De Que Precis Amos - Ed

  • November 2019
  • PDF

This document was uploaded by user and they confirmed that they have the permission to share it. If you are author or own the copyright of this book, please report to us by using this DMCA report form. Report DMCA


Overview

Download & View De Que Precis Amos - Ed as PDF for free.

More details

  • Words: 1,251
  • Pages: 3
http://www.revistapatio.com.br/numeros_anteriores_numero.aspx?id=2 Revista Pátio – Educação Infantil Ano I - Nº 02 - De que Professor precisamos para a Educação Infantil - Julho à Outubro de 2003

De que professor precisamos para a educação infantil? Uma pergunta, várias respostas É preciso assegurar o direito de brincar, criar, aprender, enfrentando os desafios de pensar a creche, a pré-escola e a escola como instâncias de formação cultural; o desafio de pensar as crianças como sujeitos de cultura e história, como sujeitos sociais. Professores e professoras no singular e no plural Refletir sobre os professores de que precisamos para atuar com crianças de 0 a 6 anos na educação infantil é tratar de homens e mulheres no plural, muitos ainda adolescentes, que têm histórias singulares, experiências acumuladas de vida e de formação, diferenças. Nessas trajetórias percorridas, construíram maneiras de ver o mundo, as crianças e a si próprios que precisam ser levadas em consideração nos processos de formação e trabalho cotidiano. Precisam também se constituir como profissionais: professores e professoras não são tios, como freqüentemente são tratados no conhecido e já denunciado mecanismo de desvalorização, desqualificação e desprestígio. Muitas pessoas que atuam na educação infantil e no ensino fundamental acostumaram-se a ser chamadas de tia e tio, esvaziando o caráter profissional da sua atuação, abrindo mão até do seu nome. Nesse título de pouco poder, defendido por professoras como único bem que parece restar-lhes, encontramos marcas de classe social, histórias de desigualdade e exclusão, discriminação de gênero, etnia, preconceitos sofridos, dificuldades enfrentadas. Nesse contexto, precisamos de professores dispostos a repensar a sua identidade e a história coletiva que vai sendo constituída. Refiro-me àqueles que, atuando na educação infantil, percebem-se como profissionais, entendendo ao mesmo tempo que, se somos professores, as pessoas de pouca idade com as quais atuamos, muito mais que alunos, são crianças. Adultos e crianças mais que professores e alunos Infans, na origem, significa "sem voz" e alumni quer dizer "sem luz". Interessa-nos que a criança passe de uma situação em que está sem voz para outra em que fica sem luz? Podemos aprender com as crianças, olhar seus gestos, ouvir suas falas, compreender suas interações, ver suas produções. Entendê-las dessa maneira não significa, contudo, abrir mão de nosso lugar e de nosso papel como adultos, de nossa experiência e autoridade. Para lidar com as crianças é preciso, além disso, levar em conta a perspectiva cultural do nosso agir e interagir no mundo, nossa condição

