CADERNO MTSD Nº 01
DIAGNÓSTICO
© Copyright 2006
André Alves, João Ivo Puhl e Jonia Fank (organizadores)
Projeto Gráfico, Capa e Diagramação Luciano Fabiani Monteiro
Tiragem de 1.000 exemplares
Impressão
Defanti Ind. Com. Gráfica e Editora Ltda. CNPJ 36.882.777/0001-74 Av. Tancredo Neves, 405 - Jd. Petrópolis - Cuiabá - MT (65) 3618-6610 - www.defanti.com.br
ISBN 85-88421-37-2 Catalogação na Fonte do Departamento Nacional do Livro da Fundação Biblioteca Nacional. MATO GROSSO SUSTENTÁVEL E DEMOCRÁTICO./ André Alves, João Ivo Puhl e Jonia Fank (orgs.). – Cuiabá: Defanti, 2006 Autores: Amintas Nazareth Rossete, Andréa Ikeda, Cláudia Regina Sala de Pinho, Claudinéia Lizieri dos Santos, Débora Pedrotti, Gustavo V. Irgang, Jane M. Vasconcellos, Jonia Fank, Laurent Micol, Michèle Sato, Nataly Manrique Rocha, Nelci Eiete Longhi, Roberta Roxilene dos Santos, Rodrigo Ferreira de Morais, Ronaldo Senra, Samuel B. de Oliveira Jr., Silas Moraes, Solange Ikeda Castrillon, Vicente José Puhl. 1. Diagnóstico Mato Grosso. 2. Desenvolvimento Sustentável e Democrático. 3. Terras Indígenas. 4. Mineração. 5. Agricultura Familiar e Sustentável. 6. Agronegócio Sustentado. 7. Desmatamento em Ucs. 8. Recursos Hídricos. 9. Educação Ambiental. CDU: 332.14
Proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem a permissão expressa do autor (Lei n. 5.988 de 14.12.1973).
SUMÁRIO Lista de siglas e abreviaturas.................................................................................09 Apresentação...........................................................................................................11 Introdução: Bases do Projeto Mato Grosso Sustentável e Democrático João Ivo Puhl............................................................................................................ 13 Terras Indígenas e o Mato Grosso Sustentável e Democrático Jonia Fank e Silas Moraes........................................................................................24 A Mineração em Mato Grosso Amintas Nazareth Rossete.....................................................................................37 Recursos Hídricos Solange Ikeda Castrillon, Andréa Ikeda, Cláudia Regina Sala de Pinho, Claudinéia Lizieri dos Santos, Nataly Manrique Rocha, Nelci Eliete Longhi e Rodrigo Ferreira de Morais.....................................................................................46 Os Desmatamentos em Ucs Roberta Roxilene dos Santos, Laurent Micol, Gustavo V. Irgang e Jane M. Vasconcellos.............................................................................................................58 De uma Agricultura Sustentada à Sustentável Vicente José Puhl......................................................................................................71 Sinfonias de Educação Ambiental Mato-grossense Michele Sato, Débora Pedrotti, Samuel B. de Oliveira Jr e Ronaldo Senra.....84
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS ABONG-CO - Associação Brasileira de ONGs, secção Centro Oeste AME - Associação do Mato-grossense de Ecologistas ANEEL - Agência Nacional de Energia Elétrica ANSA- Associação Nossa Senhora da Assunção BB - Banco do Brasil BR - Brasil ou rodovia federal BSB - Projeto Brasil Sustentável e Democrático CEAMA- Centro Etno-Agroecológico do Médio Araguaia CIEA- Comissão Interinstitucional de Educação Ambiental CIMI - Conselho Indigenista Missionário CJMT - Coletivo Jovem de Mato Grosso CPP - Centro de Pesquisa do Pantanal CPT - Comissão de Pastoral da Terra DEA- Diretoria da Educação Ambiental DETRAN - Departamento Estadual de Trânsito DNPM - Departamento Nacional da Produção Mineral EA- Educação Ambiental ECO 92 - Conferência Mundial do Meio Ambiente - Rio de Janeiro -1992 EDS - Educação para o Desenvolvimento Sustentável EIA- Estudo de Impacto Ambiental EMBRAPA- Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária EMPAER - Empresa Mato-grossense de Pesquisa, Assistência e Extensão Rural FAB - Força Aérea Brasileira FASE - Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional FEMA- Fundação Estadual do Meio Ambiente FIEMT - Federação das Indústrias de Mato Grosso FLEC - Fórum de Luta das Entidades de Cáceres FMI - Fundo Monetário Internacional FORMAD - Fórum Mato-grossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento FUNAI - Fundação Nacional do Índio que sucedeu ao SPI GERA/UFMT - Núcleo de Estudos da Amazônica, Pantanal e Cerrado GLS - Gays, Lésbicas e Simpatizantes GPEA-UFMT - Grupo Pesquisador em Educação Ambiental GT - Grupo de Trabalho ha - hectare HPP - Hidrovia Paraná-Paraguai IBAMA- Instituto Brasileira de defesa do Meio Ambiente IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas IDH - Índice de Desenvolvimento Humano IIRSA- Iniciativa de Integração de Infra-estrutura Regional Sul-americana INCRA- Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária INEP - Instituto Nacional de Estudos e pesquisas
ISA- Instituto Socioambiental MAB - Movimento dos Atingidos por Barragens MEC - Ministério de Educação MES - Municípios Educadores Sustentáveis MMA- Ministério do Meio Ambiente MMDS - Mineração, Minerais e Desenvolvimento Sustentável MPF - Ministério Público Federal MST - Movimento dos Trabalhadores Sem Terra MT - Mato Grosso ou Rodovia estadual MTSD - Projeto Mato Grosso Sustentável e Democrático MW - Megawats ONG - Organização Não-Governamental OPAN - Operação Amazônia Nativa PAEC - Projetos Ambientais Escolares Comunitários PCH - Pequena Central Hidroelétrica PCN - Parâmetros Curriculares Nacionais PIB - Produto Interno Bruto PMB - Produção Mineral Bruta PNEA- Programa Nacional de Educação Ambiental PNUD - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento PPA- Plano Plurianual PPP - Projeto Político Pedagógico – das escolas e universidades PROFEAP - Programa de Formação em Educação Ambiental do Pantanal PROMEA- Programa Mato-grossense de Educação Ambiental REMETEA- Rede Mato-grossense de Educação Ambiental RH - Recursos Hídricos RIMA- Relatório de Impactos Ambientais RJ - Rio de Janeiro SEDUC - Secretaria Estadual de Educação SEMA- Secretaria Estadual do Meio Ambiente SEPLAN - Secretaria Estadual de Planejamento SIG - Sistema de Informações Geográficas SINTEP/MT - Sindicato dos Trabalhadores das Escolas Públicas de Mato Grosso SPI - Serviço de Proteção ao Índio TI - Terra Indígena TRF - Tribunal Regional Federal UFF - Universidade Federal Fluminense UFMT - Universidade Federal de Mato Grosso UFPE - Universidade Federal de Pernambuco UFRJ - Universidade Federal do Rio de Janeiro UHE - Usina Hidroelétrica UNEMAT - Universidade do Estado de Mato Grosso UNESCO - Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura UNESP - Universidade do Estado de São Paulo UNICAMP - Universidade de Campinas – São Paulo USP - Universidade de São Paulo
APRESENTAÇÃO Este é o primeiro Caderno do Projeto Mato Grosso Sustentável e Democrático (MTSD). Está dirigido a todas(os) as(os) mato-grossenses e brasileiras(os) que se preocupam com o futuro de sua vida e pensam nas condições para a vida das futuras gerações. Apresenta as reflexões dos Grupos de Trabalho (GTs) do Projeto MTSD, esforço coletivo da sociedade civil para analisar e diagnosticar a realidade sócio-econômico-ambiental e política do desenvolvimento do Estado. O Projeto MTSD é a regionalização do Projeto Brasil Sustentável e Democrático, lançado oficialmente em abril de 2004. É coordenado pelo Fórum Mato-grossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento (FORMAD) e pela Universidade Estadual de Mato Grosso (UNEMAT) e envolve dezenas de técnicos e militantes de organizações não governamentais sócio-ambientais, pesquisadores, professores e estudantes da UNEMAT e da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). Em seminário de novembro de 2005 decidiu-se publicar os primeiros resultados do trabalho dos grupos do Projeto Mato Grosso Sustentável e Democrático que ora apresentamos para a leitura, avaliação crítica e sugestões. É importante que os textos sejam debatidos pelas entidades da sociedade civil, pelos movimentos sociais, estudantis e sindicais e por todas(os) que se comprometem pela busca da Sociedade e do Estado Sustentável e Democrático. Os textos foram escritos por representantes dos Grupos de Trabalho e em 2007 haverá continuidade de pesquisas e certamente de publicações para o conhecimento da produção de todos os GTs, como também, a continuidade do diagnóstico e a elaboração das propostas alternativas indicando ações, projetos e programas para um Mato Grosso Sustentável e Democrático.
Cuiabá-MT, dezembro de 2006.
INTRODUÇÃO: BASES DO PROJETO MATO GROSSO SUSTENTÁVEL E DEMOCRÁTICO João Ivo Puhl1
Em nível planetário e nacional há pelo menos duas décadas que pessoas, entidades, movimentos e organizações das sociedades civis, partidos políticos, órgãos públicos de diversas instâncias, agências de cooperação, diretores de bancos de fomento, organismos supra-nacionais e até empresários estão percebendo e discutindo as problemáticas do desenvolvimento insustentável. Muitos estão preocupados com os impactos resultantes das violentas agressões ambientais de atividades econômicas que favorecem o lucro de poucos e não produzem o desenvolvimento para todos e nem apontam à sustentabilidade. Nos países do hemisfério norte a questão se apresenta como o desafio para o desenvolvimento sustentável e nos países do sul o debate do desenvolvimento sustentável vem acrescido com o problema do acesso universal, a justa distribuição e socialização dos recursos naturais no consumo como uma questão de democratização dos benefícios econômicos para as gerações presentes, assegurando-os às futuras. Na década de 1990, em vários países europeus, foram realizados estudos para avaliar a sustentabilidade das sociedades nacionais. Os resultados foram alarmantes e indicam um futuro ameaçado até no curto prazo e apontaram para a necessidade de reverem os níveis de consumo de energia, recursos naturais e sociais, sob pena de o planeta entrar em colapso. O projeto Brasil Sustentável e Democrático vem concentrando esforços desde 1996, através de um conjunto de organizações a nível nacional, para analisar as bases e os custos sócio-ambientais do modelo de desenvolvimento brasileiro. As primeiras conclusões a que se chegou foi que há urgência na produção de uma nova mentalidade e adoção de atitudes mais generosas e
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Professor efetivo de História da América no Departamento de História da Universidade do Estado de Mato Grosso, campus universitário Jane Vanini em Cáceres.
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solidárias, totalmente opostas as atuais, na produção, distribuição e consumo de bens produzidos pelo conjunto da sociedade. A primeira discussão para regionalização e consolidação do MTSD se deu em setembro de 2002 com a realização do Seminário “Brasil e Mato Grosso Sustentáveis e Democráticos”. Este evento, organizado em parceria com o projeto interinstitucional Brasil Sustentável e Democrático (BSD), ABONG – CO, GERA/UFMT; Mestrado de Agricultura Tropical/UFMT, UNEMAT e UNIVAG, culminou com a definição do FORMAD2 como responsável por fomentar as discussões e articulação entre as instituições participantes. A reunião para definir o Projeto MTSD aconteceu em maio de 2003 com a presença do Prof. José Augusto Pádua, consultor do projeto Brasil Sustentável e Democrático. Na ocasião, discutiu-se o projeto nacional e lançaram-se as bases do estadual. Definiram-se os objetivos, a metodologia, e a estrutura da matriz analítica que serviu como instrumento de ação das áreas setoriais dos Grupos de Trabalho (GTs). Assim, o Projeto Mato Grosso Sustentável e Democrático tem como base o “Projeto Brasil Sustentável e Democrático” e é interinstitucional, inclusive nas parcerias. O projeto MTSD é coordenado conjuntamente pelo FORMAD e UNEMAT e organizado em 11 GTs: Terras Indígenas; Unidades de Conservação; Agricultura; Cidades; Educação; Extrativismo Vegetal e Animal, Turismo; Mineração; Agroindústria; Infra-estrutura e; Recursos Hídricos. Estes se encarregaram de juntar dados sobre a realidade setorial com o objetivo de analisar a sustentabilidade e a democracia do Estado. Pessoas de diversas entidades participaram da elaboração da matriz analítica para orientar a produção de textos e de propostas sustentáveis e democráticas. Nos primeiros encontros o Prof. José Augusto Pádua abordou os principais conceitos do projeto: Sustentabilidade e Democracia. Ressaltamos alguns pontos: 2 O FORMAD foi criado em 1992 para articular os diversos segmentos e entidades mato-grossenses, para discutir e realizar ações coletivas, públicas e privadas ante as situações que impliquem riscos ao meio ambiente e à vida humana e, para propor alternativas de desenvolvimento sustentável para o estado de Mato Grosso.
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1) O modelo de desenvolvimento brasileiro, baseado nos modelos convencionais inspirados no exemplo norte-americano, não é democrático e nem sustentável. Ele não tem sido capaz de combater a enorme concentração de renda e riqueza existente no país, que produz a situação de pobreza em que vive a maior parte da população. Seus impactos ambientais, além disso, têm sido extremamente negativos. No Brasil e em Mato Grosso, o modelo de desenvolvimento baseado na exportação de produtos primários precisa ser repensado. 2) Não é possível isolar as questões ambientais como se fossem problemas em si mesmos, desconectados das questões econômicas, sociais e culturais. O enfrentamento das questões ambientais passa pela mudança do modelo de desenvolvimento e dos padrões de produção e consumo. A sustentabilidade ecológica deve ser vista como uma das questões centrais de um projeto alternativo de desenvolvimento. 3) Difundiu-se mundialmente a crença de que o desenvolvimento é universal, todos os países, povos e nações estão caminhando por uma mesma trajetória em busca deste objetivo, baseado no padrão norte-americano. Contudo, essa concepção não considera as diversidades dos povos e regiões que, para terem melhorias nas suas condições de vida, não necessariamente precisam passar pelo caminho do desenvolvimento, traçado pelos países capitalistas centrais, baseado no uso intenso e descontrolado dos recursos naturais e no baixo uso de mão de obra. Eles podem adotar um caminho alternativo, respeitando as diferenças regionais, no plano social, cultural e ecológico. 4) Aconcepção da sustentabilidade vem da biologia/ecologia e diz respeito à sobrevivência de um sistema por um prazo ilimitado. Mas a sobrevivência não deve ser considerada como o único objetivo. É preciso discutir se pretendemos sustentar uma sociedade injusta como a que hoje existe, ou uma sociedade digna, com melhoria da qualidade de vida de toda a população, com acesso igualitário aos serviços por toda a sociedade, respeitando a diversidade dos povos. É preciso tomar posse do conceito de sustentabilidade e adequá-lo às demandas que queremos. A inclusão do termo democracia pretende qualificar a sustentabilidade no contexto da justiça e da verdadeira liberdade.
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5) A idéia de desenvolvimento sustentável surgiu nos países centrais, através de uma tentativa de aproximar as reivindicações dos ecologistas com a legitimidade das empresas, amenizando sua radicalidade. Ela supõe, para muitos, a tese de que é possível enfrentar a crise ecológica com mudança nos níveis administrativo e tecnológico, sem passar por uma mudança profunda nos padrões de produção e consumo. Atualmente, o desenvolvimento sustentável, como meta genérica e superficial, é um conceito que ganhou grande hegemonia e legitimidade. Todos são favoráveis ao mesmo. Mas o conteúdo do que deve ser este modelo alternativo de desenvolvimento é objeto de grande disputa. Como fazer com que o desenvolvimento seja efetivamente sustentável? E de qual desenvolvimento estamos falando? O desenvolvimento alternativo que estamos buscando passa pela defesa da justiça ambiental e social como premissa para se chegar a sustentabilidade ecológica. Há um consenso entre as entidades que investem no MTSD que era preciso ressignificar os conceitos para manter-nos críticos ao programa desenvolvimentista do governo federal e do governo do estado de MT que busca a expansão do capital e a criação de divisas a qualquer custo. A mudança dos padrões de consumo, das formas de pensamento e as ações transformadoras passam pela reeducação de todas(os). Havia questões que precisavam de respostas: como se daria a inserção da população mato-grossense nesse projeto? De que maneira os povos indígenas seriam partícipes e beneficiários? Como se poderiam “amarrar” as diversas “agendas” nesse projeto? Como aprofundar a organização social – popular? Como trabalhar na prática com os limites/tetos ecológicos? Quais seriam os novos indicadores de desenvolvimento, diferentes dos indicadores do modelo instalado? Como se criaria envolvimento, elos que comprometam todos, no enfrentamento dos limites? Que seria a utilização racional e ecológica dos Recursos Naturais? Acreditava-se que no processo de construção do MTSD o importante seria estabelecer as prioridades baseadas na nossa realidade. No caso do Brasil, a ênfase deveria estar no piso, na criação de uma linha de dignidade que indicasse
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uma vida de qualidade para o conjunto da população, o tema da redistribuição e dos limites também precisava estar presente, tanto em escala global quanto nacional. Prioritário é atender a maioria da população ou não subsidiar os privilégios da minoria. Só num país de origem escravista pode-se considerar normal o salário mínimo vigente no Brasil. Questionava-se: faz sentido construir enormes hidrelétricas e a população local não ser beneficiada? As populações tradicionais e indígenas não podem mais ser invisíveis. Elas precisam ser os sujeitos de um diálogo social amplo, onde se mantenha a transparência das informações e se discuta abertamente os padrões de produção e consumo que queremos, considerando-se a realidade ecológica local. Não se pode pensar apenas no tempo médio de vida da população, mas na qualidade de vida, que seja democrática, ética, respeitando as diferenças. Em 2005, o Prof. Rodrigo Aleixo, em seminário, abordou sobre seu entendimento do desenvolvimento sustentável como bandeira política deve ser usada pelas entidades porque não existe hoje quem afirme ser contra ele. Mesmo quem não busca a sustentabilidade não se atreve a dizer que não se importa. A igualdade de oportunidades, em todos os sentidos, deve ser a busca, pois a ponte entre a sustentabilidade e a democracia é o desafio. O conceito de sustentabilidade é superficial e tem muitas dimensões, a ambiental, a ética, a econômica, a cultural, a religiosa e não temos um modelo para dizer como deve ser aplicado sem atropelar nosso conceito de democracia. Isso significa defrontar ou apresentar a democracia, que é um conceito antigo, com uma nova possibilidade da modernidade que tem como perspectiva um colapso geral em nosso planeta e é o fim dos recursos naturais. Mas qual é a temporalidade desse fim? Neste espírito, o Projeto Mato Grosso Sustentável e Democrático tem por objetivo estimular as experiências e propostas dos movimentos sociais, organizações populares e organizações não-governamentais, à elaboração de um modelo de desenvolvimento alternativo para Mato Grosso, produzindo novos enfoques analíticos, novos indicadores e novas idéias para uma mudança social pautada na sustentabilidade.
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Entre os objetivos formulados para o Projeto MTSD, estão: 1. Promover o debate participativo sobre o modelo de desenvolvimento do Estado de Mato Grosso com ênfase nos aspectos social, econômico e ambiental; 2. Avaliar os estudos e diagnósticos já existentes sobre a realidade sócioeconômica, política e ambiental dominante no Estado de Mato Grosso, realizando novas análises do espaço sócio-ambiental, das políticas públicas, das organizações sociais, do trabalho e renda, dos serviços básicos e do comércio internacional e finanças; 3. Promover a construção de um modelo alternativo pautado na sustentabilidade socioambiental, nos princípios democráticos, na competência organizativa, na justiça social e ambiental e em condições dignas de vida para toda a população, com ênfase naquela parcela tradicionalmente excluída do processo de desenvolvimento no Estado; 4. Estimular o surgimento de iniciativas, articulações e redes políticas que possam promover a transição gradual para este modelo alternativo; 5. Capacitar e subsidiar atores sociais para formular propostas, aperfeiçoar as relações com a sociedade e intervir nas políticas públicas com mais consistência teórica e propositiva. A metodologia proposta para o desenvolvimento do projeto propõe os seguintes passos: 1- Sensibilização e formatação do projeto MTSD com a constituição dos GTs setoriais a partir de oficinas para o nivelamento dos conceitos de Desenvolvimento Sustentável e Democrático e para aperfeiçoar/adaptar a Matriz analítica; 2 – Diagnósticos setoriais a partir de oficinas: internas dos GTs, setoriais micro-regionais e setoriais estaduais; 3 – Tornar públicos os resultados das pesquisas dos GTs através de seminários e publicações. A parceria entre a UNEMAT e FORMAD contribuiu para a exeqüibilidade dos três “Festivais das Águas” possibilitando a atuação em todo Estado, promovendo o debate do Projeto Mato Grosso Sustentável e Democrático. Abriu diálogos para a união da população mato-grossense, brasileira e de suas diferentes organizações sociais, buscando a confraternização, os intercâmbios artístico, cultural, ambiental e esportivo. Também mostrou a riqueza de nossos ecossiste-
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mas e de nossa gente através da diversidade das raízes étnicas e sócio-culturais. Além da valorização da participação no planejamento, execução, monitoramento e avaliação das ações de desenvolvimento. Nos festivais das águas e seminários do MTSD o público era constituído de pesquisadores, gestores públicos, representantes de organizações não governamentais, comunidades acadêmicas, tradicionais e indígenas que durante as discussões fomentaram propostas de políticas públicas para a conservação dos recursos naturais e culturais. No processo de construção, discussão e análise do MTSD, destacamos o Seminário promovido pelo FORMAD e a Diretoria de Educação Ambiental (DEA), do Ministério do Meio Ambiente (MMA) (09/11/2005), para produzir subsídios e indicadores de sustentabilidade e democracia, capazes de serem referenciais para a produção das análises setoriais no Projeto MTSD. Jean Pierre Leroy, da FASE-RJ perguntou aos presentes: “o que queremos com os conceitos de sustentabilidade e democracia?” Respondendo afirmou: “queremos ações e intervenções políticas”. Segundo ele, os indicadores (PIB, IDH) são problemáticos porque trabalham pela média. Simplificam o complexo de tal forma que impedem chegar a alguma conclusão porque não permitem considerar as diferenças, os problemas e dinâmicas sociais. E continuou: “Não é sustentável uma sociedade em que os produtos/mercadorias/ serviços estão a centenas de quilômetros de distância. Concentração urbana também é um critério que poderia ser adotado. Outro indicador que acho de grande importância é entrevistar os jovens e crianças de uma comunidade e perguntar em que querem trabalhar? Se a resposta da maioria dos jovens for seguir a atividade dos pais então podemos dizer que essa é uma atividade sustentável”.
