Cinema No Mercosul

  • June 2020
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Cinema no Mercosul RECAM - Reunião Especializada de Autoridades Cinematográficas e Audiovisuais do Mercosul A Reunião Especializada de Autoridades Cinematográficas e Audiovisuais do Mercosul (RECAM) foi criada em dezembro de 2003 pelo Grupo do Mercado Comum (GMC) – órgão executivo do Mercosul – com o objetivo de criar um instrumento institucional para avançar no processo de integração das indústrias cinematográficas e audiovisuais da região. Sobre a base de três princípios basilares – reciprocidade, complementaridade e solidariedade – a RECAM estabeleceu um plano de trabalho orientado para seus objetivos básicos: - Adotar medidas concretas para a integração e complementação das indústrias cinematográficas e audiovisuais da região; - Reduzir as assimetrias que afetam o setor, impulsionando programas específicos a favor dos países com menor desenvolvimento relativo; - Harmonizar as políticas públicas e os aspectos legislativos do setor; - Impulsionar a livre circulação regional de bens e serviços cinematográficos e audiovisuais; - Implementar políticas para a defesa da diversidade e da identidade cultura dos povos da região; - Trabalhar a favor de uma redistribuição do mercado cinematográfica que garanta condições de igualdade para as produções nacionais e seu acesso ao mercado; - Garantir o direito do espectador a uma pluralidade de opções que incluam especialmente expressões culturais e audiovisuais do Mercosul. A fim de garantir a execução e a continuidade dos planos de trabalho acordados, a RECAM criou uma Secretaria Técnica com sede no Edifício Mercosul, em Montevidéu. Ensino de Cinema Antecedentes A primeira iniciativa de constituir um espaço próprio para o ensino do Cinema coube à nascente república soviética, em 1919, com a fundação da Vsesoyuznyi Gosudarstvenyi Institut Kinematographii, o Instituto de Cinematografia Estatal da União, cuja importância permanece até hoje. Assumindo o poder em um país de imenso território e de maioria camponesa analfabeta, os bolcheviques perceberam o potencial desta arte que havia surgido 20 anos antes. Através do cinema, pensavam eles, seria possível desenvolver um trabalho inédito de conscientização e mobilização política e ideológica impossível pelos meios convencionais. Considerado por Lênin “a mais importante das artes” para os propósitos da revolução, o cinema é objeto de especial atenção através de iniciativas que visam criar uma indústria própria e formar pessoal capacitado, programa de governo cuja relevância é atestada pelo fato de ser posto sob a autoridade de Nadezhda Krupskaya, esposa de Lênin e responsável pela área de educação. Na medida em que a revolução afastara os estrangeiros que até então faziam cinema na Rússia e com eles equipamentos e materiais, os primeiros anos foram dedicados ou à remontagem de peças de propaganda produzidas pelo governo czarista, destinando-as aos trabalhos de agikti, ou a um ensino “no papel”, pois, sem equipamentos de filmagem, os alunos aprendiam a escrever roteiros, dirigir e interpretar como se estivessem diante de câmeras, redigindo e desenhando todos os planos e tomadas de um filme. Kuleshov, grande professor e teórico do cinema soviético, por exemplo, tendo obtido uma cópia de Intolerância, do diretor americano Griffith, exibia-a exaustivamente para seus alunos até que estes memorizassem cada sequência e remontassem o filme no papel em versões diversas. Foi em grande parte devido a estas experiências “abstratas” que foi gerada a riquíssima concepção de cinema soviética com suas inovações fundadoras da linguagem cinematográfica.

