ECONOMIA SOLIDÁRIA: UM OUTRO METABOLISMO SOCIOECONÔMICO NESOL UFSC
1. O metabolismo destrutivo do capitalismo O CAPITALISMO é uma sociedade do espetáculo, do descartável e do supérfluo.
A essência do capitalismo é o impulso maximizador. A lógica do capital é a do valor em busca de valorização, do “quanto mais ganho, mais quero”, a qual historicamente substituiu o princípio do “suficiente me basta”.
Mecanismos da incessante acumulação capitalista. a) O capitalismo não paga seus custos: externaliza-os. A acumulação primitiva (economia de rapina) é permanente. A exploração e precarização do trabalho é cada vez maior, expropriando o trabalhador de direitos historicamente conquistados.
b) Obsolescência planejada Inimigo da durabilidade, o capitalismo decreta a baixa tendencial do valor de uso. A voracidade do capital gera a montanha de lixo diária.
c) O capitalismo vídeo-financeiro cria necessidades. Há 70 anos, as palavras que nossos avós ouviam eram dirigidas à eles como pessoas. Atualmente, a maioria das palavras que se escutam são propagandas. Elas não trazem informação sobre os bens que oferecem, mas se parecem com sonhos, criam desejos, produzem os consumidores.
Uma sociedade na qual o consumo tem de ser artificialmente estimulado a fim de manter a produção em andamento é uma sociedade fundada sobre lixo e desperdício, e uma sociedade assim é uma casa construída sobre areia. (Dorothy Sayers)
O progresso nada mais é que o consumo até o infinito de necessidades desnecessárias. (Mark Twain, 1900)
A lógica do crescimento desmesurado é CANCERÍGENA. Estamos acelerando a ENTROPIA, a degradação do Planeta, pois a velocidade da reprodução do capital não respeita os limites naturais de regeneração, os ritmos e ciclos da reprodução da vida. Obviamente o progresso material não é infinito, pois a economia é um subsistema de um planeta finito e não crescente. Existem limites bio-físicos.
A ameaça da lógica econômica capitalista (explosão demográfica de automóveis levando as cidades à auto-destruição), faz muitos tomar decisões contrárias à busca do máximo ganho. O fenômeno da contra-produtividade moderna (mais pode ser pior, demais) faz surgir a consciência da PEGADA ECOLÓGICA.
Gandhi: O planeta tem o suficiente para a felicidade de todos, mas não para a ganância de poucos. Para alcançar sua prosperidade a Grã Bretanha consumiu a metade dos recursos do planeta. Quantos planetas necessitará a Índia?
Ao atingir limites absolutos, chega ao final a fase progressista de ascensão do capital. Encerra-se o papel civilizador do capitalismo.
2. A emergência das alternativas Como o estilo de vida das elites globais não pode ser generalizado (o mundo capitalista não é universalizável), as alternativas de desenvolvimento devem fundar-se na realidade ambiental e cultural particular de cada povo. A eco-diversidade depende da sócio-diversidade.
A economia solidária, a permacultura e a agroecologia, as ecovilas, o slow food, as slow cities, alternativas energéticas e medicinais, copyleft são práticas que demonstram ser possível dentro da contemporaneidade comer menos e comer melhor; trabalhar menos e viver mais; viver melhor com menos.
Por fazer da análise do valor o único objeto, o paradigma dominante despreza as forças produtivas geradoras de riqueza presentes na natureza, nas instituições ou nas atividades imateriais, as quais, se não produzem valores imediatos, criam forças produtivas. A teoria econômica estabelecida é uma teoria das trocas em regime de escassez. A socioeconomia solidária é uma ciência das riquezas, uma teoria da produção e gestão visando à abundância social de recursos. Para explicar os fenômenos econ. é necessário considerar, além da teoria dos valores, a da força produtiva. As causas da riqueza são diferentes do valor da mesma. A força produtiva da riqueza é infinitamente mais importante que o valor gerado. O aumento contínuo de valor faz diminuir os objetos de riqueza. Somente bens econ. têm valor. Os bens não econ. são pura riqueza. Nem toda riqueza passa pela mediação do valor para ter importância.
Se no Planeta há o suficiente p/a vida plena de todos, se a miséria resulta da cobiça de poucos,
estamos diante de um problema de solidariedade, de aprender a viver em comum, compartilhar recursos, pois estes, se compartidos, são abundantes e suficientes para a nossa felicidade, e não escassos! A miragem do desenvolvimento encobre isto, é a conhecida ilusão de que devemos esperar o bolo crescer para depois reparti-lo.
