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Aulas de Noventa Minutos Joaquim António Pinto*
“... o jovem não quer mais ser enganado por uma escola, uma instituição obso leta, por professores que não sabem mais como repetir o velho. Eles querem encontrar gente que com eles procure o novo.” [Ubiratan D’Ambrosio (1997/a)] É com grande satisfação que escrevo estas linhas para me congratular com a chegada das aulas de noventa minutos ao nosso Sistema Educativo, porque ando há três anos e alguns meses como Professor Acompanhante a “pedir tempo” para poder dar cabal expressão ao preconizado no actual Programa de Matemática do Ensino Secundário. Hoje as solicitações do meio onde os nossos estudantes estão inseridos são demasiadas e deixam pouco tempo para que estes se preocupem com a Escola; deste modo, as aulas de noventa minutos, vão possibilitar a melhor motivação dos estudantes e o desenvolvimento dentro da sala de aula de algum do trabalho que antes tinha de ser desenvolvido aos pedaços e em casa. Não quero com isto dizer que este tem de deixar de ser feito, antes pelo contrário, tem sempre que complementar o que é feito na aula, mas assim o aluno pode ficar mais motivado para esse trabalho se puder ir mais longe na aula. Não é minha intenção estar aqui a transcrever o que está escrito no Programa, todos nós já o lemos e relemos, no entanto, acho importante aproveitar este espaço para, tal como o Professor Ubiratan, salientar que tais aulas vão permitir fazer melhor Matemática e não servir simplesmente Matemática pronta a “comer”; para se poder enveredar por tal caminho é necessário mais tempo. Todos nós sabemos que cinquenta (quarenta e cinco, quando muito) minutos não chegam sequer para dar verdadeiramente início a uma tarefa, quanto mais extrair tudo aquilo que pensamos que ela pode proporcionar quando a preparamos. Porque nós aprendemos não só porque fomos ensinados, mas também porque somos o resultado das nossas próprias histórias: “Carregamos nosso passado, para bem ou para mal. Mas a autocrítica permanente permite evitar a satisfação ilusória de se crer que é possível ter as soluções para situações novas naquilo que já se sabe, no que já se fez, no que já se aprendeu, e que serviu para situações velhas. Claro que quanto maior nossa experiência, mais elementos temos para enveredar pelo novo. Mas a mesmice dificilmente nos leva ao novo. Isso é fun damental em educação”. [Ubiratan D’Ambrosio (1999)]. Donde a nós professores nos é “reservado o papel de dialogar, de entrar no novo junto com os
alunos, e não o de mero transmissor do velho. O professor cuja actividade é transmitir o velho não tem mais espaço neste mundo que estamos começando a viver”. [Ubiratan D’Ambrosio (1997/a)]. É aqui, que as aulas de noventa minutos, vão possibilitar que o professor assuma, de uma vez por todas, “Uma das suas características, uma das grandes virtudes do professor é ele se expor perante seus alunos. Se expor quer dizer mostrar as dúvidas que eles têm, as incertezas, e con vidar os alunos a juntos procurarem direcções novas”. [Ubiratan D’Ambrosio (1997/a)]. Ora, a exposição que estas aulas vão “obrigar” o professor pode assustar, no entanto, só aceitando estes desafios é que evoluímos como professores e, deixando de lado a “mesmice”, é que poderemos alcançar resultados diferentes daqueles que até aqui temos conseguido æ uma geração de estudantes com grandes dificuldades de interpretar o conteúdo de um texto e incapazes de responder a uma pergunta que tenha mais do que cinco palavras, por um lado, e por outro, estudantes que respondem sem o mínimo espírito crítico, aceitando, de ânimo leve, todo e qualquer resultado que obtenham por mais disparatado que este seja. Ora, é importante que “os estudantes possam fazer matemática com autonomia. É bem claro que as aulas de noventa minutos significam diversificação de metodologias e novas relações pedagógicas na sala de aula. As aulas de noventa minutos significam nova organização do espaço aula, não podem reduzir-se a exposições magistrais, exigem actividade aos alunos. Mas não é isso que todos reclamam quando dizem que, na actual divisão horária das aulas, não podem propor actividades que os alunos autonomamente desenvolvam?” [Público, 12 de Maio de 2000, Três preciosas mudanças que é preciso defender por Arsélio Martins, Graziela Fonseca e Jaime Carvalho e Silva]. Por tudo o que aqui foi exposto e porque vivemos num tempo que corre muito depressa, é que, cada vez mais, temos as novas tecnologias como um aliado que já entrou nas nossas aulas sem nos termos dado conta disso, e ainda bem, pois só nos falta capitalizar devidamente todo esse potencial em nosso proveito. Aproveitando a predisposição e apetência, da generalidade dos alunos, para lidar com ela e, assim aprendermos também, vivendo cada vez mais junto do aluno, dando-lhe conforto e auto-estima, um dos objectivos preconizados no presente Programa. E para fazer isto, nada melhor do que aulas de noventa minutos. (Continua na pág. 7) * Escola Secundária Marques de Castilho, Águeda. E-mail:
[email protected]
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A Avaliação em Trabalho de Grupo Vladimiro Machado*
Algumas Secções num Octaedro Regular
1. No octaedro regular que construíram, considerem a secção [ABCD]. O que é que podem conjecturar acerca das secções produzidas no octaedro por planos paralelos ao plano que contém a secção [ABCD]. 2. Apresentem uma prova para a conjectura feita. (sugestão: consultem os manuais de 7.º, 8.º e 9.º). 3. Indiquem qual a secção de área máxima e de área mínima.
