Michael Jackson - Revista Veja

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Indice EDiÇÃO 21191 ANO421 N°26

TIRAGEM1284 778 EXEMPLARES

Panorama

121 Carta ao Leitor 191 Entrevista Leonardo Nascimentode Araújo 261 I.,a luft 351 Millôr 40 1leitor 561 Blogosfera Leonardo:

"Os clubes estão quebrados". PAG.19

581 Imagemda Semana 671 Holofote

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JJ ~ . ~

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Internacional

681 Datas

861Irã Mulhereslideram

70 1Radar 721 SobeDesce

901Acensuranainternet

osgritosporliberdade e comoosiranianos conseguiram burlá-Ia

721 Conversa

comJoel Santana

731 Números 761 Veja Essa

Geral 941Gente 961 PopA mortede

MichaelJackson

Brasil

1121EspecialDistúrbio

781 Senado Hora

deesvaziar aslixeiras 841 AraguaiaCurió

fronteiriço:a vida à beira do abismo 1221 Maílsonda Nóbrega 1241Saúde HPV:teste detectaa atividade do vírus

fala das execuções sumáriasde guerrilheiros

1281 O transplantede Steve Jobs,da Apple 130 Comportamento Vaidadeinfantil:spa aos 9 e Botoxaos 18 1401 Perfil JoséEdilbenes 1

Arthur Virgílio: "Ladrões!". PAG.76

EBONY

MAGAZINEIAP

.com . ALÉMDOSLIMITES

Professores de educaçãofísicadizem queexisteumabarreira físicae psicológica a servencidanoinício dequalqueratividade física:a barreira dostrêsmeses. Reportagem emvídeo explicacomoela funciona.Emwww.veja.

o GÊNIODO pop. CINEMA Trailerda animação A Era do Gelo3 ~'I;

M

ichael Jackson (1958-

2009) cresceu na frente das câmeras. Durante cinco décadas, o mundo aplaudiu sua genialidade, dançou seus passos, cantou seus hits, e depois se surpreendeu com seus escândalos e excentricidades. O site de VEJA traz a trajetória desse popstar, com destaque para:

. Cronologia: infância,sucessos,

.

casamentose filhos Fotos: JacksonFive,Neverland,

augee decadência

. Repercussão: músicos,críticose fãs lamentama perda . Capasde VEJAcom o rei do pop . Espaçoparadeixarseucomentário www.veja.com.br/extras 8 I '0 DE JULHO, 2009 I wja

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ESPORTEDO INVERNO

Saibacomofazer umaquecimento adequadonaestação maisfriadoano. Oprocedimento é indispensável para evitarlesões.Emwww. veja.com.brjperguntas

o

cantor foi socorrido na mansão alugada onde vivia em Los Angeles por volta das 12h20 da quinta-feira. Jackson havia recebido os primeiros cuidados de seu médico particular, Conrad Murray (figura que logo se tomou uma incógnita: ele teve seu carro apreendido pela polícia, que queria interrogá-Io mas não o encontrava; em seguida, veio à tona que onze dias atrás o médico havia anunciado seu desligamento da profissão). Paramédicos o encontraram sem respiração e sem pulso. Levaram-no, em estado de coma, para o hospital da Universidade da Califórnia, a poucas quadras. Mal haviam chegado e a notícia de sua morte