Para finalizar, segundo relatório3 do seminário de novembro de 2005: “A sustentabilidade é o processo pelo qual as sociedades administram as condições materiais para sua reprodução, redefinindo princípios éticos e sócio-políticos
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Relatório disponível no site:http://www.formad.org.br/arquivos/File/seminario_indicadores_09112005.pdf.
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que orientam a distribuição dos seus recursos ambientais. Portanto não há uma sustentabilidade no horizonte, o único meio de nos aproximarmos dela é considerarmos um processo. É por isso que a democracia está no centro, porque o processo é ação social. Sustentabilidade como construção só é possível num processo democrático”. Os textos que se seguem ainda são apenas parte da etapa de diagnóstico da realidade mato-grossense e há um longo caminho a ser percorrido para que se internalizem as idéias e as práticas da democracia e da sustentabilidade em nós mesmos, nas famílias, nas organizações sociais de base, nas empresas e nas macro relações da economia política e da política econômica e social municipal, estadual, nacional e global. Os GTs e o FORMAD ainda não concretizaram todas as dimensões da metodologia proposta pelo projeto que prevê uma dinamização dos movimentos sociais levantando as bandeiras de um projeto alternativo de desenvolvimento sustentável e democrático, fundamentado e entendido pelos cidadãos mais simples e executável até na maior complexidade demandada. O primeiro texto do caderno trata da situação das terras indígenas até o ano de 2005. O GT Terras Indígenas aponta os problemas socioambientais que pairam sobre as comunidades indígenas que não tiveram a regularização de seus territórios tradicionais e continuam sob ameaças diversas como a invasão de seus territórios por posseiros, grileiros, madeireiros, garimpeiros, pescadores, fazendeiros, usinas hidroelétricas; ou pelas formas de ocupação do entorno com intensos desmatamentos das matas ciliares, monoculturas, uso intensivo de agrotóxicos que reduzem a disponibilidade de peixes, aves e animais de caça e mesmo a água apropriada para o uso e o consumo das comunidades. Os dados nos desafiam a pensar: como deveria ser o desenvolvimento de Mato Grosso para que as populações indígenas fossem beneficiadas e usufruíssem, em condições dignas, dos recursos naturais e econômicos tendo seu futuro assegurado? O GT Mineração apresenta um texto que trata da exploração mineral no Estado. A capitania colonial de Mato Grosso, surgiu para proteger a fronteira e as ricas minas de ouro e diamantes encontradas. Ainda hoje a mineração continua
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tendo importância econômica e social, mas é atividade provocadora de fortes impactos ambientais negativos. Em geral extrai recursos naturais não renováveis e rapidamente esgotáveis. O autor mostra um outro tipo de mineração que poucas vezes foi percebido como tal, apesar da sua importância econômica. Trata-se da extração de argila para a cerâmica (tijolos, telhas, etc), a areia, a pedra bruta ou britada, o cimento, a dolomita e o calcário para a construção civil e este último também corretivo dos solos ácidos na agropecuária quimificada. Além de descrever o fenômeno aponta critérios para tornar a atividade racional e reduzir seus impactos ambientais mais danosos. O GT Recursos Hídricos aborda a temática da água, não somente como um recurso natural economicamente aproveitável. Serve para produzir, transportar, extrair peixes, animais e aves, para gerar energia, para a limpeza, o preparo de alimentos, matar a sede e utilidades que homens, animais e plantas lhe dão. Ela é a principal fonte de vida. Antes de tudo é um dom, um direito e uma necessidade de todos os seres vivos. O Estado tem obrigação de defendê-la e socializá-la e impedir sua privatização e transformação em mercadoria para o enriquecimento de poucos. A avançada legislação brasileira sobre o tema não impede os conflitos por interesses que se digladiam para usar a água para as hidrovias, as hidroelétricas e os grandes projetos de irrigação com os pivôs centrais que se opõe aos interesses das comunidades que se desenvolveram em torno dos cursos de águas livres. Os Festivais das Águas realizados nas três principais bacias Hidrográficas do Estado denunciam problemas, mas também apontam iniciativas de novo tipo de desenvolvimento com a democratização e o uso sustentável dos recursos hídricos. O GT Unidades de Conservação traz um texto interessante sobre a função destas unidades para reduzir os impactos dos desmatamentos no Estado que nas últimas três décadas foi campeão de desflorestamento. Conseguiu realizar em poucos anos a destruição de pelo menos 37% das florestas nativas originais que cobriam Cerrado, Amazônia e Pantanal. O estabelecimento de áreas naturais legalmente protegidas a níveis federal, estadual, municipal ou até privado, são práticas recentes em Mato Grosso e as 42 unidades representam apenas 4,6% do
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território do Estado. Estão distribuídas por todo o território de sul a norte e de leste a oeste. Apesar de serem ilhas de preservação e nem sempre respeitadas, o estudo indica que mesmo depois de sua criação muitas áreas continuaram sendo invadidas e tiveram suas florestas retiradas. Nas áreas do entorno, tão importantes para que não fiquem isoladas e ameaçadas, as matas estão sumindo rapidamente. A análise destes dados nos remete a pensar outras estratégias para assegurar a integridade das áreas protegidas e avançar na construção de formas de manejo das florestas em vista do desenvolvimento sustentável e participativo. O GT Agricultura realizou um diagnóstico dos investimentos públicos em forma de subsídios ao agronegócio e desmascara a cruel tradição política brasileira. O Estado continua ajudando os mais ricos e poderosos, sejam brasileiros ou multinacionais, pois o negócio agropecuário deles só se mantém porque “privatizam os lucros e socializam as perdas”. Toda a sociedade continua pagando os prejuízos dos créditos não pagos aos bancos e renegociados a longos prazos, porque além da força do dinheiro utilizam a política formando a bancada ruralista. Elegem-se ou financiam deputados, senadores, prefeitos, governadores, etc. para barganharem nos momentos decisivos de votações importantes que interessam ao governo ou a sociedade. O texto mostra que o agronegócio tão louvado como fator de progresso tem um altíssimo custo social e ambiental porque exclui e empobrece as maiorias, enriquece poucos, não democratiza o acesso aos recursos naturais, sociais e públicos, depreda florestas e a biodiversidade, contamina os solos, a água e o ar e produz o desemprego e a insegurança alimentar. Além de criar cada vez maior dependência de poucas empresas que controlam a cadeia produtiva, lucrando com o fornecimento de insumos, máquinas, sementes, agrotóxicos, créditos, assistência técnica, agroindustrialização e a distribuição aos atacadistas ou consumidores. O Texto do GT Educação traça em linguagem poética um quadro sintético das práticas e agentes da educação ambiental no Estado, desde os movimentos das vanguardas ambientalistas das décadas de 1960 e 70, passando pela especialização em educação ambiental promovida pela UFMT em 1989, experiência pioneira na América Latina, até a construção da Rede Mato-grossense de
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Educação Ambiental (REMTEA) que articula diversos atores populares, ONGs, empresários, órgãos públicos, universidades, pesquisadores e militantes ecologistas e ambientalistas. O texto também analisa como nas escolas em Mato Grosso a educação ambiental foi se tornando um tema transversal e como os conceitos e as práticas educativas se ampliaram. Indica ainda os desafios a serem superados para construirmos o território como espaço de vida revolucionariamente oposto ao modelo desenvolvimentista vigente. Será uma leitura estimulante e desafiadora para todos que buscam o desenvolvimento sustentável e democrático e apostam na reeducação como estratégia de ação.
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TERRAS INDÍGENAS E O MATO GROSSO SUSTENTÁVEL E DEMOCRÁTICO Jonia Fank e Silas Moraes1
Este texto tem por objetivo apresentar um diagnóstico preliminar sobre as Terras Indígenas (TI) habitadas e reivindicadas pelos povos indígenas de Mato Grosso. Tomamos por referência as informações apresentadas por representantes de vinte e três etnias2 presentes no “Encontro do Movimento Indígena e Questões Fundiárias do Estado de Mato Grosso3” realizado entre os dias 22 a 25 de novembro de 2005, na Chapada dos Guimarães-MT. Também consideramos para análise os dados oficiais da Fundação Nacional do Índio (FUNAI) de 2005, do Anuário Estatístico de Mato Grosso e o previsto na Constituição Federal e no Estatuto do Índio. Ao final destacamos duas situações de terras que são emblemáticas e que exigem atitudes urgentes. A metodologia adotada no Encontro permitiu abordar as realidades segundo diferentes aspectos, como: situação legal, territórios invadidos, usufruto e condições de degradação dos recursos naturais - floresta, água e animais. Apresentaremos estes dados, destacando números que demonstram a gravidade da questão territorial indígena em Mato Grosso. Dentre as vinte e três etnias e aproximadamente trinta e nove TIs representadas no encontro: « 21 (vinte e uma) etnias apresentaram reivindicação de recuperação de suas terras tradicionais que ficaram fora da demarcação; apenas 2 (duas) não reivindicaram. « 20 (vinte) etnias fizeram denúncias de invasões em suas terras;
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Membros do Grupo de Trabalho Terras Indígenas - GT TI. Colaboração de: Kátia Zorthea; Maristela Torres; Sebastião Moreira e Solange Pereira. 2 Etnias presentes no Encontro: Apiaká, Arara, Bakairi, Bororo, Chiquitano, Cinta larga, Enawene Nawe, Guató, Irantxe, Yudja/Juruna, Kaiabi, Kaiapó/Mebengokre, Karajá, Munduruku, Myky, Nambikwara, Paresi, Rikbaktsa, Tapirapé, Terena, Umutina, Xavante e Zoró. 3 Neste artigo, todas as citações de Encontro, irão se referir a este evento de novembro de 2005.
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« 21 (vinte e uma) etnias citaram degradação e exploração de recursos naturais; « As 23 (vinte e três) etnias registraram tensões e conflitos externos. Frisamos que todas as vinte e três etnias apresentaram algum tipo de denúncia ou reivindicação, sendo que muitas apresentaram todas as quatro categorias de denúncia e reivindicações e que todas as etnias presentes denunciaram conflitos externos. Foto: José Luis Medeiros
Encontro “Movimento dos povos indígenas e questões fundiárias de MT”, novembro 2005.
1. Terras Indígenas em Mato Grosso A Constituição Federal (1988) explicita em seu Título VIII da Ordem Social, Capítulo VIII, dos Índios, Art. 231: “São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens”. § 1º - São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.
Uma lei complementar deveria especificar como este artigo 231 será aplicado. No entanto, o Estatuto do Índio vigente ainda é o de 1973 e a não atualização deste texto favorece que acordos para exploração de recursos naturais sejam firmados de maneira individualizada. O processo de regularização dos territórios indígenas inclui etapas de identificação, demarcação física, homologação (pelo Presidente da República) e
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registro como patrimônio da União. Em muitos casos, quando a área está invadida, é necessário 'retirar os não-índios' que ocupam a mesma. Todo este processo de regularização, muitas vezes, perfaz mais de duas dezenas de anos. As razões da demora são de várias ordens, sofrendo forte influência dos poderes políticos e econômicos. No caso de Mato Grosso, mesmo havendo um número razoável de terras já demarcadas, a maioria delimitadas e processadas pela FUNAI, a partir de 1970, a dimensão dos Territórios Indígenas ainda é insuficiente para suprir a real demanda desses povos. Segundo declarações do atual presidente da FUNAI Mércio Gomes, no dia 12 de janeiro de 2006 à Agência de notícias Reuters: “o Estado Brasileiro já garantiu terras suficientes para esses povos”. Entretanto, essa não é a realidade encontrada na grande maioria dos povos indígenas do Brasil e nos relatos deste Encontro de novembro. Em Mato Grosso existem atualmente 38 (trinta e oito) diferentes etnias, sendo que 14 (quatorze) destas vivem no 'Parque Indígena do Xingu'. O Anuário Estatístico de Mato Grosso de 2004 registrava 75 (setenta e cinco) Terras Indígenas (TIs) legalmente protegidas, mas os dados técnicos da FUNAI (2005), dizem que existem 86 (oitenta e seis) TIs, sendo 55 (cinqüenta e cinco) regularizadas e as demais ainda em processo de regularização. Acrescentamos aos dados da FUNAI a TI dos Terena em Guarantã do Norte, que consta no Anuário Estatístico de 2004 e chegamos ao número de 87 (oitenta e sete) TIs em Mato Grosso. Percebe-se que há dados oficiais contraditórios entre si com uma diferença de onze TIs entre as duas fontes, além de não constar nos dados da FUNAI a TI da etnia Terena no município de Guarantã do Norte, o que parece falha grave. Com base a estes dados, consideramos urgente e necessária a atualização e regularização das mesmas pelos órgãos responsáveis. Nos dados oficiais, também não consta a existência de povos indígenas isolados no Estado. A Equipe de Índios Isolados da FUNAI, responsável pelo contato com estes povos, indica que há aproximadamente seis grupos em Mato Grosso, que também necessitam da garantia de seus territórios.
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2. Regularização e reivindicação de Terras Indígenas Dentre as etnias presentes no Encontro, vinte e uma reivindicam recuperar partes de territórios tradicionais, pois denunciam que ficaram fora da demarcação oficial e são terras com significativo valor cultural e sócio-econômico. No caso dos Kayabi, a luta por reconquistar a TI do Batelão está relacionada à história da retirada de boa parte deste povo, conduzido ao Parque do Xingu na década de 50, sendo um símbolo de resistência para as cinco famílias que permaneceram na região de origem. Estas famílias desceram o rio dos Peixes e hoje formam um grupo de mais de 350 indígenas, dividindo com os Apiaká e Munduruku, uma área insuficiente. A área é constante foco de conflitos e já houve, inclusive, episódios de violência contra os índios e vice-versa. O quadro a seguir indica as vinte e uma etnias que reivindicam a retomada de terras consideradas tradicionais, mas que ficaram excluídas da demarcação já realizada. Há casos que necessitam de regularização de toda a terra, como o das etnias Terena e Guató. Já os Chiquitano na fronteira Brasil/Bolívia tiveram apenas identificado a TI Pontal do Encantado. Esta é insuficiente e há manipulação de fazendeiros e políticos, com lideranças sendo ameaçadas de morte, numa região marcada pelo narcotráfico. Etnia Apiaká Arara Bakairi
Bororo
Chiquitano Cinta Larga Enawene Nawe Guato Irantxe (Manoki) Kaiabi
Áreas a serem reconquistadas Pedem regularização da TI Micro bacia do Rio Encrenca Retomada de área do Xingu Falta demarcação de 50% da TI Tereza Cristina (da terra tradicional demarcada pelo Marechal Rondon) e Jarudore (totalmente invadida). Falta demarcação da área Volta Grande em Sangradouro, recuperação do Pontal no Tadarimana e recuperação da colônia Santa Izabel no Perigara. Regularização das terras Caverna do Morcego e a área da cabeceira do rio Guariba Reconquista da área Adowina no Rio Preto Regularização das terras Baía dos Guató Parte do território tradicional Reconquista Batelão
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Região Noroeste Noroeste Sudeste
Sudeste/ Sul
Sudoeste Noroeste Noroeste Sul Noroeste Norte
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Karajá Mebêngôkre/ Kaiapó
Parte do território tradicional Reconquista Kaponhinore
Umutina
Região comum entre povos Kaiabi\Apiaka\Munduruku dividida pelo rio dos Peixes Área Castanhal\Tucunzal Parte da Caverna Morcegal e os cemitérios tradicionais Recuperação da Estação Rondon, o Uirapuru, a Ponte de Pedra e o Formoso. Parte da TI Urubu Branco (próximo a Santa Terezinha) Regularização das terras em Matupá/Guarantã do Norte Área tradicional que foi tomada por fazendeiros
Xavante
TI São Domingos e Marãiwatséde
Xinguanos: Yudja/Juruna
Área adjacente ao Parque área tradicional Kalapalo e Jatobá/Ikpeng.
Munduruku Myky Nambikwara Pareci Tapirapé Terena
Leste Nordeste Noroeste Noroeste Sudoeste Oeste Nordeste Norte Oeste Sudeste, Leste e Nordeste Nordeste
3. Obstáculos para a regularização das TIs Os processos de regularização das TIs, muitas vezes esbarram com problemas na justiça, além da incompetência e/ou prevaricação na FUNAI. Em particular no estado de Mato Grosso, estas terras enfrentam dificuldades para serem demarcadas ante a forte pressão política e econômica de grupos de pecuaristas, madeireiros e sojicultores. Muitos desses mantêm vínculos com políticos de expressão local, regional ou nacional, sendo favorecidos quando o Estado e a justiça demoram a chegar a um 'veredicto final'. Seria ingênuo não admitir que há casos em que indivíduos de alguns povos indígenas estabelecem 'parcerias' com sojicultores e pecuaristas, arrendando terras para o plantio da monocultura, em seu território. O caso mais conhecido e denunciado é o que ocorre entre os Paresi. Outro é o caso do povo Tapirapé com arrendamento de pasto para criadores de gado. As práticas destes indivíduos contradizem os interesses de suas comunidades que reivindicam a recuperação de suas terras tradicionais. Destacamos que Blairo Maggi, atual governador de Mato Grosso, é também o maior produtor individual de soja do mundo. Logo após tomar posse, em 31 de
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março de 2003, enviou uma carta ao Ministro da Justiça, solicitando a paralisação das demarcações, no mínimo por 02 (dois) anos, para “reavaliar as demarcações e estudos em andamento”. Finaliza seu documento argumentando que “as demarcações estão impedindo futuras obras de infra-estrutura estratégicas para o nosso desenvolvimento”. Constata-se que, pouquíssimas áreas no Estado tiveram encaminhamento para estudo, com a criação e a implementação de GT, entre outros trâmites necessários à regularização de TIs, depois desta data. 3.1. Invasões em TIs São inúmeros os casos em que, mesmo depois de finalizadas todas as etapas do processo legal de regularização das terras, os territórios seguem sofrendo exploração ilegal. Alguns poucos povos desenvolvem sistemas de vigilância, o que resolve apenas uma parte dos problemas, como indicam os casos dos Rikbaktsa e Enawene Nawe. Os maiores invasores denunciados no Encontro, foram fazendeiros, madeireiros e pescadores, conforme o gráfico abaixo: Fazendeiros Madeireiros Pescadores Presença de posseiros em suas terras Sofrem invasões de garimpeiros Sofrem com caçadores e outros Turismo Pecuária Sojicultura Exploração de palmito Grileiros Presença de ‘linhão’ de energia elétrica cortando a área
Em 2004 o povo indígena Xavante do Marãiwatséde, com muita luta e depois de quase um ano acampado na beira da estrada, retomou 2.600 (dois mil e seiscentos) hectares dos 168.000 (cento e sessenta e oito mil) hectares de sua terra tradicional, homologada e demarcada, mas invadida por posseiros e grileiros.
