Projeto PERGUNTE E
RESPONDEREMOS ON-LINE
Apostolado Veritatis Spiendor com autorizacáo de
Dom Estéváo Tavares Bettencourt, osb (in memoriam)
APRESENTAQÁO DA EDigÁO ON-LINE Diz Sao Pedro que devemos estar preparados para dar a razáo da nossa esperanca a todo aquele que no-la pedir {1 Pedro 3,15). Esta necessidade de darmos conta da nossa esperanca e da nossa fé hoje é mais premente do que outrora, visto que somos bombardeados por numerosas correntes filosóficas e religiosas contrarias á fé católica. Somos assim incitados a procurar consolidar nossa crenca católica mediante um aprofundamento do nosso estudo. Eis o que neste site Pergunte e Responderemos propoe aos seus leitores: aborda questóes da atualidade controvertidas, elucidando-as do ponto de vista cristáo a fim de que as dúvidas se dissipem e a vivencia católica se fortalega no Brasil e no mundo. Queira Deus abencoar este trabal no assim como a equipe de Veritatis Splendor que se encarrega do respectivo site. Rio de Janeiro, 30 de julho de 2003.
Pe. Esteváo Bettencourt, OSB
NOTA DO APOSTOLADO VERITATIS SPLENDOR Celebramos convenio com d. Esteváo Bettencourt e passamos a disponibilizar nesta área, o excelente e sempre atual conteúdo da revista teológico filosófica "Pergunte e Responderemos", que conta com mais de 40 anos de publicacao. A d. Esteváo Bettencourt agradecemos a confiaca depositada em nosso trabalho, bem como pela generosidade e zelo pastoral assim demonstrados.
índice pág.
AMOR A VERDADE
141
O Egllo em foco :
CRISTAOS E MUCULMANOS NO EGITO
143
Tema cándenle:
"A IGREJA E O RECONHECIMENTO DOS DIREITOS HUMANOS NA
HISTORIA", por Hubert Lepargneur
150
Ñas Mlssas dilas "comunitarias" : UMA SÓ MISSA E MUITAS DOAQOES ?
164
O menino sabio:
UM CASO DE REENCARNAQAO ?
174
Valioso depolmenlci:
FALA WERNER VON BRAUN
177
O V ENCONTRÓ NACIONAL DA ABESC
179
CRISTIANISMO E FILOSOFÍA NA AMÉRICA LATINA HOJE
182
LIVROS EM ESTANTE
184
COM APROVACAO ECLESIÁSTICA
NO
PRÓXIMO
NÚMERO :
«Jesús de Nazeré» de Franco Zeffirelli. — Duas cartas provenientes da U.R.S.S. — Os coloquios vespertinos do Pe. Dmitrij Dudko. — «Eu fui testemunha de Jeová», por Günther Pape.
X
«PERGUNTE
E
RESPONDEREMOS»
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(RJ)
AMOR Á YERDADE
p/e
Narra o Evangelho que certa vez Jesús, tend trado um cegó de nascenga, lhe deu a vista. Pouco depois, esse homem, vendo Jesús, teve a coragem de reconhecé-lo
como Messias. Ao presenciaren! esses fatos, os fariseus procuraram furtar-se ao seu significado, e acabaram expulsando
da sinagoga o que fora curado; Jesús entáo lhes disse:
"Para julgamento é que vim a este mundo: para que os
que nao véem, vejam, e os que véem se tornem cegos... Se vos, fariseus, fosseis cegos, nao teríeis culpa; mas, pois que dizeis 'Nos vemos', o vosso pecado permanece" (cf. Jo 9,1-41).
Descreyendo tais acontecimentos, o evangelista alude a dois planos da realidade: o das coisas visíveis e o dos valores
invisiveis. O cegó obteve a vista física e desta passou para a visáo da fé. Ao contrario, os fariseus, que já tinham a visáo física, cairam na cegueira da incredulidade... A razáo por que os homens assim se diferenciavam, é que o cegó tinha um coragáo reto; nenhum obstáculo moral o impedia de discernir a transparencia ou a presenga do próprio Deus através dos tragos humanos de Jesús. Ao invés, os fariseus tinham o coracáo entravado por paixóes; por isto eram cegos para o significado da realidade física que eles percebiam; diante da evidencia da verdade, recorreram a subterfugios e sofismas. Foi, portante, com muita razáo que disse O Senhor: «Bem-aventurados os que tém o coragáo puro, porque veráo a Deus» (Mt 5,8). Estes dados
1)
do Evangelho sugerem algumas
reflexóes:
Grande é a responsabilidade dos que tém olhos físi
cos sadios.
que véem?
Véem, sim, mas — pergunta-se — entendem o Váo até o ámago dos sinais cuja periferia perce-
bem com os olhos? S. Agostinho nos diz que a realidade que nos cerca, é comparável a enorme letreiro: o analfabeto, ao vé-lo, pode admirar a elegancia dos caracteres bem tragados, mas nao saberá ler ou nao entenderá o que eles significam. Somente quem sabe ler, poderá perceber todo o alcance das linhas que tem ante os olhos. Ora diante dos acontecimentos
de cada dia, que sao sempre sinais de Deus, o homem pode comportar-se como um analfabeto; assiste, acompanha, co menta os dados dos jomáis e das crónicas, mas nao sabe ler* nao sabe ligar os fatos (as letras) entre si, de modo a apreender as palavras e a mensagem que o Senhor Deus de tal modo quer transmitir aos homens. Para superar tal tipo — 141 —
de analfabetismo e para ler a realidade, principalmente para ler os sinais de Deus, é preciso que o homem tenha olhos plenamente abertos, o que supóe Uberdade interior e disponibilidade para a verdade; é mister ter um coragáo desvin culado para que possa ser interpelado e convertido pela ver
dade.
Os fariseus, de olhos abertos, nao tiveram a coragem
de ver o que Jesús significava. Ao contrario, o cegó, que nao tinha olhos, mas tinha o coragáo livre, viu a face humana de Jesús e compreendeu o seu misterio. 2)
Jesús resumiu a sua missáo nos seguintes termos:
"Nasci e vim ao mundo para dar testemunho da verdade. Quem é da verdade, escuta a minha voz" (Jo 19, 37).
Cristo enfatiza grandemente a verdade... Ele veio trazé-la ao mundo. Isto, porque no inicio da historia o homem foi vítima da mentira do tentador e, em conseqüéncia, incorreu na morte. Cf. Jo 8,44. Sendo assim, este tempo de Páscoa (que é o da Vitoria da vida sobreí a morte ou da verdade de Cristo sobre a men
tira de Satanás)
nos incita a conceber, de maneira mais
consciente ainda, o amor á verdade.
Amor á verdade...
A expressáo parece pálida, quando
se pensa em outras expressóes mais usuais: amor a um ente
querido, amor ao dinheiro, amor ao prestigio, amor á carreira... Apesar disto, o amor á verdade é fundamental para um cristáo; este há de amar a verdade em todas as suas acepgóes: — a verdade no plano das realidades humanas, no da historia, no da linguagem, no da vida de cada dia...