iminente -

finalmente declarada às

14h26 - já causava comoção global. O tráfego do serviço de microblogs Twitter dobrou. O Google entrou em pane, tantas as buscas. O serviço de mensagens instantâneas da AOL também sofreu um colapso nos Estados Unidos. O iTunes e a Amazon, as maiores lojas virtuais de música do mundo, registraram um aumento extraordinário nas vendas de discos e canções de Jackson. No caso da Amazon, o volume de vendas cresceu incríveis 700 vezes. A causa exata da morte só deverá ser conhecida em quatro a seis semanas, quando serão divulgados os resultados de sua autópsia. Mas informações vindas de parentes e amigos do cantor sugerem que Jackson vinha abusando de analgésicos potentes. Segundo aventou na sextafeira o canal de fofocas TMZ, entre eles estaria o demerol, um opiáceo sintético de ação similar à da morfina. Jackson teria tomado uma injeção poucas horas antes da parada cardíaca. Na classe dos opiáceos, só a heroína causa mais dependência que a meperidina, como é chamado o princípio ativo do demerol. Nas primeiras doses, o efeito dura de seis a oito horas. "Se ele for consumido todos os dias, bastam duas semanas para o efeito do medicamento durar a metade disso", diz !rimar de Paula Posso, anestesiologista do Hospital das Clínicas de São Paulo. A parada respiratória ocorre porque o medicamento diminui a sensibilidade das células do sistema nervoso central que regulam a respiração - a qual vai diminuindo, até causar sonolên- ~ cia. A falta de oxigênio, então, pode cul- § minar em colapso do coração. O cantor ~ começou a usar remédios para a dor em g 98

I 10 DE JULHO.

2009

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MORTESÚBITAMichael Jackson entubado (foto maior à esq.), o embarque do corpo no helicóptero rumo ao departamento de medicina legal de Los Angeles (acima), a chegada da mãe ao hospital (à esq.) e a irmã La Toya em prantos: ele sai de cena dias antes do inicio de uma temporada de cinquenta shows

veja

I 1° DE JULHO,

2009 199

meados dos anos 80. Desde então, teria se tomado dependente deles. Nos últimos tempos, Jackson os estaria tomando em razão de uma lesão numa vénebra e de dores nas pernas produzidas pelo excesso de ensaios: depois de vários anos sem fazer shows e da longa reclusão que se impôs desde que foi absolvido da acusação de abuso sexual de um garoto, em 2005, o cantor estava prestes a retomar ao palco. No próximo dia 13, daria início a uma temporada de cinquenta apresentações em Londres. No início da década de 80, momento de explosão de Jackson, nem nos confins do planeta se encontraria um adolescente que não tivesse se arriscado a imitar o quase impossível moonwalk, a dança que ele inventou ao fundir a suavidade dos passos de Fred Astaire à agressividade dos dançarinos de break, ou suas coreografias sensacionais, profundamente estilizadas - comoaquela mão na virilha que era, ao mesmo tempo, erótica e uma paródia do erotismo. Hoje, não se encontra em lugar nenhum attista pop que não dance no palco à maneira de Jackson: como uma declaração criativa que avança por territórios e sentidos aos quais a letra e a melodia não [:J

chegam. Mas essa foi apenas uma das ~ revoluções de Jackson. ~ As imagens de Thriller;catorze mi- ~ nutos que sempre pareciam cunos de- ~ mais, cravaram o videoclipe como a for- ~ ma essencial de veicular uma música e <5 ajudaram a tomar a MTV uma força de- ~ cisiva entre o público jovem. E o público <3 jovem (com a ajuda decisiva de Walter Yemikoff, então presidente da CBS, que ameaçou tirar todos os anistas da companhia da MTV caso ela não exibisse Thriller) obrigou a emissora, que antes torcia o nariz para anistas de música negra, a abrir sua programação para eles. Hoje, o rap e o rhythm'n'blues (R&B) são os estilos hegemÔnicos na emissora. Jackson desenhou ainda o mapa de componamento do ícone pop para as décadas seguintes: o anista inacessível que, com suas esquisitices e demandas, causa frenesi entre os paparazzi, aumenta a circulação dos tabloides e leva seus assessores e contratantes à loucura. Pop star que se preze, hoje - e a lista vai de astros "normais" como Madonna, Justin Timberlake e Mary 1. Blige a "excêntricos" do quilate de Mariah Carey e Britney 100 I 1°DE JULHO. 2009 I veja

