a memória do futuro
o aprendizado comeÇa com a percepção. nem uma pessoa nem uma empresa sequer começarão a aprender sem antes terem visto algo de interesse no ambiente, É por isso que sobreviver e prosperar em um mundo volátil exige, acima de tudo, uma gerência sensível ao meio ambiente de sua empresa. no mínimo alguns dos líderes da empresa deveriam estar atentos e sensíveis ao mundo em que vivem, a ponto até mesmo de desempenhar um pap e l ativo nesse mundo ext erno. observadores internos são necessários em todas as empresas, mas eles pouco vêem das forças que irão afetar o futuro de sua empresa. uma gerência aberta e extrovertida, em contraste, perceberá muito antes qualquer coisa que esteja acontecendo do lado de fora. somente após verificar que algo está prestes a mudar (ou que já começou a mudar) fora da empresa é que a gerência estará pronta para lidar com os efeitos dessa mudança. muitos desses efeitos residirão no futuro e serão incer-tos. no desejo de "saber" e diminuir a incerteza, muitos gerentes dedicam tempo excessivo a uma pergunta que não tem grande utilidade: o que acontecerá conosco? mas os gerentes que perceberem a mudança desde cedo deveriam dedicar mais tempo a uma pergunta muito mais útil: o que faremos se isro ou aquilo acontecer? somente essa pergunta pode levar os gerentes a fazer mudanças dentro da empresa, as (piais permitirão que cia sobreviva e prospere nesse novo mundo.com efeito conforme demonstra a experiencia
pode ser necessária uma mudança fundamental e penosa, possivelmente incluindo até mesmo a extinção de um negócio principal da empresa. de fato, em 1983, na royal dutch/shell, nosso estudo de empresas de grande porte c longevas proporcionou muitos exemplos do carátcr fundamental das mudanças internas necessárias para que as empresas sobrevivessem em um ambiente turbulento. de início, o estudo toi desencadeado pela permanente inquietação presente em qualquer empresa que atua na área de recursos naturais: o que acontecerá quando as reservas de petróleo se exaurirem? para nosso alívio, descobrimos que nenhuma das empresas que estudamos, em toda a nossa pesquisa de literatura, fracassara por se ter exaurido seu principal recurso natural. no entanto, mu iras empresas se afastaram de sua base original de recursos naturais ou de sua área de negócios original. a dupont é um exemplo clássico e bem conhecido . seu portfólio de negócios mudou, no decorrer do tempo, da polvorã para produtos químicos mediante maioria no controle acionário da general motors. após a equipe responsável pelo estudo da shell ter relatado esse tipo de descoberta, fiz outra pergunta à equipe: alguma daquelas longevas empresas de grande porte havia mudado de maneira fundamental — não porque tivesse sido forçada a tanto, mas porque havia antecipado a necessidade de mudar? com efeito, sim. a wa/ona das empresas longevas, segundo a equipe, havia antecipado a necessidade de mudar, no mínimo uma ve% durante a sua vida. com maior frequência, essa oportunidade havia nascido du uma crise em meio a uma nova ameaça proveniente do ambiente de negócios — um novo concorrente, uma restrição de comércio, uma guinada no mercado ou uma tecnologia rival. as empresas longevas pareciam ter uma capacidade inata de explorar essas crises e transformá-las em novos negócios. frequentemente, alguém de dentro da empresa identificava a iminência da crise, porém não
como uma crise, mas sim como uma nova oportunidade, uma rota alternativa para o crescimento e a rentabilidade da empresa. novamente, um dos exemplos foi a dupont. seus líderes, em sua maioria membros da mesma família, haviam astuciosamente navegado pelas contracorrentes tecnológicas, políticas e sociais dos estados unidos dos séculos xix e xx. a empresa assumira uma precursora liderança nos eua na área de produção de dinamite e, mais tarde, nas áreas \ de embalagens de celofane pesquisa de plásticos. alguns membros da família du pont, a qual era proprietária e cuidava da direção da empresa, haviam se tornado políticos destacados - entre eles pierre s. du pont iv, que foi congressista e governador nos eua. ethel du pont se casara com theodore roosevelt jr., e havia indícios de que essa sensibilidade permitira aos tomadores de decisões da família movimentarem-se rapidamente de um negócio para outro, consolidando sua posição na general motors e nas indústrias químicas em tempo hábil para a expansão industrial da segunda guerra mundial.1 conforme consta em nosso relatório: identificar uma oportunidade ou ameaça era unia questão; estimular a mudança necessária para aproveitar aquela oportunidade era outra. existe uma considerável diferença entre as empresas que passaram cegamente ao largo da ameaça e da oportunidade e aquelas que reagi ram e mudaram.2 o que deu às empresas a capacidade para tais realizações? voltaremos