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Continuam enfrentando invasões articuladas por estes agentes, além de outros desafios para sua sobrevivência na área, tais como obter alimentação e moradia. 3.2. Degradação e Exploração dos Recursos Naturais Destacamos também, deste Encontro, as denúncias relacionadas à degradação e exploração dos recursos naturais em terras indígenas. As denúncias mais freqüentes foram em relação a madeireiros e a pesca predatória, que atingem as áreas de onze das etnias presentes. Cinco etnias têm problemas com a construção de hidrelétricas. O povo Enawene Nawe sofre a ameaça da efetivação de 11 (onze) projetos de hidrelétricas no rio Juruena que passa pelo seu território. O quadro abaixo apresenta as denúncias com destaque aos tipos de degradações e de exploração de recursos naturais, em ordem decrescente de importância: Degradação e Exploração dos recursos naturais em TIs de MT Retirada de madeira Pesca predatória Construção de PCHs Nascentes de rios degradadas fora da área Diminuição da caça, pesca e coleta de frutos silvestres Garimpo Atingidos pelo uso de agrotóxicos no entorno Desmatamento no entorno de rios Captura de iscas Degradação da terra tradicional que está sendo reivindicada Desflorestamento para monocultura Cerrado destruído Dependência de recursos alimentares externos
Analisando o conjunto dos territórios é possível prever que problemas decorrentes da degradação no entorno, afetam cada vez mais diretamente a um maior número de povos indígenas, pois boa parte das nascentes de rios estão fora de suas terras. Ali os processos de desmatamento avançam, deixando as TIs como 'ilhas' cercadas por pasto e monocultivos. A exploração agropecuária que prioriza a agricultura em larga escala, em detrimento das condições de reposição e de manutenção dos recursos naturais,
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causa impactos diversos sobre as TIs. Destacamos o assoreamento dos rios, devido à destruição das matas ciliares e a contaminação dos lençóis freáticos pelo uso intermitente de agrotóxicos. As circunstâncias apontam para sérias conseqüências sobre toda a sociedade, comprometendo a qualidade e a quantidade da produção agrícola, em qualquer escala, trazendo prejuízos à saúde dos indígenas e das populações do entorno. 4. Casos Emblemáticos em Mato Grosso Apresentamos com mais detalhes o que ocorre em duas das terras indígenas mais impactadas e ameaçadas pelo modelo hegemônico desenvolvimentista adotado no Estado. É importante ressaltar que além destes casos há outras situações emblemáticas em Mato Grosso, como por exemplo, a vivenciada pelos Bororo de Jarudori e da TI Tereza Cristina. 4.1. Caso Xavante – TI Marãiwatséde No início dos anos de 1960 o paulista Ariosto da Riva invadiu o território tradicional Xavante instalando ali seu latifúndio de cerca de 1.000.000 de hectares (um milhão). A área conhecida como Suiá-Missu (por conta do rio de mesmo nome que a corta e deságua no Xingu), iria abrigar a maior área contínua de criação de gado do mundo. Em agosto de 1966, após acordo dos novos proprietários (família Ometto) com o Serviço de Proteção ao Índio (SPI), com o auxílio de aviões da Força Aérea Brasileira (FAB), foi iniciada a transferência dos cerca de 300 sobreviventes do povo Xavante da área para a Missão Salesiana em São Marcos, 400 quilômetros ao sul de Marãiwatséde. Na operação morreram cerca de 90 índios em decorrência do traslado e de doenças advindas do contato com a sociedade nacional. Os mais velhos consideram que a transferência significou uma violenta ruptura que jamais será esquecida. “A terra onde cresci era livre, tinha floresta, porque o índio preservava e não havia nenhum branco ainda”, relembra o cacique Damião, que tinha 11 anos quando foi
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levado para São Marcos. “Depois que saímos, foi a perdição. Nunca mais encontramos um lugar nosso, de verdade”. Depois do fracasso do projeto agropecuário inicial de Riva, as terras da SuiáMissu em mãos da família Ometto, passaram ao controle da corporação italiana Agip Petroli (holding da estatal Ente Nazionali Idrocarburi – ENI). Em 1992, em meio às várias discussões que marcaram a Conferência Mundial do Meio Ambiente (ECO 92), no Rio de Janeiro, representantes da empresa se comprometeram verbalmente a devolver a área original aos Xavantes. Diante disto, grupos políticos do Estado e fazendeiros da região contrários à idéia organizaram um processo de ocupação da área por posseiros e grileiros, mesmo sabendo que fora oficialmente identificada, demarcada e homologada como terra indígena, uma extensão de 168 mil hectares. Ao longo desses anos os Xavante tentaram retomar Marãiwatséde, sendo sistematicamente impedidos de voltar a construir suas aldeias nessa área. Mesmo assim, retornam a estas terras para coletarem matérias primas utilizadas na confecção de artesanato, arcos e flechas, e para cultuarem seus antepassados nos antigos cemitérios. Em 2003, os anciãos do povo Xavante manifestaram o desejo de voltar à terra de seus ancestrais antes de morrerem. Os jovens guerreiros sentiram a obrigação de propiciar este retorno. No mesmo ano, 280 (duzentos e oitenta) pessoas (crianças, jovens, adultos e velhos) retornaram às suas terras, mas foram impedidos pelos invasores de entrarem na sua terra indígena. Então, ficaram acampados à beira da BR 158, entre novembro de 2003 e agosto de 2004, aguardando a decisão do Juiz da 5ª Vara da Justiça Federal de MT. Durante o período muitos adoeceram em decorrência da má qualidade da alimentação, da água e por falta de saneamento básico, três crianças morreram. Atualmente os Xavantes ocupam cerca de 20 mil hectares de suas terras. Vivem em clima de tensão e há o risco de acirramento do conflito com os posseiros a qualquer momento. A permanência dos posseiros na área Xavante está amparada em decisão do Tribunal Regional Federal - TRF, que determinou que uma eventual extrusão fosse iniciada apenas após o julgamento do mérito da ação civil pública – proces-
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so que, neste momento, depende de uma nova perícia antropológica da FUNAI e de levantamento fundiário por parte do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA. Placas colocadas pela FUNAI para identificar a terra indígena foram pichadas com tinta preta. Pelas informações dos índios, posseiros vêm desmatando e fazendo novas ocupações nas proximidades da aldeia, reduzindo o espaço para a caça e a pesca nos moldes tradicionais. Em outubro de 2004, um grupo de rapazes Xavante teve sua pescaria interrompida à bala por pistoleiros. Na tentativa de escapar, dois índios foram atingidos. A sensação é de confinamento. “Estamos presos aqui. Os posseiros estão à nossa volta. A caça e a pesca são prioridades para nós, mas hoje não podemos andar longe porque tem risco de conflito com posseiro. Isso não pode continuar, é contra o jeito de ser do povo Xavante”, protesta Arimatéia Tserewahriwê, jovem liderança da etnia. Segundo ele, não é da natureza xavante aceitar a imposição de limites em sua própria terra. “Não podemos perder nossa cultura, nossa caça, nosso modo de conseguir alimento. Queremos ser Xavantes autênticos e andar sem medo”. Desde o ano 2005, o INCRA tentou, sem sucesso, concluir duas das principais etapas necessárias ao processo de devolução de Marãiwatséde aos Xavantes: o cadastramento dos posseiros e a seleção dos potenciais clientes da reforma agrária. No momento percebe-se que a situação está ficando insustentável. Os Xavante não podem fazer suas roças, caçar, pescar nem coletar materiais tradicionais. Há mais de dois anos, aguardam uma decisão da justiça que garanta a posse definitiva de seu território e a retirada dos invasores, mas os procedimentos não avançam. 4.2. Caso Enawene Nawe – Rio Preto e PCHs4 O desrespeito às leis ambientais e a demora na identificação do território tradicional Enawene Nawe colocam em risco a sobrevivência deste povo localizado no município de Juína, a 737 quilômetros de Cuiabá. 4
Pequenas Centrais Hidrelétricas.
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Aregião do rio Preto, que fica fora da Terra Indígena é uma importante fonte de peixes para esse povo. O ritmo intenso de ocupação, os desmatamentos ilegais e o uso de agrotóxicos nas lavouras de monocultura ameaçam seriamente esses recursos. Agravando a situação estão planejadas pelo consórcio Juruena (empreendedoras Maggi, MCA e Linear) nove Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) e duas hidroelétricas maiores nas proximidades do território. Mesmo após o contato, em 1974, os Enawene Nawe mantêm o seu modo tradicional de vida, diretamente ligado a um calendário de festas e rituais. Esses eventos que dão sustentação à organização social coincidem com o calendário produtivo desse povo. A pesca, a agricultura e as atividades extrativistas mantêm estreita ligação com o universo mítico, o cumprimento de obrigações e o pagamento de dádivas aos espíritos. Monolíngües e pertencentes à família Aruak, os Enawene Nawe realizam a pesca para o seu ritual mais importante - o Yãkwa. Pescam com armadilhas colocadas em barragens, armadas no leito dos pequenos rios de sua área, da mesma forma como faziam seus antepassados. Atualmente, a barragem de maior produção para o ritual encontra-se no rio Preto, fora dos limites da Terra Indígena homologada. Este ritual se estende por um período de sete meses. A maioria dos povos indígenas do Brasil sofreu forte decréscimo populacional no período posterior ao contato. No entanto, a população Enawene Nawe apresentou um considerável aumento populacional. Em 1974, eram 97 indígenas, hoje são 445 pessoas5. Na mesma proporção, cresce a necessidade de uma maior obtenção de alimentos. Por conta disso, a preservação das nascentes dos rios, das matas-ciliares e da floresta são fundamentais para a manutenção do equilíbrio físico e cultural desse povo. Cientes desse fato, os Enawene Nawe vêm buscando através de diferentes instâncias governamentais o reconhecimento dos seus direitos sobre terras da região do rio Preto. Em 2003 a FUNAI chegou a informar sobre a instauração de
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Dados da OPAN - março de 2006.
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um Grupo de Trabalho (GT) para estudo dessa área. O GT acabou sendo cancelado em 2004 por causa de uma moratória que atingiu outras áreas indígenas em situação semelhante. A partir daí os Enawene Nawe iniciaram seus contatos com o Ministério Público e a própria FUNAI para garantir a instalação do GT. Na tentativa de conter as ações predatórias em seu território tradicional, também foram encaminhadas denúncias ao IBAMA sobre derrubadas irregulares. Nenhuma das tentativas teve resultados concretos. A dúvida dos Enawene Nawe é, quando finalmente se iniciarem os trabalhos de reconhecimento, não será tarde demais? Um dos representantes do povo, Marikerosene, manifesta que a questão é urgente: “Tem que ser rápido. Nossa terra está ficando feia, estão derrubando todas as árvores, vão jogar veneno na água, logo os peixes vão embora e não terá mais nada. Vou sentir saudades”. A construção de um complexo hidroelétrico no rio Juruena, próximo de sua área tem preocupado os Enawene Nawe. No curso do rio Juruena, estão previstas a construção de 9 (nove) PCHs e duas hidroelétricas. Cinco das PCHs atingirão de forma direta essa população. A primeira estará apenas há 20 km do limite sul da Terra Indígena. Os empreendimentos já possuem licença prévia e de implantação. O site da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) disponibiliza um cronograma para a realização das obras. Até o momento os Enawene Nawe não foram ouvidos sobre o tema. Conforme o administrador da FUNAI em Juína, Antônio Carlos de Aquino, as hidroelétricas estão sendo pleiteadas por grandes produtores da região e os processos tramitam na Coordenação Geral de Patrimônio Indígena e Meio Ambiente da FUNAI, em Brasília. Caso se concretize a construção destas usinas, o modo de vida Enawene Nawe será, sem dúvida, fortemente afetado, considerando que o peixe é um recurso natural e simbólico vital à ordem, manutenção e reprodução da sua organização social e se constitui no primeiro ponto mais vulnerável deste processo. É principalmente a partir das evidências do impacto sobre os peixes e sobre as atividades pesqueiras tão fundamentais à vida social Enawene Nawe,
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que eles definem argumentos e estratégias contrárias àqueles empreendimentos. Calculam os riscos da degradação dos seus recursos hídricos, que os setores governamentais, brasileiro e estadual, vêm desconsiderando ao incentivarem a construção das usinas. 5. Documentos consultados: BRASIL. Constituição Federal. 1988. Disponível em www.planalto.gov.br. CIMI. Arquivos do Conselho Indigenista Missionário - Regional Mato Grosso FORMAD. Arquivos do Fórum Mato-grossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento. MATO GROSSO. SEPLAN. Anuário Estatístico de Mato Grosso 2004. Vol.26. Cuiabá: SEPLAN-MT: Central de texto. 2005. MENDES, Artur Nobre. Terras Indígenas de MT. Setor Fundiário da FUNAI em Brasília-DF. Documento enviado (e-mail) em junho de 2005. OPAN - Arquivos e site da Operação Amazônia Nativa Relatório do Encontro do Movimento dos Povos Indígenas de Mato Grosso. Chapada dos Guimarães, 2005. Disponível site: www.formad.org.br/index.php/bibliotecas/ler/22
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A MINERAÇÃO EM MATO GROSSO Amintas Nazareth Rossete1
Introdução A “explosão demográfica” (DEMENY, 1987) verificada principalmente no século XX e a melhoria das condições gerais de infra-estrutura de uma parte da humanidade ocasionaram o aumento vertiginoso da demanda por bens minerais. Isto pode ser notado ao se observar as estatísticas de produção de metais. Segundo Spoel (1990), a produção de metais foi de 25 milhões de toneladas do início da civilização até 1750; 10 milhões de toneladas de 1750 a 1800; 100 milhões de 1800-50; 900 milhões de 1850 a 1900; 4 bilhões de 1900 a 1950; e de 5,8 bilhões de 1950-80. De acordo com McDivitt e Manners apud Suslick (1992), cada indivíduo consome em média, 20 toneladas anuais de matérias-primas minerais. Este consumo deve-se em grande parte à crescente industrialização, notadamente nos países do Hemisfério Norte, fenômeno este que teve seus primórdios com a Revolução Industrial do século XVIII (SUNKEL e PAZ, 1988), implicando numa explosão desenfreada da pesquisa e lavra dos bens minerais. Atuando como base de sustentação para a maioria dos segmentos industriais, a extração mineral desempenha hoje um papel fundamental na economia de diversos países, principalmente dos países em desenvolvimento que tem a mineração como uma importante fonte de geração de divisas, via exportação de minério, além de ser uma atividade geradora de empregos e impostos, representando, assim, um fator determinante para o desenvolvimento de um grande número de cidades e micro-regiões (MARQUES, 1993). No Brasil a atividade de extração mineral como um todo corresponde a US$ 28,0 bilhões, o que representa aproximadamente 4,20% do Produto Interno Bruto
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Deptº de Ciências Biológicas Campus Universitário de Nova Xavantina Universidade do Estado de Mato Grosso – UNEMAT. Membro do GT Mineração.
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(PIB) - brasileiro. Este valor do PIB, no entanto, não reflete a real importância do setor dentro da economia brasileira, já que ao se considerar as etapas de transformação do bem mineral (fases onde o produto é beneficiado para posterior aproveitamento industrial), esse valor sobe para aproximadamente 10,5% do PIB (SUMÁRIO, 2005). A mineração funciona como atividade matriz para setores como siderurgia, metalurgia, indústria cerâmica, cimenteira, química e de fertilizantes, dentre outros. Para efeito de comparação mais de 80% de toda a produção mineral da França é de agregados para a construção civil, (ARNOULD, 1989), enquanto no Brasil a produção dos minerais utilizados na construção civil é estimada em aproximadamente 15% (BRANDT, 1994). Este valor representa a somatória da participação em porcentagem na Produção Mineral Bruta (PMB) das substâncias Pedras Britadas e Ornamentais, Calcário, Argila e Areia. De acordo com Brandt, op. cit., deve-se ressaltar que a clandestinidade no setor de areia para construção no Brasil é da ordem de 90% em média, segundo estudos que levam em conta os índices de produção oficiais e o consumo teórico de areia. Dentro do conjunto dos minerais industriais que participam de todos os ramos da atividade humana merecem destaque aqueles utilizados na indústria da construção civil (pedra britada e ornamental, areia, calcário [cimento] e argila) que consome mais de 70% do total da produção mineral nacional em termos de valor. Para Dinelli (1988), pode-se afirmar a supremacia da construção civil no consumo de minérios e produtos de minérios industriais, pois além de demandar produtos apenas beneficiados ou “in natura”, caso da areia, requer também, um leque de produtos transformados. A significativa demanda por bens minerais ditos de uso imediato na construção civil deve-se tanto à crescente urbanização que ocorreu principalmente a partir da segunda metade do século XX, como também ao forte crescimento econômico ocorrido no mundo, particularmente nos países desenvolvidos. Mato Grosso que historicamente teve suas origens no ciclo de mineração do
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período colonial na busca de ouro e diamante, e mais recentemente na década de 70 e 80 com a vinda de levas de garimpeiros para o Norte mato-grossense e Baixada Cuiabana, atualmente tem sua principal produção mineral os de uso imediato, conforme Tabela 01. Tabela 01: Produção Mineral de Mato Grosso em 2004.
Quantidade
Classe/Substância Metálicos Ouro (Primário)
218 Kg
Ouro (Secundário)
85 Kg Não-Metálicos 72.522 103 L
Água Mineral Areia
46. 533 m3
Argila Comuns
809.420 t
Calcário (Rochas)
5.803.377 t
Dolomito
508.925 t 1.614.086 m3
Rochas (Britadas) e Cascalho Gemas e Diamantes Diamante (Secundário)
6.672 ct
Fonte: Anuário Mineral Brasileiro, 2005.
Dado a sua grande extensão territorial e à diversidade de sua Geologia, Mato Grosso possui uma vocação natural para a exploração mineral. Neste contexto entendemos que a atividade da mineração pode ser colocada dentro dos paradigmas do desenvolvimento sustentável. A Mineração e suas especificidades Segundo Sá (1991), a mineração compreende a pesquisa, o desenvolvimento e a lavra, bem como o transporte, manuseio, beneficiamento e toda infraestrutura necessária a essas operações, excluindo-se os processos de metalurgia e transformação. Estas atividades têm como finalidade última, o aproveitamento dos recursos minerais de forma econômica. De acordo com MMDS (2003, p. 04) os princípios para o desenvolvimento sustentável para a mineração acontecem em quatro esferas:
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Esfera econômica * Maximizar o bem estar da humanidade; * Assegurar o uso eficiente de todos os recursos, naturais ou outros, através da maximização de rendas; * Procurar identificar e assimilar custos ambientais e sociais; * Manter e melhorar as condições para a existência de empresas viáveis. Esfera social * Garantir uma distribuição justa dos custos e benefícios do desenvolvimento para todas as pessoas que vivem no planeta; * Respeitar e reforçar os direitos fundamentais dos seres humanos, incluindo liberdades civis e políticas, autonomia cultural, liberdades sociais e econômicas e segurança pessoal e procurar sustentar as melhorias no tempo; * Assegurar que a diminuição dos 55 recursos naturais não irá privar as gerações futuras, através da sua substituição por outras formas de capital”. Esfera Ambiental * Promover o manejo responsável dos recursos naturais e do meio ambiente, incluindo a reparação de danos anteriores; * Minimizar a quantidade de resíduos e danos ambientais em toda a cadeia de abastecimento; * Ser prudente nos locais em que os impactos são desconhecidos ou incertos e operar dentro dos limites ecológicos e proteger o capital natural crítico”. Esfera de governança: * Apoiar a democracia representativa, incluindo a tomada de decisões participadoras; * Estimular a livre empresa dentro de um sistema de normas claras e justas e incentivos; * Evitar concentração excessiva de poder, através de controles e contrapesos apropriados; Assegurar a transparência, proporcionando acesso aos atores e informações relevantes e corretas; * Garantir a responsabilidade por todas as decisões e ações que estão baseadas em análises amplas e confiáveis; * Estimular a cooperação, para gerar confiança e compartilhar objetivos e valores comuns e assegurar que as decisões são tomadas no nível apropriado, aderindo ao princípio da subsidiariedade quando possível”.
A mineração de maneira geral possui especificidades (BUCK e ELVER, 1970) que a tornam "única" entre os diversos tipos de atividades econômicas. A seguir é feita uma discussão destas peculiaridades, as quais sofrem modificações quando enfocadas para os bens minerais utilizados na construção civil.
