Ortodoxia X Heterodoxia: A Controvérsia Na Teoria Econômica Acerca Do Emprego

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Ortodoxia X Heterodoxia: a controvérsia na teoria econômica acerca do emprego 1

Laion Azeredo

RESUMO: O problema do desemprego figura como uma das principais preocupações da sociedade econômica atualmente. A Economia, enquanto ciência social, deve servir ao propósito de explicar e propor soluções para este fenômeno deveras maléfico para a humanidade. Há duas correntes, entre as mais aceitas na academia e na política, que versam sobre a matéria. Estas correntes estão em debate há quase um século, tentando provar suas conclusões em detrimento as das outras. Neste artigo tentaremos entender um pouco melhor a proposta de cada uma delas e o porquê de seu crônico desacordo.

Palavras-Chave: Ortodoxia, Heterodoxia, Keynes, Economia Neoclássica, Desemprego.

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Graduando em Ciências Econômicas pela Univ. Candido Mendes – Centro.

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Mainstream X Heterodoxy: The controversy in economic theory about employment

Abstract: The problem of unemployment is one of the main concerns of the economic society today. The economy, while social science, should serve the purpose of explaining and proposing solutions to this phenomenon very harmful to humanity. There are two currents, among the most widely accepted in academia and politics, that deal with the matter. These currents are in discussion for nearly a century, trying to prove their conclusions to the detriment of the other. In this article we will try to understand a little better the proposal for each of them and why their chronic discord.

Key words: Orthodoxy, Heterodoxy, Keynes, Neoclassical Economics, Unemployment.

1. Introdução:

Sendo uma Ciência Social, a Economia não é exata. Ela pode apenas apresentar tendências de comportamento da sociedade, dadas determinadas premissas e circunstâncias (MARSHALL 1996, pp. 99 e 100). Por isto, talvez, existam tantas escolas de pensamento econômico. Mas duas destas escolas travam uma batalha há mais de 70 anos acerca do problema do desemprego e do crescimento da renda de uma economia. É sobre este debate - entre as escolas neoclássica e Keynesiana - que o presente trabalho versa.

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2. Ortodoxia X Heterodoxia: Os economistas conhecidos como neoclássicos2, que Keynes chama de clássicos (KEYNES 1996), entendiam que o sistema econômico tenderia sempre ao pleno emprego dos fatores produtivos. Este ponto de vista era sustentado pelo argumento do economista Jean-Baptiste Say, que diz que em uma economia de livre iniciativa, onde todos os recursos têm plena mobilidade, a competição é perfeita e todos os agentes buscam maximizar seus benefícios, pois são racionais e nunca preferem o pior podendo alcançar o melhor3, todo processo de produção capitalista é também o de geração de renda4, e, sendo assim, toda a oferta gera sua própria procura. Neste estado de coisas, o capitalista tenderia a empregar cada vez mais fatores de produção, até a barreira o pleno emprego (KEYNES 1996, pp. 9 e 56). O equilíbrio no mercado de trabalho é dado pela interação entre a Oferta de Trabalho5 e a Demanda de Trabalho6. Com a oferta de trabalho tendendo a ser constante no curto prazo7, a condição de equilíbrio seria dada pelas decisões empresariais acerca do nível de produção. O salário real8, para estimular o trabalhador a ofertar seu recurso produtivo, deve ser igual à desutilidade que o labor causa, isto é, quando o trabalho entra em ação o seu detentor, o trabalhador, ganha desutilidade por estar agregando utilidade ao produto. O salário deve, então, ser equivalente a este nível de desutilidade para que o trabalhador esteja em equilíbrio e, assim, seja incentivado a ofertar sua mão-de-obra (KEYNES 1996, p. 46). 2

Entendamos neste trabalho como escola neoclássica de economia os economistas fies à tradição utilitarista e marginalista e que seguem o pensamento de economistas como Gossen, Jevons, Menger, Edgeworth e Walras de maneira mais ou menos consistente. Deste grupo, por óbvio, devem ser excluídos fundadores de escolas críticas àquela e seus seguidores, como Schumpeter, Keynes, Veblen e Kalecki. 3 Este seria um estado de completo laisser faire; estado este que Alfred Marshall, um dos expoentes da escola neoclássica, em 1890, viria a considerar difícil de ser encontrado no mundo prático, principalmente no que tange à concorrência perfeita (MARSHALL 1996). 4 Uma vez que todos os custos de produção remuneram fatores de produção. 5 Gerada pelos trabalhadores. 6 Gerada pelas empresas. 7 Limitada pela população economicamente ativa que não costuma sofrer grandes alterações em curtos espaços de tempo. 8 Preço da mão-de-obra. Representa o poder aquisitivo dos trabalhadores, isto é, o seu salário monetário (nominal), descontando-se a variação dos preços.