a essa questão ao longo de todo este livro porque essa capacidade dependia de todos os quatro fatores diferenciadores da empresa viva: sua capacidade de adaptação ao mundo exterior (aprendizado), seu caráter e identidade (persona), suas relações com as pessoas e instituições dentro c cm torno de si mesma (ecologia) e a forma como se desenvolveu no decorrer do tempo (evolução). podíamos ver que a mais acessível dessas capacidades, e aquela que costuma surgir primeiro, era o aprendizado. as empresas longevas eram sensíveis à sua comunidade e ao seu meio ambiente. essa sensibilidade não era superficial ou ditada por uma responsabilidade social. ela era regida pelo interesse próprio da empresa viva. por trás de todas as demonstrações de sensibilidade em relação à comunidade [escrevemos em nosso relatório] geralmente havia uma abordagem obstinada e o reconhecimento de que... o manter-se alerta e reativo... ajudava a criar um clima apropriado ao crescimento da empresa.3
considere, por exemplo, o caso da empresa sueca stora. se você se sente perplexo com a turbulência em seu ambiente empresarial de hoje, pense então nas forças conflitanties com as quais a stora teve de lidar. a primeira menção escrita à empresa data de 1288. naquela época, ela era uma mina de cobre sediada em dalecaília, uma província da região central da suécia.
quando estava com apenas 270 anos de idade, durante o século xv, a empresr teve de lutar com o rei da suécia para manter sua independência e ider tidade. reis de todas as partes da europa, enredados na luta por estab -lecer estaclos-nação centralizados, procuravam arrebatar qualquer cent :vo em que pudessem colocar as mãos e suas exigências ameaçavam a existência de empresas como a stora. então a stora assumiu um papel po;ítico dentro da suécia, sob o respaldo não só dos recursos financeiros de seus líderes, mas também do significativo apoio de camponeses da região de sua base de operações, a província de dalecarlia. no final, os mestres mineiros da stora encontraram uma resposta apropriada para a turbulência externa na maneira com que se organizaram. conforme escreveu um historiador: "estabeleceu-se uma gui lda na montanha... que adotou um perfil independente e militarista. para os membros, a lealdade à guilda sobrepujava a lei da terra, e a palavra do mestre da guilda pesava mais que a de um juiz.'"1 durante esse período de inquietação, teria sido catastrófico se a empresa tivesse se concentrado em seus negócios de uma forma introvertida, alheia à política. ao contrário, a empresa remodelou seus objetivos e métodos de modo a ficar em sintonia com as demandas do mundo exterior. ela voltou a fazer o mesmo repetidas vezes ao longo de vários séculos, desde a idade média até a reforma, passando pelas guerras cio século xvii, pela revolução industrial e pelas duas guerras mundiais do século xx. para aquilatar as
dificuldades de adaptação, considere a ínfi ma quantidade de informação de que dispunham os gerentes suecos da stora. em vez de telefones, aviões e redes eletrônicas, eles dependiam de mensageiros, cavaleiros e navios para o porte e transporte de suas mensagens. eles mal-e-mal dispunham das facilidades de uma visão global de seus próprios negócios, e menos ainda de urna visão do ambiente global de negócios. tampouco, ao que parece, seus diretores tinham tempo a gastar em deliberações sobre as necessidades e demandas dn sociedade. no .entanto, a reação pronta e oportuna às condições presentes na sociedade era necessária para a sobrevivência da empresa e por vezes até mesmo de seus membros individualmente. no decorrer dos vários séculos seguintes, enquanto a empresa lidava com as constantes mudanças das forças sociais e políticas, ela alterava continuamente sua área de atuação, passando da mineração de cobre para a exploração florestal, depois para a redução de minério de ferro, força hidráulica e, mais tarde, para papel, celulose e produtos químicos. suas tecnologias da. produção também mudaram - do vapor para a combustão interna, depois para a eletricidade e finalmente para o microchip. em retrospectiva, cada uma dessas mudanças parece hercúlea, mas, para as pessoas que dirigiam essas empresas naquela época, tais mudanças devem ter sido graduais e quase imperceptíveis em seu início. certamente, algumas dessas mudanças devem ter envolvido uma crise na base na empresa, mas a stora - e todas as outras empresas de sucesso que estudamos - conseguiu efetuar suas dramáticas mudanças sem sacrificar sua identidade ou sua vida corporativas durante o processo. isso só pode significar uma coisa: essas empresas reagiram precocemente em vez de tardiamente, com presciência em lugar de responder a uma constatação posterior.