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a) exaustão - característica típica da indústria de mineração está relacionada com a finitude de um depósito mineral, isto é, o depósito mineral tem um estoque limitado, cuja exploração é medida em termos de anos ou dezenas de anos, enquanto os processos de formação deste depósito são medidos em milhares a milhões de anos. Esta característica sine qua non para a totalidade dos depósitos minerais tem uma das exceções no caso dos depósitos de areia, principalmente nos localizados em ambientes fluviais e marinhos, onde os processos de erosão e sedimentação atuantes nestes sistemas fazem com que haja uma renovabilidade dos depósitos compatível com sua exploração. b) heterogeneidade na distribuição dos depósitos - os depósitos têm uma distribuição geográfica irregular entre regiões, países e continentes por tipo de depósitos e usos, sendo a principal conseqüência econômica disto o papel de funcionar como fonte de crescimento diferenciado entre economias regionais e/ou nacionais, além de gerar graus diferentes de dependência por bens minerais. Dada a relativa abundância de agregados para a construção civil na superfície terrestre, nenhum país sofre de desabastecimento de agregados, e apenas localmente, surgem questões de oferta e demanda destes produtos. c) alto risco na exploração, pesquisa e produção - a incerteza que caracteriza os investimentos nas fases de exploração e pesquisa, decorrentes das especificidades únicas para cada depósito, bem como a insegurança que existe na fase de produção, são típicos da indústria de mineração. No caso dos agregados, tanto para argila como para a areia, tal afirmativa tem sua veracidade questionada, pois seus depósitos minerais destes bens minerais são relativamente fáceis de prospectar e não envolvem tecnologias avançadas nem onerosas na exploração. d) caráter multinacional - no setor mineral existe uma tendência à especialização de empresas em determinados bens minerais com um alto grau de verticalização e, dentro de uma tendência de globalização da economia, estas empresas atuam no mundo todo. Embora não seja específico da indústria de mineração, o caráter multinacional neste setor é bastante acentuado e de grande importância. Esta também não é uma característica no caso de mineração de agregados, por ser uma atividade de cunho local, e essencialmente dominada
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por empresas de porte pequeno ou médio. e) necessidade de capital intensivo e longo período de maturação para o desenvolvimento dos depósitos - da descoberta do depósito até o seu efetivo aproveitamento gasta-se em média 10 anos com alto investimento de capital. Mais uma vez, a extração de areia e argila para a construção civil é uma exceção, visto que, em sua maioria, não necessita de grandes investimentos de exploração e/ou explotação e o investimento tem um rápido retorno, já que a produção dos depósitos é quase que imediata e com baixos investimentos. No Brasil, a indústria extrativa de areia para construção civil é tipicamente de pequeno porte, excepcionalmente de médio a grande porte. Há casos de grandes empresas que operam um conjunto de vários empreendimentos pequenos. f) aparente conflito entre a mineração e o meio ambiente - a atividade mineradora é, por essência, modificadora do meio ambiente. Por tratar-se de uma atividade desenvolvida por necessidade normalmente próxima aos centros urbanos (devido à alta relação custo do transporte/custo do bem), a mineração de agregados apresenta-se mais visível à maior parte da população, gerando maior pressão da sociedade contra os possíveis impactos ambientais. Além do que, a atividade mineradora acaba competindo com outros tipos de atividade econômica no uso e ocupação da terra. Neste item específico já ficou comprovado que a mineração de agregados é potencialmente, em sua maior parte, restituidora dos espaços por ela antes ocupados. g) rigidez locacional - os bens minerais são encontrados em locais onde a interação de fatores físicos, químicos e geológicos permitem o seu acúmulo em tal quantidade e teor que podem ser extraídos, se as condições sociais, políticas e econômicas lhe forem favoráveis. Neste item a mineração de agregados não difere em nada dos outros tipos de bens minerais. Para os agregados, tal característica, causa graves prejuízos por fazer com que depósitos sejam rapidamente “esterilizados” devido a ocupação de áreas potencialmente promissoras por outros tipos de atividade econômica. Como vimos, as características da mineração como um todo nem sempre são válidas para a mineração de agregados em áreas urbanas. Esta última possui
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especificidades tais como: a) abundância relativa - devido a sua abundância e larga ocorrência, os agregados são tratados dentro de uma concepção de que se pode encontrá-los em qualquer lugar. b) baixo índice de rejeitos - nas atividades de explotação dos depósitos de agregados, em sua maioria, o volume de rejeitos é pequeno, com índices que chegam a menos de 5% do extraído, gerando uma baixa relação rejeito/minério. c) simplicidade de lavra e beneficiamento - geralmente, com poucas operações de lavra e equipamentos se consegue a explotação dos agregados, principalmente no caso da areia. Em termos de beneficiamento, por exemplo, basta um simples peneiramento para a areia estar pronta para utilização. d) baixo valor unitário - esta característica decorre principalmente de duas das características citadas acima: sua relativa abundância, onde está embutido o conceito econômico de oferta/demanda, e a simplicidade de lavra e beneficiamento, o que implica em baixos custos de extração. Devido a esta característica, tem-se como conseqüência um relativo desprezo do empresariado em investir no setor, além de se preferir outras atividades em detrimento desta. e) volume específico alto - por ser um material empregado geralmente em grandes quantidades e por terem um alto volume específico, isto faz com que os custos no seu transporte sejam um elemento de elevação em seus preços. f) alto valor local - esta característica está relacionada com o custo de transporte que aumenta em relação com a distância do local de extração. Em geral, segundo Martins (1994), quanto mais baixo for o valor monetário no local ou na mina, mais alto será o valor local. De acordo com Martins (1991), os agregados têm como limites médios de transporte as distâncias de 50 km para brita, ou 100 km para areia. Outras características podem ser destacadas, de acordo com Tonso (1994, p. 25): - inicialmente, a mineração urbana está lidando com terras de relativamente alto valor comercial, ou no mínimo e, de acordo com a velocidade dos processos de urbanização, com um alto potencial para um futuro não muito distante; - mesmo utilizando pouco maquinário, estes dão ao empreendimento um caráter de indústria pesada que a coloca em conflito com as regiões e usos mais “nobres” do território;
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- os materiais agregados, pela sua característica de utilização e pelo baixo valor unitário, são extraídos em larga escala, implicando na movimentação de grande quantidade de material.
Pela importância dos minerais, como visto anteriormente e particularmente no caso dos bens minerais utilizados na construção civil, se faz necessário, o uso eficiente e conservativo destes recursos, o que pressupõe novas formas de planejar sua exploração. Considerações finais Cada vez mais se fazem necessários estudos que possam dar subsídios e compreender a dinâmica das atividades humanas em prol de um desenvolvimento que busque o uso sustentável dos recursos naturais. A mineração por suas características e especificidades assume um papel relevante nas discussões sobre a manutenção dos estoques de recursos naturais para as gerações futuras, fazendo com que seja de fundamental importância a compreensão das interações socioambientais dentro do Estado de Mato Grosso a fim de que possamos implementar um modelo de utilização destes recursos o mais conservacionista possível. Bibliografia ARNOULD, M. Estudo do impacto da mineração sobre o meio ambiente na França: Legislação, Reabilitação de áreas, Balanço de 10 anos de experiência. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL SOBRE MINERAÇÃO EM ÁREAS URBANAS, São Paulo.Anais... São Paulo, Prominério/DNPM, out. 1989. p 21-24. BRANDT, W.(Coord.)- PROJETO BRA/90/005 Diretrizes Ambientais para a mineração Segmento: Bens Minerais de Uso Social. s.l.p. Brasil: M.M.E.R.H.A.L.1994, 66p. BUCK, W.K.; ELVER, R.B. An Approach to Mineral Policy Formulation. Mineral Information Bulletin, Ottawa. 15p. 1970. (MR 108, Mineral Resources Branon, Departament of Energy, Mines and Resources, Ottawa, Canadá). DEMENY, P. Population Change: Global Trends and Implications. In: McLaren, D.J.; Skinner, B.J. (eds), Resources and Word Development. New York: John Wiley & Sons, 1987. p. 29-48. 44
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DINELLI, H. M. - Mercado potencial para minérios industriais. Brasil Mineral, São Paulo. n . 55, p. 3845. Junho/1988. DEPARTAMENTO NACIONAL DA PRODUÇÃO MINERAL (BRASIL). Sumario Mineral Brasileiro 2005. Disponível em: http://www.dnpm.gov.br/portal/assets/galeriadocumento/sumariomineral2005/ Sumário%20Executivo%20-%20Parte%20I% 202005.pdf. Acesso: 14/04/2006. DEPARTAMENTO NACIONAL DA PRODUÇÃO MINERAL (BRASIL). Anuário Mineral Brasileiro 2005. Disponível em: http://www.dnpm.gov.br/portal/assets/galeriaDocumento/AMB2005/ ParteII_UF/MT_Parte_II_(2005).pdf Acesso: 14/04/2006. MARQUES, M. - A importância da mineração para a economia do Brasil. Brasil Mineral, São Paulo, Ed. Especial . Set./ 1993. MARTINS, L.A.M. Materiais de construção e outras matérias brutas. Campinas: Unicamp, 1994. 98p.(Bloco 2). MARTINS, L.A.M. O ambiente urbano e a produção de agregados minerais. In: ENCONTRO NACIONAL DE ESTUDOS SOBRE O MEIO AMBIENTE, 3, 1991, Londrina. Anais... Londrina, Universidade Estadual do Paraná, 1991. p. 697-706. Vol. 1 Comunicações. McDIVITT,J; MANNERS, G. apud: SUSLICK, S.B. Geociências: um ensaio preliminar de avaliação e perspectiva. Revista do Instituto Geológico, São Paulo, Vol. 13, no 1, p. 69-81, 1992. MMDS – Mineração, Minerais e Desenvolvimento Sustentável (2003). Abrindo novos caminhos – Mineração, Minerais e Desenvolvimento Sustentável. Disponível em: < http://www.iied.org/mmsd/ mmsd_pdfs/ab/anc_sumario.pdf > Acesso em: 18/06/2005. SÁ, T.D. Conceitos Básicos: Mineração X Meio Ambiente, importância do Estudo Ambiental. In: Curso de Meio Ambiente, Campina Grande: UFP, 1991. 40p. (Módulo 1 - 1a e 2a partes). SPOEL, H., The current status of scrap metal recycling: Journal of Metals, Vol. 42, no 4, p. 38-41, 1990. SUNKEL, O; PAZ, P. El subdesarrolo latino americano e la Teoria del desarollo. 22a ed.. México: Siglo XXI, 1988. 385p. TONSO, S. As pedreiras no espaço urbano: perspectivas construtivas. Campinas, 1994. 131p, Dissertação de Mestrado em Geociências. IG - UNICAMP.
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RECURSOS HÍDRICOS EM MATO GROSSO: O DESAFIO DA DEMOCRACIA E DA SUSTENTABILIDADE Solange Ikeda Castrillon1 Cláudia Regina Sala de Pinho Nelci Eliete Longhi Nataly Manrique Rocha Rodrigo Ferreira de Morais Andréa Ikeda Claudinéia Lizieri dos Santos
Seguindo as orientações do projeto Mato Grosso Sustentável e Democrático (MTSD) que se fundamenta em dois conceitos principais: sustentabilidade e democracia, dos quais derivam outros, que são complementares no sentido do conhecimento e perspectiva política, apresentamos neste texto algumas experiências que levaram a um amplo debate sobre a questão das águas em Mato Grosso. Algumas estão relacionadas ao Festival Ecológico e Cultural das Águas de Mato Grosso, que ocorreu entre 2003 e 2005, nas versões: Pantanal, Araguaia e Amazônia. Foram eventos que em seu bojo discutiram o projeto MTSD nas oficinas e nos espaços de diálogos. Também serão apresentados alguns conflitos e projetos alternativos nas Bacias Hidrográficas deste Estado. 1. Os recursos hídricos na legislação brasileira O Brasil é o país mais rico do mundo em termos de reservas hídricas, com 13,7% da água doce disponível no planeta. Possui dois fenômenos ambientais globalmente singulares, o Pantanal, que é a maior área úmida continental do mundo e na Amazônia estão as maiores florestas inundadas (WWF-Brasil, 2005). Por suas dimensões continentais e diversidade geográfica, apresenta situações bastante distintas quanto à disponibilidade hídrica, sendo afetado tanto pela escassez, quanto pela degradação dos recursos causada pela poluição de origem doméstica e industrial. 1
Membros do GT Recursos Hídricos, no projeto MTSD
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O acesso à água é um direito de todos e também é responsabilidade da coletividade assegurar as condições necessárias e indispensáveis para garantir este direito a toda humanidade. Ter acesso à água não é uma questão de consumo. A exigência de um uso racional e responsável de um bem comum e fundamental para todos, é mais comprometedora daquela que um consumidor racional pode ter em relação a um recurso/mercadoria, ao qual a economia de mercado concede o poder de poluição e de destruição do próprio recurso na medida em que paga (PETRELLA, 2004). Petrella (2004) defende a necessidade de uma política alternativa da água, pois significa um direito à vida. Isto indica que as autoridades públicas têm a missão/dever de mobilizar os recursos, sobretudo financeiros, para satisfazer esse direito. A democracia necessita de um público novo, participativo e solidário que defina e realize a política da água, do âmbito local ao mundial. No Brasil, a Lei nº 9.433, de 8 de Janeiro de 1997, instituiu a Política Nacional de Recursos Hídricos e criou o Conselho Nacional de Recursos Hídricos e o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, um de seus objetivos é assegurar à atual e às futuras gerações a necessária disponibilidade de água, em padrões de qualidade adequados aos respectivos usos. O Fórum Nacional de Comitês de Bacias Hidrográficas e WWF-Brasil (2005), consideram que, com a aprovação da Lei 9.433, a legislação brasileira, neste setor, tornou-se uma das mais avançadas do mundo. Reconhecem, porém, que o Sistema nasceu incompleto. O início da sua implementação foi apontando, segundo o Fórum, outros desafios, como a efetiva participação da sociedade no processo decisório; a implantação da gestão compartilhada e harmonizada, e a construção de uma lógica territorial de gestão integrada dos usos múltiplos. A Conferência Nacional de Meio Ambiente de 2005, reforçou em suas deliberações que estes desafios estão ainda em pauta, ao discutir o Plano Nacional de Recursos Hídricos sugere que há necessidade de assegurar por meio de instrumentos efetivos uma ampla participação e controle socioambiental, respeitando a paridade entre poder público e sociedade civil. A Conferência deliberou que sob a competência do Ministério do Meio Ambiente existe a
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necessidade de integrar a política de recursos hídricos com as demais políticas setoriais (federal, estadual, do Distrito Federal e municipais) de saneamento, saúde, meio ambiente, educação e energia. As deliberações sobre o tema água e recursos hídricos desta Conferência demonstra uma urgente necessidade de se viabilizar propostas para a conservação das águas, propondo: “Assegurar a implantação de programas nacionais, estaduais e municipais inclusive de educação ambiental - que contemplem a bacia hidrográfica como unidade territorial de gestão e planejamento para a harmonização, adequação e integração das políticas públicas relacionadas ao uso da água, priorizando a conservação dos recursos hídricos e recuperação dos ecossistemas associados, garantindo a ampla divulgação por meio de diversos veículos de comunicação e audiências públicas aprovadas pelos respectivos Comitês de Bacias Hidrográficas.”
O Movimento denominado Grito das Águas nasceu em 22 de março de 1999, no dia Mundial da Água (MORELI, 2004). O autor relata a importância da manifestação popular em defesa das águas, e considera que a escolha da Água, em 2004, como tema da Campanha da Fraternidade, representa um importante avanço na sensibilização da crise da água que se agrava em todo planeta. Foram 30 mil comunidades em oito mil paróquias que refletiram sobre o tema em todo Brasil. Várias vozes ecoaram nos últimos anos ao mesmo tempo, discutindo o desafio das águas no presente e futuro, através de Fóruns, Simpósios, Congressos, Festivais, Manifestações Internacionais e Nacionais. Acesso à água como direito humano fundamental, a garantia do múltiplo uso e o cuidado com este recurso limitado é uma bandeira de luta dos movimentos sociais e faz parte dos objetivos das parcerias entre poder público e ONGs, das iniciativas individuais e coletivas de diversos segmentos da sociedade e deve ser valorizada. 2. Conflitos e desafios das águas de Mato Grosso Ao se afirmar a impossibilidade de isolar questões ambientais como se fossem problemas em si mesmos, desconectadas das questões econômicas, sociais e culturais, reafirmamos que o enfrentamento das questões ambientais 48
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passa pela mudança do modelo de desenvolvimento e dos padrões de produção e consumo. Acselrad (2004) afirma que os conflitos ambientais devem ser analisados, simultaneamente nos espaços de apropriação material e simbólica dos recursos do território. No espaço de apropriação material, desenvolvem-se lutas sociais, econômicas e políticas pela apropriação de diferentes tipos de capital, como, por exemplo, no meio ambiente, disputas por apropriação dos rios entre populações ribeirinhas e grandes projetos hidroelétricos, confrontos entre seringueiros e latifundiários pelo controle de seringais, etc. No campo simbólico a luta é para impor as categorias que legitimam ou não, a distribuição de poder sobre os distintos tipos de capital. O intenso desmatamento no Estado nas décadas de 1970 e 80, conseqüência do modelo desenvolvimentista de integração da região estava pautado em políticas de ocupação com a implantação de grandes projetos de: colonização, mineração, usinas hidroelétricas, rodovias e agropecuária (ALENCAR, 2004). O modelo provocou conflitos, gerou impactos ambientais nos ecossistemas com o deslocamento de populações indígenas, ribeirinhas, tradicionais e pequenos produtores, intensificando perdas culturais e biológicas, reduzindo a disponibilidade de água, danificando os solos, etc. 2. 1. Barragens e Hidrelétricas Uma deliberação da Conferência Nacional do Meio Ambiente de 2005, determinou a “suspensão imediata de todos os empreendimentos para aproveitamento hidrelétrico, inclusive as PCHs, ainda não iniciadas, até que o EIA/RIMA seja realizado, bem como a proibição destas instalações em unidades de conservação, áreas indígenas e comunidades tradicionais, garantindo a efetiva participação popular, principalmente, das populações ameaçadas e/ou atingidas pelas barragens.” Apesar da ilegalidade destas obras e da ratificação do movimento ambientalista e demais segmentos que participaram da Conferência, na mesma época, índios de várias etnias do Parque Nacional do Xingu ameaçavam entrar em guerra se continuassem as obras de uma hidrelétrica no rio Culuene, um dos
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mais importantes afluentes do rio Xingu e a principal fonte de alimento das aldeias. A hidrelétrica de pequeno porte resultou de um acordo entre a empresa Paranatinga Energia, o governo do Estado e algumas lideranças indígenas. O acordo foi contestado depois pela maioria das 14 etnias existentes no Xingu e a maior parte dos caciques que o tinham assinado. O local é sagrado para os índios - onde teria nascido o Quarup, maior celebração religiosa da tradição Xingu, um ritual em homenagem aos mortos. Apesar das medidas impetradas pela Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e pelo Ministério Público Federal (MPF), o acordo entre índios, Estado e empresa está sendo cumprido e obras da hidrelétrica continuam no conflito criado. Vainer (2004) relata em “Águas para vida, não para a morte” que nos anos 80 cresceram em diferentes regiões a organização e as reivindicações dos atingidos por barragens contra as injustiças às populações desabrigadas. Em 1989, reuniuse em Goiânia, o I Encontro Nacional de Trabalhadores Atingidos por Barragens. A carta da resolução final do evento expressa o nascimento de um movimento nacional que reúne as reivindicações dos atingidos por barragens e a busca de uma política energética nacional com democracia. Em 1992, o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) se consolida em um movimento nacional no I Congresso Nacional de Atingidos por Barragens. Em Mato Grosso, o MAB nasceu em decorrência da barragem do rio Manso, principal afluente do rio Cuiabá. A história da construção da Usina de Manso é herança das faraônicas obras de infra-estrutura planejadas pelo governo militar (ARINI, 2005). Em 1998 esta barragem foi inaugurada para gerar eletricidade, controlar as enchentes e irrigar lavouras, hortas e pomares. Sua área de alagamento é de 427 Km2. Apesar do grande reservatório que, segundo dados de Furnas a UHE, tem capacidade de geração de até 212 megawats (MW), a usina produz de forma fixa apenas 97 MW de energia, ou o equivalente a três pequenas centrais elétricas com represamento de áreas até cem vezes menores. Foi denunciada por irregularidades na Licença Ambiental para operar. Em 2004 o MAB informava que existiam 1.065 famílias atingidas pela Usina Hidrelétrica de Manso, que perderam tudo com a construção da obra, mas
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somente 249, em princípio, foram reassentadas em cinco diferentes áreas. Levantamentos técnicos de uma comissão independente revelaram que 92% do solo dos re-assentamentos era formado por areia, impróprio para a agricultura. Em dezembro de 2005, o MAB montou acampamento na Usina de Manso para reivindicar o cumprimento dos acordos firmados com Furnas, após a construção da barragem. Das famílias retiradas da área, mais da metade ainda não haviam recebido suas terras. Os impactos ambientais produzidos por essa barragem vêm sendo denunciados por ambientalistas e pesquisadores desde o início da obra, tanto pelas mudanças no sistema de inundação do pantanal e na bacia onde está inserida, com destruição de habitats, extinção de espécies, diminuição de populações de peixes; quanto em impactos sociais na área de alagamento e a jusante onde moradores dependem do ciclo natural das águas para sobreviver. Silveira (2004) observou que o represamento do Rio Manso provocou alterações nas características ecológicas, no uso da água e na biodiversidade aquática conforme os dados registrados na comunidade do Sítio Santa Rita. A pesquisadora afirma que esta população possui uma grande dependência ecológica e cultural do sistema hídrico do rio Cuiabá e atualmente vive as conseqüências negativas da barragem e nem usufrui os benefícios da energia elétrica produzida. As denúncias de populações tradicionais ribeirinhas, como as da comunidade Bom Sucesso, viram notícias de jornais a cada vez que não se percebe o ciclo natural das águas do Pantanal, a diminuição de estoques pesqueiros e mudanças ecológicas em processos como a piracema. Em 2005 mais uma polêmica relacionada à instalação de uma hidrelétrica inicia a partir de uma batalha judicial, a AHE Dardanelos. Esta usina produziria cerca de 261 MW, através do aproveitamento do rio Aripuanã, na grande queda natural denominada “Salto de Dardanelos”. O Município e o rio Aripuanã são bastante conhecidos em Mato Grosso pela grande quantidade e diversidade de peixes, e, principalmente, pela enorme beleza de suas diversas quedas d'água que possuem uma beleza cênica impressionante como Dardanelos e Andorinhas, de fácil acesso à população local e
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turistas. Foram estas belezas que incluíram Aripuanã no Proecotur, o programa de ecoturismo na Amazônia iniciado, em 2000. A região foi classificada pelo Ministério do Meio Ambiente como de prioridade "extremamente alta" para a conservação da biodiversidade (ÂNGELO & ARINI, 2006). O Ministério Público do Estado de Mato Grosso, via Promotoria de Justiça de Aripuanã, propôs ação questionando o Estudo e relatório de impacto ambiental (EIA/Rima) referente ao Aproveitamento Hidrelétrico Dardanelos, que teria sido elaborado com irregularidades técnicas e formais. A equipe de peritos composta por pesquisadores de diversas Universidades constatou que vários quesitos necessários ao atendimento do EIA/RIMA não foram atendidos. Constataram que as análises sócio-econômico-ambientais da Área de Influência Indireta não contemplam devidamente os impactos positivos e negativos que serão produzidos na região. No que se refere à Área de Influência Direta, os estudos foram feitos dividindo-a em dois ambientes restritos: a primeira, meio físico biótico, ligada exclusivamente à área de interferência ocasionada pelas obras, isto é, não existe nenhuma análise sobre a influência do empreendimento após a construção; o segundo ambiente abordado diz respeito ao sócioeconômico, que sem esclarecer qual paradigma que fundamentou a área delimitada, transforma este tipo de análise, certamente complexo. Muito pouco foi analisado para verificar a relação entre os interesses em conflito envolvendo a população local, regional e o Estado, isto é, não foram considerados os elementos relacionados ao uso das cachoeiras e dos recursos naturais a ela associados.