Após este pioneirismo, a idéia de “escola de cinema” disseminou-se por todos os países interessados em iniciar ou desenvolver uma indústria cinematográfica, seja como um meio de fornecer recursos humanos habilitados, seja como instrumento de estudo, crítica e renovação formal. Assim, o ensino de cinema veio a cumprir várias tarefas: formar técnicos e realizadores, conferir ao cinema a dignidade de um campo artístico merecedor de estudos tão aprofundados como os que já se faziam em relação às “grandes artes” e garantir-lhe plena inserção na cultura. Um outro veio de formação, contudo, foi decisivo na história do Cinema: o ambiente dos estúdios, onde, sem exigência de escolaridade, pessoas de proveniência variada envolviam-se nas tarefas diárias da produção, aprendendo com os mais experientes e buscando abrir seu caminho próprio de expressão. O Cinema do século 20 dispôs, portanto, de duas grandes fontes para formar seus quadros, com as tensões e prevenções recíprocas que sempre marcaram as distintas trajetórias dos profissionais oriundos “da escola” e os que se criaram “na prática”, estes desconfiando do “teoricismo” ou hábitos “intelectualistas” dos primeiros, os quais, por sua vez, tendiam a subestimar o “pragmatismo” dos outros. É verdade que muitas escolas surgiram da constatação por realizadores da necessidade de oferecer uma formação mais sistemática, tal ocorrendo à medida que o Cinema se expandia e complexificava, estabelecendo seus códigos e técnicas próprias, exigindo pois pessoal já previamente familiarizado com sua cultura. Ora, na medida em que o ensino vinha calcado pela mentalidade de áreas tradicionais -artes plásticas, teatro, literatura --, impunha-se abrir novos espaços onde o Cinema se afirmasse com seu espírito peculiar. Se, em certos campos intelectuais, o Cinema foi tratado com reservas, visto meramente como “arte menor” ou mero “divertimento” para as “massas”, outros valorizaram seu potencial criativo propiciando frutífera aproximação que vai congregar estudiosos e realizadores de artes plásticas ou teatro em torno de iniciativas inovadoras que, ao contrário de se intimidarem com “as massas”, concebem obras que rompem com o círculo limitado do palco, incluem as massas como protagonistas e a elas se dirigem para formar as grandes e inéditas platéias do século 20. A formação em cinema implica na familiarização com diversas vertentes do conhecimento, sejam as artes -- plásticas, teatro, música, literatura --, sejam as ciências humanas -- filosofia, história, sociologia, antropologia --, sejam enfim aquelas áreas chamadas de “comunicação” que passaram a reunir saberes em torno dos processos midiáticos e da “indústria cultural”. Se acrescentarmos as exigências dos conhecimentos teóricos e práticos específicos do fazer cinema, teremos uma gama imensa de conteúdos a serem transmitidos, o que naturalmente sempre impôs opções e ênfases na organização de escolas. É evidente, por outro lado, que a realidade cinematográfica de cada país e sobretudo seus traços predominantes em relação à dinâmica do mercado de produção e às tendências estéticas e de linguagem foi um fator influente naquelas opções, determinando os estilos próprios de cada escola conforme o clima nacional de seu cinema

O Ensino de Cinema no Brasil No Brasil, aprender a fazer Cinema sempre foi, grosso modo, através da “Escola Humberto Mauro de Cinema”: olhar, ver fazer – isto é, empiricamente, através da prática. Claro, nos anos 20 existiram escolas de Cinema em São Paulo, mas eram diferentes das que conhecemos hoje: o propósito declarado destas escolas era formar atores de cinema. No entanto Uma das resoluções aprovadas pelo 1º Congresso Brasileiro de Cinema (1952) – reafirmada no 2º Congresso (1953) – propunha a criação de uma Escola Nacional de Cinema, vinculada à então Universidade do Brasil (atual UFRJ), possivelmente inspirada em escolas de Cinema européias, como o IDHEC, da França, e o Centro Sperimentale di Cinematografia, da Itália. Esta resolução mostra uma certa insatisfação pela formação empírica (de aprender fazendo) que os profissionais de Cinema tinham e, ao mesmo tempo, uma preocupação manifesta por uma formação mais sólida. No entanto, só a partir dos anos 60 é que as primeiras escolas universitárias de Cinema começaram a aparecer. Duro é saber de verdade qual a primeira. Poderia ter sido a Escola Nacional de Cinema, proposta pelos Congressos Brasileiros de Cinema e cujo projeto começou a ser elaborado em 1956, a partir da criação da Comissão Federal de Cinema pelo presidente Juscelino Kubitschek, que continuou com o GEICINE, criado pelo presidente Jânio Quadros em 1961. ambos trabalharam em conjunto com a Associação Brasileira de Cronistas Cinematográficos, que a partir de 1960, na I Convenção da Crítica Cinematográfica, começou a elaborar o projeto de organização da Escola. Mas ela nunca saiu do papel, e no papel foi extinta depois do golpe de 1964. Assim, a Escola de Cinema da Universidade Católica de Minas Gerais (atual PUC-MG), surgida em 1962 em Belo Horizonte, disputa a primazia com o curso da Universidade de Brasília (UnB), que começa em 1965. Infelizmente, o primeiro fecha no início dos anos 70, enquanto que o segundo continua funcionando até hoje, apesar dos tropeços e algumas interrupções. A primeira (e grave) foi justamente em 1965: 15 professores são demitidos (...), outros 210 pedem demissão em solidariedade. A ditadura militar, em fase de consolidação, não podia comportar uma experiência como aquela, em plena capital da República. Setembro/outubro de 1965, um sonho termina: alunos e mestres retornam a seus estados.[i] Sob alguns aspectos, foi um péssimo negócio para a ditadura militar: dois daqueles ex-professores de Cinema da UnB criariam (ou ajudariam a criar) dois novos cursos de cinema no país. Um foi Paulo Emílio

