Entrevista Sobre Fraude Ocupacional

  • October 2019
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Entrevista em 16/02/2006 para matéria sobre roubo de ativos Entrevistado: Adriano Theodoro Entrevistadora: Flavia de Figueiredo Pereira Martins Assessoria de Comunicação da Controladoria Geral do Município do Rio de Janeiro Tel.: (21) 2503 2967

1) O que é o crime econômico e, mais especificamente, o roubo de ativos? São considerados como crimes econômicos todos os atos ilegais dolosos praticados dentro de uma organização que resultem em dano financeiro, imediato ou não, ao seu patrimônio. Esse tipo de crime abrange desde fraudes praticadas por empregados - como, por exemplo, o roubo de ativos - até os atos criminosos que são praticados com a conivência de administradores e executivos, como é o caso das manipulações financeiras e contábeis. A apropriação indevida de ativos é o ato que envolve o roubo ou o mau uso dos bens de uma organização, segundo a Association of Certified Fraud Examiners (ACFE), entidade norte-americana que reúne cerca de 30 mil peritos em todo o mundo, especializados em investigação de crimes financeiros. Sem dúvida alguma o modo mais usual de roubo de ativo é o desfalque que atinge diretamente o caixa das organizações, tais como: reembolso a funcionários de despesas que efetivamente não ocorreram, ou ainda, que ocorreram em valores inferiores e estão sendo superfaturadas; pagamento por serviços que não foram realizados; pagamento de despesas pessoais de dirigentes; a assinatura em cheque ou endosso forjado; etc. Já o mau uso é configurado quando o indivíduo de uma empresa faz uso dos ativos (financeiros ou não) para fim diverso do que estipula o objeto social da organização ou para fins pessoais. 2) Quais são os danos que o crime econômico pode causar a uma empresa? Os danos variam de acordo com o tipo de crime e o tipo de organização que foi vítima de fraude. De forma geral os principais danos são:

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perdas financeiras provocadas pela fraude, pois na maioria dos casos o dinheiro não é recuperado;



danos à imagem e reputação;



queda no valor de mercado da companhia;



perda de credibilidade junto aos fornecedores e clientes das organizações que sofreram ou foram coniventes com fraudes;



redução nos níveis de faturamento;



perda de pessoal altamente qualificado quando o ambiente de trabalho se torna desgastante devido ao clima de desconfiança generalizada

que

ocorre após a descoberta da fraude; •

gastos extras com serviços de especialistas (peritos, advogados, etc).

3) Como é possível prevenir a ocorrência de tal crime? O risco de fraude em uma organização - sobretudo das chamadas “Fraudes Ocupacionais” - aquelas perpetradas principalmente por empregados - pode ser reduzido com a adoção de práticas internas que resultem na prevenção, dissuasão e detecção desses crimes. Portanto a inibição da prática de fraude ocorre com a adoção combinada das seguintes medidas: •

Manter controles internos eficazes: Os controleis internos são um conjunto de procedimento adotados com a finalidade de garantir a segurança e a padronização das informações resultantes das atividades operacionais das organizações. Esses controles são geralmente elaborados por auditores internos ou, no caso das empresas de pequeno porte, pelos próprios administradores. Para a elaboração de um controle interno capaz de prevenir, detectar e impedir a ocorrência de fraudes é preciso que os responsáveis

pela

sua

elaboração

conheçam

bem

os

processos

operacionais da organização e também compreendam os fatores que motivam um indivíduo a praticar esse tipo de crime.

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Selecionar novos empregados: É preciso definir critérios na seleção de pessoal que não estejam exclusivamente voltados a avaliar a capacitação técnica do indivíduo. Deve-se criar rotinas de checagem dos antecedentes do candidato junto aos empregadores anteriores. Dependendo do cargo, a investigação que começa pela vizinhança do interessado, estende-se até mesmo para sua vida financeira. Para que uma organização tenha sucesso na prevenção contra fraudes deverá possuir políticas internas que minimizem a chance de contratar ou promover indivíduos com baixo nível de honestidade, especialmente para cargos de confiança.

Políticas proativas na contratação ou promoção

deverão incluir: •

condução de investigação do histórico do candidato, seja ele interessado em uma nova vaga na organização ou para uma promoção em cargo de confiança;



verificação cautelosa do nível escolar;



diálogos com antigos empregadores e com aqueles indicados para referências pessoais;



treinamento periódico de todos os empregados sobre valores e código de conduta ética da organização;



incorporação, dentro da revisão regular do desempenho da organização, de uma avaliação sobre como cada indivíduo tem contribuído para criar um ambiente de trabalho saudável, de acordo com os valores e o código de conduta ética da organização;



avaliação contínua das ações dos empregados, observado se estão de acordo com os valores da organização e o cumprimento do código de conduta ética, onde qualquer violação deverá ser comunicada imediatamente.