mudando para entrar em sintonia dom o mundo externo hoje, as pessoas de negócios ignoram, por sua própria conta e risco, as opiniões populares com relação a questões como soberania nacional, colonialismo e imperialismo, poluição, conservação, exploração, "o declínio da classe média" e até mesmo o livre comércio. mudanças sociais - tais como a mudança da posição da mulher na sociedade, o aumento do tempo de lazer, as mudanças no transporte e a evolução dos gostos do consumidor - criam continuamente novas oportunidades cie emprego e novos mercados, ao passo que outros mercados começam a declinar. indicadores económicos sobem e descem de forma desenfreada, incluindo taxas internacionais de câmbio, taxas de inflação, taxas cie juros e ciclos de vida de produtos (liderados pela indústria de eletrôni-cos). as atitudes dos acionistas mudam de dóceis a altamente exigentes e por vezes de volta a dóceis. com a queda do muro de berlim, vimos mudanças políticas que derrocaram setenta anos de hegemonia do comunismo em alguns países. todas j essas atitudes são aspectos cruciais do meio ambiente de negócios de uma empresa. quando digo "meio ambiente", não utilizo o termo como um ecolo-gista o faria para se referir às circunvizinhanças naturais. antes, eu o uso para indicar a soma de todas as forças que afetam os atos de uma empresa. nos últimos vinte anos, esse meio ambiente de negócios, dentro cio qual todas as empresas têm de operar, exibiu oscilações de frequência e amplitude crescentes. estas, por sua vez, reorientam o senso de propósito corporativo. no calor da reestruturação e da reengenharia, é fácil perder de vista o propósito da mudança:-fazer frente às mudanças nas pressões do mundo exterior. há momentos em que o know-how, a linha de produtos e as relações trabalhistas de uma empresa estão em harmonia com o mundo que a cerca. tais situações são familiares; a empresa está bem organizada, treinada e preparada. os gerentes não precisam desenvolver e implementar novos conceitos. nessas épocas, a essência da gestão está em alocar recursos para promover o crescimento e o desenvolvimento. trata-se de um tipo de trabalho altamente gratificante. ele significa canalizar capital e talento humano para aquelas partes da organização melhor posicionadas para se beneficiar do meio ambiente convergente e harmonioso - c essas partes da organização retribuem o cumprimento tornando-se maiores, melhor estabelecidas e mais fortes dentro da empresa. mas então surge o momento inevitável, justamente quando a empresa conseguiu se organizar da forma adequada para lidar com a situação anterior, em que o atual meio ambiente de negócios muda de rumo.
ele se torna desarmonioso com a forma com que a gerência estruturou a empresa - particularmente com os componentes maiores, bem estabelecidos e poderosos que se beneficiavam da estrutura anterior. se tal desarmonia tiver um caráter suficientemente fundamental, também as mudanças requeridas dentro da empresa serão fundamentais. mudanças contínuas, fundamentais, no mundo exterior - um turbulento meio ambiente de negócios exigem uma contínua gestão de mudança dentro da empresa. isto significa fazer mudanças fundamentais contínuas nas estruturas internas da empresa. para muitos psicólogos, esse princípio representa um importante aspecto do aprendizado. tal imperativo tem importantes consequências também sobre a forma como dirigimos nossas empresas. a empresa deve ser capaz, quando necessário, de modificar seu marketing, sua linha de produtos, onde e como os manufatura e sua forma organizacional — para estar em harmonia com o mundo em torno. uma revisão fundamental nas regras fi nan ceiras pode levar um banco a considerar novos mercados e novos produtos, ampliando drasticamente sua capacidade existente. um aumento nos preços do petróleo (algo que uma empresa que comercializa petróleo deveria tratar como rotina) pode forçar uma empresa aérea a fazer uma revisão fundamental cm seus custos, estrutura de preços, programação cie voos ou na composição de sua frota (para aeronaves mais eficientes em uso de combustível. uma vez implementadas essas novas soluções, quer envolvam uma nova tecnologia, política de marketing, portfólio de pro-jetos ou programação de serviços, a empresa não é mais a mesma. ela passou para uma nova fase de sua vida. essa é a essência do aprendizado. para adquirir esse tipo de aprendizado, a empresa precisa ver o que está acontecendo em seu meio ambiente com toda a clareza. novamente, o aprendizado começa com a percepção. de que outra forma os gerentes podem saber quando uma mudança significativa se faz necessária ou como agir efetivamente para alcançar um novo tipo de harmonia? no entanto, gerentes de empresas, mergulhados nos detalhes de seus esforços de mudança, pensam nas pressões externas apenas vagamente. eles não enxergam; não desenvolvem uma sensibilidade atenta aos sinais de pressões externas à empresa e a como essas pressões estão mudando. por que é tão difícil para os gerentes manterem sua sensibilidade? por que as empresas deixam de antever os sinais de mudança? em meu último cargo no grupo shell, como coordenador de planejamento corporativo, era importante encontrar uma resposta para essa pergunta. se as empresas pudessem enxergar de antemão e gerir a mudança interna segundo essa antevisão, muita destruição de capital e miséria social seria evitada - não só na nossa, mas em qualquer empresa. por que, então, há tantas empresas aparentemente tão cegas e surdas àquilo que acontece à volta delas? com o tempo surgiram cinco respostas diferentes a essa pergunta. as duas ou três primeiras provavelmente já ocorreram a você; elas representam os mitos tácitos porém predominantes com relação a por que os gerentes deixam de perceber efetivamente.