No próprio EIA-Rima da hidrelétrica de Dardanelos, preparado pela Eletronorte e pela construtora Norberto Odebrecht, dos 83 impactos descritos no relatório, 72 eram negativos, segundo o parecer dos peritos, ainda ocorre a inoperância da hidrelétrica no mínimo de 3 meses/ano, por falta de vazão d´água. Os Ministérios Público Estadual e Federal chegaram à conclusão que o EIA/RIMAnão demonstrou a viabilidade do empreendimento, pois não realizou estudos sobre as linhas de transmissão, isso equivale dizer que não comprovou 52
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sua viabilidade ambiental, pois o preço da energia com os valores e custos da linha de transmissão chegará ao consumidor de outra forma que a disposta no EIA/RIMA. Mesmo com os diversos questionamentos e a equipe técnica da Secretaria Estadual de Meio Ambiente (SEMA) verificando falhas no EIA-Rima, estabelecendo 24 condicionantes para a liberação de Licença Prévia, que não foram atendidos em tempo, a própria SEMA e a Assembléia Legislativa do Estado concederam a Licença Prévia em meados de 2006 e a AHE Dardanelos foi a leilão. Os conflitos a respeito desta obra deverão continuar até a sua execução e mesmo após sua construção. 2.2 Zoneamento Sócio Econômico Ecológico Em 1995 o Governo do Estado implantou o projeto do Zoneamento Sócio Econômico Ecológico do Estado de Mato Grosso (ZSEE-MT). A proposta de ZSEE-MT e a minuta de projeto de Lei que o regulamenta encontram-se disponíveis no site da Secretaria de Planejamento do Estado de Mato Grosso (SEPLAN), apesar da minuta de Lei e do relatório ter sido disponibilizado em 2004, em 2006, ainda não foram regulamentados. No relatório do ZSEE-MT, são elencadas áreas com comprometimento da qualidade da água por esgoto doméstico, por herbicidas e agrotóxicos, por garimpo de ouro e por outras minerações. Consta também a necessidade de recuperação de praticamente todas as nascentes dos rios do Estado, que atualmente estão degradadas e desmatadas. Segundo o ZSEE-MT, a qualidade da água na Bacia Amazônica está comprometida principalmente por garimpo de ouro, herbicidas e agrotóxicos e as Bacias dos rios Araguaia e Paraguai, com esgoto doméstico. O garimpo se desenvolveu principalmente na região do município de Peixoto de Azevedo, contaminado extensas áreas. O esgoto doméstico afeta principalmente a região de Cuiabá e Várzea Grande entre outros municípios, com maior aglomeração urbana. O atual modelo de desenvolvimento do Estado contribui para o crescente desmatamento e uso de agrotóxicos, que contaminam nascentes, rios e o lençol
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freático principalmente no planalto da Bacia do Alto Paraguai. Estes por sua vez chegam até a planície pantaneira causando danos ao ambiente e à saúde. 2.3 Hidrovia Paraguai Paraná Na década de 1980 o projeto inicial da Hidrovia Paraguai Paraná envolveria 5 países da bacia do Prata: Bolívia, Brasil, Paraguai, Uruguai e Argentina e previa a execução de centenas de obras de dragagens, derrocamento, retificação de curvas (aumentando o raio) dos rios Paraná e Paraguai, a partir do município de Cáceres. A via atravessaria 1.300 quilômetros do Pantanal até Nueva Palmira, no Uruguai. O propósito seria permitir o tráfego de barcaças 24 horas por dia, durante os 365 dias do ano. Desde sua proposição a hidrovia Paraguai-Paraná, vem sendo questionada por pesquisadores, comunidades locais e movimentos sociais, ambientais de todo mundo e diversos estudos sobre impactos ecológicos e culturais vêm provando a inviabilidade do transporte de comboios de chatas no sistema pantaneiro. Em curso desde 2000, a iniciativa aposta na integração para promover o desenvolvimento econômico da região. No entanto, inúmeros questionamentos em torno da relação custo-benefício do transporte hidroviário, e sua conexão com outros meios, têm sido levantados. A Coalizão Rios Vivos e outras entidades tornaram públicas as inúmeras conseqüências negativas possíveis da hidrovia Paraguai-Paraná. O movimento resultou no abandono do projeto da hidrovia no Pantanal, até sua proposta de retomada pela Iniciativa de Integração de Infra-estrutura Regional Sul-Americana (IIRSA). Atualmente, diversas propostas de ampliação e construção de novas hidrovias, previstas na IIRSA e no Plano Plurianual (PPA) do governo federal (2004 - 2007), têm mobilizado ONGs nas discussões dos impactos das obras propostas (PAIM, 2003). Atualmente, após decisão judicial, um novo Estudo de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) deverá ser feito considerando todo o trecho da hidrovia. A justiça também determinou que o Licenciamento Ambiental para que a hidrovia comece a operar seja analisado pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
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Recursos Naturais Renováveis (IBAMA). A decisão da justiça foi uma vitória do movimento socioambientalista, que durante anos tentou barrar o projeto que acontecia camuflado, com obras isoladas e licenciamentos ambientais estaduais. Em Cáceres-MT, houve o fortalecimento do movimento sócio ambiental a partir da mobilização em defesa do rio Paraguai, através de uma manifestação de diversos movimentos sociais ocorrido em 14 de novembro de 2000, contra a instalação de um Porto que serviria de base para a implementação da hidrovia Paraguai-Paraná. A construção do Porto foi barrada pela Justiça Federal e seguiram-se diversos eventos em que se debateu a situação do Pantanal Matogrossense e a necessidade de sua conservação (VIANA, 2001). Em 14 de fevereiro de 2001 realizou-se “O Encontro Internacional da Sociedade em Defesa do Rio Paraguai” questionando a implantação da Hidrovia Paraguai-Paraná. Vários especialistas e movimentos sociais participaram do evento com representantes da Argentina, Bolívia, Paraguai e Brasil e mostraram preocupações com o destino da população que depende do rio para sobreviver. Em 14 de novembro do ano de 2001, o Fórum de Luta das Entidades de Cáceres (FLEC), organizou a celebração do “Dia do Rio Paraguai”, comemorando um ano da resistência da comunidade em defesa das águas. A partir desta experiência, foi proposto o Festival Ecológico e Cultural das Águas de Mato Grosso, como um espaço para o diálogo contínuo sobre as questões ambientais nas três principais Bacias do Estado. Articulando a academia, movimentos sociais, indígenas e ambientais, em 2003, ocorreu o Festival das Águas do Pantanal, em 2004, o Festival das Águas do Araguaia e em 2005, a versão Águas da Amazônia Mato-grossense em Alta Floresta. A mobilização e a discussão nos três eventos foram intensas, mostrando, em regiões distintas do Estado, a necessidade e a urgência de modelos sustentáveis para a água. Destacamos trechos da Carta das Águas do Araguaia (2004): Temos o dever de chamar a atenção de todos e todas que há uma campanha orquestrada mundialmente no sentido de construir uma aceitação de políticas que visam, sobretudo, privatizar as águas de todo o mundo. De nossa parte, declaramos que há uma crise que envolve esse precioso elemento da natureza, mas que essa crise não autoriza concluir que, para resolvê-la haverá de privatizar as águas. Declaramos
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enfaticamente, com base em pesquisas científicas e de reflexões de ordem filosófica que a água não é simplesmente recurso hídrico, mas que é parte da vida e, como tal, não pode ser alienada e separada da totalidade da natureza (...) O Estado de Mato Grosso tem uma responsabilidade especial perante a humanidade (...) as duas maiores áreas continentais alagadas do planeta – o Pantanal e o Araguaia – dependem da dinâmica socioambiental direta de nosso Estado (...) A maior ameaça que paira sobre o imenso patrimônio de água deste pequeno pedaço do planeta que nos cabe cuidar é o modelo de desenvolvimento econômico com base no grande latifúndio produtivo de monocultura, de desigualdade social e de violência.
A Hidrovia no rio Araguaia também vem sendo questionada em Mato Grosso, e o movimento de resistência se empodera da luta e da poesia de D. Pedro Casaldáliga que proclama: “Nossas vidas são os rios”. 3. Desafios Coordenar o debate deste tema, em um Estado tão grande como nosso, é um desafio e uma necessidade do GT Recursos Hídricos do projeto como o Mato Grosso Sustentável de Democrático. Não faremos este diálogo e debate considerando a água apenas como um recurso. Ao lembrar da sensação que tivemos no Araguaia junto com Dom Pedro Casaldáliga, Carlos Walter, Roberto Malvezzi, Marcelo Barros, Severiá, Samuel Karajá e tantos outros companheiros, sabemos que as nossas águas são realmente as nossas vidas, de todas as formas, em todos os lugares. Ao caminhar pelo Estado sabemos também de diversas iniciativas que estão contribuindo com a conservação das nossas águas, projetos como: Aquabio, “Y Ikatu Xingu”, revitalização dos rios Araguaia – Tocantins, iniciativas de comitês de bacias, reorganização da Reserva da Biosfera do Pantanal e muitas outras que contribuem para uma sociedade Democrática e Sustentável. 4. Referencias Bibliográficas ACSELRAD, Henri. As práticas espaciais e o campo dos conflitos ambientais. In: Acselrad, Henri (org.). Conflitos ambientais no Brasil. Rio de Janeiro: Relume Dumará: Fundação Heinrich Böll, 2004.
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ANÁLISE DO DESMATAMENTO NAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO NO ESTADO DO MATO GROSSO 1
Roberta Roxilene dos Santos Laurent Micol Gustavo V. Irgang Jane M. Vasconcellos
O Estado de Mato Grosso, com uma área total de 905 mil km², possui alta biodiversidade, com a presença de três grandes tipologias vegetais: Floresta Amazônica (423 mil km²), Cerrado (331 mil km²) e Floresta de Transição (145 mil km²). O desmatamento acumulado até 2005 atingiu 32,4% da área de Floresta, 40,0% da área de Cerrado e 34,5% da área de Transição. Do total de 585 mil km² de cobertura vegetal original remanescente, 6,5% encontram-se protegidos pelas 42 Unidades de Conservação (UCs) existentes no Estado (), que somam 41 mil km², cobrindo 4,6% do território estadual. Desta extensão, 30,8 mil km² representam categorias de manejo de Proteção Integral e apenas 10,2 mil km², são de Uso Sustentável. O governo estadual criou e administra 35 destas UCs (29 de Proteção Integral e 6 de Uso Sustentável), enquanto 7 unidades (6 de Proteção Integral e 1 de Uso Sustentável) são federais. As Unidades de Conservação são instrumentos legais de conservação da natureza, amplamente adotados pela maior parte dos países, constituindo-se na mais importante estratégia mundial para a proteção da biodiversidade. Segundo a Lei que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), as Unidades de Conservação são espaços territoriais e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituídos pelo Poder Público, com objetivos de 1
Roberta Roxilene dos Santos é Geógrafa e Analista de SIG do ICV; Gustavo Irgang é Geógrafo, e Coordenador Programa Conservação - ICV; Jane M Vasconcellos é Bióloga, Consultora sobre Conservação e conselheira do ICV; Laurent Micol é coordenador adjunto ICV.
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conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, aos quais se aplicam garantias adequadas de proteção. A Lei do SNUC também estabelece que no entorno das UCs, exceto Área de Proteção Ambiental (APA) e Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN), deve haver uma Zona de Amortecimento, com normas específicas regulamentando a sua ocupação e o uso dos recursos. Diante do crescimento desordenado da ocupação territorial – causa de sérios conflitos entre a conservação do patrimônio natural, que deveria ser um bem comum de todos, e o uso e apropriação dos espaços pelo homem – as áreas legalmente protegidas desempenham um papel essencial no ordenamento territorial. Embora muitas destas áreas ainda não estejam efetivamente implantadas, elas vêm-se demonstrando muito eficazes para a conservação ambiental. Mato Grosso tem ocupado o posto de campeão dos desmatamentos da Amazônia, como demonstram os dados da: 14.000 Acre
Desmatamento (km²)
12.000 Amapá
10.000
Amazonas
8.000
Maranhão Mato Grosso
6.000
Pará
4.000
Rondônia
2.000
Roraima Tocantins
2004
2005
2002
2003
2000
2001
1998
1999
1996
1997
1994
1995
1992
1993
1990
1991
1988
1989
0
Ano
Figura . Evolução da taxa do desmatamento nos Estados da Amazônia, INPE - 2005
Neste contexto, cresce a importância das unidades de conservação como instrumentos eficazes para reverter este quadro, contendo o avanço do desmatamento local e regional. O presente trabalho pretende demonstrar esta importância e identificar as unidades em situação mais crítica em relação ao desmatamento, reforçando a necessidade de sua plena efetivação, além da urgente criação de novas áreas legalmente protegidas como Ucs.
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Objetivo Geral Identificar a eficácia das Unidades de Conservação do Estado de Mato Grosso como barreiras ao avanço do desmatamento local. Objetivos Específicos • Analisar a dinâmica do desmatamento nas Unidades de Conservação e seu entorno, num raio de 10 km. • Quantificar, de forma comparativa, os desmatamentos ocorridos no interior das Unidades e no seu entorno, antes e depois da sua criação. • Identificar a situação das Unidades de Conservação e categorias de manejo quanto a sua eficácia na proteção da cobertura vegetal nativa.
Figura Unidades de conservação no Estado do Mato Grosso 2
Método e Fontes de Dados
Para análise do desmatamento nas Unidades de Conservação (UCs) do Estado de Mato Grosso, utilizou-se as bases de dados cartográficos digital de 2006, fornecidas pela Secretaria de Estadual do Meio Ambiente (SEMA-MT). 2
Agradecemos à Secretaria de Estado de Meio Ambiente do Mato Grosso pela presteza na cessão dos dados espaciais. Ao Ibama pelas informações e à Dra. Jane Maria de Oliveira Vasconcellos pelo apoio à elaboração deste estudo.
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O processo de análise espacial envolveu duas etapas distintas: 1. Padronização das bases cartográficas 2. Análises do banco de dados espaciais Na primeira etapa do trabalho foi feita a padronização da informação, como descrito a seguir: - Os arquivos vetoriais dos temas UCs, desmatamento, tipologia florestal foram convertidos do sistema de coordenadas geográficas, expressa em unidades de medida angular, para Universal Transversa de Mercator (UTM), datum SAD1969, que adota coordenadas métricas planas, mais adequado para cálculo de áreas. - Uma área tampão de 10km (buffer) foi delimitada no entorno de cada Unidade de Conservação, visando a análise da dinâmica do desmatamento no seu entorno imediato, com exceção das Áreas de Proteção Ambiental (APA), que, segundo a Lei do SNUC, não necessitam possuir uma zona de amortecimento. Em casos onde houve sobreposições foram calculados o quanto de cada buffer estava contido em outra UC. - Os arquivos vetoriais do desmatamento de cada período disponível, até 2005, foram agrupados para otimizar as análises, resultando no arquivo vetorial da dinâmica, com todos os anos representados no mesmo banco de dados espacial. Nesse processo, verificou-se a existência de algumas sobreposições entre os vetoriais de um ano para outro, sendo necessário processar a reclassificação dos arquivos para eliminar as sobreposições, prevalecendo sempre a detecção mais antiga. Nas sobreposições entre as Unidades de Conservação, foi considerada a categoria de proteção mais restritiva. - Os arquivos vetoriais foram posteriormente transformados em imagens raster com um pixel de 100 x 100 metros (1 ha), onde estão contidos os valores dos atributos de cada polígono que se quer representar. A partir daí, com as bases padronizadas, teve início a segunda etapa do trabalho, com a realização das análises espaciais do banco de dados, através de tabulação cruzada, possibilitando quantificar o desmatamento nas unidades e seu entorno ano a ano. Isto também permitiu a quantificação do desmatamento
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anterior e posterior a data de criação de cada UC. A quantificação realizada expressa o desmatamento ocorrido na cobertura vegetal de um modo geral, sem considerar as diferentes tipologias (Floresta, Cerrado, Transição). Para esse trabalho não foram consideradas nas análises as UCs localizadas dentro de perímetro urbano.3 Resultados • Análise quantitativa do desmatamento no interior das Unidades de Conservação do Estado. Das 42 Unidades de Conservação do Estado de Mato Grosso, 38 foram analisadas de acordo com o método anteriormente descrito. A análise comparativa das taxas de desmatamento ocorrido no interior das UCS, até 2005, incluindo os períodos anteriores e posteriores a criação da Unidade, permitiu classificá-las em 3 grupos distintos: Grupo 1: Unidades com até 5% de área desmatada Grupo 2: Unidades com 5% à 20% de área desmatada Grupo 3: Unidades com mais de 20% de área desmatada Estes resultados estão expressos na apresentada a seguir:
Figura Grupos de Unidades de Conservação, segundo critério de taxa total de desmatamento
3
SNUC, Lei n 9.985, Capítulo VII – Art. 49.
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No Grupo 1 estão 15 Unidades, 11 estaduais e 4 federais, sendo 14 de Proteção Integral e 1 de Uso Sustentável. São 6 Parques Estaduais, 6 Estações Ecológicas, 2 Parques Nacionais e 1 Reserva Extrativista. Nesse grupo, que representa 3% do território do Mato Grosso, apenas 3 possuem Plano de Manejo (PM). Destacam-se Unidades que não apresentaram desmatamento no período analisado, como as Estações Ecológicas do Rio Flor do Prado e Taiamã e o PN Pantanal Mato-grossense que é uma das unidades com PM. O PN Juruena, criado em maio de 2006, é o maior, aproximadamente 11.600 km² em Mato Grosso (1,28% da superfície do Estado), apresenta menos de 1% de sua área desmatada4. Neste grupo 1, as unidades com maior taxa de desmatamento (quase 5 %), são o PE Serra de Santa Bárbara com 3,7 % (44 km²) e o PE Araguaia5, com 4,8% (106,3 km²), que no ano de 1997, antes de sua criação, apresentou a maior taxa de todo o período analisado, 2,7% do total. No Grupo 2 estão 14 Unidades, 12 estaduais e 2 federais, sendo 12 de Proteção Integral e 2 de Uso Sustentável. São 7 Parques Estaduais, 2 Refúgios de Vida Silvestre, 1 Parque Nacional, 1 Estação Ecológica e 1 Reserva Ecológica e 3 Áreas de Proteção Ambiental. Nesse grupo, que representa aproximadamente 0,7 % do território do Estado, somente duas unidades estão com o PM em andamento, o PE Cristalino I e o PN Chapada dos Guimarães. Destacam - se as unidades com menor taxa de desmatamento a Estação Ecológica Serra das Araras6, com 5% (cerca de 16 km²), o PE Cristalino I, que apresenta 5,3% de sua área total já desmatada, sendo que 73% desses desmatamentos aconteceram antes de sua criação. O PN da Chapada dos Guimarães, criado em 1989, apresenta um desmatamento em torno de 9,5 % de sua área. A Unidade deste grupo com maiores valores de desmatamento é o PE Dom Osório Stoffel, com 18,3% de área desmatada, sendo que 96% do total dos desmatamentos na Unidade ocorreram antes de 2002, quando o Parque foi criado.
4 O PN Juruena se sobrepõe totalmente à Reserva Ecológica Apiacás e parcialmente ao Parque Estadual Igarapés do Juruena. 5 Ambas unidades possuem Plano de Manejo. 6 É uma das Unidades de Conservação mais antigas do Estado, foi criada em 1982 e não tem Plano de Manejo.