3. A Economia Solidária A ES se refere à práticas de consumo responsável, à redes de comércio justo, de finanças solidárias (cooperativas de crédito, fundos éticos de investimento), formas de agricultura familiar, assentamentos do MST, empresas recuperadas através da autogestão, cooperativas, círculos de trocas solidários ...
UM MAPA DO CAMPO DA ECONOMIA SOLIDÁRIA NO BRASIL MTE/ SENAES
Rede de Gestores Públicos Fórum Brasileiro de ES Fóruns Estaduais de ES
Instâncias Governamentais Fóruns e Redes
FACES do Brasil
Rede de Socioeconomia Solidária
Organizações de Finanças Solidárias
Empresas Autogestoras
Empreendimentos Econômicos Solidários
Economia Solidária
Associações, Clubes de Trocas, Grupos
Cooperativismo popular
Redes de Empreendimentos
Entidades de Apoio e Fomento
UNISOL COCRAB MST
Órgãos de Governos Municipais e Estaduais
Ligas ou Uniões
CÁRITAS
ANCOSOL ADS/CUT UNICAFES
ANTEAG
ITCPs
Fundação Unitrabalho
Outras: FASE, IBASE, PACS, IMS
São experiências não movidas nem pela rentabilidade máxima do capital, nem pela exacerbação do interesse individual. Isto permite repor o sentido originário: economia – cuidado da casa, amorosidade, porém sem perder o sentido mais vulgar – usar racionalmente os recursos, fazer melhor com menos tempo e recursos.
É característico da ES o fato da sua acumulação material estar submetida à limites, porém sem deixar de possibilitar a reprodução ampliada da vida (a melhoria das condições de vida). Ou seja: não estamos falando da reprodução simples de mercadorias, de atividades meramente de subsistência, duma economia pobre para pobres.
A novidade da ES é estar no mercado sem se subordinar à busca do lucro máximo, como se evidencia pela prática do preço justo. Nas finanças solidárias a preocupação com a rentabilidade econômica não se exclui, mas suas operações se pautam pelo respeito à valores éticos e humanistas.
O solidarismo destas práticas indica uma outra racionalidade: casa o emocional com o econômico, a competição com a cooperação, o econômico com o ecológico. São sinais dum outro paradigma produtivo sintonizado com as novas possibilidades organizacionais e tecnológicas, de uma transição paradigmática e civilizacional.
4. Davi x Golias Vivemos num mundo criado pelas grandes corporações, numa era fundamentalista de mercado na qual o certo foi subordinado ao eficaz. A desigualdade abissal que permite que um cidadão seja tão opulento que possa comprar outro, e alguns tão pobres que sejam obrigados a vender-se, falseia a democracia.
Na sociedade moderna as "redes de controles organizacionais e a comunicação instantânea com toda parte" tornam "os novos poderes obscuros, impossíveis de fixar ou de enfrentar, eterizados. Era possível romper a muralha de uma cidade ou matar um rei: mas como se pode atacar um cartel internacional?" Lewis Mumford, em 1938.
O capital é uma relação social: conta com nossa adesão, nossa cumplicidade. “O oprimido nunca é pura vítima. Uma parte dele sempre colabora” (Nandy). Ainda que sejam submetidos à compulsão das necessidades e ao poder da publicidade, os indivíduos não agem como vítimas passivas dos constrangimentos.
Em todas as sociedades do passado se encontra a presença da cobiça. Porém, nas sociedades pré-modernas este “afã pelo ouro” encontrava limites nas tradições e religiões.
É somente com o advento do capitalismo que ele se generaliza, transformando-se num ethos, numa mentalidade, num espírito (Weber), num princípio vital.
Um outro metabolismo econômico (uma economia da permanência) exige uma nova sociabilidade. A economia somente é sustentável se romper com a lógica do capital e orientar a produção para a reprodução da vida.
O Império tem um poder parasitário. Sua força reside em que nós consumimos cocacola, Nestlé, Shell, confiamos no dinheiro deles e ainda o depositamos nos bancos deles... Mas este rei aparentemente onipotente encontra-se nu! É isto que a frágil criança, que está sendo embalada na economia solidária, na permacultura e nas ecovilas, já está a gritar: votamos cada vez que compramos e consumimos. Este sim é o voto decisivo, esta sim é a aliança fundamental!