teoria 1: os gerentes são estúpidos teóricos e académicos da área de negócios, com o benefício da retrospectiva, deixam implícito ou afirmam que os gerentes são idiotas -quer cegos, surdos ou estúpidos completos. se não fosse assim, por que as grandes empresas ferroviárias norte-americanas não v i r am as auto-estradas sendo construídas margeando seus trilhos no começo deste século? por que os fabricantes ocidentais de eletrônicos de consumo não enxergaram os concorrentes japoneses e coreanos que estavam prestes a engoli-los? estaria claro, então, que as pessoas de negócios não estão preparadas intelectualmente para lidar com o caráter dinâmico de seu meio ambiente. jamais gostei dessa explicação. a grande maioria das pessoas que encontro nos círculos empresariais não são surdas, cegas nem estúpidas. de qualquer forma, o problema confrontado pêlos gerentes não é agir com inteligência de forma isolada, mas sim fazer uso da inteligência de toda a empresa para prever os problemas de forma conjunta.
teoria 2: conseguimos enxergar somente quando uma crise abre nossos olhos apresentei a pergunta a uma série de psicólogos: por que os gerentes não exercitam a antevisão? eles me explicaram que existe uma resistência humana à mudança - uma resistência que é basicamente boa, tanto para o indivíduo como para a sociedade. não se deve mudar apenas pela mudança. todavia, disseram os psicólogos, quando a sobrevivência depende da mudança, essa resistência deve ser superada, e a única forma disso ocorrer é pelo sofrimento - um sofrimento profundo e prolongado! o equivalente corporativo do sofrimento é a crise. no auge de uma crise prolongada, segundo essa teoria, as pessoas da empresa sofrerão e ficarão convencidas de que algo precisa ser feito. realmente, muitas vezes você ouvirá gerentes dizendo: "o que essa empresa precisa é de uma pequena e boa crise. aí conseguiremos fazer algumas mudanças por aqui." não há dúvida de que muitas mudanças fundamentais tiveram uma crise em sua raiz. toda vez que converso com gerentes de uma empresa que passou por uma adaptação estrutural, eles sempre se lembram claramente da dolorosa época por que passaram no período que precedeu as mudanças. e isso não se aplica só a empresas. pense na opep em 1986, nos vários sindicatos durante a última década e nas lutas da ex-união soviética em sua atirai transição, li m cada um desses casos, o mundo em torno mudou. os sinais de advertência foram ignorados até, por fim, a desarmonia começar a se manifestar (nas empresas) nos resultados do trimestre (quando, de qualquer forma, já era tarde demais). mesmo então, os velhos objetivos foram perseguidos obstinadamente. os cintos foram apertados. empregos foram perdidos. pessoas lutavam sob pressão. em última instância, a sobrevivência da instituição estava em jogo. e, finalmente, a contragosto, as pessoas começaram a adotar uma orientação voltada para o aprendizado. apesar do desgaste envolvido, muitos gerentes apreciam uma crise. enfim é possível fazer coisas. como é essencial tomar medidas rápidas, a empresa pode enfim se mexer sem a necessidade de consultas e demoradas deliberações. prospera a gestão autocrática e heróica. decisões podem ser tornadas sem delongas. o poder torna-se centralizado e concentrado — colocado sobre um punhado de cabeças: a empresa parte para o "tudo ou nada". mas será que isso significa que as crises são o único caminho para o aprendizado? ou que as crises necessariamente geram aprendizado? podemos nos lembrar de muitas crises em que houve pouquíssima adap tação institucional: empresas que esmoreceram sob a pressão da aquisi ção hostil de seu controle acionário, dó surgimento de um novo concor rente feroz ou de um processo judicial'inesperado. essas crises tendem a seguir um mesmo padrão genérico. '' • em algum momento, à medida que as perspectivas se tornam sombrias, o dano ou perigo fica evidente e, voluntária ou involuntariamente, chega-se a um consenso sobre a inevitabilidade da mudança. • quando isso acontece, resta pouquíssimo tempo. • pelo fato de haver pouquíssimo tempo, são muito poucas as opções viáveis. elas não são necessariamente as melhores, ficando restritas àquelas que exigem pouco tempo para implementação. • quase por definição, essas opções tendem a ser m uit o duras, devastadoras para o moral da empresa e difíceis de delas sair