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O Grupo 3 é o que inclui o menor numero de Unidades, porém as que apresentam as maiores taxas de desmatamentos. São 9 áreas, todas estaduais, sendo 5 de Proteção Integral e 4 de Uso Sustentável: 2 Parques Estaduais, 2 Estações Ecológicas, 1 Monumento Natural e 4 Áreas de Proteção Ambiental, representando 1,2% do território estadual. No PE Cristalino II, dos 22,8% da área total desmatada, 54% ocorreram após 2001, ano de sua criação. De forma semelhante, o PE Ricardo Franco, criado em 1997, apresenta 23,2% de sua área desmatada, sendo 43% disso depois da criação do Parque. A APA Chapada dos Guimarães, criada em 1995, apresenta 43,7% de sua área total desmatada, sendo 30% desse valor ocorridos depois de sua criação e é a única unidade deste grupo com PM concluído. A EE Rio da Casca 1, é a menor unidade do Estado e a que apresenta a maior taxa de desmatamento de todas as áreas analisadas, cerca de 69% de sua área total. Criada em 1994, teve 65% de área desmatada antes de sua criação. Destacam–se ainda neste grupo 3, a APA Nascentes do Rio Paraguai e o Monumento Natural Morro Santo Antônio, criadas em 2006, e que juntas representam 6% do total de desmatamentos do grupo, todos anteriores a criação das mesmas. Em resumo, até 2005, cerca de 10% dos 41 mil km² protegidos como Unidades de Conservação no Estado já haviam sido desmatados e cerca de 68% deste total foram desmatamentos ocorridos antes da criação das Unidades, como demonstra a 1. As 9 Unidades do Grupo 3 representam cerca de 78% do desmatamento total ocorrido no interior das UCs do Estado. Tabela 1: Dados do desmatamento por grupo de análise UCs do Grupo 1 Representatividade 16 UCs em relação a área do 24.611 km2 ou 2,7% Estado do território Área total desmatada 335 km2 ou 8% nas UCs Área desmatada antes da criação da 258 km2 ou 6% UC
UCs do Grupo 2 14 UCs 6.080 km2 ou 0,7% do território 586 km2 ou 14% 423 km2 ou 10%
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UCs do Grupo 3 Total 9 UCs 41.191 km2 ou 4,6% 10.500 km2 ou 1,2% do território estadual do território 4.165 km2 ou 10% 3.244 km2 ou 78% da área total das UCs 2.149 km2 ou 52%
2.830 km2 ou 68% do total desmatado
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• Análise quantitativa do desmatamento no entorno das Unidades de Conservação do Estado, num raio de 10 km. O propósito da Lei do SNUC, ao estabelecer a obrigatoriedade da normatização da ocupação e uso dos recursos no entorno das UCs ou Zonas de Amortecimento, é minimizar os impactos negativos sobre a unidade e fortalecer as oportunidades para o desenvolvimento sustentável. Desta forma, para a classificação das áreas do entorno das UCs, quanto as taxas de desmatamento, foram utilizados grupos com intervalo de valores maiores do que aqueles para o interior das Unidades, como a seguir: Grupo 1: Entornos com até 20% de área desmatada Grupo 2: Entornos com 20% à 50% de área desmatada Grupo 3: Entornos com mais de 50% de área desmatada Esta análise foi feita para o entorno de 327 unidades. No Grupo 1 estão incluídos os entornos de 17 Unidades, sendo 16 entornos de áreas de Proteção Integral e 1 entorno de área de Uso Sustentável. São 5 entornos de Estações Ecológicas, 2 de Parques Nacionais, e 7 de Parques Estaduais, 2 entornos de Refúgio da Vida Silvestre e 1 de Reserva Extrativista. A EE Taiamã e o PN do Pantanal Mato-grossense, que não apresentaram áreas desmatadas em seu interior, também não apresentam desmatamentos em seus entornos. O PN Pantanal Mato-grossense tem 3% do seu entorno sobreposto ao PE Guirá, também incluído no Grupo 1. A Resex Guariba Roosevelt e o PE Cristalino I, ambos com 9% de seu entorno desmatado, também fazem parte do Grupo 1. No caso do PE Cristalino I, o seu entorno está sobreposto em 34% com o PE do Cristalino II. Deste grupo a unidade que apresenta seu entorno mais desmatado é o RVS Quelônios do Araguaia, com 16%. No Grupo 2 estão o entorno de 9 unidades, todas de Proteção Integral. São 6 Parques Estaduais, 1 Parque Nacional e 2 Estações Ecológicas. Com 20% de seus entornos desmatados estão a EE do Rio Ronuro e o PE Cristalino II, que tem 20% 7
Não foram consideradas na análise o entorno das Áreas de Proteção Ambiental
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de seu entorno sobreposto com o PE Cristalino I. Com 38% do seu entorno desmatado está o PE Ricardo Franco, e a unidade deste grupo que apresenta a maior área desmatada é o PE Serra de Santa Bárbara, com 48% no total. O PN da Chapada dos Guimarães apresenta cerca de 35% do seu entorno desmatado, porém 72% da área está sobreposto à APAChapada dos Guimarães. O Grupo 3 inclui o entorno de 6 unidades, todas de Proteção Integral. Temos 2 Parques Estaduais, 2 Estações Ecológicas, 1 Reserva Ecológica e 1 Monumento Natural. Apresentando taxas semelhantes estão o Monumento Natural Morro Santo Antônio (52%), a Resec Culuene (53%) e o PE Serra Azul com 54% da área do entorno desmatado. No caso do PE Serra Azul, aproximadamente 6% da área está sobreposta à APASerra Azul. Das unidades analisadas, a que apresenta o entorno mais desmatado é a EE Rio da Casca 1, com 81 %, e aproximadamente 12% está sobreposto a outras unidades, EE Rio da Casca 2 e à APAChapada dos Guimarães. Em resumo, as taxas de desmatamento no entorno das UCs de Mato Grosso vem demonstrando, nos últimos três anos, franca redução nos seus valores. Estes estão relativamente menores que a média das áreas não protegidas: até 2005, 15% dos 56 mil km² de área de entorno de UCs foram desmatados, contra 42% para o total das áreas não incluídas em UCs ou TIs. Entre as 33 UC's analisadas, 17 tem menos de 20% de suas áreas de entorno desmatadas; 9 têm de 20 a 50% de suas áreas de entorno desmatadas, sendo todas de Proteção Integral, e com uma taxa média de desmatamento de 4% nos últimos 3 anos ou 1.8% ao ano; entre as 6 UC's que possuem mais de 50% de suas áreas de entorno desmatadas, a taxa média de desmatamento de 2003 a 2005 foi de 3%, isso se explica pelo fato de a maioria dessas áreas de entorno já terem sido desmatadas antes de 2003. • Identificação das categorias de Unidades de Conservação mais eficazes para combater o avanço do desmatamento Segundo o SNUC, o objetivo básico das Unidades de Proteção Integral é preservar a natureza, sendo admitido apenas o uso indireto dos seus recursos naturais, com exceção dos casos previstos em lei.
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Para as Unidades de Uso Sustentável é possível compartilhar a conservação da natureza com o uso sustentável de parcela dos seus recursos naturais. Segundo Magnanini (2002), estas são mais áreas de restrição de atividades e não Unidades propriamente ditas; elas existem mais em função de planejamento e de licenciamento de uso e de atividades e não constituem necessariamente em si Unidades de Conservação. Ou conforme Dourojeanni (1997), ressalta a respeito das RESEX, estas tem demonstrado pouca eficiência tanto para a conservação como para o desenvolvimento e geração de renda para as populações envolvidas. Para Alencar (2004), áreas protegidas de proteção integral e de uso sustentável têm um papel central na redução do desmatamento, na preservação da biodiversidade e na proteção dos direitos de populações tradicionais. Entretanto, não podem ser vistas como a única solução. Nesse contexto, o resultado da avaliação das diferentes categorias de manejo estaduais e federais, frente ao avanço do desmatamento no Estado. Na 2 estão os resultados das taxas de desmatamento por categorias de manejo, ou seja a contribuição de cada categoria ao desmatamento total nas unidades de conservação do Estado. Tabela 2: Dados do desmatamento por categoria de manejo Área Total Categorias de Manejo (km²) Taxa de desmatamento acumulado Antes da criação da UC Depois da criação da UC PROTEÇÃO INTEGRAL FEDERAL ESTADUAL FEDERAL ESTADUAL 4.191 0 0.7 1.1 0.2 Estação Ecológica 36 0.0 0.1 Reserva Ecológica 1.139 3.4 0.5 Refúgio Vida Silvestre 3 0.02 0 Monumento Natural 25.524 1.9 16.8 0.7 9.2 Parque USO SUSTENTÁVEL 485 0.04 0.05 Reserva Extrativista Área de Proteção 9.813 2.0 43 1.8 18 Ambiental 41.191 3.9 64.1 3.6 28.4 TOTAL
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Analisando os resultados, podemos concluir que, como era de se esperar, as categorias de Proteção Integral, apresentam taxas de desmatamento em seu interior menores se comparadas às categorias de Uso Sustentável. Em Proteção Integral estão 75% do total das UCs do Estado. São as Estações Ecológicas, Reservas Ecológicas, os Refúgios de Vida Silvestre, Monumento Natural e os Parques. Estas representam 35% do total dos desmatamentos ocorridos no interior das unidades do Estado, sendo que 31% nas unidades estaduais e 4% nas federais. Destacamos os Parques Estaduais que apresentam a maior taxa (26%) de desmatamento no interior das unidades e apesar de 16,8% ter ocorrido antes da criação e de apresentar uma redução significativa após a criação, mesmo assim permanece uma taxa relativamente elevada para uma categoria de Proteção Integral (9,6%). Isso demonstra a fragilidade dos Parques Estaduais frente a pressão do desmatamento. As Estações Ecológicas existentes no Estado, tanto federais quanto estaduais, apresentam taxas baixas de desmatamento, antes e após a criação, com valores decrescentes no caso das estaduais. Nota-se um aumento na taxa dos desmatamentos após a criação nas Estações Ecológicas federais, que era de 0% passando para 1,1%. Os Refúgios de Vida Silvestre que representam 2,8% do total da UCs existentes no Estado, apresentam uma redução significativa nas taxas de desmatamento após a criação, e demonstram-se eficazes ao avanço do desmatamento. Representando apenas 35% do total das Ucs do Estado temos as categorias de Uso Sustentável, como as Áreas de Proteção Ambiental e as Reservas Extrativistas. No Estado, são responsáveis por 65% do total dos desmatamentos ocorridos no interior das UCs. As APAs Estaduais representam 61% desse total e as federais 4%, ficando a única Reserva Extrativista do Estado responsável por apenas 0,08% deste total. Os resultados apontam que do desmatamento total ocorrido no interior das unidades de conservação do Estado, 92,5% ocorreram em unidades estaduais
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apresentando taxa elevada também nos entornos chegando a 87% de desmatamentos. Dado muito preocupante e que reforça a necessidade de maior fortalecimento no Sistema Estadual de Unidades de Conservação. As unidades federais são responsáveis por 7,5% e por 13% nos seus entornos. Das categorias de Unidades de conservação existentes em Mato Grosso, destacamos como mais eficazes para barrar o avanço do desmatamento as unidades de Proteção Integral como Refúgios de Vida Silvestre e Estações Ecológicas, por demonstrarem clara diminuição nas suas taxas após a criação das unidades. Comentários Finais Até 2005, cerca de 10% do território total das Unidades de Conservação do Estado havia sido desmatado, bem como 15% das áreas do entorno dessas Unidades, num raio de 10 km. Ao compararmos estes dados com as taxas cumulativas do desmatamento ocorrido no Estado de Mato Grosso, que foi 35,3%, no mesmo período analisado, é possível constatar que, de um modo geral, as UCs têm sido instrumentos eficazes na conservação do patrimônio natural, contendo o avanço do desmatamento local. Como sugerem estudos recentes, mesmo as UCs com deficiências administrativas e de manejo, demonstram-se mais eficientes na conservação do que áreas não legalmente protegidas (BRUNER, 2001). Porém, estes 10% de áreas desmatadas no interior das UCs representa um dado ainda expressivo, visto tratar-se de áreas protegidas por lei. Nas Terras Indígenas foram registrados apenas 3,3% de desmatamento. O mesmo ocorre com os 15% constatados nas áreas de entorno, considerando ainda que, em muitos casos, o entorno de uma UC localiza-se no interior de uma outra área protegida (UC ou TI), reduzindo desta forma a pressão do desmatamento. As categorias de manejo de Proteção Integral são as mais eficazes para conter o avanço dos desmatamentos, porém é fundamental reforçar a necessidade de elaboração e implantação dos Planos de Manejo, passo muito importante
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na efetivação dessas áreas, proporcionando também a atuação dos atores-chave na tomada de decisão e gestão da unidade, através dos conselhos consultivos ou deliberativos. Os resultados apresentados reforçam a necessidade de maiores estudos sobre a biodiversidade para definição de áreas prioritárias visando a criação de novas unidades conservação e assim fortalecer o sistema de unidades de conservação do Estado, que atualmente representa apenas 4,6% do território. Também apontam a necessidade de políticas públicas que privilegiem a efetiva implantação das UCs existentes e a criação de novas áreas legalmente protegidas, dentro dos programas voltados para a contenção do avanço do desmatamento no Estado. Deve também ser dada especial atenção às iniciativas que visam promover o desenvolvimento integrado e sustentável dos territórios localizados no entorno das UCs, efetivando-os, na prática, como Zonas de Amortecimento legais e funcionais. Referências Bibliográficas: ALENCAR, A.[et al], 2004. Desmatamento na Amazônia: indo além da Emergência Crônica.Belém: Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia. BRASIL. 2000 Lei n0 9.985, de 18 de julho de 2000 Institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza – SNUC, e estabelece critérios e normas para criação, implantação e gestão das Unidades de Conservação. BRUNER, A.G., GULLISON, R.R., RICE, R.E.E FONSECA, G.A.B. 2001. Effectiveness of parks in protecting tropical biodiversity. Science 291(125–128). DOUROJEANNI, M. J., 1997 Áreas Protegidas: problemas antiguos y nuevos, nuevos rumbros. In: Congresso Brasileiro de Unidades de Conservação. Curitiba: IAP/Unilivre/RNPUCs. Anais, vol. I, p: 69 – 109. MAGNANINI, Alceo 2002. Política sobre as Unidades de Conservação – Dificuldades e sucessos no pensamento de Alceo Magananini. Unidades de Conservação: Atualidades e Tendências – Curitiba: Fundação O Boticário de Proteção à Natureza. p: 151 – 160.
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DE UMA AGRICULTURA SUSTENTADA À SUSTENTÁVEL
1
Vicente José Puhl
O título justifica-se porque expressa a essência da análise do modelo de desenvolvimento do agronegócio, predominante no estado de Mato Grosso. Construiu-se subsidiado com recursos de crédito e pesquisas públicas. Mantémse à custa de altos impactos sociais, pois gera poucos empregos, muitas vezes usa trabalho escravo ou degradante, faz baixa remuneração dos trabalhadores, concentra terra e renda e produz acentuado êxodo rural. Apresenta custos ambientais como desmatamento indiscriminado, queimadas, assoreamento e poluição das águas por agro-químicos, etc. A prova mais cabal, de que é sustentado pela sociedade, com recursos públicos, são as recentes manifestações dos grandes produtores, principalmente da soja, que iniciaram em 2005, promoveram um “tratoraço” em Brasília, e realizaram “o grito do Ipiranga” em 2006. O movimento é liderado nacionalmente por produtores e políticos de Mato Grosso. A carta de 13 de março de 2006, enviada pelo governador à Ministra Chefe da Casa Civil com as reivindicações do setor, indica isto. “Agronegócio sustentado”, afirmou a economista Miriam Leitão no dia seguinte à demissão do ministro Antônio Palocci (27/03) e na posse de Guido Mántega, disse que esperava do novo ministro a continuidade da gestão do antecessor, não cedendo às pressões setoriais, como as do agronegócio. Concluiu, “a lógica do agronegócio é privatizar os lucros e deixar para a sociedade os prejuízos inerentes ao setor. Nenhum governo pode operar assim, pois numa economia de mercado as crises podem afetar todos os setores” (Rádio CBN).
1
Mestre em Educação Pública e Meio Ambiente – UFMT; Coordenador Regional FASE-MT; membro do GTAgricultura do Projeto MTSD.
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1. A agropecuária mato-grossense
Figura 1 – Foto Campanha Ykatu Xingu - Fonte ISA - 2005.
A imagem expressa uma visão da realidade da agropecuária de Mato Grosso. Mostra elementos do processo de ocupação, como ocorre via de regra. Produtores migrantes chegam, encontram uma mata ou cerrado, retiram a madeira nobre, derrubam, queimam, plantam pasto ou mecanizam para a produção de grãos, principalmente arroz, milho e soja. O gráfico abaixo anota os principais produtos da agropecuária do Estado, mostra a dinâmica de crescimento e a área que cada um ocupa. Dinâmica das principais atividades agrícolas no Estado de MT 6.000 Algodão
Mil ha
5.000
Arroz
4.000
cana
3.000
Feijão
2.000
Mandioca milho
1.000
soja 0 1978
1981
1985
1990
1995
2000
2004
Gráfico 01 – Fonte, pesquisador Ms. Antônio João Castrillon Fernandes (2005)
De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) Mato Grosso possui aproximadamente 90.000.000 (noventa milhões) de hectares de terra, dos quais 33.648.412 ha, são ocupados pela agropecuária em pasto e pela agricultura com soja, milho, arroz, algodão, cana, feijão, mandioca e
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banana. Significa que 37,38% da área do Estado já foi desflorestada e ocupada pela agropecuária. O pasto predomina na ocupação de área em relação aos grãos e outros produtos agrícolas, com 25.918.998 ha, o que representa 77,02% da área ocupada. Em segundo lugar vem a soja, com 5.279.928 ha, representando 15,69% da área ocupada, mas representava 68,30% da área cultivada pelas principais lavouras temporárias do Estado em 2004. Apresentou um crescimento impressionante. Foram 1.703,20% desde 1977, início do registro de sua produção em Mato Grosso, quando eram cultivados 310.000 ha. Sua área multiplicou-se 17 vezes. Em terceiro lugar vem o milho, em 12,17% da área cultivada e no quarto lugar está o arroz ocupando 9,56% da área cultivada. Este produto, em 1978, representava 81,6% da área total das lavouras temporárias. Assim como o arroz, o feijão, produto destinado ao mercado interno, produzido predominantemente em estabelecimentos familiares, teve a área de plantio reduzida de 48 mil ha em 1978 para 43.476 ha em 2004. Hoje representa apenas 0,56% da área cultivada com lavouras temporárias. A mandioca não teve grandes variações ao longo do período e ocupa apenas 0,48% da área cultivada. Em síntese, observa-se um crescimento da área cultivada para os produtos destinados ao mercado externo e às agro-indústrias (soja, milho, algodão e canade-açúcar) e uma redução ou crescimento pouco expressivo dos produtos destinados ao consumo no mercado interno como o arroz, feijão, milho e mandioca (FERNANDES, 2005). O crescimento da área de soja e milho não é exclusividade mato-grossense, acompanha uma tendência mundial como mostra a tabela 01. Schlesinger (2006), afirma que o crescimento global se deve principalmente ao aumento de consumo de carne no mundo, pois a soja é o principal componente da ração animal. A área do trigo diminuiu e a do arroz cresceu pouco porque os países asiáticos e os países em desenvolvimento estariam aumentando o consumo de carne e diminuindo o consumo destes cereais. Os dados sobre o aumento da produção de soja no Brasil nos últimos anos, impressionam. Sua área plantada na safra 2004/2005 equivale à soma dos outros
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quatro principais grãos produzidos no país: arroz, feijão, milho e trigo. O total da área plantada destes, mais visíveis na mesa do brasileiro médio, reduziu-se entre 1991 e 2004, enquanto área destinada à soja mais do que triplicou. O Brasil foi, em 2003 e 2004, o maior exportador mundial de soja e vem mantendo a posição de segundo maior produtor, após os Estados Unidos. Os três principais produtos do chamado complexo da soja – grão, farelo e óleo representaram, em 2004, 12% das exportações do país, cerca de 10 bilhões de dólares. Corresponderam, também, a mais de um terço de toda a soja comercializada no mercado internacional. Tabela 01 - Tabela da Produção Mundial de Grãos (milhões t) Produto Soja Milho Trigo Arroz Forrageiros
1993/94 2003/04 Cresc. % 117,8 200,2 70,00% 476,4 609,0 27,80% 558,1 549,5 -1,50% 354,9 389,3 9,70% 798,6 881,6 16,30% Fonte: Pereira (2004) Schlesinger (2005)
Em Mato Grosso predominam absolutamente as monoculturas extensivas tanto na pecuária como na produção agrícola. Trata-se de um modelo agropecuário com uso intensivo de capital e com máquinas moderníssimas. Alcançou alta produtividade devido ao uso intensivo de insumos químicos artificiais, principalmente na agricultura de exportação. 2. Agropecuária mato-grossense: sustentável e democrática? Os Projetos Brasil e Mato Grosso Sustentável e Democrático partem de duas preocupações centrais para a humanidade. Enfrentar a desigualdade da distribuição da riqueza, do acesso e uso dos recursos naturais, pois 80% são consumidos pelos 20% mais ricos da população e a crescente degradação ecológica, que causa desequilíbrios climáticos. Para resolver estes problemas são necessárias profundas mudanças no modelo de produção e distribuição. Entendemos que o primeiro passo da mudança é melhorar nossa compreensão sobre a realidade dos diversos setores.
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Partimos do princípio de que democracia não é apenas o direito de participação nos processos eleitorais. Democracia real é a participação de todos/as os/as cidadãos/as no usufruto dos recursos naturais e dos bens gerados a partir do trabalho. Sustentabilidade só há quando existem processos de produção duradouros, uso de práticas e técnicas que causem o mínimo de impactos ambientais. Sociedade sustentável só se for democrática, com cidadãos satisfeitos, incluídos e usufruindo as benesses do desenvolvimento. A análise da agropecuária de Mato Grosso, que é motivo de orgulho para uns e de preocupação para outros, nos remete a uma reflexão importantíssima de Schlesinger (2006, p 09), que afirma: O crescimento do agronegócio de exportação vem provocando uma série de impactos negativos sobre a qualidade de vida da população. Não se pode ignorar, que a monocultura de exportação, ao longo da história do Brasil, sempre caminhou de mãos dadas com padrões inaceitáveis de distribuição da riqueza, da renda e da terra.
Enfatiza que a mecanização e a concentração dos negócios em número cada vez mais reduzido de grandes empresas dedicadas à comercialização e industrialização de alimentos, invadem espaços antes ocupados pela agricultura de subsistência – a autêntica agricultura familiar - reduzindo o emprego no campo, a capacidade de produção de alimentos tradicionais e comprometendo, assim, a segurança alimentar da população. Destaca o avanço da soja sobre o Cerrado e a Amazônia que já não permite sequer aos setores mais conservadores dos meios de comunicação ignorar seus impactos sobre o meio ambiente. Ameaça às águas, o clima e a preservação da biodiversidade, este avanço vem provocando não só denúncias e protestos, mas também o surgimento de campanhas nos níveis nacional e internacional. As lideranças do agronegócio, nos últimos anos, venderam a idéia de que o setor representa a solução de problemas sociais como o desemprego e a falta de trabalho, mas a análise dos dados sugere que o agronegócio está longe de ser a solução, mas é em grande parte causa destes problemas (PUHL, 2005).