MÚSiCA Comele,a música negratornou-sea forçadominanteno pop.Oartistamais bem-sucedido de hoje- JustinTimberlake,umbranco- aindabebedesuafonte MODAEESnLO~

~

Seuvisualfoi modanos anos80.Depoisdisso,o " quesobressaiu foisua excentricidade. Masos brilhantese o ourodesuas luvase casacostornaram-se partedovocabulário da alta-costura - atémesmo emdesfilesdesteano,de grifescomoLouisVuitton

GLOBALlZADO Em sentido anti-horário, Jãs choram a morte do cantor em Pequim, Londres, Los Angeles e Moscou: a comoção mundial provocou pane até no Google

DANÇA DepoisdeMichaelJackson, serum bomdançarino tornou-se imperativo paraqualquerastromasculino da músicapop.Inspirando-se nobreak, umadançaderua,eleinventou seu ., próprioestilonocomeçodosanos80 - o moonwalk. OusoqueJackson fez democassins pretoscommeiasbrancas - emtese,umpecadofashion- erauma homenagem aouniformedosbailarinos

veja I 1° DE

JULHO, 2009 I 101

TALENTOPRECOCEO cantor (em primeiro plano), com os pais e os irmãos nos tempos do Jackson Five: sucesso e traumas emjamflia Spears -, reza pela cartilha escrita por Jackson. Em uma reflexão que só pode ser feita a posteriori, Jackson foi ainda um exemplo definitivo do soft power, ou a tração que um país exerce por meio de conceitos e ideias. Na primeira parte da década de 80, a economia americana estava às voltas com um dado novo e desconcertante: a ascensão esmagadora do Japão como potência industrial - e dono de uma indústria não mais imitadora, como antes, mas criadora. A Sony japonesa lançou, nesse período, um fcone cultural tão poderoso quanto o próprio Thriller: o walkman, acessório que inaugurou a era da ponabilidade da música. Mas os Estados Unidos, se não inventaram o aparelho, tinham a música que se ouvia nele - a de Michael Jackson. E aí, claro, está a questão crucial para entender Jackson ou qualquer outro artista capaz de alcançar a longevidade na carreira: a música, o epicentro do qual irradiam todos esses tremores culturais e componamentais. Em razão do aparato industrial e mercadológico que cerca os pop stars, é comum que se pinte com tintas ideológicas a sua existência, acusando-os de serem fabricações. Alguns o são. Outros trazem para o cenário artfstico um talento verdadei102 11° DE JULHO, 2009 I veja

ro e uma capacidade real de inovação. Descartar Madonna ou Justin Timberlake como "produtos" é só uma forma de não compreendê-Ios, nem ao mundo em que vivemos; categorizar Jackson como uma fabricação seria um equfvoco ainda mais completo. Ele de fato criou o pop. Até a década de 70, a música jovem se dividia em dois nichos distintos. Havia o rock e suas variações, consumidos principalmente por adolescentes brancos e de classe média. E havia a música negra soul, funk, disco, rhythm'n'blues -, que era ouvida por negros. Jackson quebrou essa barreira em discos como Off lhe Wall, de 1979, e Thriller, de 1982, e borrou para sempre a linha que separava os dois universos. Nesses discos, o cantor talhou as linhas de baixo e bateria na medida para as pistas de dança; mas associou-as à vibração caracte-

OS ALTOS

r;.

