UNIVERSIDADE FEDERAL DO CARIRI – UFCA Discente: Odilon Rodrigues de Lima Netto Docente: Camila do Espirito Santo Prado de Oliveira Disciplina: História da Filosofia I
Aristóteles e sua escola Pode-se notar na origem da escola de Aristóteles, como na origem da Academia, a mesma vontade de criar uma instituição durável. Como na Academia há duas espécies de membros, os anciões, que participam do ensino, e os jovens; há também certa igualdade entre os anciãos. Mas há profunda diferença entre o projeto da escola de Aristóteles e o projeto platônico. A escola de Platão tem uma finalidade política, a de Aristóteles, o ensino prático e político dirigir-se-á a um público mais amplo, a homens políticos, de fora da escola, mas que desejam se instruir sobre a melhor maneira de organizar a cidade. Aristóteles distingue entre a felicidade que o homem pode encontrar na vida política, na vida ativa – é a felicidade que pode conduzir à prática da virtude na cidade -,e a felicidade filosófica que corresponde à theoría, isto é, a um gênero de vida consagrado totalmente à atividade do espírito. Aquele que se consagra à atividade do espírito depende unicamente de si mesmo: sua atividade será, talvez, melhor caso tenha colaboradores; porém, quanto mais se é sábio, mais se poderá ser só. A vida segundo o espírito não procura outro resultado senão a si mesma, é amada por si mesma, é para si mesma seu próprio fim e, poder-se-ia dizer, sua própria recompensa. A vida segundo o espírito conduz também à ausência de perturbação, a vida filosófica se pode viver no ócio, no distanciamento dos cuidados materiais. Essa forma de vida representa a forma mais elevada de felicidade humana, mas pode-se dizer, ao mesmo tempo, que essa felicidade é sobre-humana. Como em Platão, a escolha filosófica conduz o eu individual a ultrapassar-se em um eu superior, a elevar-se a um ponto de vista universal e transcendente. O cume da felicidade filosófica e da atividade do espírito, isto é, a contemplação do intelecto
divino, só é acessível o homem em raros momentos, pois é próprio da condição humana não poder em ato de maneira contínua. Parece que para Aristóteles a filosofia consiste em um modo de vida “teorético”. A palavra teorético designa o modo de conhecimento que tem por fim o saber pelo saber e não fim exterior a si mesmo e, por outro, o modo de vida que consiste em consagrar sua vida a esse modo de conhecimento. A filosofia “teorética” é, ao mesmo tempo, uma ética. A práxis teorética consiste em escolher como fim apenas o conhecimento, em querer o conhecimento por ele mesmo, sem perseguir outro interesse particular e egoísta estranho ao conhecimento. A escola de Aristóteles dedica-se a uma imensa caça de informações em todos os domínios, dados históricos (por exemplo, a lista dos vencedores dos Jogos Píticos), sociológicos (as constituições das diferentes cidades), psicológicos ou filosóficos (as opiniões dos antigos pensadores). Isso para fazer comparações e analogias, que se percebam as causas, em estreita colaboração entre a observação e o raciocínio. Diz Aristóteles, é necessário fiar-se mais a observação dos fatos que ao raciocínio, e ao raciocínio somente á medida que ele concordar com os fatos observados. Se experimentamos alegria ao conhecermos tanto os astros como os seres da natureza sublunar, é porque nisso encontramos, direta ou indiretamente, um signo da realidade que nos atrai de maneira irresistível, o primeiro princípio, que move todas as coisas, como o objeto de seu amor move o amante. Se temos prazer ao ver a reprodução pelo artista de coisas feias e repulsivas, é que admiramos a arte com o qual o artista as imitou. Notemos, rapidamente, que é precisamente na época helenística, iniciada no tempo de Aristóteles, que a arte grega torna-se realista, representando temas vulgares, personagens de classe inferior ou animais de todo gênero. Encontraremos prazer em estudar todas as obras da natureza se procurarmos sua intenção, a finalidade que ele buscou em sua ação. Para Aristóteles, todo ser é belo, pois ele sabe situá-lo na perspectiva do plano da natureza e do movimento geral e hierarquizado de todo o universo para o princípio que é o desejável supremo. O prazer que se tem com a beleza da