com a identidade corporativa intacta: melhorar drasticamente o fluxo de caixa, cortar custos, cortar gastos de capital, cortar pessoal. • a crise é um ciclo auto-reforçador. quanto mais fundo você mergulha, rnais opções se torham inviáveis e menor se torna o tempo - o que reduz ainda mais suas possibilidades e o envolve mais profundamente na crise. sem duvida seria melhor agir com presciência. mas é possível introduzir uma mudança fundamental por meio da presciência? na prática, isso só pode ocorrer se os gerentes da empresa situação ter- se deteriorado ao ponto de a empresa perder opções. em resumo, para agir com presciência, a empresa precisa agir em função dos sinais e não em reação ao sofrimento. no final , a visão dos psicólogos - de que a única maneira de se operar uma mudança fundamental é por meio de uma crise - é uma visão pessimista a qual reluto em aceitar. ela significa que, em face de um
meio ambiente desarmonioso, não há nada que um gerente possa se prontificar a fazer. os eventos seguem seu caminho inescapável rumo ao desastre, v vida no mundo dos negócios é um jogo ou, melhor, uma tragédia grega. sofremos e enfrentamos os eventos. não há esperança de que. seja diferente.
teoria 3: conseguimos enxergar apenas aquilo que já experimentamos com a emergência da psicologia cognitiva e do estudo dos mapas incutais, alguns psicólogos começaram a afirmar que as pessoas só conseguem "enxergar" aquilo que já experimentaram - de alguma forma, pelo menos, para receber vim sinal do mundo exterior, esse sinal precisa ecoar em alguma matriz já existente na mente, lá colocada por eventos anteriores. considere, por exemplo, a história do chefe de uma tribo que foi levado a cingapura por um grupo de exploradores ingleses no início deste século. os exploradores o haviam encontrado nos rincões das altas montanhas da península malaia, em um vale isolado. sua tribo havia literalmente parado na idade da pedra. seu povo nem sequer inventara a roda. não obstante, o chefe era muito inteligente e tinha uma conversa agradabilíssima (quando os exploradores conseguiram um meio de se comunicar com ele). o chefe parecia ter uma percepção profunda e concreta de seu próprio mundo. portanto, como experiência, eles decidiram levá-lo a cingapura, na época já uma sofisticada região portuária, com prédios de vários andares e um porto repleto de navios grandes. economicamente, essa cidade-estaclo tinha uma economia de mercado, com seus comerciantes e especializações profissionais. socialmente, possuía muito mais camadas do que a sociedade da qual o chefe tribal provinha. eles ciceronearam o chefe por aquele inundo durante 24 horas, submetendo-o a milhares de sinais de mudança potencial para sua própria sociedade. depois eles o levaram de volta ao seu vale na montanha c começaram a lhe fazer perguntas. de todas as maravilhas que havia visto, somente uma parecia impor tante para ele: o chefe vira um homem carregando mais bananas do que jamais pensara ser possível um homem carregar. não se consegue enxer gar o que a rnente não experimentou antes. o chefe tribal não conse guia fazer correlações com os prédios de vários andares ou com navios gigantes; porém, quando viu um vendedor do mercado empurrando um carrinho lotado de bananas, ele conseguiu entender. todos os outros sinais de mudança potencial estavam tão distantes de suas experiências anteriores de vida que sua mente não conseguiu absorver aquilo que seus olhos lhe diziam. existe alguma verdade nessa explicação. mas ela não pode ser a única explicação por que as empresas deixam de enxergar s i nai s de mudança cm seu meio ambiente. ela significaria que empresas antigas com ricos históricos viriam sempre 'prevalecer sobre empresas mais jovens, ao menos no que se referisse a'flexibilidade, porque as empresas mais velhas teriam construído uma base muito maior de experiências a partir da qual fazer correlações significativas com as novas percepções. na verdade, creio que essa dinâmica efetivamcnte ocorre. uma empresa mais velha e com uma boa memória institucional provavelmente enxergará mais que uma empresa jovem. no entanto, empresas velhas e experientes volta e meia deixam de enxergar sinais. conforme convincentemente demonstram as estatísticas, elas são tão propensas a crises quanto empresas mais novas. alguns outros fatores devem estar em operação.