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Para os neoclássicos, então, se há desemprego ele só pode ser de dois tipos: Voluntário, quando o ofertante de trabalho decide não entrar no mercado por não achar as condições interessantes; Friccional, quando o ofertante de trabalho não está trabalhando por assimetrias de informação ou mobilidade imperfeita de recursos. O desemprego em massa observado nos EUA pós-crise de 1929, segundo esta teoria, foi gerado, por um lado, por resistência dos trabalhadores em aceitar redução de salários e, por outro lado, pela legislação de amparo ao trabalhador, como salário mínimo e limitações de jornada. Estas causas podem ser traduzidas como repressão da concorrência perfeita, em virtude da força dos sindicatos, o que tendia a concentrar a oferta de trabalho e subir seu preço (salário), e manipulação do sistema de mercado, através da fixação de preço mínimo (salário mínimo). Não existindo desequilíbrios, não haveria a possibilidade de desemprego involuntário. Bastaria deixar o mercado agir sem intervenção do Estado ou dos sindicatos que o equilíbrio no pleno emprego seria restabelecido (DILLARD 1982, pp. 21 e 22). O professor Cecil Pigou foi o principal defensor desta tese, em seu trabalho Theory of Unemployment (KEYNES 1996, pp. 47 e 49). Na obra A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda (Teoria Geral), publicada na Inglaterra no ano de 1936, o economista John Maynard Keynes demonstrou sua discordância com relação à teoria neoclássica e expôs uma teoria alternativa. Mais do que uma teoria alternativa, Keynes a chamou de Teoria Geral, pois ele acreditava que os postulados neoclássicos só seriam verificados no caso especial do pleno emprego (KEYNES 1996, p. 43). Não obstante, Keynes admitia a possibilidade de equilíbrio em um nível de atividade abaixo do pleno emprego. Este seria o caso mais comum; não o pleno emprego. Keynes vai mais longe ao acreditar que o alcance do nível de pleno emprego, dada uma situação de equilíbrio abaixo deste, só seria possível através de incentivos oriundos do Estado. De uma só vez, este economista põe por terra toda a teoria baseada na Lei de Say e no laisser faire. Para justificar seu interesse pelo tema, Keynes argumenta que o problema do desemprego tem sido negligenciado pela teoria econômica vigente na época 4/8

(neoclássica) e que esta não sobrevivia quando confrontada com os fatos (KEYNES 1996, pp. 43 e 44). Keynes dá um novo tratamento à teoria econômica. Em primeiro lugar, para explicar sua teoria, ele olha o sistema econômico de modo agregado, isto é, como o conjunto de agentes de vários mercados. O economista representa a oferta de bens da economia como um todo em forma de renda mínima que os empresários pretendem auferir com a venda destes bens para justificar a produção, em função do nível de emprego necessário para que isto seja possível. Esta relação foi chamada de Curva de Oferta Agregada (KEYNES 1996, p. 60). Contudo, a grande inovação fica na interpretação da Curva de Demanda Agregada. Ela seria formada pelas expectativas que as empresas fazem acerca da renda que a venda de seus produtos iria gerar, dado o nível de emprego da economia (KEYNES 1996, pp. 60 e 61). Vale pena frisar que as duas curvas não são iguais para Keynes. A primeira representa o mínimo que as empresas aceitariam de renda, ao nível de emprego que está sendo praticado. A outra representa a expectativa de preço que se deve realizar. Segundo os neoclássicos não haveria duas curvas, mas antes apenas um ponto, o de pleno emprego, uma vez que toda a oferta geraria sua própria procura (KEYNES 1996, pp. 63 e 64). Keynes então introduz a idéia de Propensão a Consumir. Segundo este conceito, o consumo é dependente da renda. O consumidor tende a consumir uma parte da renda, mas nunca toda ela. Esta porcentagem da renda que tende a ser consumida, Keynes chamou de Propensão a Consumir (KEYNES 1996, p. 63). A relação entre o consumo e a renda é sempre menor que a unidade, e quanto maior for a renda, menor tende a ser esta proporção (KEYNES 1996, p. 64). A Lei de Say desmorona na análise de Keynes, pois, neste caso, toda a oferta tenderia a gerar uma procura menor. Na Teoria Geral, a Oferta pode ser de dois tipos de bens: i) Bens de Consumo, cuja demanda é uma função da Propensão a Consumir, que é uma função da renda e que, em última análise, é uma função do emprego. A Propensão a Consumir, segundo