Isto
equivale a horror a falsidades, ambigüidades, meias-atitudes, semi-verdades, camuflagens covardes...; — a verdade no" plano da Revelagáo ou no plano da fé..., verdade como fidelidade á Palavra de Deus transmi tida auténticamente pelo magisterio da Igreja..., verdade a ser estudada e aprofundada em Circuios Bíblicos e em cursos de formagáo crista para os diversos niveis do povo de Deus.
«Para conhecer, é preciso amar», dizia sabiamente Blaise Pascal (tl662). E, para amar..., amar a verdade, é pre ciso ter um coragáo livre, isento de paixóes e outros obstá culos.
Que Ele, o Senhor, a todos conceda esta premissa como fruto da sua santa Páscoa! E.B.
— 142 —
«PERGUNTE
E
RESPONDEREMOS» Ano XIX — N* 220 — Abril de 1978
O Egito em foco:
(listaos e muculmanos no egito Em sfntese: A populado do Egito conla aproximadamente 33 miIhdes de muculmanos e seis niilhóes de coptas cristaos monoflsltas, que
professam quase a mesma fé que a Igreja Católica. Os cristaos coptas tém estado sujeltos a lels e prátlcas de dlscrlmlnacBo religiosa que os cercelam em seus direitos clvls. Eis, porém, que o presidente Anwar
Sadat no ano de 1977 se mostrou mais e mais favorável a urna revisSo
de tal estatuto, dando testemunhos públicos de benevolencia aos coptas. Esta atitude, em grande parte, deve-se á lealdade de que os coptas tém dado provas em relacáo ao Governo, delendendo-o contra Invectivas comu nistas; acresce o fato de que a luta contra Israel tem contribuido para avivar em todos os cidadáos egipcios a consclencia da necessária unidade
nacional. A política de simpatia de Sadat em relacSo aos cristaos culmi-
nou por ocasiáo da visita do presidente egipcio a Jerusalém aos 20/11/77. Nessa ocasiáo disse o presidente ao Parlamento Israelense (Knessel): "Nos, cristaos e muculmanos..." O fato, embora nSo tenha tldo o almejado efeito de um Tratado de Paz entre Israel e o Egito, é altamente significativo, dada a nota religiosa que Sadat quls dar á sua demanda de paz.
Comentario: Os jomáis vém falando insistentemente do Egito e de seu presidente Anwar Sadat, que recentemente
surpreendeu o mundo pela sua magnanimidade ou seu desejo de paz e vida nova. As atitudes de Sadat tém sido diversa mente comentadas pelos observadores; nao raro sao avaliadas táo somente segundo criterios políticos. Ora o Governo de Sadat tem-se caracterizado, outrossim, por certa tolerancia religiosa, que revela no presidente do Egito um senso místico apurado e digno de nota. Dado que os pronunciamentos e gestos de Sadat sobressairam no contexto da atual política internacional, vamos abaixo relatar sumariamente as ocorréncias mais notáveis da política religiosa de Anwar Sadat e tecer-lhe alguns comentarios.
— 143 —
4
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS* 220/1978
1.
__
Egito e cren$as religio&as
A populagáo egipcia consta de 33 milhóes de mugulmanos, mais de seis milhóes de cristáos e de crescente número de judeus. Estes sao um grupo de mil pessoas aproximada mente (antes do Governo de Abd-el Nasser eram 80.000).
Os cristáos egipcios sao chamados copias. Esta palavra se deriva do grego Aigyptos; as consoantes do radical respec tivo — g (ou k), p e t — deram, com outras vogais, o nome kopta. Os coptas sao os descendentes da antiga populagáo do país, que, na época dos Faraós e dos reis Ptolomeus Lagidas, criou grandes obras de arte. Abragaram a fé crista, quando esta lhes foi anunciada a partir do século I. Todavía no século V separaram-se da comunháo da Igreja por recusa-
rem o Concilio de Calcedonia (451)
e aderirem ao monofi-
sismo *, que o Patriarca ÉJutiques de Alexandria havia proposto e defendido... A Igreja do Egito teve seus grandes santos e doutores como Dionisio de Alexandria, S. Atanásio de Alexandria, S. Cirilo de Alexandria, Didimo o Cegó... No século VII os árabes invadiram o Egito e tornaram o país até hoje predominantemente mugulmano.
Hoje em día o islamismo é a religiáo oficial da Repú blica Árabe do Egito, constituida em 1971 por Sadat; a sua fonte jurídica é o Direito sagrado dos Sunitas (mugulmanos).
As outras crengas religiosas sao ai toleradas, mas nao gozam de igualdade de direitos; nao lhes é permitido, por exemplo, construir novas igrejas, nem seus membros tém fácil acesso as fungóes públicas; qualquer agáo missionária é severamente punida; o mugulmano que apostatasse da sua fé, estava, até pouco tempo atrás, sujeito a pena de morte. Aos cristáos nao é licito constituir Partidos políticos ou organizagóes para defender os seus legítimos interesses (alias, o mesmo também é proibido aos mulgumanos como tais, com a diferenga de que os mugulmanos já constituem a maioria em todas as instituigóes da vida egipcia). 10 monofislsmo afirmava só haver urna pessoa (divina) e urna natu-
reza (divina) em Cristo, á diferenga do Concilio de Calcedonia (451), que professava uma pessoa (divina) e duas naturezas (a divina e a humana) em Cristo. Hoje em dia os coptas, embora ainda se digam monofisltas, reconhecem, como a Igreja Universal, haver em Cristo, além da natureza divina, a natureza humana, que foi pregada á cruz e glorificada pela ressurrelcfio. Por consegulnte, o que os separa de Roma, é relativamente
Insignificante; tem-se dado crescente aproximado entre o Patriarca copta e a Santa Se.
— 144 —
CRISTAOS E MUCULMANOS NO EGITO
2.
A recente historia religiosa
O presidente Gamal Abd-el Nasser era de origem copta; embora professasse a fé islámica, nao deixou de mostrar sim patía pelos coptas em certos casos. O escritor copta Ramsés Stino, autor da obra «Filosofía da Encarnagáo», tornou-se o grande mentor de Nasser e do socialismo árabe concebido por este. Em 1964, o presidente Nasser langou a pedra fun
damental da imponente igreja patriarcal copta do Cairo, e em 1968 assistiu á consagragáo da mesma. Todavía manteve
os coptas excluidos das maís altas posigóes do exército e da administragáo pública. A situagáo piorou após a morte de Nasser em 1970,
quando o poder foi assumido por Anwar Sadat, que era expoente do islamismo radical e tinha ligagóes com as faná
ticas Fraternidades Derwisch. Em 1971, tendo falecido o Patriarca copta Cirilo VI, o Governo impediu a eleicáo, a Patriarca, do bispo Amba Samuil, tido como ayancado, e favoreceu a de Amba Chenuda, conservador, bem relacionado com o entáo Ministro do Exército, General Sadek. Chenuda III, ainda hoje Patriarca de Alexandria e de toda a África, conheceu, pouco depois de eleito, dura fase de perse-
guigáo aos cristáos: grupos de mugulmanos fanáticos puseram-se a incendiar igrejas com a conivéncia das autoridades governamentais. Apenas urna mulher, Aischa Rateb, entáo Ministro de Estado, ousou protestar em favor dos cristáos oprimidos; em conseqüéncia, numa assembléia reunida na Universidade musulmana Al-Azhar, foi declarada atéia (o que equivalía a excomunháo), resultando-lhe dai a perda de suas funcóes públicas.