E BAIXOS DE MICHAEL (emnúmerode cópiasvendidas)

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OFFTHE WALL-1979 Éo momentoem queelese descolados irmãose da imagemde artistajuvenil.Emsintonia comostemposda discoteca,é umálbum adultoe dançante BEN-1972 Segundodiscodo cantor,ficoumarcado pelamúsica-título- a primeirade sua carreira-soloa alcançaro topo nas paradasamericanas

INVINCIBLE- 2001 Comcustode 30 milhões de dólares,foi o disco maiscaroproduzidoaté então.levouseisanos paraficarpronto- e foi umadecepção

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ONIPRESENÇA Michael Jackson

OANGEROUS-1991

Apesarde saudado como"rei do pop",ele temdificuldadeem acompanharas novas tendênciasda música negra,trazidaspelorap e pelohip hop

gravando

HIStory: PAST,PRESENTANOFUTURE-1995 A coletãneaé umatentativadesesperada do cantor de demonstrarqueaindatemalgumarelevância musical.Imersoemesquisitices,mandaespalhar estátuassuaspelosquatrocantos do mundo

videoclipe

em Salvador com Madonna

no Pelourinho,

(no alto), num jantar (no centro) e recebendo

homenagem de Britney Spears no Madison

Square Garden, em Nova

York: ele fazia questão de ostentar o epfteto de "rei do pop" wja

I 10DE JULHO, 2009 1103

rfstica do rock'n'roll. Até mesmo as origens de um fenômeno social notável entre os jovens americanos, o dos adolescentes brancos que querem falar, dançar e agir como negros, podem ser traçadas diretamente à sua influência. Descontado Stevie Wonder,que lançou o primeiro disco aos 12 anos, mas cujo apelo nunca residiu no magnetismo ou na dança, Michael Jackson foi o primeiro grande ídolo mirim da música. Nascido em 29 de agosto de 1958 em Gary, no estado de Indiana, desde cedo ele mostrou talento para o canto e a dança. Seu pai, Joseph, que havia tentado a carreira num grupo de rhythm'n'blues, percebeu logo o talento de Michael, bem como de seus outros filhos. Transformou-os no Jackson Five, que ensaiava exaustivamente. Em 1968, o grupo foi contratadopela gravadoraMotown, a referência mítica da música negra. A audição do Jackson Five para Berry Gordy Jr., fundador e presidente da Motown, deixa claro que a estrela ali era Michael. No vídeo remanescentedo teste, ele canta I Got the Feelin', de James Brown, e encarna todos os trejeitos do astro do funk - mas com graça própria. Ao se lançar como artista-solo, em 1971, Jacksonjá havia aprendido muito sobre composição e produção musical. 50FT POWER O camor Teve a sagacidade de, pouco depois, recebido na Casa Branca por aliar-se ao produtor Quincy Jones, que Ronald e Nancy Reagan (no alto). com Bill Climon havia feito carreira no mundo do jazz. Eles colaboraram nos álbuns Off the e afilha Chelsea, ao lado de Wall, Thriller e Bad. Jackson não era Nelson Mandela (à dir.) e com ainda o recluso das últimas décadas, a princesa Diana (abaixo): mas um artista curioso e vivo. Muitos s{mbolo do exercfcio do poder dos ritmos presentes nesses trabalhos pelos Estados Unidos por nasceram de suas idas às discotecas, e meio da cultUra suas letras vinham repletas das angús- .... tias de um rapaz da sua idade. Até 1996,

ano em que foi ao Morro Dona Marta, no Rio de Janeiro, e ao Pelourinho, em

Salvador,para gravar o clipe de They Don't Care about Us, Jackson ainda vivia no mundo real. Cada vez mais, porém, ia sendo dominado pelo lado obscuramente infantilizado de sua personalidade, que o levaria, a cena altura, a se isolar em sua bizarra propriedade de Neverland - ou Terra do Nunca, em referência ao lugar em que vivia Peter Pan, o garoto que não queria crescer. Esse Jackson aberrante e patético encobriu o totem da revolução pop. Mas, com a sua mone, ele renasceu. 1041