teoria 4: não conseguimos enxergar aquilo que é emocionalmente difícil de ver na indústria do petróleo, vimos pela primeira vez o valor da sensibilidade durante três grandes crises nas décadás de 1970 e 80: a crise de fornecimento de petróleo da opep em 1973, a derrubada do xá do ira em 1979 e o colapso do preço do petróleo em 1986. em todas as empresas de grande porte, pelo menos algumas pessoas anteciparam essas crises e deram alertas prévios quanto a elas. não obstante, a maioria
das empresas não implementou em tempo hábil às mudanças internas necessárias. em meados dos anos 80, essa falta de antevisão cobrou seu preço, com o resultado de que duas das "sete irmãs" -- as principais empresas petrolíferãs que pareciam herméticas e invencíveis no início dos anos 70 - ficaram enfraquecidas ou sofreram fusões. além disso, muitas empresas petrolíferas menores morreram. o que aconteceu a elas? um fator fundamental foi a ascensão e queda da exploração e produção (e&p) - o componente de alta tecnologia de empresas petrolíferas que fazem perfurações em busca de petróleo, instalam bombas para sua extração e o vendem como óleo cru. na crise de fornecimento de petróleo de 1973 (conhecida nos estados unidos como o embargo da opep), o preço do óleo cru disparou a alturas até então inéditas e permaneceu assim por mais 13 anos. embora isso representasse uma crise igualmente real para todos, os de dentro e os de fora das empresas petrolíferas, não foi de modo algum uma crise para a e&cr o preço de seu produto havia subitamente saltado de us$2 para us$30 o barri l - para elas, uma sincronização bastante harmoniosa com o mundo exterior. essa situação harmoniosa resultou em outra mudança: na alocnçftn cie recursos. talvez 30 por cento do orçamento total das empresas petrolíferas fossem alocados na e&p. a partir daí esse departamento receberia 50 por cento, ou, em algumas empresas, 70 por cento. carreiras de gerentes então atuantes na área de e&p inflaram-se de sucesso, e pessoas novas e capazes se voltaram para essa área porque era ia que estava o sucesso. como resultado, nas maiores empresas petrolíferas os altos executivos provinham cada vez mais das fileiras de e&p então chegou o ano de 1986. de repente, o preço do petróleo caiu para us$10 o barril. especialmente para a área de e&p, tal queda representou um desastre muito desarmonioso. e, o que era pior, as empresas petrolíferas haviam então se reorganizado em torno da liderança da e&cp. elas haviam respondido à harmonia com sucesso, mas agora achavam a desarmonia muito mais difícil. o pensamento dos altos líderes vinha mesclado da experiência em e&p, e esta continuava a ficar com a parte do leão dos recursos. eles não podiam oferecer o mesmo nível de retorno sobre aqueles recursos, mas tampouco podiam mudar seus métodos e abordagens. em muitas empresas, eles fortaleceram sua resistência à mudança com a racionalização de um desejo: "as coisas vão se reverter e o preço do petróleo voltará ao 'normal'." era emocionalmente difícil promover uma mudança fundamental. por um lado, os gerentes de e&p de muitas empresas petrolíferas precisavam aceitar o fato de que suas prioridades e conhecimentos não eram mais as fontes deterfninantes de triunfo. além disso, as empresas haviam descoberto que gerir em função de uma mudança interna fundamental era inerentemente muito menos gratificante do que gerir em função do crescimento. em um ambiente de não-crescimento, você deixa de gerir pela alocação de uma base continuamente crescente de recursos. você passa a ter de cortar custos, passa a conhecer o que é a frugalidade e procura novos negócios que implicam riscos muito maiores, muito menos espaço para erros e recompensas muito mais incertas. muito compreensivelmente, aqueles que se acostumaram com as intensas emoções da fase anterior resistirão à correção nesta fase. mudar de rumo/nunca é agradável para as pessoas que estavam à frente no ataque anterior. por consequência, os jornais estão repletos de exemplos de empresas que, sob condições de um meio ambiente modificado, protelam demais as providências no sentido de;mudar suas (anteriormente bemsucedidas) políticas - até mergulhar em umaj.grave crise. não se pode fazer nada para neutralizar essa dor emocional. ela é um complemento necessário da mudança fundamental. e, realmente, é muito forte. no entanto, ela não pode ser esmagadora, porque, se fosse, as empresas jamais mudariam. e, conforme podemos ve r i f i c a r pelo exemplo da stora, algumas mudam. contrariamente às visões pessimistas dessas teorias, existe uma enorme esperança de melhoria. ademais, os seres humanos parecem ter desenvolvido uma capacidade de presciência muito maior que a tias empresas. assim sondo, após considerar as quatro primeiras teorias durante meu estudo na shell, começamos a examinar a natureza cognitiva da adaptabilidade humana. o que os psicólogos pesquisadores acreditavam ser o fator que proporcionava aos seres humanos sua capacidade de antecipar o futuro? e será que as empresas poderiam emular esse aspecto do comportamento humano?