Eis, porém, que a situacáo evoluiu para melhor. Durante
a guerra de 1973 contra os judeus, o Governo declarou a
unidad© nacional de todos os egipcios. Isto, porém, nao significava abrandamento das leis religiosas vigentes ou das restrigóes feitas a liberdade de culto dos cristáos.
Em Janeiro de 1977, verificaram-se no Egito motins de origem comunista...; o presidente Sadat perdía a sua popularidade... Todavía os coptas se lhe mostraram fiéis. Esta atitude de lealdade dos cristáos parece ter aberto os olhos do presidente para o significado da minoria copta, que ele
até entáo menosprezara. Em julho de 1977 os extremistas da seita musulmana Takfir-wa-Higra raptaram e mataram o _ 145 _
6
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 220/1978
ex-Ministro dos Cultos e conclamaram os seus concidadáos para constituir urna teocracia confiada a fanáticos. Essa revolta só pode ser debelada mediante a participacáo volun taria de tropas de policiais cristáos do Alto Egito. Tal gesto de fidelidade reforcou a atitude simpática do presidente para com os coptas. Em outubro do mesmo ano de 1977, novo levante comunista foi descoberto. Ora a sucessáo dos acontecimentos motivou Sadat a tomar atitudes publicamente favoráveis aos cristáos. Na mesma época o presidente compareceu á inauguracáo do Hospital copta do Cairo dedicado a S. Marcos Evangelista, e doou do próprio bolso elevada quantia para o bom funcionamento dessa instituigáo crista. Mais:
presente á solenidade inaugural da Casa de Saúde, Sadat proferiu palavras que equivaliam á proclamagáo de nova polí tica do seu governo islámico em relagáo aos cristáos: "Muculmanos e
Nunca
lares
entregaremos
divinas, do
cristáos
ao
sao hoje
urna
materialismo esta
humanismo,
do
só
térra
amor e da
carne
dos
fél"
e
um
profetas,
só
sangue.
das reve
Em sete anos de Governo, Sadat nunca se mostrara táo conciliador quanto naquele momento. O presidente permitiu entáo que se organizassem no Cairo e em outras cidades Fraternidades Cristas, de vida
comunitaria, destinadas á agáo social e ecuménica. Ésses gru
pos suscitaram renovagáo da vida eclesial copta, que quase
só podia contar até entáo com os focos de espiritualidade situados nos mosteiros e ñas colonias de eremitas.
Corre outrossim urna versáo dos fatos segundo a qual, no mes de agosto de 1977, o Patriarca Chenuda III apresentou ao Primeiro Ministro e ao Ministro do Interior do Egito um relatório que expunha as inquietudes dos coptas derivadas
da discriminagáo religiosa praticada no país.
Dizia textual
mente: "Pedimos urna revisáo da sltuacao, de manelra que os cristáos sejam representados no Parlamento e nos órgSos de Governo locáis segundo proporcSo correspondente ás estatlstfcas reais... Pedimos aos responsávels intervenham enérgicamente para suprimir as correntes extremistas e asslm salvaguardar a unldade nacional".
A entrevista de Chenuda com o Ministro do Interior Mamdouh Salem, provocada por tal relatório, nada obteve, pois, a quanto parece, Salem deu a entender ao Patriarca que
— 146 —
CRISTAOS E MUCULMANOS NO EGITO
o Governo tinha preocupares mais importantes do que as apreensóes dos coptas... Todavía aos 21 de setembro de 1977 o presidente Sadat
convidou o Patriarca e trinta e sete bispos coptas para urna audiencia no seu palacio de El-Kanater no Cairo, estando presente também o Primeiro Ministro. O encontró, que durou mais de quatro horas, íoi amistoso; após a leitura do relatório por parte de Chenuda, cada um dos bispos citou casos concretos de injustigas infligidas aos coptas. Ao ouvir os rela tos, o presidente terá perguntado repetidamente ao Primeiro Ministro: «Mamdouth, por que nao fui informado a respeito?» Na verdade, Sadat parece nao ter sido notificado dos inci dentes provocados pelos extremistas mugulmanos. A audiencia era foco moveu-o a declaragóes posteriores em favor da paz nacional, como, por exemplo, a que foi publicada aos 12 de outubro pelo jornal «El Ahram»: "O Egito eteno jamáis será a térra da díscriminagáo e da divisáo".
Tais fatos justificam certo otimismo da parte dos cristáos egipcios no tocante á sua liberdade de culto e de expressáo, embora fiquem nuvens no horizonte derivadas da posicáo de faccóes fanáticas.
Passemos agora aos memoráveis fatos de novembro 1977.
3.
Novembro 77 : Sadat em Jerusalém
A evolucáo das atitudes de Sadat se traduziu finalmente
em novembro pp. num gesto que nao foi somente de alcance
político, mas ao qual o próprio presidente quis dar um signi ficado religioso.
Havia mais de trinta anos, Israel e o Egito viviam em estado de guerra, que quatro vezes redundou em serios conflitos armados, nutridos por odio implacável, profundamente arraigado na populagáo árabe e na israelense. Ora, após pre vias negociacóes, de 19 a 21 de novembro de 1977, Anwar Sadat, num gesto de grande coragem, quis estar em Jerusa lém a fim de iniciar ?.s tratativas de paz. Aos 20/11/77 foi recebido no aeroporto de rel-Aviv pelo presidente Katzir, pelo Primeiro Ministro Menahen Begin e a mor parte dos Minis— 147 —
S
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 220/1978
tros de Estado, assim como por multidáo jubilosa de israelenses e árabes, que agitavam bandeiras dos dois países e cantavam hinos evocadores da paz. Cantos populares, aclamacóes, recitagáo de versículos da Biblia e do Coráo acompanharam o cortejo presidencial á saída do aeroporto e á chegada em Jerusalém.