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O modelo das monoculturas extensivas é socialmente anti-democrático e insustentável porque concentra terra e renda, dispensando e excluindo gente do campo. Poucas empresas e pessoas, com moderníssimas máquinas se apropriam e produzem em enormes extensões de terras. Trabalhadores perdendo seu lugar e auto-sustento passam a depender de ajuda, de doações, de cuidados e de proteção do Estado. Asociedade paga toda esta conta através dos impostos, que ao invés de fomentarem investimentos na melhoria das condições de vida dos cidadãos, são gastos na manutenção deste exército de excluídos e desempregados. Estes custos não estão sendo embutidos na conta do agronegócio. Poucas grandes corporações, em geral multinacionais, sempre ganham economicamente devido à sua localização estratégica no mundo. Elas passam imunes às crises e faturam porque dominam quase toda cadeia produtiva. A soja é uma cultura que pode ser benéfica ao solo, da qual derivam centenas de subprodutos, o problema é o modelo de sua produção. Preocupante mesmo, é a tendência à concentração da produção, observada nos dados estatísticos, tanto nas antigas quanto nas novas áreas de produção. As propriedades com áreas de soja abaixo de 100 ha. diminuíram, entre 1985 e 1996, em 44,8%. Por outro lado, as propriedades produtoras de soja com áreas acima de 1.000 ha aumentaram em 11% e passaram a ser responsáveis por 35,1% da produção brasileira. Os agricultores do Centro-Oeste, com destaque para os de Mato Grosso, ocupam áreas mais extensas que na região Sul (SCHLESINGER, 2006). Sendo a margem de lucro pequena, por área, a lógica do produtor é ampliar a escala de produção, pela abertura de terras próprias, mas fundamentalmente pela aquisição de novas áreas. O índice de concentração da terra tem-se elevado desde o último Censo Agropecuário aos dias atuais. Os indicadores de Renda do município de Sorriso, modelo de sucesso do agronegócio, também apontam esta tendência da concentração. Um dos objetivos do Projeto Mato Grosso Sustentável e Democrático é enfrentar as desigualdades, por isso preocupa-nos de modo especial este modelo que leva à concentração. Esta significa exclusão social ou ausência de democracia real e leva à insustentabilidade social. A renda dos 80% mais pobres de Sorriso
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reduziu-se, em termos de participação na renda total, era de 39,5% em 1990 e foi para 31,5% em 2000. Por outro lado, a renda dos 10% mais ricos, de Sorriso, em termos de participação na renda total, subiu de 44,6% para 55,2%, crescimento de 10,6% (FERNANDES, 2005). Um quinto da população mais pobre do município tinha renda per capita média, em 2000, de R$ 65,00 e um décimo mais rico R$ 2.550,00; ou seja, a diferença de renda média entre os 10% mais ricos e os 20% mais pobres é de aproximadamente 3.800%. Enquanto que a renda per capita média dos 20% mais pobres cresceu 30% no período de 1991 a 2000, a renda dos 10% mais ricos cresceu 99,1%. Contraditoriamente, os municípios produtores de soja apresentam o IDH Índice de Desenvolvimento Humano acima da média do Estado. Argumento utilizado pelo “setor produtivo” para demonstrar as vantagens sociais da economia da soja. O IDH de Sorriso em 2000 foi de 0,824, enquanto o de Mato Grosso era 0,773. É possível concluir que a metodologia do IDH, na prática encobre o dado da desigualdade da renda, quando simplesmente divide toda renda do município pela população. No caso de Sorriso gera uma renda média alta, mas desconsidera que é concentrada. Por mais que a agricultura familiar tenha baixa renda, para a maioria das unidades de trabalho, este modelo da produção familiar é socialmente mais adequado para um Mato Grosso Sustentável e Democrático. Aprodução familiar inclui, ocupa muito mais mão-de-obra por área trabalhada e produz muito mais do que muitos imaginam. As propagandas patrocinadas pelas grandes corporações que dominam o agronegócio no mundo falseiam a imagem da agricultura familiar e das vantagens da agricultura patronal. No entanto os dados comparativos indicam que a produção familiar camponesa é responsável por 95% dos empregos do campo, embora só receba 15% do crédito federal. A agricultura patronal, ou o agronegócio dos médios e grandes estabelecimentos, embora receba 85% do crédito, emprega diretamente apenas 5% da mão-de-obra da agropecuária. Se tivéssemos uma inversão no direcionamento dos recursos a produção aumentaria com inclusão social.
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Pode-se concluir que não está na contramão quem defende o modelo da produção familiar, pois ela representa um caminho para parte da solução do problema do desemprego. A opção de ancorar o modelo agropecuário de Mato Grosso, basicamente em dois produtos, na pecuária e na soja, é uma decisão por manter pouca população no meio rural, pois as duas atividades apresentam baixíssima capacidade de gerar empregos, por área ocupada. Verificou-se que, com investimentos em tecnologias, o número de trabalhadores por mil hectares caiu de 65 para 15, entre 1996 e 2004. O modelo é economicamente anti-democrático e insustentável porque é extremamente exigente em capital e baseado em monoculturas extensivas. Como o modelo permite incorporar com facilidade novas áreas leva a superoferta do produto e conseqüentemente a baixa dos preços e o aumento dos insumos porque aumenta a área e a necessidade de nutrientes na mesma área plantada. Assim, constantemente o setor que contraditoriamente prega o livre mercado, busca socorro do Estado, aos fundos públicos e passa a conta para toda sociedade pagar e os benefícios ficam apenas para poucas grandes corporações, na maioria, transnacionais. As lideranças dos produtores e o governador de Mato Grosso estão na dianteira das mobilizações do agronegócio, que solicitam como medida emergencial a securitização e renegociação dos prazos das dívidas vencidas e por vencer. Apresentaram uma carta com as reivindicações a Ministra Chefe casa civil Dilma Rossef em 13-03-06. Querem: que a ferrugem asiática da soia seja tratada como endemia; insumos Genéricos para a Agropecuária; a liberação comercial junto a CTNBIO dos transgênicos das culturas de algodão e milho, que segundo eles possibilita menor uso de agrotóxicos e diminuição dos custos de produção; a retirada do veto ao artigo da lei que instituiu o quórum de 2/3 do conselho da CTNBIO; incentivos da pesquisa oficial em biotecnologias; a regulação do uso de Biocombustível em nível regional, permitindo o uso puro ou em mistura por parte do consumidor; o pagamento do frete, pela Petrobras, da refinaria até a base distribuidora e eliminação da carga tributária federal sobre o óleo diesel utiliza-
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do na agricultura e pecuária (CIDE, PIS, COFINS, etc); a atualização dos preços mínimos dos produtos agrícolas que levem em consideração os valores que contemplem o atual custo de produção e garantam uma renda mínima ao produtor, disponibilizando a opção da equivalência produto na contratação de financiamentos; na infra-estrutura a Implementação e aporte de recursos do Orçamento da União para inicio das obras de asfaltamento da BR 163 viabilizando novo canal de exportação e conseqüente redução do custo Brasil. Em resposta o governo federal lançou um pacote de medidas em 20 de maio de 2006, bastante favorável, especialmente aos grandes devedores, com subsídios que outros setores e categorias não obtêm. Como exemplo a redução da taxa de juros de 17% para 8,75%. Schlesinger (2005) aponta que esta situação já vem se arrastando desde a implantação do Plano Real. Numa conjuntura desfavorável ao setor agrícola, o governo FHC promoveu uma ampla renegociação das dívidas do setor agrícola, lançando os chamados programas de securitização. Em 1997, foram incluídos também os que deviam mais do que esse valor. Em 2001, nova negociação trocou a correção monetária pela variação do preço do produto. Já no governo Lula (2003) instituiu-se o desconto de 30% para os que pagassem em dia. Görgen e Stédile (2005, p 07) vão além na análise destes números. Segundo eles, as dívidas renegociadas em 1995, 1999 e 2002, roladas em 25 anos com juros de 3% ao ano (enquanto a taxa Selic, que regula os índices de juros no país, oscilava entre 15 e 20%) e garantidas pelo Tesouro Nacional, só em contratos acima de R$ 100.000,00 somavam um valor global de R$ 26 bilhões2. O Brasil do agronegócio defende o fim dos subsídios e barreiras para garantir mercado para os produtos do agronegócio “brasileiro”, que nem sempre tem subsídio direto, mas em muitos casos exploração direta, como é o caso do uso constante de mão-de-obra escrava ou degradante, Puhl (2005).
2 O Tesouro Nacional equaliza os juros dessas dívidas num valor anual superior a R$ 3,38 bilhões, pagando assim parte dos juros que os fazendeiros não querem pagar. O cálculo por baixo é de que seus beneficiários não ultrapassam a vinte mil grandes proprietários. Feitas as contas, isto representa uma transferência a cada um deles de R$ 15 mil mensais.
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Só em 2005, tivemos em Mato Grosso mais de 1.300 trabalhadores libertados em fazendas, por fiscais do Tribunal Regional do Trabalho porque eram escravizados ou trabalhavam em condições degradantes. Esta prática recorrente indica a agressividade do modelo e sua inviabilidade, pois se fosse viável, não recorreria para o uso de mão-de-obra escrava. O modelo agro-exportador de matéria-prima é inibidor do desenvolvimento da agroindústria mato-grossense. A submissão dos produtores aos negócios das grandes corporações que garantem seus ganhos em todas as situações, pois dominam toda cadeia, fornecendo insumos (sementes, adubos e agrotóxicos), financiando e comprando a produção e às vezes até industrializando-a. Estas grandes corporações não querem o desenvolvimento de agroindústrias locais. Trabalham para facilitar a exportação de grãos in natura em detrimento de subprodutos industrializados. Schlesinger (2005), constatou que na Bunge, novas fábricas de processamento de grãos, a maioria delas de soja, hoje são erguidas prioritariamente na Ásia e no Leste Europeu, regiões onde é expressivo o potencial para o crescimento do consumo de alimentos. Ao Brasil, que no passado recebeu aportes similares também em função do consumo crescente e da vocação exportadora, cabe mais o papel de "celeiro" para a abertura das fronteiras (LOPES, 2005). Em entrevista um “pequeno produtor” faz o seguinte comentário: Trabalhar só a minha área (120 ha) não sobrevive. Ai no assentamento de Boa Esperança, lá o lote é de 70 (ha), ele planta e tem que caçar um serviço fora para sobreviver. Para tirar luz, essas coisas, para sobreviver. Você só fica trocando seis por meia dúzia.
O modelo do agronegócio, baseado na monocultura, no plantio direto e nos insumos externos como os fertilizantes químicos artificiais, herbicidas, sementes transgênicas e agrotóxicos é profundamente insustentável ambientalmente. A poluição das águas dos córregos e rios tem afetado diretamente outros setores da sociedade. As freqüentes mortandades de peixes por contaminação de agrotóxicos vêm diminuindo o estoque de pescado. Pesquisadores já trabalham com a
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hipótese de que o pescado, em grande parte, diminui porque a flora aquática, componente importante na alimentação dos peixes, está sendo afetada pelos herbicidas. Assim, a inviabilização da vida de comunidades ribeirinhas e pescadores é outro custo que o agronegócio não computa e toda sociedade é convidada a pagar (PUHL, 2005). Estudos recentes mostram que o comércio agrícola promove uma gigantesca transferência de água de regiões onde ela se encontra de forma abundante e a baixo custo para outras regiões onde é escassa, cara e seu uso compete com outras prioridades (RODRIGUES, 2006). Assim, a China, importando cerca de 18 milhões de toneladas de soja por ano, permite que ingressem no país 45 milhões de metros cúbicos de “água virtual”. O Brasil, por sua vez, exportou em 2003 1,3 milhão de toneladas de carne bovina. Por esse caminho, exportou também 19,5 km³ de água virtual (19,5 bilhões de m³) (SCHLESINGER, 2005). Nos últimos vinte anos, verificou-se uma rápida internacionalização de grandes empresas sementeiras, com a penetração de grupos industriais vindos dos setores: farmacêutico, químico e alimentar. Especialmente na produção de sementes geneticamente modificadas, um oligopólio formado por apenas cinco empresas detém 91% das vendas, com valor estimado em US$ 4,5 bilhões no ano de 2003. São elas a Dupont, Monsanto, Syngenta, Bayer CropScience (Aventis) e Dow AgroSciences (SCHLESINGER, 2005). As vendas mundiais da ADM no ano de 2004 atingiram US$ 36,2 bilhões. As da Bunge somaram US$ 25,2 bilhões. ABunge é a maior empresa de alimentos no Brasil, com um faturamento de R$ 23,2 bilhões. Neste cenário, também as empresas nacionais da soja passam a negociar com as multinacionais. Até cooperativas com menos capacidade e experiência, dependem dessas multinacionais para acederem ao mercado externo. Os volumes da soja subordinados à atuação destas grandes empresas em todo o mundo lhes permitem um amplo controle dos preços do produto no mercado mundial. Esta supremacia e amparo político internacional das corporações transnacionais colocam em risco a soberania e segurança alimentar das nações.
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3. Transição de agricultura sustentada à sustentável O conjunto de atores envolvidos no Projeto Mato Grosso Sustentável e Democrático entendem que os impactos socioambientais do atual modelo do agronegócio, associado à insegurança econômica e o risco da soberania e segurança alimentar, requer uma profunda mudança no modelo de desenvolvimento rural do Estado. Não aprofundamos como esta transição para a agricultura sustentável se realizaria. Apenas anunciamos que importantes passos nesta direção estão sendo implementados por diversas organizações de agricultores familiares e camponeses. As recomendações de Jean Pierre no Fórum Social Brasileiro, realizado em novembro de 2003 em Belo Horizonte (MG), apontam um caminho que devemos perseguir no projeto. Afirma que as monoculturas desestruturam as possibilidades de vida social nos territórios aonde chegam. "No Mato Grosso, vi famílias que já não têm ônibus passando perto de suas casas, porque tudo em volta é soja. Com isso, as crianças não podem mais ir à escola. O que acontece? Afamília tem que se mudar".
Por isso, ele propõe a criação de pólos de desenvolvimento local no meio rural, com ênfase na pequena produção familiar e diversificada. "Precisamos de vários pólos para fixar as famílias com produção diversificada, sem isolamentos e com integração em mercados solidários". É, sem dúvida, uma alternativa de desenvolvimento sustentável muito mais interessante do que o agronegócio exportador que enriquece poucos, a custa de todo o esforço da sociedade. As dezenas de experiências de produção agroecológica que estão em andamento em Mato Grosso representam um embrião necessário para construir uma transição ao modelo agroexportador e concentrador, em desenvolvimento sustentável e democrático.
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4. Referências bibliográficas DUARTE, Jorge; CASTRO, A. M. G. Comunicação e tecnologia na cadeia produtiva da soja em Mato Grosso. Brasília, DF: Embrapa Informação Tecnológica, 2004. 275p. FERNÁNDEZ, Antonio J.C. Estudo De Caso Sobre A Soja No Estado De Mato Grosso Município De Sorriso. Cuiabá, 2005, relatório pesquisa soja FASE, 46p. GÖRGEN, Sérgio A. e STEDILE, João Pedro. O mensalão dos ruralistas. Jornal O Globo, 21/06/05, p.7. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIAE ESTATÍSTICA- IBGE, 2004. LOPES, Fernando. Brasil alimenta expansão global daBunge. Gazeta Mercantil, 13/06/05. OLIVEIRA, Ariovaldo U. Barbárie E Modernidade: O Agronegócio E As Transformações No Campo. São Paulo, texto apresentado em reunião da CPT Nacional – Goiânia-GO 22/10/2003 e a segunda versão ampliada, foi apresentada no XII Encontro Nacional do MST – São Miguel do Iguaçu – PR, 19 a 24 de Janeiro de 2004. OLIVEIRA, Ariovaldo U. Notas Para Entender A Crise Agrícola E As Falsas Saídas. São Paulo: USP, 2006. PUHL, Vicente J. Plantio Direto: Risco direto para Segurança Alimentar. Anais do VIII Congresso Brasileiro de Plantio Direto. Tangará da Serra - MT: 2005. RODRIGUES, Vânia Água virtual: a água que consumimos sem ver. www.aesabesp.com.br/artigos_agua_virtual.htm (Artigo capturado em 20–05-2006) SCHLESINGER, Sérgio. O grão que cresceu demais: A soja e seus impactos sobre a sociedade e o meio ambiente. Rio de Janeiro: FASE, 2006. 76p.
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SINFONIAS DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL MATO-GROSSENSE
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Michèle Sato Débora Pedrotti Samuel B. de Oliveira-Jr Ronaldo Senra
Prelúdio A dimensão ambiental era ignorada pela civilização, passou a ser considerada na década de 1960, possivelmente com o grito ecológico de Rachel Carson, com a publicação do livro “Primavera Silenciosa” (2002). A preocupação com a dimensão ambiental ultrapassou os danos dos pesticidas e já é uma constatação notória aos habitantes deste planeta Terra. Embora a Educação Ambiental (EA) do plano internacional seja muito relacionada com a dimensão ecológica, no Brasil ela se reveste de enorme envergadura social. Reconhecemos desta maneira, que ela não é um mero instrumento de gestão ambiental e que nossa luta está longe de ser finalizada. Ela é uma modalidade educativa que incorpora a rebeldia da contracultura, recebe herança da Antropofagia da Semana da Arte Moderna, incorpora o legado da Tropicália, ou espelha-se na corajosa e teimosa luta de sujeitos como Chico Mendes. Queremos forjar um mundo com mais justiça social e ambiental, através de táticas revolucionárias que possam promover a práxis de transformação contra os modelos insustentáveis de consumo e simultaneamente, incluindo a maioria que ainda vive sem condições dignas de sobrevivência. No Brasil, orientada pela Lei 9795-99 de Educação Ambiental (PNEA), e amparada no Programa Nacional de Educação Ambiental (ProNEA), o cenário rico testemunha um caldo vigoroso de originalidade, criatividade e preocupação social, ao lado da ambiental (BRASIL, 2005). Os estados se organizam em redes e comissões colegiadas, traçando diretrizes, metas, proposições e utopias em
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Agradecemos a Edinéia (Tangará da Serra, UNEMAT) e Lucileide (Cuiabá, GERA), parcerias do mesmo sonho. Membros do GT Educação do Projeto MTSD.
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horizontes de esperanças. O Estado de Mato Grosso não se esquiva deste compromisso, iniciando sua trajetória ecologista ainda na década de 1960, através do movimento dos artistas pela natureza e outros movimentos da vanguarda que trouxeram a criação do Parque Nacional da Chapada dos Guimarães. A primeira Organização Não-Governamental (ONG), a Associação Mato-Grossense de Ecologistas (AME) ainda possui sua dinâmica, porém tímida nos dias atuais. Grande parte de seus militantes ingressou em outras organizações, mudou de estado ou está em refluxo temporário. Estes ecologistas, entretanto, permitiram seus legados na criação da Rede Mato-Grossense de Educação Ambiental (REMTEA)3, hoje liderança forte em Mato Grosso, oferecendo eventos, contando com listas virtuais e em diálogos locais, nacionais e globais. Suas atuações políticas vêm sendo reconhecidas pelo fortalecimento de uma EA crítica, emancipatória e revolucionária. Não há registro sistematizado da EA popular, senão estudos de caso que revelam a forte presença da EA de forma multisetorial, com grupos ou sujeitos que carregam marcas indeléveis de significados e esperanças que se redefinem, redizem e ressignificam segundo os contextos e referências, à luz de nossas cosmogonias, crenças e valores. Ainda que a REMTEA tenha um amplo cadastro de seus membros, seus dados ainda são incipientes para oferecer um amplo panorama do estado da arte da EA. Isso implica dizer que não há um cenário padronizador que possa oferecer um perfil exato da EA no estado de Mato Grosso, senão um vasto e complexo campo das diversas culturas e ambientes. A Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) foi pioneira em oferecer um curso de especialização em Educação Ambiental na América Latina e Caribe, ainda no ano de 1989. Seus egressos tornaram-se lideranças em seus territórios e ainda hoje, é possível conversar com um ou mais grupos sobre o efeito desta inovação. Após esta fase, iniciou seu compromisso na pós-graduação stricto sensu, no Programa de Pós-Graduação em Educação, através do Grupo Pesquisador em Educação Ambiental (GPEA), que persiste vigorosamente até os dias atuais. 3
www.ufmt.br/remtea.