Salles Gomes, que ajudaria a formar o curso de Cinema da Escola de Comunicações Culturais (mais tarde, Escola de Comunicações e Artes – ECA) da USP. O outro foi Nelson Pereira dos Santos.

A experiência do magistério da UnB havia sido rica para Nelson – mas prematuramente abortada. Em 1968, ele propõe ao reitor da Universidade Federal Fluminense, Manoel Barreto Netto, criar um Curso de Comunicaçào semelhante àquele de Brasília. (...) Em maio de 1968, Nelson é designado responsável pelo setor de arte cinematográfica da UFF e, junto com outros professores, recebe a tarefa de estudar as diretrizes para o funcionamento do Instituto de Arte e Comunicação. (...)[ii]

Além das diretrizes para o futuro IACS, Nelson também realiza, com os alunos, o primeiro filme da UFF: (...) "Daí ele [Nelson] apareceu e disse que tinha a grande solução: íamos fazer um filme sobre a universidade, sobre a reforma universitária e as suas influências na UFF.(...)" (...) para impedir eventuais obstáculos à execução do projeto na própria UFF, Nelson tomou as suas providências: "Logo no primeiro dia foi filmar o reitor. Botou a câmera na sala dele, ficou o compromisso armado. Não tinha jeito. E quando a gente precisava de alguma coisa, dizia logo: ei, reitor, lá embaixo não estão deixando a gente entrar com a câmera..." [iii] O resto é história – aliás, uma história de 37 anos de criatividade e formação de grandes profissionais para o audiovisual brasileiro, como Tizuka Yamazaki, Paulo Halm etc.

Últimas considerações

O surgimento dos primeiros cursos superiores de cinema no Brasil coincidiu ou vinculou-se à criação e disseminação dos cursos de comunicação social em cujo âmbito os organismos estatais de educação os incluíram como uma “habilitação”. Os cursos de comunicação, por sua vez, resultaram inicialmente dos cursos de jornalismo, cuja implantação havia sido um reclamo da categoria profissional e depois do forte impulso ganho pelo mercado televisivo e publicitário no país a exigir quadros especialmente formados para nele atuarem Lembremos que os profissionais de cinema provinham de duas extrações básicas: uma, de técnicos que aprendiam na prática, sem qualquer exigência de escolaridade, até mesmo fundamental, e de pessoas oriundas de uma escolarização avançada ou superior almejando exercer o cinema como uma arte expressiva. Na biografia de muitos dos cineastas encontramos sua passagem pelas faculdades, de várias áreas, concluídas ou não, com cuja especificidade eles rompem mas sem dúvidas nas quais obtiveram bastante de seu estofo cultural e sobretudo sua politização Os cursos de comunicação, com suas vertentes hegemônicas no jornalismo e na publicidade, preparavam principalmente quadros habilitados a atuarem em empresas de comunicação, ou seja, na condição de assalariados e submetidos às regras e objetivos destas empresas. No caso de jornalismo o apelo a uma vocação “expressiva” sempre foi muito forte e ainda mais exaltado dada a circunstância histórica da censura durante longo período das décadas de 60 e 70; contudo, de qualquer modo, o recém profissional via-se diante do desafio não apenas de apurar as técnicas próprias do jornalismo como de adaptar-se a um universo em que o fazer era e é em grande parte determinado por diretrizes ditadas pelos interesses das empresas para as quais trabalham, criando, com isto, uma tensão característica da trajetória de quase todos os egressos daqueles cursos. Em publicidade, dado o pressuposto dogmático dela se destinar a “atender ao cliente” este tipo de contradição não se evidenciou e a vocação “expressiva” do jóvem encontrava estímulo em sua “criatividade” ou então familiaridade com os “negócios” característicos da vida de mercado O futuro cineasta, por sua vez, nem podia contar com esta destinação empregatícia e tãopouco podia confiar que sua atividade estivesse a serviço de demandas muito precisas do mercado ou mesmo da sociedade de modo geral. De fato, o cinema no Brasil jamais chegou a se constituir numa “indústria” em seu sentido pleno, com uma rede de empresas a produzirem em tempo contínuo, de tal modo que “trabalhar em cinema” sempre apareceu como uma atividade sazonal e descontínua e na qual não se chagava a criar relações empregatícias estáveis. Além disso, o que é decisivo, o cinema no Brasil sempre foi marcado por iniciativas que se alimentaram da insistência de seus realizadores, já que sua presença na sociedade e ainda mais no mercado nunca chegou a se constituir num fenômeno irreversível. Por isto, coube em grande parte aos próprios realizadores “inventar” a necessidade do cinema, quase que impô-la como condição indispensável de objetivos culturais e políticos estratégicos do país Assim, enquanto jornalistas e publicitários encontravam espaços configurados por explícita demanda social e de mercado (aos quais tinham que submeter-se como assalariados) os cineastas eram levados a justificar sua necessidade, numa situação ambígua e precária, ora alocando-se nos nichos de produção que ainda encontravam relativo suporte de público, ora exercendo pressão sobre o Estado para que este os reconhecesse e ao cinema como componentes estratégicos de sua política -- o que evidentemente se complicava dado o caráter autoritário do regime e da trajetória politicamente divergente de boa parte dos cineastas

