DEFORMIDADES
FORMIDÁVEIS
A trajetória dos CORPOS TRansformADOS e da DEFICIÊNCIA FÍSICA pela moda
por mariana rachel roncoletta
FACULDADE ANHEMBI MORUMBI PÓS-GRADUAÇÃO EM MARKETING DE MODA
DEFORMIDADES FORMIDÁVEIS A trajetória dos corpos transformados e da deficiência física pela moda Por Mariana Rachel Roncoletta
São Paulo, 2004
FACULDADE ANHEMBI MORUMBI PÓS-GRADUAÇÃO EM MARKETING DE MODA
DEFORMIDADES FORMIDÁVEIS A trajetória dos corpos transformados e da deficiência física pela moda
Por Mariana Rachel Roncoletta
São Paulo, 2004
DEFORMIDADES FORMIDÁVEIS A trajetória dos corpos transformados e da deficiência física pela moda Por Mariana Rachel Roncoletta
Banca Examinadora _________________________________________________________ _________________________________________________________ _________________________________________________________
Data de aprovação Nota da MCC
Dedico esta pesquisa a todos os corpos um dia transformados, e aos corpos que estão por serem modificados pela ciência e pela moda.
Agradeço a minha grande, gigante família. Ao apoio dos meus pais Adilson e Maria Inês. A paciência do meu namorado Pedro. A colaboração do ortopedista Walter Targa. O profissionalismo e carisma das fisioterapeutas Sandra, Tia Cíntia e Rita. A sabedoria de Denise. Aos velhos amigos pelo suporte nas horas difíceis. Em especial a Debby Gram e Marcelino França por retratarem minha experiência. E aos novos amigos, por facilitarem o caminho de mais uma jornada.
RESUMO Com esse estudo vamos relacionar a importância da linguagem da moda na aceitação da deficiência física perante a sociedade atual. Serão analisados através da história da moda observando seus elementos estruturais: 1.
Linguagem da moda: como meio de comunicação da
sociedade e reflexo da mesma. O movimento moda vai passar por vários processos até chegarmos a apoiar universalmente os corpos transformados. 2.
Corpo: é a primeira ferramenta para que o ser humano possa
se comunicar com a sua própria sociedade. Serão observados o corpo nu, o corpo modificado e a relação do corpo influenciando o movimento moda. 3.
Vestimenta: como extensão do próprio corpo, portanto um fator
importante na comunicação do indivíduo. O relacionamento da veste com o corpo alterando suas proporções originais será o eixo principal desta argumentação. As vestes especializadas incluindo os calçados também serão observados. 4.
Mídia: serão analisados os diversos meios de comunicação
pela qual a moda se manifesta. Possuem grande influência na sociedade ao mesmo tempo em que é um reflexo da mesma.
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ABSTRACT In this study we address the importance of the fashion language in the acceptance of the physically disabled in the current society. We analyze through the history of fashion and considering their structural elements, the following: 1.
Fashion language: as society communication media and as its
reflex. The fashion movement goes through several processes until we can universally support the transformed body. 2.
Body: it is the first tool for the human being to communicate
with its own society. We will address the naked body, the modified body and the effects of the body influencing the fashion movement. 3.
Clothing: considered as an extension of the body, and
consequently a key influence in the individual communication. The relationship of the clothing and the body, changing its original proportions is the main line in this reasoning. The specialized clothes, including shoes, are also addressed. 4.
Media: we analyze several communication media through which
fashion manifests itself. They have large influence on the society, while they are its image.
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SUMÁRIO Introdução .............................................................................................. 4 1 - A linguagem da moda: um reflexo social........................................... 5 2 - O Corpo............................................................................................25 2.1 - O corpo nu ....................................................................................29 2.2 - O corpo modificado .......................................................................31 2.3 - O corpo faz a moda.......................................................................36 3 - A veste no corpo ..............................................................................55 3.1 - A moda transforma o corpo...........................................................57 3.2 - Os Especialistas no corpo transformado.......................................74 3.2.1 – Vestimenta ergonômica.............................................................76 3.2.2 – O Calçado especializado...........................................................84 4 - O poder da mídia .............................................................................89 Conclusão ...........................................................................................111 Bibliografia...........................................................................................115
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INTRODUÇÃO
Vamos compreender através da história da moda, como pôde existir um espaço para as deformidades físicas no mundo socio-cultural atual. Referindo-nos as deformidades físicas como deficiências naturais ou causadas por acidentes involuntários, e não transformações do elemento corpo pelo fator único da estética. O percurso da moda foi escolhido por este ser o instrumento que reflete as manifestações de uma determinada sociedade. Vamos percorrer seu caminho realizando pontes entre o hoje, o ontem e o amanhã. Abordando diversas passagens, absorvendo a releitura que só a própria moda como linguagem da comunicação é capaz de realizar. Através da sua trajetória pelos acontecimentos relacionados à ciência da moda, principalmente no séc. XX, onde o elemento moda entra em evidência tornando-se um ‘movimento’ importante da cultura contemporânea. Tendo como princípio o Movimento Moda como reflexo de uma sociedade, sua expressão é a ferramenta utilizada. Sua estrutura: a linguagem, o corpo, a veste e a comunicação (mídia) são os elementos analisados.
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A LINGUAGEM DA MODA: UM REFLEXO SOCIAL
O homem social e o vestuário se relacionam desde os primórdios, talvez primeiro como proteção, depois como adorno e posteriormente como distinção social a veste cobriu a nudez do corpo humano fazendo comunicar-se além do significado da própria veste, surgindo assim um elemento socio-cultural chamado: MODA. Segundo LIPOVESTSKY (1989), o sistema de moda, é um dispositivo social caracterizado por uma temporidade breve, um fenômeno social ou cultural que consiste na mudança periódica dos hábitos, gostos, estilos em diversos fatores. A moda como sistema, marca sua importância no séc. XIV na Europa Ocidental, passando a ser uma regra social, de costumes e boas maneiras exclusiva da nobreza. Somente com o surgimento da burguesia que o movimento moda começa a ganhar força, graças à prosperidade do comércio, e ao desenvolvimento industrial significando maior elaboração nas roupas. É criada uma série de regras para o vestuário incluindo as classes trabalhadoras. É quase impossível distinguir as trabalhadoras domésticas das suas senhoras quando estão usando suas roupas de domingo informa LAVER (1989) em A roupa e a moda. A mudança do comportamento humano é enorme numa época em que a ciência enfatiza a psicanálise, onde a mente do indivíduo e seu comportamento são de grande interesse. Pelo anseio de compreender a mente humana, de explicar o porquê, a ciência busca diversas formas. Uma
das
‘formas’
utilizadas
é
a
vestimenta
e
seu
relacionamento com a sociedade, afinal, moda é um reflexo da sociedade. Cada vez mais são estudados os conhecimentos sociais, até que no séc. XX, a semiologia procura compreender o movimento moda de forma verdadeiramente científica.
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A semiologia vem ampliando, aperfeiçoando a consciência de modo científico. “No quadro de uma vida em sociedade onde tudo é comunicação… quando haverá comunicação na nossa vida cotidiana, a todos os níveis, até mesmo no nível do modo de caminhar ou de colocar o corpo.” (ECO, 1975:12). A moda, como aspecto da cultura, é um reflexo da sociedade, e de seu comportamento atual. É um dos casos da cultura, onde um objeto qualquer (corpo, vestimenta…) perde o ponto de funcionalidade física e adquire um valor comunicativo (os atos de comunicação) de valor social significativo. Os códigos da moda são considerados por ECO (1989), sinais fracos por ter o poder de se modificar com rapidez não podendo descrevê-lo sem que o mesmo já tenha mudado. Como na linguagem verbal, a linguagem visual serve não somente para transmitir certos significados como para ‘identificar posições ideológicas’, segundo os significados transmitidos e as formas significativas que foram escolhidas para transmitir. A moda não é a historia da veste, é um sistema de comunicação que reflete o indivíduo na sociedade considerada hoje, claramente um fenômeno relevante na organização social não apenas na pesquisa acadêmica, mas também no senso comum. Cada vez mais é percebido e analisado seu papel nas relações sociais e de sociabilidade, respondendo a problemas de distinção social, de diferenciação entre gêneros, dos meios de expressão
pessoal
etc.,
argumenta
Almeida
(NIDEM
2002)
em
Moda,
Comunicação e Cultura. Podemos
assim
provar
que
a
moda
é
comunicação,
comunicação é linguagem, linguagem é expressão, é um reflexo da sociedade atual, contemporânea como princípio, subjetiva e individual. “Porque a sociedade seja de que forma se constituir, ao constituir-se ‘fala’. Fala porque se constitui e constitui-se porque começa a falar. Quem não sabe ouvi-la falar onde quer que ela fale, ainda que sem
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usar palavras, passa por essa sociedade às cegas: não a conhece: portanto, não pode modificá-la.” (ECO, 1975:20). A melhor sedução da moda é sua diversificação, sua mutabilidade. Através dos artifícios da aparência, o menos perfeito pode ser camuflado, transformado.
Fig. 1: Poiret, 1987. Com seus trajes lânguidos a mulher finalmente está livre para respirar.
Fig. 2: Fashion, 2002. O modelo beachwear de Elsa Schiaparelli dos anos 30.
Fig. 3: A Moda do Século, 2002. A mulher pode praticar esporte na década de 20.
A história da moda nos mostra como Ela fala pela sociedade. Nos anos 20, o corpo é libertado do espartilho por Paul Poiret, pela necessidade que as mulheres têm de se locomover, dançar, de ficar ao ar livre, de ser simplesmente desportista. É o espírito dos anos loucos que estimulam criadores como Poiret e Chanel. A moda nunca mais será a mesma, a partir de agora, seu movimento lidera os pensamentos de uma sociedade, por enquanto só do alto-
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escalão, somente décadas mais tarde que a moda pôde ser verdadeiramente democratizada. Aproximadamente 30 anos mais tarde, o New Look de Dior transformou não somente o corpo, as proporções da veste feminina, como falou pela necessidade social da época. Quando foi lançado em 1947, parecia um absurdo, um supérfluo vergonhoso no valor de 40 mil francos, enquanto a maioria das mulheres não tinha dinheiro nem para comprar leite para os filhos, mas apenas alguns anos depois, não somente a alta sociedade, mas a classe média também estava fascinada por tais proporções. Christian Dior falava a linguagem de uma época, refletia o desejo, a necessidade pela beleza do mundo no pós-guerra. “O que a muitos pareceu uma revolução social teve sua origem na necessidade global de renovação” (SEELING, 2000:236). Com Dior, a moda soube captar essa necessidade, soube falar pelo desejo mundial. Graças ao sistema de cópias, introduzido nos anos 30, onde os compradores compravam um modelo pronto ou um modelo de corte com indicações precisas quanto ao tecido, às cópias eram feitas, os esboços copiados mais de mil vezes barateavam o custo, a mulher da classe média podia agora adquirir um modelo copiado. Ele percebeu que vendia além da alta costura, vendia principalmente idéias, e podia lucrar com isso, não deveriam copiar livremente suas criações, ele praticamente inventou os royalties. Dior gostava que o copiassem, gostava simplesmente que todas as mulheres do mundo usassem seus modelos. Ele não somente soube criar a imagem de uma época como soube popularizá-la. Ele a eternizou. Deu novos parâmetros para a comunicação da moda e sua linguagem que agora atingiam a classe média. As ativas trocas comerciais e de idéias fez mais pela democratização e internacionalização da moda do que se esperava – pela primeira vez mulheres de todos os países uniam-se de livre vontade sob um único ditame da moda. Nada poderia supera o tímido Christian neste momento.
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Dior foi o primeiro estilista a apresentar suas coleções de seis em seis meses, inclusive alterando a linha de forma radical. Ele preferia que sua moda passasse rapidamente, assegurando assim os títulos da imprensa e animando as vendas. Era um gênio do marketing. A mídia começou a perceber a importância da comunicação da moda. A moda graças à popularização tomou um outro rumo: “Desta vez na direção dos esquecidos da moda, daqueles que vivem com o dinheiro contato e por isso, confinados por uma roupa uniforme.” (BAUDOT, 2002:140). Pela primeira vez o Movimento Moda ‘falava’ para uma classe desfavorecida (as mulheres mais velhas da classe média, e os jovens só terão espaço mais tarde), os primeiros passos para que este mesmo movimento se direcionasse para os deficientes físicos estava dado, já que os mesmos também são uma minoria. Mesmo assim teríamos que passar por outras revoluções na sociedade, esperar mais algumas décadas. Pouco a pouco a Moda como comunicação social vai falar pelas mais diversas minorias. Outro passo foi dado, a descentralização do mundo fashion parisiense também se popularizou entre os jovens que emprestaram de Emilio Pucci - um italiano, a calça Capri, prática e confortável ela foi usada por jovens “rebeldes” do mundo inteiro. A ditadura da moda ainda pertencia a capital francesa, mas como o próspero mundo jovem, eles assumiram o controle do futuro. Os sixties chegam, a cultura jovem influenciada pelo rock and roll assume a liderança em forma de rebeldia e finalmente populariza a moda como linguagem. Não mais é possível distinguir as classes sociais dos jovens pelo o que vestem, ouvem ou como se comportam. A moda, música e arte se unem contra as regras. O modo de se vestir, o que ouvir e como se comportar tem um único compromisso com o estilo de vida rebelde: ser contra as regras. Os jovens começaram a impor uma maneira de ser, e claro de se vestir. Paris perde a supremacia absoluta para os jovens americanos, mas não perde o poder. A moda não era mais ditada pelas Maisons Haute Couture, o prêt9
à-porter assumiu a posição, primeiro com Dior, e depois com todas as outras. Ainda em 1957, Pierre Cardin apresenta uma coleção de 150 modelos para a rua e para a noite. Consciente de que a alta-costura não poderia mais bastar-se por si mesma, Cardin abre a butique Eva e depois uma outra chamada Adão. Karl Lagerfeld ao lado de muitos outros nomes cria uma aliança histórica entre indústria e o estilo. A partir daqui, nada mais de uma tendência única, a Europa vai ver uma transformação radical na moda. O EUA se impõe pelas tentações dos produtos de massa que sabem fabricar como ninguém.
Fig. 5: A History of men´s fashion, 1993. Marlon Brando em The Wild One influenciara toda uma geração.
Fig. 4: Moda do século, 2000. As garotas no look colegial para dançar o rock and roll.
“Antigamente, não seguir a linha dominante da moda indicava que se era pobre. A partir dos anos 60, isso significa muito claramente que se é livre.” (BAUDOT, 2002:188). O mundo se transforma e a moda, claro o acompanha. Os costureiros através das butiques criam linhas mais baratas e mais jovens do que da alta costura, mas não só eles que estão presentes, criadores como Mary Quant, na Inglaterra e Jil Sander, na Alemanha também eram adoradas. Agora a moda fala para os jovens, independente de sua classe social. A moda não somente descentralizou-se de Paris, como também a diferença de classe entre os costureiros da alta costura e os criadores das butiques desapareceram. No final da década a liberdade era total. Aos poucos surgem os estilistas, que são jovens
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criadores independentes da idade, capazes de traduzir os desejos de sua cultura atual. Yves Saint Laurent e Pierre Bergé abrem uma butique numa área grã-fina não conformista de Paris, eles propõem preços acessíveis a produtos de qualidade, essa estrutura utilizada por eles será copiada pelo mundo.
Fig. 6: Yves Saint Laurent, 1984. O vestido Mondrian de YSL inspirado na arte moderna. A arte e a moda se misturam, uma obra reflete na outra.
Fig. 7: Forty years of creation, 1998. O smoking para a mulher eternizado por YSL questionado a sexualidade do traje. Editorial publicado originalmente na Vogue Paris em 79.
A moda vem da rua, diz Quant: A idéia da minissaia não é minha e nem de Courrèges, foi à rua que a inventou. A antimoda se consagrou de tal forma que até nos dias atuais nenhum criador contemporâneo deixa de lado os fenômenos espontâneos nascidos na rua. Cada uma a sua maneira, todos os integram em seus trabalhos, afirma BAUDOT (2002). Maïme Armodin abre em 61 um escritório de estilismo, convencida pela internacionalização da moda francesa e apóstola do belo pelo útil, ainda em 68 cria com Denise Fayolle, a Mafia, uma espécie de escritório de estilistas e agência de publicidade. Essa empresa vai tornar-se a vertente mais criativa de certo setor da publicidade em plena expansão nesses anos. A renovação da moda está intimamente ligada à curva econômica de sua época, todos os progressos nos 60 são a prova disto, no âmbito 11
industrial como no social. O estilo pop da geração bem sucedida encabeçada por Andy Warhol começa a dar lugar para a cultura hippie que surgiu no final dos 60 e marcou definitivamente os anos a seguir.
Fig. 8: Les années pop, 2001. O ‘frágil’ vestido criado por Andy Warhol em 63. Arte e moda se unem na cultura pop do cotidiano.
Fig. 9: Ronald Traeger, 1999. Um ensaio feito com Twiggy para Vogue em 66, não publicado, mostra juventude na foto em movimento.
Os anos 60 ficaram na memória como a grande época da revolução da juventude, enquanto os anos 70 se destacaram pela irregularidade, não tendo um perfil definido. Foi nesta década que as transformações prosseguiram em grande escala. A revolução desta vez é verdadeiramente cultural, afirmam os historiadores. Todas as culturas do mundo, principalmente as consideradas primitivas aparecem nas butiques. “É proibido proibir”, diz o lema. “Os anos 70 marcam definitivamente a Cultura de Moda. A moda e a arte juntaram-se para fixar o efêmero, foi criada uma cultura que associava moda e movimentos sociais.” (FAUX, 2000:182). Alguns estudiosos consideram o movimento hippie parte da década de 60, outros o início dos 70. As primeiras manifestações em grande escala aconteceram no ano de 68, como a Woodstok. Daqui pra frente será difícil definir qual evento, ou em que tempo um movimento fashion é desencadeado. Tudo está entrelaçado. Podemos falar de vários acontecimentos unidos: a busca
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pela paz causada pela Guerra do Vietnã, a sintonia dos Beatles com tal predisposição (pela paz) e sua grande influência sobre os jovens, a sensibilidade de Saint Laurent para explorar tais causas. Várias manifestações sociais são contestadas ao mesmo tempo falando pelas mais diversas tribos, será difícil saber claramente quem se inspirou no que. Podemos afirmar: a sociedade ocidental pedia por paz de espírito, pelo fim da Guerra, pedia para viver ‘na paz e no amor’. A moda soube manifestar de forma fascinante este desejo.
Fig. 10 e 11: Street Stye, 1994. Os hippies no show dos Rolling Stones em Londres de 69. Uma inspiração da antimoda de Saint Laurent. Na segunda, o neohippie lançado por Dolce & Gabbana em 93 também virou febre.
