OS CAMINHOS DA IGREJA Heber Ramos Bertucci INTRODUÇÃO 1. A Igreja moderna vive dilemas que são frutos de uma era de reconhecida ignorância Bíblica e ênfase em movimentos de curta duração, mas capazes de retirar várias pessoas de denominações sérias. Por isso, proponho-me a redigir esta “Carta Exortativa” visando não apenas uma Igreja em particular, mas a irmãos em Cristo no geral. O tema escolhido será “Os Caminhos da Igreja” onde tentaremos nortear a Igreja em uma séria e frutífera cosmovisão cristã. I – O PROBLEMA DETECTADO 2. Desde a entrada do pecado no mundo (c. Gn. 3) a humanidade nunca mais foi a mesma. A sua natureza foi corrompida e as tentações são freqüentes especialmente no meio dos crentes. Pedro já dizia inspirado pelo Espírito Santo: “Sede sóbrios e vigilantes. O diabo, vosso adversário, anda em derredor, como leão que ruge procurando alguém para devorar”. (I Pe. 5:8). A tentação resistida produz perseverança (c. Tg. 1: 1-3), mas a não resistida gera um desnorteamento espiritual que vem acompanhado de uma sensação de vazio porque nos faz sair dos caminhos de Deus. O escritor James Packer diz: “Para aqueles que não conhecem a Deus o mundo se torna um lugar estranho, louco, penoso, e viver nele algo de decepcionante e desagradável.” 1 Para que não caiamos no erro de nos esquecermos de Deus, nós precisamos, a priori, saber e praticar os caminhos da Igreja que apontaremos a seguir.
ensinos de seu tempo exclusivamente com o ensino das Escrituras. 2 Agostinho de Hipona escreveu: “’Dediquemo-nos a alimentar-nos e a beber no estudo e na aplicação às divinas Escrituras!’” 3 Hagglund afirma que “A teologia de Lutero é teologia da Palavra.” 4 Lutero fala da comparação que Bernardo de Claraval (c.: 1090-1153) faz da Escritura: ela é como uma fonte que os cristãos devem sempre beber: “[Claraval] prefere beber da própria fonte do que do regato, como fazem todas as pessoas; quando podem beber da fonte, esquecem o regato, embora se tenha utilizado dele para chegar à fonte.” 5 E a conclusão de Lutero não poderia ser outra: “Assim também a Escritura deve continuar sendo mestre e juiz, ou então, quando se segue demais aos regatos, eles nos levam para longe demais da fonte e perdem tanto o gosto como a força, até que desembocam e se perdem no mar salgado, como aconteceu sob o papado.” 6 4. João Calvino também sempre valorizou as Escrituras: “Sua opinião era que a Bíblia é reconhecida como a Palavra de Deus, não por deduções lógicas ou por observações e testes experimentais, mas porque o Espírito Santo testifica ao crente que ela é a Palavra de Deus.” 7 Para Calvino, “... para que nos fulja a verdadeira religião, tem-se de assim haver: que da celeste doutrina deva [ela] ter o ponto de partida, nem pode alguém provar sequer o mais leve gosto da reta e sã doutrina, a não ser [aquele] que se haja feito discípulo da Escritura.” 8 Esse testemunho de Calvino e os outros acima sobre a Escritura nos são importantes porque nos fazem tê-la como elemento sine qua non de nossa fé, isto é, ela é indispensável para nossa vida cristã. III – A TRADIÇÃO DA IGREJA
II – A ESCRITURA SAGRADA 3. A mensagem bíblica é norteadora. Se assim não fosse, o salmista não diria: “Lâmpada para os meus pés é a tua palavra e, luz para os meus caminhos.” (Sl. 119:105). A Palavra de Deus norteou pessoas no passado e pode também nortear a nossa vida hoje com sua mensagem sempre atual. Devemos aprender com os homens de Deus do passado que valorizavam a mensagem Bíblia. Por exemplo, Ireneu de Lion (130 – 200) gostava de refutar os falsos
2
Cf.: Roque FRANGIOTTI, História da teologia: período patrístico, p. 25.
3
AGOSTINHO. Apud Franklin FERREIRA, Agostinho de A a Z, p. 96.
4
Bengt HAGGLUND, História da Teologia, p. 187.
5
LUTERO, Martinho. Dos concílios e da Igreja. In: Ilson KAYSER (Ed.). v. 3 (Debates e Controvérsias, I), p. 312 – 313.
6
Ibid., p. 312 – 313.
7
W. Stanford REID. A propagação do Calvinismo no século XVI. In: _____. (Ed.), Calvino e sua influência no mundo ocidental, p. 47 – 48.
1
James I. PACKER, O conhecimento de Deus, p. 11.
8
João CALVINO. As Institutas ou Tratado da religião cristã. Livro I, p. 86.
