha moram no sítio Serra dos Mares, no município de Remígio. Trabalham com seus filhos numa área de 2,5 hectares. E há alguns anos a família está lutando por uma área no assentamento Fazenda Sessenta e Oito. No sítio em Serra dos Mares, a família de João Miranda e Terezinha desenvolve muitas experiências. Eles possuem 3 barragens subterrâneas, várias barreiras de pedra, área de palma, roçado diversificado, faixas de algodão preto plantado atravessado para impedir a erosão e melhorar a terra. Estão conservando e plantando muitas plantas da região como a aroeira, frei Jorge, juazeiro, catingueira, ubaia, canafístula, mororó e outras tantas. Desenvolveram uma cerca viva com plantas da região (pinhão, burra leiteira, imburana de espinho) e fizeram um enchimento com gliricídia. Para fechar a base da cerca, eles plantaram palma de espinho. Possuem um tanque de pedra e um barreiro. Aproveitam a área das barragens subterrâneas para plantar muitas fruteiras como pinha, caju, graviola, laranja, limão, manga, coco e os cultivos de horta e de vazante. Além de plantar essa diversidade de plantas, a família está preocupada em produzir e distribuir mudas com seus vizinhos e visitantes. Cultivos Ecológicos 01

João Miranda e Terezinha guardam com muito zelo as sementes das plantas de seu sítio. Selecionam e guardam tanto as sementes das plantas da região como as que irão plantar no roçado, na horta, na vazante e aquelas utilizadas como remédio. Há 3 anos, João vem se desenvolvendo experiências em produzir sementes de verdura. Na época da luta pela terra da Fazenda Sessenta e Oito, compraram sementes de várias qualidades numa loja. Conseguiram produzir e tirar sementes de várias delas como tomate, pimentão, alface, coentro, cebolinha, pepino e jerimum de horta. Aqui eles irão nos explicar algumas. Para selecionar as sementes, eles começam selecionando os pés. Procuram as plantas mais fortes, bem desenvolvidas e sadias. Escolhem plantas distantes uma das outras pelo meio do plantio. Para o tomate, separa os frutos da primeira carga. Deixa ficar bem maduro e coloca para apodrecer. Com 3 dias de podre, passa numa arupemba para separar a semente e espalha no lajedo para secar. Coloca de manhã e ao meio dia está pronto. João colhe os pimentões maiores e sadios bem maduros. Abre, passa uma escovinha e coloca para secar. Um dia de sol valente dentro de uma bacia de zinco, as sementes ficam prontas. Elas podem ser guardadas consorciadas com as sementes de tomate. Assim, diz João Miranda, faz um canteiro só na hora de plantar, aproveitando também a água. Para produzir as sementes de alface, João planta, no final do inverno, as mudas bem separadas uma das outras e deixa crescer a vontade. Quando sente que o cacho está perto de amadurecer, ele corta e despreza a ponta do cacho. Dessa forma, eliminam-se aquelas sementes chochas. E quando estiver maduro, ele tira todo o cacho, deixa dormir, e coloca no sol. Aí pode-se guardar as sementes de duas maneiras. Dentro Cultivos Ecológicos 01

do paú, o que ele chama de semente sebosa ou pode-se guardar a semente ventada. Para isso, João aconselha fazer uma cortina de pano, para bater as sementes. Terezinha nunca deixa de ter sementes de mostarda em casa. Acredita ser uma ótima planta de remédio e não fica sem, por isso sempre semeia pelo roçado. Para separar as sementes ela colhe o pé inteiro bem maduro, quase seco, mas observa que tem que ser antes de começar a debulhar. Para guardar tanta semente, eles colocam em vasilhas de plástico ou latinhas. E para livrar do ataque dos bichos, colocam pimenta do reino, cabeça de alho ou cinza. João nos lembra que para fazer semente tem que ter muita paciência e gosto pelo ofício.

Armazenamento natural de sementes: a experiência da família de dona Maria de Edísio Dona Maria de Edísio nasceu no interior de uma família muito pobre no Rio Grande do Norte. Muito cedo, uma fatalidade os obrigou afastar-se de seu pai. Como filha mais velha, dona Maria se viu na obrigação de assumir junto com sua mãe o sustento de sua família. A fim de garantir dias melhores para os irmãos mais novos, mudaram-se muito. Foram para o Maranhão onde dona Maria chegou a quebrar coco para fazer a feira para a mãe e para os irmãos. Cansados da luta, resolveram mudar-se para Casserengue, no Curimataú de Solânea, onde morava a avó materna de dona Maria. Mas os dias ainda continuavam pesados para ela e para sua mãe. Passaram a plantar de meia e puxar agave para garantir a comida na mesa para os irmãos mais novos. Foi em Casserengue que dona Maria conheceu seu Edísio. Casaram-se e os primeiros anos de vida juntos também foram marcados pela dificuldade, pelo trabalho duro. Seu Edísio era morador na fazenda de Bila Joca, quem ainda mantém respeito em sua memória. No dia Cultivos Ecológicos 01