A união de uma moda jovem contestadora rompe os laços tradicionais drasticamente abrindo espaço para diversas vertentes difundidas ao mesmo tempo: a primeira, futurista em busca ao caminho do espaço psicodélico com o auxílio da tecnologia manifestando-se já algum tempo, a segunda em busca da paz através da natureza vinda dos conflitos americanos, principalmente. Ambas retratadas pela mídia especializada em moda/comportamento cada vez mais difundida pelo mundo. Várias manifestações da minoria uniram-se em diversas direções formando as tribos urbanas. As tribos eram pequenos grupos que se identificavam pelo seu estilo de vida, pela moda e até por seus protestos. A moda,
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tal como a vida, já não tinha certas regras: cada um escolhia o que lhe agradava, conforme suas necessidades cotidianas, suas preferências pessoais e sociais que permitiam que o mesmo fizesse parte daquele pequeno grupo, daquela determinada tribo. As ações terroristas se espalharam pelo mundo. O fim da Guerra do Vietnã, a crise do petróleo… enfim a decadência econômica mundial tornou os jovens cínicos onde tudo era experimentado, misturado, recuperado. “Saint Laurent concedeu aos trajes folclóricos cheios de fantasia, bem como aos blusões de couro preto do anti-establishment, a consagração mais elevada da alta costura, tornando-os utilizáveis para uma clientela que queria ser ‘anti’ com toda a beleza… Se na realidade, o mundo novo, multicultural, harmonioso e com igualdade de direitos tardava, pelo menos existia na passarela. Afinal ela é responsável pela realização dos sonhos.” (SEELING, 2000: 413). Ele percebeu o desejo do mundo, e trouxe para passarela da alta costura. Com o passar dos anos, e a renovação cada vez mais ágil do mundo os jovens hippies pareciam velhos, os movimentos feministas aprenderam que feminilidade e juventude não eram garantia de um mundo melhor – ser jovem já não significava automaticamente ser idealista e otimista. A Fiorucci com suas campanhas irônicas, de consumo ágil e fácil expande seu império para uma política de imagens e de estratégias de comunicação originais. Em resposta as contradições da corrente antimoda, os italianos propõem um estilo coerente e fácil de usar, mas que seja ao mesmo tempo de grande luxo. Entende-se aqui, por enquanto luxo como sinônimo de riqueza financeira, depois de qualidade discreta, e ainda sinônimo de sucesso ostentativo nos 80; e mais tarde indiscreta no final dos 90 com a febre da logomarca. Este
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conceito de luxo será reavaliado, ou melhor, revisitado nos últimos anos do século e nos primeiros do novo milênio de tantas formas diferentes que só o movimento moda pode fazer. Chegará ao ponto onde ser cool é poder ter a liberdade milimétrica de se poder misturar uma t-shirt de brechó com um tailleur Chanel, graças ao ‘supermercado de estilos’. Para a British Colony, em sua coleção primavera-verão 2005, o jornalista Jackson Araújo festeja as diversas influências de Max. “Ele passa por galáxias desconhecidas, no caftan de shape futurista Dart Vader, cenários orientais, na estampa de onça com flores; e desembarca na praia-velha conhecida do estilista surfista – na brilhante bermuda páreo de surf - que nasce megahit do verão.” (SITE: ERIKA PALOMINO, 2004).
Fig. 12: Style surfing, 1996. No supermercado de estilos, os elementos que fazem o styling são de diversas influências, criando um estilo único e pessoal.
Fig. 13: Site: Erika Palomino, 2004. São as mais diversas inspirações que influenciam Max. Sua coleção primavera-verão 2005 para a British Colony é uma prova.
São nesses conceitos de luxo associados às diversas influências que comandam a moda do novo milênio, personalizando cada criador. Neste conceito nascerão McQueen e Icarius exploradores do corpo de forma contemporânea expondo, questionando os fundamentos básicos sociais sobre a beleza do final do século.
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Voltando a nossa linha do tempo: Cada vez mais, a moda como elo de comunicação da sociedade fala para populações maiores, fala por minorias até que as mesmas se tornem luxuosas, fala de política, de desejos, de aspirações sociais, de paixões, de luxo… enfim fala de tudo. São nos anos que estão por vir que os jovens criadores vão demonstrar seu verdadeiro talento, reivindicando a individualidade para cada caso. Surgirão inúmeras tendências expostas por inúmeros criadores. Mas ainda temos barreiras a romper para poder falar de deficiência física como um movimento de moda. Uma delas é a barreira do masculino-feminino (já questionada por Chanel e YSL) finalmente quebrada por Gaultier, o enfant terrible, desde sua primeira coleção em 77, ele reconstrói a roupa de mulher e a roupa de homem, defensor do homossexualismo e do feminismo faz com que o homem use saia e a mulher fume charuto. Utiliza pessoas reais em seus desfiles, independente da beleza, idade, ou se são gordos ou magros. Ele celebra a personalidade como estigma do belo. Celebra a identidade, a cultural, a etnia.
Fig. 14: Moda-século dos estilistas, 2000. O questionamento da beleza sempre esteve em pauta para Gaultier. Nesta coleção de 98 ele se inspira na artista mexicana Frida Kahlo.
Agora até as pessoas normais estão em evidência no mundo da moda, todos temos uma chance de aparecer, de possuir seus 5 minutos de fama segundo Andy Warhol, o rei do pop.
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As punks inglesas, ainda nos 70 desenvolveram uma imagem muito própria, uma nova estética e uma linguagem sem inibições sem se intimidar pelas pressões sociais muito menos pelos códigos do vestuário. A butique Sex de Vivienne Westwood vendia artigos para essa tribo dos punks antes que o movimento tenha virado moda nas passarelas e penteados dos 80 por intermédio de outros criadores. Outro passo foi dado. Finalmente os movimentos sociais da massa, se manifestam através da moda, e da antimoda. O mundo politizado fala por todas as tribos. Fala sobre e para as deformações corporais. “Nos Estados Unidos, a boneca Barbie já teve uma versão deficiente física, que andava de cadeiras de rodas, comercializada nos 70.” (SITE: GUIA DOS CURIOSOS, 2004). É o movimento moda que vai falar por essa tribo integrante da sua sociedade atual, a moda das deformidades corporais fala porque se constitui na sociedade e constitui-se na sociedade porque se manifesta, faz parte dela. Nesta década que surgem em maior peso as confecções especializadas para determinado tipo de deficiências (serão analisadas no capítulo Os especialistas), em geral por questões de mobilidade. A busca pelo corpo perfeito, pela forma perfeita, pela riqueza e ostentação do poder dos anos 80 vai criar verdadeiros abismos entre as classes sociais. É considerada por muitos a década dos contrastes, pelo menos da intensificação dos mesmos. Os yuppies são vestidos para o sucesso. Os jovens negros também deixam sua marca na sociedade, com o lema Black Movement dos anos 60 atualizado para o Black Beautiful, unem-se ao recém conceito de marketing para a moda e fazem da marca Adidas um ícone do movimento, associado claro, a música do hip-hop, rap, e break dance. Jamais a moda esteve tão na moda, celebra a sociedade do espetáculo. A criação da roupa e das atividades ligadas a esta se tornam fenômenos sociais. Parece que antecipamos a virada do século.
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“Os anos 80 que começaram por volta de 1978 com a febre da música disco, terminarão em 1989 com festas do bicentenário da Revolução Francesa.” (BAUDOT, 2002:276). A partir da metade da década o espírito party começa a perder força. A Aids é anunciada, o acidente de Chernobyl, os buracos na camada de ozônio assustam o mundo. As pessoas deixam de se preocupar somente consigo mesmas e começam a popularização das causas ambientais, em prol dos animais em extinção e das pessoas famintas na África. A moda também vai sentir essa conscientizarão do mundo. Sem perder tempo e para seu tempo, afinal tudo anda rápido demais, as grandes lojas anunciam freneticamente suas novidades divulgadas pela imprensa, paralelamente aos ditames da moda da escolha, várias correntes alternativas do mundo subterrâneo vão mostrando sua cara. A falida alta costura recupera o fôlego, tendo clientes para tal, as releituras de sucesso são cada vez mais realizadas por jovens criadores que começam a encabeçar a direção dos artigos de luxo. Os criadores cult, os japoneses da capital francesa ganham terreno entre os intelectuais com suas propostas culturalmente diferenciadas. Mal os franceses aprendem chegam os antuérpios em Londres, Ann Demeulemeester, Dris van Noten, Martin Margiela, Josephus Thimister, Dirk Bikkembergs e Walter von Beirendonck. O próprio Margiela declarou: somos filhos dos japoneses, impondo a seguir sua estética do ‘inacabado’ estabelecida nos 90. “Além de influências compartilhadas, de tendências observadas aqui e ali que se entregam a uma corrida de velocidade, existe o fato de que cada percurso, cada perfil, cada produto, possui, nesses anos, seu próprio perfil.” (BAUDOT, 2002:308). Estamos a caminho da individualização industrial, seguida e solicitada pela individualização pessoal.
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O movimento moda está completamente popularizado, saiu das passarelas da alta costura, se inspirou nos ricos, nos pobres, nos negros, nos gordos e nos magros, junto com a música defendeu causas sociais e ambientais, espalhou-se pelo mundo através da TV e do cinema, depois pela internet, se globalizou
pelo
mundo
unindo
ingleses, italianos,
japoneses,
franceses,
americanos e antuérpios. O preconceito acabou! Há espaço para tudo e todos. Você só precisa estar presente na hora certa, no lugar certo defendendo a causa certa para fazer sucesso. Uma maré de informações é o alimento diário do espírito, graças à globalização, as pessoas estão acostumadas com escândalos políticos, ambientais, violência no noticiário etc. Algumas campanhas, como a Diesel manifestam-se de forma polêmica: “All Diesel Jeans have been tested on animals” – Todos os jeans Diesel foram testados em animais. Demonstram que podemos falar sobre todos os assuntos. Não podemos nos esquecer da recessão que cada vez mais vai nos assombrar:
Fig. 15: Fashion at the edge, 2003. A campanha da Diesel de 2001 questiona o envelhecimento na sociedade ocidental. Uma das filosofias da marca é trazer para a moda os valores sociais contemporâneos.
Fig. 16: Extreme, 2003. Vestido de Helmult Lang para o outono-inverno de 96 mostra sua versão mininal da cintura do kimono.
Crise econômica, desemprego e diminuição no consumo são características da década assim como no final do século passado. A linguagem da
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moda compreende e lança os basics, as roupas utilitárias minimalistas tornam-se chique pelo ‘less is more’ – menos é mais, nos meados dos 90. O luxo vai encontrar seu lugar nos tecidos naturais, no corte impecável, no design. Helmult Lang é o embaixador da tendência minimalista. “Be yourself” – Seja você mesmo, será o novo slogan. Inicia-se, mais uma vez uma busca pelo sentido de vestir, preocupados com a preservação da natureza, com a funcionalidade das vestes, com a praticidade do ágil mundo moderno. A moda volta-se para a interiorização, pela busca do individuo, pela personificação do ser. Miuccia, uma socióloga herdeira do império Prada personifica esse estado da mente em suas coleções feitas para mulheres pensantes. Os americanos são cool, com suas investidas de marketing Calvin Klein, Donna Karan e Ralph Lauren são procurados oferecendo uma imagem intemporal. Os italianos são considerados demasiado clássicos, os londrinos demasiados loucos, e os franceses fantasiados demais. O que você gostaria de ser? Qual personagem quer representar, serão as próximas questões respondidas pela moda no final dos anos 90. Seja quem você quizer! O luxo ostensivo, pelo menos nos primeiros anos, não é tido nos anos 90 como politically corret, mas paradoxalmente, as marcas de artigos de luxo têm cada vez mais procura. O luxo torna-se democrático. No final da década, aprecia-se o luxo, pela etiqueta, por ser distinto, criativo e prático. Graças as grandes estratégias de marketing, casas como Prada e Gucci, esta sob a direção do americano Tom Ford, vão ressurgir das tradicionais peças de couro consumidas por artistas do cinema dos fifities para assumir a cena dos 90. Junto com essas marcas, Louis Vuitton e Fendi lançam a era da logomarca valorizando-as no mercado de luxo cada vez mais cobiçado. A universalização do visual cresce vertiginosamente, a era da imagem, se aproxima, porém busca-se um sentido para todas essas imagens que
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vagam pelo planeta, literalmente. A importância da imagem é enorme, estamos na era da imagem. O que você veste reflete quem você é no exterior e no interior.
Fig. 17 e 18: Fashion Algebra, 1998. A logomania invade a estação nos anos 90, segundo Anna Piaggi colaboradora da Vogue Itália. Identificar um artigo de luxo por sua marca, seu logo ou sua assinatura é simplesmente um luxo.
Esse fato nos proporciona uma brincadeira: de quem você quer ser hoje, depende do ser individual e da tribo em que este está inserido, ou da qual vai participar naquele momento, de quem quer ser, de sua individualização, daquilo que tem pra expressar, de como pretende agir. Essa é a nova busca do início do milênio. Este é o novo conceito de luxo: um luxo social e não mais simplesmente aquisitivo, é a liberdade de poder vagar pelas ruas sendo e vestindo o que quiser, de poder cavalgar por diversas tribos diferentes e conviver com todas que quiser, afinal nada mais é tão radical. É um supermercado de estilos que faz do indivíduo quem ele quer ser, como se o mesmo pegasse todas suas influências culturais, pessoais, colocasse no carrinho, misturasse tudo e aí se vestisse, com o cabelo e com a atitude que quiser representar. A liberdade é luxuosa. Mas não se iluda, o julgamento continua existindo. Faz parte do ser humano social. Faz parte da tribo que o mesmo integra.
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Mas, o que o luxo tem a ver com os corpos transformados e a linguagem da moda? Simplesmente porque o futuro será luxuoso e fantasioso! Assessorado pela tecnologia, pelos estudos ergonômicos, pelos novos tecidos que permitem transpiração (são termoactivos resistentes e confortáveis). Os materiais high-tech vão ao encontro do desejo de proteção e da liberdade individual.
Fig. 19: Max Factor’s hollywood, 1995. O futurista calibrador de beleza, uma criação de 32 era capaz de medir a beleza da face para poder determinar com perfeição as correções da maquiagem. Foi o percussor dos programas computadorizados dos atuais cirurgiões plásticos que medem a simetria da face do cliente..
Fig. 20: Pages from the glossies, 1998. O editorial da Vogue americana de 95, chamado Machine Age fotografado por Newton enfatiza a beleza do corpo saudável por meio da ginástica em aparelhos ultratecnológicos. O traje metálico de Mugler cria uma harmonia perfeita entre moda, saúde e biomecânica. Cuidar do seu corpo é fundamental, afirma a revista. Usar da ciência para tal, é um luxo! A transformação da musculatura corporal pelo movimento, e da veste futuristamecânica de Mugler estão associados às inovações tecnológicas.
Quanto maior e mais rápida a renovação das tendências de moda, tanto maior o número de soluções apresentados por ela, associados à ciência desde um pó ou um batom com fator solar, passando por intervenções cirúrgicas, como lipoaspiração, botox, implantes de silicone chegando a próteses e até mesmo implantes de membros, transformando nossos corpos. A imagem é cada vez mais importante, as necessidades do vestuário com características pessoais são cada vez mais transparentes.
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Essa liberdade é a essência do novo milênio, a individualização é o luxo da vida aqui e agora, é o reflexo da moda ocidental. Gloria
Coelho,
uma
brasileira
apaixonada
por
histórias
medievais, por heroínas, personagens bíblicos, gladiadores, arte, cinema incluindo Harry Potter. Mistura suas fantasias lúdicas as cibernéticas ainda com um toque de esporte e de luxo a cada estação. Suas peças já foram cortadas a lazer, já possuíram botões magnéticos. Ela sempre investe na tecnologia inovadora para sua confecção. “Por mais que se deixe levar por inspirações etéreas, Gloria aprendeu logo a conviver com o lado comercial da profissão.” (BORGES, 2002:374). A coleção que está na loja é o resultado da mistura da criação com um pouco de comércio afirma a própria Gloria para a revista Vogue Brasil. Jefferson Kulig é um estilista brasileiro, um pesquisador que faz do seu trabalho um intercambio entre arte e tecnologia. Com seu estilo conceitual, suas coleções apresentadas de forma geométrica, ora inspiradas na matemática ora na química, física ou na biomecânica sempre associando moda e ciência.
Fig. 21: Fashion at the edge, 2003. Neste vestidocadeira, desenvolvido em resina para a coleção de verão de 99 de Chalayan, você pode carregar sua cadeira e sentar onde o seu corpo te levar. Além do material utilizado não ser usual na vestimenta. Seu conceito é ainda muito mais vanguardista.
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Fig. 22: Erika Palomino, 2004. Primaveraverão 2004 de Jefferson Kulig, um modelo conceitual e individualizado baseado na tecnologia. Confeccionado em neoprene e cortado a lazer, o vestido-tiras foi baseado na matemática.
Hussein Chalayan é outro criador que explora o natural, a cultura e a tecnologia, oferecendo formas inusitadas associadas a cadeiras, mesas ou novos elementos. Trabalha com fibras de vidro, metal e resina. Suas coleções de 99 e 2000 oferecem um monumento de idéias. Ele traz para o vestuário a idéia do mobiliário. Com um olhar futurista será um dos maiores questionadores da forma na veste, da funcionalidade pratica e conceitual da mesma e ainda do corpo humano e suas funções motoras. É considerado um dos criadores mais vanguardista do final do milênio. Ora inspirados no corpo, ora na forma, no tecido ou na personalidade de um ser humano, numa pintura, num artista, numa música, num elemento ou simplesmente num desejo ou na união de todos esses anseios que os criadores a partir dos anos 70 vão se fazer comunicar de tal forma que a moda vai entrar na moda, por volta de 85. O movimento moda vai adquirir tal liberdade de expressão, que uma crescente individualidade no trabalho de cada criador será cada vez mais respeitada. É nesse ambiente da busca do individualismo, do inusitado que surgiram grandes nomes na criação de moda pela forma ou pelo corpo. Muitas vezes causando polêmica. Pela forma ou pelo tecido, em geral os japoneses como Rei Kawakubo imperam desde os anos 80. Pelo corpo deformado, somente no final dos anos 90 que Alexander McQueen e Icarius abordam temas, como a falta de membros e o câncer de mama. Esses estilistas trabalham em diversas causas a exploração do corpo humano, sem preconceito falam de realidades presentes no mundo contemporâneo, falam simplesmente por fazer parte da história individual de cada ser, por fazer parte de seus cotidianos, pela necessidade de explorar suas criações: as mutações corporais do ser. Libertos do preconceito esses criadores vão manipular o corpo modificado pelo fato desses corpos integrarem a vida desses criadores, como qualquer outro elemento podia inspirá-los.
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O CORPO O corpo humano é analisado pelas diversas culturas desde que estas tomaram conhecimento do mesmo. A princípio com os avanços tecnológicos do mundo ocidental, e hoje, do mundo globalizado, o corpo pode ser construído e reconstruído por cientistas e engenheiros. A vida pode ser prolongada, transplantes de órgãos são executados com freqüência, a clonagem, as pesquisas com célula tronco (e suas controvérsias), as próteses e até mesmo algumas máquinas podem ser inseridas no corpo humano. Nossos corpos são modificados com freqüência. Segundo EWING (2000) em The Body a ciência colocou o corpo, ou melhor, as possibilidades de sua transformação num patamar altíssimo, desde os anos 70 com a descoberta do DNA, despertando um interesse cada vez maior em artistas e escritores pelo mundo na exploração do corpo. São infinitas as reconstruções feitas pela arte, inclusive pela moda no corpo ‘vestido’ de significado.
Fig. 23: The body, 2000. O corpo transformado na Distortion n. 141 por André Kertész em 1933 através dos efeitos fotográficos. A arte já alterava as proporções corporais no início do séc. XX.
Fig. 24: The body, 2000. Man Ray deslumbrado com a fotografia fazia experimentos com a proporção do corpo ainda na década de 30.
Através da moda com ou sem ajuda da ciência o corpo humano vem se transformando e sendo revisitado na busca dos padrões de beleza atuais
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de cada época, em cada cultura. Os ocidentais, inclusive os brasileiros modificam seu corpo radicalmente pelo culto da beleza por processos muita vezes dolorosos. Essas transformações do corpo, conseqüentemente da imagem do ser humano são exploradas pelos Reality Shows pelo mundo todo, são inúmeros os casos de transformação nos mais diversos programas, garantindo uma audiência cada vez maior. Somente no canal pago People and Arts, sua casa pode ser redecorada pelo programa Minha casa sua casa, ou por Enquanto você não vem; a estética pessoal por outros programas de grande sucesso, o Antes e Depois ou ainda pelo Esquadrão da Moda, sob o comando de Susannah e Trinny as pessoas selecionadas (homens e mulheres) são instruídos em como devem se vestir, cortar o cabelo, se maquiar, cuidar da pele etc. Recebem uma verba equivalente a US$ 3000,00 para as novas compras realizadas em 2 dias, sempre orientadas pelas stylists. As pessoas selecionadas retornam para suas casas com um guarda-roupa novo, com um novo estilo apropriado para a rotina de cada um. O mesmo canal apresenta também outro reality show chamado Fashion House onde os competidores, estudantes de moda europeus, moram, trabalham, convivem uns com os outros. Durante cada programa um competidor é eliminado até sobrar o vencedor que ganha o direito de fazer um estágio com Stella McCartner na Maison Gucci. Os reality shows permitem que qualquer ser seja uma celebridade, mostrando seu talento, espírito competitivo ou o assunto em pauta: o corpo e sua transformação, através desses programas qualquer ser comum pode participar. De forma mais radical, Extreme Makeover, outro reality show apresentado pela Sony no ano de 2004 no Brasil, foi um dos programas de maior audiência. As transformações envolvem processos cirúrgicos, muitas vezes radicais carregados de relatos em saudação da saúde, sem contar as pressões psicológicas dos candidatos que passam de 6 a 8 semanas fazendo suas transformações. Essas mudanças corporais na busca da beleza, nem sempre da perfeição não é novidade, elas são encorajadas pela sociedade há muito tempo.