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Keynes, tende a flutuar pouco no curto prazo (KEYNES 1996, p. 64); ii) Bens de Investimento, cuja demanda é função do preço destes bens, que é função da diferença entre a Eficiência Marginal do Capital9 e o complexo de taxas de juros corrente10 (KEYNES 1996, p. 62). Como se pode imaginar, o investimento tende a ser mais errático do que o consumo. A Demanda Efetiva é quem determina o nível de emprego de uma economia. Ela é dada no cruzamento entre as Curvas de Demanda e Oferta agregadas (DILLARD 1982, p. 30). Neste ponto, as expectativas das empresas se realizam, pois, ao nível de emprego oferecido, conseguem igualar o mínimo que elas aceitariam de receita com a receita realizada, maximizando seus lucros e equilibrando o sistema (KEYNES 1996, p. 64). Contudo, este ponto não precisa ser o de pleno emprego (KEYNES 1996 p. 62). Como os bens de consumo geram uma receita menor do que a remuneração dos fatores produtivos empregados em sua produção11, e esta diferença tende a ser maior conforme a renda aumenta, as empresas tendem a diminuir o emprego até o ponto onde o consumo compense a oferta de emprego. Não obstante, não nos esqueçamos dos bens de investimento. Como sua demanda não depende da renda, nem do emprego, mas antes das expectativas os empresários com relação ao comportamento da Eficiência Marginal do Capital e da Taxa de Juros no futuro, o Investimento Agregado é o fator regulador do emprego na economia, juntamente com a Propensão a Consumir (KEYNES 1996, p. 64). Se o investimento cobrir a diferença entre o consumo e a renda gerada pelo emprego, eliminando a insuficiência de demanda, a economia estará em pleno emprego, mas apenas nesta situação (KEYNES 1996, p. 62). Por isto Keynes afirma que a teoria neoclássica não é senão o caso especial. Quanto maior a renda, maior tem de ser o investimento para cobrir o gap do consumo e levar a economia ao pleno emprego. Para que isto aconteça, dada uma Propensão a Consumir que consideraremos quase fixa no curto prazo, é preciso

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Atualmente, um conceito próximo a este pode ser a Taxa Interna de Retorno (TIR). Dadas as informações sobre riscos e prazos médios. 11 Lembre-se da Propensão a Consumir menor que 1. 10

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aumentar o incentivo ao investimento. Isto pode se dar de várias formas, inclusive por políticas econômicas12 e intervenção direta do Estado na economia13 (KEYNES 1996, p. 171).

3. Conclusão: Surgida em um momento propício14, a Teoria Geral ganhou rapidamente muitos adeptos e o status de Revolução, justamente porque rompia com postulados importantes da economia neoclássica, como laisser faire e Lei de Say. Os conceitos de Demanda Efetiva e Propensão a Consumir romperam também com o Princípio da Parcimônia apregoado pelos neoclássicos como única fonte do crescimento econômico, pois só poupando (abstendo-se do consumo presente) seria possível investir (consumir no futuro). A Teoria Keynesiana foi utilizada como base para políticas econômicas na Europa e EUA após a II Guerra Mundial, mas depois da década de 70 do século passado foi subjugada por teorias de inspiração neoclássica (os novoclássicos). Ao entender do autor fica claro que a insistente divergência entre estas correntes se deve às premissas que adotam com relação à distribuição do produto econômico – uma parte da Lei de Say e outra da Demanda Efetiva – que são mutuamente excludentes. Deste modo, dependendo como os dados do mundo econômico se apresentem, e dependendo do estado de prosperidade ou depressão, uma tende a sobrepujar a outra nos discursos acadêmicos e políticos, mas, aparentemente, por um curto espaço de tempo.

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Fiscal, Monetária e Cambial. Desde que afete positivamente as expectativas dos empresários. 14 Durante a maior Depressão econômica já vista (1929 – 1939), quando a validade da economia neoclássica começava a ser questionada nos meios acadêmico e político. 13

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BIBLIOGRAFIA: DILLARD, Dudley. A Teoria Econômica de John Maynard Keynes. Tradução: Albertino PINHEIRO JR. São Paulo: Livraria Pioneira, 1982. KEYNES, John Maynard. A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda. Tradução: Mário R. CRUZ. São Paulo: Nova Cultural, 1996. MARSHALL, Alfred. Princípios de Economia. Tradução: Romulo Almeida e Ottolmy Strauch. São Paulo: Nova Cultural, 1996.

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