Pitta, Danielle Perin Rocha - Iniciação Ao Imaginário De Gilbert Durand.pdf

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Danielle Perin Rocha Pitta

INICIAÇÃO À TEORIA DO IMAGINÁRIO DE GILBERT DURAND 2a Edição

EDITORA CRV Curitiba - Brasil 2017

Copyright O da Editora CRV Ltda. Editor-chcfc: Railson Moura Diagramaçào e Capa: Editora CRV Imagem da capa: O Jardim das Delícias Terrenas - Hieronymus BOSCH (1504) - Museu do Prado - Madrid Revisão: A Autora

PnSI Pina. Daniclle Perin Rocha. Iniciação à teoria do imaginário de Gilbert Durand. Daniclle Perin Rocha Pina. 2. Ed Curitiba: CRV. 2017. llSp. Bibliografia ISBN 978-85-444-1481-1

1. Antropologia 2. Imaginário 3. Métodos - símbolos 1 Titulo III. Série.

CDD 128.3 Índice para catálogo sistemático 1 Antropologia 128.3

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2017 Foi feito o depósito legal conf. Lei 10.994 de 14/12/2004 Proibida a reprodução parcial ou total desta obra sem autorização da Editora CRV Todos os direitos desta edição reservados pela: Editora CRV Tel.: (41) 3039-6418 - E-mail: [email protected] Conheça os nossos lançamentos: www.editoracrv.com.br

Conselho Editorial: Comitê Científico: Aldira Guimarães Duarte Domínguez (UNB) Andreia da Silva Quintanilha Sousa (UNIR/UFRN) Antônio Pereira Gaio Júnior (UFRRJ) Carlos Alberto Vilar Estevão (UMINHO - PT) Carlos Fedcrico Dominguez Avila (UNB) Camien Tereza Velanga (UNIR) Celso Conti (UFSCar) Ccsar Gerónimo Tello (Univer. Nacional Trcs de Fcbrero • Argentina) Elione Maria Nogueira Diogenes (UFAL) Élsio Josc Cora (UFFS) Elizeu Clementino (UNEB) Francisco Carlos Duane (PUC-PR) Gloria Farinas León (Universidade de La Havana - Cuba) Guillermo Arias Beatón (Universidade de La Havana - Cuba) Jailson Alves dos Santos (UFRJ) João Adalberto Campato Junior (UNESP) Josania Portela (UFPI) Leonel Severo Rocha (UNISINOS) Lídia de Oliveira Xavier (UNIEURO) Lourdcs Helena da Silva (UFV) Maria de Lourdcs Pinto de Almeida (UNICAMP) Maria Lilia Imbiriba Sousa Colares (UFOPA) Mana Cristina dos Santos Bezerra (UFSCar) Paulo Romualdo Hemandes (UNICAMP) Rodrigo Praite-Santos (UFES) Sérgio Nunes de Jesus (IFRO) Sintone Rodrigues Pinto (UNB) Solange Helena Ximenes-Rocha (UFOPA) Sydione Santos (UEPG) Tadeu Olivcr Gonçalves (UFPA) Tania Suely Azevedo Brasileiro (UFOPA)

Ângelo Aparecido Priori (UEM) Dagniar Manieri (UFT) Edison Bariani (FCLAR) Elizeu de Miranda Corrêa (PUC/SP) Fernando Antonio Gonçalves Alcoforado (Universitat de Barcelona. UB, Espanha) Giovani José da Silva (UNIFAP) Josc de Ribamar Sousa Pereira (Exército Brasileiro/Ministério da Defesa) Marcelo Paixão (UFRJ e UTexas - US) Mauro Guilherme Pinheiro Koury (UFPB) Silvia Maria Favero Arend (UDESC) Sonia Maria Ferreira Koehler (UNISAL)

Este livro foi avaliado e aprovado por pareceristas cid hoc.

SUMARIO PREFÁCIO ........... Alberto Filipe Araújo

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LIVRO 1 - O QUE É IMAGINÁRIO ... O dever de imaginar............................ Quando e como surgiu, no ocidente, o estudo do Imaginário........................ O imaginário: essência do espírito...... Do símbolo ao simbólico ao imaginário A organização dos símbolos............... Como se forma então o imaginário de uma cultura dada? .... Os símbolos convergem .......................................... Regimes das imagens e as estruturas do imaginário Os semblantes do tempo.......................................... O regime diurno da imagem..................................... A estrutura heróica do imaginário............................. O regime noturno da imagem................................... A estrutura mística do imaginário............................. A estrutura sintética do imaginário........................... As funções da imaginação simbólica ....................... Métodos do imaginário ............................................

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LIVRO 2 - OS PAIS FUNDADORES DA NOÇÃO DE IMAGINÁRIO .................... Gaston Bachelard (1884-1962)................ J-J Wunenburger Método...................................................... Fisionomia da imagem............................. Tipologia das imagens............................. Leis das imagens...................................... A nova crítica literária............................... A imaginação como arte de viver e ética ... Fontes e influências..................................

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Mircea Eliade (1907-1986) J. Thomas O estatuto da imagem em Eliade O mito heroico............................ O esquema iniciático.................. A coincidentia oppositorum O tempo...................................... Bibliografia seletiva.................... Henry Corbin (1903-1978) J. Thomas Obras de Henry Corbin Edgar Morin (1921-)................... J. Thomas Referências............................... Gilbert Durand (1921 - 2012) H. Godinho REFERÊNCIAS SOBRE AAUTORA

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PREFÁCIO Alberto Filipe Araújo Universidade do Minho — Portugal

Danielle Rocha Pitta, uma das fundadoras dos Estudos do Imaginário no Brasil, em boa hora (kairos) preparou uma nova edição da sua obra intitulada Iniciação à Teoria do Imaginário de Gilbert Durctnd estruturada em dois livros: o primeiro trata de indagar “o que é o imaginário”, enquanto o segundo livro debruça-se sobre “os pais fundadores da noção de imaginário” (Gaston Bachelard, Mircea Eliade, Henry Corbin, Edgar Morin e, por último Gilbert Durand). Utilizando as suas próprias palavras, 0 objetivo do seu livro é, a partir das Estruturas Antropológicas do Imaginário (1960) e da Imaginação Simbólica (1964), apre­ sentar “uma síntese da sua proposta em uma linguagem acessível a pessoas sem formação específica sobre o assunto”. No Livro 1, dedicado ao Imaginário, a autora apresenta toda uma teoria e concetualização do Imaginário que permite entender uma noção simultaneamente ingrata e complexa com­ parativamente com as noções de utopia e de símbolo que têm normalmente uma conotação positiva no quadro da hermenêutica e mesmo do pensamento sociopolítico. E, portanto, neste Livro 1 que a mestria e competência científica da Danielle Rocha Pitta ressaltam no quadro da compreensão e explicação do edifício que constitui o Imaginário enquanto essência do espírito, porquanto ele não é caótico, arbitrário e contingente. Trata-se, pois, de um conceito que dá que pensar, como o disse antes Paul Ricoeur a propósito do símbolo, visto que ele é um adjuvante importante quer para as atividades do pensamento, quer mesmo para a trans-formaçâo do sujeito imaginante. No Livro 1 a autora discorre sobre o dever de imaginar, ou seja, no uso da imaginação como uma faculdade de dar vida ao imaginário que é, por sua vez, uma vida animada de símbolos. Aliás, esta é uma das noções que me­ rece, por parte de uma das artesãs dos Estudos do Imaginário em língua portuguesa, um destaque particular na economia da obra a par de uma reflexão sustentada nas “estruturas antropológicas

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do imaginário** de Gilbert Durand c mesmo na importante noçào de “imaginação simbólica": ambos os temas constituem a clef dc voíite do pensamento de Gilbert Durand. O Livro 1 termina-se com os “métodos do imaginário" onde nos é explicado que os conteúdos do imaginário são passíveis de serem estudados e tematizados mediante metodologias rigorosas às quais Gilbert Durand deu o nome de mitocritica (domínio do texto literário) e de mitanálise (domínio do social e do histórico). Ao conjunto destes dois métodos. Gilbert Durand deu-lhe o nome de mitodologia. A autora inclui também nos “Métodos do Imaginário’* o “Teste Arquetípico de nove elementos (AT9)’* da autoria de Yves Durand que permite, nas palavras de Danielle Rocha Pitta, ao “indivíduo transformar arquétipos universais em símbolos situados numa vivência individual e coletiva específica". Se a temática do Livro 1 funciona como uma rigorosa e comprometida iniciação à teoria do imaginário de Gilbert Durand em língua portuguesa, já o Livro 2 é dedicado aos “pais funda­ dores da noçào de imaginário": muitos dos quais, nomeadamente Gaston Bachelard, Mircea Eliade e Henry Corbin, influenciaram decisivamente o pensamento do próprio Gilbert Durand. Trata-se de um livro retomado de uma obra já editada por Joèl Thomas, intitulada Introdução às metodologias do imaginário (1998), em que Danielle Rocha Pitta apresenta de modo pertinente e escla­ recedor um conjunto de autores, aliás, já citados e aos quais se acrescenta os nomes de Edgar Morin e, por último, de Gilbert Durand. E um livro que permite compreender, ainda que de modo abreviado, o pensamento desses autores que estiveram na base da obra de Gilbert Durand excetuando Edgar Morin cuja influência foi menor que os restantes citados. Se procurarmos apresentar uma síntese da obra, agora pu­ blicada pela mão da Danielle Rocha Pitta, por nossas próprias palavras diriamos que da nova antropologia durandiana podem ser extraídas três orientações: A procura de uma terceira via entre estruturalismo de Claude Lévi-Strauss e a hermenêutica de Paul Ricoeur: o estruturalismo figurativo onde se ancoram, em úl­ tima instância, a mitocritica e a mitanálise enquanto métodos sincréticos;

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A fundação de uma nova antropologia do imaginário, cuja base assenta em dois regimes do imaginário (o diurno e o noturno) e três estruturas (a heróica, a sin­ tética e a mística). Toda uma arquitetura fundada em reflexos dominantes corporais (postural, copulativo e digestivo) que culminam nos símbolos culturais, passando antes pelos schèmes verbais, arquétipos “epitéticos” e “substantivos”; Por fim, o imaginário dá conta da totalidade do uni­ verso humano na sua relação com o cosmos e o meio-ambiente em geral. Assim, vemos que Gilbert Durand insere o imaginário numa das suas noções fundamentais - a de “trajeto antropológico” que começa pelos “refle­ xos dominantes” - atualmente diriamos neuronais - e se termina pelo intermédio das representações e valores culturais (artes e religiões, por exemplo).

Neste contexto, Gilbert Durand propôs nas suas Les Struc/ures Anthropologiques de L 'Imaginaire1 uma espécie de gramática iconológica que obedece a uma lógica de imagens e esta, por sua vez, conjuga uma “semântica arquetipal” (e não existencial) com uma sintaxe simbólica (não formalista), a qual recebeu o nome de “Classificação Isotópica das Imagens”: é constituída por dois regimes de imagem (diurno e noturno) e por três estru­ turas antropológicas que configuram o imaginário (estruturas esquizomofas ou heróicas, estruturas sintéticas ou dramáticas e as estruturas místicas ou antifrásicas. Estas orientações condu­ zem a que a imaginação não imagine qualquer coisa, ela não é a folie du logis (Malebranche), nem, como o pretendia Pascal, a maitresse d'erreur et de fausseté. A imaginação (que não deve ser confundida com a fantasia (fancy)) produz as suas obras de acordo com a gramática iconológica, tal como a elaborou o próprio Gilbert Durand, na medida em que o imaginário humano não imagina qualquer coisa como sublinha também o autor. Compreende-se, assim, que a imaginação não seja uma faculdade caótica, arbitrária, contingente e que o imaginário por si destilado possa ser mesmo universalizado em conteúdos 1

Gilbert Durand (1984). Les Structures Anthropologiques de 1’lmaginaire. Introduction á 1’archétypologie générale. 106 edit. Paris: Dunod.

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imaginativos que podem ser recenseados sob a forma de símbo­ los que sempre encobrem os dois tipos de arquétipos (epitéticos e substantivos) estudados por Gilbert Durand. Neste sentido, perguntamo-nos. na linha de Danielle Rocha Pitta, qual o papel dos símbolos, das estruturas antropológicas do imaginário e das funções da imaginação simbólica na formação imaginante do homem como “animal simbólico*’ (Ernst Cassirer)? Em última instância, podemos responder, apoiados na autora, que o seu papel é o de nos ensinar a “imaginar melhor” e melhor entender as raízes míticas e simbólicas que estão na base desse mesmo imaginar: imaginar melhor remete-nos, para além da utopia, para uma das principais funções da imaginação segundo Gilbert Durand - a função de eufemizaçào com o seu poder de transformação: a imaginação simbólica tem por escandalosa função geral negar eticamente o negativo [...] a imaginação simbólica c dinamicamente negação vital negação do nada da morte e do tempo. [...] a função da imaginação é antes de mais uma função de eufemizaçào, não um simples ópio negativo, máscara que a consciência ergue face à horrenda figura da morte, mas pelo contrário di­ namismo prospectivo. que através de todas as estruturas do projecto imaginário, tenta melhorar a situação do homem no mundo. [...] O facto de desejar e de imaginar a morte como um repouso, um sono, esse mesmo facto a eufemiza e a destrói (1979, p. 117, p. 119, p. 121-122)2. Também o imaginário, bem longe de ser uma paixão vã. é ação eufemizante e transforma o mundo segundo o Homem do Desejo (1984, p. 501 )3. 2 3

Gilbert Durand (1979). A imaginação simbólica. Trad. de Maria de Fátima Morna. Lisboa: Arcádia, p. 117, p. 119 e p. 121-122. Gilbert Durand (1984). Les Structures Anthropologiques de l'lmaginaire. Introduction à 1'archétypologie générale, p. 501. Atente-se a esta passagem que Gilbert Durand escreve nas suas Structures Anthropologiques de ílmaginaire a respeito desta questão: ‘Car Ia véritable liberté de Ia dignité de Ia vocation ontologique des personnes ne repose que sur cette spontanéité spirituelle et cette expression créatrice qui constitue le champ de l imaginaire. Elle est tolérance de tous les régimes de lesprit, sachant bien que le faisceau de ces régimes nest pas de trop à cet honneur poétique de l'homme qui consiste à faire échec au néant du temps et de Ia morfi (1984, p. 497).

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Esta função, como nos recorda Gilbert Durand, não só se submete ao antagonismo dos regimes do imaginário, como não pode deixar de usar as figuras semânticas da retórica, tais como a antítese para o regime diurno e a antífrase para o regime noturno, para melhor se exprimir. Por fim, a imaginação simbólica é uma faculdade, se é que podemos falar de modo espacial, que não se encontra nos confins do nosso espírito, ela é como o vento e a água que o está sempre percorrendo ora mais suavemente, ora mais in­ tensamente não importa qual é a direção escolhida: “a imaginação simbólica constitui a própria actividade dialética do espírito"4. Como é bem preciso terminar este prefácio, nós escolheri­ amos a secção em que Danielle Rocha Pitta fala do imaginário como “essência do espírito” onde apresenta as várias noções de imaginário concebidas e apresentadas por Gilbert Durand. Assim, nós escolheriamos tão-somente, e a título de exemplo de fecho, dois extratos de Durand citados pela autora: Para poder falar com competência do Imaginário não se deve confiar nas exiguidades e nos caprichos da sua própria imaginação, mas possuir um repertório quase exaustivo do Imaginário normal e patológico em todas as camadas culturais que nos propõem a história, as mitologias, a etnologia, a linguística e as literaturas. O Imaginário, nesta perspectiva, pode ser considerado como essência do espírito, na medida em que o ato de criação (tanto artístico, como o de tornar algo sig­ nificativo), é o impulso oriundo do ser (individual ou coletivo) completo (corpo, alma, sentimentos, sensibi­ lidade, emoções...), é a raiz de tudo aquilo que, para o ser humano, existe. Deste modo, deixo estas palavras escritas que são também elas próprias não só uma apreciação da obra em apreço, Iniciação à Teoria do Imaginário de Gilbert Durand (na sua 2a edição), como também uma homenagem sincera e agradecida à sua autora.

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Gilbert Durand (1979). A imaginação simbólica, p. 117.

É

LIVRO 1 - O QUE É IMAGINÁRIO O dever de imaginar Você já teve a oportunidade de ver, ou já ouviu falar nas diferenças existentes entre os esqueletos humanos nas diversas culturas? No Musée cie 1'Homme, em Paris, por exemplo, pode-se ver crânios achatados, outros alongados, outros ainda afundados no meio para formar uma divisão; existem também pés com as falan­ ges dos dedos torcidas; e várias outras deformações do esqueleto. Depois do esqueleto, muitas culturas modificam também a pele através de cortes ou deformações: esticam-se os lábios, o pescoço ou as orelhas, fazem-se perfurações, tatuagens e escarificações. Chegando-se, então, à modificação mais superficial deste corpo através da roupa, do tratamento do cabelo e da maquilagem. Mas o que leva o ser humano a tanto modificar o que foi feito pela natureza? Certamente seria difícil dar uma explicação baseada na utilidade dessas modificações. Na verdade, por estas ações, o homem está exercendo uma faculdade que lhe é própria, que é a de dar sentido ao mundo, ao universo. Para criar sentido, entretanto, ele põe em atividade uma função da mente que é a imaginação. A razão, outra função da mente, permite sem dúvida analisar os fatos, compreender a relação existente entre eles, mas não cria significado. Para que a criação ocorra é necessário imaginar. E o que fazem, na sociedade ocidental, os filósofos, os cientistas sociais, os estudiosos das religiões, os políticos, os arquitetos, os físicos, os matemáticos... e o homem da rua no seu cotidiano. Todas as culturas criam filosofias, teorias, religiões, obras de arte... Recriam, a cada instante, o universo. A ciência, como conhecimento, pode ser obtida seguindo-se os mais variados caminhos. Nas ciências humanas, durante mui­ tos anos, optou-se por um caminho calcado naquele das ciências naturais e que se acreditava ser racional e objetivo. Atualmente, as diversas críticas às diversas teorias, a auto­ crítica do próprio Ocidente diante dos fatos históricos (guerras, conflitos, miséria, etc.) e as modificações do pensamento sobre o

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assunto, em parte em relaçào aos progressos da física (quàntica), consideram como inviável estudar o ser humano como se esse fosse apenas um objeto, e talvez mesmo desinteressante. Como, por exemplo, compreender o que está sendo feito c dito hoje cm relaçào ao terrorismo, sem considerar as dimensões simbólicas e míticas que estào nas suas raízes? Nesta perspectiva, um estudo baseado na observação sensí­ vel dos fatos aparece como muito mais adequada para a obtenção de um conhecimento aprofundado de um objeto tão complexo quanto o ser humano. Este livro, para abordar o Imaginário, não terá, pois. como finalidade, retraçar no tempo e no espaço a história desta ciência na tentativa de dar uma visão completa sobre o assunto, mas optará por uma visão específica, que é a do antropólogo Gilbert Durand. A tentativa será de - a partir das “Estruturas Antropológicas do Imaginário" e da “Imaginação Simbólica” - apresentar uma síntese da sua proposta em uma linguagem acessível a pessoas sem formação especial sobre o assunto. Deve-se ressaltar ainda que o Imaginário, como encruzilhada das mais diversas ciências, diz respeito ao conhecimento como um todo, isto é. às diversas disciplinas acadêmicas.

Quando e como surgiu, no ocidente, o estudo do Imaginário? O ser humano é assim feito que atribui significados indo bem além da funcionalidade dos atos ou objetos. Assim é que aquilo que poderia parecer como sendo absolutamente natural (árvores, água. fogo...), é transformado pelas diversas culturas para adquirir significado específico. Como foi visto acima, altera-se a aparência do corpo com as mais diversas escarificações. com o corte dos cabelos, com os enfeites, a roupa. No plano das necessidades básicas, o procedimento não é diferente: para a alimentação existem as proibições alimentares, o modo de apresentação dos alimentos, a maneira de assimilá-los, etc... Enfim, nada para o ser humano é insignificante. E dar significado implica entrar no plano do simbólico. Se simbolizar faz parte da própria condição humana, é compreensível que estudiosos das mais variadas disciplinas se

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tenham desde sempre interessado por este nível de expressão No entanto, para a cultura ocidental, estes estudos foram feitos durante longo tempo de maneira pontual. Modernamente, pode-se considerar que é com o filósofo francês Gaston Bachelard (1884-1962) que tem início um estudo sistemático e interdisciplinar (a partir de diversos campos de es­ tudo) sobre o símbolo: a fundação da Société de Symbolisme em 1950, em Genebra, a partir de 1962 passa a publicar os Cahiers Interncitionciux de Symbolisme. Bachelard tem o grande mérito de ter reabilitado a poesia como meio de conhecimento; poesia que é do domínio do sim­ bólico, do sensível, do subjetivo: “Tudo o que pode esperar a filosofia, é tornar a poesia e a ciência complementares, é uni-las como dois contrários bem feitos”. Importância também do Círculo de Eranos (designação dada a um encontro de pensadores que ocorreu regularmente próximo a Ascona, na Suíça, a partir de 1933). Bachelard vai demostrar que o imaginário, muito longe de ser a expressão de uma fantasia delirante, se desenvolve em torno de alguns grandes temas, algumas grandes imagens que constituem para o ser humano os núcleos em torno dos quais as outras imagens convergem e se organizam. Em sua proposta de “um novo espírito científico”, Bachelard orienta a ciência para uma mudança de paradigma, propondo estudar o homem em sua capacidade de devaneio. Discípulo de Bachelard, Gilbert Durand funda em 1967 o Centre de Recherches sur VImaginaire, em Chambéry, na França, que passa a publicar a revista Circé. Com uma proposta, também, de interdisciplinaridade, o “Centre“ se desenvolve com forte influência das obras de Bachelard e do psicanalista suíço C. G. Jung (1875-1961). A partir destes dois centros e da difusão das teorias de base, os grupos de estudo sobre o imaginário se multiplicam. Atual­ mente existem centros de pesquisa em mais de vinte países, e em cada pais, em diversas universidades. No Brasil, cerca de 400 grupos de pesquisa lidam com o imaginário (dados do CNPQ 2016). Na França, a reflexão sobre a dimensão simbólica tem sido aprofundada - a partir de bases teóricas diversas - por es­ tudiosos corno Paul Ricoeur, René Alleau, Edgar Morin, Michel

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Maffesoli, Jean Duvignaud, Jean Baudrillard, J. J. Wunenburger, entre outros, além do próprio Gilbert Durand.