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Fig. 25: Fashion Images 1, 1996. As cicatrizes inseridas artificialmente por Mondino sugerem uma mudança nos critérios de beleza. Uma top model pode ser transformada no computador. Qualquer imagem é possível com tais recursos.
Fig. 26: Work, 2000. O uso de aparelhos ortopédicos na fotografia sempre sofisticada de Newton demonstra sua fascinação pelo corpo feminino e um fetiche pelas próteses modeladoras da forma. Sem duvida um questionamento moral sugerido por ele.
Existem relatos que os hindus em 4000 a.C. já praticavam cirurgias reparadoras. Os egípcios, em 2000 a.C. realizavam reconstruções de nariz por questões religiosas, ou mutilações. Apenas no séc. XIX que a especialidade passou a ser reconhecida como importante ramo da Cirurgia. Desde 1886, praticava-se o descascamento (ancestral de peeling) retirando as camadas superiores da epiderme, com o objetivo de eliminar cicatrizes. Vários atores e atrizes freqüentavam regularmente os consultórios de descascamento. Outra técnica aplicada consistia em injetar parafina para inchar as bochechas e as pálpebras. O grande salto foi dado durante a Primeira Grande Guerra, quando a cirurgia reparadora pode ser exercitada em soldados feridos no front, levando posteriormente um número maior de mulheres a retificar um nariz ou eliminar rugas. Inspirados em culturas étnicas ou mesmo na história da moda ocidental as transformações do corpo também se dão no âmbito da veste gerando uma ilusão do mesmo. A indumentária pode modificar a proporção corporal de
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forma radical com a precisão de uma incisão cirúrgica, vide o programa da People and Arts de Susannah e Trinny. A chamada geração 2000, por EVANS (2003) em Fashion at the Edge é perita em transformar completamente o corpo pela veste. São especialistas da forma, estudiosos da textura, apaixonados pela tecnologia, pela historia pelo futuro e pelo corpo humano. Interpretam perfeitamente o movimento moda na sua contemporaneidade.
Fig. 27: Extreme, 2003. Hussein Chalayan primavera-verão 2000; Victor and Rolf, 1994; Vandervorst, 1998. São criadores especialistas na transformação corporal. Fascinados pela proporção pertencem a geração de estilistas conceituais que criam através da veste uma ilusão do corpo.
Todos os grandes nomes da moda atual são transformistas da plasticidade corpo/veste. Nomes como Alexander McQueen, Chalayan, Galliano, Gaultier, são os ‘jovens’ na idade. Miyake, Yohji, Kawakubo, Westowood os primeiros a inovar na proporção, continuam ‘jovens’, ou seja, contemporâneos e atuais. Os brasileiros, Herchcovitch, Renato Loureiro, Gloria Coelho, Reinaldo Lourenço, Huis Clos e muitos outros são considerados pela mídia especializada o futuro da moda.
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O corpo nu
É o corpo que nos personifica e nos torna presente no mundo. As fronteiras do homem são traçadas pela própria carne, pelo seu limite físico. O corpo é o responsável por conectar o ser com o mundo. É um suporte sensível para o sistema de comunicação do ser, transformando – o constantemente para querer significar. A maturação do indivíduo incorpora várias correções de posturas anatômicas, onde cada cultura tem o seu ritual – fabricam o próprio corpo (fazem dele uma imagem concreta, do seu ser imaginário). Mesmo quando este está nu está cheio de significado. O corpo nunca se apresenta ‘simplesmente nu’, a própria pele como primeiro revestimento do corpo, atribui um reconhecimento social inserido naquela cultura.
Fig. 28: The body, 2000. O nu sendo explorado como forma de linguagem. Fig. 29: Body land, 1998. Aqui o corpo nu incorpora-se a paisagem. Fig. 30: The Atlanta dream, 1996. Os atletas olímpicos australianos, formas de corpos aperfeiçoados pela ciência e ainda desejados pelo mundo se apresentam nus celebrando o esporte e a plástica corporal.
Sendo o corpo o primeiro elo de transformação sobre a natureza e a cultura, o primeiro ‘movimento de comunicação do indivíduo social’, ele é carregado de significado podendo de várias maneiras fabricar ou reconstruir o próprio corpo, e assim transmitir diferentes sinais.
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Mutilações, cirurgias plásticas, pinturas, adornos, vestimentas, e até mesmo a expressão corporal são interpretações sobre o corpo transformado como meio de comunicação com o objetivo de fazer parte de um determinado grupo, de pertencer a tal sociedade. Essas modificações radicais ou não devem ser aprovadas pelo meio social ao qual o indivíduo pertence. A necessidade de diferenciar-se, individualizar-se, de atrair a atenção para si, e ao mesmo tempo fazer parte de um grupo, faz parte da ‘socialização’ dos seres humanos desde as mais primitivas civilizações. Onde está, então, o corpo transformado? Onde estão as modificações corporais plásticas que não compreendiam os padrões da estética ocidental?
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O corpo modificado
Todas as manifestações do corpo transformado, que não eram padrões de cada época, simplesmente não foram aceitas pela sociedade por séculos. São identificáveis 2 tipos de transformações corporais: Genética: aquela diversificação causada pelos genes dos seus antepassados. Com o avanço da medicina várias deficiências podem ser tratadas ou até mesmo melhoradas no pré ou pós parto.
Fig. 31: The Body, 2000. A moça cobrindo o seu rosto indica a ‘vergonha’ de ser identificada. A elefantíase era um dos problemas mais sérios e relativamente comum, explorado em grande escala no entretenimento popular por séculos.
Fig. 32: The body, 2000. A magreza excessiva também era uma modificação corporal conhecida no circo ou escondida do meio social. Hoje acreditasse que os distúrbios sejam genéticos. Ambas as fotos foram retratadas por médicos com a finalidade de estudar os casos.
Auto-inflingida: transformações que ocorrem por algum fator externo. Divididas em 2 grupos: o primeiro voluntário de cunho estético/social, portanto aceita pela tribo social do indivíduo (tatuagens, mutilações como reconhecimento de gangues, deformação dos membros de cunho cultural, implante de silicone,
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botox etc.), o segundo involuntário, causado por acidentes em geral (para ou tetraparalisia, amputações etc.).
Fig. 33: Mondino, 2003. A tatuagem como modificação voluntária corporal aceita e até mesmo encorajada pela moda e pela sociedade na dec. 90.
Fig. 34: Freaks,1999. O soldado ferido durante a Primeira Guerra, ganhava a vida fazendo a fumaça do cigarro sair pelo buraco de suas costas. Tornou-se uma atração no circo.
Desde a Idade Média, as relações da sociedade e a pessoa com deficiência (genética ou auto-inflingida) foram marcadas por práticas de eliminação física, eliminação social, piedade, intolerância, curiosidade e estudo. No
requisito
curiosidade
muitas
aberrações,
com
eram
conhecidos, eram apresentadas nos Circos Itinerantes (como conhecemos até hoje, claro que suas atrações mudaram) ou nos Museus da Moeda, onde o visitante podia ver as aberrações acompanhadas de um educador explicando a importância natural das coisas. Os Circos, um dos poucos meios de entretenimento popular há séculos, chegou ao seu ápice na metade do séc. XIX nos EUA com a rápida urbanização e a eletricidade nas cidades, gerou uma grande necessidade de lazer, nas poucas horas de descanso das classes operárias. A Teoria da Evolução de Darwin também contribuiu com a curiosidade nas aberrações. “As pessoas sentiam-se fascinadas, observando até onde a natureza podia ir na sua diversidade.” (ITO, 1999:14).
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Muitos
destes
artistas
ganharam
dinheiro
com
suas
apresentações percorrendo o EUA e toda a Europa, principalmente com o evento da fotografia, onde após o espetáculo o público podia comprar o postal da sua ‘monstruosidade preferida’. Essas fotos eram colocadas em álbuns junto com as personalidades favoritas da época.
Fig. 35: Freaks, 1999. Ela e sua irmã também deformada conseguiam sustentar sua família com suas apresentações no circo. A foto é de 1925.
Fig. 36. Freaks, 1999. Com 15 anos Myrtle Corbin também trabalhava no circo onde se casou e teve 5 filhos, 3 nasceram de um corpo e 2 de outro.
Muitas pessoas com deficiência mental ou física tinham (tem até hoje) uma vida sacrificada. Fora da vida circense eles estavam atrelados às dificuldades sociais e principalmente aos avanços científicos da época. Para trabalhar no circo você também tinha que ser uma grande ‘aberração’, a maioria dos artistas vinham de casos genéticos graves. Para os demais havia locais para confinar as pessoas consideradas indesejáveis: as instituições. Os deficientes em geral, aqueles que não estavam no circo, representavam um segmento social frequentemente excluído da participação social. VASH (1988) identifica 3 tendências para a explicação sobre a desvalorização da pessoa com deficiência:
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1. O ser humano instintivamente rejeita organismos danificados. 2. No plano psico-social, as diferenças marcantes são menos toleradas. 3. Plano político-econômico: o indivíduo não ser produtivo no aspecto econômico, prejudica a dinâmica de funcionamento das famílias, da comunidade ou da sociedade mais ampla. Segundo CORRER (2003): A concepção sobre deficiência variou, no decorrer desta história, da determinação metafísica para a orgânica, desta para a educacional e, mais especificamente na segunda metade do século XX ampliou-se para o âmbito das determinações sociais. SANTOS (1995) atribui o surgimento oficial dos primeiros indícios do movimento pela integração da pessoa deficiente, na Europa, como decorrente dos seguintes fatores: “As duas grandes guerras, onde ouve um aumento considerável de indivíduos que voltavam fisicamente debilitados ou deficientes, e as lacunas deixadas pelo grande número de pessoas mortas. Estes fatores promoveram programas de educação, saúde e treinamento que visavam integrar tais indivíduos na sociedade, preencherem as lacunas nas forças de trabalho europeu, originado pelas duas guerras. A Declaração Universal dos Direitos Humanos do Homem, proclamada pela ONU, em 1948, aponta em seu artigo 1: Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos e, dotados que são de razão e consciência, devem comportar-se fraternalmente uns com os outros... Se no pós-guerra a perspectiva de reintegração destes indivíduos se dava no sentido de ‘preencher lacunas’ ou num sentido paternalista, a partir dos anos 60, quando surgiram movimentos pelos direitos humanos,… a demanda relativa aos deficientes, a partir de então, se dá no sentido de integrá-los com base em seus direitos como seres humanos e indivíduos nascidos em dada sociedade”. (SANTOS,1995 apud: CORRER, 2003:27) É neste momento que surgem as primeiras confecções que estudam algumas deficiências, principalmente em relação à mobilidade ou a falta de membros. O avanço científico permitiu o desenvolvimento de pesquisas nas áreas sociológicas, médica, educacional e psicológica. Ser excepcional, ou seja, carregar algum tipo de deficiência não necessariamente deveria implicar em
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incapacidade. Os deficientes poderiam e deveriam ser produtivos para serem reconhecidos pela sociedade. Nos anos 90, vários pesquisadores de diversas áreas do conhecimento direcionaram seu foco para a qualidade de vida. HALPERN (1993) apud CORRER (2003) faz uma reflexão sobre os aspectos envolvidos na qualidade de vida reconhecendo a importância de serem criados recursos não paternalistas no plano das necessidades objetivas (alimentação, vestuário, moradia, saúde e educação), como no plano das necessidades subjetivas (satisfação pessoal, felicidade, filosofia de vida, lazer etc.) ao acesso de todos. Portando, só podemos começar a observar a relação do movimento moda mais deficiência física a partir do momento que o indivíduo portador de deficiência começa a fazer parte desta sociedade. Primeiro temos que compreender como esses indivíduos até então banidos puderam fazer parte da sociedade, através da história da moda ocidental. Depois de entendermos este passo em relação às minorias marginalizadas veremos que a princípio nos paises de primeiro mundo a veste traz conforto, e em alguns casos qualidade. A veste em si não possui um estilo próprio mesmo porque o conceito de estilo (da época) está restrito a alta sociedade e a alta costura, somente com a moda teeneger, a antimoda, os movimentos de rua, os yuppies, punks, e as mais diversas tribos relacionadas socialmente ao movimento moda que este espaço no estilo pode ser aberto. Só vamos poder falar de moda, com estilo para portadores de deficiências físicas a partir dos anos 90.
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O corpo faz a moda
A necessidade do homem de se comunicar numa sociedade, mesmo primitiva fez com que um dos primeiros meios de comunicação fosse seu próprio corpo. Várias manifestações corporais artísticas foram atribuídas como classificações sociais primitivas, símbolos de coragem, força ou até mesmo um ritual de passagem da vida infantil para a vida adulta. As mulheres indianas até os dias atuais ornam pés e mãos com arabescos feitos de hena, principalmente na noite que antecede seu casamento. As mulheres já casadas usam o titak, um ponto vermelho no meio da testa indicando sua marcha no caminho certo. O
ser
humano
desde
os
primórdios
tentou
modificar,
transformar seu próprio corpo, fazendo-se comunicar através dele. No Zaire, os crânios dos bebes são enrolados e pressionados para alongar o rosto, combinando com as tranças num exótico coque.
Fig. 38: Beleza do século, 2000. As cabeças alongadas por compressão desde a infância embelezam as mulheres desta tribo. A corte é extremamente refinada.
Fig. 37: Beleza do século, 2000. Escarificações como forma auto-infligida de transformação corporal marcam riqueza, beleza, coragem e pertencimento a tribo.
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As tribos pintam seus corpos, valorizam suas cicatrizes e em alguns casos chegaram a transformar seus corpos em prol da beleza cultural. As pinturas de corpo que inspiraram o body painting no Ocidente são tradições nas tribos africanas. Outra arte corporal comum praticada são as escarificações, um conjunto de cicatrizes feitas com cortes de faca, ou espinhos marca riqueza, beleza, identificação a uma determinada tribo, e acima de tudo coragem. As deformações africanas também são práticas essenciais para determinar a distinção social entre as tribos, assim como o titak indiano usado por mulheres casadas. “Os adeptos europeus do piercing não conseguem ser rivais das tribos Sara do Chade ou Surmas da Etiópia: desde a infância, as meninas têm seus lábios furados; a pequena peça de madeira que os transpassa, sucedem com o tempo em peças cada vez maiores até que cheguem à idade do casamento: os botoques ou bandejas deformaram então definitivamente sua boca… a tribo as vê embelezadas pelos botoques.” (FAUX, 2000:239). Muitas tribos indígenas brasileiras utilizam-se ainda hoje de várias técnicas em prol da beleza, desde piercing nos lábios (causando deformação permanente), como pinturas nos corpos até uma espécie de ataduras nos membros criando o efeito de corpos mais roliços inclusive em crianças, não chegam, porém a causar deformidades físicas concretas (a deformação de membros), apenas efeitos estéticos, com exceção dos grandes piercings. O corpo humano, principalmente o feminino sempre inspirou o movimento moda/beleza num contexto social. Observando a história, inclusive a história da moda ocidental, podemos colher vários momentos em que o corpo foi inspiração para a moda/cultura, e vice-versa, dentro do âmbito social. Os pés atrofiados (enrolados por faixas) das mulheres da aristocracia oriental mantiveram as chinesas dependentes até quase metade do séc. XX. A vitória dos comunistas de Mao em 1949 viu o fim dos pés atados, mutilações precoces que refreavam o desenvolvimento normal do crescimento a 37
fim que as mulheres conservassem pés pequenos, cânone da beleza imperial e símbolo de sua alienação.
Fig. 39: Extreme, 2003. Os pés enfaixados foram deformados até pouco tempo. A cultura oriental encorajava esta deformação aceita e valorizada como ícone de beleza.
Fig. 40: Extreme, 2003. As mulheres girafa de Burna através dos anéis colocados desde a infância é um dos mecanismos de alongamento do pescoço.
Fig. 41: Extreme, 2003. A moda se inspira na proporção da mulher girafa transformando o corpo através da veste na coleção de Galliano para Christian Dior Haute Couture de 97.
As famosas mulheres girafa, da Tailândia alongam seus pescoços também como atributos de beleza. Colocando-se gradualmente anéis de metal desde a infância, ao redor do pescoço chegando a medir 20 cm de altura e nunca mais podendo ser removidos, pois os músculos se tornam frágeis demais
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para sustentar a altura do mesmo. John Galliano para Christian Dior Haute Couture, em 1997, se inspirou em tais mulheres. No período conhecido como La Belle époque a cintura fina, apenas 42 cm era o centro das atenções para o corpo feminino. Numa época de grande ostentação e extravagância as mulheres usavam um espartilho feito de barbatana de baleia, proporcionando ao corpo uma postura em forma de S. Apesar dos protestos do movimento Traje Racional visando maior conforto, os espartilhos assumiram grande popularidade. Afirma LAVER (1989) em A Roupa e a Moda. Nos anos 20, enfim a paz! Década caracterizada pela audácia, a busca da embriaguez e a emancipação das mulheres, marcada pela magia da aviação, o Manifesto do Surrealismo, o estilo art déco e uma silhueta andrógina, os anos loucos finalmente liberaram o corpo feminino. “Os corpos mudam, os corações também.” (BAUBOT, 2002:62). Em 1929, um encontro de Nadia Payot e a bailarina Anna Pavlova, intrigada com a perfeição do corpo da bailarina, Nadia cria uma ginástica para rosto e corpo fazendo os músculos trabalharem em prol da juventude. Iniciada a largada para o culto do corpo, da saúde e da higiene, uma preocupação agora social. Inventora do corte em viés e dos drapeados, Madeleine Vionnet, considerada a arquiteta da moda, só é reconhecida tardamente. Seu amor pela geometria e aptidão para matemática, provavelmente fizeram seus cortes refinados baseados em triângulos ou quadrados revolucionassem o mundo da moda e transformasse o corpo feminino para os filmes hollywoodianos, com seus ombros nus e recortes sensuais. “Vionnet estudou, como um médico, o corpo feminino, de forma a conservar a beleza que lhe é própria… colocou costuras hábeis, para que o vestido seguisse a silhueta do corpo. Foi um pensamento revolucionário, já que, até então, era o contrário: o corpo tinha de se ajustar à moda do momento.” (SEELING, 2000:71).
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Foi a primeira a pensar no conforto do corpo e a desenvolver seus sensuais e elegantes vestidos considerando o movimento do mesmo.
Fig. 42 e 43: Fashion, 2002. No vestido preto Vionnet trabalhou a técnica do origami. No outro também de uma construção invejável, os detalhes das rosas e a paixão pelos japoneses e pelo corpo são suas grandes fascinações.
Madame Vionnet incompreendida no seu tempo, foi a pioneira da modelagem ergonômica. Uma revolucionária de sua época teve o segredo de seus vestidos desvendados décadas depois. O culto da saúde e da higiene entrou em alta no mundo devastado pela guerra, assim como alguns cuidados com o corpo. Instalou-se uma consciência, a princípio européia e depois com a ajuda do cinema difundida pelo mundo ocidental. A atitude em relação ao corpo humano, a preocupação com uma aparência saudável, são cada vez mais difundidas na sociedade ocidental. A beleza, sinônimo de saúde, era considerada dever nacional nos anos 40 pósguerra afirmam os historiadores da moda. Christian Dior, o criador do New Look, foi o primeiro a perceber que países diferentes, tinham cultura diferente, portanto corpos diferentes. Um gênio do marketing, perfeccionista ao extremo, um grande visionário decidiu internacionalizar seus negócios. Suas lojas em Nova York, Londres, Paris e 40
Caracas, deveriam produzir desenhos próprios, especiais de acordo com as necessidades do país e com a proporção do corpo de suas clientes. Ainda na Haute Couture, em 1944, Carmen abre a Maison Carven, direcionada a mulheres como elas, miúdas e rechonchudas. A altacostura ‘fala’ para as mulheres que nunca encontraram nos costureiros tradicionais um vestido que lhes assente bem. A inspiração no corpo humano diferenciado, as gordinhas não consideradas padrões de beleza da época, encontraram seu espaço muito discretamente através desta pequena maison. O senso prático e o bom gosto são marcas de madame Carven, cuja especialidade, durante muito tempo, foi os vestidos longos de interior.