Sadat falou na Knesset (Parlamento de Israel) em Jeru salém, propondo a paz no Oriente Próximo. Todo o seu dis curso foi caloroso e penetrante. Dele extraímos urna das passagens mais significativas: "Paz a todos aqueles que se encontram na térra árabe, em Israel e em qualquer parte deste vasto mundo, atormentado por contlitos cruen tos, chelo de agudas contradlcóes, ameacado periódicamente pelas guerras devastadoras que o homem empreende para destruir os seus semelhantes. Ao flm de tais lulas, em meio ás rufnas do que fora construido, e entre os residuos das vitimas humanas, nao pode haver nem vencedores nem vencidos. O eterno derrotado é o homem, a suprema criatura de Deus, o ser humano que Deus criou, como disse Gandhi, o apostólo da paz, 'para camlnhar com as suas própria3 pernas, construir a sua vida e adorar a Deus1. Hoje vlm até vos caminhando firmemente com
as
minhas
pernas, a
flm de que possamos construir urna vida nova, a (im de que possamos eslabelecer/ a paz para
todos
nos
nesta térra,
a
térra
de
Deus — nos
todos, muculmanos, crislSos e hebreus, do mesmo modo —, e a fim de que possamos adorar a Deus, um Deus cujos ensinamentos e preceitos sáó o amor, a retidlo, a pureza e a paz".
No mesmo discurso, Sadat pronunciou cerca de vinte vezes o nome de Deus. Aludindo diretamente aos valores reli giosos, acrescentou: "O destino quis que a com a festa musulmana de Al — o Patriarca dos árabes e e se entregou ao Altfssimo,
minha viagem (missáo de paz) coincidisse Adha, a testa do sacrificio pelo qual Abraáo dos judeus — obedeceu á ordem de Deus nao por fraqueza, mas por forca espiritual,
e, usando de total liberdade, aceltou sacrificar seu filho, com fé inabalável, estabelecendo assim para nos ideáis que dio á vida urna profunda
significacSo".
Em coeréncia com as suas palavras, Sadat foi orar na grande mesquita de El Aksa, visitou o santo Sepulcro de Cristo e o monumento judeu «Yad Vachem», erguido em memoria das vitimas do nacional-socialismo. Comovido pelas imagens que lembravam a crueldade dos campos de concen-
tragáo nazistas, Sadat escreveu no livro de ouro do monu— 148 —
CRISTAOS E MUCULMANOS NO EGITO
9
mentó judeu, em inglés e em árabe, palavras que significan! todo um programa político: "Possa o Senhor guiar os nossos passos pelo camlnho da paz, a. fim de que cessem para sempre os sofrimentos de toda a humanldadel"
O gesto de Sadat, embora tenha encontrado contraditores tanto entre os intelectuais do Egito quanto no estrangeiro, suscitou os aplausos e a alegria do povo egipcio.
A imprensa internacional, entre outros tópicos, realgou a atitude religiosa do presidente egipcio. Assim, por exemplo, o jornalista francés Maurice Druon escreveu no «Le Figaro»: "De todo modo, o que é Importante e fica adquirido, é que, no encontró de Jerusalém, Deus fol mencionado como sendo Aquele que de ve ditar as atitudes dos povos, inspirar os atos dos governantes e suscitar a aproxlmacáo dos dois campos. Há quanto tempo, há quantos séculos nSo se dera semelhante acontectmento?" (citacao colhida em "Informatlons Cathollques Internationales" n? 521, 15/12/77, p. 13).
A visita de Anwar Sadat a Jerusalém nao surtiu os efeitos désejados, pois as negociagóes de paz subseqüentes se defrontaram com impasses que o Egito e Israel julgaram inso-
lúveis. Todavía a Providencia Divina acompanha a historia e, através dos acontecimientos desta, vai realizando seus sabios designios. Se a aproximagáo do Egito e de Israel nao atingiu aínda o almejado Tratado de Paz, ao menos deixou marcas na historia deste fim de século XX, caracterizado por onda de indiferentismo e ateísmo oficiáis entre os povos.
Possam
os
gestos religiosos
duradouros nao so
em favor
da
de Sadat
produzir frutos
populacáo do Egito,
mas
também no plano da política internacional!
Bibliografía:
Helnz Gstrein, "Aegypten: Christen und Muslime Im relfglosen Aufbruch", em "Orientlerung" n« 22, 419 ano, Zürlch, 30/11/1977, pp. 240s. J.-P. M, "Sadate á Jerusalém: J'en appelle á Dleul", em "Informatlons Catholiques Internationales", n? 521, 15/12/1977, pp. 11-14.
— 149 —
Tema candente:
"a igreja e o reconhecimento dos direitos humanos na historia"
por Hubert Lepargneur
Em sfntese:
realcar que
1)
O artigo considera o Nvro ácima proposto, tentando
os falos históricos passados hio de ser considerados dentro da
sua moldura cultural respectiva. Por conseguinte, a Inquisicáo deve ser colocada em seu contexto medieval, renascentista ou ibérico próprio. So assim se poderá compreender que o fato da Inquisicáo, embora choque o homem moderno, nao perturbava os santos de outrora, mas, antes, Ihes parecía, via-de-regra, expressao de fidelidade a Cristo e de zelo pela
causa da verdade e do
2)
bem;
a Igreja, além de ser o povo de Deus, ó também o sacramento
da unldade dos homens entre si e com Deus. Por conseguinte, a sua realidade nño se esgota na sua face visfvel. Esta encobre e manlfesta a presenca de Deus, que se comunica através da face visfvel
da
Igreja.
Em conseqüéncla, nSo se pode julgar a Igreja com olhos meramente humanos ou a partir de criterios meramente naturais.
Comentario: O Pe. Hubert Lepargneur, teólogo de renome
internacional, publicou em 1977 o livro de titulo ácima, que,
como se compreende, se reveste de grande atualidade. Divide
o seu estudo em tres partes: 1) Balizas cronológicas; 2) Bali zas temáticas; 3) Igreja e Direitos humanos na atualidade. Na primeira, analisa o comportamento da Igreja frente á questáo dos direitos humanos desde a origem do Cristianismo até a época contemporánea. Na segunda, considera as gran des nocóes da Filosofía e da Teología que fundamentam os direitos humanos, entrando também na reflexáo sobre fatos históricos atinentes ao assunto. Na terceira parte, o autor 1 Editora Cortez e Moraes Ltda., Sao Paulo 1977, 140 x 210 mm,
139 pp.
— 150 —
IGREJA E DIREITOS HUMANOS
11
se volta para a situacáo contemporánea, expondo como a Igreja se comporta nos diversos países do mundo (marxistas
e nao marxistas) no tocante aos direitos humanos. — O livro
traz as pp. 7 e 8 urna Apresentacáo assinada pelo Emo. Sr. Cardeal-arcebispo D. Paulo Evaristo Arns.
A obra, sem dúvida, desperta o grande interesse dos estudiosos. É rica em citagóes de fatos e textos que ilustram bem a historia e a problemática dos direitos humanos. Toda vía duas serias restrigóes se opóem ao escrito de Lepargneur:
1) a primeira se refere ao dimensionamento histórico; 2) a outra é pertinente ao conceito de Igreja. Vamos explaná-las sucessivamente.
1.