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Diversos projetos de pesquisa, vivência e docência foram e ainda estão sendo desenvolvidos, com premiações, financiamento e reconhecimento internacional. Assim como a UFMT, outras universidades, principalmente a Universidade de Estado de Mato Grosso (UNEMAT) também realizam suas atividades na EA, seja através de vivências comunitárias, docência ou pesquisa em amplo desenvolvimento. As Secretarias da Educação (SEDUC) e do Meio Ambiente (SEMA) comandam a Política Estadual de Educação Ambiental e possuem projetos e atuações fortalecidas no campo da EA. Buscam diálogos e transversalizando a EA em demais órgãos, e através da Comissão Interinstitucional de Educação Ambiental (CIEA), e acolhem vários organismos na Política Pública Privada, como o Departamento de Trânsito, Estradas e Rodovias (DETRAN), Fórum Mato-Grossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento (FORMAD), ou a Federação das Indústrias de Mato Grosso (FIEMT), além de diversos outros órgãos. Uma grande expressão da sociedade civil foi a Carta da Terra, que em seus 16 princípios, trouxe ressonâncias internacionais. A Carta da Terra, inicialmente liderada pelas Organizações das Nações Unidas em Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), regional Mato Grosso, foi incorporada facilmente pelos povos indígenas, organização de bairros, movimentos negros, mulheres, Comunidades Eclesiais de Base, artistas e Gays, Lésbicas e Simpatizantes (GLS), entre outros. Suas atividades iniciaram em 1998, com a realização da Conferência Internacional da Carta da Terra e têm sustentabilidade até os dias atuais (SATO, PASSOS & MALDONADO, 2005). A Agenda 21 de Mato Grosso ainda está em plena construção, mas nosso aporte à Agenda 21 nacional foi significativo, através de proposições e olhares críticos que possibilitaram também escrever uma agenda da EA, além da tessitura da agenda 21 escolar. Um outro destaque é o Coletivo Jovem de Mato Grosso (CJMT), liderado majoritariamente por universitários, com acolhimento aos estudantes do ensino médio e com forte articulação nacional e internacional. Engajados na plataforma política do governo federal: “Vamos Cuidar do Brasil”, atuam também nas escolas, participando da I Conferência Infanto-Juvenil do Meio Ambiente Pantaneiro (SATO,
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2006), e convém sublinhar o papel relevante destes jovens que em suas irreverências, possuem compromissos que podem dar sustentabilidade aos chamados “dinossauros” da EAda década de 1960, ainda em plena liderança no Estado. A Lei Estadual da Educação Ambiental (7888/00) deve ser revisitada, com a coragem de permitir que o Programa Mato-Grossense de Educação Ambiental (ProMEA), acene sua dinâmica de mutação. Novos projetos em parcerias, redes, comissões e coletivos educadores formam uma grande comunidade de aprendizagem nos setores escolarizados e também em territórios não escolarizados, construindo a escola e seu entorno, através de Organizações Não Governamentais, instituições governamentais, empresas, escolas, artistas e sujeitos. Cumpre ressaltar que no ano 2005, a REMTEA e o FORMAD realizaram conjuntamente uma audiência pública com o Ministério do Meio Ambiente, reforçando o papel da sociedade civil na participação democrática da construção e formulação de políticas públicas. Na contemporaneidade dos compromissos e agendas da EA, o Coletivo Educador vem sendo construído no Programa de Formação em Educação Ambiental no Pantanal (ProFEAP), que em aliança com o estado de Mato Grosso do Sul, busca oferecer uma variedade de pratos no rico cardápio de variedades e exuberâncias dos pantanais mato-grossenses. Ultrapassando a rigidez e engessamento das tradicionais disciplinas, cursos ou palestras, o cardápio pode ser uma variação gastronômica da antropofagia oswaldiana, em comer o feio para que o belo floresça. Na meta de promover o empoderamento comunitário, basicamente através da agitação e barulho da educação popular, o coletivo educador se arranja na composição de tons e semitons que matizam Mato Grosso e seus Municípios Educadores Sustentáveis (MES). A proposta dos MES descentraliza as políticas, permitindo que as políticas sejam desenhadas conforme necessidades e limites das biorregiões. A ordem na desordem pode ser percebida na exuberante e bela natureza, mas ameaçada em seus impactos; ou no sabor das expressões culturais, ameaçadas pelo efeito globalização que padroniza as identidades. Uma outra frente em EA veio no Projeto “Mato Grosso Sustentável e
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Democrático (MTSD)”, inicialmente liderado pela UNEMAT Tangará da Serra, Grupo de Estudos sobre Reforma Agrária (GERA) e UFMT. A meta era diagnosticar o estado da arte da EA em espaços escolarizados e não escolarizados, através da fonte de consulta dos organismos da educação formal, bem como ONGs. Entretanto, a ausência de financiamento foi determinante em encolher o universo, e conjuntamente com a SEDUC, conseguimos um vasto panorama da EA escolar. É sobre este contexto que o presente texto decorre seu olhar fenomenológico. Partituras Através dos relatórios entregues pelas 27 secretarias de educação de cada estado brasileiro, o Ministério da Educação (MEC), em conjunto com o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), lançou um amplo diagnóstico acerca do estado da arte da EA nas escolas (VEIGA, AMORIM & BLANCO, 2005). A análise documental, que não contou com uma pesquisa empírica, revela que a EA acompanha a evolução do número de escolas do ensino fundamental, apontando um aumento na promoção da EA de, aproximadamente, 72% no ano 2001 para 95% em 2005. Em Mato Grosso, este número sobe de 57% para 94%, em sintonia com o cenário nacional. Comparando regiões urbanas e rurais, o saneamento aparece como proposta da EA, sem referência à saúde, ambas dimensões transversais nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). Inscreve-se nesta proposta da Agenda Marrom, o tema mais popular da EA no cenário internacional: os resíduos sólidos, com ênfase exagerada na Pedagogia da Reciclagem, que favorece a coleta seletiva do lixo sem reflexão da inadequação do modelo desenvolvimentista da sociedade global. A coleta seletiva, geralmente em latas coloridas que indicam as características dos resíduos sólidos, aponta a preocupação do destino final do lixo, e isso não pode ser encarado como meta da EA, uma vez que o consumo já foi realizado e o resíduo representa um problema que não foi evitado. Se conseguirmos transcender da “Pedagogia da Reciclagem” à “Pedagogia dos 3 R (Redução, Reutilização e Reciclagem)”, alertaríamos sobre importância
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da reflexão crítica dos modelos de desenvolvimento, evidenciando as disparidades sociais desassociadas das complexidades ambientais, desde que o consumo exagerado de poucos gera a miséria da maioria da civilização humana. Algumas pessoas se segregam e dialeticamente são segregadas na vida dos lixões, à mercê das políticas ineficientes que corroboram a exclusão social e o prejuízo ambiental. Ahistória do Homo sapiens revela que os danos ambientais recaem, majoritariamente, nas camadas economicamente desfavorecidas e a Rede Internacional da Justiça Ambiental conclama os direitos e a possibilidade de vidas dignas, através de táticas que promovam a inclusão social com proteção ecológica. A análise quantitativa de relatórios esconde de qual EA estamos tratando, desde que inúmeras atividades em datas comemorativas, conteúdos abordados nas ciências naturais e geografia, ou atividades pontuais de plantar árvores podem ser compreendidas como práxis da EA. Tornou-se, assim, imperativamente importante realizarmos um diagnóstico mais local, que pudesse oferecer uma interpretação mais qualitativa do estado da arte da EA mato-grossense. No ano de 2004, a Secretaria de Estado de Educação de Mato Grosso (SEDUC) encaminhou um denso questionário às escolas públicas, com o objetivo de lançar um olhar mais crítico à práxis educativa, além de promover encontros e conhecimento empírico das realidades escolares. O retorno de 52% dos 5 mil questionários encaminhados às escolas, valida a fidedignidade do espaço amostral, que abarca vários municípios de áreas indígenas, rurais e urbanas. Embora com a maioria numérica de escolas urbanas (69%), e com a clara divisão entre os efetivos e contratados, cumpre ressaltar que das 22 escolas indígenas do Estado, tivemos o retorno de 14 escolas, evidenciando a participação e interesse indígena, que merece especial atenção na formulação de políticas educacionais. Admiravelmente, a maioria dos questionários foi respondida por professoras e professores com formação em Pedagogia (22%) e Letras (20%), contrariando a tradicional presença de disciplinas como a Biologia (18%) ou a Geografia (10%). Uma outra agradável surpresa foi a presença de 10% de questionários respondidos por professores de Matemática, área tradicionalmente alheia as dimensões ambientais, e cujas dificuldades pedagógicas são debatidas mundialmente no
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enfoque da EA. A área de História expressa sua relevante participação na EA com uma representação de 9%, e surge, inclusive, a disciplina de Educação Física, embora com representação de apenas 1%. Abarcando várias outras disciplinas (10%), as escolas mato-grossenses demonstram que a temática ambiental compreende uma polissemia de sentidos e interpretações e que as fronteiras do conhecimento podem ser superadas, através do engajamento responsável de todos os cidadãos. Este resultado valida a preocupação mundial com o ambiente, desafiando as fronteiras do saber ao tratamento transdisciplinar requerido à EA. O diagnóstico revela que a leitura de 50% de professoras e professores traz o ambiente como um lugar para se viver, cuja territorialidade deve ser protegida e cuidadosamente valorizada. 18% ainda mantêm a percepção da instrumentalização, e consideram que a EA seja uma mera ferramenta para solucionar os dilemas ambientais como as queimadas, monocultura ou perda da biodiversidade. Embalados pelos desejos da proteção ecológica, talvez estes professores não consigam enxergar os campos epistemo-praxiológicos próprios da EA. Em contraposição a este olhar, 16% buscam a construção de sociedades sustentáveis, inscritos nos desejos da participação democrática à promoção da inclusão social e da proteção ambiental como fatores conjugados dos processos educativos. Figura 1: Olhares da EA
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Na década (2005-2014) que se orienta mundialmente pela “Educação para o Desenvolvimento Sustentável (EDS)”, é um conforto constatar que apenas 5% dos professores compreendam a EA como elemento desenvolvimentista. O desenvolvimento foi sempre orientado através de visões dominantes do poder, com falhas históricas e dúvidas existenciais (FIELD, 2006). As orientações hegemônicas internacionais, em particular as relacionadas com os programas educativos da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), Banco Mundial e Fundo Monetário Internacional (FMI), insistem em globalizar os discursos e padronizar os diferentes. No contexto fenomenológico, é evidente que as orientações, ou os 'pacotes' vindos de cima devam ser rejeitados, porque não são partes intrínsecas das identidades dos sujeitos que atuam na EA. Se 4% dos professores compreendem a dimensão ambiental em sua globalidade planetária, muitas vezes conclamando que Gaia é um planeta vivo, há que sublinhar que outros 4% conclamam a terra, a água, o fogo e o ar da biorregião como fatores prioritários à incorporação da EA. Apenas 3% ainda percebem a EA associada aos elementos da natureza, entretanto, esta pequena porcentagem contradiz os cartazes e narrativas apresentados durante a I Conferência Infanto-Juvenil do Ambiente Pantaneiro, realizada no final do ano de 2005. Sob a coordenação da SEDUC, do MEC, da UFMT, do Centro de Pesquisa do Pantanal (CPP) e do CJMT, cerca de 100 escolas pantaneiras participaram da conferência expondo cartazes que evidenciavam a esmagadora visão da EAnaturalista. As narrativas dos estudantes revelavam um banquete do belo, com cantos de insetos, revoar de borboletas, exuberância de flores e árvores, plumagens de pássaros ou percursos dos rios, bastante distantes da existência humana (SATO, 2006). Entretanto, num contexto mais genérico, talvez as professoras e os professores estejam se esforçando para superar o “mito moderno da natureza intocada” (DIEGUES, 1994), buscando construir uma trajetória da EAque aposte na utopia de um 'outro mundo possível'. As dificuldades para inclusão da EA nas escolas são sublinhadas principalmente pela ausência de materiais pedagógicos, o que orienta a formulação de políticas públicas que estimule a produção de materiais locais com ampla
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divulgação como plataforma das políticas de EA. Um segundo problema concentra-se na escassez de processos formativos, iniciais e continuados, que acarreta diversos outros problemas como: inabilidade em se trabalhar em grupo ou formar parcerias; redimensionar o currículo às temáticas transversais; compreender os conceitos subjacentes ao campo da EA; fomentar participação comunitária nos projetos da escola; e a enorme dificuldade em se avaliar a aprendizagem no âmbito da EA, já que, por ser uma proposta de vanguarda e incorporada tardiamente pelos sistemas formais da educação, os modelos de avaliação tradicionais não conseguem abarcar o processo da formação de uma comunidade de aprendizagem. Considerações sobre ausência de recursos, ou infra-estrutura escolar precária são outros aspectos apontados como obstaculizadores à EA. Obviamente, referendar a EA é também considerar o trabalho docente e sua trajetória salarial, já que ela não é uma ilha isolada de um continente em crise. Entretanto, as políticas devem orientar as agências de fomento para melhor divulgação, com facilidade no cumprimento dos editais, desde que mesmo em condições de financiamento às atividades da EA, distanciam-se das realidades escolares em função do excessivo engessamento burocrático. Os eventos devem estimular a participação dos professores com trabalhos, pois estes garantem a visibilidade, divulgação e conhecimento das inúmeras experiências que pulsam e embelezam o Estado, mas que paradoxalmente se fragilizam pelo seu anonimato. Para a análise das temáticas abordadas nas escolas, orientamo-nos pela construção da Agenda 21, e nesta divisão, a Agenda Verde lidera com 35% por meio de vivências relacionadas com a proteção da biodiversidade, preocupações com a queimada, integridade ecossistêmica, cuidados nas matas ciliares ou preocupação com as indústrias madeireiras e a monocultura. Incorporamos as atividades relacionadas com hortas e jardinagens, temas bastante comuns nos programas de EA do mundo todo (figura 2). O fato de a Agenda Verde superar a Agenda Marrom (30%), contrariando o diagnóstico nacional com atividades excessivas relacionadas ao saneamento, lixo ou esgoto, pode evidenciar a notória
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percepção dos danos ambientais no Estado, despertando a sensibilização da comunidade escolar em não segregar a qualidade de vida dos aspectos naturais. Cuidados com a comunidade do entorno escolar, valorização da cultura através de mitos ou expressões artísticas revelam o compromisso da Agenda Social (21%) intrinsecamente relacionado com a dimensão ambiental. Os componentes da Agenda Azul (13%) evidenciam a preocupação e cuidado com a água, nascentes, rios e olhos da água, numa das regiões mais ricas do potencial hídrico do planeta, na presença das bacias do Alto Paraguai, Platina e Amazônica. Todos os ecossistemas mato-grossenses, quais sejam, a Amazônia, o Cerrado e o Pantanal são paisagens com intrincadas tessituras de ligação e, se um elo for danificado, todo o sistema poderá entrar em colapso. 6% das temáticas carregam proposições de fortalecimento da legislação, busca de energia alternativa ou construção da educomunicação, uma nova tática que consagra a formação e a informação em movimentos circulares de transmissão e recepção, na ultrapassagem do produto informacional à valorização dos processos formativos, e, essencialmente, na responsabilidade sócio-ambiental que edifica uma Nação. Figura 2: Temáticas abordadas
Embora a maioria das respostas indique que os sujeitos envolvidos nas atividades da EA sejam de coletivos de professores e estudantes, muitas vezes com o envolvimento de toda a escola, inclusive com a comunidade do entorno, as aulas expositivas aparecem como estratégia mais utilizada pelos respondentes
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do diagnóstico. Dificulta, desta maneira, compreender como as aulas são oferecidas aos membros da comunidade ou funcionários da escola, já que é uma estratégia restrita ao âmbito da sala de aula. Reforçando o paradoxo, os livros didáticos surgem como principal recurso utilizado, absolutamente na metade das respostas obtidas. Informações dos veículos de comunicação de massa; trabalhos de campo; palestras com especialistas; acesso à internet; documentos e diálogos possíveis em eventos da EA constituem como demais recursos utilizados nas vivências em EA(figura 3). Figura 3: recursos mais utilizados
As estruturas educadoras como parques urbanos, museus, ou unidades de conservação são pouco citadas, talvez fruto da demasiada burocracia exigida nos trabalhos de campo, na ausência de tempo ou na inabilidade em se trabalhar na perspectiva de multirreferências, agregando mais de uma área do conhecimento às atividades da EA. Somado a estes fatores, não há sistematização coerente que possibilite a divulgação destes centros de EA, inviabilizando a utilização destas estruturas como potenciais aliadas à práxis pedagógica da EA. Embora diversos materiais, publicações, jogos ou multimídia sejam divulgados cotidianamente, tais recursos ainda estão distantes da vida pedagógica das escolas, demarcada pelo uso excessivo dos tradicionais livros didáticos. Estudos sobre os livros didáticos (LD) evidenciam que o valor de um texto é determinado pela qualificação do educador (SATO, 1992). A formação crítica na qualificação docente possibilita que a professora, ou o professor, execute sua
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tarefa com louvor, desde que sua formação possibilitará lançar um olhar aguçado às tendências, ideologias ou erros conceituais de qualquer LD. Por outro lado, um bom livro jamais fará um bom professor, pois o valor e a aceitação da EA vão depender da capacidade emancipatória da formação intelectual do educador. É fundamental, portanto, que as políticas públicas incorporem o processo de formação permanente na práxis educativa. Para além dos recursos pedagógicos e processos formativos, entretanto, há que considerar a importância de um desenho dos Projetos Políticos Pedagógicos (PPP), perspectivando a dimensão ambiental nos currículos escolares, e não apenas nas paixões movidas pela militância da luta ecológica. A institucionalização da EA não representa seu engessamento, desde que a causa ambiental transcenda os espaços escolares e solicite um currículo fenomenológico mais amplo (PASSOS & SATO, 2002), que se inscreva na produção e reprodução de culturas das diversas sociedades sustentáveis. “Educar, na perspectiva libertária e demais tendências pedagógicas que dialogam no campo crítico, é emanciparse, exercer ativamente a cidadania, construir democraticamente as alternativas possíveis e desejadas” (LOUREIRO, 2004, p. 35). Assim, é preciso fortalecer as políticas públicas que favoreçam a construção dos Projetos Ambientais Escolares Comunitários (PAEC), que aliem a dimensão escolarizada ao saber popular, e que sobremaneira, resgatem a função revolucionária do processo pedagógico à capacidade de mobilização, para que a democracia seja participativa e não meramente representativa. Clausura A morfologia da EA não é austera, mas sua fisiologia é legítima e dinâmica, e muitas vezes, assemelha-se à teia de aranha, na metáfora weberiana da cultura que é tecida por dentro, externaliza-se e sustenta a sobrevivência humana. Se um fio se solta do emaranhado de fios e novelos da teia, a aranha então comanda a operação de resgate, buscando táticas que possam fiar novos tecidos na trama flexível da EA. A teia construída sofre intempéries de chuva, ventania e poeira. Entretanto, superando o caos, busca em seus labirintos, seu caminhar ao hori-
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zonte, superando obstáculos no equilíbrio e na dinâmica do ciclo da vida e da morte. Em síntese, o estado da arte da EA no estado de Mato Grosso sempre foi desenhado através dos princípios de: • Trabalhos dialógicos em parceria; • Privilégio da mediação pedagógica em situações de conflitos; • Reconhecimento das multirreferências e na existência de saberes populares e científicos; • Aceitação de um enfoque emancipatório, complexo e crítico; • Reflexão filosófica por uma ética menos antropocêntrica; • Respeito à diversidade biológica e à diferença cultural e étnica; • Competência em aliar o local com o global; • Descentralização das ações, fortalecendo os municípios; • Adequação de propostas biorregionais, contextualizadas nos limites e potenciais de cada grupo social ou território; • Proposta de transversalizar a EA em projetos, programas, currículos e instituições; • Conhecimento e liberdade autônoma dos sujeitos e instituições através de pactos éticos; • Adoção dos princípios à construção de sociedades sustentáveis, por meio de ampliação das parcerias interinstitucionais e intersetoriais. O fortalecimento da EA como programa de políticas públicas representa uma guinada conceitual e prática em direção à consolidação da função social da educação, propriamente dita, que poderá convergir para um genuíno compromisso com a participação para a desejada transformação social e responsabilidade ecológica. Poderá ser um momento de inauguração histórica, na aliança dos protagonistas atuantes do estado, que sob compromisso social, mantêm seu foco na dimensão ambiental do Estado. Ao trazer a História da EA, reescrevemos a memória, ainda que incompleta e faltando detalhes do movimento. Nada jamais conseguirá fazer com que a EA se desvie da aventura que escolheu. O movimento ecológico foi, e continuará sendo definido por grupos diferenciados, com instrumentos capazes de tocar
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músicas muito distintas, em sistemas e compassos muito específicos. Não é esta a lógica que sustenta o aparelho do pragmatismo, porque a história não se movimenta por lógicas, mas por interesses. E as correlações de forças são mutáveis. A meta esmiuçada, ponto de partida para a construção da EA, é o grande desafio de quem se aventura a trabalhar em um grupo com diversos interesses. Refazer e criar os desejos de esperanças, como sentido gerador no tempo, é a ação de ofício de quem se arrisca a domar e a desvendar a EA. Ainspiração incita a ação de desfazer e desconstruir a trama, algumas vezes amorosamente tecida por diversas mãos, por outras vezes, violenta contra as agressões que ferem a liberdade. A EA representa, desta maneira, malhas frágeis de conflito que necessitam de cuidados na dinâmica da cultura e da natureza. Representa uma viagem de constantes tessituras que se tocam e se articulam mutuamente, não na sobreposição de uma ou outra opinião, mas na tensividade de sua complementação. É no ritmo e na pausa deste desejo de transformação que a EA se põe em circularidade, onde os perdedores das armas nem sempre são derrotados da esperança e onde a utopia se inscreve na ousadia de correr os riscos, pois somente aqueles que se aventuram em territórios ameaçados compreendem a dimensão da vitória. São estes os compromissos da Educação Ambiental que ousa propor seu programa desenhado pela democracia, na participação dos diferentes segmentos do Estado que não se sobrepõem, nem se recusam a dialogar nesta construção, mas que, sobremaneira, quer complementar suas diferenças e competências no caldo vigoroso que torna Mato Grosso especial na sua tessitura da Educação Ambiental. Instrumentos musicais BRASIL, Ministério do Meio Ambiente; Ministério da Educação. Articular, fortalecer e enraizar a Educação Ambiental para um Brasil de todos. Brasília: Órgão Gestor da Política Nacional de Educação Ambiental - MMA/MEC, 2005. CARSON, Rachel. Silent spring. Boston: Houghton Mifflin Company, 2002 (40ªed). DIEGUES, Carlos. O mito moderno da natureza intocada. São Paulo: Hucitec, 1994.
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Apoio
ISBN85-88421-37-2
9 788588 421370