Expressionismo “Dinâmico, pleno de cor e carregado de emoção, o Expressionismo foi a contribuição da Alemanha à arte moderna.” Trevin Copplestone
Antes de 1860, a Alemanha não era um país como o conhecemos hoje e sim uma confederação de estados. De todos eles a Prussia era o mais forte. Seu monarca, Otto Van Bismark estava convencido que a Alemanha devia ser unificada e que ele como “premier”da Prussia devia tomar a iniciativa. Para convencer os estados dessa necessidade, atiçou o fervor patriótico e lançou-se a várias campanhas bélicas contra a Dinamarca, a Áustria- Hungria, a França ( onde morrerá o pintor Bazille ). Estas campanhas deflagradas por uma aparente “causa comum” acabam convencendo os príncipes, duques e inclusive, o rei da Bavaria da necessidade de obedecer a um único monarca , Guilherme Primeiro, Imperador de toda a Alemanha. O pais unificado entra repentinamente na Revolução Industrial exigindo do seu povo, predominantemente agricultor, um grande sacrifício. A nova Alemanha se alimenta dos pressupostos prussianos, obediência e disciplina militar e devido a seu rápido crescimento se vê elevada a uma posição de destaque entre os países europeus Berlim vira capital em1871, sem rivais em desenvolvimento industrial e econômico, mas falha e sem tradição na área cultural, o que sobrava ás cidades de Praga e Viena . Para remediar esta situação o governo dá emprego aos artistas pensando que assim, os atrairia à capital que se constituiria num dos centros europeus de importância cultural ;mas chegada a última metade século XIX ,com a revolução nas artes visuais que explode em Paris, Berlim percebe que os arcos, as avenidas e os parques, mera imitação da Cidade Luz, não a convertem num espaço cultural significativo e que não passa de uma grande cidade provinciana. Os próprios artistas assim o reconhecem. Munich e Dresden continuam centros onde o pensamento moderno tem oportunidade de se desenvolver. Os dois grupos expressionistas de mais renome foram Die Brucke ( a Ponte ) em Dresden e Der Blaue Reiter ( Cavaleiro Azul ) em Munich. ‘A geração expressionista se forma baixo um clima social tenso, com a imposição dos cânones militaristas prussianos , o que lhe valeu a denominação de “Geração em revolta” dada por Bernard Meyer. Estamos diante de uma geração de pintores que produzem num clima de rebeldia e se engajam
politicamente, colocando sua obra a serviço dos ideais políticos revolucionários. Vale constatar que toda vez que o Expressionismo renasce em nosso século, são essas as marcas que o acompanham. “Ser expressionista é ser jovem em um mundo cansado e velho, é acreditar na dissolução da sociedade, na idiotice das massas, na falsidade da pintura que adere ao sistema, é acreditar na ação comunitária” diz Frank Whitford. Se observarmos o nome das publicações expressionistas será fácil adivinhar que seus heróis foram Nietsche e Marx . Vejamos o nome das publicações : The Storm ( A Tempestade ), The Cry ( O Grito ), The Torch ( A Tocha ), The Action ( A Ação ). Os jovens expressionistas crescem nas mordomias burguesas do Império Alemão, no entanto se negarão, sem excepção, a compactuar com a ideologia da classe dominante. O primeiro ato de rebeldia é contra a família, simbolizada na figura do pai. A insatisfação com os valores hipócritas e moralistas da instituição familiar e do país ; a constatação de viver num mundo injusto e cruel, onde poucos usufruíam das benesses, deu como resultado dois trágicos suicídios e o aumento do consumo de drogas no meio de artistas e intelectuais. Chocar à sociedade era um impulso incontrolável. Oscar Kokoschka ,o grande pintor austríaco , vivia com uma boneca de tamanho natural, ia á ópera com ela, simplesmente porque queria ultrajar os burgueses. Acreditavam que uma nova ordem social erradicaria á velha e que só uma verdadeira revolução faria essas idéias virarem realidade. Estes ideais se consolidam quando os artistas sobreviventes da guerra de 1914 voltam ao trabalho. O horror da guerra apagou o brilho juvenil e a fé daqueles que a viveram e uma profunda amargura os contagia. Para muitos, no entanto, a guerra poderia limpar a Europa da mediocridade reinante. Durante o século XIX o Romantismo e o Naturalismo eram estilos que predominavam na Alemanha. Quando o Impressionismo chega, a produção alemã é uma imitação da pintura