INVESTIGAÇÃO
BIOMETRIA E PUBERDADE FEMININA
RAYMOND VICTOR HEGG 1 ROBERTO HEGG2
RESUMO Um grupo de 543 escolares femininas de 8 a 16 anos, brancas, brasileiras, clinicamente sadias, alunas de um colégio religioso de São Paulo, é analisado em termos de crescimento e desenvolvimento relacionado com a puberdade, através das seguintes medidas: peso, estatura, comprimento troncocefálico, comprimento dos membros inferiores, comprimento do membro superior, segmento superior, segmento inferior, diâmetros biacromial e bicrista ilíaca, dobras cutâneas tricipital, subescapular e supracris-
Inúmeras são as modificações de ordem morfofísio e psicológicas que se processam no organismo humano durante crescimento e desenvolvimento e diretamente ligadas ao surto pubertário. Neste estudo transversal analisamos apenas o comportamento e a variação de algumas medidas biométricas num grupo de escolares femininas de 8 a 16 anos, faixa etária dentro da qual se processa habitualmente a puberdade. Disciplina de Biometria Humana da Escola de Educação Física da Universidade de São Paulo. Apresentado na 29.a reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (São Paulo, 1977). 1 Professor Titular de Biometria Humana. 2 Médico Assistente da Clínica Ginecológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Aceito para publicação em 10 de dezembro de 1979.
ta ilíaca. O desenvolvimento pubertário é visto em números absolutos e em função da idade através do desenvolvimento mamário, desenvolvimento piloso pubiano e axilar e menarca, sendo este último evento adotado como critério para definir puberdade, classificando-se as alunas em púberes e não púberes. Nas idades de 8, 9 e 10 anos todas as alunas são impúberes; aos 16 anos todas são púberes; nas idades intermediárias há os dois grupos, e os valores médios das 12 medidas apresentam-se mais elevados nas meninas púberes que nas não púberes. A significância ao nível de 5% através de teste t é analisada.
Material e métodos Durante o ano letivo de 1974 medimos 543 alunas do Colégio Pio XII na cidade de São Paulo, todas caucasóides, brasileiras, pertencentes à classe sócio-econômica média alta e clinicamente sadias segundo os padrões habituais. Deixamos de incluir no total citado 24 escolares pelo fato de 22 estarem sob tratamento medicamentoso para correção de excesso de peso, 1 por apresentar acentuada escolióse e 1 por seqüela de paralisia infantil afetando o aparelho locomotor. Todas as 543 alunas foram medidas e avaliadas no seu desenvolvimento pelo mesmo examinador (R.V.H.) apresentando-se as
mesmas em trajes sumários; os dados foram colhidos no período da manhã para as alunas das 5.as às 8.as séries do 1.° grau, e à tarde para as alunas das 3.as e 4.as séries do mesmo grau, contando-se com a colaboração, em cada período, de uma mãe de aluna para as devidas anotações. O crescimento foi avaliado através das seguintes medidas: peso, estatura, comprimento tronco-cefálico, comprimento dos membros inferiores (diferença entre estatura e comprimento tronco-cefálico), segmento inferior (distância púbis-solo), segmento superior (diferença entre estatura e segmento inferior), comprimento do membro superior, diâmetro biacromial e bicrista ilíaca, espessura das dobras cutâneas tricipital, subescapular e supracrista ilíaca. O surto pubertário foi analisado através de desenvolvimento mamario, desenvolvimento piloso pubiano e axilar segundo padrões dados por Tanner 6 . As alunas foram distribuídas em dois subgrupos, não púberes e púberes, admitindo-se como conceito de puberdade o fato da aluna já ter tido sua menarca. Parte do instrumental utilizado foi igual ao usado na pesquisa de Marcondes & cols. 3 ; o segmento inferior e o membro superior foram medidos com antropômetros metálicos segmentares referidos por Hegg & Luongo 1 ; o comprimento do membro superior e as três dobras cutâneas foram obtidos sobre o lado esquerdo do corpo, sendo as três últimas tomadas com o Harpenden skinfold caliper obedecendo à técnica descrita por Tanner 7 ; os grupos etários foram constituídos segundo a data do nascimento com variação de mais ou menos 6 meses e em função da data da medida.
Resultados As medidas tomadas, analisadas em termos de média aritmética, desvio-padrão e amplitude de variação, assim como as variações condicionadas pela puberdade, são apresentadas nas tabelas 1 a 17. O desenvolvimento pubertário, em freqüência absoluta e relacionado com a idade, é apresentado na tabela 18.
Discussão Há, de maneira geral e em função da idade, aumento dos valores médios das medidas sendo mais elevados no subgrupo das alunas púberes do que nas não púberes.