O imaginário: essência do espírito Ao longo da exposição da sua teoria, Gilbert Durand explicita a noçào de imaginário, através de noções várias que estào aqui reagrupadas: “O Imaginário - isto é, o conjunto de imagens e de relações de imagens que constitui o capital pensado do 'homo sapiens' - nos aparece como o grande denominador fundamental onde vêm se arrumar (se ranger) todos os procedimentos do espírito humano”. ‘'0 Imaginário [...] é a norma fundamental [...] perto da qual a contínua flutuação do progresso científico aparece como um fenômeno anódino e sem significado”. ‘‘Entre a assimilação pura do reflexo e a adaptação limite da consciência à objetividade, constatamos que o imaginário cons­ tituía a essência do espírito, isto é, o esforço do ser para erguer uma esperança viva diante e contra o mundo objetivo da morte”. “Para poder falar com competência do Imaginário não se deve confiar nas exiguidades e nos caprichos da sua própria imaginação, mas possuir um repertório quase exaustivo do Imaginário normal e patológico em todas as camadas culturais que nos propõem a história, as mitologias, a etnologia, a linguística e as literaturas”. O Imaginário, nesta perspectiva, pode ser considerado como essência do espírito, na medida em que o ato de criação (tanto artístico, como o de tornar algo significativo), é o impulso oriundo do ser (individual ou coletivo) completo (corpo, alma, sentimentos, sensibilidade, emoções ...), é a raiz de tudo aquilo que, para o ser humano, existe.

Do símbolo ao simbólico ao imaginário Porque falar em imaginário e não simplesmente em sim­ bolismo? Para obter resposta a esta pergunta é necessário fazer um breve percurso pelas principais teorias que serviram de base à reflexão de Gilbert Durand. Primeiro deve-se dizer que a proposta dc abordagem é fenomenológica: dois filósofos alemães, W. Dilthey (1833-1911) e

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E. Husserl (1869-1938), preocupados com o significado de uma obra ou da significação de um modo geral, estabelecem a oposição existente entre um método explicativo (estabelecendo relações de causa a efeito) que pode ser aplicado à natureza, e um método compreensivo, próprio para o estudo do homem. De maneira que o objetivo do estudo é decifrar o sentido próprio de toda a realidade humana, de toda expressão humana da vida e do espírito. Pode-se considerar que com Bachelard, definitivamente, em relação às ciências humanas, a visão do homem, como se fosse a de um objeto, deixa de ser a mais importante. Segundo o filó­ sofo, a validade do conhecimento é a mesma seja ele adquirido pela experimentação ou pela poesia. Bachelard mostrou, através da sua obra, que a organização do mundo - ou seja, as relações existentes entre os homens, entre os homens e a terra, entre os homens e o universo — não é o resultado de uma série de racio­ cínios, mas a elaboração de uma função da mente (psíquica) que leva em conta afetos e emoções. Nesta perspectiva ele coloca algumas idéias básicas: que o símbolo permite estabelecer o acordo entre o “eu” e o mundo; que os quatro elementos (terra, ar, água e fogo) são os “hormônios da imaginação”. O símbolo é pois dinâmico e a partir desta constatação Bachelard estabelece a relação entre símbolo, imagem e imaginário. “O vocábulo fundamental que corresponde à imaginação, não é a imagem, é o imaginário. O valor de uma imagem se mede pela extensão de sua aura imaginária. Graças ao imaginário, a imaginação é essencialmente aberta, evasiva. Ela é no psiquismo humano a experiência da abertura, a experiência da novidade”. Por outro lado, C. G. Jung (1875-1961), psicanalista su­ íço, intrigado com o fato de seus clientes relatarem sonhos idênticos a mitos de culturas outras que não a sua, propõe o conceito de “inconsciente coletivo”, memória da experiência da humanidade. O mito seria então a organização de imagens universais (arquetípicas) em constelações, em narrações, sob a ação transformadora da dinâmica das situações sociais. O que implica em uma relação íntima entre o indivíduo, a espécie e o cosmos. O inconsciente coletivo é estruturado pelos arquétipos, ou seja, por disposições hereditárias para reagir. Esses arquéti­ pos se expressam em imagens simbólicas coletivas, o símbolo sendo a explicitação “encarnada” do arquétipo.

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Cassirer (1874 -1945). filósofo alemão da escola neokantiana. por sua vez. mostra a importância do ser humano como animal simbólico. Para ele, os símbolos têm propriedades criadoras e libertadoras. Para Mircea Eliade (1907-1987). ainda, autor do “Tratado da História das Religiões” e estudioso do pensamento mítico, o mito é a experiência existencial do homem que lhe permite encontrar-se e compreender-se. A atividade criadora do espí­ rito humano lida com toda a experiência humana. A Física nào descreve o mundo, mas o ordena. A partir destas orientações, entre outras, Gilbert Durand vai falar em imaginário e nào em simbolismo, pois o símbolo seria a maneira de expressar o imaginário. Frequentemente, para se tratar de simbolismo, faz-se refe­ rência a “sistemas simbólicos”: aborda-se então o simbolismo religioso, político, etc. Mas para G. Durand. esses sistemas sim­ bólicos nào sào independentes, pois, decorrem de uma visão de mundo específica, imaginária, que é a própria cultura.

A organização dos símbolos Assim como aquela do autor das “Estruturas antropológi­ cas do imaginário”, esta exposição deverá ser feita de maneira linear, quando de fato nào existe anterioridade de nenhuma etapa sobre a outra. Para se abordar a “convergência” dos símbolos, é necessário definir os principais termos utilizados na construção teórica: SCHEME: é anterior à imagem, corresponde a uma tendên­ cia geral dos gestos, leva em conta as emoções e as afeições. Ele faz a junção entre os gestos inconscientes e as representações. Exemplos: à verticalidade da postura humana, correspondem dois schemes: o da ascensão e o da divisão (visual ou manual); ao gesto de deglutição, correspondem os schemes da descida (percurso interior dos alimentos) e do aconchego na intimidade (o primeiro alimento do ser humano sendo o leite materno, a amamentação). ARQUÉTIPO: é a representação dos schemes5. Imagem primeira de caráter coletivo e inato; é o estado preliminar, zona 5

Ortografia aqui proposta, considerando que a tradução de schème por esquema está equivocada.

INICIAÇÃO Á TEORIA DO IMAGINÁRIO DE GILBERT DURAND - 2a Edição

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onde nasce a ideia (Jung). Ele constitui o ponto de junção entre o imaginário e os processos racionais. Exemplos: o scheme da subida vai ser representado pelos arquétipos (imagens univer­ sais) do chefe, do alto; o scheme do aconchego, pelos da mãe, do colo, do alimento. SÍMBOLO: “é todo signo concreto evocando, por uma rela­ ção natural, algo ausente ou impossível de ser percebido”. E uma representação que faz “aparecer” um sentido secreto. Eles são visíveis nos rituais, nos mitos, na literatura, nas artes plásticas... MITO: “o mito é um sistema dinâmico de símbolos, arqué­ tipos e schemes que tende a se compor em relato”, ou seja, que se apresenta sob forma de história. Por este motivo ele já apresenta um início de racionalização. O mito é um relato fundante da cultura: ele vai estabelecer as relações entre as diversas partes do universo, entre os homens e o universo, entre os homens entre si. Por sua construção, próxima da composição musical que comporta refrãos, repetições, o mito tem sempre uma dimensão pedagógica. E ainda função do mito fornecer modelos de comportamento, ou seja, permitir a construção individual e coletiva da identidade. E assim que uma filha de Maria e uma filha de Iemanjá não terão nem a mesma visão de mundo nem o mesmo comportamento. As duas, entretanto, participarão da imagem arquetípica da Grande Mãe.

Como se forma então o imaginário de uma cultura dada? Para a compreensão do que segue, deve-se considerar que o processo de formação das imagens é o mesmo quer se trate de um indivíduo, quer se trate de uma cultura. A sensibilidade própria de uma cultura em interação com um meio e circunstancias determinadas, valoriza mais ou menos os schemes que, como um todo, correspondem à condição humana. Assim é que uma cultura pode perceber o universo como cheio de divisões e oposições, e outra (talvez no mesmo universo físico - ver os trabalhos da antropóloga americana Margaret Mead 1901-1978) o perceberá como unido e harmonioso. A primeira estará valorizando os schemes da divisão, vendo as diferenças como opostos: alto/baixo, bem/mal etc. e valorizará a individua­ lidade, o arquétipo do herói, o exercício do poder, a ação (como,

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por exemplo, os Mundugumor estudados por M. Mead: tribo da Nova Guiné australiana, os Mundugumor são canibais e caça­ dores de cabeças, individualistas e ávidos de poder). A segunda estará valorizando a comunidade, o plural, o arquétipo da mãe, do aconchego, o ato de proteger, o refúgio (como por exemplo, os Arapesh estudados pela mesma M. Mead: tribo do nordeste da Nova Guiné que tem por principais valores a comunidade e a harmonia). Isto não significa que todos os elementos da cultura se encontram neste registro de sensibilidade e percepção, mas que existe um polo predominante. Por este motivo não se trata de classificar uma cultura em tal ou tal estrutura, mas de perceber qual é a “polarização’* predominante, isto é. o tipo de dinamismo que se encontra em ação. O que leva à determinação do “trajeto antropológico’’ em determinada cultura ou grupo social. O trajeto antropológico é “o incessante intercâmbio existente, ao nível do imaginário, entre as pulsões subjetivas e assimiladoras e as intimações objetivas que emanam do meio cósmico e social". O scheme é, pois, a dimensão mais abstrata, correspondendo ao verbo, à ação básica, à intenção de gesto: por exemplo, dividir, unir. confundir. O arquétipo, dando forma a esta intenção fun­ damental. já vai ser uma imagem mais concreta, herói, mãe, ou tempo cíclico, mas universal. Já o símbolo, vai ser a tradução desse arquétipo dentro de um contexto específico. Exemplo: scheme: unir, proteger; arquétipo: a mãe; símbolo para a cultura cristã: a Virgem Maria, símbolos para a cultura afrobrasileira: Iemanjá, Oxum. O mito vai transformar em linguagem, em relato, as valo­ rizações assim feitas; e este relato, por sua vez vai organizar o mundo, estabelecer o modo das relações sociais, e seus persona­ gens vão servir de modelo para a ação cotidiana dos indivíduos (em “O duplo e a metamorfose” da antropóloga franco-brasileira Monique Augras, pode-se observar a importância do modelo, do exemplo dado pelos orixás, na vivência cotidiana dos adeptos do Candomblé, no Rio de Janeiro). São, pois, os schemes, arquétipos, símbolos e mitos que vão, a partir da sua organização, feita exclusivamente por uma cultura dada, orientar a vivência cotidiana desta cultura.

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Os símbolos convergem As imagens vêm se organizar em torno de um “núcleo” e formam constelações, convergindo a um só tempo em torno de imagens de gestos, de schemes, e em torno de objetos pri­ vilegiados pela sensibilidade. O objetivo inicial da tese de G. Durand era o de estabelecer uma relação de imagens colhidas em culturas diversas. Para tanto, o autor fez um levantamento de imagens em grande número de culturas, nas mitologias, nas artes, seja na literatura ou nas artes plásticas: é para organizar o material obtido que o autor parte da ideia da existência do “trajeto antropológico”, ou seja, uma maneira própria para cada cultura de estabelecer a relação exis­ tente entre a sua sensibilidade (pulsões subjetivas) e o meio em que vive (tanto o meio físico como histórico e social). O trajeto antropológico pode partir tanto do culturalmente construído como do natural psicológico, o essencial da represen­ tação c do símbolo estando contido entre estas duas dimensões. Uma vez levantadas as imagens, na tentativa de classifica­ das, o autor percebe que estas se dividem em dois grupos que se distinguem pelo seu significado fundamental. Seguindo a distinção efetuada anteriormente por outros filósofos, G. Durand reagrupa as imagens em dois “regimes”: o diurno e o noturno. Esta classificação leva em conta a existência de uma maneira de organizar, de um dinamismo, próprios a cada cultura, dinamismo esse que se encontra na base das organizações (convergências) dos símbolos que formam as constelações de imagens. Seguindo uma lógica própria, os símbolos se reagrupam em torno de núcleos organizadores. As constelações de imagens são estruturadas por isomorfismo dos símbolos convergentes. Por exemplo: a imagem do movimento de ondulação faz com que as ondas da água vão remeter às ondas dos cabelos, cabelos longos, femininos, que por sua vez se ligam à dimensão de feminidade da água, imagens todas convergindo também em tomo da passagem do tempo, passagem das águas do rio, que vão e nunca voltam. Finalmente, antes de se dar início ao detalhe da teoria, deve-se levar em conta a hipótese segundo a qual “existe uma estreita concomitância entre os gestos do corpo, os centros nervosos e as representações simbólicas”.

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De fato o autor estabelece um paralelo entre os gestos correspondentes aos reflexos dominantes básicos do ser hu­ mano (estudados pela escola de Betcherev, de reflexologia) e as representações simbólicas. Assim é que: ao reflexo de posição (ereta para o homem) correspondem as imagens de elevação, divisão, luta: ao reflexo de deglutição correspondem as imagens de interiorizaçâo, descida, harmonização, contemplação; ao reflexo de copulação. correspondem as imagens de ciclicidade, de ritmo, de diálogo, de progresso. Regimes das imagens e as estruturas do imaginário Existe pois um isomorfismo de schemes, de arquétipos e de símbolos, presente nos mitos e nas constelações de imagens. A constatação da existência desse isomorfismo leva a perceber certas normas de representação imaginária, bem definidas e re­ lativamente estáveis. Estas representações agrupadas em torno de schemes originários, são chamadas estruturas. Considera-se aqui a estrutura como uma “forma transformáver. Cada imagem — seja ela mítica, literária, visual - se forma em tomo de uma orientação fundamental que se compõe da sensibili­ dade, dos sentimentos e emoções próprios de uma cultura, assim como do conjunto da experiência individual e coletiva. Este eixo (orientação) básico corresponde ao scheme. Assim, por exemplo, temos uma imagem mítica que é a do cangaceiro (afetividade e experiência regionais), ligada ao arquétipo do herói (universal), ligado ao scheme da divisão (entre o bem e o mal, por exemplo). Pois Gilbert Durand percebe no material que estuda duas intenções fundamentalmente diversas na base da organização das imagens: uma dividindo o universo em opostos (allo/baixo, esquerda/direita, feio/bonito, bem/mal etc.), outra unindo os opostos, complementando, harmonizando. O primeiro é o re­ gime diurno, caracterizado pela luz que permite as distinções, pela polemica. O segundo é o regime noturno, caracterizado pela noite que unifica, pela conciliação. Estes dois regimes da imagem recobrem três estruturas do imaginário. Estruturas estas que dão resposta à questão funda­ mental do homem que é a sua mortalidade.

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Morte e angústia existencial se expressam através das imagens relativas ao tempo.

Os semblantes do tempo Para falar da dimensão simbólica é necessário ter em mente que o símbolo se caracteriza pela sua ambiguidade e pelo sem fim de seus significados. De maneira que, a seguir, serão vistos somente os aspectos angustiantes dos elementos citados, os aspectos positi­ vos dos mesmos fazendo parte de outras constelações de imagens. Ligados por uma lógica própria, os símbolos expressando a angústia se dividem em três grandes temas: * SÍMBOLOS TERIOMÓRFICOS (relativos à ani­ malidade): são aqueles ligados à animalidade angustiante sob várias formas. E necessário distinguir o animal físico do animal simbólico. Assim são encontrados: - o fervilhamento (grouillement), que diz respeito a larvas amontoadas visguentas e agitadas, a insetos em geral, e que ex­ pressam a repugnância primitiva diante da agitação incontrolável que é o arquétipo do caos. São baratas correndo em todos os sentidos, a “bicheira” que se desenvolve nos animais, uma casa de cupins, por exemplo. - a animação, o movimento em si, incontrolável, dos gran­ des animais. Aí se encontram principalmente o cavalo e o touro que, em diversas mitologias, representam a morte. “O folclore e as tradições populares germânicas e anglo-saxônicas conservaram este significado negativo e macabro do cavalo: sonhar com um cavalo é sinal de morte próxima14. O tropel do animal, relacionado ao trovão, já é mau agouro (os cineastas bem o sabem). O touro desempenha o mesmo papel imaginário do que o cavalo: “todas as culturas paleo-orientais simbolizam o poder meteorológico e destruidor pelo touro”. A sua força bruta é mortal (não é à toa o sucesso das touradas: vencer o touro é vencer a morte). E a mesma angústia que motiva os dois simbolismos: a angústia diante da mudança, da fuga do tempo, do “mau” tempo. - a “mordicância” ou ato de morder, de devorar, é outro aspecto angustiante da animalidade. Aqui, a imagem significativa primeira da animalidade não está mais centrada no movimento,

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seja ele formigamento ou tropel, mas na boca aberta e cheia de dentes. Nesta ordem de pensamento vào ser encontrados os lobos (principalmente para o Ocidente), os leões (para os trópicos e o equador), as onças pintadas (para o Brasil) que em diversas mitologias e contos infantis devoram, seja as pessoas seja a lua (que representa o tempo), e também os “ogros” (comedores de criancinhas), e o próprio Kronos, o tempo, devorando seus filhos. “Terror diante da mudança e diante da morte devorante, tais parecem ser os dois primeiros temas negativos inspirados pelo simbolismo animar’. * SÍMBOLOS NICTOMORFICOS (relativos à noite): dizem respeito à escuridão. Eles se subdividem em: - Situação de trevas, seja provocada como é o caso do “choque negro” do Rorschach (teste projetivo em psicologia), seja natural como a cegueira. No folclore, a hora final do dia, ou a meia-noite, são consideradas muito perigosas: “é a hora em que os animais maléficos e os monstros infernais se apossam dos corpos e das almas’'. Os psicólogos notam por sua vez que a mancha negra (Rorschach), induzindo a situação de trevas, provoca imagens de caos, de agitação desordenada. Já a cegueira se encontra frequentemente, nas diversas mitologias, sob os traços do “rei cego’*, símbolo do inconsciente, que aqui se torna decadência; mas deve-se levar em conta que.o velho rei cego muitas vezes tem por parceiro o jovem herói (muitos folhetos de literatura de cordel retraçam esta situação). - Agua escura, triste: aquela do rio que passa para nunca mais voltar; a água estagnada, convite ao suicídio, cujo fundo esconde entidades maléficas (como tão bem observou Bachelard) presentes em todos os folclores e mitologias (no Brasil, por exem­ plo, íemanjá leva seus amantes para o fundo do mar); o espelho, réplica da água estagnada, convite a passar para o “outro lado” (como nos filmes de Cocteau em que o personagem mergulha no espelho e tem grande dificuldade em se locomover “do outro lado”); a cabeleira, que “vai insensivelmente inclinar os símbolos negativos... para uma feminizaçào...“ (pelo menos no Ocidente onde é a mulher que tem - ou tinha - cabelos longos) por suas ondulações, réplica da água corrente que implica a feminização da água, mas aqui num feminino noturno de mulher fatal que por sua vez estabelece a relação água/lua (marés), lua (mês)/menstruação,

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lua (tempo)/morte, o que traz a imagem da mãe terrível, dcvoradora, e a “vamp”, o que leva a uma feminilidade animalizada que leva à aranha, à mulher aranha, que leva ao liame (instrumento que liga: linhas, cordões, etc.) que sufoca e enforca, e por aí vai... * SÍMBOLOS CATAMÓRFICOS (relativos à queda): são aqueles relativos à experiência dolorosa da infância. A queda tem a ver com o medo, a dor, a vertigem, o castigo (ícaro). Mas a queda frequentemente é uma queda moral (pelo menos no Ocidente) e tem então a ver com a carne, o ventre digestivo e o ventre sexual e daí, com o intestino, o esgoto, o labirinto. Cai-se no abismo, e o abismo pode ser tentação. Aí estão as imagens do tempo negativo, do tempo de morte. Foi visto que “um isomorfismo contínuo religa uma série de imagens díspares à primeira vista, mas cuja constelação permite induzir um regime multiforme da angústia diante do tempo”. Existe também um tempo positivo que será visto adiante. Mas diante deste, o negativo, segundo Gilbert Durand, só exis­ tem três soluções possíveis para sobreviver: pegar as armas e destruir o monstro (a morte), criar um universo harmonioso no qual ela não possa entrar, ter uma visão cíclica do tempo no qual toda morte é renascimento.

O regime diurno da imagem “Aos schemes, aos arquétipos, aos símbolos valorizados negativamente e aos semblantes imaginários do tempo, poder-se-ia opor, ponto por ponto, o simbolismo simétrico da fuga diante do tempo ou da vitória sobre o destino e sobre a morte”. Ligado à verticalidade do ser humano, este regime é o das “matérias luminosas, visuais e das técnicas de separação, de pu­ rificação, das as quais as armas (flecha ou gládio), são símbolos frequentes”. Trata-se aqui de dividir, de separar e de lutar. Aqui, “os símbolos constelam em tomo da noção de Potên­ cia”: as armas são os arquétipos correspondentes, a espada e o gládio os símbolos culturalmente determinados.

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A estrutura heróica do imaginário Correspondendo ao regime diurno das imagens, a estrutura heróica (ou esquizomórfica) representa “uma vitória sobre o des­ tino e sobre a morte". Vitória pelas armas, pela luta aberta. Esta estrutura corresponde a três grandes constelações de imagens:

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* Os símbolos de ascensão (elevação): para Bachelard, “é a mesma operação do espírito humano que nos leva para a luz e para o alto". Estes símbolos se dividem em: - Verticalidade: práticas ascensionais nas religiões, o monte sagrado (os locais de espiritualidade se encontram na maioria das vezes em elevações). As práticas ascensionais são frequentes nas mais diversas religiões: no Brasil, por exemplo, existem diversas festas de santos em que os fiéis sobem escadas de joelhos ou com outras formas de sofrimento, para a tingir uma graça, um perdão, em direção à igreja; - Asa e angelismo: a “desanimalizaçâov do pássaro pela asa: o animal biológico é totalmente esquecido para se transformar fundamentalmente na sua função, voar. Neste contexto a pomba significando a paz. a águia a soberania pelo poder do voo; a asa é vontade de transcendência (que se eleva para uma superioridade); existe, pois. um isomorfismo entre asa, elevação, flecha, luz; -A soberania Uraniana: gigantismo e potência: elevação e poder são sinônimos no campo simbólico, o rei é alteza; ora, o que está mais alto é o que está no céu e principalmente, o sol; de onde a universalidade do Grande Deus uraniano; o rei e o pai (pai-virilidade-potência); o soberano guerreiro e o jurista (o poder de quem julga o certo e o errado), incluindo as guerras justiceiras; o rei religioso e o rei jurista (dualidade funcional da soberania - executiva e judiciária); - O chefe: participa dos mesmos significados (em francês 'Le chef é também a cabeça) com o culto universal dos crânios (centro e princípio de vida); os cornos e o troféu que são maneiras de aumentar o crânio, sítio do poder; O simbolismo ascensional se coloca como a reconquista de uma potência perdida. Reconquista pela ascensão para um além do tempo pela rapidez do voo, pela virilidade monárquica.