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Dar exemplo de conduta: É responsabilidade da organização a criação de uma cultura de honestidade e ética, além de comunicar claramente qual é o comportamento que se espera de cada empregado. Mais do que esperar um comportamento honesto é preciso que membros da alta direção dêem exemplo de conduta ética. Pesquisas demonstram que a melhor maneira de conseguir que os outros adotem um comportamento é através do exemplo. O administrador de uma organização não pode agir de uma forma e esperar que seus colaboradores se comportem de forma diferente.



Criar um ambiente de trabalho positivo: Estudos mostram que a má conduta ocorre com menor freqüência quando o empregado tem sentimentos positivos em relação a organização onde trabalha. Quando se sente explorado, ameaçado ou ignorado há mais possibilidade que um sentimento de baixa moral desperte nele a intenção de cometer fraude contra a organização. Alguns fatores que prejudicam a manutenção de um ambiente positivo de trabalho e podem elevar o risco de fraude incluem: •

falta de reforço ou apoio ao comportamento adequado pela alta direção;



não há reconhecimento quando o empregado atinge a performance esperada;



empregados freqüentemente presenciam injustiças praticadas pelos administradores;



a gestão administrativa é realizada de forma autocrática e não participativa;



existem baixos indicadores de lealdade organizacional ou sentimento de pertencer à corporação;



são definidas metas administrativas inatingíveis;



o empregado tem medo de dar más notícias ao supervisor e/ou administrador;



a remuneração é incompatível com as responsabilidades;



falta treinamento e oportunidades de promoção;

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não há clareza sobre as responsabilidades do indivíduo dentro da organização;

• •

a prática ou método de comunicação interna é ineficaz.

Promover e apoiar de forma justa o empregado: Cada pessoa possui seu conjunto de valores e de ética pessoal. Quando está sob pressão e percebe uma oportunidade, alguns poderão se comportar de forma desonesta, especialmente se esta pessoa já vivenciou alguma conseqüência negativa por seu comportamento honesto, tal como comunicar suspeita de fraude cometida por outros colegas e que a supervisão/administração não deu a devida atenção para o fato.



Treinar: Novos empregados devem ser treinados, no momento da contratação, para que conheçam os princípios da organização e seu código de conduta. Esse treinamento deve ser claro ao explicitar as expectativas da organização em relação a todos os funcionários e que todos são responsáveis em comunicar qualquer tipo de fraude que tiver conhecimento ou que vir a conhecer ou descobrir; explicitar os tipos de fraudes a que estão suscetíveis os vários departamentos de uma organização, inclusive exemplificando os casos; informação sobre a quem e como comunicar as ocorrências ou suspeitas que tiver conhecimento. Vale ressaltar que esse tipo de treinamento deverá se periódico e específico por área crítica da organização, como é o caso do departamento financeiro, compras, vendas, almoxarifado, etc.



Avaliar: A avaliação periódica dos procedimentos operacionais das organizações tem papel importante. A sensação de acompanhamento continuo das operações realizadas pelos empregados colabora na dissuasão da prática de fraude, mas se mesmo assim ela ocorrer, a avaliação periódica poderá detectar o problema antes que ele alcance proporções significativas para a organização.

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Disciplinar a conduta: A forma com que uma organização reage após a descoberta de uma ocorrência de fraude é uma poderosa mensagem aos demais empregados. Dependendo da atitude tomada pela empresa contra o fraudador a mensagem que ficará para os demais empregados poderá ser de condescendência ou de intolerância. Por exemplo, se o caso terminar com um acordo de demissão entre a empresa e o fraudador, seja por incapacidade da empresa em reunir provas contra o criminoso, ou ainda por receio da empresa em se expor, a mensagem que será captada pelos demais empregados será que os futuros casos também terão grande chance de impunidade. As ações seguintes podem ser adotadas nos casos de alegação de fraude: •

conduzir uma completa investigação do incidente;



ações consistentes a apropriadas devem ser tomadas contra os comprovadamente culpados;



controles

internos

relevantes

devem

ser

avaliados

e

aprimorados; •

a comunicação do fato e o treinamento devem ocorrer para reforçar os valores, código de conduta e as expectativas da empresa em relação aos empregados.