teoria 5: conseguimos enxergar apenas aquilo que é relevante para nossa visão do futuro na shell, essa investigação acabou nos levando ao trabalho de david ingvar, chefe do departamento.de
ne.urobiologia da universidade de luncl, suécia.5 os resultados de sua-pesquisa, publicados em 1985, demonstram que o cérebro humano está sempre tentando abstrair um significada do futuro. em cada momento de nossas vidas, criamos instintivamente planos e programas de ação para o futuro - antecipando o momento oresente, os minutos seguintes, as próximas horas, os próximos dias, -..s próximas semanas e os próximos anos - em alguma parte de nossa mente. essa atividade mental se dá em todo o decorrer do dia, independentemente daquilo que estejamos fazendo; ela ocorre de forma ainda mais concentrada à noite, enquanto dormimos. provavelmente você criou uma dezena ou mais desses lapsos de tempo enquanto lia este capítulo. "se eu continuar lendo por mais uma hora, ficará tarde para telefonar para beth. aí vou ter de sair para me encontrar com andré antes do jantar. se andré me oferecer um drinque, talvez eu não consiga ligar para márcia antes que ela saia para ir ao teatro. talvez seja melhor mesmo ligar para ela amanhã de manhã. por outro lado, se eu parar de ler agora, ainda consigo pegar o trem para ir até o centro. se o trem chegar atrasado, ligo da estação e depois pego um táxi em vez de pegar o metro...." esses planos são organizados de forma sequencial, como uma série de ações possíveis: "se isto acontecer, farei aquilo." não se trata de previsões. eles não se propõem a dizer o que acontecerá. trata-se de lapsos de tempo na antevisão de um futuro. cada plano combina uma condição hipotética futura do meio ambiente ("se o trem chegar atrasado") com uma opção de ação ("pego um táxi"). o cérebro não só fabrica esses hipsos de tempo nos lobos pré-lron-tais, como os armazena. visitamos esses futuros e lembramos de nossas visitas. temos, em outras palavras, uma "memória do futuro" sendo continuamente formada e otimizada em nossa imaginação e repetidamente revisitada. a memória cio futuro, conforme ingvar a denomina, é um processo interno do cérebro, relacionado à capacidade da linguagem e à percepção. aparentemente ela nos ajuda a distinguir a infinidade de imagens e sensações que chegam ao cérebro pela atribuição de relevância a elas. percebemos algo como dotado de significado se esse algo é significativamente compatível com uma memória que tenhamos fabricado de um futuro antecipado. ingvar destaca que entre as pessoas "normais", cerca de 60 por cento desses futuros antecipados são favoráveis: coisas boas acontecem neles. e 40 por cento são ruins. se esse equilíbrio for prejudicado, teremos oti-mistas inabaláveis ou pessimistas incorrigíveis, dependendo de se suas memórias predominantes do futuro forem positivas ou negativas. seja como for, quanto mais saudável o cérebro, mais lapsos alternativos ele fabrica, obtendo um razoável equilíbrio entre condições favoráveis e desfavoráveis. fabricamos e armazenamos grande quantidade de opções para o futuro, muito mais do que jamais poderemos realizar. em sua pesquisa, david ingvar aborda a qu'estão de a que função se prestaria esse tipo de "memória do futuro". por que ela teria surgido? uma razão óbvia seria nos preparar para agir logo que um dos futuros visitados se materializasse. mas ingvar sugere outra finalidade: como um filtro, para ajudar a lidar com a sobrecarga de informações a que todo ser humano está constantemente sujeito. o corpo humano, observa ingvar, tem uma infinidade de canais sen-soriais: -os olhos, ouvidos, nariz, paladar e todas as partes da pele. cada um desses sensores envia ao cérebro um fluxo contínuo de sinais sobre o mundo em torno. o volume de informações aleatórias que chega até o cérebro é tal que a vasta maioria delas precisa ser ignorada. o cérebro não poderia funcionar adequadamente se'atribuísse igual prioridade a todas as informações que recebe. ingvar lança a hipótese de que as nossas "memórias do futuro" proporcionam um guia subconsciente para nos ajudar a determinar quais informações recebidas são relevantes. os lapsos de