Introdução
Trabalho de grupo - elaboração de um texto
No Ajustamento do Programa de Matemática (1997) afirma-se:
Na primeira tarefa os grupos estabeleceram a sequência generalização, conjectura e prova. Os dois primeiros aspectos foram ultrapassados rapidamente, já na prova manifestaram dificuldades. Para a construção desta cada grupo teve a oportunidade de consultar os manuais de 7.º, 8.º e 9.º ano. A pesquisa trouxe alguns problemas, nomeadamente tiveram dificuldades em situar os assuntos, o que conduziu a que se fornecessem algumas pistas para promover uma procura eficaz. Na posse de ‘novos’ conhecimentos os alunos confrontaram opiniões sobre a prova a apresentar e acabaram por elaborar um texto com as conclusões.
“O professor não deve reduzir as suas formas de avaliação aos testes escritos, antes deve diversificar as formas de avaliação de modo a que cerca de metade seja feita usando outros instrumentos que não testes clássicos.” (p.13). Em face disto surgiu a necessidade de implementar outros instrumentos de avaliação o que relançou algum debate em torno da avaliação. Muito naturalmente que para além do conhecimento de outros instrumentos de avaliação importa o modo como estes são usados. Centrando-nos neste último aspecto iremos dar o nosso contributo para esse debate. Assim, levamos até à prática um modo de integrar a avaliação na aprendizagem, e é de referir que rejeitamos assumir a avaliação e a aprendizagem como dois sistemas separados. Contudo tivemos sempre presente que embora integrados, o nosso objectivo era a aprendizagem e não a avaliação, ou seja criamos condições para que a avaliação pudesse contribuir para uma melhoria da aprendizagem.
Na segunda tarefa, após a leitura, procederam às medições que entenderam como necessárias, num octaedro de oito centímetros de aresta que tinham construído em casa. Com os dados recolhidos elaboraram um gráfico (em papel quadriculado) revelando, em geral, dificuldades em identificar se a linha que obtinham era ou não uma curva. Por isso o professor, quer por solicitação dos grupos quer por iniciativa própria, decidiu apoiar iniciativas que permitissem esclarecer a situação. Assim, e depois de confrontarem opiniões, acabaram por elaborar um gráfico e um texto explicativo.
Um modo de… Avaliação descritiva - dos textos
Numa turma de 10.º ano, implementou-se uma avaliação em que se privilegiou essencialmente o desenvolvimento do raciocínio e da capacidade de comunicar. Para isso elaboraram-se duas tarefas que foram resolvidas num contexto de trabalho de grupo. Na primeira tarefa tinha-se como principal objectivo que os alunos ‘viajassem’ desde a generalização passando pela conjectura até à prova, e na segunda que estabelecessem conexões entre os temas de geometria e de funções.
Cada um dos textos foi sujeito a uma avaliação descritiva baseada num descritor de avaliação construído para o efeito. Nesta realçou-se os aspectos positivos já alcançados, e indicou-se aqueles que deveriam ser sujeitos a uma melhoria ou alteração; enfatizando-se os aspectos que diziam respeito à clareza, à simbologia matemática e em especial ao conteúdo. Naturalmente que a avaliação assumiu um caracter holístico em contraposição a uma simples correcção de erros.
Durante sete tempos lectivos (alguns dos quais duplos) os alunos realizaram consecutivamente as duas tarefas em trabalho de grupo, e no final apresentaram as conclusões à turma. A metodologia usada para cada uma das tarefas compreendeu quatro fases: (1) trabalho de grupo com elaboração de um texto; (2) avaliação descritiva do texto; (3) trabalho de grupo para a preparação de uma apresentação à turma, com elaboração de um acetato; (4) avaliação descritiva do acetato. Posteriormente o processo terminou com mais duas fases: (5) trabalho de grupo para ajustes nos acetatos e apresentação à turma; (6) trabalho individual para a elaboração de um relatório.
Trabalho de grupo - preparação de uma apresentação à turma O texto referente à primeira tarefa foi devolvido com a avaliação, juntamente com um acetato para registo das conclusões a apresentar à turma. Em face disto os grupos, depois de lerem a apreciação feita, discutiram os aspectos a serem melhorados e/ou alterados. De referir que houve um maior envolvimento na actividade matemática, tendo surgido uma nova oportunidade para argumentarem e refutarem. Finalmente estabeleceram um acordo sobre o modo de optimizarem em especial o conteúdo matemático. Mas apesar de terem construído uma prova aceitável para a proporcionalidade dos lados tiveram muitas dificuldades quanto à igualdade dos ângulos. Assim tornou-se necessário dar um esclarecimento para toda a turma de como se podia comprovar esse facto. Posto isto elaboraram o acetato para apresentar à turma.
Trataremos seguidamente em simultâneo cada uma das fases que corresponde à resolução das tarefas e posteriormente as duas últimas.