em que se casaram, mudaram-se para uma casa muito simples, na época ainda de taipa. Tinham como patrimônio apenas a cama, dois tamboretes e os utensílios de casa comprados com capricho para o enxoval de dona Maria. No início do casamento, seu Edísio era marchante, vendia e comprava bodes e era também carreiro do patrão. Seu Edísio conta que juntos plantavam e colhiam o algodão. Quem se ocupava do roçado era dona Maria. No começo, plantava feijão estendedor, achava ótimo, mas os invernos foram se afracando, conta dona Maria. Passou a plantar e selecionar sementes de feijão meia moita. As sementes que eu via que dava certo para mim, sempre guardava. Nessa época, plantavam tudo consorciado, junto com o algodão mocó, plantavam o milho, a fava e o feijão estendedor que subia nos pés de algodão. Todo o plantio do algodão era então dividido com o Bila Joca. Mas os produtos do roçado eram todos da família. Todos os legumes produzidos eram para o consumo da casa e o algodão era vendido para comprar roupa, sapato, livros, animais ou para tratar alguma doença. Aconselhados pela ANCAR, empresa governamental de extensão da época, deixaram de plantar consorciado, assim aumentariam a produtividade, era a promessa dos técnicos. Viveram anos mais difíceis, a praga passou a atacar as plantações e o algodão deixou de ser um produto de renda. Toda a comunidade passou a derrubar mais a vegetação para aumentar as áreas de roçado, plantar agave ou fazer carvão. Acreditam que junto com a degradação do ambiente, aumentou também a dificuldade das famílias em viver no Curimataú. Em conseqüência dos bons negócios como marchante e também do algodão, seu Edísio foi capaz de acumular recursos e formar seu patrimônio. Aos poucos, foram comprando as terras dos herdeiros de seu antigo patrão. Nos 40 hectares de terra, hoje moram o casal e as famílias de seus dois filhos. Dona Maria recorda-se que, desde 1972, vem guardando as sementes que vem pesquisando. Com uma lista de critérios Cultivos Ecológicos 01

bastante apurada, dona Maria vem separando ao longo dos anos aquelas qualidades que dão mais, que são mais rendosa, que são vendável e as mais saborosas. Todos os anos, separa as suas sementes e as coloca para secar ao sol. Depois que elas estiverem bem secas e frias, dona Maria coloca em seus garrafões ou em silos de 10 ou 20 quilos, construídos por seu filho, Toinho, especialmente para armazenar suas sementes. Mas antes de guardar, dona Maria mistura suas sementes com as cinzas da fogueira de São João. Distribui as sementes nos recipientes e para bem vedar, faz uma lama, como chama, da cinza com água e coloca uma camada na tampa do recipiente. Quando seca, essa lama transforma-se em um torrão que irá vedar com eficiência seus silos. Garante que, em todos esses anos, nunca perdeu suas sementes com gorgulho. Na época em que chega o inverno, divide suas sementes com seus filhos e vizinhos. Se eu perder, meus vizinhos podem ainda ter. Não quero as sementes só para mim. Quero para mim, para meus filhos e vizinhos, conta dona Maria. Quando o inverno é ruim e as sementes estão mais limitadas, eu dou limitado, mas quando dá mais, eu distribuo bastante. Dona Maria ainda tem algumas estratégias para nunca perder suas sementes. Em 2002 mesmo, eles encheram o roçado de milho e feijão, mas o inverno foi muito fraco. Dona Maria conta que para não perder as sementes, a família não comeu o feijão e o milho verde, alimento bastante apreciado na região. Esperaram secar para poder colher e separar as sementes e só comeram o que sobrou. O feijão macassa cariri e o camaupu, o mulatinho da vagem roxa, o carioca e o milho 60 dias são sementes que ela preserva há anos. Acredita ser importante guardar as sementes todos os anos por ter a garantia do que está plantando. Se comprar na feira, o agricultor dificilmente terá a certeza de sua qualidade e é arriscado até não Cultivos Ecológicos 01

nascer. Guardando as sementes em casa, tem o conhecimento do tempo, o que dá a segurança na germinação. Com a semente em casa, na hora que chove o agricultor pode plantar, porque no Curimataú para lucrar o agricultor tem que plantar no rastro da chuva. Dona Maria ainda conta que guardando a semente em casa, tem-se certeza de que aquela semente é bem adaptada ao seu setor e, com isso, guarda também todo o conhecimento sobre tempo de germinação, de produção, de colheita, toda sabedoria vinda dos seus anos de observação. Dona Maria procura passar suas experiências para seus filhos e Toinho de Edísio já é grande divulgador de seus conhecimentos. Já viajou dentro Brasil e até mesmo para o exterior, divulgando essa e outras experiências de sua família.

