Dossier Psicologia Agressividade

  • December 2019
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Hélder Paixão

Dossier

Teorias Sobre a Agressividade 1. A concepção de Freud

2. A concepção de Lorenz 3. A concepção de Dollard

4. A concepção de Bandura

1.

Hélder Paixão Agressividade e ética, segundo Freud Este trabalho atém-se a apenas um dos recortes possíveis, da forma como a agressividade é explicada na obra de Freud, e como esse afeto pode ser pensado em suas relações com a ética. Em grande parte da obra freudiana, a agressão é entendida como resultado de um processo defensivo. Especificamente, segundo a primeira teoria pulsional (“O instinto e suas vicissitudes” [Freud, 1915/1980]), a agressividade seria, em última instância, uma formação reativa: o ódio seria manifestação secundária da libido. Sobre isso, vale ainda notar que a polaridade entre amor e ódio é entendida como uma organização da libido, na fase anal sádica. Ou seja, segundo esse raciocínio, odiar é apenas uma forma, necessária, de amar. O paradigma da atitude agressiva aparece na situação da horda primitiva, descrita em “Totem e tabu” (Freud, 1912/1980). Nesse caso, trata-se de uma agressividade que tem como base o amor à mãe (objeto de reivindicação), ao pai (amor que causa o remorso) e aos irmãos (que leva à identificação e organização social). O amor subjacente ao ódio justificaria a culpa. E a agressividade, transposta em culpa, já é organizada (e, ao mesmo tempo, organizadora) pelas relações afetivas. É no peso dessa situação primeva, repetida e herdada filogeneticamente, que Freud encontra o lugar de uma ética inquestionável, se assim pode ser dito. Inquestionável porque filogenética, e sem ela não haveria grupo e sobrevivência da espécie. Nesse ponto cumpre considerar a ótica evolucionista, que Freud adota: o amor e suas manifestações (entre elas a agressão) são fundados nos interesses de sobrevivência (o objeto de amor surge sempre da dependência biológica [Freud, 1925/1980]). A relevância do interesse de sobrevivência leva Freud, inclusive, a não conceber o masoquismo, exceto como resultado de uma identificação com o objeto, alvo de uma libido sádica (somente após 1920, é que o autor reorganiza a hipótese sobre o masoquismo, a qual é particularmente descrita em “O problema econômico do masoquismo” [Freud, 1924,1980]). A agressividade, explicada dessa maneira, é submetida ao ego desde o início. Ou

Hélder Paixão seja, é sempre uma agressividade regulada pelo que, até a segunda teoria pulsional, Freud designa pelos dois princípios de funcionamento mental (princípio do prazer e princípio da realidade). Interessa salientar que o ego é fundado em identificações, as quais implicam numa condição libidinal. Enfatiza-se assim a tese de uma agressividade ética, porque baseada no amor ao outro (notando os processos de correspondência entre o outro e o narcisismo) e no controle egóico. Com a formulação do conceito de pulsão de morte, em “Além do princípio do prazer” (Freud, 1920/1980), a gênese da agressão está aquém dos representantes psíquicos, portanto, aquém da formação do outro, numa localização anterior à estrutura egóica (daí não tardar para que Freud designe o id, como lugar desse início pulsional, em “O ego e o id” [Freud, 1923/1980]). E mesmo a agressão sendo organizada na ação recíproca das pulsões de vida e de morte, é nessa última que está sua gênese. O masoquismo primário é fundado na força da pulsão de morte. Sem dúvida, essa afirmação considera que tal genealogia é explicada em termos metapsicológicos: trata-se de uma perspectiva lógica, e não cronológica. Esse impulso primordial à destruição está isento de controle psíquico (visto a ação da pulsão de morte, que desliga as representações psíquicas). De acordo com essa perspectiva de Freud, a formação do outro e das relações de afeto que lhe são inerentes já são defesas, limitadas (D’Avila Lourenço & Simanke, 2007), contra tal impulso destrutivo. Assim este trabalho entende que, a partir das teses de “Além do princípio do prazer”(Freud, 1920/1980), a ética deve ser pensada levando-se em conta que a agressão ao outro já é uma defesa (limitada) contra uma auto-agressão (masoquismo primário) sem possibilidade de representação e, portanto, de regras. Nesse ponto, importa advertir que a auto-agressão só ganha contornos psíquicos nas formas secundárias de masoquismo, nas quais a presença do outro e dos processos de identificação já estão estabelecidos. Entretanto, tais formações secundárias do masoquismo, e todas as manifestações sádicas, não sobrepujam o masoquismo primário. Este trabalho entende