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m Trabalho de Grupo dimiro Machado*
Quanto à segunda tarefa o processo seguido pelos grupos foi o mesmo terminando com a elaboração do acetato. Avaliação descritiva - dos acetatos Para cada um dos acetatos produziu-se uma avaliação descritiva que agora obedeceu a uma apreciação mais rigorosa sobre os aspectos da clareza, da simbologia matemática e do conteúdo. De igual modo esta baseava-se num descritor de avaliação construído para o efeito. Também aqui se privilegiou uma avaliação holística em detrimento de uma mera correcção de erros. Importa realçar que, em especial, a prova apresentada nos acetatos estava substancialmente mais elaborada que nos textos. Trabalho de grupo - apresentação à turma A avaliação dos acetatos foi entregue aos grupos no início dos dois tempos lectivos destinados à apresentação e debate das conclusões. Assim, numa primeira parte permitiu-se aos grupos que voltassem a reflectir sobre a actividade matemática, tendo alguns deles alterado parcialmente aspectos dos acetatos. Para a apresentação escolheram-se dois grupos para cada uma das tarefas, pois repetições nada aportariam de novo para a aprendizagem. Os grupos escolhidos organizaram-se livremente para a apresentação à turma. Cada um dispôs de cerca de quinze minutos para a apresentação, a que se seguiu um debate com resto da turma, quer para esclarecimento de algum ponto menos claro quer para contestar afirmações produzidas. Estes debates permitiram que os alunos abordassem conceitos como a razão de semelhança entre figuras (no que se refere ao perímetro e à área) e proporcionalidade directa e inversa. Tendo o professor durante os debates assumido o papel de moderador. Trabalho individual - o relatório No final do debate estabeleceu-se um prazo de quinze dias para a elaboração de um relatório individual. Os alunos foram informados que nele deveriam descrever a actividade matemática produzida no grupo, as conclusões a que chegaram e aprofundarem os assuntos tratados segundo alguma vertente. Com base num descritor de avaliação produziu-se uma avaliação qualitativa e descritiva dos relatórios. Nestes os alunos, de um modo geral, apresentaram de um modo correcto o essencial sobre os assuntos tratados nas aulas e, cada um segundo as suas possibilidades teve oportunidade para aprofundar os assuntos em alguma direcção.
Nota Final Em consonância com o que afirmamos na introdução (o nosso objectivo é a aprendizagem e não a avaliação) durante a actividade dos grupos apenas se procedeu a uma avaliação informal do trabalho desenvolvido. De facto rejeitamos as opções que conduzem uma avaliação que se torne ‘asfixiante’em trabalho de grupo, isto é, ao uso de uma panóplia de instrumentos de avaliação. Uma vez que esse modo de avaliação por um lado afasta o professor do seu papel central de gestor de situações de aprendizagem, e por outro pode gerar nos alunos um clima em que a confiança se desvanece. Assim importa realçar que nestas circunstâncias a avaliação proporcionou aos alunos oportunidades para reflectirem sobre as suas aprendizagens. Após cada momento de avaliação os alunos tiveram oportunidade de reflectirem ultrapassando dificuldades e desse modo melhorando a aprendizagem. Aliás, a isso se refere uma das alunas nas suas conclusões do relatório:
Das Secções no Octaedro Regular ao gráfico
Meçam a aresta [EB]. Considerem vários pontos nessa aresta e registem, na tabela abaixo, a distância desses pontos ao vértice E. Em cada caso determinem a área da secção obtida na tabela abaixo. Elaborem um gráfico representando no eixo das abcissas a medida do lado da secção e no eixo das ordenadas a área da secção. Que linha se obtém?
“Agradou-me este trabalho pois todo o grupo sugeriu hipóteses diferentes, o que gerou um ‘debate’ entre todos os elementos.” (Ana). e mais à frente escreve: “Achei interessante tudo em geral mas, principalmente, as dificuldades pois é sempre muito difícil iniciar-se uma tarefa.” (Ana). Na opinião desta aluna fica clara a importância que teve a metodologia implementada na ultrapassagem das dificuldades. Um outro aluno coloca um enfoque no relatório ao afirmar: “Quanto ao relatório, penso que cumpriu aquilo que considero o seu principal objectivo, ou seja, uma apreensão facilitada dos conteúdos programáticos em questão.” (Alberto). Nesta opinião é notório que assume o relatório como o culminar de um processo que lhe permitiu uma aprendizagem mais conseguida. Em síntese a avaliação que se produziu neste contexto criou condições propícias tanto para a clarificação, como para o aprofundamento dos conceitos matemáticos envolvidos, quer em grupo quer individualmente. Aqui a avaliação constituiu um ponto de apoio para a aprendizagem permitindo que os alunos pudessem ir tanto além quanto lhes era possível.
* Escola Secundária de Valongo.
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Distância ao Vértice E
Medida do lado da secção
Área da secção
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História no ensino da Matemática: O caso da T Iran Abreu Mendes 2
História na geração do conhecimento matemático O ensino da matemática é a preocupação básica dos estudos e pesquisas em Educação Matemática nos diversos centros académicos de todo o mundo. Muitos desses estudos apontam para vários fracassos do referido ensino e sugerem que novas estratégias devem ser utilizadas para melhorar a qualidade desse ensino. Dentre as estratégias alternativas de ensino existentes, encontramos na história um bom aliado que pode reforçar nossa tentativa constante de solução das dificuldades encontradas no ensino da Matemática em qualquer nível de ensino. Falar de história nos leva a pensar em narração de fatos e acontecimentos ocorridos na evolução das sociedades ou, ainda, no grupo de acontecimentos adquiridos através da tradição oral e/ou mediante documentos ligados ao passado da humanidade. Não podemos, contudo, perder a certeza de que somos hoje o resultado das revoluções mentais, sociais, físicas e climáticas do ontem. O ontem é o ocorrido, às vezes, documentado, ou mesmo transmitido oralmente e que assim se transforma em história. Todavia ficamos a reflectir acerca de algumas questões do tipo: qual a relação da matemática com a história? A matemática é considerada como um fragmento dos saberes contidos no aglomerado de informações do arcabouço cultural da humanidade que ao longo do tempo adquiriu o valor estético de ciência. Diante desse fato é possível admitirmos que o processo de construção desse aglomerado cultural perpassa uma relação estreita entre a matemática que hoje temos ou fazemos e o seu desenvolvimento histórico. Todavia é necessário compreendermos qual a utilidade da história para a matemática. Acreditamos que a conexão entre a matemática e sua história se apresenta como um forte argumento para a explicação dos porquês matemáticos, para a busca de demonstração de teoremas e propriedades matemáticas, que possivelmente levou e ainda hoje leva os matemáticos a se valerem das informações históricas para obter subsídios necessários a solução de enigmas que respondam questões abertas apontadas pelos problemas da sociedade. Tais questões posteriormente serão respondidas e transformar-se-ão em conhecimento matemático formal. Essas questões respondidas (conhecimento matemático sistematizado) são consideradas questões abertas para os estudantes, no momento em que eles necessitam compreendê-las para prosseguir em seu estudos na escola. Entretanto nos vem uma nova questão: como