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* Símbolos espetaculares (relativos à visão): Luz e sol: isomorfismo entre céu e luminoso; pureza celeste e brancura; o dourado e o azulado; o sol nascente (ado­ ração do sol); as divindades solares (o oriente); coroa e auréola (solaridade da espiritualidade). “Na tradição medieval, o Cristo é constantemente comparado ao sol, ele é chamado “sol saluti\ “sol invicíus ", ou ainda, em nítida alusão a Josué, “sol occasum nesciens"' e, segundo santo Eusébio de Alexandria, os cristãos, até o século Vo, adoravam o sol nascente”; O olho e o verbo: parte do isomorfismo luz-visão; visão e distância (o olho vence o espaço), o olho do pai (de Deus), olho solar e uraniano; divindades com “mil olhos”; valor simbólico intelectual e moral do olho. Ver é saber. Luz e palavra andam jun­ tas, por exemplo, nos textos bíblicos e nas mitologias de culturas totalmente diversas. Existem diversas dimensões do isomorfismo da luz e da palavra: assim como a visão, a palavra (o verbo) traz o conhecimento à distância. Gilbert Durand diz que “toda transcen­ dência se acompanha de métodos de distinção e de purificaçào“. * Símbolos da divisão (ou diairéticos): trata-se da sepa­ ração “cortante“ entre o bem e o mal, “a transcendência está sempre armada“. Separação e polêmica exigem um herói, um guerreiro. E o guerreiro tem armas. E o herói solar é sempre um guerreiro violento. - As armas do herói: são símbolos de poder e pureza, pois todo combate é espiritualizado (existência de sociedades guerreiras); - As armas espirituais: batismos e purificações: são ma­ neiras de distinguir o profano do sagrado, o pertencer (a uma comunidade) do não pertencer, uma situação social de outra. Para distinguir vão ser usadas escarificações, a circuncisão (excisão ritual do prepúcio); para purificar, a água e o fogo. Assim praticam-se rituais de separação (de corte): “tais nos parecem ser as práticas como a depilaçào, a ablação (raspagem) dos cabelos, as mutilações dentárias. Essas últimas, por exemplo, praticadas pelos Bagobo, são explicitamente feitas “para não ter os dentes como os dos animais”. A circuncisão, por sua vez, vai permitir a distinção entre os opostos sexuais. Mas para tantos atos de divisão, as armas são necessárias: o arsenal simbólico compreende pois: a espada, o fogo, a tocha, a água e o ar, os

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detergentes, que têm por função cortar, purificar, limpar, salvar, separar, "distinguir as trevas do luminoso valor”. O Regime Diurno da imagem se apresenta, pois, como caracterizado por uma lógica da antítese, onde prevalecem as intenções de distinção e de análise.

O regime noturno da imagem Oposto ao Regime anterior preocupado em dividir e reinar, o Regime noturno vai se empenhar em fundir e harmonizar. Fará isto de duas maneiras distintas, correspondendo a duas estruturas do imaginário: a estrutura mística e a sintética. Neste regime, a queda heróica é transformada em descida e o abismo em taça. Nào se trata mais de ascensão em busca do poder, mas de descida interior em busca do conhecimento.

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A estrutura mística do imaginário A palavra mística não deve ser entendida aqui com um sentido religioso, mas no seu sentido mais comum que significa “construção de uma harmonia*1, na qual “se conjugam uma von­ tade de união e um certo gosto pela secreta intimidade”. Aqui não se trata mais de polêmica, mas de quietude e gozo. Para atingir tal objetivo, o procedimento vai ser o da eufemização e inversão dos significados simbólicos. * Símbolos de inversão: — expressão do eufemismo: trata-se de desdramatizar o conteúdo angustiante de uma expressão simbólica, invertendo o seu significado: o abismo não é mais o buraco sem fundo onde se perde a vida, mas o receptáculo (aquilo que contem), a taça. A linguagem do eufemismo é obrigatoriamente ambígua, já que ela procede por inversões. O isomorfismo dos símbolos do eu­ femismo leva das figuras femininas para a profundeza aquática, para o alimento, o plural, a riqueza, a fecundidade; Se, para o regime diurno, o “puro“ significava ruptura e separação, para o regime noturno ele vai significar ingenuidade, origem. O corpo, com sua interioridade morna e obscura, passa

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a ser tomado em consideração, enquanto, no regime anterior reinava a espiritualidade clara; - encaixamento e redobramento: é uma maneira de assi­ milar, “engolir”, o outro para se apropriar da sua essência: nas diversas mitologias se encontram peixes grandes que engolem os menores; no canibalismo há apropriação da essência valorosa do inimigo; é também o caso das bonecas russas em que a maior contém as menores; e das cantilenas universais de “encaixe” como por exemplo “a velha a fiar”; - hino à noite: ao contrário da “noite diurna” onde predo­ mina o simbolismo da angústia, noite onde se escondem todos os perigos, a noite do regime noturno (ao contrário das trevas) vai ser a noite de paz. Neste caso a noite é o avesso do dia, local de grande repouso. A noite se toma divina. Ela é local de reunião, de comunhão. E “o dia das fadas”. Nesta noite existe a presença e valorização das cores: “A pedra filosofal, símbolo da intimi­ dade das substancias, tem todas as cores, entenda-se, todas as potências”. Cores também dos reflexos da água ao luar, ligadas à valorização da mulher, da natureza, do centro, da fecundidade. - mater e matéria: são muito frequentes, nas diversas mi­ tologias, as Grandes Mães aquáticas (no panteão afro-brasileiro: Oxum e Iemanjá), presentes nas cavidades da terra e fontes. De onde decorre o isomorfismo mãe, matéria, terra, mãe terra, pá­ tria, pátria mãe. As Grandes Mães usam, nas diversas culturas, grandes cabeleiras, e a análise dos cultos que lhes são dedicados mostra a sua relação com a matéria prima, cujo simbolismo oscila entre o aquático e o telúrico, confundindo as virtudes aquáticas e as qualidades terrestres. “As águas seriam, pois, as mães do mundo, enquanto a terra seria a mãe dos vivos e dos homens”. * Símbolos da intimidade - o túmulo e o repouso: com a sua capacidade de eufemização, a estrutura mística vai transformar o túmulo em local de repouso desejado, justa recompensa de uma vida agitada. Assim a morte não é mais destruição definitiva do ser, mas um retorno ao berço, local de calma e felicidade. A morte se torna um retorno ao lar. “Em numerosas culturas, na Escandinávia, por exemplo, o doente ou o moribundo é revigorado pelo sepultamento ou pela simples passagem por uma fenda rochosa. Enfim, vários povos sepultam seus mortos em posição do aconchego fetal, marcando

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assim nitidamente sua vontade em ver na morte uma inversão do terror naturalmente experimentado e um símbolo do repouso primordial" (primeiro, essencial): - a moradia e a taça: as duas contêm, são continentes, donde decorre o isomorfismo entre: a caverna, a casa antropomorfa (aquela descrita por Bachelard cujo sótão é a cabeça e o porão as raízes ou pés). Espontaneamente a criança reconhece nas janelas os olhos da casa e imagina as entranhas no porão e nos corredores. E essa casa tem cantos onde a intimidade se concentra: o canto (do quarto, do jardim...), onde gosta de se esconder a infância. Outro ‘‘espaço feliz” é aquele que diz res­ peito ao centro, em geral paradisíaco: mandala (que tem também outros sentidos) das culturas orientais, “A mandala tântrica, jogo de figuras fechadas circulares e quadradas, no interior das quais reinam imagens de divindades, parece constituir um resumo do local sagrado.“O recinto quadrado é aquele da cidade, é a fortaleza, a cidadela. O espaço circular é mais aquele do jardim, do fruto, do ovo ou do ventre, e desloca o acento simbólico para as volúpias secretas da intimidade”. Com este sentido de centro de espiritualidade íntima, ainda vão ser encontradas as imagens de nave (da igreja) e nave (do navio), a arca. A “guliverizàção” (de Gulliver, herói de J. Swift, sobre o poder do pequeno - miniaturizaçào) do continente (aquilo que contêm) participa da mesma constelação na medida em que a redução do tamanho concentra a essência. Assim se encontram: a casca (casca de nozes, por exemplo, em que vivem personagens poderosos dos contos in­ fantis), o ovo cósmico (como aqueles dos quadros de J. Bosch), o vaso, as taças litúrgicas (destinadas a rituais religiosos: o Santo Graal, por exemplo), o estômago, todos contendo a intimidade secreta e preciosa. Mas a imagem do estômago vai levar a outra série de imagens ligadas à interiorização: - alimentos e substâncias: a substância é a intimidade da matéria e “toda alimentação é transubstanciaçào” já que trans­ forma o alimento em energia modificando sua essência. Os ali­ mentos arquetípicos são: o leite (primeiro alimento afetivamente significativo já que normalmente relacionado à amamentação), o mel (precioso por estar escondido, pela cor de ouro, pelo poder nutritivo), as bebidas sagradas, as “águas de vida” (em francês cachaça é “eau cie vie”), e finalmente o “ouro alimentar”: o sal,

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como o ouro princípio substancial das coisas, ele é inalterável e serve para a conservação do alimento. A estrutura mística do imaginário, diante da angústia existencial e da morte, vai, pois, negar suas existências e vai criar um mundo em harmonia baseado no aconchego e na intimidade (de si, e das coisas). Trajeto interior mais lento na descida do que o do herói na subida. A estrutura sintética do imaginário Nesta estrutura o tempo se torna positivo: trata-se do movi­ mento cíclico do destino e da tendência ascendente do progresso. “Os arquétipos e os schemes que polarizam está ambição fun­ damental são tão poderosos que conseguem, nas mitologias do progresso, nos messianismos e filosofias da história, ser tomados por realidade objetiva, por moeda válida do absoluto e não mais como resíduo concretizado de simples estruturas singulares, de simples trajetos da imaginação”. Vários estudiosos do imaginário dizem que o homem não faz senão repetir o ato de criação no qual acredita; o calendário religioso comemora no espaço de um ano todas as fases que ocorreram desde as origens. Neste caso o destino não é mais urna fatalidade, mas consequência dos atos dos homens. No entanto para assegurar o ciclo de vida são necessários rituais e sacrifícios. * Símbolos cíclicos: O tempo cíclico não tem começo nem fim, já que são as fases (uma ascendente e outra que descendente) do círculo que o formam. Deste modo a morte não é mais fim, mas recomeço, renascimento. Os símbolos se reagrupam de forma a dominar o tempo: o recomeço dos períodos temporais, a regeneração, a repetição do ato criador presente em todas as mitologias (no Ocidente, apesar da predominância de um tempo linear, várias festas correspondem a rituais de regeneração: por exemplo o Ano Novo, as festas juninas e o carnaval); é neste contexto que se equilibram os contrários. Grande número de culturas expressa nos seus mitos a pre­ ocupação em equilibrar os contrários: para os índios Fulni-ô (Estado de Pernambuco), por exemplo, o mundo foi criado por

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dois irmãos rivais. Falôdato (o calor) e Walêdato (o frio), que devastavam tudo nas suas passagens, um queimando e o outro gelando as terras por onde passava; é do acordo entre os dois, em ficarem juntos, que nasce o equilíbrio dando origem à vida. Por outro lado o tempo pode se tornar positivo a partir do mito do progresso. Neste caso. as imagens convergem de maneira a integrar, em uma sequência contínua, todas as outras intenções do imaginário. Estes dois aspectos da temporalidade, ligados ao ritmo (das estações, da copulaçào). dizem respeito às seguintes constelações: - o ciclo lunar: a lua, como já foi visto, pela regularidade das suas fases, serve de base em grande número de culturas para a organização do tempo; ela tem uma ligação estreita também com a vegetação já que ao tempo correspondem as estações. Neste contexto vai ser encontrada a figura do andrógino: “a maioria das divindades da lua ou da vegetação possuem dupla sexualidade”, o que equivale à mesma valorização das duas fases do ciclo. No entanto para que o ciclo não seja interrompido, os homens acreditam que devem se sacrificar. Este sacrifício pode ser o do próprio homem, o de um animal que tome o seu lugar, ou de objetos quando o sacrifício é simbólico. O sangue, como essên­ cia da vida. é que fertiliza a terra e assegura o reinicio do ciclo. A lua vem associada a imagens de animais, a um “bestiário”: qualquer animal, como qualquer planta, é capaz de simbolizar o drama ou simplesmente a marcha do tempo; “o scheme cíclico eufemiza a animalidade, a animação e o movimento, pois os integra em um conjunto mítico onde desempenham um papel positivo, já que em tal perspectiva, a negatividade, fosse ela animal, é necessária à vinda da plena positividade”. - a espiral: simbolismo frequentemente ligado à permanên­ cia e ao movimento. Representação importante para as culturas cuja mitologia se baseia no equilíbrio dos contrários. O caracol participa do mesmo significado, já que carrega uma espiral, ao qual se somam o aspecto aquático (da concha) e o feminino. - o simbolismo ofidiano: a serpente carrega consigo grande número de significados; a sua relação com o tempo cíclico passa por três dimensões: a da transformação temporal na medida em que, periodicamente muda de pele abandonando a antiga; a da representação do ciclo através do “uroboros” (a serpente

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mordendo o próprio rabo); e o aspecto fálico que o torna “mestre das águas e da fecundidade”. - a tecnologia do ciclo: são os objetos representativos do tempo e do destino como o fuso e a roca, o tecido, a corrente, a trama; e os arquétipos da roda: como a carruagem, “engrenagem arquetipal essencial na imaginação humana”. - do “scheme rítmico ao mito do progresso”: o ritmo da natureza, principalmente nos climas temperados, ensina que a morte é necessária para que haja renascimento. O fogo, proporcionando a morte total é o elemento mais propício ao renascimento (renascer das próprias cinzas). Várias fogueiras juntas implicam em lembrança de sacrifício, trazendo a rege­ neração da vegetação (festas de São João no Brasil). - o sentido da árvore: pela sua verticalidade, idêntica à do homem, além das suas características cíclicas (floração, frutificação), a árvore permite passar “do devaneio cíclico para o devaneio progressista”. Associada à água fertilizante, ela é símbolo de vida. E pelas suas transformações sucessivas, pela sua humanização (assim como o homem ela é resumo cósmico e verticalidade), sugere o devir, a progressão no tempo. A estrutura sintética do imaginário vai, pois: seja har­ monizar os contrários, manter entre eles uma dialética salva­ guardando as distinções e oposições, seja propor um caminhar histórico e progressista.

As funções da imaginação simbólica Para abordar o simbolismo, deve-se ter sempre em mente a dimensão da ambiguidade, que é fundamental. E essa ambigui­ dade faz com que “a essência dialética do símbolo” se estenda sobre diversos planos, exercendo uma constante reequilibração. Gilbert Durand destaca quatro setores em que esta ree­ quilibração se exerce: O primeiro diz respeito ao plano biológico: é o equilíbrio vital. A constante atividade de criação do ser humano, nas artes, nas ciências, nas ocupações do cotidiano, são maneiras de ultra­ passar o destino mortal: “... a arte inteira, da máscara sagrada à opera cômica, é antes de tudo empreendimento eufêmico para

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se insurgir contra o apodrecimento da morte". Essa eufemizaçào é feita através das estruturas do imaginário. O segundo é fator de equilíbrio psicossociai. permite ao indivíduo estabelecer a síntese entre as suas pulsões individuais e aquelas do meio em que vive. E o que ocorre, por exemplo, nas técnicas de reequilibraçào mental, criadas pelo doutor Desoille (1890-1966). com a utilização de imagens antagônicas (contradi­ tórias) ao regime da imagem em que se encontra o indivíduo: se o regime for o diurno, o terapeuta vai propor imagens noturnas (descida para a terra ou para o mar), se for noturno, imagens de ascensão (luz. pureza, voo), obtendo assim a reequilibraçào psíquica do indivíduo. Em certos casos de doença mental, o que está em jogo é o equilíbrio entre os regimes do imaginário, visto que toda intensificação de um regime leva ao desequilíbrio e à patologia (seja para o indivíduo, seja para a sociedade). A reequilibraçào social é aquela que ocorre de uma geração para outra, cada “geração de 36 anos”, se opondo à precedente (“uma pedagogia expulsa a outra”). Trata-se do equilíbrio sócio-histórico de uma sociedade. Ao nível do planeta, efetua-se um equilíbrio antropológico. os atuais meios de comunicação permitem “um real ecumenismo”. O conhecimento, muitas vezes através das artes, de outras ma­ neiras de organizar o mundo, permite “temperar“ a própria. E assim que a tendência diurna do Ocidente estaria atualmente se reequilibrando através de um maior conhecimento do Oriente, tentando contrapor ao excesso de valorização da racionalidade conhecimentos de técnicas de espiritualização e desenvolvi­ mento de possibilidades outras do corpo, por exemplo. “O que a antropologia do imaginário permite, e é a única a permitir, é reconhecer o mesmo espírito da espécie em ação no pensamento ‘primitivo’ como no pensamento ‘civilizado’, no pensamento normal como no pensamento patológico”. Finalmente, por “dizer o indizível”, a imaginação simbólica tem uma função transcendental, ou seja, ela permite ir além do mundo material objetivo e criar o que Bachelard chamava de um “suplemento de alma”.

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Métodos do Imaginário Uma das grandes qualidades desta teoria é, sem dúvida, a de ter desembocado em vários instrumentos metodológicos adaptáveis aos mais diversos objetos de estudo: Yves Durand criou o AT-9, arquétipo teste de 9 elementos, a partir das “estruturas antropológicas do imaginário”. Permitindo ao indivíduo transformar arquétipos universais em símbolos situados numa vivência individual e coletiva específica, ele se torna uma preciosa fonte de dados para a análise comparada de culturas. Permite, igualmente, o estudo de um elemento em par­ ticular (por exemplo, o significado do fogo), nas suas dimensões de representação, função e simbolismo; ou de uma dinâmica social, no caso da análise actancial que pode ser feita, mostrando a maneira de lidar com a angústia existencial de um grupo dado. A mitocrítica, análise de uma obra ou de um texto (inclusive de história de vida) a partir das redundâncias que remetem aos mitos diretores em ação. A mitanálise, que vai situar os resultados da mitocrítica em um contexto sociocultural definido. Estes métodos têm sido empregados, no Brasil, em Antropo­ logia e Comunicação (Núcleo Interdisciplinar de Pesquisas sobre o Imaginário - UFPE, o Imaginalis - Grupo de Estudos sobre Comunicação e Imaginário, UFRGS), em Educação (CICE da USP e o LIRES da UGF do Rio de Janeiro), em Linguística (NELIM - Núcleo de Estudos de Eco-linguística e Imaginário - UFG), em História (Videlicet - UFPB), em Sociologia (UFPB - UNIR), em Artes (várias universidades), nas organizações (Grupo de Pesquisas Imaginário, Gestão e Cultura - UEC), entre muitos outros6. Ao término desta exposição, três aspectos da teoria podem ser destacados. Um diz respeito à formação do trajeto antropo­ lógico: deve-se ter em mente que é o contexto sociológico que modela os arquétipos e os símbolos. Os schemes, na base da dimensão cultural, orientam a ação, mas as imagens concretas presentes nas artes, nas mitologias, nos relatos diversos (orais ou escritos), adquirem contornos específicos em relação ao contexto (meio ambiente) social.

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Ver lista: .

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Nào se traia de unia teoria determinista. Ao contrário. O fato de o imaginário ter regras nào implica, longe disto, em relações causais (isto foi colocado desde o início do presente texto): ao contrário, pelo seu poder de criação, a cada instante, imaginar é um ato de liberdade. Diz G. Durand: “Pois a verdadeira liberdade e a dignidade da vocação ontológica das pessoas nào repousam senão sobre esta espontaneidade espiritual e esta expressão criadora que constitui o campo do imaginário”. O imaginário diz respeito a todas as ciências. Primeiro às ciências humanas: implica, para o Ocidente, em uma nova pedagogia (um modo de ensino nào mais centrado unicamente na razão); em outra visão da história já que esta se coloca dentro do trajeto antropológico; em outras dimensões da economia que mostra nào ser somente resultante de um cálculo racional; em outra abordagem da geografia: hoje a geografia humana já leva em conta, por exemplo, a literatura a respeito da área estudada, enfim, as relações com a filosofia, a psicologia, a literatura pare­ cem ser evidentes; quanto às ciências ditas exatas: a matemática utiliza conceitos como “limites” e “infinito” entre muitos outros e teorias como a das “catástrofes”; a física quântica, a química, a biologia já há muito tempo trabalham com conceitos que vão além de um puro raciocínio. O estudo da relação entre imaginário e mídia necessitaria de todo um livro. Enfim, imaginar é criar o mundo, é criar o universo, seja através das artes, através das ciências, ou através dos pequenos atos, profundamente significativos, do cotidiano.

LIVRO 2 - OS PAIS FUNDADORES DA NOÇÃO DE IMAGINÁRIO “Introdução às metodologias do imaginário ”7 Tracluçcio: Tania Pitta Mario Carvalho

GASTON BACHELARD (1884-1962) J -J Wunenburger Os trabalhos metodológicos sobre o imaginário foram irreversivelmente marcados pela figura do filósofo Gaston Bachelard (1884-1962). Nascido em Bar-Sur-Aube (Champagne, França), ele começou tarde seus estudos de filosofia, que o conduziram primeiro a trabalhos de história das ciências a fim de compreender melhor o desenvolvimento psicológico e histórico da racionalidade objetiva. A partir de 1935, Bachelard iniciou pesquisas sobre os processos da imaginação criadora que se completaram nas cinco obras consagradas aos elementos primeiros da natureza (ao fogo, ao ar, à água e dois à terra), a estudos temáticos (Poética do espaço), teóricos (A poética do devaneio) e a numerosos en­ saios, alguns publicados após sua morte. Bachelard explora as duas vertentes opostas e complementares do psiquismo humano, conceitualização e o devaneio, que culminam respec­ tivamente na ciência e na poesia. Essa opção fundamental não deixou de suscitar reações opostas: para uns, mais positivistas, tal casamento entre imaginação e razão é portador de uma concepção muito romântica do espírito e arrisca enfraquecer a racionalidade, obrigando-a sem parar a se purificar de imagens-obstáculos; para outros, corno Gilbert Durand, é o antagonismo entre imagem e conceito que se revela excessivo, com o risco de reativar uma concepção positivista, senão cientista da autonomia da razão, que Bachelard queria precisamente retificar. Além desse debate de fundo, que põe em dúvida uma teoria geral do conhecimento 7

Os textos que seguem são uma tradução de parte do livro de Joél Thomas (dir.): Introduction aux méthodologies de l’imaginaire. Paris: Ellipses, 1998.