francesa, uma pintura antiquada e sem nenhuma atração. Com a crítica situação social e política que Alemanha vive no fim do século XX e a herança romântica e naturalista o que diferencia o Impressionismo alemão do francês é sua emocionalidade ( ver ali a semente expressionista ). O encontro com as obras dos post-impressionistas, especialmente com as de Van Gogh e Guaguin fornece a solução para a busca temática e técnica à que os pintores alemães estavam dedicados: As emoções podem ser expressadas pela cores, usando a tinta diretamente do tubo sem mistura-la na paleta ,fazendo com que a emoção se manifeste diretamente. Não podemos deixar de lado a importância da influência do Simbolismo sobre os expressionistas. O Simbolismo nasceu entre poetas que gravitavam entorno de Mallarmé Verlaine e Rimbaud . “Chamar um objeto pelo seu nome é suprimir três quartos do prazer do poema; sugerir, esse é o sonho”, declaravam os poetas e os pintores expressionistas adotaram a idéia. Van Gogh escreve “No lugar de tentar pintar exatamente o que tenho diante dos meus olhos, eu uso as cores de forma arbitrária , de forma a me expressar com
mais força”. Estas palavras descrevem a técnica com a qual os expressionistas se expressarão. Esta é a chave do método utilizado pelos pintores alemães, que dará como resultado uma arte difícil, trágica , que enfoca a condição humana das minorias e impregna cada pincelada com sua dor. Guaguin , do mesmo modo, não utilizou a cor de forma realista ( ver a “Visão após Sermão” ) acrescentando a ela, o poder simbólico da linha.( Uma linha estreita, por exemplo, poderia significar o infinito.) Outro artista teve grande influência na pintura expressionista alemã, o norueguês Edvard Munch que morou na Alemanha e pintou as profundezas dos estados mentais extremos, analisando com atitude pessimista o sexo feminino,como a mulher devoradora do homen. Como Guaguin , ele também ,acreditava no valor simbólico da cor e da linha. No “Grito”( sua obra mais conhecida e discutida ), a composição, a distorção do espaço, os contornos e as cores agressivas, tudo ,alude ao tema. O escandinavo Strindberg com sua obra teatral, teve muitos adeptos entre os jovens pintores. Mas Gauguin ,com sua procura incansável do “paraíso perdido”, que o levou ao Brasil, à América Central e finalmente ao Taiti , expressa o desejo latente dos expressionistas , o de reencontrar a limpeza de espírito perdida nos séculos de história que o homem dedicou à conquista de bens materiais . Esta visão primitivista influencia ,através de Kirchner ,o desenvolvimento do estilo de “Die Brucke. Da África, da Nova Guiné, da América, dos Países Nórdicos chega a magia da arte primitiva, o mistério da vida plasmado em imagens . Paralelamente à formação do expressionismo, se consolida um movimento internacional de arte decorativa, a Art Nouveau ( na Alemanha Jugendstil ).A Art Nouveau se mostra aparentemente como um estilo fútil e decorativo, utilizando como elementos centrais de sua estética a abstração de formas naturais. Um estilo simbolista que merece um estudo detalhado e profundo ( ver Gaudí, van de Velde e Klimt ) já que está presente na concepção formal de vários pintores, como o vemos na obra de Munch. A influência da arte gótica também está presente na produção expressionista. Anos antes da formação do Die Brucke, os artistas alemães buscavam em seu passado gótico, em pintores como Cranach e Grunewald da Escola de Colônia , a fonte da estética alemã enquanto a Renascença Italiana foi deixada de lado como influência estranha ao espírito alemão. Para o teórico alemão Worringer a arte gótica alemã se desenvolve num ambiente hostil o que contribui para o nascimento de uma força plástica, mística e de fácil comunicação com o povo. Para os expressionistas a lição gótica deve ser fervorosamente assimilada: se formam verdadeiras comunidades de artistas e intelectuais, onde se trabalha, se discute e se troca experiências . A xilogravura , da qual Cranach e Durer foram grandes mestres, volta ao panorama das artes , assim como volta a ser uma preocupação do artista o diálogo com as minorias. Resumindo , o Expressionismo alemão é influenciado por Van Gogh, Gauguin,( o Neoimpressionismo ), o Simbolismo, a Arte Primitiva, a Art Nouveau, e o medievalismo. DIE BRUCKE 1905 Dresden Fundado por: Kirchner, Bleyl, Heckel e Rottluff.