as informações geradas pela história da matemática poderão ser utilizadas no ensino de matemática? A investigação em história da matemática actualmente pode ser considerada uma alternativa metodológica para o ensino de matemática escolar e baseia-se em pressupostos que defendem o uso dessas informações através de actividades de aprendizagem para o aluno. Desse modo podemos buscar na história fatos, descobertas e revoluções que nos mostrem o carácter criativo do homem quando se dispõe a elaborar e disseminar a ciência matemática no seu meio sócio-cultural. Quando este aspecto da história é incorporado no ensino da matemática, o aluno tem mais condições de construir a matemática como um conjunto de ideias que são não somente interrelacionadas, mas também relacionadas a outros aspectos da conjuntura que as deu origem. Assim, será facilitada tanto a sua compreensão da própria matemática quanto as suas aplicações. De acordo com um estudo realizado por MENDES & FOSSA(1996) 3, procurando verificar as concepções, atitudes e experiências dos professores de Matemática com relação ao uso da história em sala de aula, detectou-se que os professores investigados apontam para a necessidade de um aprofundamento acerca do conteúdo histórico de alguns tópicos matemáticos como a trigonometria, justificando ser possível e necessária a utilização do mesmo durante as suas atividades de ensino. Desse modo buscamos desenvolver um estudo que procurasse apresentar a eles um aprofundamento teórico acerca do conteúdo histórico de trigonometria para que se torne possível utilizá-lo como alternativa de aprendizagem de conceitos trigonométricos básicos no ensino secundário. História no ensino de matemática: Relações metodológicas A busca de estabelecer possíveis relações metodológicas entre a história da matemática e o ensino desta disciplina, tem-se apresentado cada vez mais presente em vários estudos realizados actualmente por um número cada vez crescente de educadores matemáticos. Com relação ao uso da história como recurso de ensino de matemática, há, na literatura referente a esse tema, um estudo exaustivo, realizado por MIGUEL (1993), intitulado “Três Estudos sobre História e Educação Matemática”, no qual ele caracteriza diversas fontes de utilização há história da matemática, dentre as quais destacamos a de motivação da aprendizagem, a de selecção de objectivos de ensino, a de recreação através de Inf o r Ma t 4
actividades lúdicas e heurísticas, a de desmistificação, para mostrar a matemática acessível às actividades educativas do homem; a de formalização de conceitos, a de dialéctica, a de unificação de vários campos da matemática, a de conscientização epistemológica e de significação, a de cultura e a de epistemologia. Além disso seu trabalho culmina com a apresentação de um estudo histórico-pedagógico-temático voltado para o ensino-aprendizagem dos números irracionais, material este bastante útil para o trabalho dos professores que atuam no ensino secundário. Aspectos Históricos da Trigonometria O desenvolvimento histórico e cultural da humanidade é marcado por estudos e investigações nos quais o conhecimento matemático é um deles. Tal saber foi construído em uma ordem diferenciada ou quase inversa à que é seguida nas nossa escolas. A Trigonometria, por exemplo, desenvolveu-se a partir das necessidades existentes nos estudos de astronomia, navegação e agrimensura, que interagindo com as teorias matemáticas já existentes, puderam ser aplicadas aos problemas práticos evidenciados em tais atividades. Suas raízes perderam-se na pré-história pois os tipos de registros da época não resistiram as ações do tempo, embora haja alguma identificação inicial com as medições de sombras ao longo das horas do dia e das estações do ano, entre outros fatores que evidenciaram o caráter empírico dessa produção de saber. Podemos, entretanto, salientar que o conhecimento geométrico existente, nesse período, teve importância fundamental no desenvolvimento das primeiras teorias ligadas à astronomia e que mais tarde originaram a trigonometria. Porém, somente a partir do século XIII é que a astronomia foi considerada diferente da Trigonometria, quando iniciou-se uma interação dela com a análise numérica e geometria, além dos aspectos algébricos que só foram introduzidos por volta do século XVI. A criatividade de se fazer matemática como uma atividade sócio cultural está nos fatos históricos, descobertas e revoluções que envolvem a construção da Trigonometria visto que a fato histórico marcante no desenvolvimento dessa parte da Matemática diz respeito à mudança efetuada entre o estudo da corda de um arco de circunferência para o estudo da metade dessa corda até a conceituação de seno. Isso ocorreu em virtude da conveniência operacional percebida pelos hindus e árabes para a construção
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das tábuas de cordas úteis à sua astronomia. Desse modo fica claro que a matemática não é rígida mas experimental com relação as versões diferentes de um conceito. A revolução surge no momento em que o trigonometria se desvincula da astronomia, criando seu espaço próprio como um tópico da matemática, se desligando de sua origem histórica e ganhando vida própria, oportunizando assim, a realização de variadas aplicações inesperadas nos diversos campos do conhecimento. A descoberta marcante diz respeito a percepção de Euler com relação a utilização da Trigonometria na apresentação das funções complexas, o que novamente mostra o desenvolvimento e a inter-relação de idéias aparentemente distintas e que convergiram na construção de um tópico matemático organizado a partir da aplicação da trigonometria. Actividades históricas: Construção e motivação para a matemática escolar O ensino de matemática baseado em atividades pressupõe a aprendizagem como uma construção constante das noções matemáticas a partir da experimentação, discussão posterior dos resultados obtidos e elaboração final dos conceitos em construção. Cabe, porém, ao professor preocupar-se com a elaboração das atividades e com as orientações dadas aos estudantes durante a realização das mesmas pois isso poderá ser decisivo no processo de aprendizagem. Essa abordagem de ensino prevê a experiência direta do aprendiz, com situações reais vivenciadas onde a abordagem instrucional é centrada no aluno e em seus interesses expontâneos. O nosso trabalho tem uma grande preocupação com o ato cotidiano de ensinar-aprender vivenciado por professores e alunos, logo propõe o uso da história através da elaboração e execução de atividades voltadas à construção de noções básicas de trigonometria pois somente a partir daí pode-se continuar a busca da compreensão das propriedades, teoremas e aplicações da trigonometria na solução de problemas que exijam do aluno, algum conhecimento desse assunto. Para isso o professor deve adoptar a conduta de orientador das atividades em que o aluno construa seu conhecimento partindo do próprio raciocínio e conhecimentos históricos, numa metodologia que priorize as experiências teóricas ou práticas conduzidas pelos alunos e orientadas pelo professor a fim de formular conceitos ou propriedades e interpretar essas formulações visando aplicá-las na solução de problemas práticos que assim o exijam.