4) Qual é o perfil dos fraudadores? Segundo Joseph T. Wells, em seu artigo intitulado “Why Employees Commit Fraud” uma característica comum entre os fraudadores, do mais alto ao mais baixo escalão, é que nenhum deles aceitaram o emprego com o propósito de cometer fraude. Geralmente, quando são pegos, é a sua primeira experiência. Então o que faz com que um indivíduo considerado de bom caráter se torne um criminoso? Uma resposta obvia seria a ambição, mas muitas pessoas consideradas ambiciosas não se utilizam de mentiras, trapaças ou roubam para

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conseguir o que desejam. Wells afirma que existem duas teorias que explicam a razão da prática de fraude por empregados. A primeira, baseada em uma pesquisa realizada há vinte anos por Hollinger e Clark, onde foram ouvidos 12.000 trabalhadores, entre eles pessoas do mais baixo ao mais alto nível organizacional. A pesquisa concluiu que aproximadamente 90% dos pesquisados já haviam participado de algum tipo de “desvio” no ambiente de trabalho, no qual incluíam comportamentos contraproducentes como: ociosidade, diminuição do ritmo de trabalho, simulação de doença, além de pequenos furtos. Acima de tudo, o que mais surpreendeu na pesquisa é que um terço dos empregados declararam já terem se apropriado indevidamente de dinheiro ou de produtos de empresas onde trabalharam. Os pesquisadores concluíram que a razão mais comum que levava os empregados a cometerem fraude tem pouco há ver com a oportunidade, mas muito com a motivação, isto é, quanto mais insatisfeito estiver o empregado maior será a probabilidade que ele ou ela tenha um comportamento criminoso. A segunda teoria está relacionada com pressões financeiras. Na década de 40, o criminologista Donald R. Cressey entrevistou cerca de 200 fraudadores que foram presos, incluindo executivos. Ele observou que a grande maioria haviam cometido fraude para cumprir com suas obrigações (pressões) financeiras. Cressey observou que outros dois fatores estavam presentes nas ocorrências de fraudes: a oportunidade para cometer e ocultar o crime e a capacidade para racionalizar o ato, isto é, justificar para si mesmo e não se sentir culpado. Portanto, está comprovado que a fraude apóia-se em um tripé composto pela oportunidade, pressão e racionalização. No Brasil, o “Relatório da Pesquisa 2004” sobre fraudes, realizada pela KPMG, uma das quatro maiores empresas mundiais na área de auditoria, aponta que o fraudador típico brasileiro é homem, situa-se na faixa etária de 26 a 40 anos e percebe, mensalmente, entre R$ 1.000,00 e R$ 4.500,00 e está contratado há mais de dois e menos de cinco anos na empresa. Já a “Pesquisa sobre Crimes Econômicos – Brasil 2005”, elaborada pela PriceWaterhouseCoopers, que também é uma das gigantes no setor de auditoria mundial, revela que entre as

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empresas vítimas de fraude, mais de 80% dos fraudadores têm curso superior completo, 68% pertencem à alta e média gerência, 82% são do sexo masculino e a faixa etária concentra-se entre 31 e 40 anos.

5) Quais são as deficiências dos sistemas de controle das empresas? Além das falhas características dos controles internos das organizações de modo geral – não segregar funções de risco, como, por exemplo, é o caso do Contas a Receber e do Contas a Pagar; não realizar reconciliações constantes entre os dados lógicos e físicos; não acompanhar os desvios de padrões de processos e resultados das áreas administrativas, contábil e financeira e demais áreas de risco; não realizar treinamento sobre como prevenir a ocorrência de fraudes - na minha opinião, a grande falha ocorre, efetivamente, na falta de aperfeiçoamento dos mecanismos internos existentes, falta de planejamento na avaliação dos processos operacionais, e também na inexistência ou deficiência das políticas internas de conduta, especialmente nas áreas de maior risco. 6) Qual é a importância de fazer uma pesquisa de crimes econômicos como a realizada pela PriceWaterhouseCoopers? Acredito que a divulgação desse tipo de pesquisa colabora para que as empresas tenham ciência de que embora os fatos ocorridos sejam muito pouco ou quase nunca expostos à mídia, por razões que já foram mencionadas, a fraude ocorre constantemente dentro das organizações. Com a publicação de pesquisas como esta, organizações de todos os tipos e tamanhos adquirem conhecimentos sobre as ocorrências, ferramentas utilizadas na prevenção e detecção e ações tomadas contra fraudadores. Além disso, esses dados servem também para que empresas reconheçam que estão sob risco constante de serem alvo desse tipo de crime corporativo e que também, nesse caso, prevenir é menos oneroso do que remediar.

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