Kirchner e Heckel são jovens estudantes de arquitetura, quando decidem formar o grupo com a intenção revolucionar o caminho da arte alemã e a natureza de sua sociedade. A partir desta pretensão , nada modesta, nasce o primeiro movimento de arte alemã de importância mundial após 300 anos. Fato que se reveste de maior importância quando vemos que o mais jovem do grupo tinha 19 anos e o mais velho 25 anos. Três exposições foram decisivas para a formação do grupo: a de Cézanne e Monet em 1896, a de Munch em 1900 e a de Vincent Van Gogh em 1905. “Com fé no progresso e numa nova geração de criadores e apreciadores da arte; como representantes da juventude, queremos estabelecer a liberdade de vida e um movimento de oposição contra a estreiteza das velhas forças”. ( Manifesto de Die Brucke ) O primeiro a ser convidado para formar parte do grupo foi Nolde após sua exposição em Dresden. “O grupo de artistas conhecido como Die Brucke ficaria honrado de tê-lo como membro. Naturalmente nada sabe sobre nós , como nós nada sabíamos de você. Pois bem um de nossos objetivos é atrair os elementos revolucionários, e agitadores (...). Assim , meu caro Nolde, pense como quiser e o que quiser (...) esta é a nossa oferta para sua tempestade de cor. Assinado: Brucke”. Pechstein escreve: “Estava decorando o teto no Pavilhão de Artes e Ofícios ( recomendado por professores da Academia ) e decidi variar o tom de minhas tulipas (...) . No dia seguinte quando voltei para continuar com o meu trabalho, fiquei horrorizado quando vi que o vermelho ardente com o qual eu as tinha pintado tinha sido escurecido com pincelada cinzentas (...). Eu nada podia fazer porque já tinham retirado os andaimes , e no chão desesperado escutei que alguém atrás de mim , insultava os mestres que tinham feito aquilo. Era Heckel (...) Passei a fazer parte do grupo.” Assim novos companheiros engrossam às fileiras: Nolde, Nolken, Pechstein , Otto Muller. O reconhecimento do Die Brucke se dá em 1912 em Colônia onde as obras dos participantes são mostradas ao lado de obras francesas de renome. O grupo se desfaz em 1913 quando o objetivo fora alcançado: juntos, criar a nova arte alemã. Suas fortes personalidades falaram mais alto do que o trabalho em comum mas não existiram em vão. Em 1909 Kandinsky, Jawlensky, Munter, Marianne von Werfkin e Franz Marc estão entre os artistas de Munich que fundam a Nova Associação de Artistas em 1910. Na segunda exposição, serão introduzidos trabalhos de Picaso, Braque, Rouault entre outros. Para o catalogo , Kandinsky, presidente da Associação escreveu : “ (...) Vergonha para aquele que tenha a faculdade de transmitir as palavras necessárias por meio da linguagem da arte e não o faça. Vergonha para quem deixe de ouvir a arte . Um ser humano fala aos seres humanos acerca do sobre-humano, a linguagem da arte”. Em 1911 se da a ruptura. Kandinsky se nega a cumprir uma norma do juri e deixa o grupo com Franz Marc e outros. Der Blaue Reiter: 1911 – 1a Exposição dos editores do Cavaleiro Azul – Kandinsky e Franz Marc. Foram 3 exposições até 1912, convidados : Picaso, Braque, Derain e os membros do Brucke : Hans Arp, Klee, Nolde, Malevich e outros. Neste ano sai o almanaque do Cavaleiro Azul. Vejamos o que diz Kandinsky : “(...) foi nessa altura ( entre 1908-1910 ) que nasceram todos os “ismos” e as “guerras civis” temperamentais. Dois movimentos nasceram , praticamente, no mesmo dia ( 1911-1912 ) a pintura cubista e a abstrata