Fig. 44: Site: Designer History, 2004. A maison Carven faz moda elegante para mulheres gordinhas. É a primeira manifestação da moda como linguagem que favorece uma beleza fora do padrão ideal.
Fig. 45: Fashion Images 3, 1998. A Vogue Inglesa publicou um editorial de moda sensual fotografado por Nick Knight para mulheres gordinhas.
Primeiro foram as classes sociais menos favorecidas (classe baixa) através de Dior, agora os corpos menos favorecidos, as rechonchudas, ainda que apenas para alta-sociedade privilegiada. Será que chegaremos aos corpos transformados (deficientes físicos) até então totalmente discriminados pela sociedade? Ainda estamos longe! Sonia Rykiel, a rainha da malha, assim considerada pelos americanos, a partir de 62, começou a vender roupas confortáveis para mulheres
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grávidas (mais uma nicho do mercado carente) na loja de seu marido. Tendo seu próprio corpo como inspiração, suas roupas fizeram tanto sucesso que mesmo depois da gravidez Rykiel foi reconhecida internacionalmente por sua moda que se adaptava aos tempos livres, não no sentido americano do sportwear, mas ao estilo francês que convida uma ociosidade elegante. Os movimentos considerados marginais dos anos 60/70 influenciavam novas imagens de beleza e dariam nascimento à moda étnica, a body art, a pop art, e ao flower power. A moda vinda da rua e a princípio discriminada foi se popularizando. Essas tendências ganharam uma força fenomenal na difusão mundial. O movimento da body art, uma manifestação pura da expressão do corpo como meio de comunicação. Sobre o corpo diversas formas de pinturas foram aplicadas vestindo-os de significados que em maioria traduziam o pedido de paz e interiorização do ser humano através das culturas orientais, principalmente a Indiana. O movimento perdeu a marginalidade e tornou-se moda, assim como as tatuagens nos 90.
Fig. 47: Style surfing, 1996. Releitura do body painting continua sendo associada à moda como forma de arte, expressão e individualização.
Fig. 46: Decades of beauty, 1998. O body painting dos anos 60 é uma manifestação cultural relacionada à moda através da ferramenta corporal.
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Fig. 48: Freaks, 1999. Uma doença de pele tornou famoso Hiki, o homem escamas de forma involuntária, suas marcas na pele associadas à tatuagem voluntária são processos de individualização do ser. O primeiro foi banido, o segundo encorajado.
Fig. 49: Visionaire 7, 2000. Na capa de uma das publicações mais importantes do meio. A tatuagem que um dia foi marginalizada, hoje é aceita pela sociedade graças à divulgação na moda de luxo. Aqui Marina Dias, uma brasileira está usando Chanel.
“Cultive seu corpo”, era o slogan de Yves Saint Laurent, nos 70. Um movimento que incentivava as mulheres a embelezarem sua própria imagem abriu caminho para a individualização. A silhueta jovem e cheia de energia era marcada por um “estado de espírito”, e não simplesmente por uma forma plástica. “Pela primeira vez na evolução da beleza, homens e mulheres podiam escolher sua aparência segundo seu estilo de vida pessoal, e não somente as exigências da moda.” (FAUX, 2000:182). A beleza virou competição, e os anos 80 são marcados pelo ‘corpo perfeito’, e pelas sacerdotisas da aeróbica, como Jane Fonda. A ginástica, porém não era suficiente. Entra em ação o bisturi, e a cirurgia plástica cresceu no ano de 1988, 68% somente nos Estados Unidos. Popularizando o colágeno e o silicone. A cirurgia plástica se democratizou. As descobertas da ciência na busca de uma vida melhor crescem rapidamente. Próteses, transplantes de órgãos e posteriormente a biomecânica e biogenética vão modernizar as técnicas que prolongam a vida. Os criadores da moda conceitual, atentos a esse mundo da transformação estética
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vão utilizar no final do milênio ‘artifícios’, como o aparelho ilizarov, próteses de titânio e até mesmo de silicone em suas passarelas.
Fig. 50: Extreme, 2003. A prótese, uma extensão das pernas está em evidência no desfile da W< primavera-verão 98. A coleção chama-se Fetiche for Beauty. Fig. 51: Mondino, 2003. A escama de peixe transforma o ser humano num mutante. Os artifícios para modificação do corpo são celebrados pela moda atual. Fig. 52: Fashion Algebra, 1998. Nas gaiolas futuristas de Paco Rabanne, publicadas originalmente na Vogue italiana lembram trajes que prolongam o corpo de forma animal ou tecnológica. Estamos presos ou associados ao futuro questiona Piaggi. Estamos enjaulados nas nossas descobertas, ou a tecnologia nos auxiliara.
A Lycra tem grande influência, assim como a aeróbica na moda. Estilistas como Azzedine Alaïa, o rei do stretch dominando todas as fazes da construção da roupa usam materiais elásticos que mostram cada curva do corpo, marca a silhueta da mulher contemporânea. Versace, um criativo estilista mistura tudo no seu estilo neobarroco extravagante valoriza a sedução, a encenação erótica das passarelas para o cotidiano tanto nas coleções femininas como masculinas. Mugler, influenciado pelo futurismo e pela retro Hollywoody cria verdadeiras heroínas, super-mulheres que não tem medo de chamar a atenção para seus corpos. Tudo tem que ser simplesmente perfeito, a obsessão pela forma perfeita desses anos vai a princípio inibir e depois contribuir para que outras formas sejam utilizadas. Afinal como o movimento da moda é a essa altura 44
multicultural, vamos admirar corpos esculturalmente perfeitos, transforma-los através de dietas, exercícios e cirurgias plásticas na busca da perfeição. Por um lado a busca de corpos esculturalmente perfeitos, por outro a busca de novas proporções para moda, para vestir esses corpos outros criadores: os japoneses serão responsáveis por transformar as proporções corporais através da veste em formas jamais utilizadas até então. Giorgio Armani com seu design italiano vai acrescentar ainda a moda uma filosofia de vida: “Eu queria acabar com as roupas austeras, salvaguardando o aspecto ético, pensava em mulheres inteligentes e cosmopolitas com essas roupas. Gosto da moda que não se vê.” Discursa o próprio. Sua roupa tornou-se um símbolo de uma presença segura e informal no mundo dos negócios. Seus trajes combinavam perfeição, funcionalidade e qualidade. Com Gaultier, o movimento moda conhece as mais variadas formas do corpo humano, as belas, altas, magras, gordas e feias. “Ele encarna de fato a estética, as posturas, os desejos e as ambigüidades de toda uma juventude de inicio francesa e posteriormente internaciona.l” (BAUDOT, 2002:290). Estamos prestes a romper a barreira das proporções do corpo humano como objeto de comunicação. Os corpos já explorados das mais variáveis formas não se contem perante a si mesmo. A própria ciência já lhe proporcionou, e continua a criar tantas inovações na busca da perfeição que o perfeito se tornará muito chato, cansativo, pelo menos para a moda. Com a mudança comportamental da sociedade ocidental iniciada apenas na década de 60. A relação homem-corpo-comunicação, passou a ser vista por outro ângulo. A confusão pós-moderna dos 80/90 proveniente de modas e modelos do mundo inteiro alargou os nossos horizontes estéticos, concordam os estudiosos.
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A era das imperfeições e das esquisitices surge. Primeiro seremos radicas glorificando os considerados marginais: o heroin chic é uma grande tendência dos 90. O que pode chocar é considerado fashion. A comunicação é tão rápida que em pouco tempo as tendências consideradas underground fazem a cabeça das patricinhas. O corpo torna-se um novo campo de expressão, decorando a pele com tatuagens, a geração tecno 90 manda perfurar a língua e/ou nariz, o piercing antes subversivo torna-se cool para a nova geração de jovens que usam seu corpo em busca da individualização além da vestimenta, da cor dos cabelos ou da maquiagem. A atitude é fundamental!
Fig. 53 e 54: Fashion Images 3, 1998. Da autoria de David LaChapelle, o corpo não é apenas uma forma de expressão mas sim de como ele pode ser alterado, transformado. As publicações de moda intensificam essa mensagem na década de 90.
Todas essas deformações do corpo foram até então aprovadas pela sociedade. Outras foram banidas, como os pequenos pés orientais. Muitas são admiradas até hoje, pelo fato dessas distorções estarem inseridas no movimento social de cada cultura.
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Será necessário que mais uma vez que o conceito de beleza seja questionado para que essas transformações em conseqüência as deficiências físicas possam ser tratadas como elementos da exploração do corpo humano.
Fig. 55: Alexandre Herchcovitch, 2002. No especial de 98, ele e Mauricio Iânes criam vestes feitas de látex. Exploram a forma do corpo pela forma do material.
Fig. 56: Fashion, 2002. Miyake utiliza da body art em sua segunda pele optical recriando uma falsa ilusão do corpo tatuado. É uma combinação de elasticidade e decoração.
Fig. 57: Mondino, 2003. A individualização do ser é retratada pela moda literalmente escrevendo nele o que quer representar.
Fig. 58: Fashion National Geographic, 2001. A individualização é retratada e respeitada na diversidade social associado à moda.
Alexandre Herchcovitch é um estilista brasileiro questionador do corpo, da moral, da forma, dos costumes, do sexualismo e do fetiche. Enfim, de todo o cotidiano que o rodeia.
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“Desde o início da sua carreira pública, em 1993. Alexandre Herchcovitch contesta veementemente os parâmetros da moda, frustra os pressupostos do que seja beleza, escarnece da ética de consumo da indústria e explora com coragem questões de gênero e sexualidade. É aqui, em especial, que seu trabalho se entrecruza com as práticas de vários estilistas contemporâneos, para os quais o corpo, mas também as roupas e os acessórios servem de meio de investigações sobre as identidades do gênero feminino e masculino”. (DAWN para HERCHCOVITCH, 2002:109). Os questionamentos tornam-se mais e mais freqüentes. A atual campanha da Dove, de 2004, coloca no ar várias formas de beleza, considerando diversas raças, terceira idade, inclusive cicatrizes, tanto a beleza comum como a beleza ‘estranha’, a beleza de estar grávida e etc.
Fig. 59/60 e 61: Sensation, 1997. A exposição realizada em Londres, por diversos artistas interpreta pela arte o grande interesse no corpo humano visto de várias formas. A arte já está pronta para interpretar a deficiência, a transformação corporal.
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Algumas exposições questionam o culto da beleza, e se perguntam o que é belo. A importância do corpo, sua releitura na arte, na moda e na comunicação são discutidas. Sensation realizada em Londres (97), os artistas convidados falam sobre o corpo e seus tabus, retratando o lado ‘feio’ ou irônico da deformação corporal, da morte, sexualidade, ciência etc. Extreme Beauty – the body transformed em Nova York (2001) usa a moda atual, histórica e cultural para relacionar as transformações radicas do corpo pela veste; conta que o ideal de beleza varia culturalmente e modificasse pelo tempo. Retrata as transformações dos criadores mais controversos e suas manipulações do corpo nu no desejo torna-los ainda mais belos.
Fig. 62: Extreme, 2003. Alexander McQueen para o verão de 2001 absorve o rigor da forma na leveza das plumas.O corpo é completamente remodelado pelo traje.
Fig. 63: Extreme, 2003. Miyake no inverno de 89 inspira-se nas armaduras. Seu interesse pelo tecido e pela forma torna possível essa nova silhueta.
Diversos especialistas comprovam em documentários que passam na TV a importância da simetria corporal, teses defendidas nas universidades relatam sobre a personalidade e o charme a acima de tudo. Ser perfeito é aceitar suas imperfeições, é poder conviver com elas em paz, se não puder, transforme-as fazendo um lifting, uma lipoaspiração, uma dieta, uma cirurgia de córnea, uma transplante, um bronzeamento artificial, um botox, utilizando qualquer técnica que a medicina moderna puder oferecer. Os motivos
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estéticos, psicológicos e médicos (saúde) estão tão bem relacionados que só o próprio indivíduo pode responder por eles. A estética pertence ao ser, não mais a sociedade, esta o pressiona ao mesmo tempo em que tenta libertá-lo. O carisma ou marketing pessoal tornam-se ferramentas fundamentais da divulgação da beleza pessoal. Ser belo, ou melhor, ser aceito pela sociedade é uma questão de estilo, de personalidade não unicamente uma questão de aparência. Este é o novo milênio, com inicio no final da década de 90, claro. Com essa nova definição do corpo, do que é belo, finalmente as deformidades físicas podem compartilhar a sociedade.
Fig. 64: Decades of beauty, 1998. A campanha da Kenar com Linda Evangelista em prol do câncer de mama. As preocupações não se restringem ao exercício, mas também a saúde. Fig. 65: Naomi Campel, 2002. Fotografada no Brasil para a campanha câncer de mama na moda. Uma instituição mundial. Todas as personalidades participam de graça auxiliando na conscientização do corpo Fig. 66: The body, 2000. No capitulo Politic do livro, todo corpo tem um potencial político. Essa imagem originalmente publicada em Beauty of Damage (93) serve como um alerta saudável e também como uma exposição do corpo transformado sem preconceito.
São vários os elementos que fazem parte deste novo cenário despertando diversos movimentos na moda. A busca pela individualização, as preocupações sociais e/ou ecológicas, o envolvimento da plasticidade artística em si, a nova relação do ser com o corpo. Manifestados em campanhas beneficentes,
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em estudos ergonômicos ou simplesmente no catwalk, essas estéticas são exploradas como elementos importantes da moda como linguagem A inspiração são os corpos transformados, distorcidos, fora dos padrões de beleza tradicionais, porém inseridos na sociedade como parte dela e não mais discriminados. As campanhas de Câncer de Mama são famosas pelo mundo todo, onde varias celebridades utilizaram suas camisetas para arrecadar fundos, inclusive no Brasil. Diversas t-shirts diferentes, inclusive trabalhos mais artísticos foram apresentados mundo a fora arrecadando milhões. Na metade dos anos 90, um estilista brasileiro recém formado se inspira em sua própria mãe e lança uma coleção assumindo a deformidade causada pela amputação do seio. Icarius vira um hit fashion, seus trabalhos inicias sempre em conflito com a estética permitida e a proibida trabalham a cirurgia plástica, a doença de pele, o câncer, e a falta de membros.
Fig. 67 e 68: Vogue Coleções, 1999. Icarius reflete literalmente sobre a cirurgia plástica em seu desfile. Na primeira imagem, Ana Claudia usa um drapeado representando as deformações da pele. Na segunda, Daniela Raizel aparece na passarela com um aparelho ortodôntico de acrílico deformando sua boca. Um susto positivo, diz a revista. Fig. 69: Site: Erika Palomino, 2004. Nesta coleção de inverno 2004 ele utiliza da biomecânica para fazer moda. Luciana Curtis veste um vestido de camadas de neoprene recortados a lazer. Tecnologia e ciência fazem parte do repertório conceitual de Kulig.
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Jefferson Kulig, um outro criador brasileiro se interessa pela anatomia do corpo humano, suas funções e mecanismos para o aprimoramento da vida. Em 2004 lança sua coleção que sofreu forte influencia da biomecânica. “Criou a partir deste conceito, bases receptoras que expõem a estrutura muscular do corpo conectada a hastes metálicas – acessórios cinéticos, que além da sua função estética, funcionam como músculos artificiais, potencializando a atividade físico-motora.” (RELEASE JAN/04). Paralelamente,
muitos
sites
médicos
oficiais,
e
outros
recomendados até mesmo por pacientes dão dicas do que fazer para tornar suas vestes mais confortáveis quando expostos por uma deficiência, até mesmo que temporária. Os casos mais clássicos, ou até mais dramáticos, utilizado na mídia impressa da moda, em situações glamurosas é o uso de uma espécie de prótese externa, chamada ilizarov colocados para fixar ou alongar membros, muitas vezes estes aparelhos metálicos chocam seus usuários ou observadores.
Fig. 71: Ensaio, 2001. Fotografado por Debby Gram onde a modelo utiliza um aparelho real.
Fig. 70: Site: Ilizarov, 2004. O site mostra como o aparelho é utilizado ortopedicamente.
Em 97 (parece que este foi o ano de maior questionamento em relação às deformações físicas) a M.Officer colocou na passarela o modelo Ranimiro Lotufo, que após sofrer um acidente perdendo uma das pernas ele que
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já era modelo se viu obrigado a abandonar o mercado. Ao aparecer no desfile, Carlos Miele (diretor de criação da marca) ajudou na sua reintegração social. Ranimiro exibindo sua prótese também foi modelo da campanha publicitária desta estação. “AACD, e outras clínicas de reabilitação pediram pôsteres com a imagem do modelo exibindo a prótese, pois isto havia motivado a recuperação e auto-estima de muitas pessoas.” (SITE: M.OFFICER, 2004). Alexander McQueen um dos criadores mais controversos do ultimo século abre seu desfile de 97 com uma modelo e atleta para-olímpica. Usando suas próteses metálicas Aimme adentra na passarela de forma glamurosa causando grande repercussão da mídia. No ano seguinte um editorial com disable people coordenado por ele será publicado na revista Dazed & Confused. Aimme vestindo Adidas é a capa intitulada Fashion Able.
Fig.72: Fashion at the edge, 2003. A modelo portadora de deficiência utilizada na abertura do desfile de McQueen usa aqui um agasalho Adidas feito especialmente pra ela. Essa foto foi capa da Dazed & Confused em 98.
De forma elegante e criativa McQueen propõe a funcionalidade da veste e os corpos transformados questionando o corpo contemporâneo. Polemico, sim! Contraditório, não. Este criador que já brincava com todas as formas do corpo, simplesmente brincou com mais uma não para ser
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politicamente correto, mas sim, para poder observar mais um comportamento plástico, explorar mais uma forma, um corpo diferente, uma proporção atual, um outro desafio, sem preconceito. Apenas manifestar a arte da moda em toda sua plenitude. A sociedade contemporânea, finalmente, começou aceitar as modificações corporais fora dos padrões de beleza convencionais. Os estilistas se inspiraram nesses corpos transformados. O corpo e a moda rompem mais uma vez outra barreira social: o preconceito. Estes exemplos provam que a moda como linguagem pode motivar a recuperação social sem preconceito.
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A VESTE NO CORPO
A vestimenta sempre modificou, transformou e até mesmo iludiu o corpo humano. Através de proporções, cores, texturas etc. a história da moda brincou, e ainda se diverte, com corpo desde os primórdios. A roupa tem o poder de transformar silhuetas, como num jogo de sombra/luz, textura, cores, caimento, corte. O artista, neste caso o estilista possui a ferramenta que modifica a relação veste/corpo. Quase como num quadro, o estilista pode diverti-se e criar verdadeiras ilusões.
Fig. 73 e 75: Tierry Mugler, 1998. Na primeira figura, o ‘tailleur atitude’ criação de 97, todo articulado mostra o contorno do corpo feminino, sedução e mistério. Na da direita de inspiração em insetos enfatiza a mulher eternamente poderosa de Mugler. Não importa suas criações, seu estilo é inesquecível. Fig. 74: Fashion, 2002. A figura do meio de Yohji para o inverno de 96 demonstra a assimetria como característica de sua carreira. O vestido parece recriar o corpo. São propostas de vestes diferentes para estilo de vida e personalidades diferentes.
“No séc. XX, a moda significava, sobretudo uma maneira de ser, e por extensão, de vestir-se.” (BAUDOT, 2002:8). O movimento moda já não está ligado exclusivamente a indumentária, e sim ao comportamento. A Moda sendo uma forma de expressão desta sociedade, uma forma de manifestação deste comportamento se vê na
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obrigação de transformar o corpo pela veste, modificando suas proporções, conseqüentemente os requisitos de beleza. Observando a relação da moda com o corpo na sua história vamos notar as mais variadas ilusões criadas pela linha do tempo.