O dimenstonamento histórico
O livro é perpassado de pessimismo e de críticas a Igreja. Ora observa-se que as pessoas demasiado ciosas de denun ciar o que julgam ser injustigas do passado, se arriscam, por sua vez, a cometer injustigas. Nao há dúvida de que os homens da Igreja, em séculos idos, cometeram o que nos hoje conceituamos como violagáo dos direitos humanos: houve, por exemplo, as faganhas da Inquisigáo, que sao freqüentemente citadas nao só por Lepargneur, mas também por outros críticos, como testemunho de injusta atitude da Igreja. Quem lé as objegóes proferidas por Lepargneur
(que as vezes se
baseia em bibliografía anticatólica), nao pode deixar de que rer dialogar com o autor para lhe propor as seguintes ponderagóes:
a) Reconhegamos sinceramente a verdade em toda a sua amplidáo (sem a encobrir, mas também sem a aumentar
indevidamente).
A Igreja nao pretende ser constituida ape
nas de santos, mas, como disse o Senhor no Evangelho, Ela compreende trigo e joio (cf. Mt 13, 24-40. 36-43). Por isto, se houve falhas, e graves falhas, por parte de membros da
Igreja no passado ou nos tempos atuais, sejam confessadas
com lealdade. A causa de Cristo só se pode beneficiar pelo reconhecimento sincero e humilde da verdade comprovada. b) É necessário, porém, que o estudioso nao ceda á tentagáo de querer julgar episodios do passado com lentes do — 151 —
12
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 220/1978
século XX... Como nao se julga urna crianga a partir das categorías que se aplicariam a um adulto. Os feitos que hoje sao tidos como objetiva e • subjetivamente imorais, outrora podiam ser encarados em outra perspectiva e segundo crite
rios diferentes, devidos á cultura da época respectiva. Assim o mal objetivo e real pode ter sido praticado por pessoas de consciéncia tranquila. A luz destes
principios, examinemos
de modo
detido a
Inquisicáo, tida como o espécimen mais flagrante de violagáo dos direitos humanos por parte da Igreja.
1.1.
Poder civil e autoridade eclesiástica
Nao se pode falar da Inquisicáo como se fosse um empreendimento monolíticamente imputável á Igreja. Antes dis tingamos a Inquisieáo Medieval (séc. XI — séc. XV), a Inquisigáo Romana (séc. XVI-XVII e a Inquisigáo Espanhola (séc. XV-XIX).
a)
A Inquisicáo Medieval comecou como movimento de
repressáo aos cataros ou albigensss, que em hordas fanáticas percorriam o territorio da Franca, o Norte da Italia, a Flándria.... pilhando e devastando propriedades alheias, movidos por sua mentalidade dualista (ou maniquéia).
O combate aos cataros foi iniciado pelos nobres e reis, que se opunham á desordem pública causada pelos agitadores fanáticos. Entrementes as autoridades eclesiásticas recusavam recorrer á repressáo violenta, pois pretendiam debelar os cataros pelo poder da persuasáo. «Sejam os herejes conquis tados nao pelas armas, mas pelos argumentos», admoestava S. Bernardo, t 1153 («In Cant.» serm. 64). Nao sao casos ¡solados os seguintes: em 1144 na cidade de Liáo o povo quis punir violentamente um grupo de inovadores que ai se introduzira; o clero, porétn, os salvou, desejando a sua conversáo e nao a sua morte. Em 1077, um hereje professou seus erros diante do bispo de Cambraia; a multidáo de populares langou-se entáo sobre ele, sem esperar o julgamento; encerraram-no nutna cabana, á qual atearam fogo!
Contudo em meados do século XII a aparente indiferenga do clero se tornou insustentável: os magistrados e o povo — 152 —
IGREJA E DIREITOS HUMANOS
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exigiam colaboragáo mais direta na repressáo aos cataros,
pois estes provocavam tumultos, saques e agressáo aos direitos
públicos civis. Muito significativo, por exemplo, é o episodio seguinte: o Papa Alexandre ni, em 1162, escreveu ao arcebispo de Reims e ao Conde da Flándria, em cujo territorio os cataros disseminavam desordens: "Mais vale absolver culpados do que, por excesslva severidade, atacar a vida de Inocentes... A mansldáo mais convém aos homans da Igreja do que a dureza".
Informado desta admoestagáo pontificia, o rei Luís VII da Franga, irmáo do referido arcebispo, enviou ao Papa um documento em que o descontentamento e o respeito se traduziam simultáneamente: "Que Vossa prudencia dé atencSo toda particular a essa parte (a heresla) e a suprima antes que possa crescer. Supllco-Vos para o bem da fó crista: concede! todos os poderes neste setor ao arcebispo (de Reims); ele destruirá os que asslm se Insurgem contra Deus: sua justa severidade será louvada por todos aqueles que nesta térra sfio
animados de verdadeira piedade. Se procederdes doutro modo, as quelxas nao se acalmaráo fácilmente e desencadearels contra a Igreja Romana as violentas recrlminagSes da oplnlño pública" (Marténe, "Amplissima Collectio" II 683s).