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- que nào cabe aqui a contribuição bachelardiana ao estudo das atividades da imaginação e. sobretudo, da “vida das imagens” marcou, há meio século, as pesquisas literárias, psicológicas e filosóficas e foi reconhecida, confirmada, aprofundada ou reno­ vada por um grande número de leitores, de artistas ou de teóricos. Método As obras consagradas às imagens, a partir de 1938, não deixam, portanto, de desconcertar. Cada uma delas, fortemente marcada por uma evolução flexível do vocabulário e das refe­ rências. apresenta-se como um entrelaçamento - sedutor ou irritante, dependendo do leitor - de comentários de documentos, de proposições teóricas, de notas de dicionário de símbolos, de antologias de textos literários exemplares, senão de lembranças autobiográficas. Esse pensamento poli fônico prejudica sem dúvida o rigor e a sistematizaçào da pesquisa, mas ilustra também a pre­ ocupação metodológica de uma aproximação global das imagens. Quanto mais as produções conceituais, que são as fragmentações do real, deixam-se analisar abstratamente (em ciências ou em filosofia), mais as imagens, que são as representações totalizantes, resistentes à separação do sujeito e do objeto, exigem um método de aproximação adequado e sutil para não desnaturá-las. As imagens devem, de fato, ser estudadas por outras imagens, o que implica igualmente uma escrita, um estilo poético adaptado, tão típico de suas obras. No lugar de se contentar em sintetizar uma vasta cultura erudita tirada de leituras (sobre as mitologias religiosas, os casos patológicos etc.), Bachelard quer experi­ mentar por ele mesmo, senão sobre ele mesmo, as imagens, seja dentro dos devaneios espontâneos, seja na leitura atenta, para reencontrar fenomenologicamente os processos da imaginação criadora. Pois o filósofo e, sobretudo o crítico literário que quer compreender as imagens dos textos poéticos, deve começar por sonhar ele mesmo e se engajar em uma exploração subjetiva que permitirá revelar as propriedades objetivas dos devaneios. Isso porque, depois de ter aprendido muito com elas, Bachelard testemunha uma desconfiança orgânica em relação aos métodos frios, sempre contaminados demais pelos conceitos, em particular aqueles da psicanálise. Pois os psicanalistas se colocam quase

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sempre na superfície das imagens, não distinguindo suficien­ temente imagem explícita e imagem implícita, contentando-se com aproximações muito globais, desencarnadas, que mascaram a importância das forças psíquicas, valorizando excessivamente os símbolos sociais (AS 27; TRV 19; TRR 141 ).8 Fisionomia da imagem Bachelard adquiriu muito cedo a convicção de que as ima­ gens formam a instância imediata e universal do psiquismo; o conceito sendo sempre segundo, pois construído a partir de uma oposição às imagens. Mas não há imagens sem imaginação, sem um processo que as inicie, as anime, as deforme, criando sempre imagens novas . A imaginação é “a capacidade de deformar as imagens fornecidas pela percepção, ela é, sobretudo, a faculdade de nos libertar das imagens primeiras, de mudar as imagens” (AS 5; e também 140, 216; ER 25), ou seja, de produzir um imagi­ nário. O psiquismo é, pois, fundamentalmente ativo, criador, sempre em busca de novidade, de passagem do limite em direção a uma imagem maior, mais intensa, uma vez que o próprio da imaginação é fazer as imagens mudarem de escala, em direção ao pequeno (Liliput, TRR 12 ss.) e, sobretudo em direção ao grande (Gulliverização, TRV 387). A potência da imaginação se mede precisamente por essa ampliação à dimensão do cosmos de seu mundo interior “existe a atividade da imaginação quando há uma tendência a passar para o nível cósmico“ (AS 295, e também ER 75, TRV 82, 157), que dá conta da tendência poética em exagerar a expressão imagética. Tal força criadora de imagens é ela mesma subtendida, como em Schopenhauer, por uma vontade de viver, um querer-viver primitivo, princípio da vida espiritual. Pois a imaginação está antes a serviço de uma energia vital que lhe confere uma causalidade criadora e que a coloca a serviço de seus ritmos próprios de avanço e de relaxamento (TRR 87). E porque ela 8

As referências entre parênteses foram tiradas das cinco obras consagradas aos ele­ mentos, nas seguintes edições: La psychanalyse du feu (PF), Paris: Gallimard, Folio, Essais, 1997; L'Air et les songes (AS), Paris : Le livre de poche, Biblio, Essais, 1992; L'Eau et les rèves (ER), Paris: Le livre de Poche, Biblio, Essais, 1993; La terre et les réveries de Ia volonté (TRV), Paris: Corti. 1980; La terre et les rêveries du repos (TRR), Paris : Corti, 1997.

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oscila sempre entre movimento e repouso, entre extroversão e introversào (TRV 9. 33, TRR 52). que constituem as duas pola­ ridades fundamentais do psiquismo. fonte dos dois regimes bem distintos de atividades imaginantes. Imaginação e vontade são dois aspectos de uma mesma força profunda ... à imaginação que clareia o querer se une uma vontade de imaginar, de viver o que imaginamos. (AS 144, e também AS 65, 315; TRV 51)

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A imaginação não saberia então ser assimilada por uma atividade segunda, derivada da percepção, da qual combinaria somente os materiais, nem por um simples jogo fantasioso com as imagens (ER 156. TRV 3, TRR 79-80). Ao contrário, a ima­ ginação trabalha sobre imagens a priori, independentes e mesmo anteriores às representações da percepção: é o que se encontra na ideia cara a Novalis e, mais tarde, a Gilbert Durand, de uma ‘‘fantástica transcendental’' (TRV 5). Por outro lado, a imagina­ ção, longe de brincar gratuitamente com as imagens, obedece a interesses primordiais do sujeito vivo, bem distante de toda avaliação utilitária (ER 88) que confere às ações e aos objetos valores passionais (TRV 130, 229, 384; TRR 41), destinados a satisfazer os desejos psíquicos (de beleza, por exemplo, AS 340) e mesmo físicos do eu (ER 16, 135). A valorização imaginária constitui então o meio pelo qual o mundo se anima, é tirado de sua indiferença. “A imaginação não designa seus objetos. Ela os elogia ou os deprecia” (TRV 314). A imaginação opõe então à natureza das coisas o real, que a ciência procura conhecer, um mundo estritamente irreal, surreal. mas que tem a mesma con­ sistência, a mesma realidade que o real objetivo (TRR 82). Pois a imaginação envolve suas imagens de cargas afetivas, atraentes ou repulsivas, que fazem do mundo sonhado um mundo de alta densidade emocional. É por isso que a imaginação vai sempre em direção aos devaneios felizes, porque ela é, afinal de contas, a res­ posta do querer-vi ver à dificuldade de viver na realidade exterior. Tipologia das imagens As imagens apresentam uma grande variedade, segundo seu nível de formação e de expressão:

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-As imagens mais primitivas sào fundamentalmente incons­ cientes, escondidas nas profundezas noturnas do psiquismo. Difi­ cilmente acessíveis, ou acessíveis somente no sonho noturno que nos dá fragmentos sem mediação de um cogito, elas constituem todavia centros de significações e de afetos, verdadeiros germes sintéticos do onirismo, que Bachelard chamará a partir de TRR, à maneira de Carl Jung, de arquétipos suprapessoais e universais (TRR 211,263-4). As imagens inconscientes se organizam quase sempre em “complexos” (postas em evidência principalmente na Psicanálise do fogo), que podem ser sublimados em complexos de cultura (ER 26-7, 191). Bachelard testemunha, entretanto, a respeito do sonho de uma grande hesitação: por um lado, ele é acusado de falta de criatividade porque o sujeito dormindo é ausente dele mesmo (Poética do devaneio) por outro, ele é reco­ nhecido como a única matriz das imagens, que o sonho acordado só faz prolongar. Uma psicologia da imaginação deve então: [...] partir sistematicamente do sonho e descobrir assim, antes das formas das imagens, seu verdadeiro elemento e seu verdadeiro movimento (AS 39, e também ER 208). - O caminho mais seguro para fazer aparecer a imagem consiste nos estados de espontaneidade onírica nos quais a cons­ ciência, livre de todo saber e da contaminação do conceito, apreende-as em seu imediatismo, em seu estado nascente. Atu­ alizamos assim as “imagens naturais” (ER 100, 207, TRV 183) que vêm da natureza e da nossa natureza e que se desdobram ao longo de uma linha que vai do devaneio à contemplação e à representação propriamente dita (AS 217; ER 11). Alcançamos assim a imagem “fundamental”, “primeira”, “princeps”, en­ quanto existência absolutamente original, quer dizer, “antes do pensamento, antes do relato, antes da emoção” (AS 131). Ela é de alguma maneira a-histórica, já que ela não envelhece (AS 62); ela age em nós (TRR 58-59) tomando-se verdadeiramente sujeito em vez de complemento (AS 22), constituindo a matéria primeira da imaginação (TRR 276). A imagem natural não pode ainda ser assimilada a uma representação, pois ela é estranha a um “desenho”; ela é antes uma primeira “orientação” dinâmica (AS 86), paradoxalmente próxima a uma abstração viva (como no caso da imagem do voo, anterior à imagem da asa). Podem

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ser classificadas entre as imagens primeiras: a árvore (AS 287), a flor (TRV 127). a forja (TRV 153), a rocha (TRV 191), o cristal (TRV 309), a imensidão (TRV 379) ou a casa (TRR 101). - Essas imagens manifestam seu dinamismo criador quando elas se veem traduzidas em palavras, vocalizadas e mesmo ver­ balizadas sob uma forma escrita. A imaginação é antes expressi­ vidade e esta expressividade encontra sua via mais completa na forma literária, que Bachelard julga muito mais fecunda que as expressões plásticas (ER 210: TRV 95, 224). É por isso que ele tanto cultiva as imagens literárias, isto é. próprias à literatura, que são presumidamente as mais ricas e as mais “sinceras”, porque o criador soube dar às imagens naturais uma novidade universal. A imagem literária é simultaneamente uma categoria e um evento: é dita literária a imagem (como a da cotovia - AS 107 - ou a da serpente - TRR 266) a meio caminho do sonho e da imagem sábia (TRV 234), que é fonte de um grande número de metáforas que constituem um comentário (AS 125); mas cada imagem literária, fruto de uma criatividade verbal, apresenta-se também como um surgimento imprevisível, um renovamento único das imagens preexistentes (TRV 6), cuja forma mais alta é a pura metáfora, reduzida a uma forma verbal concisa (TRV 321). E por isso que ela se beneficia da força das palavras “indutoras“ (AS 78, 151; TRR 293) e triunfa na metáfora, em que Bachelard vê uma dinâmica polifônica. “Fenômeno da alma poética” (ER 207), “ato literário o mais simples” (TRR 262), a metáfora serve para multiplicar as valorizações por meio de um jogo rítmico feito de exuberância e de retenção. Porém, mais do que a imagem pura, a metáfora é frágil, exposta ao uso ou ao empobrecimento por meio de superposições inúteis, imagens literárias e metáforas sào em todo caso um fator essencial de dinamização psíquica, capaz de tonificar o sujeito (AS 7). - Esta tipologia dá espaço a numerosas outras imagens: imagens intermediárias, medianas entre inconsciente e imagem literária: imagens inseridas em relatos, como nos mitos, nos contos e nas lendas; imagens sobrecarregadas intelectualmente, no caso das alegorias, dos símbolos, dos clichês etc.; falsas imagens que são apenas conceitos imagéticos e não imagens ativas.

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A imaginação criadora

Como dar conta então do poder criador da imaginação, como ela chega a enriquecer e a transformar as imagens? A atividade onírica se apoia dc fato em duas fontes, o inconsciente pessoal e as profundezas do eu, por um lado, e as formas, as forças e as matérias da natureza, por outro, que se correspondem, trocam seus conteúdos, confundem-se como um modelo e seu duplo em espe­ lho, cada polo podendo ser, altemadamente, o modelo ou a cópia. Bachelard, desconfiado quanto às racionalizações próprias às explicações dos psicanalistas, retém entretanto a maior parte da bagagem geral dc Freud e principalmentc da psicologia das profundezas de Jung. O inconsciente constitui o fundo original das imagens (TRV 395, TRR 167), mesmo se os determinismos pulsionais nunca são suficientes para dar conta da significação das imagens do devaneio, e se a atividade do Sobre-Eu (Sur-Moi) - que marca a influência da sociedade sobre o inconsciente - é normalmente julgada inútil para dar conta do “inconsciente natural44 (TRV 297, e também ER 154). A criação de imagens poéticas supõe, entretanto, sempre uma operação de “sublimação44, termo recorrente mas pouco precisado por Bachelard (AS 12). No entanto, para se transformar em imagem consistente, apta a captar e a atualizar um arquétipo, a imagem precisa ser adicionada a objetos exteriores, naturais e fabricados, que virem ocasiões para fixar, para projetar imagens e então atualizar interesses e valores (TRV 290 e TRR 267). O imaginário desses objetos, sua capacidade de ocasionar devaneios, deriva de três características: “formal, material e dinâmica” (TRV 392 e também ER 181). Se Bachelard minimiza claramenle a importância do imaginário das formas dos objetos, muito racionalizáveis (AS 31, 78, 107; ER 101, 149, 155; TRV 94, 101; TRR 211), ele se prende longamente à imaginação material, e, cada vez mais, à imaginação dinâmica, que se casa mais intimamente com a atividade do psiquismo. As imagens fundamentais, estas nas quais se engaja a imaginação da vida, devem se prender às matérias elementares e aos movimentos fundamentais (AS 340). O valor onírico de um objeto vem primeiro da matéria substancial que o habita, um mesmo objeto podendo sintetizar

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várias matérias complementares ou opostas. “Não sonhamos profundamente com objetos. Para sonhar profundamente, deve? se sonhar com matérias" (ER 32), porque “a matéria é o incons­ ciente da forma" (ER 63). As matérias primordiais reconduzem a uma quaternidade de elementos, bastante explorada pelas mitologias universais, pelos pré-socráticos em particular: terra, água. fogo e ar (AS 13). Essas matérias ativam os devaneios à medida que elas sào nào somente contempladas, mas manipula­ das. transformadas pela mào, por um corpo que age e principal­ mente trabalha. Em lugar algum a imaginação é tão encarnada quanto nas atividades artesanais, que parecem ter favorecido e explorado todas as grandes formas de devaneio (TRV 31 ss.). A poética bachelardiana é, antes de tudo, a do Homo Faber, cultivada e conservada pela civilização pré-industrial, pelos mitos, pelas lendas, pelos contos e pelo folclore. Mas a imaginação material pode ser completada ou suplan­ tada pela imaginação dinâmica que constrói seus devaneios em tomo de movimentos, de forças, de energias. A imaginação dinâmica não propõe senão imagens de impulsão, de élan, de elevação, imagens em que o mo­ vimento produzido tem o sentido da força imaginada ativamente. (AS 121) A imaginação “dinamogênica” (TRV 117) substitui então ao ser o devir das coisas e, logo, do eu, inscrevendo-os em uma mobilidade direcionada para o futuro. Por essa confrontação onírica com as matérias, oferecidas ou trabalhadas, e com as forças, a imaginação permite ao sonhador ‘‘fazer corpo’’ com o mundo, dilatar seu ser na escala do cosmos para participar de sua totalidade viva. A imaginação se confunde assim com o espaço-temporizaçâo da consciência. Ela ativa uma conquista psicológica do espaço, que se anima pelo jogo de for­ ças e de substâncias, o que permite em retorno uma verdadeira individuação, uma apropriação do espaço interior do eu. Essa gênese espacial da identidade é inseparável de uma apropriação do tempo. Se o tempo é fundamentalmente descontínuo, feito de instantes separados que confrontam sem parar o sujeito a um vazio, o devaneio permite, ao contrário, engajar a consciência, me­ nos na duração contínua, como gostaria a metafísica bergsoniana,

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do que no tempo rítmico, que é criado à medida que as imagens se transformam dialeticamente. As idas e vindas das imagens, os movimentos de afirmação e de negação que subentendem os valores que elas transportam, comprometem assim o sujeito imaginante em um processo rítmico, feito de plenos e de vazios, de tensão e de relaxamento, que constituem a matéria primeira da vivência, que podemos chamar de alegria de estar no mundo. O conhecimento da imaginação incita desde então a desenvolver uma prometedora “ritmanálise” (TRV 33, 320). Leis das imagens O encadeamcnto das imagens e suas relações mútuas foram indevidamente apresentados como gratuitos e incoerentes. Ao contrário, para Bachelard, as imagens obedecem a uma lógica, ou mais exatamente a uma dialética e a uma rítmica, que não têm nada a invejar às do conceito. O imaginário é dotado de uma autonomia, de uma consistência, que permite retirar proprieda­ des gerais e coerentes de um mundo e de determinar leis de uma física onírica, as imagens estando submetidas a um verdadeiro “determinismo” (TRV 211). Em um sentido, o real está bem mais submetido à contingência do que o irreal. Se Bachelard opta por um idealismo da imagem contra um. realismo que conduziría a fazer da imagem um duplo empobrecido do percebido, ele aplica paradoxalmente um realismo ao mundo da imagem, que comporta então uma dimensão transcendental em relação ao sujeito. A imagi­ nação, mesmo nos liberando do real, não procede anarquicamente, porque ela obedece a processos regrados, que Bachelard expôs de maneira empírica e disseminada, sem nunca retomá-las em uma verdadeira ciência do imaginário. Podemos tirar, portanto, de um lado, leis sintáxicas e, de outro, princípios semânticos : As imagens, não podendo ficar isoladas, formam conjuntos que obedecem seja a leis de - “composição”, para as imagens dinâmicas, seja a leis de “combinação”, para as imagens ma­ teriais (ER 109). É assim que a imaginação só pode combinar dois elementos materiais: Estas combinações imaginárias só reúnem dois elemen­ tos, nunca três ... nunca, em qualquer imagem natural, vemos se realizar a tripla união material da água, da terra e do fogo. (ER 111)

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Toda rclaçào entre as matérias imaginadas se enriquece de suas oposiçòes. de suas contradições, como no caso da água e do fogo: “Quanto ativaríamos nossa imaginação se procurás­ semos sistematicamente os objetos que se contradizem" (TRR 292). Mas. longe de provocar exclusões ou disjunções, tais contradições engendram psicologicamente uma ambivalência de valores (atraente-repulsivo), que se transforma em fator determinante de valorizações oníricas. Pois “uma matéria que a imaginação não possa fazer viver duplamente não poderá ter o papel psicológico de matéria original" (ER 19, e também 87, 117). Essas leis estão na fonte de uma dialética de imagens que consiste em ura vai-e-vem entre dois polos contrários. Todo devaneio obedece, assim, a um ordenamento de tempo forte e fraco, de momentos positivos e negativos, que desenham uma espécie de rítmica coercitiva (contraigncinte). — Ao lado dessas leis sintáxicas, Bachelard destaca algu­ mas constantes semânticas que dizem respeito ao conteúdo das produções oníricas. Dessa forma, ele põe em evidência um prin­ cipio de isomorfismo, segundo o qual uma imagem continua a mesma por meio das diferentes categorias de suas manifestações (caverna, casa, ventre), que ela seja projetada no universo ou que ela se volte às profundezas do eu. E por isso também que, no imaginário, o pequeno pode agir sobre o grande porque ele é um concentrado de sua potência (ER 163), o grande pode virar pequeno por simples mudança de escala (TRR 226). Por outro lado, imagens e metáforas são extremamente reversíveis, como a água e a cabeleira, o vinho e o sangue, sem conhecer os limites das conversões próprias aos logicistas. Desse ponto de vista, uma das reversibilidades mais sugestivas refere-se ao sujeito e ao objeto, ao homem e ao universo, o que permite imaginar todo olhar como uma luz e toda luz natural como um olhar (AS 237; EWR 39; TRR 199). Enfim, entre outras constantes, a imagina­ ção tem sempre uma tendência a aumentar uma imagem até o infinito (AS 11), a privilegiara verticalidade (AS 17, 118), a se enriquecer com o contato das resistências e das lutas (TRV 21), a transformar o difuso em movimentos (AS 237), etc.