Experimentação de alternativas para libertar dos adubos químicos Adubo da Independência: modo de preparo O adubo da independência é um adubo que os próprios agricultores e agricultoras podem fazer com o que eles encontram em sua região. É um adubo natural preparado com as coisas que se Veja como é fácil fazer este adubo: tem na própria terra, por Ingredientes necessários para fazer 2 toneladas: isso é importante que 500 quilos de terra argilosa de barranco cada agricultor ou 350 quilos de húmus de minhoca 200 quilos de esterco bovino (pode ser de cabra ou agricultora experimente ovelha) sua própria receita. Seu 160 quilos de MB-4 preparo é muito fácil, 160 quilos de calcário porém trabalhoso. O 80 quilos de farinha de osso ideal é fazer em regime 330 quilos de farelo de trigo de mutirão. 140 quilos de pó de carvão 6 litros de mel de cana-de-açúcar A motivação para a 2 litros de E.M ou 500 gramas de fermento de pão descoberta deste 20 quilos de batata-doce produto, experiência de 20 quilos de pó de telha um grupo de agricultores 20 quilos de fosfato natural do Paraná, foi a partir da 20 quilos de rocha potássica necessidade dos agricultores produtores Cultivos Ecológicos 01

de batatinha do Agreste da Paraíba, que ainda são muito dependentes de produtos químicos como a uréia e sulfato de amônia.

“Esse adubo misturado De tudo se aproveita Terra e esterco de gado Até com carvão se ajeita Pedra moída no motor Terra de barranco onde for perto da terra ou no mato Só dá pena a gente ver Que em vez de se comer Joga-se dentro a batata”. Euzébio Cavalcante.

A Comissão de Cultivos Ecológicos do Pólo Sindical da Borborema vem, portanto, promovendo diversos mutirões de fabricação do adubo da independência e vem estimulando a sua experimentação nos vários tipos de cultivos como batatinha, horta, frutas e também na produção de mudas. Nesses mutirões estão envolvidos agricultores e agricultoras dos diversos municípios do Pólo, que ao final saem com o compromisso de partilhar os resultados dessa experiência com outras famílias de agricultores. Modo de preparar 1º Passo: reunir os ingredientes necessários no local onde será preparado, de preferência longe de casa, devido ao cheiro forte nos primeiros dias de fermentação. É bom escolher um lugar coberto de chão batido ou piso de cimento. 2º Passo: Colocar a terra de barranco no lugar onde vai ser fabricado. 3º Passo: Cozinhe 10 quilos de batata-doce ralada numa vasilha com 20 litros de água. Esmagar bem até formar um mingau. 4º Passo: Quando o mingau esfriar, colocar 3 litros de mel de cana-de-açúcar. Mexa bem e coloque o fermento de padaria. 5º Passo: Espalhar os ingredientes secos no chão batido, fazendo camadas finas. Primeiro, comece pela terra de barranco e depois os outros ingredientes. Traçar bem os ingredientes. 6º Passo: Derrame o mingau sobre os ingredientes secos já traçados. Em seguida, molhe com água pura, mexendo bem para conseguir uma boa mistura. Essa mistura deve ficar com 50% de umidade. 7º Passo: Faça um monte de aproximadamente 50 centímetros de altura. 8º Passo: Mexa o monte todos os dias para que ele não esquente demais. Cuide para que o calor não passe de 60 graus centígrados. Se for preciso, esfrie com água na hora que for mexer. Cultivos Ecológicos 01

9º Passo: Quando parar de esquentar, o adubo da independência pode ser guardado em sacos ou num monte. Preste atenção para que ele não fique molhado novamente. Caso aconteça, coloque para secar um pouco na sombra. Adaptado da cartilha Adubos caseiros e caldas: receitas para nutrição e proteção das plantas. Fórum das organizações dos trabalhadores e trabalhadoras rurais do Centro Sul do Paraná e AS-PTA.