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A moda transforma o corpo
No período chamado de La Belle Époque, o corpo feminino tinha forma de S ou ampulheta, época de prosperidade da burguesia, as mulheres, principalmente ostentavam riqueza e feminilidade acentuadas pelas linhas do quadril e busto através dos espartilhos saudáveis. Acredita-se que as primeiras intervenções cirúrgicas em prol da estética pela moda tenham surgido nesta época, algumas mulheres chegariam a recorrer ao bisturi para deslocar ou mesmo tirar algumas costelas, a fim de apertar o espartilho a ponto de desmaiarem. Importante
ressaltar
a
popularidade
das
inumeráveis
e
inacreditáveis próteses tais como seios de borracha perfumados munidos de uma mola que lhes permitia palpitar, divulgadas nas revistas de beleza da moda.
Fig. 76: Moda – o século dos estilistas, 2000. As cinturas finas eram tão apreciadas no inicio do século passado que as mulheres se submetiam as cirurgias dolorosas para consegui-las. Fig. 77: Galliano, 1997. Para sua coleção de verão de 97. Ele se inspira na história reconstituindo magicamente os corselets e as proporções da Belle Epoque. Fig. 78: Moda - o século dos estilistas, 2000. A famosa foto de Horst demonstra a sensualidade de uma das peças mais interpretadas no vestuário feminino no ultimo século.
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Vários estilistas inspiraram-se nesta transformação do corpo através dos espartilhos ou corselets, desde McQueen para Givenchy em 97, como Gaultier, Chalayan e principalmente a consagrada rainha Vivienne Westowood responsável pela primeira releitura depois do New Look de Dior.
Fig. 80: Site: Erika Palomino, 2004. Na primavera-verão de 2005, Gloria repete o sucesso do corselet, agora inspirado em armaduras.
Fig. 79: Moda – século dos estilistas, 2000. Coleção de inverno 95/96, Vivienne recria mais uma vez o espartilho.
Em 93, Gloria Coelho lança sua coleção Napoleônica e com ela a releitura do corselet. Um sucesso absoluto da crítica especializada e do público ela manteve essa peça chave por diversos anos adaptando-a as suas novas inspirações. A necessidade de a roupa acompanhar o novo espírito de vida dos anos loucos faz com que a moda liberte o corpo para tal. Em 1910, o Balé Russo, e Paul Poiret são os responsáveis pela mudança radical na silhueta feminina, ele libertou a mulher do aprisionamento do espartilho, sugerindo uma nova proporção livre para acompanhar os acontecimentos da época. “A forma de um triângulo com a base para cima era a nova silhueta dos anos loucos.” (LAVER, 1989:225). Abandonado o espartilho, seus vestidos eram marcados pela ‘cintura’, logo abaixo do busto. O interesse pelo esporte, pela vida ao ar livre 58
lançou o que mais tarde seria conhecido como sportwear. Finalmente as mulheres podiam se movimentar sem desmaiar. A atitude muda. O mundo muda. A moda muda. O corpo muda É preciso surpreender para seduzir. Renovar-se para vender. A moda do mundo de ontem só muda porque tem de manter-se a par de um sistema que ela vigora, ela faz parte das importantes regras sociais. Mais tarde o vestido tipo saco até a barriga das pernas, apertado nos quadris com um cinto ou uma faixa impôs-se. No fim desta década, as cinturas voltaram aos seus lugares naturais, e as saias aumentaram de comprimento. A moda pela primeira vez na história muda a proporção do corpo na mesma década criando uma nova ilusão. A necessidade de mudança está começando a agilizar-se. Para compreendermos a relação da moda com o corpo conseqüentemente com a roupa é necessário entender que a partir deste momento (o rompimento se dá com os anos loucos) a história da moda não mais se restringe à história da veste. A moda já completamente entrelaçada com a atitude do ser humano social aprende com Mademoisele Chanel uma grande lição: gostar de si mesma antes de seduzir seus sócios capitalistas. Coco, assim conhecida carinhosamente, inventa uma maneira de ser, suas criações nascem em função de suas próprias necessidades. “A obra de Chanel é sua vida em forma de roupa cheia de contradições. Ela fundia o feminino e o masculino, o charme e a força, a simplicidade e o luxo, o domínio e a submissão que agrada a mulher moderna. Seu objetivo era libertar as mulheres dos espartilhos mentais, de certa preguiça mental, que as mantinha na dependência dos homens.” (SEELING, 2000:99). Com Chanel a moda assumiu o que mais tarde chamaremos de lifestyle. As necessidades sociais, suas próprias necessidades fizerem da veste uma ferramenta que essa grande mulher tinha em suas mãos não mudasse apenas o corpo feminino como alterasse sua mobilidade, no sentido concreto e figurado. A primeira razão de ser da moda é servir a pessoa que a usa, afirmava.
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Fig. 81/82 e 83: Moda-século dos estilistas, 2000. Na primeira, Chanel na dec. 30 usando calças, um dos seus trajes preferidos. Na segunda, o imortal tailleur, uma criação sua nos anos 60 acompanhada de todos os detalhes clássicos: a camélia, a bijoux e a sapatilha. Na terceira, aos 50 anos de idade Chanel era mais bonita, deixou-se fotografar a vontade, promovendo sua publicidade pessoal. Esta imagem é de Man Ray onde ela usa seus eternos companheiros: a bijuteria, o cigarro e a elegância.
Os anos 30 pediram sensualidade e luxo, orientada pelas estrelas do cinema americano, a silhueta apresentava-se elegante e justa, os tecidos caíam suavemente e as costas eram desnudadas. As cinturas ‘frágeis’, foram novamente moldadas pelo espartilho feito agora de látex, exerciam uma pressão abaixo do peito, pois esse era levantado. A liberdade de movimentos era importante, as mulheres trabalhavam e dançavam ao som do swing. Desde 1934, a moda de dia era mais severa, os ombros se alargaram e quatro anos depois tinham volumosos chumaços. A moda parecia ter previsto a catástrofe da Segunda Guerra Mundial, parecia ter pressentido tamanha indagação. No final da década, a roupa tinha quase caráter de uniforme. Para a noite, os desejos de opulência e beleza eram sustentados por vestidos forrados e ornamentais, como sempre acontece em tempos difíceis. A forma do corpo e o movimento da moda mais uma vez tornam-se um reflexo da situação sociopolítico-econômica, agora em escala mundial. Com a Europa em Guerra, a América do outro lado do oceano tinha um meio de comunicação já admirado pelo mundo desde sua invenção: o
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cinema. Os figurinistas percebem sua importância em escala mundial, e criam verdadeiras obras de arte para as estrelas junto com os maquiadores profissionais. Adrian, um mestre na arte do vestir do cinema havia reconhecido algo ousado: podem-se esconder desvantagens físicas através das roupas – mas também é possível acentua-las e transforma-las numa força pessoal, até talvez numa nova moda. A relação corpo/ veste / moda, nunca mais será a mesma. Edith Head, com 35 nomeações para o Oscar, das quais recebeu 8, fez 11 filmes com Alfred Hitchcock, pois este só confiava nela quando se tratava de esconder os abismos secretos das suas gélidas loiras de trajes burgueses, relata a História do Cinema.
Fig. 84: Magnum cinema, 1994. Edith Head, a figurinista prepara Rita Hayworth.
Em 1943, Howard Hughes desenha um sutiã de bojos pontudos para a atriz Jane Russel, desencarrilhando em Hollywood o protótipo das pin-ups, preparando terreno para Dior, onde nada existia usavam-se acolchoados. A moda dos sutiãs pontudos agressivos modifica sutilmente o corpo feminino para os anos que estão por vir. As curvas do corpo estavam na moda graças ao filme Outlaw e seu figurino surpreendente. Cristóbal Balenciaga considerava a moda uma arte. “Um costureiro tem de ser um arquiteto para o corte, um escultor para a forma, um
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pintor para as cores, um músico para a harmonia e um filósofo para o estilo”, argumentava. Criou vestidos de balão, vestidos-túnica, em forma de saco e camiseiro, trabalhava com tecidos rígidos, que se adaptavam perfeitamente a silhueta feminina. Ele foi um dos criadores de moda que sobreviveu durante a Guerra. Entretanto seu talento só foi verdadeiramente conhecido após a libertação. Pesquisando incansavelmente a harmonia perfeita entre silhueta, proporções e postura, o arquiteto da moda chegou a arrancar um elogio de Dior: “Ele é o mestre de todos nós”.
Fig. 85 e 87: Fashion, 2002. Em 1955, após ter criado o vestido-túnica, Balenciaga tornou o corpo mais abstrato. O casado da figura a esquerda foi feito com o mínimo de cortes possíveis. Na figura da direita, o vestido de gaze na forma de um trapézio e suas variações ficaram conhecidas como bady-doll. Fig. 86: Moda-século dos estilistas, 2000. O famoso vestido escultural cor-de-rosa de 65 é suficientemente discreto para não eclipsar a personalidade da usuária. No pós-guerra ele compreendia que a riqueza merecia discrição.
Christian Dior consagra as curvas e celebra o corpo feminino, a sensualidade e a vida no pós - guerra, com seu New Look, lançado em 1947, ele agarrou e espírito da época que não estava limitado a um só país ou a uma só classe social. A classe média começa a se destacar no consumo de moda, ainda dominado pela alta-costura, mas com uma presença forte no prêt-à-porter. “A forma de ampulheta do new look encontrava-se na arquitetura, na decoração de interiores e em artigos de consumo. Mesas em forma de rim, poltronas em forma de concha, copos em forma de tulipa,
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lâmpadas em forma de cartucho, jarras talhadas e cinzeiros de vidro – tudo refletia as linhas esculturais do new look.” (SEELING 2000:236). Ele apresentou 22 linhas diferentes, nos 11 anos que durou seu reinado na alta costura. Deu ao corpo feminino a forma ora de um 8, ora de um H, de um A, ou de um Y, até escondê-lo num vestido saco. As mulheres seguiam suas idéias, não só suas clientes, mas todas as mulheres graças ao sistema de venda de licenças, introduzido nos anos 30, permitindo fazer as cópias, as mulheres da classe média podiam acompanhar as tendências do prêt-à-porter de luxo e comprar um vestido copiado por 80 dólares, em vez dos 950 originais. Assim Dior popularizou a moda, transformando através da veste o corpo de milhares de mulheres no mundo inteiro.
Fig. 88: Moda-século dos estilistas, 2000. A criatividade de Dior combinava com sua grande fascinação pela novidade. Para manter vivo o interesse pela moda, ele introduziu o dobro das linhas. São seus parâmetros que seguimos até hoje.
Os anos 60 chegaram, considerada por alguns um década sombria que provocou o desmoronamento da moral, da autoridade e da disciplina, por outros o tempo áureo da liberdade. Foi a década mais importante do século XX, tudo que originou mudanças nesses tempos teve conseqüências sociais, políticas e culturais até os nossos dias, afirmam os sociólogos. Para SEELING
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(2000) era a mesquinhez da burguesia, com suas regras de decoro e etiqueta, que provocaram a oposição dos jovens, sua rebeldia. Nomes como Courrèges, Cardin e Paco Rabanne rompem radicalmente com o passado vão defender a vanguarda da alta-costura francesa assim como o prêt-à-porter, idolatrados pelos jovens e pela mídia vão modernizar a moda. Utilizam durante suas carreiras materiais como o plástico, acrílico e metal. Linhas geométricas e futuristas nas formas de vestidos, vêem o espaço como o futuro da moda, desenvolvem novas técnicas em seus laboratórios de costura como o vestido sem costura apenas colado criado por Cardin.
Fig. 89: Pages from the glossies, 1998. Para a Vogue francesa em 70, Helmut Newton mostra a coleção psicodélica de Courrèges. A moda vai retomar de tempos em tempos sua inspiração. Fig. 90: Fashion imagens 2, 1997. Para a D Magazine os anos 60 futuristas e Paco Rabbane são a inspirações no final do milênio. Fig. 91: Alexandre Herchcovitch, 2002. Em sua coleção primavera-verão 2002 está clara a releitura das formas futuristas de suas peças como a maneira de apresentar o catwalk.
Mary Quant esteve em harmonia total com sua época, foi a primeira a utilizar o PVC em casacos e botas, em 1960 difundiu a minissaia, em Londres. Sua moda refletia o espírito da década, desde o logotipo negro da flor pop, como acessórios de lingerie e make-up, tudo para os jovens. Ela e seu cabeleireiro Vidal Sasoon, com o desejo de copiar o penteado dos Beatles, introduziram o cabelo curto feminino, alongando o pescoço que combinado com a maquiagem, causavam um aspecto quase infantil. Magras e atrevidas as lolitas reinaram com suas minissaias representadas por Twiggy e Penelope Tree. Os
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cabelos curtos invocavam a inocência no futuro, e os compridos a inocência da natureza na pele de Brigitt Bardot.
Fig. 92: New angles, 1999. Twiggy para revista Elle em agosto de 67. A modelo da inocência, da juventude.
Fig. 93: Decades of beauty, 1998. Jackie Kennedy em 61, conhecida como uma das mulheres mais elegantes do século.
Fig. 94: Decades of beauty, 1998. Ursula Andress para o filme 007 contra o Dr. No em 61. Um ícone de beleza feminino desejado por homens e mulheres na tela do cinema.
Fig. 95: Decades of beauty, 1998. Os jovens: Keller, Bailey, Tree e Faithfull com seu estilo de vida revolucionário responsáveis pelo desenvolvimento da musica, arte, moda e mídia dos anos 60.
Uma década marcada pelo futurismo e depois pela natureza selvagem, por diversas manifestações na música, oposições a sociedade burguesa atual só poderia reconhecer diversos padrões de beleza desde as ninfetas inglesas já mencionadas como a charmosa Jack Kennedy, implacável em 65
sua elegância como também a modelo Veruschka que chegou a desenvolver a pintura do corpo, até esta se tornar a arte pura em sua nova profissão ou James Joplin, um ícone hippie. Cada vez mais a moda está relacionada ao estilo vida, e não a veste. Com o fenômeno hippie muitas contestações inclusive do belo no útil e o útil para todos. A moda a muito não mais considerada apenas a veste, mas todo um conceito é eternizado pela antimoda de Yves Saint Laurent.
Fig. 96: Yves Saint Laurent, 1984. Coleção chamada African para 67.
Fig. 97: Forty Years of Creation, 1998. O traje safári é publicado pela Vogue Paris em 68.
Para Mugler, não importa se as mulheres normais podem ou gostam de vestir seus fatos. Ele cria para as estrelas e para grandes acontecimentos. Pouco lhe importa a estrutura do corpo, para ele, a mulher é como um fetiche, uma deusa ou uma heroína, sedutora e feminina. “Enquanto o Ocidente, com os conhecimentos da ciência da nutrição e da medicina desportiva, tenta formar o corpo como umas obras de arte, os japoneses, em Paris, desenvolvem novas proporções que alteram o corpo distanciando-o da realidade – assim transformam os seus vestidos em obras de arte.” (SEELING, 2000: 420). Kenzo, Miyake, Yamamoto e Kawakubo, revolucionaram a nossa concepção do corpo e do vestuário no final dos 70 e por toda a próxima década.
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Para os japoneses o corte do vestuário parte do tecido, diferente da maioria dos ocidentais que partem do corpo. Paradoxalmente enquanto os ocidentais se matavam nas aulas de aeróbica e com dietas malucas os orientais escondiam o corpo com vestes funcionais de formas chocantes.
Fig. 98 e 99: Extreme, 2003. Na exposição do Metropolitan Museum of Art, de Nova York em 01/02 encontram-se a campanha de Miyake/82 (na figura da direita) quebrando os padrões da estética; e Yohji Yamamoto, para o inverno de 86 fotografado por Nick Knight. Os japoneses foram os responsáveis por uma nova estética na moda em escala mundial. Fig. 100: Moda – século dos estilistas, 2000. Rei Kawakubo para Comme des Garçons em 87. Sua filosofia: só valia a pena ser mostrado o que nunca tinha sido visto. Uma das criadoras mais importantes para a década de 80 que continuará a transformar o corpo através da veste em todas suas coleções.
As criações de Miyake podem negar o corpo, mas lhe deixam toda liberdade. Ele faz experiências com o volume do corpo através da veste proporcionando assim como outros japoneses, outras dimensões. Finalmente, as proporções do corpo e as proporções da roupa estão desassociadas, graças aos orientais, finalmente o corpo pode ser completamente transformado pela veste causando distorções completamente inusitadas até então. Yamamoto, um visionário de uma elegância constante, concilia em seus trabalhos um grande contraste: A fantasia com a função, a sedução com reserva, o erotismo com o pudor. Neste final de século, será esse japonês que exprimirá a quintessência do espírito da alta costura.
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Fig. 101 e 102: Fashion, 2002. A primeira de Yohji para o inverno/93 apresenta uma releitura do western-style-nipônico. A segunda da autoria de Kawakubo para Comme des Garçons no inverno/94, cria um vestido que parece ter sido usado durante anos. O tecido desgastado e retorcido transforma o corpo e insere o conceito do já usado. São vestes que não podem mais ser rotuladas. São tantas as inspirações, tantos os elementos trabalhados que ficará difícil definir, nomear as criações na moda até os dias atuais.
Fig. 103 e 104: Site: Erika Palomino, 2004. Y3 na primavera-verão 04. Apresentada numa academia de judô em Paris, Yohji faz da marca esportiva Adidas uma revolução fashion. Essa associação entre o corpo, o esporte e a moda tornam-se uma das diretrizes do novo milênio para as tendências de moda comportamentais.
Será Yohji também o responsável pela reavaliação da marca Adidas transformando uma marca esporte num artigo de luxo cobiçado pelos fashionistas. Batizada de Y3, a coleção que começou em 2000 com o
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desenvolvimento de tênis para a marca, atinge hoje peças de vestuário masculino e feminino exclusivíssimas inspiradas no espírito sportswear da marca. “Essa parceria é o caso de co-branding mais bem sucedido da moda... e se exercita em materiais tecnológicos de última geração, que respiram... As três listras se desdobram criando grafismos. As peças em pink já nascem hit... Esportivo e fashion, divertido e cool.” (SITE: ERIKA PALOMINO, 2004). Criadores brasileiros como Clô Orozco da Huis Clos exercita a proporção da veste na modificação corporal; por sua admiração na moda japonesa suas coleções sempre trabalham a forma plástica e intelectual da mulher. Especialista no tricô, Renato Loureiro é outro nome de peso para a moda nacional. “O mais importante é criar desejos, esse é o alicerce, não importa onde você esteja”, afirma o estilista para O Brasil na Moda. Fruto da geração de estilistas que viram os japoneses mudarem a estrutura da roupa, propondo mais que uma nova silhueta, uma nova estética, eles carregam consigo essas referências.
Fig. 105 e 106: Site: Erika Palomino, 2004. Ambas as figuras do verão 2005. Na da esquerda Huis Clos influenciada pelo japonismo e na da direita Reinaldo Lourenço transformando a proporção de uma simples camisa básica no corpo feminino.
Reinaldo Lourenço gosta de sobrepor idéias, proporções como se fosse uma colagem, usar um tema sobre o outro, misturar informações como se estivesse batendo num suco de liquidificador. “Quando olho para o passado é sempre procurando o futuro chegar.” Relata em O Brasil na Moda.
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“Reinaldo abriu o dia exercitando-se de modo criativo, num desfile conciso. Partiu da camisaria masculina para trabalhar variações assimétricas – sempre leves – da peça, em branco, lembrando seus primeiros sucessos, nos anos 80.” (SITE: ERIKA PALOMINO, 2004). Rei Kawakubo, que se escondia atrás da marca Comme des Garçons mostrava vestidos assimétricos, muito largos, compridos e angulares valorizando a assimetria e a imperfeição, como sinais de vida… seguindo a estética japonesa. Na era do Sex e da riqueza, em 83, seu trabalho foi considerado intelectual por Suzy Menkes: “Racionalmente, sinto-me atraída pelos japoneses, mas meu corpo inclina-se para os franceses” disse a respeitada jornalista.
Fig. 107 e 108: Fashion Images 2, 1997. Nesta célebre coleção Kawakubo questiona o corpo humano e suas proporções. Ela sugere que as deformações são belas e fazem parte da sociedade contemporânea. Várias revistas publicaram sua coleção conceitual, mais usável. Estas são da Marie Claire japonesa por Paolo Roversi.
