Individualismo E Liberalismo

  • November 2019
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in, O individualismo: uma perspectiva antropológica da ideologia moderna se o individualismo deve aparecer numa sociedade do tipo tradicional, holista, será em oposicão à sociedade e como uma espécie de suplemento em relação a ela, ou seja, sob a forma de indivíduo-fora-do-mundo. Será possível pensar que o individualismo começou desse modo no ocidente? É precisamente isso o que vou tentar mostrar; quaisquer que sejam as diferenças no conteúdo das representações, o mesmo tipo sociológico que encontramos na Índia - o indívíduo-fora-do-mundo - está inegavelmente presente no cristianismo e em torno dele no começo da nossa era."ii[2] Alguém opõe ao individualismo o nacionalismo, sem explicação. Sem dúvida, é preciso entender que o nacionalismo corresponde a um sentimento de grupo que se opõe ao sentimento "individualista". Na realidade, nação, no sentido preciso e moderno do termo, e o nacionalismo - distinto do simples patriotismo - estão historicamente vinculados ao individualismo como valor. A nação é precisamente o tipo de sociedade global correspondente ao reino do individualismo como valor. Não só ela o acompanha historicamente, mas a interdependência entre ambos impõe-se, de sorte que se pode dizer que a nação é a sociedade global composta de pessoas que se consideram como indivíduos." a configuração individualista de idéias e valores que nos é familiar não existiu sempre nem aparece de um dia para outro. Fez-se remontar a origem do "individualismo" a um época mais ou menos remota, segundo, sem dúvida, a idéia que dele se fazia e a definição que se lhe dava."iv[4] Pode sustentar que o mundo helenístico estava, no que tange às pessoas instruídas, tão impregnado dessa mesma concepção que o cristianismo não teria podido triunfar, a longo prazo, nesse meio, se tivesse oferecido um individualismo de tipo diferente. Eis uma tese muito forte que parece à primeira vista contradizer concepções bem estabelecidas."v[5] Se tentarmos ver em paralelo a situação cristã medieval e a situação hindu tradicional a primeira dificuldade está em que, ao passo que na Índia, os brâmanes contentavam-se com sua supremacia espiritual, a Igreja no ocidente exercia também um poder temporal, sobretudo na pessoa de seu chefe, o Papa. Vendo as coisas grosso modo, a Idade Média parece ter conhecido uma dupla autoridade

temporal. Além, disso, uma vez que a instância espiritual não desdenhava revestirse de poder temporal, podia-se perguntar até se a temporalidade não desfrutava, de fato, de uma certa primazia. (...)" Para os modernos, sob a influência do individualismo cristão e estóico, aquilo a que se chama direito natural (por oposição ao direito positivo) não trata de seres sociais mas de indivíduos, ou seja, de homens que se bastam a si mesmos enquanto feitos à imagem de Deus e enquanto depositários da razão. Daí resulta que, na concepção dos juristas, em primeiro lugar, os princípios fundamentais da constituição do Estado (e da sociedade) devem ser extraídos, ou deduzidos, das propriedades e qualidades inerentes no homem, considerando como um ser autônomo, independentemente do todo e qualquer vínculo social ou político. os princípios fundamentais da constituição do Estado (e da sociedade) devem ser extraídos, ou deduzidos, das propriedades e qualidades inerentes no homem, considerado como um ser autônomo, independentemente de todo e qualquer vínculo social ou político."viii[8] O valor infinito do indivíduo é, ao mesmo tempo, o aviltamento, a desvalorização do mundo tal como existe..."ix[9] indivíduo democracia, filosofiaideologia justificação pela fé"sacerdócio universal dos crentes". "graça divina", Os puritanos que fundaram as colônias na América do Norte tinham dado o exemplo do estabelecimento de uma Estado por contato. Assim, os famosos "Peregrinos" do May-flower concluíram um pacto de estabelecimento antes de fundarem New Plymouth em 1620, e outros fizeram o mesmo. Vimos os Levellers irem mais longe em 1647 e acentuarem os direitos do homem como homem e, sobretudo, o direito à liberdade religiosa. Esse direito fora introduzido desde cedo em várias colônias americanas: em Rhode Island por um alvará de Carlos I (1543), na Carolina do Norte pela Constituição redigida por Locke( 1669). Tratado Sobre o Governo Civil