5. A Igreja também se norteia por sua tradição. Na realidade, o termo tradição é muito criticado nas Igrejas Protestantes por causa de sua associação com a Igreja Católica Romana. Entretanto, quando uso o termo tradição, refiro-me aos ensinamentos que herdamos da Reforma Protestante do séc. XVI. A Igreja deve se atentar a eles com o fim de se nortear por eles. Mas porque essa tradição é importante? A resposta só virá com a correta definição do termo tradição e qual o seu papel em nossas vidas. 6. Nossa palavra portuguesa “tradição” vem do termo latino “traditio” que tem o sentido de “... ‘transmissão’, tanto o repasse oral daqueles que vieram antes quanto a disseminação escrita.” 9 O termo grego correspondente para tradição é parádosis que é composto de duas palavras: “pará” - “ao lado de” ou “junto a”, e “dídomi” - “trazer, conceber, causar, colocar, permitir”. 10 Sendo assim, o termo parádosis tem o sentido de “trazer para o lado” e indica um corpo de ensinos que vai sendo colocado um ao lado do outro no decorrer de gerações. 11 7. Esta definição de tradição nos faz observar qual é o seu papel em nossas vidas: nortear nosso caminho em direção a Deus. Mas para que isso aconteça, essas tradições devem estar de acordo com a Bíblia Sagrada, pois esse é o conceito reformado de “Tradição da Igreja” que Packer resume de forma fantástica quando afirma: “A questão não é se temos tradições, mas se nossas tradições estão em conflito com o único padrão absoluto nessas questões: as Escrituras Sagradas.” 12 8. Quais são então as nossas “tradições reformadas”? A Constituição de nossa Igreja Presbiteriana do Brasil diz que nós adotamos “... como sistema ex-
positivo de doutrina e prática a sua Confissão de Fé [Westminster] e os Catecismos Maior e Breve”. 13 A Confissão de Westminster, concluída em 1648, foi um credo calvinista puritano que foi preparado por 131 pastores e trinta leigos na capela de Westminster, em Londres. É a última das confissões reformadas clássicas. 14 Além disso, ainda temos como tradição os escritos de João Calvino (1509-1564); a Confissão Belga (1561) que foi escrita por Guido de Brès, um pregador nas igrejas reformadas da Bélgica, como sumário das crenças dos cristãos reformados que estavam sendo perseguidos pelo governo católico-romano; o Catecismo de Heidelberg (1563) que foi escrito a pedido de Frederick, o Terceiro, Eleitor da Alemanha Palatina, por Zacharias Ursinus, um professor da Universidade de Heidelberg, e Caspar Olevianus, o pregador da corte, e ficou conhecido como o mais pastoral e pessoal dos credos da Reforma; 15 e outros. 9. A Igreja deve não somente saber da existência desses Credos e Confissões, mas deve também procurar lê-los. Os líderes devem ensiná-los para que os crentes saibam no que devem crer. É claro que não conseguiremos decorar tudo que neles contêm, mas pelo menos as idéias centrais devemos guardar para que elas norteiem a nossa vida diante de Deus e dos homens. O apóstolo Pedro já dizia: “santificai a Cristo, como Senhor, em vosso coração, estando sempre preparados para responder a todo aquele que vos pedir razão da esperança que há em vós”. (I Pe. 3:15). CONCLUSÃO 10. Como devemos então viver nesta época tão conturbada pelo relativismo? Que caminhos devemos seguir para que nossa vida tenha norte? Devemos seguir a Escritura Sagrada e a sua fiel exposição que é a Tradição da Igreja Reformada. Deus nos abençoe e ajude a viver assim!
9
Tradição, Tradição dos Anciãos. In: Russel N. CHAMPLIN. teologia e filosofia. Vol. 6 (S - Z), 2002. p. 464.
Enciclopédia de Bíblia
Dado em Jandira, na Igreja Presbiteriana JMC, no dia 27 de setembro – Escola Bíblica Dominical – do ano 2009, ano de minha licenciatura.
10
Cf.: para; di,dwmi. In: F. Wilbur GINGRICH; Frederick W DANKER, Léxico do Novo Testamento grego/português, p. 155; 56.
11
Cf.: Alister E. MCGRATH, Teologia sistemática, histórica e filosófica: uma introdução à teologia cristã, p. 49.
13
CI/IPB, Cap. I, Art. 1.
12
14
Cf. Anthony HOEKEMA, Salvos pela graça: a doutrina bíblica da salvação, p. 170 – 171.
15
Cf.: Ibid., p. 170 – 171.
J. I. PACKER. O conforto do conservadorismo. In: Michael S. HORTON, Religião de poder: a igreja sem fidelidade bíblica e sem credibilidade no mundo, p. 234.