1° DE JULHO. 2009

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Michael Jackson passou a infância trabalhando como um adulto. Aí, cresceu e dedicou a maior parte de seu tempo a agir como criança e a querer provar que isso era a coisa mais natural do mundo LIZIA BYDLOWSKI

m uma rara entrevista, dada à revista Time, Joseph Jackson, o pai de Michael, descreveu o filho mais famoso: "Ele é muito tímido. Quer dizer, tímido diante de poucas pessoas. No palco, na frente de milhares, ele se solta. O rapaz adora animais. Tem um lhama, dois cervos, um carneiro, uma cobra, três papagaios, dois casais de cisnes, um negro e um branco, alguns pavões. É religioso (mais do que os irmãos) e vegetariano radical. Tem um carrinho de pipoca e uma máquina de fazer sorvete - e sempre convida crianças para compartilhar com ele essas delícias". A cena altUra, a mãe, Katherine, interrompe: "Falam que ele é gay. Michael não é gay. Isso iria contra a religião, contra Deus". A entrevista é de 1984, Michael Jackson tinha 25 anos, ainda morava com os pais. Já se vislumbravam ali os esboços da esquisitíssima, ambígua e desequilibrada figura que ele viria a ser

E

pelo resto da vida: nem preto, nem branco,nemhomem,nem mulher,nem 1061

1°DE JULHO, 2009 I wja

adulto, nem criança - ou, colocadode outra forma, preto, branco, homem, mulher, adulto e criança. Joseph e Katherine. Pai e mãe. Pobre Michael. A ambição dos pais não conhecia limites. Aos 6 anos, Michael se tomaria a maior estrela do grupo criado por eles. Acabava-se ali sua infância. Ensaiava o dia inteiro - "Às vezes, olhava para fora, via as crianças brincando e chorava", contou em entrevista à apresentadora Oprab Winfrey, em 1993. Se os men.inoserravam um passo ou uma nota, o pai se enfurecia como um treinador de animais de circo. Lembrou Michael na entrevista a Oprab: "Ele pania para cima da gente... Ficávamos muito nervosos nos ensaios porque ele ficava sentado numa cadeira, com o cinto na mão, e se alguma coisa não safa direito ele vinha para cima, sem dó". De tão aterrorizado, "tinha vezes que ele chegava peno e eu vomitava". Jackson pai dizia que o filhoprodígio era feio, criticava o rosto com espinhas e ria de seu nariz "enorme". Nos "muito tristes" anos da puberdade, ele "chorava todos os dias". O começo

da carreira musical foi em boates e palcos de prostfbulos de Indiana. Em um deles, forçado pelos irmãos mais velhos, Michael perdeu a virgindade e ganhou mais um trauma para carregar vida afora. O pai dominador, a mãe muito religiosa mas indiferente aos maus-tratos, a fama, o isolamento, a fragilidade emocional, o abismo entre sua carreira e a dos irmãos (e irmãs as três, Rebbie, Janet e LaToya, também se viabilizaram como cantoras, mas no limite mínimo da mediocridade), tudo isso moldou a personalidade de Michael Jackson. Seu caso se encaixa como exemplo acabado dos manuais básicos de psicologia, em especial nos

capítulos sobre os efeitos na personalidade da infância perdida e da busca tor-

turante pelaperfeição.

I., ----- -

Aos 20 anos, Michael Jackson decidiu exorcizar os fantasmas infantis pela fuga de si mesmo e pela erradicação dos. sinais visíveis de suas origens. Começou sua metamorfose. As sobrancelhas se arquearam. O queixo ganhou uma covinha, a pálpebra foi levantada e o maxilar afilou. Os lábios se adelgaçaram, o cabelo perdeu os caracóis e ficou liso. A pele clareava e o nariz reaparecia cada dia mais fino. Apesar de todas as evidências, nas poucas vezes em que tocou no assunto admitiu ter se submetido a rinoplastias. Foram muitas, a ponto de a estrurora cartilaginosa do nariz ter dado lugar a uma prótese, que atrapalhava a respiração e ele tirava para dormir. A uma admirada Oprah, ele disse candidamente que sua pele ficara

branca em consequênciado vitiligo,a despigmentaçãobenignada epiderme.