natureza é, de alguma maneira e paradoxalmente, um interesse desinteressado. Na perspectiva aristotélica, esse desinteresse corresponde ao afastamento de si, pelo qual o indivíduo se eleva ao nível do espírito, do intelecto, que seu verdadeiro eu, e toma consciência da atração que exerce sobre ele o princípio supremo, desejável supremo e inteligível supremo. Aristóteles procura fazer compreender o que pose ser a beatitude do pensamento divino comparando-a ao que experimenta, em raros momentos, o intelecto humano. Parece que a beatitude do intelecto humano chega a seu ponto mais elevado quando, em certos momentos, ela pensa, em uma intuição indivisível, na indivisibilidade da beatitude divina. Não há nada mais distante da teoria que a teorética, isto é, a contemplação. Antes que de uma vida de sábio é necessário falar da “vida dedicando-se à sabedoria”, da “vida filo-sófica”, na medida que a sabedoria representa, para Aristóteles, a perfeição da theoría. Para ele o intelecto humano está distante de possuir essa perfeição, da qual só se aproxima em certos instantes. ”Somente Deus pode desfrutar esse privilégio”. As obras de Aristóteles são fruto da atividade teorética do filósofo e de sua escola. Mas o discurso filosófico desconcerta o leitor moderno, por exemplo a teoria do intelecto. Não se encontra nele uma exposição exaustiva e coerente de teorias que constituíram as diferentes partes dos sistemas de Aristóteles. Como Sócrates, como Platão, o que ele quer antes de tudo é formar discípulos. Seu ensinamento oral e sua obra escrita dirigem-se sempre a um auditório determinado. A maior parte de seus tratados, salvo talvez os de moral e de política, sem dúvida destinados a um público mais amplo, são o eco das lições orais que deu em sua escola. Quando Aristóteles elabora um curso, não se trata de “informar”, de entornar no espírito dos ouvintes um conteúdo teórico, mas de “formá-los”, e trata-se também de realizar uma investigação comum: é essa vida teorética. Para Aristóteles a discussão dos problemas é, por fim, mais formadora do que sua solução. Nesses cursos, ele mostra de modo exemplar por qual marca de pensamento, por qual método, devem-se investigar as causas dos fenômenos
em todos os domínios da realidade. Agrada-lhe abordar o mesmo problema sob ângulos diferentes, partindo de diferentes pontos de partida. Ninguém mais que Aristóteles foi consciente dos limites do discurso filosófico como instrumento de conhecimento. Tudo que simples é inexprimível na linguagem. A discursividade da linguagem só pode exprimir o que é composto o que pode ser dividido sucessivamente em partes. Quando se trata de substâncias simples, como o Intelecto primeiro, que é princípio de movimento de todas as coisas, o discurso não pode dizer sua essência, mas somente descrever seus efeitos ou proceder por comparação com a atividade de nosso próprio intelecto. O discurso por si não pode agir sobre o ouvinte se não há colaboração da parte dele. Na ordem teorética, é necessário, primeiramente, para compreender o discurso, que o ouvinte já tenha uma experiência disso que fala o discurso, uma familiaridade com seu objeto. É necessário experimentar demoradamente as coisas para conhecê-las, para familiarizar-se tanto com as leis gerais da natureza como com as necessidades racionais ou as exigências do intelecto. Sem esse esforço pessoal, o ouvinte não assimilará os discursos e eles serão inúteis. Os discursos filosóficos não bastam para tornar virtuosos. Há duas categorias de ouvintes. Os primeiros já têm predisposições naturais para a virtude ou receberam uma boa educação. Para estes, os discursos morais podem ser úteis. Os segundos são escravos de suas paixões e, neste caso, o discurso moral não terá nenhuma influência sobre eles. A esse gênero de ouvintes é necessário trabalhar muito tempo o hábito da alma do ouvinte, de modo que ela exerça bem suas propensões e repulsões. Aristóteles considera que esse trabalho de educação cabe à cidade realizar, pela coação de suas leis e pela coerção. Assegura a virtude de seus concidadãos efetivamente educados de modo a tornar-se virtuosos e, por outro, assegurar no seio da cidade a possibilidade de ócio que permita aos filósofos ascender a vida teorética. Para Aristóteles a atividade do filósofo na cidade deve restringir-se a formar o juízo dos políticos: são estes, por seu turno, que deverão agir pessoalmente, legislando, para assegurar a virtude moral dos cidadãos. O filósofo, por sua parte, escolherá uma vida consagrada à investigação
desinteressada, ao estudo a à contemplação e, deve-se reconhece-lo, independente da azáfama da vida política.