Os resultados do adubo da independência no roçado: a experiência de Robinho Robinho é um jovem agricultor de Lagoa Seca. E junto com sua mãe, dona Odenira, vêm realizando diversas experiências de cultivos ecológicos no seu sítio. Robinho planta muita mandioca, feijão de várias qualidades, batatinha, milho, fava, cará preto, inhame, coentro, batata doce, ainda tem uma capineira e uma área de pasto. Em 2002, ele resolver fazer uma experiência de adubação de solo no plantio da batatinha com orientação do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Lagoa Seca e da AS-PTA. Separou quatro cortes do roçado para fazer um teste com um novo adubo, o adubo da independência. No primeiro corte, Robinho colocou, na encama do leirão, meio quilo de adubo da independência por metro corrido. E depois aguou com biofertilizante, na concentração de 1 litro de bio para 10 litros de água. Para isso, usou meio litro dessa mistura por 1 metro corrido. No segundo corte, Robinho colocou na encama do leirão somente biofertilizante na mesma concentração do primeiro corte. Teve o cuidado de preparar essas duas áreas no final da tarde para que o sol não secasse o biofertilizante, para no dia seguinte realizar o plantio da batatinha. Cultivos Ecológicos 01

No terceiro corte, não foi colocado nem adubo da independência e nem biofertilizante na encama do leirão. Robinho plantou a batatinha e depois que ela nasceu, contou 15 dias e colocou o adubo da independência na cova. De forma semelhante, Robinho trabalhou no quarto corte. Só que aplicou o adubo depois de 20 dias. Em cada corte, plantou 3 caixas de batata semente. E em todos os cortes, aplicou biofertilizante nas partes aéreas das plantas. Para tanto, iniciou a aplicação quando as plantas estavam com 20 dias de nascida. Nas duas primeiras aplicações, usou uma mistura mais fraca, de 1 litro de biofertlizante para 19 litros de água. E nas aplicações seguintes, achou melhor aumentar a concentração do produto. Usou a mistura de 2 litros de bio para 18 litros de água, o que completa a bomba de 20 litros. No total, fez 8 aplicações de biofertilizante nos 4 quatro cortes, obedecendo um intervalo de 8 dias de uma aplicação para outra. Nesta mesma área, fez ainda o consórcio com milho e feijão macassa. Depois de 15 dias que a batatinha tinha nascido, ele plantou o milho no bucho do leirão. Plantou em um leirão, pulou outros 4, para plantar no outro novamente. E após 20 dias do plantio do milho, plantou o feijão macassa. Depois de 120 dias, Robinho colheu 67 sacos de batata desses 4 cortes. Avalia que as batatas produzidas com produtos naturais conseguem durar muito mais tempo no solo, sem apodrecer e mantendo a cor mais limpa. De todos os testes realizados, o melhor resultado foi do primeiro corte, do uso do adubo mais o bio na encama do leirão. Com esses produtos, a batatinha teve um ótimo desenvolvimento, ficou com uma cor limpa, sem pinta e bem amarela. Mas o que também chamou muita atenção de Robinho foi o peso das batatas. Nesse primeiro corte, a produção foi de 18 sacos que geralmente pesa 50 quilos. No entanto, por serem mais pesadas, cada saco estava em média 8 quilos acima do peso comum. Observou também que o milho e o feijão macassa produziram melhor nesta área. No segundo corte, a produção foi de 17 sacos, porém observou que com esse tratamento as batatas não eram tão pesadas quanto o do primeiro. Cultivos Ecológicos 01

No terceiro e quarto corte, a produção foi bem abaixo dos dois primeiros tratamentos; 13 sacos para o terceiro e 7 sacos para o quarto corte. Nessas áreas, as batatas ficaram pequenas e com qualidade inferior. Fazendo uma avaliação de seus experimentos, Robinho chegou a conclusão que o adubo não atua logo que é colocado na terra. Por exemplo, quando aplicou o adubo na planta com 15 dias, notou que ela só começou a usar o alimento do adubo depois de mais 15 dias. Por isso, acredita que o melhor tratamento seja aquele que se coloca o adubo da independência com o biofertilizante na encama, pois quando a planta nasce ele já está disponível para ser consumido pelas raízes. Robinho conseguiu vender toda sua produção num preço acima do valor de mercado. Vendeu 55 sacos de batata comércio para o mercado de produtos orgânicos a 25,00 reais cada saco. Vendeu 7 sacos de batata refugo no comércio normal, conseguindo um preço de 15,00 reais por saco, ou seja, o mesmo preço da batata produzida com veneno. E ainda, separou 5 sacos de batata semente. No ano de 2003, Robinho repetiu, portanto, o procedimento que ele achou mais interessante, ou seja, aplicou 1 tonelada do adubo e o biofertilizante na encama. Os resultados novamente foram surpreendentes. Plantou 16 caixas de batata semente e colheu 6 toneladas de batata comércio e mais 45 caixas de batata semente.