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"É de família", disse. Aproveitou para ~. justificara maquiagempesada- "Uso ~; para disfarçar as manchas na pele" - e ~.

As cinco mulheres Q

uantomaisestranho parecia,maisMichaelJackson queria provarque era um homemnormal.Suaprimeira namorada"séria"foi Brooke Shields,ela tambémartista precoce, conhecedora dossofrimentos intensos efantásticos prazeres queelevivia.Nointervalodedécadas entreBrooke e seupróximo, digamos, romance,MichaelJackson cultivoua amizadede duas mulheres maisvelhas:a cantoraDiana Ross,comquemtrabalhouno filmeTheWize comquempor certotempotentouficarparecido,e a atrizElizabeth Taylor, uma alma gêmeatemperamental,gastadora e maluquete.Em1994,casou-se semter namorado comUsaMariePres108 110DEJULHO,2009I

veja

ley,a filha de Elvis.Duroudois anosenuncaconvenceu ninguém, mas na sexta-feira,abaladapor suamorte,elaescreveunumblog: "Nossarelaçãonãofoi umasimulação.Eraumarelaçãoincomum, é verdade,na qualduaspessoas incomunsque não tinham nem

conheciam umavidanormalencontraramumaconexão", Com DebbieRowe, a mãededoisde seusfilhos,Michael Jackson nem tentoudisfarçar: depoisdo sim, numasuítede hotelemSydney, naAustrália, deu-lheumbeijinho norosto- efoisó.

BONZINHO? NEMTANTO A imagemcultivada pelaproximidade commeninoscomo MacaulayCulkin despedaçou-se comasacusações depedofilia e as imprudênciascom o própriofilho

para reiterar suas raizes: "Tenho orgulho de ser um negro americano". Com suas roupas de soldadinho de chumbo (só que com muito mais brilho), a voz aguda e a extrema magreza, Michael Jackson fez o que pôde para parar

no tempo- um tempoque o tomava cada vez mais esquisito. Recluso, calado e solitário, mas montado em muitos milhões de dólares, em 1987 comprou uma propriedade de 1150 hectares na Califórnia e lá construiu sua Disneylândia particular, que chamou de Neverland, a Terra do Nunca de Peter Pan (o manual de psicologia básica, de novo). Nele instalou castelos em miniatura, um pequeno zoológico, roda-gigante, montanha-russa, fliperama, videogame, um trenzinho - e uma estátua em tamanho natural do Homem-Aranha. Fechado em Neverland com seu chimpanzé de estimação, Bubbles, recebia poucos e escolhidos amigos pinçados em dois grupos distintos: o das mulheres mais velhas, que eram duas - Elizabeth Taylor e Diana Ross, presenças marcantes na sua

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VELHAS, NOVAS E TANTO FAZ

Jacksone suas damas: a musa-espelho Diana Ross, a colega de problemas de infdncia Brooke Shields, a amiga Elizabeth Taylor. a noiva Lisa Marie Presley e a enfermeira motoqueira Debbie Rowe - que lhe deu dois filhos de olhos azuis

wja

I 10DE JULHO, 2009 1109

ADEUS, TERRA DO NUNCA Absolvido da acusação de abusar de um menor em sua mansão, Jackson nunca mais pisou nela. Hoje ela se encontra vazia e abandonada