Para que se efetive um ensino-aprendizagem significativo, propomos o uso da história através de atividades centradas na aprendizagem por descoberta pois o material histórico servirá de referencial para a elaboração e testagem das atividades de ensino de trigonometria. Essa forma de abordagem de ensino pressupõe uma colaboração mútua entre professor e alunos durante o ato de construção do saber pois a característica essencial desse modo de encaminhar as atividades de ensino está no fato de que os tópicos a serem aprendidos estão por ser (re)descobertos pelo próprio aluno durante o processo de busca que é conduzido pelo professor até que ele seja incorporado à estrutura cognitiva do aprendiz. Além disso esse modo de atividade conduz o aprendiz através de experiências semelhantes as etapas vivenciadas pelos matemáticos do passado e por isso o material histórico torna-se imprescindível para o desenvolvimento desse tipo de ação docente. Outro ponto a considerar durante essa proposta de ensino de trigonometria, diz respeito ao que Dockweiller chama de “modelo em desenvolvimento”, no qual procura enfatizar o uso desse tipo de atividade centrado em três pontos importantes na construção do conhecimento matemático: 1) A experiência física e visual vivenciada através da manipulação e experimentação; 2) A verbalização ocorrida através da comunicação oral dos fatos experimentados e compreendidos pelo aprendiz e 3) A simbolização ou abstração evidenciada pela representação dos resultados obtidos durante a realização da atividade proposta pelo professor. Esses pontos se apresentam como um processo contínuo que gera consequentemente a construção de conceitos matemáticos, o desenvolvimento de habilidades e culmina com a capacidade de realizar aplicações desse conceitos na solução de situações – problemas que possam surgir. Uma atividade que pode mostrar como esses pontos são abordados diz respeito à medição de altura de objetos sem a utilização de sombras, cujos objetivos são; relacionar ângulos e lados de dois ou mais triângulos retângulos semelhante, visando determinar a razão entre os lados desses triângulos através dos processos de medição desses objetos. Essa atividade suscita fatos históricos ligados as experiências de Tales e ao conhecimento sobre a construção de tábuas trigonométricas realizadas na antigüidade, através da determinação da tangente de um ângulo agudo. A discussão dos dados conduz os estudantes a uma aprendizagem significativa através das etapas sugeridas por Dockweiller quando apresenta os ponIn f or M at 5
tos importantes de uma atividades de ensino de matemática. Considerações Finais A utilização das actividades históricas no ensino de matemática é um empreendimento pedagógico que pode solucionar alguns problemas detectados pelos professores durante a sua prática escolar, pois é comum surgirem questionamentos dos alunos acerca da evolução histórica desse tópico matemático bem como das causas e importância de sua construção. Sabemos, entretanto que fatos como esses só poderão constituir-se num programa efectivo de ensino se houver um compromisso assumido por todos os elementos envolvidos no processo - professores, estudantes, administradores e supervisores escolares – de modo que possam desencadear na escola uma valorização do “fazer para aprender” que possa levar o professor e os estudantes a um crescimento científico e cultural provocados pela manipulação do material histórico, de uma forma criativa e produtiva, caso contrário transformar-se-ão em novas tentativas pedagógicas inaplicáveis a realidade educacional de nossa comunidade. O uso de atividades, proposto aqui, se dispõe principalmente a auxiliar a construção das noções básicas de trigonometria a partir de sua contextualização histórica e isso não é suficiente para que o aluno desempenhe com total segurança, suas atividades de resolução de problemas relacionados com a aplicação desses tópicos, cabendo para isso um exercício maior de atividades voltadas à fixação da aprendizagem ou à utilização de outro tipo de atividade que desenvolva o conteúdo programático sugerido pela escola. Cabe ao professor buscar outras alternativas que possam superar as possíveis dificuldades que venham surgir durante seu trabalho em sala de aula. Para isso sugerimos um melhor manuseio do livro didático ou à utilização de atividades orientadas voltadas à pesquisa ou resolução de problemas que envolvam ou não aspectos históricos, pois o importante é a construção das idéias iniciais através das informações históricas. 1 Artigo baseado na conferência apresentada no Departamento de matemática da Universidade de Aveiro em 26/10/2000. 2 Professor do Departamento de Matemática da Universidade do Estado do Pará – Brasil. Doutorando em Educação pelo PPGEd/UFRN – Natal – Brasil. 3 Iran Abreu Mendes & John A. Fossa. "Conceptions and Attitudes of Mathematics Teachers Towards the History of Matematics as a Pedagogical Device." História e Educação Matemática. Vol. II. Portugal/Braga: 1996. 4 Clarence J. Dockweiller. "Children’s Attainment of Mathematical Concepts: A Model Under Development." (mimeog., 1996).