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A nova crítica literária Bachelard ligou intimamente compreensão do imaginário e literatura, da qual ele se declarava um leitor incansável, insaci­ ável. Em um primeiro tempo, a literatura lhe serviu, sobretudo, de fonte de documentação sobre as atividades da imaginação, à medida que o escritor, o poeta, o ensaísta tem o dom de captar no ato “as imagens naturais”. A literatura é, desse ponto de vista, mais eficaz que a estética visual ou as mitologias, compiladas pelos etnógrafos ou folcloristas. O escritor sabe trabalhar uma imagem para reencontrar toda sua primitividade substancial, com a condição de ser “sincero”, isto é, de evitar jogos fictícios sobre as imagens (didatismo, jogo de palavras), sinceridade que não dispensa, no entanto, o humor e a ironia. Mas é também exposto a diversos defeitos: ser vítima de sobrecargas simbólicas por racionalização, sob a pressão da cultura, herdar imagens usadas, clichês, ceder a metaforizações excessivas. Paradoxalmente, Bachelard prefere em geral aos grandes clássicos os escritores de segunda classe, porque eles seriam mais receptivos às imagens, e os escritores contemporâneos mais ávidos de imagens que de relatos (TTR 283). Só que o panteão bachelardiano possui um vasto leque de clássicos: Balzac, Blake, Goethe, Hofmannsthal, Hugo, Huysmans, Lawrence, Michelet, Poe, Rilke, Shelley e etc. Em um segundo tempo, Bachelard, em pequenos toques, formulou um verdadeiro método de crítica literária, resultado de sua própria interpretação de textos, que cobre os campos teóri­ cos da receptividade, da leitura e da interpretação. Ele opõe de súbito uma leitura espontânea e rápida - atenta principalmente ao sentido do texto - a uma segunda leitura, lenta, que deve se preservar de toda recitação em voz alta e que deveria se esforçar em recopiar os versos de um poema para aproximá-los melhor (TRV 262). Somente esse tipo de leitura seria capaz de descobrir o imaginário de um escritor, encontrando a força das imagens e atrás delas o mundo próprio das matérias sonhadas. Mas, ao con­ trário de uma visão intelectualista, trata-se, para o leitor crítico, de reviver tais imagens, de reencontrar nele mesmo a semântica cósmica ou laboriosa das imagens escritas. Hostil a uma crítica universitária ou psicanalítica muito dominada pelo conceito, a crítica bachelardiana se quer inseparável de uma subjetividade poética. Trata-se então de:

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Simpatizar com o devaneio criador, tentando pe­ netrar ate o núcleo onírico da criaçào literária, comu­ nicando, pelo inconsciente, com a vontade de criaçào do poeta (ER 63, TRV 233). Por esse caminho, Bachelard procura compreender como um autor pôde se apropriar do imaginário universal, com suas substâncias e suas leis, individualizando-o em funçào de seu mundo interior, de sua própria psicologia (consciente e incons­ ciente) existencial. Em raras passagens. Bachelard pretende aprimorar ferra­ mentas mais sistemáticas que permitam sintetizar os saberes adquiridos: diagramas poéticos (PF 185), hológrafos etc. Sinal que confirma que Bachelard inaugurou novas vias, multiplicou hipóteses inovadoras, mas, sem nunca dogmatizar, ele estava convencido de que a crítica literária devia ela mesma permanecer um trabalho literário de devaneio, de satisfação das palavras e de tentativa de escritura. Uma visão bachelardiana não saberia então reivindicar uma tomada global da expressão literária, tendo negligenciado, por querer, tanto as visões formalistas, linguísti­ cas. propriamente narrativas (TRV 355 ss.). Podemos certamente estimar que Bachelard instrumentalizou demais a literatura para fazê-la servir a um conhecimento de imagens; entretanto, nessa ocasião, ele enunciou um certo número de métodos insubstituí­ veis para delimitar o trabalho da linguagem e da criaçào poética. A imaginação como arte de viver e ética Mas a vocação bachelardiana em explorar o funcionamento da imaginação e a lógica do imaginário não se reduz a um interesse especulativo, nem mesmo estético. A imaginação é para ele, antes de tudo, um meio para o homem se aliviar, ou seja, curar-se de seus desajustes psíquicos, de sua estrutura neurótica, uma vez que seu mal existencial está marcado pela angústia e pelos medos primiti­ vos. Assim, as imagens dispõem de um coeficiente de equilibração, de libertação e de felicidade. Mesmo em contato com imagens negativas, a imaginação encontra a mola para compensar seu lado sombrio e para trazer um devaneio feliz, seguindo em particular as forças dinâmicas sugeridas pelas imagens de verticalidade, que contribuem para estruturar a vontade, para exorcizar as trevas das

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imagens de queda (TRV 344 :5s.). Ganharíamos, então, ao nos servirmos do imaginário das matérias e mesmo das imagens do trabalho sobre as matérias para modificar um psiquismo, ou seja, para dirigir uma intervenção terapêutica e clínica (sobre o modelo da psicoterapia de Robert Desoille ou de L. Binswanger). É por isso que Bachelard acompanha vários resultados de recomendações pragmáticas destinadas a dominar adequadamente o dinamismo das imagens para viver melhor, seja para alcançar uma sabedoria, uma realização plena do ser. A psicologia do imaginário se torna então inseparável de uma ontologia e mesmo de uma metafísica, que tem como fim uma arte de viver. E por isso que, no final das contas, a imaginação é portadora de uma energia moral, de uma orientação do ser a ficar ereto, a opor às forças negativas um querer-viver positivo, que permita se tomar verdadeiramente homem. As páginas consagradas a Nietzsche (AS 163 ss.) testemunham as afinidades de Bachelard com uma ética voluntária, animada por um desejo de superar, por uma dialética incessante de valores, a oposição trágica do mal e do bem. Fontes e influências A obra de Bachelard, largamente engajada em uma psico­ logia do conhecimento considerada como um processo contínuo de desconstrução e de reconstrução, em uma linha que leva assintaticamente à coisa em si, continua sendo uma filosofia da qual retoma as grandes problemáticas e as grandes filiações. Sua concepção do imaginário faz bastante eco com a cosmologia dos pré-socráticos, com as relações da razão e da imaginação nos pensadores do Renascimento, com as instituições e as operações de alquimia, enquanto conjugava materialismo e espiritualismo (TRV 240 ss.; TRR 44 ss.), com as teorias do idealismo alemão (Fichte, Hegel, Schelling) e, enfim, com as idéias de Schopenhauer, de Nietzsche e de Freud. Se Bachelard utilizou de uma história da razão das Luzes (Lumières) para clarear a ideia de uma progressão contínua da razão nas ciências, enquanto isso tomou o partido de um certo romantismo para penetrar nos arcanos da imaginação criadora, designada para criar um mundo surreal, que seria o pendente do inundo real reconstruído pelo conceito.

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Quanto ao impacto de sua obra, ele é imenso e ainda difícil de avaliar. A epistemologia bachelardiana deu nascimento a um estilo especificamente francês de trabalhos sobre história das ciências que foram marcados pelos nomes de Georges Canguilhem, Louis Althusser. Michel Foucaull ou François Dagognet. Quanto ao Bachelard poético, ele deixou sua impressão sobre várias críticas literárias, francesas e estrangeiras, e serviu de lente de aumento a um grande número de artista, que reconheceram em suas análises verdades íntimas sobre sua própria imaginação criadora.

Mircea eliade (1907-1986) J. Thomas

Mircea Eliade é sem conteste o melhor intérprete de Jung no campo da história das religiões. Jung tinha orientado suas pesquisas segundo quatro eixos9: \

1) 2) 3) 4)

o estudo clínico de seus pacientes; o estudo da história do pensamento ocidental; o estudo do corpus mitológico das grandes civilizações, das vias de sabedoria e das formas de espiritualidade; o estudo dos fenômenos ditos ocultos e paranormais.

Se considerarmos a imensidade do coipus assim evocado, Jung não podia explorar sistematicamente as pistas que ele tinha aberto. Eliade foi sem dúvida um de seus melhores sucessores e colaboradores rio campo da história das religiões, da mitologia, do estudo das místicas e das espiritualidades. Nesta selva escura, tanto densa quanto difícil de penetrar, ele realizou avanços decisi­ vos, e sua presença assídua na 7?/g///?ígpIuridisciplinar de Eranos, iniciada por Jung em 1933 em Ascona, mostra as estreitas ligações, científicas e amigáveis, que uniam os dois homens. Deve-se dizer que o perfil de pesquisador de Mircea Eliade é surpreendente, e particularmente largo: foi criador de vários romances, é um ex­ celente conhecedor do pensamento místico do extremo-oriente (ele passou quatro anos em Calcutá, de 1928 à 1931), e também 9

Cf. M. -L. Colonna, “Sur le versanl psychologique du nombre", Prisma, VIII, 2, Poitiers, Juillet-décembre 1992.

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da antropologia contemporânea (em particular das obras de G. Dumézil e de Lévi-Strauss). Eliade cria então verdadeiramente uma nova concepção da história das religiões, fundamentada em: - Uma fenomenologia, como um decifrar, sempre apoiado em bases históricas, hierofanias, digo, manifestações do sagrado. Nesse plano, Eliade reencontra Jung, também apegado ao caminho fenomenológico como único cientificamente rigoroso. - Uma hermenêutica, isto é, uma interpretação dos dados fornecidos pelo trabalho de “campo”. Trata-se agora de compa­ rar documentos, e de retirar dos fatos religiosos o que eles têm de trans-históricos. A hermenêutica de Eliade é então fundada, antes, em um comparatismo. Em seguida, ela é simpatia, porque inscreve e implica o pesquisador, e o leitor, na clémcirche da qual ele toma conhecimento: na grande corrente da vida, a história das religiões tem um papel na vida cultural contemporânea, e o estudo da nossa sociocultura não é o da vida das formigas: ela nos implica. Como também, nós veremos, os mitos são vivos, assim como a interpretação tem um papel ativo, o espectador está no sujeito, ele não é passivo. Logo, Eliade não dissocia nossa problemática daquele das socioculturas que ele estuda. Ele estaria em contradição, se o fizesse, com o sistema de inter-relações que fundam sua teoria. Isso o conduz frequentemente a uma compreensão profunda dos “mitos” modernos, mesmo se eles estiverem, como ele diz, “camuflados”10. Por exemplo, é seu olhar sobre as sociedades tradicionais que lhe permite compreender que a famosa “crise do homem” do século XX é, com efeito, bastante narcísica, porque ela é antes uma crise do homem ocidental, e que a maneira de a ultrapassar está no reconhecimento de nossas raízes (arcaicas, selvagens, familiares) illnd tempus. Esta noção de illnd tempus (o espaço-tempo primordial onde se situa o ato fundador original descrito no mito etiológico) é, sem dúvida, a melhor maneira de entrarmos no pensamento de Eliade. Ela deriva estreitamente da noção de sincronicidade junguiana. De fato, o tempo do mito é um tempo “total”; seria insuficiente descrevê-lo dizendo que o mito está “no início”, pois o evento fundador pode ser “ressuscitado” a cada momento da vida de 10

Cf. M. Eliade, “Survivance et camouflage des mythes", Diogene, 1963, v. 41, p. 3-27.

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uma sociedade no qual cie é o referencial. Para Eliade, está aí precisamente a essência do sagrado. A hierofania (o episódio mítico fundador) se deixa ver por quem sabe fazê-la vir a si. Há entào um efeito recursivo, em feedback entre o “tempo do mito” e o “tempo da história”, entre o sagrado e o profano. O mito irriga a história, ele dá um sentido, uma estrutura, ao que seria apenas uma acumulação insignificante de eventos. Entào o sentido está na relação, na complexidade, e não na única sucessão diacrônica. Bem além do que se entende geralmente por “história”, a história das religiões é antes, para Eliade, uma ciência da complexidade: “o sagrado é um elemento da estrutura da consciência, e não um momento da história da consciência”, para retomar uma fórmula de M. Eliade. E assim como o mito irriga a história, a história dá uma carne, um corpo, uma respiração ao mito. que se encarna e que se deixa ver nela. A bipartição entre profano e sagrado se jus­ tifica. dessa forma, na continuidade de uma experiência “religiosa” global (no sentido de uma relação, religio), que é experiência da relação, como elemento constitutivo ao vivente. Em um movimento contínuo, ligado ao vivente, por meio da dialética da hierofania, o profano se transforma em sagrado, e a dessacralização retransforma o sagrado em profano. Essa estrutura dinâmica permite entender a simbólica do sacrifício como um momento de inversão alquímica entre um “desmembramento” que encontra seu ápice na morte do sacrificado e um “remembramento” simultâneo, uma subida gloriosa no sagrado que faz dessa morte uma vitória, uma ressurreição, a identifica à morte-renascimento do herói original, no illud tempus. No mistério do sacrifício, a extrema desordem, a vitória da entropia (a morte) é o canal oculto da reunificação e do retomo à unidade e à neguentropia. Da mesma forma, uma comemoração religiosa (uma missa, por exemplo) faz coincidir o fiel com a paixão, in illo tempore, do personagem salvador funda­ dor de sua religião: Cristo, Mitra. Dionísio, Osíris... O tempo da missa (e a expressão é ruim, porque, justamente, nesse momento, o tempo é abolido), o fiel se toma, é o deus. O estatuto da imagem em Eliade De onde decorre o estatuto da imagem em M Eliade"? Ela é como Malraux dizia da arte, “moeda do absoluto”. Reencontramos

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um processo descrito e observado por Jung. Como relato da ori­ gem, o mito fundador é, antes de tudo, ponte, passagem, media­ ção. Ele faz passar o arquétipo na carne do inundo encarnado11. E aí reina muito “barulho”, desordem, deriva e desperdício. O trabalho do historiador das religiões é então o de apreender, além da diversidade e do brilho das imagens, o universo do sím­ bolo. Este é a imagem e a linguagem do arquétipo na consciência. Entre a imagem e o arquétipo há a imagem simbólica; entre a hierofania e o fiel há os mitos e os ritos. Eliade insiste nessa capacidade da imagem de ser mais carregada, instantaneamente, de sentido simbólico, do que o discurso teórico, que deve, ele, passar pelo canal da linguagem e de suas representações con­ ceituais. E o poder e a missão das imagens de mostrar tudo o que permanece refratário ao conceito12. Por outro lado, a carga da imagem não fala à inteligência, à razão; ela é multivalente e, simultaneamente, anagógica, diretamente operativa; a imagem simbólica é ativa, dotada de um poder imediato de transformação daquele que a vê, e logo a vive. Para serem mais eficazes, tais imagens simbólicas são rea­ grupadas em relatos organizados, os mitos. O mito é um “sistema dinâmico de símbolos, de arquétipos e de schemes [...] que tende a se compor em relato”13. Por meio dos mitos, Eliade mostra que os diferentes símbolos se organizam em “sistemas autônomos”, mas religados entre si - então em auto-organização, e em “fe­ chamento operacional”14. Capazes de se abrir sobre o “mundo’, isto é, de “dar” e de “tomar” sentido na consciência do leitor, são um belo exemplo de estrutura dinâmica, ativa, que religa o arquétipo e a psique individual, cujo canal é um sistema imagi­ nário desencarnado, porém mais “verdadeiro” que o “real . São as instâncias organizadoras e constitutivas da psique humana - ou mesmo, além, as estruturas do vivente - que se manifestam por meio da “linguagem” das imagens míticas.

11

12 13 14

Assinalemos que, para Eliade, dizer isso não é querer provar um a priori espiritualista, mas levar em conta as experiências observadas, em todo lugar e sempre, na história das culturas e das civilizações. Cf. Images et symboles, p. 24. G. Durand, Les structures de Fimaginaire, p. 64. Cf. Ia parte, cap. III, Enjeux et prospectives. Eimaginaire et les autres concepts exploratoires: systématique et complexité, p. 161 ss.

1

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Notemos que Eliade. como bom historiador, tem menos confiança nos sonhos do que Jung como experiência do imagi­ nário; ele privilegia a experiência coletiva (religiões, mitos) em proveito da experiência onírica individual, menos esclarecida, e ilustra dizendo que há, entre o sonho e o mito, a mesma diferença que entre um adultério e Madame Bovary. O mito heroico Dentre os mitos, o mito heroico tem um estatuto particu­ lar, privilegiado na obra de Eliade. E que ele aparece como a metaforizaçào do dinamismo organizador que liga o profano ao sagrado, o fiel à comemoração do illud tenipus. Nisto, o relato heroico é, fundamentalmente, iniciação, passagem (do latim mire, "‘entrar em”). O herói mítico está investido de funções que reencontramos em todas as culturas: - Ele é aquele que. por sua andança, sua ascese, suas pro­ vas. qualifica-se em uma “cavalaria”, ao mesmo tempo que ele faz existir o mundo à sua volta, e normalmente ele o faz existir nomeando-o, em sua função epônima. Ele exprime assim, sim­ bolicamente. que o interior e o exterior formam somente um, e que a conquista do espaço interior é indissociável daquele do espaço geográfico. Dessa maneira, o herói, o cavaleiro, passam seu tempo entre o centro (o eixo arquetipal) e uma periferia (a “carne” do mundo encarnado; a floresta misteriosa), sem nunca se situar em um ou no outro. O sentido está no movimento, na relação, enquanto que o rei, que garante as proezas do herói ou do cavaleiro, quase não se mexe. - Ele é aquele que, no decorrer de sua andança, opera uma reviravolta, um movimento de ascese, contra a corrente e a in­ clinação natural das coisas, quando nós nos deixamos levar por elas. Enéas sobe o Tibre contra a corrente, antes de chegar no sítio axial, fundador de Roma; e são as pegadas de um cavalo com a ferradura de traz para frente que indicam a Perceval o caminho para o Castelo do Graal. Eliade fala da familiaridade dessa característica do herói com a yoga (que ele conhece bas­ tante^): a yoga também se opõe ao instinto. Os asana não são poses naturais. A concentração do yogui se orienta para uma 15

Cf. Le yoga, immortalité et liberté, Paris: Payot, 1991 (1954).

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forma de ordem, mas como dominação de um fluxo criador, que é o “redemoinho da consciência” de nossa vida psico-mental. - O herói mítico é então fundamentalmente homem de desejo: um desejo do ser, vivido como nostalgia da “realeza” espiritual perdida, por meio dos caminhos do exílio, e cuja “sim­ patia” do leitor do imaginário de que falamos supra é como um reflexo. Para Eliade, o desejo tem um lugar essencial na constru­ ção imaginária, em sua dupla projeção negativa (o sentimento do paraíso perdido, da queda e do abandono) e positiva (a certeza da fusão e da reintegração). Sem desejo, o homem morre - também quando uma sociedade histórica não se transfigura mais em seu “ser de desejo” se ligando aos seus mitos fundadores, ela se autonomiza sem se religar, ela não é mais auto-organizada, e ela morre. Quando Perceval pergunta onde está o Graal, o mundo da terra gasta revive. Ninguém tinha pensado, antes de Perceval, em colocar essa questão central, e o mundo morria por causa dessa indiferença metafísica e religiosa, por causa dessa falta de imaginação, e por essa falta de desejo do real16. Mas esse “homem de desejo” é, indissociavelmente, “homem de memória”, assim como, na dinâmica do vivido, memória e respiração, dimensão axial e dimensão projetiva são inseparáveis, e que, para definir a noção de “conversão”, de “inversão”, que evocamos supra, a língua grega possui duas palavras: epístrofe, “retomo para traz”, olhar nostálgico, e metanoia, “todo outro”, mudança radical e projeção para frente. O herói é então aquele que perpetua e afirma o priinat de uma leitura iniciática em relação a uma leitura “banal” do mundo. O esquema iniciático: B - Vida, apogeu / C - Morte / A - (Re) nascimento, res­ surreição se superpõe ao esquema biológico: A - Nascimento / B - Vida, apogeu / C - Morte, sem que eles sejam fundamentalmente diferentes: são os mesmos, com um ponto de deca/agem (B toma o lugar de A). São então duas descrições da complexidade do vivo em duas leituras, todas duas verdadeiras, uma profunda, a outra superficial; o relato mítico está aí para descobrirmos o esquema iniciático “profundo”. 16

Cf. Images et symboles, p. 71.

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Face a essa projeção do herói, o obstáculo participa, à sua maneira, de um papel estimulante. Ele é a resistência que permite ao homem de metamorfose se pôr se opondo. Assim, o obstáculo leva o herói a um fecundo desequilíbrio. Rompendo a simetria de uma ordem estabelecida demais, esse desequilíbrio, essa assimetria, criam o élan que projeta o herói para além e o faz ultrapassar os limites: do mundo, dele próprio - permite ao herói o salto iniciático que faz dele ao mesmo tempo o mergu­ lhador e o acrobata: ele está em equilíbrio instável sobre um cimo. entre dois precipícios, a queda o ameaça, mas ele vê mais longe do que nunca; bela metáfora da condição humana, que reencontramos nas tumbas (a Tumba do Mergulhador) ou nos templos (o Salto de Sapho, na Basílica pitagoriciana da Porte Majeur em Roma) com esse valor iniciático. A coincidentia oppositorum

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As instâncias a partir das quais se organiza a trajetória he­ róica. e se cria o mundo, relevam o princípio de pares de opostos antagonistas cujo “combate'’ é bem real, mas se duplica, atrás da cena. em uma secreta aliança: a coincidentia oppositorum. As­ sim. o mundo se projeta e se cria a partir da luta e da conjunção dessa matéria-prima. Eliade foi particularmente completo em seu estudo sobre tais pares opostos, e o melhor se encontra em seu Tratado de história das religiões, como “estrutura e morfologia do sagrado”17, descrevendo as grandes constelações imaginárias “habitadas*’ pelas hierofanias: Sol, Lua, Agua, Pedra, Terra, Ve­ getação ... Na Epreuvedu labyrinthe, Eliade sublinha que quando Brancusi - outro Romeno... - queria exprimir, em suas esculturas, o simbolismo do voo e a gravidade abolida, ele escolhia para criar seus pássaros, suas colunas sem fim, a matéria oposta ao elemento aéreo, e o arquétipo da gravidade: a pedra; assim, ele opera a coin­ cidentia oppositorum. Mas o hermeneuta sucede ao historiador e ao fenomenólogo: Eliade não se contenta de nos descrever esses campos do imaginário. Por seu método comparativo, e se apoiando em pesquisas inteligentemente exploradas de seus predecessores antropólogos (Mauss, Durkheim, Dumézil, Lévi-Strauss), ele nos dá o sentido profundo. Releva que toda a obra de Dumézil é uma 17

Traité d'histoire des religions, p. 15.

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construção paciente que se propõe em demonstrar que a dualidade (onde, como Piganiol, havíamos por muito tempo acreditado ver o dinamismo essencial) está no interior da tripartição, ela só pode ser entendida na “tecitura”. Eliade conclui: Para os estruturalistas, as polaridades, os pares de contrários, as oposições, os antagonismos não têm uma origem social e também não se explicam por meio de eventos históricos. Trata-se de uma estrutura de vida, que é idêntica à estrutura da matéria18. E cita em apoio Lévi-Strauss: O pensamento mítico procede de uma tomada de cons­ ciência de certas oposições, e tende à sua mediação progressiva19. Eliade conclui: Não existe solução de continuidade entre as polaridades e as oposições registradas ao nível da matéria, da vida, da psique profunda, da linguagem ou da organização social - e o nível das criações mitológicas e religiosas20. Existe um continuam de energia do ser vivo, e o imaginário, longe de ser do domínio do não existente, é uma presença real, tão “verdadeira” quanto a matéria, e mesmo mais, pois ela é transfigurativa e ativa.

O tempo O tempo do mito é como o mito: complexo. Ele entrelaça várias formas de tempo, como tantas descrições de u m a realidade imperceptível (o arquétipo) que estará sempre além do olhar que os homens podem ter sobre ela. Assim, o mito se apresenta por meio de no mínimo três tempo: um tempo linear, o da história; um tempo cíclico, o da repetição, e do retomo indefinido; e um 18 19 20

M. Eliade, “Mythes de combat et de repos. Dyades et polarités", in Eranos Jahrbuch, Polaritéit des Lebens, Zurique: Rhein Verlag, 1968, p. 64. Somos nós que sublinhamos. Anthropologie struturelle, Paris : Plon : 1958, p. 248. M. Eliade, op. cit., p. 64.