As conseqüéncias deste intercambio epistolar nao se fizeram esperar: o Concilio regional de Tours em 1163, tomando
Barbarroxa medidas repressivas á heresia, mandava inquirir (procurar) os seus agrupamentos secretos. Por fim, a assembléia de Verona (Italia), á qual comparecerán! o Papa Lu cio m, o Imperador Frederico Barbarroxa, numerosos bispos, prelados e principes, baixou em 1184 um decreto de grande importancia: o poder eclesiástico e o civil, até que entáo haviam agido independentemente um do outro (aquele im pondo penas espirituais, este recorrendo á forca física), deveriam combinar seus esforcos em vista de mais eficientes resul tados: os herejes seriam doravantq nao somente punidos, mas também procurados (inquiridos); cada bispo inspecionaria, por si ou por pessoas de confianga, urna ou duas vezes por
ano, as paróquias suspeitas; os condes, baróes' e as demais autoridades civis os deveriam ajudar sob pena de perder seus cargos ou ver o interdito lancado sobre as suas térras; os
herejes depreendidos ou abjuririam seus erros ou seriam entre gues ao brago secular, que lhes imporia a sancgáo devida. — 153 —
M
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 220/1978
Assim a Inquisigáo se constituiu como tribunal misto integrado por civis e eclesiásticos, que se dispunham a por termo as invectivas dos cataros e de outros herejes. A Inquisigáo, portante, nunca foi um tribunal meramente eclesiástico. Até o fim do séc. XIII, o poder civil e o eclesiás tico compartilhavam as responsabilidades, cabendo, como se compreende, á autoridade eclesiástica julgar se o acusado era ou nao réu de heresia. Esse julgamento, porém, se fazia muitas vezes sob pressáo da populagáo local, que participava tanto
quanto podía (e passionalmente) dos processos da Inquisigáo. A partir do século XIV, os reis se foram tornando abso lutistas (tenham-se em vista Filipe IV o Belo da Franga, 1285-1314, e Luís IV da Baviera, 1327-1347). Em conseqüéncia, difícilmente toleravam que houvesse, ao lado do poder judiciário do reí, outro poder judiciário, independente do mesmo. Isto fez que a Inquisigáo fosse cada vez mais manipu lada pelos reis e seus agentes, que, mediante o aparato da Inquisigáo, procuravam favorecer interesses políticos ou eliminar pessoas «nao gratas». Tal situagáo explica o processo e a condenagáo de Joana d'Arc por parte de um tribunal da Inquisigáo, presidido pelo bispo Cauchon de Ruáo em 1431. Este prelado fraquejou, prestando-se a servir aos interesses dos ingleses que, havendo capturado a guerreira francesa, pressionaram a Inquisigáo para que condenasse a jovem sob o
pretexto de ser bruxa, feiticeira, possessa do demonio, etc. Caso análogo foi o da Ordem Militar dos Cavaleiros Templarios... O rei Filipe o Belo, cobigando os bens destes Religiosos, fez levantar contra os mesmos as mais vis acusagóes de imoralidade e heresia... A pressáo exercida pelo rei sobre a Inquisigáo e o próprio Papa Clemente V terminou obtendo do Pontífice o decreto de extingáo da Ordem dos Templarios em 1312. O monarca de Franga colheu de fato enormes beneficios financeiros, pois pode assim por a máo sobre as propriedades dos Cavaleiros. b) Quanto a Inquisieao Romana (séc. XVI-XVH), assumiu caráter mais eclesiástico, pois tinha por fim a repressáo da onde protestante e de idéias novas que punham em perigo
a fé católica. c) Já nao se poderia dizer o mesmo da Inquisicao Espanhola (séc. XV-XIX). Esta foi fortemente influenciada _ 154 —
IGREJA E DIREITOS HUMANOS
15
pelos monarcas de León e Castela, que, desejosos de estabelecer a unidade cultural e política nos territorios hispánicos,
viam na Inquisigáo oportuno instrumento para eliminar mu-
culmanos e judeus. Mais de urna vez os Pontífices admoestaram os monarcas a mudar o seu comportamento; todavía pouco resultado obtiveram. Eis alguns fatos que atestam a atitude dos Papas no caso:
Estabelecida a Inquisigáo Espanhola no ano de 1480, em
breve fizeram-se ouvir em Roma queixas diversas contra a
severidade
escreveu
dos
Inquisidores.
sucessivas
cartas
Sixto
aos
IV
(1471-1484)
monarcas
da
entáo
Éspanha,
mostrando-lhes profundo descontentamente por quanto acontecia em seu reino e baixando instrugóes de moderagáo para os juizes tanto civis como eclesiásticos. Merece especial des taque neste particular o Breve de 2 de agosto de 1482, que o Papa, depois de promulgar certas regras coibitivas do poder dos Inquisidores, concluía com as seguintes palavras: "Visto que somente a carldade nos torna semelhantes a Deus..., rogamos e exortamos o Re! e a Rainha, pelo amor de Nosso Senhor Jesús Cristo, a llm de que Imltem Aquele de quem ó característico ter sempre compaixSo e perdflo. Quelram, portante mostrar-se Indulgentes para com os seus súditos da cidade e da diocese de Sevilha que conlessam o erro e Imploram a misericordia!"
Em meados do séc. XVT, tornou-se famoso o processo que os Inquisidores moveram contra o arcebispo primaz da Espanha, Bartolomeu Carranza de Toledo. Sem descer aos porme nores do acontecimento, notaremos apenas que durante dezoito anos continuos a Inquisigáo Espanhola perseguiu o venerável prelado, opondo-se a legados papáis, ao Concilio ecuménico de Trento e ao próprio Papaí
Repetidamente a Santa Sé decretou medidas que visayam a defender os acusados frente á dureza do processo regio e do povo. A Igreja em tais casos distanciava-se nítidamente da Inquisigáo Espanhola, embora esta contínuasse a ser tída como tribunal eclesiástico. Assim, aos 2 de dezembro de 1530, Clemente VII conferiu
aos Inquisidores a faculdade de absolver sacramentalmente os
delitos
de heresia e
apostasia; assim
o
sacerdote
poderia
tentar subtrair do processo público e da infamia da Inquisigáo
qualquer acusado que estivesse animado de sinceras disposigóes para o bem. Aos 15 de junho de 1531, o mesmo Papa Clemente — 155 —
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«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 220/1978
VII mandava aos Inquisidores tomassem a defesa dos mouriscos que, acabrunhados de impostas pelos respectivos senhores e patróes, poderiam conceber odio contra o Cristianismo. Aos 2 de agosto de 1546, Paulo ni declarava os mouriscos de Granada aptos para todos os cargos civis e todas as dignidades eclesiásticas. Aos 18 de Janeiro de 1556, Paulo IV autorizava os sacerdotes a absolver em confissáo sacramental os mouris cos.
Contudo, apesar das freqüentes admoestagóes pontificias, a Inquisigáo Espanhola ia-se tornando mais e mais um orgáo poderoso de influencia e atividade do monarca nacional. Para comprovar isto, basta lembrar o seguinte: a Inquisigáo, no territorio espanhol, ficou sendo instituto permanente, durante tres sáculos a fio. Nisto diferia bem da Inquisigáo Medieval, a qual foi sempre intermitente, tendo em vista determinados erros oriundos em tal e tal localidade. A manutengáo perma nente de um tribunal inquisitorio impunha avultadas despesas, que somente o Estado podia tomar a seu cargo; foi o que se deu na Espanha: os reis atribuiam a si todas as rendas materiais da Inquisigáo (impostos, multas, bens confiscados) e pagavam as respectivas despesas; conseqüentemente, alguns historiadores, referindo-se á Inquisigáo Espanhola, denominaram-na «Inquisigáo Regia»!
Estes poucos dados já manifestam suficientemente que nao se pode atribuir táo somente á Igreja as diversas faganhas da Inquisigáo.
1.2.
Espirito metafísico e espirito psicológico
Nao há dúvida de que os medievais eram acentuadamente
dados ao cultivo da metafísica e da lógica; todavia pouco abertos para a psicología. Hoje em dia verifica-se o contrario: os homens sao extremamente interessados pela psicología e a penetragáo dentro do psiquismo humano, ao passo que menos estimam a metafísica.
Em outros termos: os medievais professavam firmemente a existencia do espirito e dos valores espirituais, que eles apreciavam muito mais do que os valores materiais (ao menos em teoría). Conseqüentemente qualquer lesáo infligida aos valores espirituais (como, por exemplo, a doutrina da reta — 156 —
IGREJA E DIREITOS HUMANOS
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fé) era tida como crime de maior gravidade do que o daño infligido a bens materiais. Por conseguinte, se a pena de morte na Idade Media era imposta a quem falsificasse a moeda corrente (pondo em perigo a vida material dos seus concidadáos), a mesma pena deveria ser decretada para aqueles
que falsificassem a doutrina da fé (pondo em perigo a vida da alma). É o que se le na Suma Teológica de S. Tomás de Aquino: "É muito mais grave corromper a fé, que ó a vida da alma, do que falsificar a moeda, que é um meio de prover á vida temporal. Se, pois, os falsificadores de moedas e outros malfeitores sao, a bom direito, con denados á morte pelos príncipes seculares, com muito mais razáo os herejes, desde quo sejam comprovados tais, podem nSo somante ser excomungados, mas lambém em toda justiga ser condenados á morte" (S. Teol. 11/II
11, 3c).