`Para entender o poder político corretamente, e derivá-lo de sua origem, devemos considerar o estado em que todos os homens naturalmente estão, o qual é um estado de perfeita liberdade para regular suas ações e dispor de suas posses e pessoas do modo como julgarem acertado, dentro dos limites da lei da natureza, sem pedir licença ou depender da vontade de qualquer outro homem."xii[12] luta de todos contra todos. "Portanto, onde não há o seu, isto é, não há propriedade, não pode haver injustiça. E onde não foi estabelecido um poder coercitivo, isto é, onde não há Estado, não há propriedade, pois todos os homens têm direito a todas as coisas. Portanto, onde não há Estado nada pode ser injusto. De modo que a natureza da justiça consiste no cumprimento dos pactos válidos, mas a validade dos pactos só começa com a instituição de um poder civil suficiente para obrigar os homens a cumpri-los, e também só aí que começa a haver propriedade." Com o predomínio do individualismo contra o holismo, o social nesse sentido foi substituído pelo jurídico, o político e, mais tarde, o econômico."xiv[14] O individualismo subentende, ao mesmo tempo, igualdade e liberdade. Distinguese, portanto, com razão, uma teoria igualitária "liberal", a qual recomenda uma igualdade ideal, igualdade de direitos ou de oportunidades, compatível com a liberdade máxima de cada um, e uma teoria "socialista" que quer realizar a igualdade nos fatos, por exemplo, abolindo a propriedade privada."xv[15] E mais: " "... em todos aqueles casos em que não há juiz sobre a Terra, não tem o povo outro remédio além do apelo aos céus. "que os tratados de Locke considerados políticos contêm a ata de batismo da propriedade privadaxix[19]."

"O individualismo subentende, ao mesmo tempo, igualdade e liberdade."xxi[21] A ausência de um juiz comum dotado de autoridade coloca todos os homens em estado de natureza; a força sem direito sobre a pessoa de um homem causa o estado de guerra, havendo ou não um juiz comum."xxii[22]

A Democracia na América A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, adotada pela Assembléia Constituinte no verão de 1789 marca, num sentido, o triunfo do indivíduo

As grandes obras políticas de Maquiavel a nossos dias. O individualismo: uma perspectiva antropológica da sociedade moderna Models of Democracy. Cambridge/ Leviatã ou matéria, forma e poder de um estado eclesiástico e civil. Dois Tratados sobre o Governo. Sobre a liberdade ____. Considerações sobre o governo representativo. Do contrato social. A democracia na América.

i

Notas:

[1]

DUMONT, Louis. O individualismo: uma perspectiva antropológica da sociedade moderna.

Tradução de Álvaro Cabral. Rio de Janeiro: Rocco, 1985. ii [2]

DUMONT, L. Op. Cit., pag. 38/39.

[3]

DUMONT, L. Op. Cit., pag. 21.

iv [4]

DUMONT, L. Op. Cit., pag. 22.

v [5]

DUMONT, L. Op. Cit., pag. 39.

vi [6]

DUMONT, L. op. Cit., pag. 80.

vii [7]

DUMONT, L., Op. Cit., pag. 87.

viii [8]

DUMONT, L. Op. Cit., pag. 87

ix [9]

DUMONT, L. Op. Cit., pag. 43.

x [10]

HELD, David. Models of Democracy, pag. 15.

xi [11]

DUMONT, L. Op. Cit., pag. 110/111.

[12]

LOCKE, J. O segundo tratado sobre o governo, §4º, pag. 381/382.

xiii [13]

HOBBES, T., Leviatã, pag. 123/124.

xiv [14]

DUMONT, L. Op. Cit., pag. 91

xv [15]

DUMONT, L. Op. cit., pag. 91.

xvi [16]

Idem.

xvii [17]

LOCKE, J., Op. Cit,. § 167, pag. 535.

xviii [18]

LOCKE, J. Op. Cit., Cap. III.

xix [19]

DUMONT, L. Op. Cit, pag. 22.

xx [20]

LOCKE, J. Op. Cit., Cap. V.

xxi [21]

DUMONT, l. Op. Cit., pag. 105.

xxii [22]

LOCKE, J. Op. Cit., § 19, pag. 398.

xxiii [23]

DUMONT, L. Op. Cit., pag. 109.

Resumo: O texto tem por propósito refletir sobre os princípios do individualismo e do liberalismo a partir da leitura sistemática de alguns clássicos sobre o assunto.

Palavras-chave: Indivíduo, Individualismo liberal, liberdade e propriedade. (*) O autor é bacharel em Ciências Sociais (IFCS/UFRJ) e em Direito (UFF), mestrando de Ciência Política do IFCS/UFRJ e ocupa o cargo de Juiz de Direito no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.

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