Os resultados do adubo da independência na verdura:experiências de Naldinho Ednaldo Silva Nascimento, mais conhecido como Naldo é um jovem agricultor de Lagoa Seca. Casado com Maria José, eles e seus 3 filhos pequenos moram no sítio Lagoa do Barro. Lá eles plantam feijão macassa, feijão preto, tomate, cenoura, coentro, alface e pimentão. Há dois anos, a família de Naldo passou a plantar as verduras. E no início, chegou a plantar com muito veneno. Já usou dithane, folidol e outros. Mas pelas mãos de seu próprio pai, o Zezinho Plácido, Naldo conheceu os benefícios dos produtos naturais. E Cultivos Ecológicos 01

hoje em dia ele não quer saber mais de produtos de loja. Começou experimentando o biofertilizante e a calda bordalesa e depois foi testando a manipueira, urina de vaca, melão de são Caetano. Acredita que esses produtos naturais sejam bons para quem está lutando, para a família que passa a consumir sem veneno, para o comprador e, sobretudo, é para o bolso. Naldo fez a conta, este ano ele vai gastar 70% a menos do que gastaria se usasse veneno. Atualmente, vende seus produtos na Feira Agroecológica de Lagoa Seca. Recentemente, Naldo testou mais um novo produto, o adubo da independência. Foi mais uma vez seu pai que lhe apresentou o novo adubo, que resolveu testar no plantio de tomate, pimentão, coentro e alface. Em um canteiro de 5 metros por 1 e meio, Naldo sameou 10 quilos do adubo em 600 mudas de pimentão que já estavam com 20 dias de transplantas. Naldo comparou com outras vezes que havia plantado o pimentão e observou que com o adubo, os pés tinham carregado mais e que tinha enramado bem. Plantou uma semente de pimentão casca dura e observou que o adubo ajudou a dar mais ponta de rama, o que permitiu tirar 5 panhas. E acredita que só não tirou mais porque estava com pouca água. Produziu nesse canteiro mais de 1250 pimentões, o que avalia ser uma boa produção. Depois que retirou o pimentão, plantou tomate na mesma área. E quando o tomate começou a florar, ele colocou aproximadamente 250 gramas de adubo na cova de 110 pés. Atualmente, as plantas já carregam os tomates em cacho. E observou que nesta área cada planta tem em média 8 cachos. Segundo suas contas, cada planta deve produzir mais de 1 quilo, o que lhe renderá uma produção total de aproximadamente 150 Kg. Observou que as plantas com o adubo da independência cresceram mais limpas e bonitas. Pretende ainda Cultivos Ecológicos 01

colocar mais um pouco de deste adubo na cova desses tomates para ajudar na ponta de rama. Uma adubação para o crescimento dos frutos. Experimentou também o adubo da independência no cultivo da alface. Sameou aproximadamente 10 quilos de adubo em 300 pés de alface com 15 dias de crescimento. Notou que se comparar com a área em que colocou o estrume de galinha, os pés ficaram mais graúdos, mais evidente, mais verde, bem molinho, mais sadio e foi mais rápido. No canteiro com o adubo da independência conseguiu colher o alface com 40 dias, enquanto nos outros canteiros colheu com 45 dias. Por fim, ele fez o teste no coentro. Ele e seus clientes têm notado bastante diferença. Depois 20 dias em que plantou e estrumou, o coentro começa a ficar amarelado. Aí resolveu samear uns 2 quilos de adubo da independência. O que notou foi que o coentro ficou verde novamente em 8 dias e seus clientes repararam que ele dura verde por mais tempo depois que chega em casa. Naldo acredita ser o adubo da independência um bom produto porque ele dura mais na terra. Depois que se coloca sob a terra, ele fica disponível para a planta quando molha. Quando o sol seca a terra, seca também o adubo, que permanece em cima da terra. Aí na próxima aguação, ele torna-se disponível novamente para as plantas. Para Naldo, este adubo foi aprovado.

Comercialização de produtos agroecológicos da agricultura familiar A feira Agroecológica de Lagoa Seca A experimentação de produtos naturais no município de Lagoa Seca começou a partir de uma visita de intercâmbio realizada ao Centro-sul do Paraná. A partir dessa visita, o Sindicato dos Trabalhadores Rurais passou a se preocupar com o uso indiscriminado de veneno dentro do município, principalmente por serem produtores e exportadores de verduras. Esse processo ganhou um estímulo maior quando o Sindicato promoveu uma visita de José Lichesck, um agricultor do Cultivos Ecológicos 01