Como se vé, a argumentado de S. Tomás procede do principio de que a vida da alma mais vale do que a do corpo;
se, pois, alguém pela heresia ameaga a vida espiritual do próximo, comete maior mal do que quem assalta a vida
corporal; o bem comuni exige entáo a remogáo do grave perigo (veja-se também S. Teol. II/II 11, 4c). O homem moderno concebe dificuldade para entender táo
rígido procedimento por dois motivos: 1) os valores espirituais já nada significam pax"a muitos dos nossos contemporáneos; 2) a psicología das profundidades explica que muitos dos comportamentos objetivamente erróneos nem sempre o sao do ponto de vista subjetivo. Nem todo réu de graves delitos
(civis ou religiosos) merece ser punido com severidade, pois pode ter agido com sua responsabilidade atenuada em virtude de paixóes obsessivas, pressóes fisiológicas ou psicológicas,
taras, etc. Os medievais nao tinham a respeito destes fatores
nosáo suficiente para os levar em conta. É o que explica a defasagem entre o modo de julgar medieval e o contempo
ráneo: os medievais se empenhavam grandemente pelos valores do espirito, ao passo que os homens contemporáneos tendem a se interessar muito mais pelos bens materiais.
1.3.
Os Santos e a lnquis¡;áo
Chama a atencáo o fato de que durante todos os sáculos da Inquisicáo viveram grandes santos, ardentes de amor a — 157 —
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Deus e ao próximo; todavía nao se encontra, da parte de qualquer deles, algum protesto contra a Inquisigáo. No século XIII, quando a Inquisicáo medieval foi estruturada, viveram S. Francisco de Assis, S. Clara, S. Boaventura, S. Tomás de Aquino e outros notáveis vultos que, por seus escritos e sua acáo, enriquecerem o patrimonio da humanidade. Isto bem mostra quanto a consciéncia do homem medieval estava tran quila diante dos procedimentos da Inquisigáo. Esta, em suas linhas gerais, nada tinha de chocante para as populagóes da Idade Media, nem mesmo para os mais lúcidos genios da época. Antes parecía a todos obra de coeréncia, de servigo ao bem e 'á sociedade; nao praticar a Inquisigáo ou permitir a difusáo de idéias e práticas tidas como heréticas é que seria, para os medievais, pecado ou grave omissáo. Assim se desfaz a impressáo, aceita por alguns estudiosos, de que o homem medieval era egoísta, odiento, sanguinolento, etc. Entre os
espéciens mais significativos do espirito dos medievais e, em especial, dos mentores da Inquisigáo, acha-se o «Manual do Inquisidor», da autoría do Inquisidor Bernardo de Gui (séc. XIV). Este traca o retrato do Inquisidor em termos que talvez surpreendam pela magnanimidade e a candura que os inspiram. Eis um dos respectivos trechos típicos: "O inquisidor devo ser diligente e fervoroso no seu zelo pela verdade religiosa, pela salvacáo das almas e pela extirpacio das hereslas. Em meio as dlficuldades permanecerá calmo, nunca cederá á cólera nem á indignacáo... Nos casos duvídosos, seja circunspecto, nao dé fácil crédito ao que parece provável e multas vezes nSo é verdade; também nao rejelte obstinadamente a opinifio contraria, pois o que parece improvávol freqüentemente acaba por ser comprovado como verdade... O amor da verdade e a pledade, que devem residir no coracáo de um juiz, brilhem nos seus olhos, a (im de que as suas decisóes jamáis possam parecer ditadas pela cupidez e a crueldade" ("Practica" VI p... ed. Douls
232s).
Já que mais de urna vez se encontram instrugóes tais nos arquivos da Inquisigáo, nao se poderia crer que o apregoado ideal do juiz inquisidor, ao mesmo tempo equitativo e bom, se realizou com mais freqüéncia do que comumente se pensa? Nao se deve esquecer, porém, que as categorías pelas quais se afirmava a justica na Idade Media, nao eram exatamente as da época moderna... Além disto, levar-se-á em conta que o papel do juiz, sempre difícil, era particularmente arduo nos casos da Inquisigáo: o povo e as autoridades civis estavam profundamente interessados no desfecho dos processos; pelo que, nao raro exerciam pressáo para obter a sentenga mais favorável a caprichos ou a interesses temporais; ás — 158 —
IGREJA E DIRECTOS HUMANOS
19
vezes, a populacáo obcecada aguardava ansiosamente o dia em. que o «veredictum» do juiz entregaría ao brago secular os herejes comprovados. Em tais circunstancias, nao era fácil aos juízes manter a serenidade desejável.
Dentre as táticas adotadas pelos inquisitores, merecem particular atengáo a tortura e a entrega ao poder secular (pena de morte).
1.4.
Tortura e pena de morte
A tortora estava em uso entre os gregos e romanos -cristáos que quisessem obrigar um escrávo a confessar delitos. Certos povos germánicos também a praticavam. 866, porém, dirigindo-se aos búlgaros, o Papa Nicolau condenou formalmente.
préseu Em I a
Nao obstante, a tortura foi de novo adotada pelos tribunais civis da Idade Media nos inicios do sáculo XII, dado o renascimento do Direito Romano. Nos processos inquisitoriais,
o Papa Inocencio IV acabou por introduzi-la em 1252, com a cláusula: «Nao haja mutilacáo de membro nem perigo de morte» para o réu. O Pontífice, permitindo tal praxe, dizia conformar-se aos costumes vigentes em seu tempo («Bullarum amplissima collectio» n 326).
Os Papas subseqüentes, assim como os Manuais dos Inqui sidores, procuraram restringuir a aplicacáo da tortura: só seria lícita depois de esgotados os outros recursos para inves tigar a culpa e apenas nos casos em que já houvesse meia-
-prova de delito ou, como dizia
a linguagem técnica,
«dois
índices veementes» deste, a saber: o depoimento de testemunhas fidedignas, de um lado, e, de outro lado, a má fama, os maus costumes ou tentativas de fuga do réu. O Concilio de Viena (Franca) em 1311 mandou outrossim que os inquisido
res só recorressem á tortura depois que urna comissáo julgadora e o bispo diocesano a houvessem aprovado para cada
caso em particular. — Apesar de tudo o que a tortura apresenta de horroroso, ela tem sido conciliada com a mentalidade do mundo moderno...!