No entanto, exatamente esta situação imprecisa de demanda social alimentou a concepção “criadora” e autoral do cinema, uma vez que, não sendo convocado a exercer uma função previamente codificada e “necessária”, os cineastas sentiam-se à vontade para agir segundo suas motivações pessoais e invocando estritamente seus compromissos com a “idéia” de cinema que postulavam Paralelamente, a época de criação de cursos de comunicação e do afluxo de jovens interessados em estudar cinema nas universidades foi também a da expansão da televisão, que veio a estabelecer no Brasil um efetivo mercado profissional e uma cultura da “imagem” e da dramaturgia peculiares, ao arrepio do cinema e mesmo seu concorrente na preferência do público. Com isto, o “cineasta” defrontouse com uma realidade inóspita, pois o que no Brasil melhor representou o sucedâneo da “indústria cinematográfica”, a televisão, não correspondia às suas expectativas “criadoras”, ao contrário seguindo os passos verticalizadores da produção em série característica do mundo empresarial e rigorosamente atento aos indicadores de mercado, além de estar sempre sob vigilância ideológica do regime de então. A redemocratização do país, no entanto, foi contemporânea ao processo de literal «liquidação» do aparato de produção existente e, a partir sobretudo, do governo Fernando Collor, lançou o Cinema brasileiro, assim, como as Artes em geral, numa retração drástica da qual, mesmo com as leis de incentivo subsquentes, ainda não se livrou, ressurgindo recentemente, como alternativa inexorável, a proposição de formas de promoção estatal. A «retomada» ao final do século 20 motivou a criação de Cursos de Cinema, desta vez em formatos variados e não necessariamente vinculados à área de Comunicação -- cursos técnicos superiores de curta duração, em nível de pós-graduação lato-sensu e cursos livres -- atendendo a uma demanda crescente de jovens. Ao mesmo tempo que muitos cursos de Jornalismo e Publicidade ensaiaram constituir-se de modo autônomo, as diretrizes curriculares do MEC reiteraram sua vinculação, bem como a das demais «habilitações» ao curso de Comunicação Social numa insistência que, para muitos, não corresponde ao estado atual dos estudos e do mercado destas áreas. O rápido desenvolvimento das tecnologias da imagem e do som, especialmente dos processos de digitalização, oferecendo maior agilidade e economia de meios, vem impondo aos Cursos de Cinema e Audiovisual uma atualização de infra-estrutura para a qual os recursos disponibilizados pelos governos mostram-se insuficientes. A despeito disso, pode-se constatar que os egressos dos Cursos de Cinema e de Audiovisual tem obtido razoável êxito em posicionar-se no mercado, uma vez que outros campos de produção, como da TV, passaram a recorrer a esta força de trabalho.

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