Hélder Paixão que esse masoquismo permanece como algo inexorável. Logo, a ética pensada sob esses princípios também deve levar em conta o mal-estar insuperável e irrepresentável. Sem dúvida, essa condição de sofrimento é descrita em “O mal-estar na civilização” (Freud 1929, 1980). Nesse texto, o autor potencializa a força ética do sentimento de culpa, justamente porque tal sentimento seria fundado na ação pulsional mais primitiva, qual seja, a da pulsão de morte. Nesse texto, a ética do castigo não mais funcionaria por uma questão de convivência e organização social (como acreditava “Totem e tabu” [Freud, 1912/1980]), mas pela própria economia das pulsões. Assim, o sentimento de culpa não é mais totalmente justificado por algum desejo ou ato proibido, mas é uma configuração inerente ao jogo pulsional. Esse quadro explicaria a necessidade da figura do líder nas organizações humanas (ver “Psicologia dos grupos, e análise do ego” [Freud, 1921/1980]). Contudo, “O mal-estar na civilização” (Freud, 1929/1980) não comenta os destinos da auto-agressão primordial e irrepresentável, característica do masoquismo primário, nas relações com os outros. Sobre isso, é interessante notar que “Análise terminável e interminável” (Freud, 1937/1980) permite pensar a relação entre tal masoquismo primordial e o complexo de castração. Identificando tal complexo a uma posição de passividade e, ao mesmo tempo, a um repúdio indestrutível a ela, nesse texto, o autor levanta a hipótese de que esse complexo teria um fundo biológico, resistente à capacidade psíquica. Ou seja, a posição masoquista, identificada a esse complexo, seria irremediável pelas relações sociais. Aliás, essa posição seria justamente responsável pelo fato de tais relações serem caracterizadas pela reivindicação fálica (conforme D’Avila Lourenço, 2005). Este trabalho não desconsidera a interpretação que Lacan elabora sobre esse assunto, especialmente em “A ética da psicanálise” (Lacan, 1991). Nesse seminário, o autor enfatiza a anterioridade do gozo (e a prevalência da pulsão de morte e do masoquismo), frente ao desejo. E afirma que a ética da psicanálise, distinta da ética de Kant e da ética de Sade, consistiria exatamente na sustentação e produção do desejo,

Hélder Paixão mesmo em face à anterioridade do gozo; com efeito, dessa maneira o desejo não remediaria o gozo, mas o conteria (esvaziando-o, para dizer conforme o autor). Essa seria uma possibilidade de superação da lógica da culpa e do castigo, descrita na obra de Freud. Porém, mesmo não desconsiderando a importância dessa elaboração lacaniana, este trabalho enfoca a teoria de Freud; bem como entende que, tais interpretações de Lacan só são possíveis porque esse autor fundamenta-se em fontes teóricas diversas daquelas adotadas por Freud.

•2 A concepção de Lorenz (teoria baseada no instinto: a agressão como libertação) Segundo Lorenz, a agressividade humana estava programada geneticamente, sendo desencadeada em determinadas situações. O ser humano não teria os mecanismos reguladores da agressividade como os animais, o que explicaria as guerras. Para Lorenz(1966), as pulsões agressivas são o resultado da “pressão da seleção intra-específica” (p. 253), que fez surgir no homem, há muito tempo atrás, uma certa quantidade deste comportamento, para o qual ele não encontra um escape adequado na sociedade atual.

Na tentativa de se explicar o comportamento agressivo os psicólogos sociais tem feito referências a três teorias, de amplitude variadas. Trata-se de uma teoria biológica da agressão, da teoria da aprendizagem social e a teoria da frustração-agressão. A primeira destas teorias é eminentemente biológica, sustentando-se inicialmente na suposição de que existiria uma tendência inata a se comportar de uma forma agressiva. Tais teorias encontram-se associadas aos antigos trabalhos de Freud, em que se postula uma pulsão de morte que se contraporia a uma pulsão de vida, e mais recentemente nos trabalhos do etólogo Konrad Lorenz, que sustentava a natureza adaptativa e não destrutiva da agressão. Estes dois modelos se assentavam em uma metáfora energética onde se supunha que se a energia biológica não fosse descarregada, ela se deslocaria até um alvo apropriado. É importante observar, no entanto, que ao contrário das antigas teorias sobre o comportamento agressivo que estavam

Hélder Paixão assentadas no conceito de instinto, as modernas explicações sugerem que o comportamento agressivo não é instintivo, mas sim influenciado biologicamente.