de sujeitos da história e da cultura. Reduzir as 23 milhões de crianças de 0 a 6 anos a alunos é ter uma visão de que basta ensinar coisas. Ao contrário, a prática pedagógica envolve conhecimentos e afetos, saberes e valores, cuidados e atenção, seriedade e riso. O cuidado, a atenção, o acolhimento, as trocas, as narrativas da história precisam estar presentes na educação infantil, assim como a circulação de saberes. Nas práticas realizadas, as crianças aprendem; nosso desafio é atuar com liberdade para assegurar a apropriação e a construção do conhecimento por todos. No que se refere à educação infantil, é preciso assegurar o direito de brincar, criar, aprender, enfrentando os desafios de pensar a creche, a pré-escola e a escola como instâncias de formação cultural; o desafio de pensar as crianças como sujeitos de cultura e história, sujeitos sociais. Nós, professores e professoras de educação infantil, também temos responsabilidade social coletiva nesse processo. Fazer com: desafios do trabalho coletivo Na educação infantil, o trabalho coletivo é requisito básico, é condição para construir e consolidar os projetos, para atuar com as crianças, para lidar com as famílias e as pessoas da comunidade na qual se insere a creche, a pré-escola ou a escola. Ao mesmo tempo, um projeto sério e competente fortalece o trabalho coletivo. Hoje, no entanto, quando o projeto político pedagógico torna-se exigência legal, é preciso um cuidado imenso para não perder o seu espírito: projeto exige trabalho coletivo. Um projeto só fica pronto provisoriamente; ele é sempre parcial, atende a uma parte das necessidades e dos desejos, a um contexto específico, em um certo momento. E é projeto na hora em que o concluímos, mas é uma proposta no minuto seguinte. Para os que participam da sua elaboração, em secretarias, ONGs, escolas, na hora em que o terminamos, ele vira o início de tudo: é necessário reler, reavaliar o projeto construído, confrontá-lo com outros e com a prática. Um caminho essencial para o trabalho coletivo é resgatar as histórias das pessoas, as trajetórias profissionais e as histórias das propostas e dos projetos. Precisamos de contextos que valorizem a escuta das histórias das pessoas: as crianças, as professoras, as famílias, quem são? Desses fios das histórias, podemos ir pouco a pouco puxando a possibilidade de fazer o trabalho coletivo: o que um ainda não sabe e o outro já fez, o que o outro já experimentou e ensina para mim, o que nenhum de nós sabe e um terceiro pode ajudar ou vamos procurar lendo, vendo, estudando, refletindo. O trabalho coletivo é ponto de partida e ponto de chegada; na elaboração e na implementação de projetos, o direito à voz e à criação precisa ser garantido. Por isso, é essencial recuperar as histórias das pessoas envolvidas, repensando a sua inserção no processo da cultura, o que implica ver e rever a tradição, mirar o que foi produzido ontem com o olhar de hoje, olhar criticamente o que foi feito para poder mudar. Nesse

trajeto, é fundamental o resgate das histórias de infância - para que os adultos (re)aprendam a brincar - e o resgate dos elos perdidos de propostas antes realizadas ou deixadas por realizar, de equipes antes reunidas e agora desfeitas. Professores e crianças: sujeitos sociais, sujeitos da cultura Como professores e professoras, precisamos conhecer as crianças e os professores (nossos colegas) dos diferentes contextos em que trabalhamos. Eles e elas são sujeitos sociais, têm o direito a experiências de cultura - brincadeira, literatura, cinema, museus, música, pintura - e à arte em geral. Ou seja, é pela discussão da infância como categoria social e histórica e das crianças como sujeitos sociais que se torna possível pensar a educação e realizá-la de forma democrática. Por outro lado, todas as crianças têm direito a um espaço digno e sadio, ao conhecimento, à educação de qualidade, com professores que também sejam tratados e vistos como sujeitos sociais, que produzam cultura e sejam sujeitos da história. Em condições precárias, não se educa (nem se ensina nem se cuida). E aqui reside a maior urgência: precisamos de professores que sejam respeitados nos seus direitos (inclusive o direito à formação), revertendo a situação atual no contexto brasileiro, em que profissionais ganham não pelo nível que alcançam em sua escolaridade, mas pelo nível de escolaridade em que trabalham; assim, os que atuam com a criança pequena são ainda mais desvalorizados. Isso significa que os municípios precisam de recursos, de condições concretas para a ação pedagógica, de condições de trabalho, a fim de assegurar a democratização da educação infantil de qualidade para as crianças (cidadãs de pouca idade) e para os jovens e adultos (cidadãos de todas as idades) que com elas trabalham, para que possam educar com dignidade e contribuam para garantir, com a sua atuação, os direitos de todas as crianças. Nos tempos atuais, isso significa também agir na perspectiva da paz, compreendendo o papel de educar crianças e jovens contra a desigualdade e a barbárie, contra as formas historicamente impostas de exclusão, contra todas as formas de violência. Sonia Kramer é doutora em Educação e professora da PUC-Rio.

Related Documents

De Que Precis Amos - Ed
November 2019 3
Precis
June 2020 4
Precis
October 2019 8
Amos
November 2019 17
Amos
June 2020 11
Amos
June 2020 8