( absoluta , logo depois surgiram o expressionismo, surrealismo, dadaismo e em breve se veria qual o vencedor ... (...) Eu me encarreguei de traduzir os artigos dos artistas russos. Marcke dedicou-se a um artigo sobre mascaras, desenhos de crianças, arte primitiva, Egito, Islam etc , excelente e Franz Marc trouxe a Berlim material do Bruscke desconhecido em Munich”. O almanaque marcava o fim de uma associação de artistas tal como aconteceu pouco depois com o Brucke. Por outro lado, o Cavaleiro Azul, atingiu as artes visuais, a música, o teatro, realizando o desejo explícito de Kandinsky a irrupção da arte abstrata. O Cavaleiro Azul fez com a cor azul , inserida no seu nome , uma homenagem à cor predileta dos artistas românticos alemães . A pesar de sua curta duração como movimento ,muitos artistas colaboraram com ele , além de Kandinsky e Franz Marc , por alí passaram Paul Klee, Kubin , Macke, entre outros. Der Sturm Em Berlim o Sturm ( a Tempestade ) era um jornal dedicado á literatura, fundado por Henwarth Walden em 1910 . No começo era vendido em Berlim e Viena. Kokoschka que rompera com os expressionistas em Viena vai a Berlim e vira ilustrador do Sturm começando a influenciar a linha editorial do jornal, incluindo artes visuais e críticas. O próprio Walden organiza a 1a exposição expressionista de toda a Europa incluindo os pintores fauves, Munch, Kokoschka e o Blue Rider de Munich. Publica na Alemanha o Manifesto Futurista da Pintura que influenciará à pintura alemã. (O cubismo não teve essa força, possivelmente por não ter “todo o aparato teórico desejado” como diz Whiteford ). O futurismo propunha ainda, uma nova sociedade e um novo homem. Em 1916 abre a Escola Sturm e Walden publica livros de arte ( Biografia de Kansdinsky, História do Cubismo, a Arquitetura de Vidro, etc )”. Em 1918 Der Sturm será o centro do que há de mais avançado em atividades artísticas. A Guerra de 1914 e seus horrores provam a necessidade de se expressar conforme as propostas de engajamento político e filosófico expressionista. Após a guerra Der Sturm deixa de ser pioneiro. Vários jornais, revistas e galerias apóiam os estilos modernos. O Expressionismo pode ser estudado através dos diferentes grupos, mas houve artistas que ficaram totalmente independentes, ou ligados aos grupos esporadicamente como Emil Nolde, Ensor ou Meidner. Entre os artistas austríacos Klimt é seu grande expoente ( ver O Beijo ) ligado ao gosto Art Nouveau, seu trabalho teve um sucesso fenomenal. Oscar Kokoschka é outra grande figura artística vienense, criada nos meios intelectuais onde primavam as discussões sobre as idéias de Freud. A guerra trouxe também à tona, com mais ênfase, a questão da injustiça social. Nesse sentido a Rússia deu uma resposta com a Revolução Comunista que os artistas europeus apoiaram, inclusive, formando um grupo de “trabalhadores da arte” : O Grupo Novembro. O resultado das discussões sobre a educação e sobre o socialismo vai desembocar na criação da Bauhaus fundada em Weinar por Walter Gropius, e como professores: Kandinsky e Klee, entre outros. Os currículos se basearam nas idéias expressionistas. O Expressionismo é formado por artistas que incursionam por várias linguagens. O estilo revoluciona a poesia, a literatura (ver Kafka), o teatro, a arquitetura (ver Erich Mendelsohn ), o cinema ( ver Gabinete do Dr. Caligari 1914 ) Geroge Grosz, Otto Diz, Beckman levam a força o Expressionismo através da 1 a metade do século XX.
No Brasil Goeldi, algumas obras de Anita Malfati e, em especial, Lazar Segall são magistrais representantes do estilo que colocou e coloca as angústias da condição humana como tema central da expressão artística.