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outro tempo, “total", que engloba e ultrapassa os outros como duas descrições parciais, e que compreendemos melhor dentro do contexto da sincronicidade. Essa noção de “eterno retomo ”21 é sempre objeto de um mal entendido: acreditamos ver nela uma leitura cíclica do tempo, enquanto que, para ficarmos nas figuras geométricas, seria mais urna leitura espiralada: de fato, Eliade toma como o tempo sacrificial. que repete o sacrifício inicial e coincide com ele. Suporte da metamorfose, esse tempo da “presença real” é antes aquele da conjunção, além das outras “categorias” redutoras que tendem a uma leitura e a uma interpretação do espaço-tempo. Espiralado, ele “repassa”, mas em outro nível, e não tem nada de repetitivo. Regenerante e neguentrópico, ele é o vetor do absoluto pelo qual o arquétipo vivifica a “carne” do mundo manifesto. Bibliografia seletiva Tratado de história das religiões. São Paulo: Martins Fon­ tes, 2002. Le mythe de 1'éternel retour. Paris: Gallimard. 1989 [1949]. Le chamanisme et les techniques archaíques de 1'extase. Paris : Payot, 1992 [1951]. Images et symboles. Paris: Gallimard, 1979 [1952]. Le yoga, immortalité et liberté. Paris : Payot, 1991 [1954]. Forgerons et alchimistes. Paris: Flammarion, 1977 [1956]. Mythes, rêves et mystères. Paris: Gallimard, 1989 [1957]. Aspects du mythe. Paris: Gallimard, 1988 [1963]. Le sacré el le profane. Paris: Gallimard, 1988 [1965]. Histoire des croyances et des idées religieuses. Paris: Payot. 1989 [1976-1983], 3 V. Sobre Mircea Eliade CJ-H. Rocquet. Mircea Eliade. L’Épreuve du labyrinthe (Entretiens avec M. Eliade). Paris: Belfont, 1978. Cahier de l'Herne. Mircea Eliade. Ouvr. Collec., Ed. de FHeme, 1978. A. Marino. L'Herméneutique de M. Eliade. Paris: Galli­ mard, 1981. D. Allen. Mircea Eliade et le phénomène religieux. Paris: Payot, 1982. 21

Cf. 0 mito do elerno retorno, Paris: Gallimard, 1989.

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Mircea Eliade et les horizons de la culture. Ouvr. collect., publications de I ‘Université d'Aix-Marseille, 1986.

Henry Corbin (1903-1978) J. Thomas

Filósofo, tradutor de Heidegger na França, Henry Corbin também marcou seu tempo por uma outra razão, aquele que mais nos interessa: sua carreira de orientalista e iranólogo e seus trabalhos sobre a noção de imaginação criadora. Devemos-lhe a edição, a tradução e o comentário dos grandes textos do islã iraniano (íbn'Arabl, Sohravardi, Shirazi). Por seu brilhantismo na Ecole des Hautes Etudes, e nas reuniões de Eranos, fez o Ocidente descobrir o pensamento místico do Irã islâmico. Não o fez somente como erudito, mas nos fez ver em que essa espiritu­ alidade, a priori deslocada em relação à nossa, abria perspectivas de reflexão em nosso imaginário europeu, em sua diferença. Situa claramente a ambição de seu projeto em sua introdução de L 'Iinagination créatrice clcins le soufisme d'Ibn Arabí: O que se propõe aqui é uma valorização extraordinária da imagem e da imaginação para a experiência espiritual. (Paris: Flammarion, 1976, p. 14) Observaremos as noções essenciais do pensamento de Henry Corbin em torno de dois eixos: 1) De início, para ele, a religião é antes de tudo uma questão de experiência interior, em relação a um a meta-história, que transcende a história circunstancial. Nisto, o místico do Islã shiita faz a experiência do introrsum ascendere, da “subida” em Deus passando pelo “interior” do fiel: é nele que se opera a alquimia do “rapto” em Deus. Criatura e criador se encontram investidos de um extraordinário valor, não sendo nada um sem o outro: É Deus que me faz existir... Mas conhecendo-o por minha vez eu o faço existir... Disto, a novidade veio até nós. E é em mim que se realiza a proposta ... (Ibn'Arabi, Fosús, I, 83, citado na Imaginação..., op. cit., p. 197)

6-i

Encontramos ai, aplicados a um campo cultural preciso, dois temas que Jung já tinha evocado e, logo. compreende-se que Corbin tenha ocupado um lugar tào importante no Círculo de Eranos. cuja pluridisciplinaridade era constituída cm tomo da pessoa e do pensamento de Jung: - A ausência de soluçào de continuidade entre o eu e o si, entre o microcosmo da psique e o macrocosmo do universo, o primeiro estando em correspondência com o segundo, onde ele é como o “espelho". - A importância da fenomenologia: se há um unus mundus. um mundo de essências e de arquétipos, não podemos conhece-lo senão por uma franja relacionai: as imagens e as representações que dele temos. Encontramos um ensinamento junguiano. formulado na linguagem da psicanálise: não conhe­ ceremos nunca o inconsciente, mas somente as imagens e as representações que temos do inconsciente. Tem-se ai uma magnífica escola de tolerância e de liber­ dade: tolerância, pois nenhuma religião revelada se afirma pelo dogmatismo de seu discurso próprio, mas por sua aptidão a nos abrir a uma experiência pessoal da espiritualidade. Liberdade - com seus riscos ... porque essa rota que se abre é o total, o “todo outro" medieval: um caminho vertiginoso, fascinante, mas perigoso, que implica então em responsabilidade e coragem daquele que se engaja. 2) Para os místicos do Islã, a ressurreição ocorre em nós, a cada instante, pois “o outro mundo existe a partir deste mundo aqui: ele existe a cada instante em relação a cada ser”22 (Imagina­ ção .... op. cit., p. 160), e a grande guerra santa, a guerra interior que levamos em nós mesmos, passa antes da pequena guerra santa - esta, mais dogmática, que levamos contra os outros para impor nossa fé. E chegamos ao que faz, sem dúvida, a originalidade da obra de Corbin: a colocação em evidência da visão mística. Esta visão tem três características essenciais: — Ela escapa ao tempo “banal” e linear do cotidiano. Este tempo da ressurreição é da mesma natureza que o tempo 22

Arrisquemos uma aproximação com o pensamento de R. Thom : toda criação da forma (morfogênese) é ligada a uma ruptura da forma, ou catástrofe. Assim, podemos ler nos mesmos processos, desintegração e gênese: o mundo é pego a cada instante, em processo de transformações metamórficas, passando por uma desintegração e uma criação, uma “morte" e um “renascimento".

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messiânico de um Virgílio ou de um Joachim de Flore. Ele está além do tempo, ou melhor, ele engloba todos os tempos e todos os espaços, como tantas colocações em perspectiva particulares e parciais. Tem isso em comum com a profecia de poder nos dar a ver, em um “flash”, a totalidade dos mundos vindos e a vir. Aí também Corbin reencontra a sincronicidade junguiana, à qual ele trás um precioso campo de experimentação. - Eia é “interface”, mediação. Nisto, a ciência da imagina­ ção é catóplrica, ciência dos espelhos, das formas que aparecem sobre todas as superfícies espelhadas. Esse mundo da parousia, do Kérigme, da revelação, Corbin o nomeia mundus imaginaiis: a visão situada “entre” o mundo não conhecível das essências e o mundo da percepção, donde uma necessária precisão termi­ nológica. Corbin é levado a fazer uma distinção entre a fantasia - o fruto fantástico e inorgânico das divagações de nossa função imaginativa - e a imaginação criadora - saída do mundus imagi­ na/is, do imaginai, como “potência mágica criadora que, dando nascimento ao mundo sensível, produz o espírito em formas e em cores” (LTmagination créatrice..., op. cit., p. 138). Ora, a racionalidade ocidental tem tendência a identificar a imaginação “mestra dos erros” à fantasia: indo contra essa ideia recebida, enunciando nossos próprios limites ou preconceitos, Corbin nos permite entrar melhor na plenitude e na complexidade do sistema imaginário : isso o conduz então... a refutar esse termo de imaginário, muito gasto e impreciso segundo ele para estar apropriado ao rigor de seu propósito: Não compreendamos a palavra “imagens” no sentido que, em nossos dias, fala-se a torto e a direito de uma civilização da imagem; não se trata senão de imagens que ficam ao nível das percepções sensíveis, nunca de percepções visionárias. O mundus imaginalis da teosofia mística visionária é um mundo que não é m ais um mundo empírico da percepção sensível, não sendo ainda o mundo da intuição intelectiva dos puros inteligíveis. Mundo entre-dois, mundo mediano e mediador, sem o qual todos os eventos da história sacral e profética viram irreal, porque é nesse mundo que esses eventos têm lugar, “seu lugar”... Este é todo o objeto deste livro. Talvez por este, Ibn'Arabí já tenha ajudado a nossos colegas

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ocidentais que. em nossos dias - e está aí um sintoma - se esforçam em descobrir uma metafísica da imaginação e do imaginai - não diremos do imaginário. (Ulmagination .... op. cit., p. 7) H. Corbin se exprimiu novamente de maneira muito clara a esse propósito em um dos Cahiers de VUniversité Saint Jean de Jèrusalem: Esta imaginação é (segundo Mollâ Sadrâ Shfrâzi) uma faculdade puramente espiritual, independente do orga­ nismo físico; ela é de alguma maneira o coipo sutil que envolve o espírito, e desse modo antecede toda percepção empírica. O mundo imaginai é um mundo separado da matéria, mas não da extensão, um mundo onde toda carne se transforma em caro spirituahs (carne espiritual). E esse mesmo mundo que lbn'Arabi, e depois dele Haydar Aitumoli, designa como um barzakh, um entre-dois, situado ‘'no confluente dos dois mares”, o mar do intelecto e o mar da percepção sensível, o mar das idéias puras e o mar dos objetos que caem sob os sentidos. O objeto percebido pelos sentidos não é ideia; a ideia não é perceptível pelos sentidos. E por isso que é necessário um entre-dois. Sem tal entre-dois, [a revelação] não tem mais sentido nem lugar (“não tem mais lugar" - (n'a plus lieu), porque o lugar dos “eventos no céu” está precisamente aí, “na confluência dos dois mares”. Acrescentemos que é esse mesmo mundo que postula a operação alquímica, enquanto que a transmutação interior do operador acompanha os efeitos obtidos sobre as substâncias materiais ... (Cahier 1 de 1'Université Saint Jean de Jèrusalem I, 1975, p. 39) - Ela é ativa, criadora e eficaz. A imagem criadora é então uma valorização da força na forma, uma forma ativa, entre matéria “espessa” e essência não conhecível. Para o místico, existe uma forma de Deus, e não é somente uma alegoria. E pela imagem que o mundo da criação é “habitado” pela “real presença” do espírito, e Corbin é desses que nos faz compreender melhor certas declarações de Jung sobre a necessidade de ter um espírito religioso (no sentido amplo de: habitado pela evidência

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do sagrado) para estar “vivo”; por exemplo: “Ninguém fica realmente curado se não reintegrar sua atitude religiosa”, pois a imagem, na visão mística, é plenamente “real”, no sentido de que ela é transformadora do mundo. Ela é, como diz Corbin, “teofania”, isto é, manifestação do princípio divino, e também “epifania”, “passagem do estado de ocultação, potência, ao es­ tado luminoso, manifestado e revelado” (L'Imagination ..., op. cit., p. 145). Paradoxalmente, a imagem nos mostra o que somos essencialmente: nisso, ela é espelho, não espelho narcísico, mas “espelho do coração”. Ela é o princípio em ação, sua “sombra”, seu “reflexo”, e verifica esse paradoxo de participar da essência e de comunicar sua força viva, sem nunca poder se identificar a ela, que sempre está “além”: a imagem é bem um médium, uma ponte, uma interface. A oração é então explicitada em toda a sua dimensão ativa: ela é um meio de fazer “ver”, digo “viver”, o deus, que se revela em uma forma. O caminho da reza é “simpatia”: “colóquio” entre a criatura e seu criador, e logo participação ativa do fiel que deve, nas bases que evocamos, “dialogar” com seu deus, “imaginá-lo” como presente, e enfim chegar à sua visão intuitiva no “coração” (L'Imagination ..., op. cit., p. 194): é o introrsum ascendere, rapto que passa pela askésis, ascese, e é então: [o fruto de uma] colaboração da “descida” da divindade no fiel e da “subida” do fiel ao deus. O coração é então o “olho” pelo qual Deus se vê no fiel, e o fiel se vê em Deus. O contemplador é o contemplado, e a visão que tenho dele é a visão que ele tem de mim. (L'lmagination, op. cit., p. 179) Assim, Corbin nos mostra que toda a mística iraniana afirma essa concepção de uma imaginação ativa: a visão (única relação do homem à divindade) se merece, é conquistada por um voluntarismo, e assim verifica a palavra divina: “Me con­ formo à opinião que meu fiel tem de mim” (IbiVArabi, Fôsus, I, 226) - espiritualmente, nós somos o que nós queremos ser, de onde a bela frase de Plotin, sobre o desejo místico: “O desejo de ver provoca a visão” (Ennéades, V, 6, 5). Percebemos os pontos de convergência entre esse pensamento místico e vários aspectos do pensamento platoniciano. Não é de se estranhar se

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lembrarmos que a espiritualidade shita iraniana se elaborou em parte no contato e sob a influência de filósofos gregos exilados do Imperium Romanum no fim do século IV a. C., e dando origem a tais “platonicianos de Persa". Vemos toda a importância do pensamento de Corbin na história do imaginário europeu: compreendemos melhor, a partir de uma sociocultura diferente da nossa, o caráter funda­ mentalmente dinâmico e criador da imagem; ele a restaura em suas cartas de nobreza, no enorme poder que ela sempre teve nas civilizações tradicionais, e ele traz como uma verificação experimental a frase de Léon Bloy: “Todo homem é simbólico, e é na medida em que ele é símbolo que ele é vivo”. Obras de Henry Corbin Terre céleste et corps de résurrection: de 1'Iran mazdéen à 1’Iran shift. Paris: Buchet-Chastel, 1961. Histoire de la philosophie islamique, I. Paris: Gallimard, 1964. L’Homme de lumière dans le soufisme iranien. Chambéry, Paris: Présence, 1971. En Islam iranien: aspects spirituels et philosophiques. Paris: Gallimard, 1971-1976, 4 v. (Idées) L'Imagination créatrice dans le soufisme d'Ibn'Arabi. Paris: Flammarion. 1976.

Edgar Morin (1921-) J. Thomas Edgar Morin é, para nós, um dos promotores mais inte­ ressantes de uma problemática do imaginário. Não é que ele tenha procurado teorizar tal conceito, mas toda a sua obra é uma colocação em evidência das noções de complexidade c de relação: e vimos que as estruturas do imaginário se organizam justamente em tomo delas. O conjunto dos trabalhos de Edgar Morin é tão mais importante que funda e inscreve a problemática do imaginário em uma reflexão mais geral sobre os dinamismos organizadores do ser vivente, e que, assim, atribui-lhe legitimi­ dade e uma profundeza suplementares.

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Para Morin, a imagem só é interessante como símbolo, symbolon, quer dizer, etimologicamente corno relação, pois as estruturas do cosmos, do ser vivo, eslào nessa relação. Esta, por sua vez, é a tensão entre as instâncias antagonistas; e tal tensão, ela mesma, quando é constitutiva do ser vivo, não pode ser concebida senão dentro do que Morin define como complexidade. Conhecemos sua frase: “Nós vamos morrer de não compreender a complexidade”23. Decidido a denunciar os combates d'arrière-garde de um posi­ tivismo de vistas curtas, Morin se esforça para mostrar que o último estado da ciência (tanto na antropologia como na física ou na biologia) coloca em evidência uma estrutura do cosmos e do vivo - que não é jamais binário, mas sempre ternário. E o terceiro termo da estrutura é justamente a relação que associa as duas outras instâncias em uma organização, e constrói assim uma tensão e uma dinâmica. Retomando sobre esse ponto os trabalhos de Stéphane Lupasco24, Morin define o vivente como “lógica de antagonismos”; ele terá sua própria terminologia (“dialógica”, “complexidade”), à qual retomaremos. A partir de uma situação de aparente “antagonismo” (por exemplo, ordem vs. desordem), que em caso algum permite descrever a estrutura em sua comple­ xidade, mas dela ver somente a aparência, Morin propõe a leitura “complexa” ternária que adiciona a relação entre ordem e desordem como tertium non inclusum, que não é da mesma natureza que as duas outras instâncias, e que não se adiciona somente a elas, mas determina, associada a elas, uma nova ordem: ordem / organização / desordem Morin coloca - com grande talento, e de maneira muito agradável para seu leitor - os princípios de sua teoria da com­ plexidade em um livro antigo, mas que guarda todo seu valor, O paradigma perdido : a natureza humana. Logo ele alarga as pesquisas e as sistematiza em uma soma impressionante: os quatro volumes de O método. Enfim, o seguiremos em uma aplicação particularmente atual: para a Europa, em que nos sugere uma 23 24

0 método, II, p. 452. Por exemplo, 0 principio de antagonismo e a lógica da energia. Mônaco: Éd. du Rocher, 1987.

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leitura da formação da entidade europeia graças à sua visão de complexidade. Selecionamos então essas três referências em sua obra. pois nos parece que elas nos permitem apresentar um pano­ rama particularmente útil para nossas metodologias do imaginário. O paradigma perdido é construído sobre uma visão para­ doxal das origens da humanidade. Este paradoxo, veremos, vai nos introduzir muito habilmente à uma tomada de consciência da noção de complexidade, a única capaz de dar conta das estruturas do ser vivente. O homo sapiens, como sublinha Morin, não é tão sapiens assim, desde suas mais distantes origens. Aparentemente, os animais, em sua lógica regulada, são mais razoáveis, e o homo sapiens merecería se chamar homo demens. [o que pensar deste “animal dotado de desrazào”?] E inconcebível que um animal que consagra tanto de suas forças para gozar e se exaltar, que perde tempo em enterrar seus mortos, a realizar seus ritos, dançar, decorar, possa ter sobrevivido e progredido25. Mas eis: é o homem que evolui, e são os animais que es­ tagnam. Por quê? Porque - e estamos sempre em um aparente paradoxo -, enquanto a ordem natural é dominada pela homeostasia. a regulação, a programação, a ordem humana se desenvolve sob o signo da desordem. O reino do homo sapiens corresponde a uma massiva introdução da desordem no mundo; somente na ordem do vivente ele faz crescer no, e pelo erro, a desordem, o “jogo’". O jorro do imaginário (tomado aqui no senso de facul­ dade imageante, imaginação, “fantasia”, segundo H. Corbin), a multiplicação dos erros, a proliferação da desordem, longe de tomá-lo deficiente, deram-lhe os meios de seu prodigioso desenvolvimento. Pois o organismo vivente funciona com apesar, graças ao - “barulho” e erro. Assim, o sapiens é sempre inacabado, em estado de perpétua juvenilização: é por isso que, até sua morte, contrariamente ao animal, ele aprende. Ele não o faz sem risco, pois esse jogo, essa desordem, são constantemente janiformas, simultânea e potencialmente vivificantes (eles abrem à criatividade) e mortais (a loucura, a perda total do controle, 25

O paradigma perdido: a natureza humana, p. 124.

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são sempre ameaçadoras): o sistema do vivente se alimenta da desordem, mas ao mesmo tempo, é por ela ameaçado. Entào, o homem é, inextricavelmente, louco e sábio. Sua sabedoria está em sua loucura. Como dizia Rimbaud, '‘terminei por achar sagrada a desordem do meu espírito”. Dentro desse jogo de palavras que ele adora, Morin sublinha que a recreação está ligada à recria­ ção; e o cérebro humano está condenado a ficar imperfeito, ele não pode ser otimizado, porque a excelência navega no limite da crise (quer dizer, do aumento da desordem no interior de um sistema), da neurose, da loucura, e que o “melhor” contém como ingrediente aquilo que arisca degradá-lo e corrompê-lo. Morin cita a esse respeito uma bela frase de Lacan: “O ser do homem, não só não pode ser compreendido sem a loucura, mas ele não será o ser do homem se ele não levar em si a loucura como o limite de sua liberdade”26. Dizíamos que o homem é inexplicavelmente louco e sábio. É esse “inexplicavelmente” que nos dá a chave. No homem, ordem e desordem são associados. Elas têm sua eficácia somente na relação, o controle de uns pelos outros. Tudo isso se faz em um sistema de associações policentradas, de frágil estabilidade, constituído pelo jogo de livres associações aleatórias. E esse sistema ffagilmente hierarquizado, carregado de muita aptidão organizacional, e notadamente de uma aptidão à mudança e à criatividade, que Morin chama sistema hipercomplexo. Ele o reencontrará, como sociólogo, no funcionamento das grandes cidades, e das civilizações as mais avançadas: muito performantes, muito permissivas, geradoras de muita criatividade, mas muito ameaçadas, do interior ou do exterior, pois têm pouca aptidão a se organizar para se proteger. É fato que o talento do sapiens está na relação, na intercomunicaçào entre imaginação e tensão gerada pelo real, entre a desordem do “barulho” e a ordem dos “códigos”. Sua demência é a ruptura dos controles, o “voo”; é daí que ele extrai sua criativi­ dade. Mas seu talento é o de não estar totalmente prisioneiro nem da ruptura dos controles, nem dos controles; é o de encontrar um espaço perigoso, estreito, um limite, no qual se organiza um tipo de “dança” frágil sobre o vulcão entre dois precipícios, uma aresta 26