Sua fascinação pela forma, pela textura e seu questionamento das proporções do corpo sempre estiveram presentes culminando em 1997 quando de maneira espetacular ela colocou chumaços em zonas imagináveis, através dos quais os corpos ficassem deformados. O questionamento pelo corpo associado à forma foi aqui apresentado por Kawakubo, deixando no ar a pergunta: o que é belo? Ela mesma responde: as deformidades são formidáveis. Suas obras são arte para usar sobre o corpo.
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Já constatamos que somente após a metade do séc. XX as transformações corporais começaram a iniciar sua aceitação social. A moda, como linguagem que vai além da veste começa sutilmente a falar sobre esses corpos. Com as ‘marcas-conceitos’, desenvolvidas muito a partir dos anos 80, os trabalhos dos criadores de moda começam a obter atenção para essas formidáveis deformidades. O corpo humano não mais é limitado por suas proporções plásticas. A moda não mais é limitada pelas proporções plásticas do corpo. As proporções são completamente alteradas pela veste. A ilusão tornou-se realidade. Chegou o momento, a moda rompe as barreiras do corpo humano de forma significativa. Em tempos de imagens fortes, acabaram as sutilezas, e as formas da veste tornam-se consagradas.
Fig. 109, 110 e 111: Extreme, 2003. Na da esquerda, Martin Margiela inverno 2000 apresenta a forma de um trapézio encurtado somente possível se empregando técnicas de modelagem em tecidos rigorosos. Na fig. central W<, inverno 97 com sua jaqueta inflável o usuário pode se quiser deformar ainda mais o corpo. Na da direita, Junya Watanabe para o inverno 98 constrói uma estrutura em metal e tecido reconstruindo a engenharia das anáguas do séc. XIX. Esses são alguns dos novos criadores, dos novos nomes da moda que transformam radicalmente o corpo. A plasticidade do corpo e da veste é explorada por todos.
No final da década de 90 e início do novo milênio são inúmeras as interpretações dos criadores de moda transformando o corpo, dando novas dimensões mais radicais. Extremas transformações inspiradas na própria história
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da moda ou na arte rompem de tal forma as barreiras do ser humano com seu corpo que a cada estação, várias manifestações são realizadas. O desejo de transformar é mais forte, são agora comunicáveis de forma legível, os sinais não são mais fracos como um dia afirmou Humberto Eco.
Fig. 112: Site: Erika Palomino, 2004. Jun Nakao para verão 05 faz uma coleção de papel explorando as formas de maneira fascinante, os vestidos são rasgados no final do desfile. Fig. 113 e 114: Extreme, 2003. Na do meio Yohji interpreta a madeira e a dobradiça na veste, exposto na galeria o criador de moda também faz arte. Os movimentos da moda com a arte são associados desde os anos 60. Na da direita, Hussein Chalayan para o verão 2000 esculpi o tule no vestido transformando a modelo num cabide da forma.
No processo de criação são inúmeras as brincadeiras, as mais diversas reunião de fatos, desejos e jogadas de marketing anunciam a cada estação uma nova criação, uma nova proporção corporal dado pela veste ou pela transformação do próprio corpo. O catwalk transformou-se num show hollywoodiano, mostrando suas ‘tendências’, suas idéias que podem ou não se utilizadas de forma confortável, modificando as proporções a cada show de forma tão individualizada que cada marca conta sua própria história. Guiados pelo desejo de comunicar-se, manifestar e refletir os acontecimentos sociais ou pessoais os criadores e todos os envolvidos no meio fashion são os responsáveis por tornar o movimento moda o meio de expressão,
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de comunicação capaz de personificar o corpo, transformando-o radicalmente através da veste. Criadores do mundo inteiro ‘desfilam’ seu próprio show, criam sua
própria
imagem
através
das
campanhas
publicitárias
e
da
mídia
especializada. Difundem seus desejos transformados em produtos de consumo. Apesar da pressão da mídia por corpos esculturais, os padrões de beleza não mais universais solidificam a imagem da personalidade através da aparência individual, do diferente, inusitado. O conceito de beleza para o inicio do séc. XXI está no individualismo e na personalidade do ser. Todas as diferentes linhas de criação da indumentária são as comprovações da moda assessorada pelo marketing da imagem.
Fig. 115: Extreme, 2003. Viktor and Rolf inverno 01. Pela estética, pela forma, pelo conceito, pelo marketing os estilistas transformam sua passarela num verdadeiro show de talentos.
Fig.116: Site: Erika Palomino, 2004. Herchcovitch verão 05 mostra a leveza da forma numa releitura perfeita para o verão, realçando o desejo de felicidade e individualidade do coletivo.
O marketing empresarial e individual é a chave para o sucesso, claro que o talento também é necessário. Para os corpos transformados esse é o passo definitivo para a aceitação social. Ser aceito como indivíduo pelo seu ‘talento’ independente da sua deformidade.
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Os especialistas no corpo transformado
Nesta
categoria
encontramos
os
especialistas
no
desenvolvimento de produtos adequados as mais diversas deficiências ou debilidades físicas e mentais. Como vimos o conceito atual de integração do deficiente tem como objetivo melhorar sua qualidade de vida. Sendo criados vários recursos envolvendo as necessidades objetivas (na qual se encontra o vestuário), como no plano subjetivo (felicidade, filosofia de vida etc.). A ciência em conjunto com a tecnologia está abrangendo todas as áreas para tornar a vida do portador de deficiência mais eficaz e gratificante. A cada dia novas pesquisas são realizadas e novos produtos são testados. Novidades são lançadas inspiradas nas diversas disfunções humanas. Uma vasta linha de artigos vai da bicicleta ergonômica, pranchas para fisioterapia, palmilhas, próteses feitas de titânio ou de carbono, uma infinidade de muletas, bengalas e até mesmo cadeiras de rodas, sem falar nos computadores acessados pela voz, ou apenas pelo toque de um único dedo. Nos dias de hoje a pessoa com deficiência, pode e se sente muito mais útil, portanto integrada a sociedade. A bicicleta ergonômica desenvolvida pela Roli-moden é um exemplo da preocupação com a qualidade de vida do deficiente. Com a filosofia body movement, essa empresa em conjunto com a biomecânica procura desenvolver artigos que integrem a atividade física a rotina do portador de deficiência. Preocupados com a saúde psicológica, menta, social e física essa empresa participa de vários eventos com o objetivo de trazer o bem estar para disable people. Possuem ainda uma vasta linha de artigos de vestuário, incluindo tênis. As fundações ou confecções são em geral criadas por pessoas que tem contato com algum deficiente. Sentindo a escassez de produtos adaptados para uma determinada deficiência criam artigos especializados. Temos os mais diversos artigos desenvolvidos em conjunto com a ciência ou
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simplesmente adaptados de produtos já existentes, ex.: babadores-protetores. Outros produtos são resultados de pesquisas da engenharia biomecânica (a bicicleta ergonômica) até chegarmos ao vestuário, por sua extensão, os sapatos.
Fig. 117: Site: Able clothing, 2004. O barbadorprotetor utilizado na alimentação das pessoas com dificuldades de movimento. Ideais para proteger suas vestes.
Fig. 118: Site: Roli-moden, 2004. Esta bicicleta foi desenvolvida especialmente para portadores de deficiência poderem se exercitar. O design é fantástico.
A tecnologia ergonômica nos proporciona toda essa novidade. Mas enquanto a moda, a vestimenta, o sapato, relembrando que moda não é uma questão de roupa, mas também de estilo, de comportamento, como estamos desenvolvendo nossos produtos para esse mercado carente?
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Vestimenta ergonômica
A pesquisa com o vestuário para deficientes em geral centraliza suas propostas nos fundamentos básicos atuais de qualidade de vida, considerando os requisitos conforto, durabilidade e funcionalidade essenciais, primordiais. Parte da tecnologia da indústria da confecção para fazer o corpo movimentar-se de acordo com as patologias humanas apresentadas. “O vestir não é só proteger, agasalhar, embelezar, resguardar as partes pudicas, mas é um procedimento complexo, que visa além de preservar a saúde e a pudicícia, facilitar as funções motoras, sensitivas e auxiliar o ser humano em seus aspectos psicológicos, mecânicos, na saúde, nos cuidados e acima de tudo, nas prevenção predisposta a preservar uma das facetas visíveis, que compõem a complexidade humana.” (GRAVE, 2004:31) Para
criar
uma
veste
ergonômica
devemos
levar
em
consideração o biotipo e suas variações, a atividade física para aquele vestuário (adequando sua modelagem), diferenças de sexo etc. As características da raça, de regiões, a influência sócio-cultural e econômica são fatores fundamentais. Os artigos com essas características possuem uma diversidade ainda pequena, existem em grande parte em utensílios complementares da veste como babadores-protetores, para não sujar a roupa ao se alimentar, ou capa de chuva para quem utiliza uma cadeira de rodas. A confecção pioneira, que se tem relato foi a Silvert’s uma loja canadense de departamentos que existe desde os anos 30, começou dedicar-se a pesquisa de confecções para homens e mulheres que tivessem dificuldade em se locomover nos anos 60, fazendo artigos úteis para pessoas focando suas necessidade de se vestir facilmente. Suas preocupações são a durabilidade e o conforto, os itens design e estilo (fashion) com o conceito e a importância que possuem nos últimos tempos ainda não foram abordados pela Silvert’s. Seus artigos são vendidos na loja e por catálogos desde os 70, hoje comercializados também na web.
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Fig. 119 e 120: Site Silvert’s, 2004. O vestido e a capa são fáceis de vestir e usar. Podem ser encomendada pela web em diversas cores. Estas peças são comercializadas para diversas debilidades humanas: Alzheimer, Artrite como problemas de mobilidade.
A Able Apparel dirige seus produtos para crianças com dificuldade de mobilidade. Segundo o site as roupas produzidas são fáceis para usar, confortáveis e fashion como toda criança deve aparentar. Comercializadas somente pela web. Enfatizam o uso de zíper invisível e velcros por serem práticos para as crianças e também para os adultos que em muitos casos os auxiliam na hora de vestir. Essa é uma confecção de Nova York iniciada no início dos anos 90 pela mãe de um garoto que nasceu com problemas de mobilidade.
Fig. 121: Site: Able Apparel, 2004. Uma das peças mais vendidas por essa confecção é sua capa de chuva feita especialmente para cobrir o indivíduo e seu meio de transporte.
Com o lema: “When you look good, you feel better” – Quando você aparenta bem, você se sente melhor. A proprietária da Easy Acess Clothing oferece dicas de como adaptar suas roupas para determinadas necessidades, como quem precisa utilizar um tubo para urinar. Este site vende seus produtos
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somente pela web. Eles produzem roupas confortáveis e adaptadas para crianças mulheres e homens.
Fig. 122 e 123: Site: Easy Acess Clothing, 2004. Indicam o tipo de tecido, confortável e macio, assim como aberturas estratégicas, principalmente nas calças para facilitar seu uso.
Finally it fits é um outro site que oferece serviços de adaptação para roupas para pessoas que tem dificuldade em se vestir. Suas vestes são para serem usadas no dia a dia, atendendo o público feminino e masculino. Os pedidos são realizados pela web por encomenda antecipada onde o cliente pode escolher o artigo por seções (cadeira de rodas, homens, mulheres etc.) depois selecionar o tamanho e a cor. Existem fotos dos produtos com as opções oferecidas inclusive o preço. Esta empresa, como a grande maioria foi criada por pessoas que enfrentam as dificuldades de adquirir produtos adaptados, de melhor qualidade ou ainda simplesmente belos. Este ultimo motivo é discutível para nós que lidamos com o design de moda. Possuir um produto fashion, em nosso conceito, seria adquirir um produto que falasse das ultimas tendências de moda personalizando o estilo individual. Esta preocupação com o design ainda não existe em muitas das empresas. Desde 1987 a Professional Fit Clothing está no mercado. Oferecendo uma vasta variedade de produtos desde meias, luvas, babadoresprotetores para adultos etc. O propósito desta companhia é oferecer qualidade,
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conforto e funcionalidade com estilo, como eles mesmo rotulam. Garantem a satisfação de seus produtos, ou o dinheiro de volta. Seus artigos também podem ser comercializados pela web.
Fig. 124 e 125: Site: Professional Fit Clothing, 2004. As luvas de couro com velcro e sem dedos são encomendadas pela web, o tamanho e a cor são opcionais. Esta camiseta protetora é uma alternativa para os babadores-protetores convencionais que podem diminuir a auto-estima. Neste caso o design foi considerado para se aproximar de uma t-shirt comum.
Talvez uma das empresas mais completas seja a Rolli-moden. Desde 96 Manfred Sauer, um executivo fã da atividade física, também insatisfeito com os artigos oferecidos no mercado alemão fundou sua própria empresa direcionando seus artigos para portadores de deficiência física. Desenvolvendo produtos em diversas áreas (inclusive a bicicleta ergonômica) também oferece as mais variadas linhas de produtos para diversas ocasiões: social, casual, profissional e até uma linha de artigos em jeans foi elaborada tanto para homens como para mulheres. São enfatizados as costuras, os tecidos e os fechos, principalmente para quem passa a vida sentado numa cadeira de rodas precisa manter-se aquecido, as costuras não podem machucar e os fechos ou botões serem de fácil manuseio. Os artigos mais solicitados são os produtos para executivos bem sucedidos (oferecida na linha de costumes, ternos e coletes) e a linha para o activewear (uma linha de artigos para portadores de deficiência fãs da atividade física como o fundador).
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Fig. 126 e 127: Site: Rolli-moden, 2004. Os produtos casuais e sociais são confeccionados especialmente para portadores de deficiência física.
Existe ainda a Specialty Care Shoppe, um site que oferece artigos de lingerie para mulheres, fortalecendo o elo da sensualidade independente da deficiência. No Brasil em 2003, um desfile de moda é realizado pela professora e estudiosa da ergonomia humana Maria de Fátima Grave para portadores PPD’s. Este estudo, pioneiro por aqui tem como em vista trazer de forma confortável, compreendendo as prioridades da praticidade, qualidade e design. O evento foi um sucesso, causou um grande impacto na mídia comprovado que o mercado está aberto a inovações. Em conjunto com a Fundação Selma o show realizou-se na II Feira Internacional de Tecnologias em Reabilitação e Inclusão (REATECH), o Rea Fashion foi também reapresentado em 2004. Através da ergonomia, a modelista resgatou funções nos recortes e nas costuras, a posição dos pontos e dos bolsos levando em conta a liberdade do ser humano como indivíduo em cada patologia apresentada. Todos os detalhes foram atentamente estudados, inclusive acessórios, como cintos, anéis e bolsas. Segundo GRAVE (2004) em A modelagem sob a ótica da Ergonomia: O vestuário implica comunicação e conforto. Envolve uma relação e,
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em alguns casos, um apego. Suas considerações devem ir além do natural e respeitar as características de cada indivíduo. Para os portadores de deficiência os planos e eixos anatômicos normais mudam dentro da postura correta do ser humano, para um outro, com diferenciais e particularidades da sua patologia, é necessário ler o corpo do ser o que significa analisar suas diferenças da normalidade, desenvolver técnicas que resultem em soluções saudáveis ao físico e ao psicológico, dentro de um trabalho em que custo e benefício da confecção tornem-se satisfatórios.
Fig. 128, 129 e 130: Site: Rede Saci, 2004. O desfile de 2003 na Reatech em 2 momentos, o primeiro com vestimentas básicas do dia a dia, os jovens dançam com suas próteses comemoram na cadeira de rodas. Na terceira foto, o segundo momento: um estilo sofisticado prova que o deficiente pode ser elegante e estar confortável ao mesmo tempo.
“Esse consumidor completamente negligenciado pelo mercado enfrenta um sério problema quando o assunto é vestuário. Costumam usar peças dois números maiores, para se sentirem confortáveis. Pessoas com deficiência nas mãos podem levar até 20 minutos para abotoar uma camisa. Quem tem sensibilidade só em uma mão, por exemplo, não consegue colocar uma calça normal, com zíper ou botão; a peça sobe enroscando no joelho. Quando o problema é nas pernas,
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você não imagina como um bolso, um zíper ou uma costura grossa dificulta.” Afirma Maria de Fátima indignada. (SITE: REDE SACI, 2004). A ACA desde 1986 é uma organização americana criada com o objetivo de informar as pessoas amputadas, cuidar da sua saúde, auto-estima, sua mente, comunicar sobre os avanços científicos etc. Em 96 receberam recursos federais podendo assim tornar-se uma grande instituição ampliando suas metas: Favorecendo serviços especializados, publicando revistas periódicas e livros de ajuda, serviços especiais para crianças etc. São considerados uma das instituições de maior contribuição social, inclusive com um dos sites mais completos sobre o assunto, possuindo até uma biblioteca e um sistema de busca. Em conjunto com a Freedom-Innovations eles realizaram um desfile de moda em 2004. Esta empresa que trabalha com próteses cujo objetivo é ser líder no mercado americano de artigos ortopédicos envolvendo produtos que dão maior movimento e liberdade. Produzem artigos atrelados as atividades físicas, um dos seus últimos lançamentos foi a prótese para esquis. Com esta filosofia sua imagem está associada a tecnologia de ponta e ao esporte. Gerando uma grande auto-estima no cliente.
Fig. 131: Site: Fredom-Innovations, 2004. A empresa enfatiza uma vida ativa para as pessoas que necessitam de próteses. Os mais variados esportes são suas inspirações.
Em setembro na ACA 2004 Annual Educational Conference & Expo concretizam o desfile de moda com modelos utilizando as inovações tecnológicas das próteses da Freedom com roupas confeccionadas especialmente para o evento pela Nashville Goody’s Family Clothing. O desfile foi uma das atrações que mais repercutiram durante todo o evento, pois demonstram quanto 82
orgulhosos estão seus modelos. Eles encaram a multidão tornado-se exemplos de beleza e de vida, assim como na passarela fashion de Paris, Londres ou São Paulo são objetos de desejo, provendo motivação e inspiração sem preconceito. Um dos diretores da ACA, Richard Myers afirmou: “Os amputados que participaram do show mostraram com energia e carisma como eles podem verdadeiramente inspirar e motivar todos os envolvidos. O desfile foi excitante.” (SITE: FREEDOM-INOVATIONS, 2004). Essas coleções não chegam a ser movimentos de moda, são os primeiros produtos desenvolvidos, muitas vezes adaptados para um mercado necessitado, crescente. Em algumas empresas com a Rolli-moden o item design, styling está incluído na filosofia da empresa. Na maioria dos outros casos ainda não obtivemos essa modernização, talvez pela preocupação da qualidade e do bem estar. A própria professora Maria de Fátima Grave constata: é fácil ser criativo, o difícil é ser criativo e ergonômico ao mesmo tempo. O desafio foi lançado, estamos aguardando o futuro.
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O Calçado diferenciado
Desde que os calçados dos anos 20 foram inventados para permitir o swing dos anos loucos, os sapatos tomaram um outro rumo: sua importância
está
na
mídia
relacionada
a
musica,
e
principalmente
o
comportamento da época fazendo a moda. Os estudos para sapatos funcionais são ao mesmo tempo amplos (no sentido dos diversos ‘defeitos’ dos pés) como restritos (no sentido da ciência anatômica e/ou ortopédica). Uma contradição, sem dúvida. São inúmeras as dificuldades encontradas no corpo humano associadas ao conceito da ciência atual do séc. XXI (inclui conforto, qualidade de vida etc.), se admitirmos qualquer defeito do pé como deficiência. Somente com calçados são considerados: problemas com pés chatos, calos ou joanetes passando por defeitos mais acentuados,
grandes
deformações
causadas
por
paralisias
ou
mau
desenvolvimento. Primeiro,
vamos
esclarecer
a
diferença
entre
sapatos
anatômicos e ortopédicos: Anatômicos: são calçados desenvolvidos a partir da sola do pé, que acompanham a mesma, dando um melhor suporte para o pé em cima do calçado. Ortopédicos: são aqueles sapatos, em sua maioria botas reforçadas com estrutura metálica para corrigir a curva da perna. Aquelas botinhas horríveis usadas na maioria dos casos, durante a infância. A Birkenstock, uma empresa familiar no ramo de sapatos, criada a mais de 200 anos iniciou seus estudos com sandálias anatômicas em 1908. A sandália original teve como objetivo acomodar o pé através do solado. Outra empresa empenhada nos estudos dos calçados é a Dr. Scholl’s que teve sua primeira sandália introduzida no mercado em 1956. A estrutura de seus calçados encorajam o crescimento ajudando a modelar suas
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pernas. Em 1968 o tamanco Original Dr. Scholl’s introduzido no mercado americano gerou uma febre fashion.