Paraná, e um curso de produtos naturais realizado no sítio Lagoa do Gravatá. Deste curso, 2 agricultores saíram capacitados e animados em realizar diversos experimentos em suas terras. Os resultados desses experimentos sempre eram analisados coletivamente por um grupo de agricultores e agricultoras do município. Em 1999, o Sindicato propôs então a esse grupo que se montassem também pequenos experimentos. Os agricultores e agricultoras passaram a desenvolver experiências em um canteiro e fazer comparação, ver os prejuízos, os males que causam o veneno para quem pulveriza e também para quem consome os produtos. As experiências passaram a dar resultado, os agricultores e agricultoras passaram a acreditar e novas pessoas passaram a experimentar o biofertilizante, a calda bordalesa, a calda de fumo, a manipueira, o dipel, o óleo de nim, o extrato de melão de são Caetano e outros tantos produtos. Zezinho Plácido cumpriu um papel importante na busca e na pesquisa dessas novidades. Experimentava em casa e logo saia divulgando os resultados para o grupo. Em 2001, foi realizado no município de Lagoa Seca um diagnóstico sobre o uso de agrotóxicos. Esse diagnóstico foi um momento importante dentro do processo de formação dos agricultores e agricultoras que saíram sensibilizados em abandonar de vez a sujeição aos produtos químicos. Desta forma, produção de alimentos limpos foi aumentando e com ela a consciência de que estava produzindo produtos diferenciados. A fim de dar visibilidade ao trabalho e permitir que o consumidor possa ter direito de escolha de um alimento saudável a um preço acessível, iniciou-se um intenso processo de debate e troca de experiências sobre comercialização. O grupo achou importante, portanto, iniciar os trabalhos formando primeiramente um mercado consumidor e dentro de uma grande campanha, Um Natal sem veneno, 25 famílias se organizaram na véspera do natal de 2001 para vender seus produtos. Como o município de Lagoa Seca não havia feira, a aceitação foi imediata. Os feirantes foram convidados a voltarem no Cultivos Ecológicos 01

sábado seguinte, quando promoveram o Ano Novo sem veneno. A partir daí, nunca mais faltaram um sábado. Todas as ações desse grupo são compartilhadas, foi assim também na hora de decidirem pela imagem da feira. Fizeram algumas visitas de intercâmbio, em Brejo da Madre de Deus e João Pessoa, para estudarem qual seria a melhor banca e organizaram um fundo rotativo para a aquisição das barracas. O fundo rotativo recebeu um impulso ainda de dois projetos e em outubro de 2003 já possuem 29 barracas. Na feira vendem-se produtos laranja, mamão, banana e verduras diversificadas, vendem produtos do roçado, ovo de capoeira, mel, doces e bolos. A qualidade dos produtos já está sendo reconhecida na região e sempre são convidados a levarem a feira para outros lugares. Já foram para Campina Grande, Itapororoca, Alto Sertão e outros. Os feirantes possuem uma dinâmica própria de organização. Encontram-se mensalmente para discutirem para avaliarem e planejarem seus trabalhos, repassam o conteúdo e as discussões das visitas de intercâmbio, debatem sobre os problemas de produção, os preços praticados, observam os produtos que existem na feira e quais aqueles que estão faltando, incentivam e planejam a diversificação de produção. No ano de 2003, essas reuniões passaram a acontecer ora na sede do Sindicato ora na casa dos feirantes. É uma forma de garantir os produtos além de se constituírem em importantes momentos de formação. Foram também nessas reuniões que se construiu um regimento da feira, no qual se estabelecem as condições de participação e permanência no grupo. Foi formada também uma comissão composta por feirantes, agricultores experimentadores e lideranças sindicais que dá apoio técnico aos feirantes e garante o cumprimento de todas as regras do regimento. Em 2003, o grupo de feirantes e mais os agricultores e agricultoras experimentadores estão formando uma Associação dos Produtores Agroecológicos de Lagoa Seca. Cultivos Ecológicos 01

A experiência da Feira Agroecológica de Lagoa Seca é, sem dúvida, um aprendizado para todos os agricultores do Pólo Sindical da Borborema. Essa experiência está permitindo ao grupo poder criar uma cultura solidária de comercialização e, sobretudo, fortalecer um espaço de troca de experiência e de conhecimentos. E, aos poucos, estão se preparando para enfrentar um desafio ainda maior, levar a feira agroecológica para Campina Grande, Paraíba.

Comercialização de verduras: a experiência de seu Guimarães Ex seminarista, militar reformado, seu João Teixeira Guimarães hoje vive da arte de produzir e vender alimentos sadios. Depois de ter rodado por todo o Brasil, de ter morado do norte ao sul do país, seu Guimarães escolheu a Paraíba para viver. Desde pequeno já tinha amor pela a terra e cultivava sua horta. Por onde passou no mundo, teve suas terras, mas aqui na Paraíba descobriu sua vocação de plantar sem veneno e de fazer amigos. Em 1986, conta seu Guimarães que vendeu 600 hectares no Piauí para comprar 2,5 hectares no sítio Oiti, em Lagoa Seca. Logo que chegou, admite que fazia grandes monocultivos. Plantava campos inteiros de uma verdura só, fazendo apenas rotação de culturas. Plantava alface, coentro, repolho, pimentão, cebola, tomate, mas nessa época era obrigado a usar muito veneno. Assim trabalhava seus vizinhos, não sabiam plantar de outra forma. Vendia toda sua produção na CEASA. De 1990 a 1996, chegou a vender em 8 supermercados em Campina Grande. Em 1998 e 1999, houve uma grande seca no estado. A água acabou, o açude secou. Nessa época chegou ainda a plantar dentro do açude jiló e milho. O olho d´água de duas terras deu apenas para sustentar 50 canteiros e também dar de beber a mais de 200 famílias da região. Foi exatamente nessa época que deixou de usar veneno, trabalhou muito pouco o terreno. Há uns 3 anos atrás passou a andar mais no Sindicato dos Trabalhadores Cultivos Ecológicos 01