J. Lacan, in: A infância alienada. Paris: Denoèl, 1984.

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por onde a vista chega ao mais longe possível. A queda sempre ameaçadora é o preço da contemplação desse panorama, que constitui propriamente o próprio do homem, a ratio de que fala Seneca (e que é bem outra coisa do que nossa “racionalidade”). Nesse sistema, a imagem é verdadeiramente interface, tem um papel formador e transformador essencial. Ela se carrega da mesma ambiguidade que controla todo o sistema, e no qual ele encontra sua dinâmica. Ela é a porta de entrada para um espaço de “loucura" e de livre associação e. ao mesmo tempo, é o vetor de um imaginário estruturante. que toma a imagem mais “verdadeira” que o “real" que nos cerca, pois nossas representações imageantes, por seus recortes, suas associações, suas estruturações, dão um sentido a esse “real". Logo, a imagem, para Morin, é ligada à não razão e à razão, à desordem e à ordem, e é porque ela está no limite desses dois mundos que ela é realmente o motor de nossa psique, percebida como um elo - e não como local... - no qual se organizam e se desorganizam as constituintes de nosso imaginário. Nisso, o imaginário, modo de emprego de um sistema total de imersão na profundidade do vivente, além da superfície das aparências, é neguentrópico e antidegenerante: um dos traços dessa neguentropia é o fato de tal pensamento do retomo às origens (ou antes, da coincidência com a origem, que coincide com o pensamento do retomo ao sagrado), como o define Roger Caillois, longe de se “usar”, frutifica à medida que o praticamos; ele só morre porque o esquecemos; e o esquecimento é sempre, no relato iniciático, o grande pecado antológico, aquele que faz passar da vida à morte, e, diremos, da neguentropia à entropia. Para Morin. o imaginário assim definido é verdadeiramenle ativo, animado de uma “real presença”, e como dizia Henry Corbin sobre o imaginai, ele pode determinar o real. virar real, mas um real carregado de sentido, “habitado” por forças maiores que somente as formas. Teria sido tentador fazer o sonho desempenhar um papel privilegiado nessa evidenciação das forças do imaginário, pois o sonho, como estado de desordem, de livre associação aleatória e de “barulho”, é fator depoiesis, ele podería mesmo ser a “via real” de acesso às forças de nossa criatividade. Mas Morin é, nesse ponto, mais prudente que Jung, pois mesmo que o sonho partici­ passe da auto-organizaçào e da autorrepresentação da psique - e aí, Morin reencontra Jung ele se mostraria em urna constante ambiguidade; não há qualquer fator que permita introduzir um

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mínimo de controle por parte do sonhador. Ele permanece então fascinante, mas não conhecível pela parte consciente de nosso ser. Em O méíoclo, Morin retoma esses temas com mais ampli­ tude, sistematiza-os, amplia-os para uma visão cósmica e generalista das observações que foram focalizadas em perspectiva antropológica, em O paradigma perdido. O resultado é muito probante, porque Morin mostra que essa estrutura do vivo é também uma estrutura do cosmos, da organização do mundo. Ele parte da mesma aparência de uma dualidade agonística dos fenômenos, dos quais mostra que ela presidiu aos modelos que os cientistas adotaram primeiro para descrever o mundo e seus fenômenos: Clausius (1850), depois Boltzmann (1877), co­ locam em evidência o princípio da entropia, a partir do segundo princípio da termodinâmica definida por Camot: a energia se degrada em calor, e isso por um processo crescente, que tende a um estado de homogeneização no interior do sistema: então, as possibilidades de transformação desaparecem, o sistema “morre” Inversamente, a elevação da temperatura se acompanha de um crescimento da desordem interna do sistema, e a entropia maximal corresponderá a uma desordem total do seio do sistema: excesso de ordem e de desordem se juntam, em sua dimensão mortífera. Ora, essas observações eram verdadeiras, mas parciais, e seu erro era de não se descrever como tais, de se apresentar como universais. Sabemos que a grande descoberta da física do século XX foi justamente o problema do observador, sempre interferindo em sua observação, na física quântica. A lei da entropia se verifica, mas somente na física clássica, e no tipo de sistemas fechados que ela descreve. Planck descobre (já, em 1901...) a desordem das partículas, põe em evidencia o fato de essa desordem, presente em toda parte, não ser degradação. E constitucional, faz parte da physis e da ordem. Em vez de degradar, ela faz existir. Reen­ contramos o princípio de complexidade. A história da física, da astrofísica, da química, da biologia no século XX será a história da colocação em evidência desse princípio de complexidade nas ciências. Do infinitamente grande ao infinitamente pequeno, a desordem aparece também como uma desordem da gênese e da criação, uma desordem organizadora, como mostrará Ilya Prigogine quanto às estruturas dissipativas em termodinâmica, também no mundo da química. E se desintegrando que o cosmos se organiza: à entropia sucede a noção de neguentropia, de sistema

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autorregenerante. Na infraestrutura, o átomo nào é somente caos transformado de uma vez por todas em organização e ordem: ele está em gênese permanente, em auto-organização (O método, 1, 1977, p. 60). E no infinitamente grande, nosso mundo vive da "morte" do sol. enorme bomba de hidrogênio que nào para de se desintegrar. Os processos que regem a estrutura do cosmos estão assim em “círculo" auto-organizacional. Nossos mundos vivem de agonia. Toda organização neguentrópica trabalha para sua morte trabalhando para sua vida. O matemático René Thom vai ampliar essas pesquisas gra­ ças à sua própria problemática. Em sua “teoria das catástrofes”, ele liga toda criação da forma (que ele chama de moforgênese) a uma ruptura de forma, ou catástrofe. Podemos então ler nesse mesmo processo desintegração e gênese. Assim, segundo René Thom. o processo do Big-Bang. como gênese que deu origem ao cosmos, longe de ser isolado, e situado na origem de uma linha diacrônica. integra-se em um processo metamórfico de transfor­ mações desintegradoras e criadoras, que prossegue ainda hoje, em cada elemento, cada instante do cosmos. Em todo lugar, sempre, o mundo nasce e morre simultaneamente. Perceberemos a soma impressionante de mitos fundadores do imaginário, e também de constatações científicas que essa teoria integra: — O bootstrap: a fundação está ligada à manifestação, e a estrutura só se segura nessa relação: -A sincronicidade: espaço, tempo, diacronia são ultrapas­ sados e englobados em um “campo” onde só são manifestações, descrições através da imagem que nos damos a nós mesmos; - A estrutura holista: cada ponto da estrutura é por si só, toda a estrutura, à imagem do colar de Indra na mitologia hindu: em cada uma das pérolas se refletia o colar inteiro. O que nos ensinam a física fundamental e a astrofísica, en­ contramos na biologia. Os biologistas captam, na célula, a mesma dualidade fecunda entre génos, como memória do ADN, ephénon, o metabolismo e a instabilidade das proteínas, como “combustível” da célula e da respiração, indo de seu nascimento à sua morte. A dualidade não aparece somente entre ácidos nucléicos e proteínas. [...] É também uma dualidade aparentemente ontológica entre duas dimensões do real: o reinado do génos é um reinado do virtual, do potencial, do passado,

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do futuro, ele está aquém e além da vida propriamente dita. O reinado do phénon é no presente, o atual, a imediatidade da existência; precária e condenada à morte desde o nascimento, surge um instante entre dois nadas. O tempo do génos é a uma só vez o tempo lento do transformar indefinido e o tempo do retomo ao infinito. O tempo do phénon é o dos instantes que se sucedem irreversivelmente, ele se inscreve na finitude. [...]. Onde tem fenômeno, tem satisfação e sofrimento, mas onde só tem incômodo [gêne], não tem prazer... (O método, II, 1980, p. 125). Como definir melhor dois regimes de imaginário que criam e determinam o campo em relação ao qual vai se exercer a atividade humana? As representações imaginárias ocasionadas por essas duas instâncias são como as pontes incontornáveis, as formas imaginárias constituintes - Jung diria as imagens formadoras li­ gadas aos arquétipos - pelas quais passa nossa atividade criadora. E por meio de sua interface que as duas lógicas heterogêneas do génos e do phénon comunicam, pela tradução simultânea entre duas línguas: a do “código” do ADN, e a dos radicais aminados. É então pelo intermediário dessa comunicação que se elabora e se cria a auto-organização da estrutura do vivente. O historiador das religiões medirá a importância desses avanços a partir de suas próprias preocupações no campo do imaginário sociocultural: o espaço e o tempo “noturnos” e dioni­ síacos da festa e do “jogo” tomam uma nova dimensão na com­ plementaridade com o espaço e o tempo “diurnos” e apolinianos da cidade organizada e de sua lei; em uma luminosa intuição do que são as estruturas do vivo, o homem da sociedade antiga deseja que sua sociocultura seja uma visão total, que ela não mutile qualquer das instâncias constitutivas do vivente, mas que ela viva em complementaridade. Roger Caillois mostra o quanto as instituições de “férias” são atrofiadas, integradas em um du­ alismo (é preciso repousar par trabalhar melhor), em relação à riqueza da “festa” das sociedades tradicionais. Do mesmo modo, o crítico literário aberto a uma reflexão so­ bre a noção de imaginário apreciará, graças a esse comparativismo com o estado da pesquisa científica sobre as estruturas do vivente, a maneira como, por uma “monotonia sublime”, cada obra artística

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é por ela própria uma criaçào do mundo, um “retorno" a (ou antes, para integrar melhor a noçào de sincronicidade, uma coincidência com) o illud tempus das origens fundadoras. A criaçào artística é entào. iminentemente, imitas multiplex: ela se elabora a partir das instâncias formadoras do vivente, em número restrito (génos e phénon, infinito e instante, evidência da eternidade e sentimento da precariedade, decomposição e recomposição, desordem e ordem), mas ela o faz ao infinito, no brilho sempre renovado das variações que têm as cores de Íris, as cores do arco-íris da vida. Assim, essa reflexão científica sobre génos e phénon suscita uma outra, bastante filosófica: quanto mais os seres são complexos, mais eles se situam com força em relação a um espaço de memória e a um espaço de liberdade; mais eles toleram, utilizam, procuram mesmo, para seu desenvolvimento, eventos de alto risco (as “provas qualificantes” da epopeia e do romance iniciático), combates, obstáculos desmultiplicadores. Assim precisamos, para nossa própria alquimia metamórfica, tanto da agressão e da afeição, da incerteza do risco como da certeza do amor. Para propor um exemplo concreto do método de Edgar Morin, escolhemos, entre as múltiplas aplicações que ele mesmo propõe, seu livro Penser 1'Europe. Abordando a geopolílica, Morin coloca imediatamente a noçào de imaginário no centro da questão: a Eu­ ropa é tipicamente uma entidade complexa demais para ser com­ preendida por análises históricas, estatísticas, sociológicas etc., que se queriam exaustivas e totalmente rigorosas. Ela está condenada a se mostrar, a ela mesma e aos outros, por meio da representa­ ção de um imaginário da Europa se constituindo. E as instâncias que o compõem reencontram, em suas grandes linhas de força, a noçào de complexidade (como organização entre antagonismos constitutivos), fundando assim a Europa como organismo coletivo complexo integrado nas leis que presidem à estrutura do vivente. Vale lembrar que, até o início do século XX, a Europa teve somente uma existência virtual, “en oco”, por meio das divisões, antagonismos, conflitos que colocam em evidência, de uma certa maneira, uma forma de sua realidade. E assim, negativamente, em contraponto, que ela se define. E preciso então “recusar toda ideia de uma essência ou primeira substância europeia” (Penser fEurope. 1987. p. 27). Morin, como Jung, é antes de tudo fenomenólogo... Assim, para pensar a Europa, precisaremos renunciar ao modo clássico de pensamento “jacobino” e centrípeta no qual a

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idcia de unidade dilui a de multiplicidade c de metamorfose, e vir para esses parâmetros da complexidade, que Morin já tinha definido, e que ele reencontra aqui, aplicados à geopolítica: - O princípio dialógico: o neologismo se justifica, pois o termo de diálogo é insuficiente para exprimir a conflitualidade entre as instâncias constitutivas, e o termo de dialética não dá conta da persistência da oposição dualista no seio da unidade: a “mestiçagem” de Morin não é a mistura. A dialógica dará então conta do fato de que duas, ou várias lógicas diferentes, são ligadas em uma unidade, de maneira complexa, sem que a dualidade se perca na unidade: imitas multiplex... Para dar um exemplo, o que faz a unidade da cultura europeia não é a síntese judeu-cristiano-romana, é o jogo de não somente complementar, mas também concorrente e antagonista, entre essas instâncias, que cada uma tem sua própria lógica, que não a perdem, mas que estão religadas por uma estrutura organizacional, e uma praxis da qual é o cadinho. Então, o espírito da Europa não está aqui ou lá (como diz Mestre Eckhart sobre Deus...); ele está na relação entre suas instâncias constitutivas. - O princípio de recursão, ou bootstrap (“cadarço de sapato” amarrado nele mesmo): precisamos conceber os processos gera­ dores ou regeneradores como círculos produtivos ininterruptos, em que cada momento, componente ou instância do processo é simultaneamente produto e produtor dos outros momentos. Isso quer dizer que uma civilização é vivente enquanto mantém uma relação de feec/back, em ida e volta, entre seus mitos fundadores e sua história, entre sua memória e sua carne, sua respiração. Venha essa circulação a se interromper, e a estrutura se autonomiza, isto é, corta-se desse circuito autorregenerador e morre, privada das representações fundadoras às quais se religava. Por outro lado, temos aí, quando o círculo não é interrom­ pido, uma estrutura holista (ou holística), isto é, cada evento, cada elemento da estrutura é um resumo que contém potencialmente, por si só, toda a estrutura, seguindo um princípio bastante próximo das monades de Leibniz, mas que é ainda melhor metaforizado pela linda imagem hindu, já mencionada, do colar de Indra, no qual cada pérola reflete o colar inteiro. A Europa aparece então como um sistema que emerge das quebras, das rupturas, da desordem e do “barulho”. Deles ela nasce e se alimenta; e suas lutas se transformam em alianças

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fecundas. Por exemplo, ela se define contra o Islà. primeiro se unindo para fazê-lo retornar a Poitiers, em 732; depois se iso­ lando e se fechando sobre ela mesma na parte ocidental da bacia mediterrânea; mar das comunicações milenares do mundo antigo, o Mediterrâneo torna-se por muito tempo a barreira líquida, a fronteira que introverte a Europa em sua massa continental. Mas. no começo dos tempos modernos, a Europa emergirá de suas rupturas fecundas como entidade simultaneamente virtual, todavia se tomando real pela presença cada vez mais pregnante de um imaginário europeu, porque ela encontrará uma forma de dinamismo organizador para se prolongar: ela se forma do estouro, pelo estouro (éclatemení). Cria-se assim uma Europa policentrada, cujo estouro é a própria prenda da existência: na efervescência formadora dos tempos modernos, ela atinge um tipo de “calor” critico, no qual suas potências de desordem se associam a potências ordenadoras e organizadoras para criar um tipo de redemoinho, de vortex euro-organizador, feito de ordem/ desordem/ organização. Nessa construção, o que a Europa tem mais a temer é ela mesma, pois cada uma de suas instâncias constitutivas é ambígua, vivificante ou mortífera; e é nela que ela pode ser destruída, não por uma barbárie exterior, mas por sua própria barbárie, como “loucura” - desordem extrema que a autodestruirá depois de ter servido à sua auto-organização. Reencontramos a ideia de que toda existência vive do que a coroe, e pode morrer do que a nutre: “Viver de morte e morrer de vida” (HÉRACLITO, fragm. 71). Entre a atomizaçào mortífera e a unificação mortífera, entre helenização (o destino das cidades gregas que se dividiram no lugar de se unirem, e morreram em Gheronéia, abatidas por Felipe de Macedônia) e helvetização (a Europa tornando-se uma grande Suíça à escala da era planetária), a Europa não pode evitar o difícil caminho do acrobata, sobre o cimo, entre os precipícios. Referências Obras de Edgar Morin: Paradigma perdido: a natureza humana. Portugal: Europa América, 1973, t. I (“Points Essais”, 1979).

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Introdução ao pensamento complexo. Portugal: Instituto Piaget, 1995. O método 1 - A natureza da natureza. Portugal: Europa América, 1987. O método 2 - A vida da vida. Portugal: Europa Amé­ rica, 1987. O método 3-0 conhecimento do conhecimento. Portugal: Europa América, 1987. Les idées, leur habitat, leurs vies, leurs moeurs, leur organisation. Paris: Seuil, 1991, t. 4 (“Points Essais”, 1995). Pensara Europa. Portugal: Europa América, 1988. Terra-pátria. Rio Grande do Sul: Sulinas, 1996. Sobre Edgar Morin Arguments pour une méthode: autour d'Edgar Morin. D. Bougnoux, J-L. Le Moigne, S. Proulx (orgs.). Colloque de Cerisy. Paris: Seuil, 1990.

Gilbert Durand H. Godinho Durante o fim do século XIX e a primeira metade do XX, o desenvolvimento das ciências humanas colocou à disposição dos pesquisadores importantes materiais em relação ao imaginário. A antropologia, a sociologia, a psicanálise, assim como o interesse pelos estudos de literatura tradicional, tinham constituído um reservatório de elementos e de textos que faziam aparecer de maneira cada vez mais clara uma coerência da imaginação humana que chamava por uma classificação desses elementos, de forma a estudar sua ordem, o processo fundamental para estabelecer sua significação. No momento em que Gilbert Durand chegava à maturidade de sua obra, depois da Segunda Guerra Mundial, a psicanálise tinha trazido novas e importantes luzes sobre a imaginação humana; e a psicologia das profundezas de Jung, com as noções de arquétipos e de inconsciente coletivo, tinha aberto novas possibilidades a uma organização classificatória do imaginário humano.

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Simultaneamente, a guerra tinha mostrado que as ações huma­ nas nem sempre sào reguladas pela razào, e o arsenal de imagens das quais Hitler tinha-se servido para afirmar seu poder, havia abalado o ‘'resistente” que Gilbert Durand foi. Ele mesmo é quem o diz: A mitologia insensata de Rosenberg, a utilização eficaz dos poderes da imagem na propaganda de Goebbels e seus investimentos sem precedentes no povo mais avançado da civilização europeia, levava os vencidos e os que se opunham a não mais vedar os olhos, cegos por vinte e cinco séculos de iconoclasmo, sobre os poderes do mito e do imaginário [...]27. É preciso acrescentar a tudo isso o desenvolvimento que o audiovisual já tinha naquela época: [...] ou seja, todos os inventores do extraordinário ar­ senal do áudio visual sào os exatos contemporâneos de Freud. de Sorel, de Cassirer, de Jung, de Bachelard, de Eliade, de Corbin e de Dumézil... E nessa poderosa “confluência” que se instalava naturalmente minha reflexão de jovem colérico, recentemente saído da Re­ sistência, da agregação de filosofia e das brilhantes lições de Bachelard28. Vemos que a experiência vivida se adicionou ao momento cultural do desenvolvimento das ciências humanas para deter­ minar o interesse que terá Gilbert Durand pelo imaginário. Um aspecto fundamental era a classificação das imagens, problema até aí não resolvido de maneira satisfatória. É isso que fará em sua tese de doutorado, As estruturas antropológicas do imaginário (1960), na qual, na importante introdução, ele faz o ponto sobre as concepções e os estudos sobre o imaginário e propõe uma nova classificação das imagens que, até então, tinham estado classificadas segundo os seguintes vetores:

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G. Durand, “A saída do século XX", A liberdade do espírito, n. 12, junho 1986, p. 72. Ibid, p. 73.

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1) grandes epifanias cosmológicas (símbolos celestes, ter­ restres), utilizados pelos historiadores das religiões, como Krappe ou Eliade; 2) os quatro elementos (Bachelard); 3) motivações sociológicas e filológicas dos sistemas sim­ bólicos (Dumézil, Piganiol). Antes de passar às duas outras concepções que ele percebe, Gilbert Durand observa: Todas essas classificações nos parecem pecar por um positivismo objetivo que tenta motivar os símbolos unicamente por meio da ajuda de dados extrínsecos à consciência imaginante e [...] não dão conta dessa força fundamental dos símbolos que é de se ligar, para além das contradições naturais, dos elementos inconciliáveis, das barreiras sociais e das segregações dos períodos da história. Parece então que se deva procurar as categorias motivantes dos símbolos nos comportamentos elemen­ tares do psiquismo humano29. 4 e 5) As duas outras classificações, a psicanálise freudiana e a psicologia das profundezas junguiana, concebem o símbolo intrinsecamente à consciência imaginante; mas Gilbert Durand critica a psicanálise freudiana por conceber o símbolo como fruto do recalque e de classificar os símbolos “segundo o esquema da bissexualidade humana” (a psicanálise adleriana os classificará segundo o esquema da agressividade); e ele toma distância também da psicologia junguiana das profundezas (da qual ele é mais pró­ ximo), sobretudo no que concerne à hereditariedade dos símbolos . De fato, Gilbert Durand vai se colocar em uma perspectiva antropológica globalizante: a antropologia concebida como o “conjunto de ciências que estudam a espécie homo sapiens “ (p. 37). E, para isso, ele parte dos estudos da escola de reflexologia de Leningrado para determinar a influência dos reflexos dominantes na constituição do imaginário humano, mas sublinha bem que as imagens não vêm prontas e transmitidas pela heredi­ tariedade; muito pelo contrário, é pela interação desses reflexos 29

As citações são feitas a partir da 11. ed.: Paris: Dunod, 1992.

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e das pulsòes às quais eles sào ligados com o meio material e social que as imagens se formam. Tal interação é o que ele chama de trajeto antropológico, noçào capital no universo durandiano: [...] precisamos nos colocar deliberadamente no que cha­ mamos o trajeto antropológico, quero dizer, a incessante troca que existe ao nível do imaginário entre as pulsòes subjetivas e assimiladoras e as intimações objetivas ema­ nadas do meio cósmico e social. Essa posiçào afastará de nossa pesquisa os problemas de anterioridade ontológica, pois postularemos de uma vez por todas que há um a gênese recíproca que oscila do gesto pulsional ao meio ambiente material e social, e vice-versa. E nesse intervalo, neste caminhamento reversível30 que se deve instalar a investigação antropológica. Finalmente, o imaginário não é nada mais do que esse trajeto no qual a representação do objeto se deixa assimilar e modelar pelos imperativos pulsionais do sujeito, e no qual reciprocamente - como o mostrou magistralmente Piaget - as representações subjetivas se explicam “pelas acomodações anteriores do sujeito” ao meio objetivo (p. 38). Assim, como bem vemos nessa longa citação, o esforço classificador de Gilbert Durand é realmente globalizante no sentido de que ele faz nascer o imaginário na confluência do subjetivo e do objetivo, do mundo pessoal e do meio cósmico ambiente. Para conseguir apreender esse trajeto antropológico, ele vai partir dos reflexos dominantes a fim de sistematizar “esta gênese recíproca do gesto e do meio ambiente, cujo símbolo é o foco”31. Os três reflexos dominantes (de posição, de nutrição e copulativo) se prolongam em schemes. Um scheme “é uma generalização dinâmica e afetiva da imagem, ele constitui a facultatividade e a não substantividade geral do imaginário”. Nossos reflexos dominantes são então: [...] há uma grande estabilidade nas representações con­ cretas precisas; assim, ao gesto postural correspondem dois schemes: aquele da verticalização ascendente e 30 31

Destacado por mim, p. 39. Destacado por mim.