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O novo programa pode ser dado em aulas de 50 minutos? Dificilmente. O tempo de trabalho em contínuo que uma aula de 90 minutos efectivos proporciona é o ideal para que, tal como o programa preconiza: - os estudantes sejam encorajados, enquanto exploram e resolvem situações, a dar significado aos números, variáveis, expressões, equações e propriedades numa perspectiva de relacionar, aprofundar e integrar as novas aprendizagens com as anteriores; - se dê ênfase à resolução de problemas, à realização de pequenas investigações, à escrita e à comunicação oral, à discussão e ao trabalho de grupo, - se consigam integrar de forma eficaz as novas tecnologias no trabalho, para desenvolver a compreensão de conceitos, o poder e a utilidade das aprendizagens matemáticas ,analisar modelos matemáticos, explorar padrões e questões relevantes, fazer e defender conjecturas (que deverão depois ser provadas ), - se possa promover uma compreensão efectiva dos materiais pedagógicos utilizados na aula, desenvolvendo formas de fazer e pensar a matemática, incentivando o pensamento crítico, - os estudantes possam trabalhar e comunicar com colegas e com o professor para promover uma aprendizagem participada, integrada, real, capaz de levar a adquirir os conhecimentos para a vida e para quem prosseguir estudos.
Um trabalho sobre um problema de optim Antóno Pereira Rosa*
1. Introdução
de vista do utilizador (processamento de texto, folha de cálculo, Internet…). No fim do segundo período, foi-lhes entregue o trabalho que a seguir se apresenta, a fazer em grupos de 3 ou 4 elementos e a entregar no prazo de um mês e meio. Foi acordado que, na avaliação, o trabalho teria peso semelhante ao de um teste escrito. O trabalho não foi realizado nas aulas, mas combinou-se uma hora semanal para tirar dúvidas e discutir o trabalho já realizado, que foi dada no Laboratório de Matemática existente na Escola.
Nos programas actualmente em vigor no Ensino Secundário, recomenda-se o uso de instrumentos de avaliação diversificados, “em particular as redacções matemáticas (sob a forma de resolução de problemas, demonstrações,composições / / reflexões, projectos, relatórios, notas e reflexões históricas, etc)….” (veja-se [PM], pág. 13). Trata-se de uma tarefa difícil, sobretudo a nível de 12.º ano, já que o tempo disponível frequentemente mal chega para cumprir o programa (e, quantas vezes, completar o de anos anteriores…). Este artigo procura dar um exemplo de uma actividade deste tipo, indicando também como se procedeu para obviar à falta de tempo.
3. O trabalho Na escolha do trabalho, procurou-se apresentar um problema não trivial (de entre todos os quadriláteros cujos lados são conhecidos, determinar o que tem a maior área), e que fosse resolúvel por métodos elementares. Além disso, pretendia-se utilizar a tecnologia gráfica disponível para tentar remediar as dificuldades causadas pela falta de conhecimentos dos alunos. Para auxiliar a resolução do problema, foram incluídas no trabalho uma série de perguntas “preparatórias”, funcionando como lemas do resultado principal. Apresenta-se a seguir o enunciado.
2. Aturma Este trabalho foi experimentado numa turma de 12.º ano do 1.º agrupamento, com Física e em que a maioria dos alunos tinha já concluído as disciplinas de Técnicas Laboratoriais de Física I e II (onde tinham dado a fórmula de Carnot) e Introdução às Tecnologias da Informação I. Dominavam bem as calculadoras gráficas CASIO 9850 ou TI 83 e, de um modo geral, tinham bons conhecimentos de Informática do ponto
Trabalho de Matemática 12.º ano 3. Prove que a área do triângulo [ABC]
O objectivo deste trabalho é estudar por meios elementares um problema de optimização sofisticado:
•
a × b × sen (α) é dada por S = . é dada por 2
De entre todos os quadriláteros convexos de lados a, b, c e d (dados), construir o que tem maior área.
α
•
•
Obtém-se assim uma fórmula que permite calcular a área de um triângulo dados dois lados e o ângulo entre eles.
e analisar algumas questões geométricas relacionadas. Consideraremos apenas quadriláteros convexos (dados dois pontos do quadrilátero, o segmento que os une está contido no quadrilátero).
4. Dado o quadrilátero [ABCD], mostre que a sua área é dada 1 por S = a × b × sen θ + c × d × sen (φ)) por S = 2 (a × b × sen θ + c × d × sen (φ) ) (
1. Desenhe um quadrilátero de lados a = 4, b = 5 , c = 6 e d = 7 (medidas em centímetros). Mostre que a solução não é única.