Rurais de Lagoa Seca, começou a participar das reuniões, passou a conhecer mais as pessoas. Foi mais ou menos na mesma época que passou a mudar também sua forma de atingir o mercado consumidor. Nessa época, elaborou uma carta que começava mais ou menos assim: De um produtor de verduras sem veneno a um possível consumidor... Um dia foi até a um grande supermercado de Campina Grande para comprar um agrião para fazer uma comparação com o seu, queria demonstrar assim o que o veneno fazia com as folhas. Mas sua primeira demonstração aconteceu ali mesmo no caixa do supermercado. Depois de explicar o que os agrotóxicos faziam com as verduras, ele distribuiu sua primeira carta ao consumidor. Assim, disparou-se o processo de propaganda que ele considera mais eficaz, o boca a boca. A senhora do supermercado era amiga da dona de um restaurante natural da cidade. As duas foram as primeiras visitas que seu Guimarães recebeu em suas terras e o restaurante tornou-se seu primeiro ponto de venda. E mais, foi também seu primeiro e principal ponto de divulgação, pois sua dona resolveu pregar a carta para que todos a lessem. Uma iniciativa positiva para ambas as partes, por um lado, a garantia de que os produtos do restaurante eram realmente sem venenos, por outro, permitiu que seu Guimarães arrumassem novos fregueses. A partir dali, as pessoas começaram a ligar e iniciou a segunda etapa de seu trabalho, a distribuição das cestas. No começo, tudo ainda com prejuízo, segundo seu Guimarães. Mas sabia que as coisas iriam mudar se ele continuasse insistindo. Em meados de 2003, já são 160 famílias e 5 restaurantes em toda Campina Grande. Seu Guimarães afirma que não quer fregueses, quer amigos que lhe comprem verduras saudáveis. Seu interesse maior é vender para quem quer servir, porque seu preço é justo. Por isso, evita os revendedores, aqueles que querem apenas lucro. Para atender melhor seus fregueses, seu Guimarães elaborou uma comanda, ou seja, um bloco de anotações específico para marcar as quantidades de produtos que Cultivos Ecológicos 01

cada freguês deseja. As pessoas ligam então para sua casa e sua esposa, dona Alzira, faz as anotações. Ao final do dia, monta uma nova lista. Essa agora enumerando as qualidades pedidas e as quantidades de cada produto. De posse desta lista, seu Guimarães retira dos canteiros, no outro dia bem cedo, as quantidades certas que serão entregues naquele dia. Depois, com ajuda de seus companheiros, separa em sacolas a quantidade que cada pessoa solicitou, agora ele utiliza novamente a comanda preenchida por dona Alzira. Aí é só distribuir por toda a cidade. Seu Guimarães observa que geralmente quintas e sextas aumentam-se consideravelmente a quantidade de pedido. Mais recentemente, passou a cobrar uma taxa de transporte. Assim, a cada compra é acrescido o valor de 1,00 real. Por fim, seu Guimarães faz anotações diárias em um caderno de controle. Neste caderno ele construiu uma tabela com os produtos e os dias da semana. Desta forma, ele tem o controle semanal do que saiu. Com essas anotações, ele faz o pagamento do pessoal. São 5 pessoas que trabalham com ele e que ganham por volta de 50,00 a 80,00 reais por semana. De lucro, ele retira por volta de 200,00 reais semanais. Acredita ser seu trabalho importante também para a comunidade em que mora. Dá emprego para muita gente e faz a economia local movimentar. Para o futuro pretende fazer novas parcerias. Quer conseguir montar em seu sítio uma câmara fria. Assim como a batatinha, poderá por um preço justo outros produtos como tomate, pimentão, quiabo que não são produzidos em suas terras, mas que possuem grande saída no mercado. Desta forma, acredita poder manter o preço estável, melhor para quem compra, porque sabe que não está sendo explorado, melhor para quem vende. E lembra mais uma vez que seu tipo de comércio é antes de tudo uma relação de amizade. Sua maior satisfação em estar servindo é a satisfação do cliente em estar bem servido. Por fim, seu Guimarães dá algumas dicas básicas para quem quer vender. Cultivos Ecológicos 01

Primeiro tem que ter a mercadoria, só não se vende aquilo que não existe. Depois, um bom vendedor tem que conhecer bem sua mercadoria, saber como preparar o produto, de onde ele veio, como fazer e, sobretudo, tem que ter boa conversa. Confessa que assim já conseguiu vender até fruta de palma para um caririzeiro.