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aquele da divisão tanto visual quanto manual; ao gesto do “engolimento” correspondem o scheme da descida e aquele do aconchego na intimidade (p. 61). Ao gesto copulativo corresponde o scheme cíclico. Mas os schemes, enquanto que “dinamismos”, são ainda, poderiamos dizer, abstrações, eles ainda não são imagens. Por isso, vão se “substantificar” em arquétipos que são símbolos fundamentais e muito estáveis além das culturas: [...] há uma grande estabilidade dos arquétipos. É assim que aos schemes da ascensão correspondem invariavel­ mente os arquétipos do topo, do chefe, da luminária, enquanto que os schemes diairéticos se substantificam em constantes arquetipais tal como o gládio, o ritual de batismo etc., o scheme da descida dará o arquétipo do oco, da noite, do “Gulliver” etc., e o scheme do aconchego provocará todos os arquétipos do colo e da intimidade. O que diferencia precisamente o arquétipo do simples símbolo é, geralmente, sua falta de ambiva­ lência, sua universalidade constante e sua adequação ao scheme: a roda, por exemplo, é o grande arquétipo do scheme cíclico, pois não vemos qual outra significação imaginária poderiamos lhe dar, enquanto que a serpente é apenas o símbolo do ciclo, símbolo bem polivalente como veremos (p. 63). Os símbolos no sentido estrito são especificações culturais dos arquétipos: a flecha ou o avião são símbolos culturalmente determinados que dependem do scheme ascensional e do arqué­ tipo do céu, que ficam invariáveis e não dependem das culturas. O mito, Gilbert Durand vai defini-lo como [...] um sistema dinâmico de símbolos, de arquétipos e de schemes, sistema dinâmico que, sob a impulsão de um scheme, tende a se compor em relato, (p. 64) Vemos então que o scheme vai dar coerência e sentido a esse relato. Deve-se ainda notar que, nos relatos que colocam em obra um imaginário, mitos ou simples relatos “laicos”,

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[há] protocolos normativos das representações imagi­ nárias. bem definidos e relativamente estáveis, agrupa­ dos em tomo de schemes originais e que chamaremos estruturas, (p. 65) Notaremos novamente a importância dos schemes com ve­ tores da significação. Essas estruturas “figurativas” e dinâmicas (Gilbert Durand insiste nisso) se organizam, por sua vez, em outros protocolos, mais largos, os régimes da imagem: [uma estrutura é] uma forma transformável, desempe­ nhando o papel de protocolo motivador para todo um agrupamento de imagens, e susceptível ela mesma de agrupamento em uma estrutura mais geral que nomea­ remos regime, (p. 66)

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Em As estruturas antropológicas do imaginário. Gilbert Durand considerava dois regimes, o diurno e o noturno. O regime diurno corresponde às imagens provocadas a partir da dominante postural e de seus schemes, e o regime noturno às imagens provo­ cadas pela dominante da nutrição e seus schemes, também como pela dominante copulativa e seu scheme cíclico. As estruturas do regime diurno são de tipo esquizomorfo (separação, geometrização etc.) e as estruturas do regime noturno são de dois tipos: as estruturas “místicas”, que recolhem as imagens da intimidade, e as estruturas sintéticas, que reúnem as imagens do ciclo em vários níveis. E esta a classificação que Gilbert Durand dá nessa primeira e fundamental obra (As estruturas antropológicas do imaginário); mais tarde, ele individualizará também as estruturas sintéticas como um regime autônomo, e se questionará sobre a pertinência da denominação de “sintéticos”, além de ficar em dúvida entre “disseminatórios”, “diacrônicos” ou “dramáticos”. Gilbert Durand sempre foi muito atento às ciências humanas como também às ciências “exatas”, e mesmo às relações entre os dois tipos de ciências. Ele se preocupará, por exemplo, com os fundamentos fisiológicos do cérebro e de suas consequências na criação de imagens, mas ele sempre insistirá sobre a noção fundamental de “trajeto antropológico” como “lugar” de criação das imagens. Uma das manifestações desse trajeto antropológico já constituía sua hipótese de trabalho em livro primordial:

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[...] tomemos como hipótese de trabalho que existe uma estreita concomitância entre os gestos do corpo, os centros nervosos e as representações simbólicas (p. 51). “Representações” simbólicas que, elas, por seu lado de de­ pendência do contexto exterior, vão se ligar e “exigir” matérias e representações técnicas específicas: É assim que o primeiro gesto, a dominante postural, exige as matérias luminosas, visuais e as técnicas de separação, de purificação, das quais as armas, as fle­ chas, os gládios são os símbolos frequentes. O segundo gesto, ligado à descida digestiva, chama as matérias da profundeza: a água ou a terra cavernosa suscita os utensílios continentes, as taças e os cofres, e inclina aos devaneios técnicos da bebida ou do alimento. Enfim, os gestos rítmicos - em que a sexualidade é o modelo natural completo - projetam-se sobre os ritmos das estações e seu cortejo astral anexando todos os substitutos técnicos do ciclo: a roda como o “rouet”, a batedeira como o isqueiro, e finalmente, sobre deter­ minam todo “esfregamento” tecnológico pela rítmica sexual. Nossa classificação tripartida concorda então, entre outros, com uma classificação tecnológica que discerne os utensílios perculantes e contundentes de uma parte, os conteúdos e os recipientes ligados às técnicas do escavamento de outra parte, enfim, os grandes prolongamentos técnicos desse utensílio tão precioso que é a roda: os meios de transporte assim como as indústrias do têxtil ou do fogo. (p. 55) No universo durandiano, e não somente em As estruturas, as imagens são simbólicas, isto é, têm um semantismo próprio. Nisso elas se distinguem dos signos semiológicos, que são arbitrários. As imagens simbólicas não são arbitrárias, elas transportam um semantismo próprio que lhes é dado pelo trajeto antropológico no qual elas se criaram. E essas imagens fundamentais, que são os arquétipos (“genotípicos” ao contrário dos símbolos no senso estrito que são “fenótipos”, ele dirá32), são, por causa 32

Cf. “A saída do século XXB, op. cit., p. 83.

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desse semantismo estável que vimos, o ponto de junção entre o imaginário e os processos racionais. A classificação do imaginário assim obtida mostra que ele funciona como uma espécie de organismo percorrido por um dinamismo. Por exemplo, o que Gilbert Durand fala de dois ti­ pos de heróis para o regime diurno (herói solar) e para o regime noturno (herói sacrificial, filho mediador), o percurso de vários heróis parece mostrar que há uma lógica dinâmica entre os três regimes do imaginário (individualizamos também as estruturas sintéticas em regime). No início, o jovem herói deve sair da in­ timidade original acolhedora e lutar para fazer sua diérese, sua separação, e conquistar um espaço para sua identidade; depois disso, ele está pronto para viver a intimidade mística de maneira positiva e não mais devoradora, o que o leva a uma conjunctio oppositoruni feliz, que o regime sintético “governa”. Isto mostra a importância da classificação proposta em As estruturas e sua vocação natural a ser aplicada a relatos, sejam eles literários ou sociológicos. E o que Gilbert Durand fará com os conceitos de mitocrítica e de mitanálise, o primeiro aplicado na análise dos textos literários ou artísticos em geral e, o segundo, na análise dos mitos que governam as sociedades. A esses dois termos. Gilbert Durand adicionou ainda o de mitodologia, para designar o método próprio ao estudo do imaginário. Em dois textos incluídos na antologia Champs de rimaginaire e intitulados “Método arquetipológico: da mitocrí­ tica à mitanálise”33 e “Pas à pas la mythocritique”34, Durand dá uma das melhores explicações dessas duas disciplinas que criou. De uma maneira geral, podemos dizer que a mitocrítica e a mitanálise pretendem descobrir nos textos e nas sociedades quais são os mitos que os subtendem. Fortemente inspirado por Charles Mauron, no caso da mitocrítica, e de seu livro “Des métaphores obsédantes au mythe personnel”35, Gilbert Durand considera que: O mito seria de alguma maneira o “modelo” matricial de todo relato, estruturado pelos schemes e arquétipos fundamentais da psique do sapiens sapiens, a nossa. 33 34 35

p. 133-56. p. 229-42. Paris, Corti: 1963.

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Deve-se entào procurar qual - ou quais - mito mais ou menos explícito (ou latente!) anima a expressão de uma “linguagem” segunda, não mítica. Por quê? Porque uma obra, um autor, uma época - ou ao menos um “momento” de uma época é “obcecado” (Ch. Mauron) de maneira explícita ou implícita por um (ou vários) mito(s) que dá conta de maneira paradigmática de suas aspirações, seus desejos, seus medos, seus terrores [...]36. Vemos que com esse conceito de obsessão entramos em uma característica fundamental do discurso mítico: sua repetição, sua redundância. O método, para descobrir os mitos que subtendem um texto, deve, antes de tudo, levar em conta a redundância dos elementos, pois nenhum elemento é imaginariamente pertinente se ele não for repetido diretamente ou indiretamente por meio de outros elementos de valor simbólico equivalente. Esses elementos, que constituem uma espécie de sincronia na diacronia do relato, devem ser interpretados, não somente para identificar e nomear o mito subjacente, o que é geralmente difícil, mas também para revelar as tensões que, no seio da obra, colocam em relação estru­ turas de níveis diversos. Para isso, deve-se analisar as situações e as “combinatórias de situação dos personagens e dos cenários”37. Gilbert Durand, imediatamente depois de suas Estrutu­ ras, publicou um livro, Le décor mythique de 'La Chartreuse de Parme', no qual ilustra, por meio dessa obra de Stendhal, o funcionamento do imaginário que ele acabava de classificar em sua obra precedente. Trinta anos depois, no artigo sobre a mitocrítica que acabamos de citar (“Pas à pas la mythocritique”), ele dá um exemplo da tensão das estruturas tirado da Chartreuse: Por exemplo, no autor de Le Rouge et le Noir, o suporte místico do cenário, tem dificuldade a se impor face ao suporte heroico em que se situa primeiro o herói saído do imaginário [...] de Henri Beyle. (p. 237). Além desse livro sobre a Chartreuse, Gilbert Durand prati­ cou a mitocrítica em vários livros e artigos, em que um, “Lucien 36 37

‘Pas à pas la mythocritique", p. 230. "Méthodologie, mythocritique et mythanalyse", in: Figures mythiques..., p. 307-22.

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Leuxven ou 1'héroisme â 1'envers” (retomado em Figures mythiques et visages de rceuvre) é mais importante que conhecido sua importância advinda do fato de Durand mostrar que Lucien Leuwen estava condenado a não triunfar, pois ele tinha começado mal sua carreira militar do ponto de vista simbólico. De fato, por causa de sua riqueza, ele não tinha seguido as etapas de formação necessárias, e os símbolos precursores de sua falên­ cia se acumulam, a começar pela queda inicial da chegada em Nancv. o que mostra a dinâmica do imaginário da qual falamos há pouco, dinâmica que deve seguir um percurso arquetipológico determinado e não arbitrário: Quando um romance falha, não é porque ele contradisse normas literárias, mas porque ele atenta aos conteúdos arquetipais e à ordem mítica do heroísmo, (in: Figures mythiques..., p. 176) O estudo das redundâncias no nível das sociedades permitiu a Gilbert Durand mostrar em vários textos de mitanálise que um mito que governa uma época se prepara para um apogeu e entra em declínio em fatias temporais estáveis independentemente das culturas e das épocas. A mitocrítica se exerce sobre uma obra ou a obra de um autor, a mitanálise sobre um terreno mais vasto. E aqui é importante a noção de “bacia semântica” e de “trend”. Damos de novo a palavra a Gilbert Durand: Por outro lado, nos pareceu que - cronologicamente - mudanças significativas se produziam segundo uma fasagem próxima do que os economistas chamam de um trend secular [...] trend cujos começos [...] se fazem de maneira latente, ocultada pelos lentos “escorrimentos” e cuja “explosão” dinâmica se situa nas décadas de 6070 de cada século calendário. Como se de repente uma motivação “exlrínseca” (Nisbet) viesse dinamizar uma lenta maturação intrínseca. Esse trend é bem posto em evidência pelas sociologias descritivas das “histórias de vida” (F. Ferraroli, M. Catani, D. Berteaux etc.), repousando sobre o “diz que mc disse e o boca a boca”, e parece constituído por três, a três e meio (se fazemos intervir os “relatos do pai/mãe dos avós retransmitidos por esse último” gerações consecutivas de 25 a 30 anos

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cada uma. Isso é, a exaustão do “diz que me disse”, to­ dos os noventa a cento e dez anos - acompanhado bem entendido em seu apex de reinjeção, de informação e de eventos extrínsecos que “marcam” uma época - se manifestam por uma mudança mais ou menos acentuada (“Méthode archétypologique...”, p. 150-1). Como uma sociedade guarda a memória de seu próprio passado, e que seus trends são memorizados pela cultura em questão, ela poderá reempregá-Ios caso o imaginário seja limitado, como diz Gilbert Durand, a várias retomadas, das quais uma me parece bastante lapidária: A universalidade do imaginário se paga por sua limita­ ção38. [E] esta estocagem obrigatoriamente limitada que explica a redundância de barroquismos, classicismos, romantismos, decadentismos etc. (p. 230). Pois, [...] estes reempregam [...] cavam em um conjunto sociocultural o que havíamos chamado de “bacia semântica”, identificados pelos regimes imaginários específicos e mitos privilegiados. A formação dessas “bacias” segue um processo [...], do qual caracterizamos as seis etapas (cronologicamente irregulares) por outras metáforas potamológicas: escorrimento, divisão das águas, confluências, nome do rio, reabilitação das margens (con­ ceituais ou ideológicas) e, enfim, declínio: meandros e deltas... (p. 152). Vemos a riqueza do método durandiano que soube utilizar sua classificação do imaginário para ajudar a compreensão dos textos e das sociedades. Esse método foi utilizado até agora por vários colegas e discípulos de Gilbert Durand em escala interna­ cional. O Centro de Pesquisas sobre o Imaginário, que ele criou em 1966 com Léon Cellier e Paul Deschamps em Grenoble/ Chambery, irradiou-se no mundo e foi o modelo de muitos outros.

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“Pas à pas Ia mythocritique”, p. 239.

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Os trabalhos de Gilbert Durand e de seus discípulos se­ guiram o postulado segundo o qual a análise das obras de arte (literárias ou outras) se prolonga naturalmente pela análise dos mitos que governam as sociedades e, mais ainda, que a análise das obras de arte ou mitocrítica é. de algum modo, primeira em relação a essa das sociedades, porque ela nos informa sobre os autores e as sociedades:

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Desde então, metodologicamente, toda mitanálise deverá começar pelo exame mitocrítico o mais exaustivo das “obras” - ou dos “bens” - de uma época ou de uma cul­ tura dada. Pinturas, esculturas, monumentos, ideologias, códigos jurídicos, rituais religiosos, modos, vestimentas e cosméticos - em uma palavra, todo o conteúdo do inventário antropológico - são igualitariamente convi­ dados a nos informar sobre tal ou tal momento da alma individual ou coletiva. Heróis e deuses se erigem então como paradigmas verdadeiramente “compreensivos” do objeto humano particular estudado39. Os resultados obtidos pelos trabalhos de Gilbert Durand e de seus numerosos discípulos mostram o bem-fundado de suas concepções. Na obra de Durand, um outro aspecto importante, e que já mencionamos, é a teorização de uma antropologia que coloque como objetivo o estudo do homem corno produtor de imagens, o qual não pode pensar nem criar sem passar pelas imagens. Conhecer as imagens que estruturam o homem é conhecer as imagens que estruturam todas as suas obras, mesmo as obras científicas, e sabemos toda a importância que Gilbert Durand sempre deu às ciências ditas exatas e à confrontação de conceitos tirados desses dois campos. Um topo desse “diálogo” foi, sem dúvida, o famoso Colóquio de Córdoba sobre ciência e consci­ ência, no qual as ciências exatas e as humanas puderam chegar a um diálogo sobre seus pontos comuns. Na sequência de suas preocupações com essa antropologia globalizante, “fundada” na imagem, Gilbert Durand, várias ve­ zes, criticou o iconoclasmo ocidental em que a imagem perde 39

“Le XXo siecle et le retour d’Hermes", in Figures mythiques..., p. 243-306.

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seu valor em detrimento do conceito, e no qual ele sublinha dois momentos fundamentais: a adoção, no século XIII, pelo pensa­ mento ocidental, do aristotelismo que supõe a possibilidade de um conhecimento “direto”, sem imagem, e o cartesianismo, a partir do qual o imaginário foi desvalorizado até nossos dias, com uma revalorização no momento do romantismo. Nesse caminho, também se insere seu interesse pelo estudo da tradição, por um lado, porque ela é um reservatório de imagens, nomeadamente imagens arquetipais que mostram a consistência do imaginário e seus sincronismos além dos tempos e das culturas, e, por outro lado, porque ela contém de maneira privilegiada as grandes ima­ gens de ligamento do homem ao cosmos e a Deus. Essas imagens de ligação às formas de totalidade são, em nível religioso, o que o estudo antropológico do imaginário em geral nos fez entender atualmente sobre as imagens, isto é, que elas têm uma função “angelológica”, são mediadoras por excelência. Também, o fato de que não há pensamento sem imagem nos convida a entender as imagens que estão em construção em nós e em nossas obras, mesmo científicas, para nos entendermos a nós mesmos, assim como o que fazemos. Porque o que nós fazemos - e Gilbert Durand se insere em uma “tradição” atual (da qual a psicanálise) - depende do que somos, o sujeito e o objeto se encontram nas imagens mediadoras. A ligação ao cosmos e a Deus, que a tradi­ ção nos mostra por meio das imagens arquetipais fundamentais, é também “imagem”, digamos, da relação de um sujeito com um objeto, do homem ao cosmos, que se faz por mediação de imagens, tanto na tradição como hoje. Seus estudos sobre o imaginário, Gilbert Durand os colocou desde o início sob o signo de um “estruturalismo figurativo”, mostrando por aí que eles se inseriam nas pesquisas contempo­ râneas que valorizavam as sincronias da estrutura, pois elas se adaptavam bem aos estudos das invariantes arquetipológicas de que ele e seus discípulos demonstraram brilhantemente a exis­ tência e que eles mostraram em ação nos textos e nas culturas em lugares e tempos bem diversos. Em todas essas culturas e esses textos, Gilbert Durand apresentou não somente as invariantes estáticas, mas também o movimento dinâmico que a discursificação ou a dramatização dessas invariantes cria nos textos e nas sociedades. A discursificaçao ou dramatização de base é o mito, como já vimos (daí o interesse, lembremos, da identificação dos

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mitos que subentendem os diversos discursos), mas o que nos interessa agora é que o mito e os outros discursos (artísticos, sociais, etc.) funcionam segundo um modo “politeísta”, isto é, segundo um modo em que os opostos ficam em tensão sem que qualquer um seja anulado; a síntese, se esta palavra é possível nesse caso. é realizada pela mediação das imagens que, como os anjos, são mediadoras por natureza. Da mesma maneira que o sujeito e o objeto, o homem e o mundo, as ciências humanas e as ciências exatas são colocadas em relação pelo imaginário simbólico - Gilbert Durand insiste frequentemente sobre isso. Assim, todo o modo “humano’’ de funcionamento repousa so­ bre o equilíbrio dos opostos, nomeadamente do regime diurno da separação e da ascensão e do regime noturno da intimidade mística (o terceiro regime ou as estruturas sintéticas, disseminatórios ou dramáticos, como Gilbert Durand os chamou em momentos diversos, sendo já uma colocação em relação, uma "dramatização’’ dos dois outros, e é ele, o terceiro regime, que segura a lógica contraditorial). Esse caráter contraditorial do imaginário deve ser respeitado para que haja saúde psicológica e social. Quando há uma excessiva valorização de um regime em detrimento do outro, a neurose acontece, seja pessoal, seja social. Por exemplo, se a valorização se direciona para as ima­ gens diurnas, o resultado é uma psique e um pensamento de tipo esquizomorfo, o que é e foi frequentemente o caso em nossa civilização ocidental. Essa lógica contraditorial do terceiro não excluído (terceiro que pòe os dois outros em relação por meio de sua capacidade de mediação) foi reiteradamente posta em relevo por Durand e por seus discípulos como uma das características fundamentais do imaginário. Vemos, assim, no termo desse percurso na obra de Gilbert Durand, que a maneira pela qual ele renovou os estudos sobre o imaginário mostrou que este é um organismo vivo e limitado, como todo organismo que se deixa classificar de uma maneira globalizante se levamos em conta o trajeto antropológico, verdadeira pedra de toque do edifício durandiano. E, à classificação, ele acrescentou o estudo de seu dinamismo não somente em suas manifestações religiosas habituais, mas também estendendo o estudo do dina­ mismo imaginário a todas as obras do homem, integrando a história e seus filósofos, que são uma manifestação da estrutura sintética, verdadeira “estrutura historiaria do imaginário”.

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Já assinalamos o quanto as filosofias da história se situam no prolongamento de todo devaneio ciclóide e rítmico. Historiadores do progresso, como Hegel e Marx, histo­ riadores do declínio, como Spengler, procedem todos da mesma maneira - que consiste, ao mesmo tempo, em repetir as fases temporais constituindo um ciclo, e ao mesmo tempo contrastando dialeticamente as fases do ciclo assim constituído. (STRUCTURES, p. 406). Assim, a história é subentendida por uma estrutura imagi­ nária, como toda atividade humana. Não há lugar, pois, para o historicismo imperializante, etnocêntrico e colonizador além do mais. O progresso técnico que o Ocidente valoriza mais do que qualquer coisa e que se transformou no paradigma de todo aper­ feiçoamento não deve fazer esquecer que a “estrutura historiana do imaginário” não pode dominar de maneira hegemônica nem as outras estruturas do imaginário - imaginário que funciona, relembremos, em uma lógica “politeísta”, contraditorial e des­ centralizada nem as invariantes criando as sincronicidades que as culturas tradicionais e a Tradição valorizaram. A obra de Gilbert Durand, percebemos, participa realmente da criação desta antropologia globalizante que ele anunciava já no início de seus estudos. Bibliografia Obras principais de Gilbert Durand Les structures anthropologiques de lTmaginaire. Paris: Dunod, 1960 (11 e ed. Dunod 1992); Le décor Mythique de la Chartreuse de Parme: contribution à 1'esthétique du romanesque. Paris: Corti, 1961; Science de 1'homme et tradition: le nouvel esprit anthropologique. Paris: Albin Michel 1975; L’imagination symbolique. Paris: PUF, 1964; L'âme tigrée. Paris : Denoél-Gonthier, 1980; Figures mythiques et visages de 1'ceuvre: de la mythocritique à la mythanalyse; Paris: Berg International, 1979; La Foi du cordonnier. Paris: Denoêl, 1984; L'imaginaire. Paris: Hatier, 1994;

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