• θ •
2. Seria possível suceder com triângulos um fenómeno análogo ao da alínea anterior ?
φ •
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São desejáveis as aulas de 90 minutos para a disciplina de Matemática?
um problema de optimização óno Pereira Rosa*
5. Relativamente ao mesmo quadrilátero, prove que a diagonal k verifica as igualdades k2 = a2 + b2 – 2ab cos (θ) e k2 = c2 + d2 – 2 cd cos (φ). Sugestão: Pense no que aprendeu em Técnicas Laboratoriais de Física II. 6. Conclua que: a2 + b 2 − c2 − d 2 − 2abcos(θ) cos(φ) = −2cd 2 2 2 2 2 sen(φ) = 1− a + b − c − d − 2abcos(θ) −2cd 7. Considerando agora a = 4, b = 5, c = 6 e d = 7, mostre que a área S do quadrilátero é dada, em função de θ, por S(θ) = 10sen(θ) + 2 80 − 55cos(θ) − 25cos 2 (θ) . 8. Recorrendo a uma calculadora gráfica ou a um computador, trace o gráfico da função S e determine os valores de θ e φ por forma que a área seja máxima. Desenhe o quadrilátero correspondente. 9. Calcule um valor aproximado de θ + φ. Que pode conjecturar quanto ao valor exacto? 10.Admitindo que θ + φ = π para o quadrilátero de área máxima, mostre que de todos os losangos de perímetro P, aquele que tem a área máxima é o quadrado de lado P/4. 11. Seria possível provar usando o método da alínea anterior, que de todos os rectângulos de perímetro P, o quadrado de lado P/4 é o que tem área máxima? Porquê?
12. Prove que de todos os rectângulos de perímetro P, o quadrado de lado P/4 é o que tem área máxima. 13. Um quadrilátero diz-se cíclico se for possível inscrevê-lo numa circunferência. Justifique que os ângulos opostos de um quadrilátero cíclico são suplementares. Que pode concluir quanto à relação entre quadriláteros cíclicos e quadriláteros de área máxima? 4. Reacções dos alunos De um modo geral, os alunos consideraram o trabalho interessante, mas bastante difícil, sobretudo as questões 2 e 13, reflectindo a fraca preparação em Geometria que é dada pelo actual ensino pré-universitário. As versões finais dos relatórios, que foram sendo melhorados e completados ao longo das várias sessões semanais, estavam bastante boas. Foi particularmente interessante a reacção à questão 8; depois de determinarem o máximo usando a calculadora gráfica, os alunos quiseram fazer o gráfico em computador, pois concluiram que a opção de usar o Graphlink ou o FX-INTERFACE era pouco satisfatória. Assim, foram-lhes apresentados os programas DERIVE e Graphmática for Windows, que foram posteriormente utilizados para o traçado do gráfico. Todo este trabalho foi desenvolvido no âmbito do Projecto “Laboratório de Matemática”, integrado no Projecto Educativo de Escola existente no ano lectivo de 98/99. Referências [PM] Equipa Técnica (1997), Matemática - Programas, Departamento do Ensino Secundário. [Sp] Spiegel, M. R. (1971), Cálculo Avançado, Editora Mc Graw-Hill do Brasil.
Aulas de Noventa Minutos (Continuação da pág. 1)
Para terminar falemos de aritmética: hoje temos quatro aulas de cinquenta (quarenta e cinco) minutos o que equivale em termos semanais a duzentos (cento e oitenta) minutos. Passaremos a ter três aulas de noventa (oitenta e cinco) minutos, o que equivale em termos semanais a duzentos e setenta (duzentos e cinquenta e cinco) minutos, ou seja, se a duzentos e cinquenta e cinco subtrairmos cento e oitenta obtemos um ganho real de setenta e cinco minutos; mesmo que fossem cinco aulas de cinquenta (quarenta e cinco) minutos apenas teríamos duzentos e cinquenta (duzentos e vinte e cinco) minutos semanais! A maioria dos professores acompanhados reivindicava uma quinta hora para poder cumprir “conforta-
velmente” o actual programa, pois eis que aí está, a quinta hora com meia hora de “bónus”, para todos! Referências Ubiratan D’Ambrosio (1997/a). A era da Consciência. São Paulo: Editora Fundação Peirópolis. Ubiratan D’Ambrosio (1997/b). Transdisciplinaridade. São Paulo: Editora Palas Athena. Ubiratan D’Ambrosio (1999). Educação para uma sociedade em transição. Colecção Papirus Educação. Campinas, SP: Papirus Revista Noesis 55, Julho/Setembro (2000). Lisboa: Instituto de Inovação Educacional Jornal Público, Três preciosas mudanças que é preciso defender, Arsélio Martins, Graziela Fonseca e Jaime Carvalho e Silva, Sexta-feira, 12 de Maio de 2000.
In for M at 7
Não só são desejáveis como são necessárias! Todos reconhecemos que ser-se matematicamente competente não implica possuir unicamente alguns conhecimentos mas também a capacidade de identificar, mobilizar e aplicar esses conhecimentos na resolução de um problema. Capacidades de resolver problemas, necessidade de possuir espírito investigativo e curiosidade científica são essenciais hoje. Conhecimentos, capacidades e atitudes são inseparáveis no processo de aprendizagem. Já Sebastião e Silva defendia que “O professor deve abandonar, tanto quanto possível, o método expositivo tradicional, em que o papel dos alunos é quase cem por cento passivo, e procurar, pelo contrário, seguir o método activo, estabelecendo diálogo com os alunos e estimulando a imaginação destes, de modo a conduzi-los, sempre que possível à “redescoberta” e mais adiante ainda, cabe ao professor ”estabelecer, sempre que possível as conexões da matemática com outros domínios do pensamento...”. Mas digamos de forma clara que esta sua proposta nunca teve condições cabais para ir “para o terreno” (a não ser em casos excepcionais) e, portanto, a proclamada ausência de conhecimentos matemáticos dos alunos no início dos cursos superiores não pode ainda ser atribuída nem ao uso da tecnologia, nem a uma nova forma de trabalho na sala de aula, nem a uma nova visão do papel do professor (muito pelo contrário!). É pois altura de abordar o conhecimento na sala de aula de uma nova forma sem fingir que se faz o que não se faz, só porque é recomendado. O jovem não deve ser visto como um recipiente que armazena informação nem o professor como o transmissor. O professor deve passar a ser o regulador, o dinamizador da aprendizagem. Os estudantes devem utilizar todas as ferramentas disponíveis (o papel e lápis, bem como a calculadora gráfica e os computadores, os sensores, ...) para construírem o seu conhecimento de forma activa. É urgente que os estudantes resolvendo problemas, fazendo pequenas investigações, liguem as novas aprendizagens às já adquiridas num processo gradual de compreensão e aprofundamento. Apostemos então num envolvimento mais responsável dos alunos na sua aprendizagem e os 90 minutos são essenciais para tal.