Fig. 132. 133 e 134: Site: Dr. Scholl’s, 2004: Na da esquerda, o modelo original em vermelho (o primeiro era branco). Na segunda, acompanhando as exigências do mercado a empresa faz uma sandália anatômica de salto alto. Na imagem da direita o tamanco é reeditado na estampa Burberry para acompanhar mais uma vez o hit da moda.
No verão de 2003 todas as revistas de moda recomendavam como item básico para passar o verão uma Birkenstock. A sandália foi produzida nas mais diversas estampas. A moda pegou emprestado primeiro da Dr. Scholl’s nos anos 70, e depois da Birkenstock no começo do novo milênio seus calçados anatômicos transformando-os em verdadeiros itens indispensáveis da estação. Dr. Scholl’s e a Birkenstock são marcas conceituadas na busca do conforto e da qualidade. Por algum tempo ambas foram associadas ao movimento moda. Grifes de sapatos do mundo inteiro copiaram seus modelos, e muitas empresas principalmente as de tênis utilizam seus princípios na formação do solado anatômico.
Fig. 135, 136 e 137: Site: Birkenstock, 2004. Na da esquerda com inspiração indiana, a no meio considerada mais urbana e a ultima uma releitura metalizada do modelo original. As sandálias acompanham diversos estilos de vida.
A comunicação da moda, sua linguagem se apossa de tudo que lhe convier. A mídia teve e continua possuindo o poder de transformar pequenos pares de sapatos anatômicos em febre fashion. Por outro lado as empresas citadas acima não ficaram paradas no tempo, acompanharam o desenvolvimento
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industrial e o desejo de artigos atuais criando uma série de artigos atualizados e modernos, e ainda anatômicos. Os calçados ortopédicos já existentes (aquelas botinhas) são simplesmente considerados horrorosos pelos usuários, inclusive por vários ortopedistas e fisioterapeutas. As empresas ortopédicas não evoluíram no styling e no design, ficaram paradas no tempo, portanto não podem ser considerados produtos fashion pelo próprio conceito da Moda (contemporânea por definição).
Fig. 138: Site: Silvert´s 2004. Esses calçados estão a venda em diversas cores e tamanhos, porem a estética lembra as botinhas ortopédicas.
Fig. 139: Site: Professional Fit Clothing, 2004. As botinhas tem solado antiderrapante e são fáceis de colocar. Mas o design deixou a desejar.
Fig. 140: Site: Rolli-moden, 2004. O tênis aqui apresentado está à venda no site. É confortável, fácil de colocar, tecnologicamente moderno e ainda belo. Poderia ser vendido inclusive para pessoas sem deficiência. É um produto fashion por conceito.
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Alguns estudos atuais estão sendo realizados na concepção de calçados que integram funcionalidade e beleza para deficientes que possuem diferenças nos tamanhos nas pernas. Em parceria com sapateiros experientes os calçados são alterados de sua forma original, em grande maioria no acréscimo do solado. Os calçados a serem modificados são escolhidos por sua funcionalidade, estética, qualidade e até mesmo por poderem disfarçar as mudanças envolvidas. Foram desenvolvidos alguns protótipos utilizando diversas linhas desde chinelos, passando por papetes, tênis, sapatos sociais e até com salto alto. Por enquanto este estudo é realizado com a transformação de formas de sapatos já existentes. O objetivo é transformar o calçado uma parte do guardaroupa que possa acompanhar a veste e principalmente o estilo pessoal de cada deficiente (com essa patologia) em todas as ocasiões necessárias de sua vida: desde ir a praia como a um casamento sem se sentir envergonhado com seus calçados.
Fig. 141 e 142: Estudo, 2004. Em ambas as fotos foram aumentados no total 3cm no pé direito, utilizando PVC. No tênis Adidas para diminuir o efeito óptico do aumento da sola os recortes acompanham o design original e também é utilizada uma palminha interna de 1cm. Na da direita, a papete Reef teve um aumento na sola e também uma ‘cava’ no meio da mesma com a intenção de diminuir as diferenças visuais.
Os calçados sociais, principalmente os que envolvem salto alto são o maior desafio, já que ao alterar o tamanho do salto também é necessário compensar a curvatura do pé. A escolha das substituições do salto são cruciais para um melhor style associado a funcionalidade do mesmo. O objetivo é disfarçar
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as diferenças para que o calçado possa acompanhar a vestimenta deste portador de deficiência que muitas vezes teria de esconder seus pés.
Fig. 143 e 144: Estudo, 2004. Estes são os casos de sapatos sociais. No da esquerda, o scarpin Pollignanno Al’mare teve o salto fino alterado em ambos, sendo o maior da direita, a palminha interna também é utilizada. No sapato da direita, da Zara, o salto foi acrescentado em 2cm, para compensar a curvatura da planta do pé uma leve extensão da sola até o bico foi colocada em 1cm.
Fig. 145: Estudo, 2004. Neste legítimo Chanel foram alterados o tamanho do salto, uma compensação na planta do pé e também a tornozeleira foi colocada para melhor fixar o sapato.
Os calçados que eram uma preocupação anatômica nos anos 70, agora integram, apenas que pioneiramente o movimento moda, já que falam também da estética (do design) pelos portadores de deficiência física.
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O PODER DA MÍDIA
Desde o final do séc. XVIII, as revistas de moda têm um papel preponderante na difusão das tendências. A partir de 1890, com a fotografia e os ilustradores de talento, as revistas levam em consideração além da evolução das artes da moda e da estética do meio social, todos os acontecimentos da vida de uma mulher moderna. Nascem as precursoras das revistas hoje chamadas ‘comportamentais’.
Fig. 146: Key moments in fashion, 1998. A primeira capa da Vogue em 1892, uma das revistas mais importante de moda de todos os tempos, vai influenciar o século XX com suas sugestões.
Nos anos 20, o teatro e o balé (vide o impacto dos Ballet Russes em Paris) eram os meios de comunicação e difusão da moda já considerada comportamental. “O papel do teatro é comparável ao de nossos atuais desfiles de altacostura na apresentação de novidades.” (BAUBOT, 2002:38). O Ballet Russes com suas cores vivas, e luxo extravagante inspirados no oriente teve um impacto tão forte que Cecil Beaton, apenas uma criança nunca se esqueceu da explosão de cores que viu no palco, mais tarde tornar-se-ia fotógrafo de sociedade e moda. O balé influenciou grandes nomes como Helena Rubinstein, a fundadora da primeira multinacional de cosméticos,
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ficou eletrizada com os tons de ouro e púrpura, e alterou totalmente a decoração de sua casa depois da atuação do balé. A música também inovadora, considerada eletrizante, contribuiu para o seu sucesso. Paul Poiret foi precursor da comunicação nos campos de moda e da publicidade organizando festas, espetáculos elevando as artes aplicadas por meio de uma criação rica e bastante viva. Apoiada por oficinas de criação ele convidava artistas, escritores, gráficos e maquetistas para trabalhar com ele.
Fig. 147: Fashion, 2002. Poiret era famoso por suas festas a fantasia onde convidava toda a sociedade unindo banqueiros com artistas.
Os sapatos dos annés folles (anos loucos) eram concebidos para dançar, não podiam ser muito abertos, para que durante as danças do charleston e do shimmy, não caíssem dos pés, e ainda deveriam ser presos com fivela sobre os tornozelos, o salto era alto, porém amplo e estável. Salvatore Ferragamo foi uma dos grandes shoemakers de todos os tempos. Com originalidade e criatividade ele vai na Segunda Grande Guerra criar sapatos com celefone, já que o couro era escasso. Outro nome reconhecido pelo poder de seus calçados é Manolo Blahnik, seus segredos segundo The Fashion Book estão nas linhas entre o quadril e o caminho percorrido pela perna ao caminhar, na ergonomia. Esses dois grandes criadores
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de simples calçados elevam o status dos sapatos, tornando seus produtos verdadeiros objetos de desejo. Os artigos de Manolo são explicitamente explorados no mundo fashion e na mídia. Somente na série Sex in the City apresentada pelo canal Multishow no Brasil uma das personagens, Carrie possui o equivalente de um apartamento em Nova York em ‘Manolos’, como é conhecido pelos fashionitas. A importância destes designers na mídia é fenomenal, uma de suas armas além do design é o conforto de suas formas, dizem anatômicas mesmo para os saltos estiletos. Algumas marcas de sapatos anatômicos foram apresentadas no subcapitulo Especialistas tendo grande importância também na mídia atual.
Fig. 148: Moda-século dos estilistas, 2000. Os sapatos dos anos 20 criados especialmente para dançar. A influencia da música gerou uma necessidade fashion.
Fig. 149: Visionaire 22. Os calçados criados por Manolo satisfazem outra necessidade da moda de luxo: status. São exemplos de estilo e conforto na medida que o próprio salto permite.
Retornando a história da moda, é na década de 30 que Elsa Schiaparelli torna-se a preferida da imprensa. O seu sentido para brincadeiras surrealistas e seu gosto pelo choque fazem dela a parceira ideal de artistas como Picasso, Salvador Dali, Man Ray, Cecil Beaton dentre outros. A mídia impressa muito poderosa (a televisão ainda não existia) vangloria Elsa e demais artistas em suas publicações.
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Durante séculos a revista e o jornal eram os meios de comunicação mais efetivos, também os mais rápidos, só vão perder terreno para a massificação da TV nos anos 60. Os meios perdem um pouco do poder, mas ainda assim algumas revistas são consideradas verdadeiras bíblias da moda: a Vogue Itália por sua personalidade e a Vogue América por sua capacidade de globalização (é a revista de moda/comportamento mais consumida do globo terrestre até os dias atuais). De tempos em tempos algumas outras leituras são obrigatórias, fazem parte da estação, falam pela moda como falam para a sociedade daquele ano. Assim encontramos as mais diversas publicações de vanguarda: Rolling Stones, ID, The Face, Dazed and Confused, Frank, Jane, Numero, View, Purple, Visionarie, Tank entre muitas outras. O que causou grande impacto nas revistas de moda como meio de comunicação dos corpos transformados só vai se dar nos anos 90, com os questionamentos cada vez mais intensos do o que é belo.
Fig. 150: Smile ID, 2001. O questionamento do corpo humano, e até mesmo da massificação da tecnologia transformando nossos corpos está aqui representado por esta foto publicada na revista ID de outubro de 2000. Um dia estaremos todos iguais abandonados num depósito.
Fig. 151: Fashion Images, 1998. A modelo parece uma marionete. A moda e a estética conseguem manipular o corpo em conjunto com a ciência. A mídia o retrata nesta publicação da The Face outra revista de vanguarda intitulada: Girls in Bath. Originalmente publicada em 97.
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Fig. 152: Fashion Images, 1998. No livro que seleciona as imagens de moda mais significantes do ano, se encontram grandes modificações plásticas do corpo. Um dos assuntos favoritos do séc. XXI.
No final do milênio diversas publicações se interessam pelo assunto abrindo espaço na mídia para as ‘deformidades formidáveis’. Muitos artigos de cunho social serão publicados em jornais ou revistas demonstrando indignamente as dificuldades enfrentadas pelo portador de deficiência. Uma jovem locutora passa uma semana na cadeira de roda para observar tais dificuldades. Suas experiências serão retratadas num documentário, para a Folha de São Paulo ela argumenta: “É um absurdo a falta de acesso em tudo. O Brasil é um dos países que mais tem lei sobre o assunto e um dos que menos cumpre, sendo que 14,5% da população têm algum tipo de deficiência.” (FOLHA DE SÃO PAULO, 06/12/2004). Outra reportagem, também da Folha do dia 13/12/04 intitulada Driblando as dificuldades, fala dos problemas que adolescentes com deficiências encontram nos dias de hoje, oferecendo algumas dicas para como se comportar perante um deficiente visual ou auditivo. A reportagem dá depoimentos de jovens paraplégicos que pedalam pelo parque ou que saem para dançar em suas cadeiras de rodas. Ainda na Folha Ciência, de 06 de dezembro do mesmo ano, um neurocientista paulistano anuncia o braço robótico. Os avanços científicos são
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relatados pela mídia, os problemas do cotidiano também. As revistas de moda não ficam pra traz, retratando em editoriais os corpos transformados, falando da atualidade social. Contribuindo pela informação na quebra dos preconceitos perante o estigma da deficiência. É no mínimo interessante colocar que fotógrafos como Helmut Newton e revistas como a Vogue Americana, uma das revistas mais respeitadas e consumidas no mundo inteiro já publicaram editorias de moda extremamente glamurosos utilizando próteses externas como o aparelho conhecido por ilizarov, causando polêmica, claro. O preconceito ainda existe! Em Pages from the Glossies, June Newton afirma sobre o editorial: As revistas e fotografias precisam quebrar tabus.
Fig. 153: Vogue América, 1995. O uso do ilizarov no editorial da revista de moda comportamental mais famosa do mundo. Definitivamente o espaço da deficiência é defendido pela moda
Fig. 154: Dazed & Confused, 1999. Publicado originalmente na edição 48 que aborda o tema da mobilidade através deste editorial. Esta revista é responsável por uma série de imagens dos questionadores da estética.
A Dazed and Confused, uma revista de vanguarda publicou um ensaio de moda realizado com deficientes físicos reais. As peças foram desenvolvidas especialmente para os modelos retratados sob o comando de Alexander McQueen que aqui assina o editorial como stylist.
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O editorial Acess-Able fotografado por Nick Knight inclui a contribuição de diversos designers que criaram as peças especialmente para cada patologia apresentada. Também na matéria foram incluídos breves depoimentos dos modelos.
Fig. 155: Freaks, 1999. Francis que trabalhava no circo era conhecida por segurar o revolver com uma mão e puxar o gatilho com a outra. A realidade há um século.
Fig. 156: Dazed & Confused, 1998. Alison Laper exibe com orgulho seu corpo transformado. Chalayan é o responsável pela fragmentação.
Aimme Mulles, a atleta paraolímpica que abriu o desfile de McQueen no ano de 97, além de ser a capa da revista está no editorial vestido jaqueta Givenchy Haute Couture, t-shirt Alexander McQueen e criolina da Angels and Bernmans. Ela argumenta: “Eu não quero que as pessoas achem que eu sou bonita apesar da minha deficiência, mas por causa dela. Esta é minha missão: mudar o conceito do que é belo e do que não é”. (DAZED & CONSUSED 46, 1998:82). Este editorial foi reapresentado em grandes publicações de moda posteriores, como em Fashion at the Edge de EVANS (2003): Como uma frágil boneca, Aimme foi fotografada com ‘próteses fantasmagóricas’. As unhas mal pintadas, sujas molduradas com suas pernas de plástico também sujas, completamente passiva difere da mesma mulher da capa usando calças Adidas, de dorso nu e com próteses metálicas com as quais ela
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venceu na para-olimpíada, uma mulher forte e sensual. Parece uma imagem do começo do século passado e a outra do novo milênio. O artigo publicado, por sua estética e pelos assuntos contemporâneos abordados através da imagem, inclusive pelas analises posteriores só pode provar que o Movimento Moda em conjunto com a Mídia podem falar pelos portadores de deficiência, finalmente.
Fig. 157, 158,159 e 160: Dazed & Confused, 1998. O editorial retrata diferentes corpos, diversas deficiências. Acima à esquerda está Aimme. A direita, David Toole sem as pernas usa McQueen. Abaixo à esquerda, Helen Mcintosh veste Roland Mouret, à direita Catherine Long usa vestido Comme des Garçons.
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Outro meio de comunicação também vai se manifestar no final da década de 80: o cinema. Antes de contribuir terá que passar por diversos processos de modificação social. O cinema hollywoodiano, ‘a fábrica de sonhos’, primeiro lança seus percussores de moda nos anos 30. Os desenhistas do cinema americano não seguem a ditadura francesa criando modelos originais, sedutores e fotogênicos. Visto na tela por milhares de pessoas, um traje tem mais impacto no cinema do que visto por algumas centenas numa revista. A mídia impressa começa a perder seu poder, passado para o cinema e depois atingindo a massa através da televisão. O cinema modificou tudo, inclusive a moda. A revista Vogue pergunta, quem influenciou quem? Uma colaboração mútua, responde. Durante a Segunda Guerra Mundial, Hollywood desempenhou o papel principal na moda. Ia-se ao cinema para esquecer aqueles dias horríveis, portanto o realismo era pouco solicitado, tornando as tentativas de usar o filme como meio de propaganda mal sucedido. Com poucos recursos e orçamentos apertados até mesmo muitos artefatos foram desmanchados para fazerem outros, assim como Scarlett O’Hara em O Vento Levou. Percebendo a importância de fabricar sonhos em tempos de crise, os governos finalmente decidiram atribuir mais recursos à indústria cinematográfica. “Nos meios camponeses e operários, nesse mundo subterrâneo que os burgueses continuam chamando ‘o povo’, a moda… somente é conhecida de ouvido... Será preciso esperar pelos anos 60 para que, das confusões geradas pela Guerra, nasça infinitamente mais complexa, a segunda parte desta história do vestuário contemporâneo.” (BAUDOT, 2002:12). Nessa época já existiam nos Estados Unidos catálogos de venda por correspondência com os últimos modelos das estrelas de cinema com Glori Swanson ou Joan Crawford. Os fabricantes prometiam entregar as encomendas em 24 horas. Filmes como The Wild One, com Marlon Brando usando uma camiseta branca, casacos de couro e jeans e Fúria de Viver, com James Dean, 97
tornaram-se mais tarde (quase uma década) uniforme que significam nos jovens um descontentamento. Um único vestidinho preto usado por Audrey Hepburn em Breakfast at Tiffany’s, de autoria de Givenchy o consagrou. Tal importante era o poder do cinema, como mídia naqueles tempos.
Fig.161 e 162: Haute Pointure, 1989. Na da esquerda Marlon Brando em 59. Na da direita Peter Fonda em Easy Rider de 69. Ambos os filmes vão se inspirar na rua acentuando o comportamento de uma geração.
Mais do que o cinema ou a indústria da moda, o rock teve um impacto considerável sobre o domínio visual. Primeiro encabeçado por Bill Haley e depois por Elvis Presley a juventude começa a assumir a liderança pela imagem social, pela moda, afirma FAUX (2000). A música que já inspirava a moda desde os anos 30, relacionava-se tão diretamente com a moda que fica difícil dizer quem inspira quem. A música e a moda escrevem sua história juntas, porém é o som da juventude que marca a atitude como imagem. Ouvir um determinado som representa vestir uma determinada moda e se comportar como tal. A essência da moda como atitude, sua representação como imagem tão discutida no novo milênio encontra seu caminho com o rock and roll.
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“A música era o elemento que unia os jovens do mundo ocidental para além de todas as fronteiras sociais, raciais e de sexo.” (SEELING, 2000:338).
Fig. 163: Street Style, 1994. O estilo DirtyRockabbilly nas ruas de Londres nos 80. Inspirados nas guitarras dos 50.
Fig. 164: 100 Photos du siècle, 1999. O estilo hippie, que os Beatles ajudaram a difundir ia além da veste, era uma filosofia de vida.
Fig. 165: Street Style, 1994. O estilo Mod difundido nos anos 60 pelos Beatles.
Tempo de Beatles, Rolling Stones, The Who, The Kings, Jimi Hendrix e Erick Burdon, expressavam com suas melodias os desejos de sua geração. A música e a moda estavam tão bem conectadas, que quando os Beatles assumiram a elegância dos mods, inspirados por Paris com uma pequena sugestão de seu empresário, milhares de pessoas assumiram o estilo mod histericamente. Já em 1967, os Beatles nomearam Maharashi Mahesh seu guru, tornando percussores dos hippies, que procuravam um sentido da vida no Oriente. No dia seguinte, milhares de jovens assumiram não somente os trajes hippies,
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como sua filosofia de vida, desencadeando posteriormente no movimento do flower power. No Brasil, um cantor com perna mecânica conquista a platéia jovem que o acompanha por gerações, sem mesmo que muitos fãs soubessem de sua deficiência. Seu nome: Roberto Carlos. Outro compositor a cantor entrou para história do rock brasileiro não só por suas melodias, mas também como um exemplo de vida. Hebert Vianna, dos Paralamas do Sucesso sofreu um acidente em 2001 de ultraleve no Rio de Janeiro. Sua esposa morreu e ele ficou paraplégico. (Site: ESTADO DE SÃO PAULO, 2004). Vianna volta aos palcos em junho de 2002. Apresenta-se de forma informal, como sempre usou da casualidade em suas vestes durante seus shows, continua com seu estilo despojado, descontraído apresentando-se por todo pais em sua cadeira de rodas. Já era um ídolo, tormou-se um exemplo de vida ainda maior.