O peso, por razões técnicas, só foi determinado em 468 escolares (tabela 1) sendo mais elevado nas púberes que nas não púberes, com significancia ao nível de 5% nas idades de 11, 12, 13 e 14 anos. Para um aumento estatural de 30,71cm (tabela 2) dos 8 aos 16 anos corresponde um aumento de 14,17cm no comprimento do membro superior, o qual, em termos de porcentagem da estatura, apresenta variações pequenas havendo, contudo, entre as idades extremas, um maior aumento relativo do membro superior; por outro lado os maiores aumentos médios das duas medidas situamse nas faixas etárias 9/10, 10/11, 11/12 e 12/13, coincidindo com o surto pubertário que no sexo feminino tem início geralmente em torno dos 9/10 anos. O pico da velocidade de crescimento estatural (PHV) situa-se, na maioria dos casos, na vizinhança da idade de aparecimento da menarca, precedendo-a porém conforme assinalam Onat & Erten 5, Tanner 6 e Marshall & Tanner 4 . Os valores médios da estatura (tabela 3) e do comprimento do membro superior (tabela 4) são mais elevados nas púberes com significancia ao nível de 5% aos 11 e 12 anos. Aos 15 anos ainda há uma aluna não púbere, porém, com elevada estatura, pois a mesma ultrapassa 3,80cm a estatura média das púberes de mesma idade. Os valores médios do comprimento tronco-cefálico, em porcentagem da estatura (tabelas 5, 6 e 7), diminuem gradativamente dos 8 até os 13 anos aumentando em seguida, acontecendo o inverso com o comprimento do membro inferior, de acordo com o padrão de crescimento estatural. O mesmo se verifica com relação aos segmentos superior e inferior (tabelas 8, 9 e 10); convém frisar que em nenhuma idade os valores médios se apresentam iguais predominando ligeiramente, em porcentagem da estatura, o segmento inferior, quer seja em todo o grupo, quer seja nos dois subgrupos. O diâmetro biacromial aumenta 6,45cm dos 8 aos 16 anos (tabela 11) porém, em porcentagem da estatura, ele apresenta pequena variabilidade; os valores médios nas alunas púberes (tabela 12) são mais elevados que nas não púberes com significancia ao nível de 5% aos 11, 12, 13 e 14 anos. O diâmetro bicrista ilíaca apresenta um aumento de 6,69cm entre as idades extremas (tabela 11) sendo que o aumento anual é gradativamente progressivo em porcentagem da
estatura; os valores médios nas alunas púberes (tabela 13) são mais elevados que nas não púberes com significancia ao nível de 5% aos 11, 12, 13 e 14 anos. O aumento progressivo do índice acrômio-ilíaco em função da idade (tabela 11) mostra de maneira clara o alargamento da pelve feminina em decorrência do surto pubertário, fato que constitui uma das características de diferenciação sexual. Os valores médios das medidas das três dobras cutâneas (tabela 14) apresentam variação irregular nas diversas idades sendo maiores nas púberes com significancia ao nível de 5% aos 13 e 14 anos (tabelas 15, 16 e 17). O desenvolvimento pubertário (tabela 18) apresenta-se, de maneira geral, dentro dos
padrões definidos por diversos autores, entre eles Marshall & Tanner 4 , Lee & cois. 2 e Onat & Erten 5. Na faixa etária de 8 anos há uma aluna com desenvolvimento mamario no estágio 2; uma aluna não púbere de 11 anos apresenta apenas pilosidade axilar no estágio 2; a única aluna não púbere com 15 anos, apesar de sua elevada estatura, tem ambos os desenvolvimentos mamario e piloso pubiano no estágio 3 e ausência de pêlos axilares. As 26 alunas púberes de 16 anos têm ambas as pilosidades e o desenvolvimento mamario distribuído pelos estágios 4 (2 alunas) e 5 (24 alunas). Convém assinalar que nas alunas púberes de mais idade torna-se difícil, às vezes, a identificação dos diversos estágios das pilosidades axilar e pubiana pelo fato das jovens recorrerem à depilação.
SUMMARY A group of 543 white female studentes from 8 to 16 years, brazilian, clinically healthy, from a São Paulo religious school, is analised concerning growth and development relating to puberty throuth the following measures: weight, height, sitting-height, length of inferior limbs, length of superior limb, superior segment, interior segment, bi-acromial and supra-iliac skinfolds. The puberal development is seen in absolute figures and in function of age through mamal
REFERÊNCIAS 1. HEGG, R. & LUONGO, J. — Elementos de Biometria Humana. São Paulo, Livraria Nobel, 1971. 2. LEE, M. M. C., CHANG, K. S. e CHAN, M. C. — Sexual maturation of chínese girls in Hong Kong. Pediatrics 37:389, 1963. 3. MARCONDES, E.; BERQUÓ, E. S.; YUNES, J.; LUONGO, J.; MARTINS, J. S.; ZACCHI, M. A. S.; LEVY, M. S. F. & HEGG, R. — Estudo antropométrico de crianças brasileiras de zero a doze anos de idade.
Endereço para correspondência: Rua Abílio Soares, 1.437 São Paulo — SP — CEP = 04005 Brasil
development, pubic and axilar hair development, and menarche, being this last event adopted as criterion to define puberty, the students being classified as pubescent and non pubescent. At the ages of 8, 9 and 10 years, all students are non pubescent; at 16 years all are pubescent; at the intermediate ages there are both the groups, and the medium values of the 12 measures studied are higher in the pubescent students than in the non pubescent The significance at the level of 5% through t test is analised.
Anais Nestle n.° 84, 1971. 4. MARSHALL, W. A. & TANNER, J. M. — Variations in the pattern of pubertal changes in girls. Arch. Dis. Child., 44:291, 1969. 5. ONAT, T. & ERTEN, B. — Adolescent female height velocity: relationships to body measurements,sexual and skeletal maturity. Human Biol. 46:199, 1974. 6. TANNER, J. M. — Growth at adolescence. Oxford, Blackwell, 1962. 7. TANNER, J. M. — The measurement of body fat in man. Brit. Nutr. Soc. 78:148, 1959.