tempo armazenados funcionam como gabaritos com os quais os sinais recebidos são confrontados. se a informação recebida coincidir com um dos lapsos alternativos, eja será compreendida. informações tornam-se conhecimentos e o sinal adquire significado. a mensagem dessa pesquisa é clara. somente perceberemos um sinal do mundo exterior se ele for pertinente a uma opção de futuro que já tenhamos arquitetado em nossa imaginação. quanto mais "memórias cio futuro" desenvolvermos, mais abertos e receptivos estaremos aos sinais do mundo exterior. ; se o aprendizado começa com a percepção, então n teoria de ingvar tem implicações importantes para as gerências que estejam tentando guiar sua empresa em meio a um ambiente turbulento. ingvar na verdade
está dizendo que o ato da percepção não é simplesmente uma questão de coligir informações- de olhar para um objeto c registrar toda sorte de observações e dados em relação a ele. a percepção, para o ser humano, é envol-ver-se ativamente com o mundo. e, nas empresas, ela também é ativa. a percepção requer o esforço deliberado de grupos gerenciais dentro da empresa para "visitar seu futuro" e desenvolver lapsos cie tempo e opções. caso contrário, as observações e os dados coletados não terão .significado. empreender tal esforço é mais fácil para o indivíduo do que para a empresa porque o cérebro está inatamente equipado para desempenhar esse tipo de mobilização ativa. imagine que um homem que mora na frança tenha viajado a negócios para londres de barca, com seu carro. Às oito horas da manhã seguinte, ele vai de carro do hotel até o escritório. embora submetido à considerável sobrecarga de informações proveniente de tentar se localizar no trânsito de horário de pico em uma cidade estranha, ele liga o rádio para ouvir as últimas notícias. mais sinais chegam até o cérebro. no final do noticiário, o locutor faz uma breve menção ao anúncio de uma greve no porto de barcas de dover. a maioria de nós sequer ouviria essa informação. mas o nosso homem residente na frança tem um lapso de tempo armazenado em sua mente. ele tem uma memória do futuro, onde se vê indo de carro até dover naquela mesma noite para pegar uma barca. ele escuta o sinal porque ele é relevante para aquela memória. a informação tornou-se conhecimento. uma empresa não está inatamente equipada para fabricar esse tipo de memória do futuro. a gerência precisa tomar medidas específicas para produzir tal memória. e por isso que a teoria de david ingvar é tão importante no sentido de indicar um meio de aperfeiçoar o poder de percepção de uma empresa. sua teoria explica satisfatoriamente, ao menos para mim, por que os gerentes não reconhecem eventos externos cm tempo hábil para evitar uma crise. e a teoria de ingvar sugere também que as empresas podem desenvolver a sensibilidade de que precisam ao descobrir formas de construir uma "memória organizacional do futuro".
o royal dutch/sheli group por 38 anos, de 1951 a 1989, em três continentes. em 1978, retornou ao reino unido para assumir responsabilidade regional pêlos negócios da shell na África e no sul da Ásia. em 1981, chefiou a área de planejamento do grupo, que desenvolveu um trabalho pioneiro em planejamento por cenários, processos naturais e decisórios de empresas de grande porte e gestão de mudança. de 1981 a 1988, de geus foi também presidente da câmara de comércio holandainglaterra. a rainha da holanda agraciou-o com a ordem de orange-nassau, em 1988. arie de geus é um dos membros fundadores da global business netvvork. desde que se aposentou, arie d| geus tem atuado como conselheiro para muitas instituições governamentais e privadas c dado palestras em todas as partes do mundo, além de aceitar convites como membro honorário da london business school e como membro dos conselhos do centre for organizational learning do m1t e do nijenrode learning center da holanda. entre os trabalhos publicados por arie de geus está o importante artigo "planning as learning", publicado na harvard business review (1988), e a palestra intitulada "companies, what are they?", publicada pela royal society of arts, de londres (1995). ARIE DE GEUS TRABALHOU PARA