O_funding..

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O FUNDING LOAN E A POLÍTICA DE SANEAMENTO FINANCEIRO Desde os finais do período imperial, a economia cafeeira apresentava sinais de crise, crise de superprodução do café. Esta crise se refletia na arrecadação do governo, visto que, durante a Primeira República, basicamente a única fonte de arrecadação do governo eram os impostos cobrados sobre as exportações dos produtos. Com a crise de superprodução, diminui a arrecadação do governo, criando dificuldades para o pagamento da dívida externa que vinha crescendo desde a independência. Acrescenta-se a isso a excessiva emissão de moeda dos primeiros anos da república, estabelecido pelo encilhamento, agravada pelos déficits crônicos na receita governamental, que acabou por impulsionar a inflação. De acordo com Vicentino (1998), o presidente Campos Sales, em 1898, estabeleceu um acordo com banqueiros internacionais objetivando renegociar a dívida externa, o chamado funding-loan, entre outras coisas, estabelecia: * a concessão de um empréstimo no valor de 10 milhões de libras esterlinas, a ser utilizado para o pagamento dos juros da dívida externa brasileira nos três anos seguintes; * a concessão de um prazo de dez anos, além dos três iniciais, ou seja, a partir de 1911, para que se iniciasse o pagamento da nova dívida; * a penhora, a título de garantia para com os bancos credores, de toda a receita da alfândega do Rio de Janeiro, além de, em caso de necessidade, outras alfândegas, das receitas da Estrada de Ferro Central do Brasil e até do serviço de abastecimento de água do Rio de Janeiro; * a obrigação assumida perante os bancos de sanear a moeda brasileira, isto é, fortalecê-la pelo combate à inflação, com o objetivo de estabilizar a economia do país. O Funding-Loan representou uma moratória, ou seja, em troca de uma suspensão temporária no pagamento da dívida externa, concordava-se no seu aumento e na ampliação dos prazos para pagá-la. A política de saneamento financeiro pressupunha o combate à inflação. O ministro da Fazenda, Joaquim Murtinho, do governo Campos Sales, foi responsável pelo saneamento financeiro, que consistia, num primeiro momento, no combate ao déficit público. O déficit público implica em uma situação na qual o governo gasta mais recursos do que arrecada na cobrança de impostos. Essa diferença é compensada pela tomada de empréstimos do exterior, aumentando o endividamento externo, paralelo a emissão de papel moeda (como a moeda estrangeira vale mais do que a nacional, o governo sempre emite mais moeda nacional do que recebe em moeda estrangeira). Outro mecanismo é a simples produção de papel-moeda, como ocorreu com o encilhamento. Como começa a circular mais dinheiro no mercado, sem que haja uma oferta correspondente de mercadorias e serviços, a moeda se desvaloriza. Ou seja, com mais dinheiro circulando no mercado, a procura por produtos cresce superando a oferta, o que, pela lei da oferta e procura provoca o aumento dos preços e, consequentemente, da inflação. Para combater, então, o déficit publico e a emissão de papel moeda que provoca inflação, Joaquim Murtinho realizou um corte radical nos gastos do governo, inclusive com a paralisação quase total das obras públicas e o desestímulo às indústrias. Além do corte dos investimentos, estabeleceu uma política de arrocho salarial, isto é, gradativa perda de poder de compra do salário (mecanismo realizado ao não se reajustar o salário ou fazê-lo com um índice menor que a inflação). Como o salário perdeu o valor real, o governo gasta menos no pagamento do funcionalismo público. Além do mais, ao se ganhar menos, se reduz o consumo, levando a uma sobra de produção, à queda do preço das mercadorias e, consequentemente, da inflação. “Ao mesmo tempo, o governo promoveu um aumento significativo na arrecadação de impostos, inclusive com a criação de novas taxas, dentre as quais destacaram-se as sobre o consumo, calçados, velas, fármacos, perfumes, vinagres e conservas, aumentando a arrecadação. Obteve-se assim o equilíbrio orçamentário, e o governo pôde reduzir drasticamente a emissão de papel-moeda, com resultados óbvios na queda da inflação. Na verdade, Joaquim Murtinho não apenas reduziu a emissão como começou a promover a eliminação física do papel-moeda, com a incineração de imensos lotes de dinheiro. Para completar a política de saneamento financeiro, o ministro alterou a taxa de câmbio, valorizando o mil-réis em relação à libra inglesa. Os resultados foram os esperados: a inflação caiu acentuadamente, passando de 115,1% em 1896 para -7,4% em 1900, uma efetiva deflação, mas seus desdobramentos sobre a economia nacional colocaram dúvidas sobre o sucesso do plano. A diminuição, em volume, do meio circulante levou à recessão econômica, com uma queda acentuada da atividade econômica em todo o país. A elevação indiscriminada dos impostos acabou por atingir todas as categorias sociais, principalmente os setores

mais humildes, que não tinham como se defender e, além disso, enfrentavam um desemprego cada vez maior, devido à recessão. A valorização cambial do mil-réis, por sua vez, acabou por baratear o preço dos produtos importados, em sua maioria industrializados, tornando difícil a sobrevivência da já fraca indústria nacional”. (...) (op. cit) As conseqüências da adoção desta política de combate à inflação “costumam ser catastróficas em países como o Brasil, pobres e com um péssimo perfil de distribuição de renda. Aceitar a recessão como forma de combater a inflação significou simplesmente provocar o empobrecimento dos mais pobres, isto é, o fome. A morte. Observe-se também que políticas de cunho monetarista continuaram a ser adota das indiscriminadamente no Brasil até recentemente. Deve-se reconhecer que a inflação tem efeitos perniciosos que afetam basicamente os setores mais pobres; no entanto, combatê-la através de um sacrifício justamente desses setores parece ter, no fundo, algo equivocado. No mínimo são os que arcam com os custos dos projetos saneadores como se já não fossem as vitimas do modelo antecessor, a matriz da crise. (...) Ao se abster de realizar reformas mais profundas na economia brasileira (que pudessem envolver, por exemplo, a distribuição de renda ou a eliminação do caráter dependente de nossa economia), a dupla Campos Sales-Joaquim Murtinho tornava quase inevitável o reaparecimento dos mesmos problemas num futuro nem tão distante. Para concluir, fica uma citação do ministro Joaquim Murtinho, que bem demonstra sua postura submissa a interesses externos e a mística daquilo que é privado, e de poucos, como se fosse nacional: "O emprego de capitais e operários em indústrias artificiais é um esbanjamento da fortuna nacional...". (ibdem) (Texto adaptado da obra: VICENTINO, Cláudio & DORIGO, Gianpaolo. História do Brasil. São Paulo, scipione, 1998, pág. 292-294)

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