Fora De Si

  • November 2019
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  • Words: 565
  • Pages: 2
FORA DE SI - Ué? Estranhou. Esse não era o seu quarto. Olhou em volta. Um sofá de três lugares, uma estante, uma TV em cima da estante, uma janela aberta, prédios do lado de fora. Pensou em se levantar, mas não precisou: já estava de pé. - Dormi em pé? Riu da possibilidade. Caminhou lentamente pelo corredor, tomando cuidado pra não fazer barulho. Pisava tão macio no assoalho que parecia flutuar. Passou em frente ao banheiro e escutou o ruído de água caindo. Sentiu o cheiro doce que exalava. O coração bateu mais forte. Entreabriu a porta. Manuela, nua embaixo do chuveiro, deixava a água escorrer pelo corpo, com os olhos fechados. Era uma deusa. Branquinha, cabelos lisos escorridos pela água, seios pequenos, pernas delicadas. Em seu rosto, o prazer que o banho fresco lhe proporcionava. Minha nossa! Melhor sair dali antes que alguém o veja. Deu de cara com a mãe. - Ai, meu deus! – gemeu. Mas a velha passou direto, com cara de sono, como se não o tivesse visto. Foi direto pra cozinha. O filho respirou aliviado. Ainda com a imagem de Manuela na cabeça, seguiu pelo corredor. Um dia teria uma mulher como aquela. Chegou em seu quarto. Entrou. Tudo escuro lá dentro. Apalpou a parede em busca do interruptor, mas um vento abriu as cortinas. Uma fresta de luz entrou pela janela. Preferiu deixar assim. Passou em frente ao espelho e foi em direção ao guarda-roupa. Parou. Uma coisa estranha aconteceu. Recuou uns passos e tornou a ficar diante do espelho. - Ai! Pasmou. Não via o seu reflexo. Aproximou-se mais do vidro e tocou a sua superfície. Foi aí que se deu conta de que tinha uma pessoa deitada em sua cama. Tremeu. - O que está acontecendo? Andou até lá. Era um homem, um rapaz, mais ou menos da idade dele. Estava de bruços, com os braços abraçando o travesseiro. Carlos ficou na dúvida. Acordava ou não o sujeito? Faltou coragem. - Filho – a mãe apareceu na porta. - Mãe, ainda bem. A mulher novamente não o viu e passou direto. Carlos a tocou no braço, mas ela não deu atenção. - Ei, olha eu aqui! – chamou, indo atrás dela. A mãe acendeu a luz e sentou-se no colchão. - Carlos, acorda. Olha a hora – disse ela pro rapaz na cama. Mas o sujeito não dava sinal de vida. Balançou-o: nada. Impaciente, levantou-se e esbravejou: - Vai perder o trem! E saiu do quarto.

Silêncio. Carlos olhou pra porta, tentando compreender o que se passava. Como é que a mãe o confundira com aquele estranho? Debruçou-se diante dele, criou coragem e virou o seu rosto: Se viu nele. - AAAAAAAAAAAAAAAAA!!! A mãe tornou a aparecer: - Filho? Dessa vez ele não se deu ao trabalho de responder. - Tendo pesadelos? O menino a encarou. Ela fez cara de quem não entendia. - A senhora está me vendo? - Mas é claro! – e começou a rir. Carlos esticou o pescoço e viu o seu reflexo no espelho. Percebeu que estava em sua cama. Ficou sem graça: - Acho que eu comi demais. - Bem que eu te avisei – e saiu. O filho ainda ficou um tempo deitado, se refazendo. Nossa! Por um instante, pensou que tivesse morrido. Levantou-se e sentiu-se mais leve. Arregalou os olhos: Seu corpo ainda estava na cama! Emudeceu.

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