das três crianças brancas que

vida (veja quadro na pág. 108) -, e o dos meninos pequenos, que eram muitos, inclusive o ator Macaulay CuIkin, seu amiguinho 22 anos mais novo. A essa altura, Jackson já usava máscara (por temor aos germes). Deixou-se fotografar adormecido em uma câmara hiperbárica, em cuja atmosfera de alta pressão esperava encontrar a longevidade. A ideia era chegar aos 150 anos. Essa esquisitice, ele desmentiu a Oprah. A foto na câmara teria sido feita durante uma visita a um centro de tratamento de queimaduras cuja ala cirúrgica ele patrocinou. Em 1993, quando um esforço para reaquecer a carreira parecia estar dando certo, os pais de Jordan Chandler, 13 anos e hóspede frequente de Neverland, abriram um processo contra Jackson por abuso sexual do filho. "Não posso acreditar que isso esteja acontecendo comigo", lamuriou-se, com um fio de voz. Por 20 milhões de dólares, retiraram a acusação e sumiram, mas a reputação de Jackson desmoronou. Apressadamente, casou-se, para surpresa geral, com Lisa Marie Presley, a filha de Elvis. Divorciou-se dois anos depois e se casou de novo, com Debbie Rowe, uma enfermeira sem graça que ele conheceu no consultório do seu dermatologista. 11O I 10 DE

JULHO.

2009

I veja

Debbie era boa de copo e gostava de motocicletas. Ela lhe deu dois filhos, Prince Michael I, hoje com 12 anos, e a menina Paris, 11. Separaram-se sem explicações e, no processo, ela abdicou da guarda das crianças. Quatro anos depois nasceria, de mãe não revelada, o terceiro filho, Prince Michael 11, apelido Blanket ("cobertor", em inglês). Pai solteiro de três crianças pequenas, cada vez mais excêntrico, Michael Jackson, no começo dos anos 90, já tinha uma longa história de abuso de remédios controlados. O problema pode ter começado em 1984, quando se queimou gravemente em um acidente ocorrido durante a gravação de um comercial. O forte analgésico Demerol, uma das drogas suspeitas de tê-lo matado na semana passada, foi então acrescentado ao coquetel diário que incluía tranquilizantes e antidepressivos. Em 2002, na cena mais marcante de seu desequilfbrio, diante de fotógrafos e cinegrafistas, balançou seu bebê Blanket (de cabeça coberta) do lado Qe fora da sacada de um hotel em Berlim. Desculpou-se depois, mas afirmou: "Ele se divertiu". Enquanto todo mundo se espantava, foi à TV tentar provar que era o pai mais amoroso do mundo

jurava serem seus descendentes. "Para Blanket, usei uma mãe de aluguel e meu próprio esperma. Também meus outros dois filhos são do meu esperma. São todos meus filhos", declarou ao inglês Martin Bashir em 2003. Nessa mesma e célebre entrevista, confessou que sim, dormia com garotos na mesma cama. Inocentissimamente. E recomendou: "É o que todo mundo devia fazer". À entrevista se seguiu seu pior momento: uma segunda denúncia de abuso se!5xual, desta vez contra Gavin Arvizo, 13 anos, que foi repetidamente convidado a Neverland quando se tratava de um câncer. Dessa vez houve prisão, depoimento, julgamento público e humilhações várias, até Michael Jackson ser inocentado de todas as dez acusações. Estava, porém, acabado - e quebrado. Nos anos em que não trabalhou, envolveuse em projetos mirabolantes e gastou sem parar, compulsivamente (Bashir o viu torrar 6 milhões de dólares em uma única tarde em antiquários). O cantor multimilionário, dono dos direitos de 250 canções dos Beatles, acumulou uma dívida avaliada em 500 milhões de dólares. Não quis voltar para Neverland (até por não conseguir pagar a conta de manutenção da propriedade) e instalou-se, com os filhos, em altíssimo estilo, em Barein, à custa do filho do rei, o xeque Abdullah bin Hamad AI Khalifa. O xeque, que compõe, concordou em sustentar Michael se ele gravasse suas músicas. Quando Michael se recusou, pôs ele e a família para fora e se juntou ao movimentado clube de pessoas que processavam o cantor. As ações e a falta de dinheiro p~enunciavam uma velhice atormentada. Michael Jackson escapou de mais esse pesadelo pelo sono eterno. 8

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