Comercialização de frutas: a experiência de dona Helena Dona Helena é uma agricultora muito batalhadora. Desde que deixou de criar menino, vem ajudando seu marido a criar seus três filhos. E, todos os sábados, tem presença garantida na feira de Campina Grande. Dona Helena, com seu jeito meigo e com seu papo bom, acabou conquistando uma freguesia cativa na feira. A família de dona Helena mora no sítio Cachoeira do Gama, em Matinhas. Sua filha mais velha já se casou, mas ainda vive na boa companhia de seu marido e de seus filhos mais novos que a ajudam muito no roçado e também na feira. Há mais ou menos 20 anos atrás, dona Helena começou vender guandu na feira de Campina Grande. Saía bem cedo de casa, com um balaio na cabeça cheio de guandu. Mas o começo foi muito difícil, conta dona Helena. As pessoas ficavam mangando porque acabava vendendo o balaio pela metade do preço que valia. Ainda não sabia vender. Mas já nessa época, dona Helena foi conquistando seu público e logo ficou sendo conhecida por toda a feira como a Mulher do guandu. Até que um dia, um senhor de Montadas, seu Nem, falou para que plantasse manga para vender. Aí dona Helena resolveu plantar tudo no mundo para vender na feira. A família plantou então vários pés de manga, laranja de vários tipos, jaca mole e jaca dura, caju, tamarindo, acerola, abacate, maracujá, Cultivos Ecológicos 01

serigüela, carambola, banana e outras mais. Quando não tem frutas, dona Helena faz mudas de plantas de remédio, de árvores de fruta, de plantas de enfeite. Sempre tem alguma coisa para levar para a feira. Cada produto vale pouquinho, mas é dele que tira seu sustento, conta dona Helena. Um pouquinho de um, com um pouquinho de outro é o que faz a diferença. E, em 2001, finalmente conseguiu comprar sua própria banca junto com sua filha. Agora fica melhor ainda de vender, conta dona Helena. Não precisamos mais passar humilhação de dividir a banca. Para cada fruta, a família tem um cuidado. A manga, por exemplo, é tirada de vez. Dona Helena leva na cabeça um cento ou cento e meio. E ainda faz qualquer tipo de negócio. Troca na feira por pedaço de carne. E assim vai trocando uma coisa por outra. Da laranja, dona Helena leva as frutas e as folhas, que são usadas como remédio. A jaca, dona Helena vende no grosso ou no retalho, o que acha melhor. Apesar do trabalho a mais, vender no retalho dá um pouco mais de dinheiro, conta dona Helena. Mas temos que ter muito cuidado com o asseio, o público é muito exigente. Corta a fruta na hora e vai colocando os bagos em um saco plástico que compra em Campina Grande mesmo. Chega a levar de 5 a 20 jacas que variam de preço de acordo com seu tamanho. Uma jaca grande é vendida até 5,00 reais e uma pequena, por uns 0,50 centavos. O caju dá muito mais trabalho, mas é uma fruta ótima de comércio. Do caju, eles vendem apenas a castanha torrada ou vendem a fruta. Se o caju estiver bem bonito, pode vender 8 por 1,00 real. Mas para vender a fruta tem que ter muito cuidado, explica dona Helena. Eles forram todo o chão da sala de sua casa com folhas e colocam a fruta colhida uma do lado da outra sem amassar. Colocam o caju de pé para não estragar. Na hora de levar para feira, outro trabalho. Colocam as Cultivos Ecológicos 01

frutas com o mesmo cuidado nas caixas pra também não estragar. Aquelas frutas que não passaram em seu exame de qualidade, dona Helena retira a castanha e torra. A castanha é outra fonte de riqueza para dona Helena. E o restante do caju ela dá para os bichos ou deixa virar estrume. O caju é uma ótima fruta de comércio, conta dona Helena que confessa que suas contas são pagas com sua venda. Para vender bem, a gente tem que fazer uma gracinha, ensina dona Helena. E assim vai cativando sua freguesia. Muitos de seus produtos são levados por encomenda, principalmente os remédios e as mudas. E com toda sua simplicidade, dona Helena vai nos dando lições de como continuar a vida batalhando sempre.

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