Fig. 166: Site: Estado de São Paulo, 2004. Hebert Vianna, uma personalidade volta ao palco. É recebido calorosamente pelo seu público fiel.
Fig. 167: Site: Estado de São Paulo, 2004. Reeve, outra personalidade deficiente sempre elegante.
Falando de personalidades, e de mídia não podemos deixar de comentar a tragédia de um ator hollywodiano: Christofer Reeve. O Superman, recentemente falecido aos 52 anos de idade por problemas do coração. Reeve sofreu um acidente em maio de 95, ao cair do cavalo fraturou a coluna deixando-o
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tetraplégico. Desde então usou seu status de ator famoso em favor as pesquisas com células-tronco. Graças ao poder aquisitivo de Reeve ele pode usufruir das melhores tecnologias e também possuir uma equipe de apoio que o ajudasse em seu dia a dia, inclusive a se vestir. Foi um dos deficientes mais elegantes, suas roupas eram feitas sob medida. A música falou pelos jovens; que se rebelaram contra o sistema burguês dos anos 50, a moda tornou-se jovem para jovens. A alta costura investiu e pela primeira vez na história da moda a moda de rua entrou nas passarelas da alta sociedade através da casa Dior, encabeçada por Yves Saint Laurent em 1960, levando seu afastamento um ano depois, tornando-o independente. Filmes como Barbarella, estrelado por Jane Fonda colaboraram para a manifestação do futurismo na moda tumultuada dos sixties atraindo milhões de jovens. Pelos televisores, uma imprensa feminina ilustrada, geralmente em cores, nos 60, entram nas casas do mundo inteiro fazendo sonhar com um ideal de mulher americana que a mídia elegeu como rainha. A TV passa a ser o meio mais poderoso da mídia, deixando o cinema pra traz.
Fig. 168 e 169: Beleza do século, 2000. Usando celebridades, a campanha dos sabonetes Lux já usou Marliyn, Marlene Dietrich e até Gisele e Malu Mader (usando o sabonete qualquer mulher poderia se transformar nesses dois últimos ícones de beleza brasileiros).
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Ainda no cinema, diversos filmes começam a demonstrar as deficiências físicas como parte do cotidiano da vida de muitos no mundo inteiro. Esses filmes retratam a consciência social que está se formando. Do diretor David Lynch e com o ator Anthony Hopkis (interpreta o médico), o filme O Homem Elefante, em preto e branco, talvez seja um das primeiras demonstrações da 8º Maravilha do Mundo para a causa dos deficientes físicos. Indicado para 8 Oscar, lançado em 1980 o filme conta a história de John Mervick (John Hurt), um cidadão da Inglaterra Vitoriana que era portador de uma grave neurofibramotose múltipla com 90% do seu corpo deformado. Depois de libertar-se emocionalmente e intelectualmente com o auxilio de seu médico, pois tinha vivido a maior parte de sua vida em circos como um mostro, conseguiu também recuperar sua auto-estima. O filme mostra a batalha de seu médico e de John para ser reintegrado a sociedade. Foi refilmado nos anos 90 adaptado para a época atual, o filme se passa numa escola, mas o objetivo é o mesmo: aceitação social.
Fig. 170: The body, 2000. A inspiração de 1910. Casos de deformidade genética eram comuns nesses anos.
Fig. 171: Site: Adoro Cinema, 2004. Com o auxílio da maquiagem o ator foi deformado para o filme O Homem Elefante.
Um dos fatores considerados por SANTOS (1995) apud CORRER (2003), um dos maiores ‘passos’ para aceitação: as mutilações dos soldados são retratados em filmes de grande sucesso como Nascido em 4 de
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Julho, estrelado por Tom Cruise, ou Forrest Gamp, onde o capitão de Tom Hanks encontra seu destino com as pernas amputadas. Em 89, Nascido em 4 de Julho dirigido por Oliver Stone narra à história de um soldado do Vietnã que volta paraplégico (como muitos casos reais). Primeiro recebido como herói ao retornar aos EUA, e depois se vê confrontando a realidade do preconceito contra os deficientes, envolto inclusive em sua própria indignação pelo fato causado pela guerra.
Fig. 172: Site: Adoro Cinema, 2004. Em Nascido em 4 de Julho o ator Tom Cruise se vê com as dificuldades de um paraplégico, como ter que ser carregado.
Outros filmes ainda como Homens de Honra, uma história verídica mostram dentro de uma outra realidade o benefício das próteses. Com Robert De Niro e Cuba Gooding Jr. na pele de Carl Brasher torna-se o primeiro mergulhador negro da Marinha Americana e depois de um acidente o primeiro mergulhador amputado (por uma perna), com o auxilio da prótese consegue retornar as suas atividades na Marinha normalmente. Também em 89, Daniel Day-Lewis interpreta Christy Brown nascido na Irlanda. Vindo de uma família de origem humilde com paralisia cerebral lhe tirando todos os movimentos do corpo, com exceção do pé esquerdo. Com esse único movimento ele consegue se tornar escritor e pintor. O filme Meu Pé Esquerdo é outra história verídica.
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Fig. 173 e 174: Site: Adoro Cinema, 2004. Na da esquerda Cuba interpreta o mergulhador em Homens de Honra. Na da direita, o ator está preso à cadeira e aos movimentos de um único membro de seu corpo, em Meu Pé Esquerdo.
A indústria cinematográfica (o cinema, por conseqüência a TV, o VHS e depois o DVD) abordou o caso dos portadores de deficiência física e suas complexidades, nenhum deles relacionados à moda em si, ou a vestimenta, mas como casos de experiências pessoais refletidos na sociedade. Os filmes relatam as causas de uma sociedade ocidental. Falam de problemas até então desconsiderados pela mesma. Apesar dessas raras maravilhas cinematográficas não serem relacionadas diretamente com o movimento moda, eles falavam por casos verídicos ou não, discutem problemas enfrentados pelo mundo. São mais de 2 milhões de pessoas deficientes somente no Brasil, atualmente. O cinema fez sua parte, comunicando ao mundo a existência desta tribo questionando sua readaptação social. A importância destes filmes informa de forma subjetiva a presença dos corpos transformados na sociedade, assim como a moda vai absorvê-los anos depois. Retornando a importância sonora na mídia. Sex Pistols, The Clash e The Exploited faziam música com estilo de rua revolucionário que aspirava a criação de mais uma tendência vinda da rua, já no início dos 70 nas Ilhas Britânicas. O cinema e a televisão poderiam estar brigando pela sua influência na moda, mas a música continuava demonstrando sua força absoluta, inspirando o movimento punk, a moda grounge nos 80, e até décadas mais tarde 104
os clubbers, passando antes pelas discotecas, e pelo som disco marcado também nos musicais inesquecíveis: Greese, Embalos de Sábado a Noite, Flash dance, Fama dentre muitos outros. Todos os meios de comunicação se unem para lançar algo como um grande movimento, uma sacada de marketing. O cinema/TV ou clip (a imagem) + som (a música) + fashion (a linguagem) estão em completa harmonia transformando gerações de adolescentes. Até nossos dias essa combinação demonstra-se cada vez mais eficiente. A publicidade em massa para a população consegue transformar pessoas comuns em personalidades através dos reality shows exibidos neste novo milênio. Madonna, com seu hino dos 80: “I am a material girl, and I am living in a materil world.” – Eu sou uma garota material, vivendo num mundo material. Foi uma das primeiras celebridades a se reinventar, lançando-se no cinema, nos clips, e na música ela apropriou-se da ágil comunicação existente.
Fig. 175: Moda-século dos estilistas, 2000. Com o corpete criado por Gaultier, para sua turnê de 90, ela é símbolo da forte e decidida mulher destes anos.
“O materialismo de Madonna, das séries de TV como Miami Vice e Dallas espelharam a busca pelo sucesso, pela fama e pelo dinheiro dos yuppies com suas ombreiras e cinturas apertadas. Era cool ser extravagante. O masculino e feminino se difundiam nas figuras de Boy George, Prince ou Michael Jackson. Porém, com o passar dos anos é Madonna que vai mostrar que styling é suficiente… com habilidade, adapta ao seu gosto pessoal aos looks com as etiquetas mais
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famosas… adotando constantemente novas identidades, Madonna mostrou que uma mulher pode ser qualquer mulher, desde que tenha o look certo.” (SEELING, 2000:493). Ela não somente abre caminho para várias tribos diferentes como também afirma que as mesmas possam se entrelaçar que o ser humano pode possuir várias identidades, conforme suas aspirações pessoais. Madonna marca sua época e demonstra a filosofia da próxima. Os meios de comunicação também descobriram o universo da moda nos 80. Cada desfile era a oportunidade certa para encenar um grande espetáculo levando rapidamente o público a histeria. A moda estava na moda! Desencadeando o fenômeno do fashion victim. Os anos 90 é uma era em que acabam as fronteiras, graças aos avanços da tecnologia, o computador e depois a internet tornam o mundo conectado globalmente ao acesso de todos. A troca de informações, a importância da comunicação, da transmissão de dados faz a rotina cada vez mais rápida. A necessidade de obter informações de ser ágil, de estar em contato com o mundo transforma o próprio. As relações sociais entre povos de culturas diferentes rompem à barreira geográfica. Os responsáveis: a internet, o celular, a banda larga, a TV via satélite ou a cabo, os lançamentos simultâneos criam um mundo conectado com ele mesmo 24 horas por dia. Na publicidade, a nova tendência é explorar todos os sentidos (visão, audição, tato e olfato). Com um mundo cada vez mais rápido é necessário conscientizar ou capturar o cliente de todas as formas possíveis. A moda ‘inconscientemente’ já atribuía essa inovação desde que os criadores lançaram seus perfumes, há décadas. As publicidades de moda já permitiam o envolvimento dos sentidos para marcar também um estilo de vida. O primeiro a lançar um perfume relacionado ao estilo de suas roupas foi o gênio Poiret, seguido pelo inesquecível Numero 5 da Chanel, um dos perfumes associados à marca, a moda e, portanto a imagem é um dos aromas mais vendido até hoje.
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Fig. 176: Beleza do século, 2000. N. 5 da Chanel lançado em 1921 iniciou na perfumaria uma revolução.
Algumas revistas de moda, como a Dazed & Confused e a Moda, da Folha de São Paulo sugerem trilhas sonoras que acompanham aquela imagem e assim a estação. É importante para o consumidor atual que ele possa interagir com essas publicações, ao sugerir um som e um perfume, além da imagem o leitor pode completar a sensação. Precisamos estar mais informados da forma mais completa possível, é uma necessidade do consumidor.
Fig. 177: Moda, 2004. Nesta edição são indicados livros, som e cheiros tropicais para acompanhar a imagem do verão tropical.
A ferramenta que mais nos fornece dados é o computador em conjunto com a internet nos oferecem a partir dos anos 90 um acesso absurdo a um número de informações cada vez mais rápidas e mais ágeis. A banda larga
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nos permite pesquisar conhecer, reconhecer e também, infelizmente esquecer informações importantes que representam nossa cultura atual. Uma série da sites transpassa os padrões de beleza, as tendências de moda, os movimentos sociais, sem falar na situação políticoeconômica de todo mundo. Somos
submetidos
a
uma
agilidade
de
informações,
bombardeados por dados, por padrões modificados dia a dia. Cresce de forma impressionante a relação do mundo com o ser humano que pode conectar-se em questão de segundos a culturas completamente diferentes, ou ainda receber informações sobre pesquisas, dados ou qualquer coisa que lhe tenha a mente. Se você digitar: fashion + store + disable people, no site da google surgem milhões de verbetes que claro, devem ser filtrados pelo usuário para conseguir os dados realmente procurados. Os sites mais interessantes foram analisados no capitulo Especialistas. A The Nth degree é o único site encontrado que aborda o tema com humor, oferecendo pela web seus artigos para crianças e adultos. Desmistificando o preconceito. Calças e jaquetas, principalmente em jeans são os artigos mais procurados independente do estilo pessoal.
Fig. 178: Site: The Nth Degree, 2004. Com humor eles oferecem roupas para estilos pessoais diferentes.
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Foram encontrados com essa pesquisa sites que oferecem vestimentas especiais para os mais diversos tipos de deficiências, em geral para o caso de mobilidades, tais sites são muito divulgados na Inglaterra, EUA e Canadá. Indicam
nessas
regiões
lojas
especializadas
no
comércio
de
roupas
confeccionadas especialmente para algumas deficiências. Infelizmente no Brasil ainda não encontramos tais serviços relacionados à vestimenta, muito menos com estilo. Encontramos por aqui alguns lugares, poucos na realidade, que fornecem informações. A maioria destes locais possui sites que facilitam o acesso às informações. Esses sites oferecem dados que abordam a deficiência: veículos de comunicação, transporte, sugestões de livros, calendários de eventos, locais acessíveis, informações sobre órgãos públicos, entidades, escolas, noticias em geral (avanços tecnológicos na maioria) e ainda empresas e profissionais que prestam serviços na área. Aqui os mais procurados no Brasil: AACD: www.aacd.org.br Deficiente on line: www.deficiente.org.br Entre amigos: www.entreamigos.com.br Fundação Selma: www.fund-selma.org.br Rede Saci: www.redesaci.org.br Setor 3: www.setor3.com.br Alguns sites são pessoais deixam na web o relato de suas experiências e algumas dicas. São raras as dicas em relação à veste, principalmente nos sites hospedados no Brasil. Mesmo com o poder da mídia atual, com todos os meios de comunicação envolvidos: impressos (revistas e jornais), sonoros (música incluindo clips, CD e DVD), dimensionais (cinema, TV, VHS, novamente o DVD, computadores e a internet); as informações disponíveis com relação à deficiência
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física e a moda como um todo, como linguagem da sociedade são insuficientes. No mundo existe um mercado carente, necessitado desta integração a disposição. A mídia pode integrar esse mundo!
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CONCLUSÃO
Utilizando a Historia da Moda como elemento básico da cultura nós observamos através da linha do tempo como os corpos transformados ressonam na moda contemporânea do séc. XXI. Precisamos passar por várias aprovações sociais antes marginalizadas para poder ‘falar’ verdadeiramente de deficiência física. Ao analisar a relação do corpo humano com a veste e viceversa até ao momento em que a sociedade e a vestimenta rompem as barreiras com o próprio corpo. Os movimentos artísticos foram os primeiros a explorar as distorções corporais seguidos pela moda carregada de significado social chegamos aos portadores de deficiência. Desde os 80, o corpo tão analisado e alterado cientificamente na busca da perfeição e da juventude eterna abriu um paradoxo na aceitação dos corpos transformados (dos portadores de deficiência física). Por um lado temos uma obsessão pela beleza jovem perfeita, escultural da qual a maioria das pessoas ‘normais’ estão aprisionadas. Enquanto pelo outro lado, os portadores de deficiência podem e fazem parte de uma sociedade menos preconceituosa, ‘politicamente correta’. Os grandes nomes da moda atual, conceitual e vanguardista quebraram totalmente a relação da veste com o corpo alterando proporções e explorando em alguns casos os corpos transformados. A distorção do corpo pela veste é encorajada pela moda. Os sonhos vendidos no catwalk manifestam-se na idéia do inusitado, do diferente, do visual bem trabalhado vangloriando a personalidade individual do ser associado à marca e sua estratégia de marketing. Os conceitos de beleza foram alterados pela moda e por suas distorções corporais. Para ser belo neste novo milênio, precisa-se acima de tudo ter personalidade e estilo. Os padrões de beleza não são mais tão rígidos, apesar da crescente obsessão pelo corpo perfeito, os portadores de deficiência também podem ser belos. Até que enfim! 111
A moda, como ferramenta de expressão social pôde defender os corpos diferenciados nas passarelas de Paris, São Paulo ou nos eventos direcionados a esse mercado carente de produtos especializados, sem distinção, sem preconceito. A história da moda observou que finalmente podemos falar de moda, como expressão da linguagem, um reflexo da sociedade e deficiência física. O século XXI, considerado a era da imagem, por suas manifestações e elementos de comunicação tão ágeis, se transporta na importância da aparência, na importância da moda, não simplesmente com vestuário, mas como meio de comunicação do ser, do personagem escolhido pelo próprio ser individualizado. Esse talvez seja um dos mais importantes meios de comunicação do corpo literalmente transformado sem preconceito, carregado de significado. Apesar de serem ainda pequenos os movimentos que abordaram tal perspectiva os caminhos estão se abrindo para esta tribo, seja qual for sua deficiência. A moda está apenas começando a dar seus passos nos requisitos conforto, qualidade e design. Suas manifestações são essenciais para valorização do ser tendo como foco a qualidade de vida em seus aspectos objetivos e subjetivos. Os preconceitos foram quebrados pelo questionamento do próprio corpo em comunhão com a ciência na busca do corpo perfeito. A perfeição se encontra no bem estar e na estética da qualidade de vida. O mundo hoje é muito mais cruel com os quase perfeitos, do que com os completamente ‘imperfeitos’ (os deficientes). Esses já conquistaram seu espaço nos braços do questionamento do belo. Os portadores de deficiência precisam agora ser reconhecidos como público-alvo fashion. As empresas que tratam dos requisitos conforto, qualidade, praticidade e design são ainda insignificantes, principalmente no Brasil.
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CONCLUSIONS
Considering Fashion History as the basic element of culture, we observe over the time line how transformed bodies echoed in the contemporary fashion of the XXI century. We need to go through several social approvements, which were before marginalized, so we can truly ‘talk’ about physical disabilities. We analyzed the relation of the human body with the clothing and vice-versa until the moment where society and clothes break the barriers with the body. The artistic movements were the first to explore the corporal distortions, followed by the fashion with social meaning until we get to the physically disabled. Since the 80s, the body is analyzed and scientifically changed in the search of perfection and eternal youth, what created a paradox in the acceptance of transformed bodies (of the physically disabled). On one hand, there is an obsession for the perfect youth beauty, sculptural, for which most ‘normal’ people are trapped. On the other hand, the physically disabled can and are part of a less preconceiving society. The main names in the current fashion, conceptual and of vanguard, completely broke the relation between clothes and body, changing proportions and exploring, in some cases, the transformed body. The body distortion by the clothes is encouraged by fashion. The dreams sold at the catwalk show themselves in the ideas of the unusual, the different, of the well worked visual praising the individual personality of the being associated to the brand and its marketing strategy. The beauty concepts were changed by fashion and by its bodily distortions. To be beautiful in the new millennium, most of all one needs personality and style. The beauty standards are no longer inflexible, although the
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increasing obsession by the perfect body, and the physically disabled can be beautiful too. At last! Fashion, as a tool of social expression, could defend differentiated bodies in the catwalks in Paris and São Paulo, or in events targeting this market in need of specialized products, without distinction or prejudice. The fashion history observed that we can finally talk about fashion, as a language expression, an image of the society and the physical disability. The XXI century, considered the image era, by its manifestations and agile communication elements, transports itself in the importance of the look, in the importance of fashion, not only as a clothing, but also as a mean of communication of the being, of the chosen character by the individual. This is probably one of the most important communication mean of the body, literally transformed without prejudice and loaded of meaning. Although the movements that follow this perspective are small, the path is opening for this tribe, no matter what is the disability. Fashion is just on its first steps when considering requirements such as comfort, quality and design. Its manifestations are essential to value the being focusing life quality in its objective and subjective aspects. Questioning the body in communion with science in the search of the perfect body broke the prejudice. The perfection is found in the well-being and in the esthetics of life quality. The world today is much more cruel with the almost perfect, than with the completely ‘imperfect’ (the disabled). The later already achieved there place in the arms of the questioning of the beautiful. The handicapped need to be recognized as a fashion target now. Companies that deal with requirements such as comfort, quality, practicality and design are yet insignificant, mainly in Brazil.
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