Informat 7/Paginação
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A raiz quadrada de 2 não é um número racional Suzana Metello de Nápoles 1
FICHA TÉCNICA Editor: Departamento do Ensino Secundário [DES] Director: Domingos Fernandes Coordenação: Maria do Carmo Belchior e Isabel Fevereiro Design Gráfico: DELTAGRAPHOS, Design e Publicidade, Lda. Fotolito impressão e acabamento: Gráfi-Cacém, Lda. Periodicidade: Trimestral Tiragem: 4 000 exemplares ISSN: 0874-0844 Depósito Legal: 143 753/99 Lisboa 1998 Distribuição gratuita Toda a correspondência deve ser enviada para InforMAT Av. 24 de Julho, 138, 5.º 1391 Lisboa Fax: 393 81 08
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Os Pitagóricos acreditavam que tudo no universo estava relacionado com números inteiros ou razões de números inteiros. Segundo a lenda, ao descobrirem que a diagonal de um quadrado de lado 1 não era uma razão entre dois inteiros (em linguagem actual, que a raiz quadrada de 2 é um número irracional) consideraram quebrada a harmonia do universo. Convencidos de que os deuses os castigariam caso eles divulgassem aquilo que lhes parecia uma imperfeição divina, tentaram ocultar a sua descoberta.
A demonstração de Tom Apostol O número √ 2 é a medida da hipotenusa de um triângulo rectângulo isósceles com catetos iguais a 1. Supondo que √ 2 é racional, tome-se o menor número inteiro p q tal que q √ 2 é um número inteiro p (isto é √ 2 = q em que p q é uma fracção irredutível).
Este facto teve grandes repercussões na história da ciência que se fizeram sentir até finais do século XIX. De cada vez que as necessidades do cálculo levavam a introduzir novos entes numéricos gerava-se uma enorme desconfiança à sua volta, o que levava a atribuir-lhes designações curiosas. Assim, os números irracionais eram designados por números inex primíveis e por números incalculáveis. Durante muitos séculos os números reais (fraccionários e irracionais) foram apenas concebidos como medidas de grandezas e só nos finais do século XIX se construiu uma teoria dos números reais 2 independente da geometria.
Então, aplicando o factor de escala q ao triângulo anterior, obteríamos um novo triângulo rectângulo isósceles com hipotenusa igual a p e catetos iguais a q. Atendendo a que q é o menor número inteiro tal que q√ 2 é um número inteiro, este triângulo seria o menor triângulo rectângulo isósceles com lados inteiros. Vejamos como a partir deste se pode construir um mais pequeno com a mesma propriedade, o que é absurdo.
Apresentam-se em seguida duas demonstrações da irracionalidade da raiz quadrada de 2. A primeira é bem conhecida e foi sugerida por Aristóteles (384-322 a.C.) como exemplo de uma demonstração por redução ao absurdo 3. A segunda, da autoria do conhecido matemático Tom Apostol 4, é também uma demonstração por redução ao absurdo, mas que recorre apenas a argumentos geométricos. A sua notável simplicidade permite adaptá-la como actividade para a sala de aula, por exemplo, quando se estudam questões envolvendo semelhança de triângulos. É esse o desafio que se deixa ao leitor.
Com centro A e raio q tracemos um arco de circunferência. No ponto D em que este arco corta a hipotenusa tracemos uma perpendicular a esta e seja E o ponto onde ela corta o cateto BC. Os triângulos ABC e BDE são semelhantes (porque têm dois ângulos iguais). Assim, BDE é um triângulo rectângulo isósceles com catetos inteiros (iguais a p-q). Como EC = DE (porque os triângulos rectângulos ADE e ACE são iguais, uma vez que têm a mesma hipotenusa e os catetos AD e AC são iguais) a medida da sua hipotenusa, igual a q-(p-q), também é um inteiro, o que é absurdo.
Estas duas demonstrações estão separadas por… 24 séculos! A demonstração de Aristóteles Por absurdo, suponhamos que existem dois números naturais p p e q, primos entre si, tais que x = (isto é, suponhamos a q p fracção escrita na forma irredutível) e x2 = 2. Então, q 2
p 2 2 2 q = 2 logo p é um número par (porque p = 2q ) e,
1 Projecto Matemática em Acção - Centro de Matemática e Aplicações Fundamentais da Universidade de Lisboa (CMAF-UL). 2 Principalmente por obra dos matemáticos alemães Dedekind e Cantor. 3 Struik D., História Concisa das Matemáticas, Gradiva, 1989. 4 American Math. Monthly, Novembro de 2000, p. 841-842. Esta demonstração é objecto de uma animação no vídeo da autoria de Tom Apostol “Early History of Mathematics”, a ser brevemente traduzido em português pelo Projecto Matemática em Acção em colaboração com a Sociedade Portuguesa de Matemática.
consequentemente, p também é par (porque se fosse ímpar o seu quadrado seria ímpar). Se p um é número par, existe um natural k tal que p = 2k e assim 4k2 = 2q2 ⇔ q2 = 2k2. Então q seria par (porque q2 é par), o que é absurdo visto que p e q são primos entre si.
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