3 A concepção de Dollard (teoria da frustração-agressão: a agressão como reacção à frustração) Segundo Dollard, a agressão seria provocada pela frustração. Quando o sujeito não conseguia atingir os objectivos pretendidos, recorria à agressão. Os estudos de Miller, 1941, Miller e Dollard, 1941 e outros, se concentraram nesse estudo. Julgam que as respostas agressivas sao resultantes de uma determinada situacão especifica e nao da evolucão. Acreditam que as respostas agressivas as frustracões sao uma tentativa que os individuos tem para veneer os empecilhos para o prazer. Argumentam, ainda, que a agressão se manifesta como uma forma de atenuar as frustrações, como um comportamento "catartico", defendido por Freud e seguidores. Essa "teoria catartica" considera que a expressao fisica de hostilidade sera uma catarse ou cura ternporarta para os sentimentos agressivos e resultarão num equilibrio psiquico. Ambas teorias se confudem nesse aspecto.

4. A concepção de Bandura (teoria da aprendizagem observacional: a agressão como resultado da aprendizagem – aprendemos a magoar os outros) Segundo Bandura, o comportamento agressivo era aprendido por observação e imitação de modelos. A criança, no seu processo de socialização, imitaria o comportamento dos pais, dos professores e dos seus pares, incluindo os comportamentos agressivos (aprendizagem social). Primeiramente, Bandura começou estudando a agressão em crianças. Juntamente com Dick Walters, fizeram um estudo de campo sobre antecedentes familiares na agressão, e descobriram que os melhores precursores eram o estilo de vida que as famílias exemplificavam e reforçavam. O comportamento que os pais mostravam e as atitudes que eles exibiam quanto a expressão da agressão, tanto em casa como fora dela, emergiram como determinantes de importância. Começou, então, a desenvolver estudos de laboratório e também paradigmas de modelagem,

Hélder Paixão para examinar sistematicamente os efeitos da exposição a modelos agressivos sobre o comportamento das crianças. Os estudos experimentais em que foram utilizadas metodologias rigorosas, demonstraram que, a curto prazo, a exposição a modelos agressivos na televisão conduz a comportamentos agressivos nas crianças expectadoras, o que confirma a posição teórica de Bandura a respeito do fator modelo na aquisição e manutenção de comportamentos. Ou seja, o comportamento agressivo se adquiri através do exemplo, através da experiência direta e também da interação com fatores estruturais. As pessoas são instigadas à agressão por influências modeladoras, vendo outros agredirem. E através de experiências adversativas – insultos pessoais, ataques físicos, oposição ao comportamento dirigido a uma meta, reduções adversas na qualidade da vida. A agressão é mantida por vários fatores. É mantida por conseqüências externas – recompensas materiais, recompensas sociais e status. Ela é também reforçada quando as pessoas aliviam o tratamento primitivo através de recursos defensivos. O desempenho da agressão é afetado pelas recompensas ou punições observadas – reforço substitutivo. Uma das melhores maneiras de reduzir a agressão é através do fortalecimento de outras respostas que tenham valor funcional. Por exemplo, verifica-se que pessoas que recorrem à agressão física para resolver seus conflitos interpessoais geralmente têm baixa habilidade verbal (daí uma ocorrência maior de agressão física na classe social baixa). Se aprenderem a resolver verbalmente este tipo de conflito, o comportamento de agressão decresce. Outra maneira de modificar o comportamento agressivo é através da apresentação de modelos que exibam respostas socialmente aceitas (por exemplo, cooperação). No livro sobre agressão, Bandura destaca quatro formas diferentes para tentar reduzir a modelagem comercial da violência na televisão. Uma delas refere-se ao controle pelo Congresso. É através da proibição daquilo que não tem valor que as mudanças de comportamento são bem estabelecidas. A segunda abordagem é o autocontrole da produção. Como o gênero ação-aventura é econômico, os programas violentos tornaram-se predominantes na televisão. Outra abordagem é o desenvolvimento de um sistema para monitorar o nível de violência e por último, o desenvolvimento de uma programação alternativa, fora dos meios comerciais, através da qual influenciaria a televisão comercial.

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