2. Quanto á pena de morte, reconhecida pelo antigo Direito Romano, estava em vigor na jurisdicáo civil da Idade — 159 —
20
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Media. Sabe-se, porém, que as autoridades eclesiásticas eram contrarias á sua aplicagáo em casos de lesa-religiáo. Contudo, após o surto do catarismo (séc. XII), alguns canonistas comecaram a julgá-la oportuna, apelando para o exemplo do Imperador Justiniano, que no sáculo VI a infligirá aos maniqueus. Em 1199 o Papa Inocencio III dirigia-se aos magistrados de Viterbo nos seguintes termos: ' "Conforme a lei civil, os réus de lesa-majeslade sao punidos com
a pena capital e os seus bens sao confiscados... Com muito razao, portanto, aqueles que, desertando a fó, ofendem a Jesús, o
mais Filho
do Senhor Deus, devem ser separados da comunháo crista e despojados de seus bens, pois mullo mais grave é ofender a Majestade que tesar a majestade humana" (eplst. 2, 1).
Divina do
Como se vé, o Sumo Pontífice com essas palavras desejava
apenas justificar a excomunháo e a confiscado de bens dos herejes; estabelecia, porém, urna comparacáo que daría ocasiáo a nova praxe... O Imperador Frederico II soube deduzir-lhe
as últimas conseqüéncias: tendo lembrado numa Constituigáo de 1220 a frase final de Inocencio III, o monarca, em 1224,
decretava francamente para a Lombardia contra os herejes e, já que o Direito antigo em tais casos, o Imperador os condenava vivos. Em 1230 o dominicano Guala, tendo
a pena de morte assinalava o fogo a ser queimados subido k cátedra
episcopal de Brescia (Italia), fez aplicagáo da lei imperial na sua diocese. Por fim, o Papa Gregorio IX, que tinha inter cambio freqüente com Guala, adotou o modo de ver deste bispo: transcreveu em 1230 ou 1231 a Constituicáo imperial de 1224 para o Registro das cartas pontificias, e em breve editou urna lei pela qual mandava que os herejes reconhecidos pela Inqui-
sigáo fossem abandonados ao poder civil, para receber o devido castigo, castigo que, segundo a legislagáo de Frederico II,
seria a morte pelo fogo.
Os teólogos e canonistas da época se empenharam por justificar a nova praxe, como mostra o texto de S. Tomás de Aquino transcrito á p. 157.
Contudo as execucóes capitais nao foram táo numerosas
quanto se poderia crer. Infelizmente faltam-nos estatisticas completas sobre o assunto; consta, porém, que o tribunal de Pamiers, de 1318 a 1324, pronunciou 75 sentoncas condenato rias, das quais apenas cinco mandaram entregar o réu ao
poder civil (o que equivalia á morte); o Inquisidor Bernardo de Gui em Tolosa, de 1308 a 1323, proferiu 930 sentemos, das — 160 —
IGREJA E DIREITOS HUMANOS
21
quais 42 eram capitais; no primeiro caso, a proporgáo é de 1/15; no segundo caso, de 1/22.
Nao se poderia negar, porém, que houve injustigas e abusos da autoridade por parte dos juizes inquisitoriais. Tais males se devem á conduta de pessoas que, em virtude da fraqueza humana, nao foram sempre fiéis cumpridores da sua missáo. Os inquisidores trabalhavam a distancias mais ou menos consideráveis de Roma, numa época em que, dada a precariédade de correios e comunicagóes, nao podiam ser assiduamente controlados pela suprema autoridade da Igreja. Esta, porém, nao deixava de censurá-los devidamente, quando recebia noticia de algum desmando verificado em tal ou tal regiáo.
Famoso,
por exemplo,
é
o caso
de Roberto o Bugro,
Inquisidor-Mor de Franca no séc. xm. O Papa Gregorio IX a principio muito o felicitava por seu zelo. Roberto, porém,
tendo aderido outrora á heresia, mostrava-se excessivamente
violento na repressáo da mesma. Informado dos desmandos praticados pelo Inquisidor, o Papa o destituiu de suas fungóes e mandou encarcerar. — Inocencio IV, o mesmo Pontífice que permitiu a tortura nos processos da Inquisigáo, e Alexandre IV, respectivamente em 1246 e 1256, mandaram aos Padres Provinciais e Gerais dos Dominicanos e Franciscanos, depusessem os Inquisidores de sua Ordem que se lhes tornassem notorios por sua crueldade. O Papa Bonifacio VIH (1294-1303), famoso pela tenacidade e intransigencia de suas atitudes, foi um dos que mais reprimiram os excessos dos Inquisidores, mandando examinar, ou simplesmente anulando, sentengas proferidas por estes. O Concilio regional de Narbona (Franga) em 1243 promul-
gou 29 artigos que visavam a impedir abusos do poder. Entre outras normas, prescrevia aos Inquisidores só proferissem sentenga
condenatoria
nos
casos
em
que,
com
seguranga,
tivessem apurado alguma falta, «pois mais vale deixar um culpado impune do que condenar um inocente» (can 23).
Dirigindo-se ao Imperador Frederico n, pioneiro dos métodos inquisitoriais, o Papa Gregorio IX aos 15 de julho de 1223 lhe lembrava que «a arma manejada pelo Imperador nao devia servir para satisfazer aos seus rancores pessoais, com grande escándalo das populagóes, com detrimento da verdade e da dignidade imperial» (epist saec. Xm 538. 550). — 161 —
22
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 220/1978
2.
A Igreja, povo de Deus e Sacramento
Lepargneur denuncia desrespeito aos direitos humanos dentro da própria Igreja: tais seriam a censura de escritos (p. 28), o processo movido contra Iva Ulich (p. 72), certas formas de imposicáo de leis ou teses, etc. A propósito notemos:
Nao ha dúvida de que a Igreja é o povo de Deus em
marcha. Como tal, ela consta de clérigos e leigos, sendo que estes sao cada vez mais chamados a tomar parte na vida e ñas deliberacóes da Igreja... Isto tem sido altamente benéfico para o Reino de Cristo, que nao pode dispensar a colaborado de todos os seus membros.
Todavía nao se pode esquecer que a Igreja é também «o sacramento da unidade dos homens com Deus e entre si» (Const. «Lumen Gentium» n* 1). A palavra «sacramento» quer dizer que a realidade da Igreja nao se esgota na sua face visível; esta encobre e manifesta urna realidade transcen dental, divina, que se quer comunicar através da face humana da Igreja. Em outras palavras: nao se pode julgar a Igreja com olhos meramente humanos ou a partir de criterios mera mente naturais; a visáo de fé leva a aceitar a realidade sacra mental ou divino-humana da Igreja. A fé e os ensinamentos da fé háo de ser sempre levados em conta para se poder avaliar o misterio da Igreja. Entre outras coisas, estas verdades implicam o seguinte: 1)
A autoridade, na Igreja, nao repousa sobre o povo
de Deus, de modo a ser delegada por este aos seus legítimos representantes escolhidos por eleigáo. Tal conceito — que é o de democracia simplesmente dita — nao corresponde á instituicáo neotestamentária. Esta apresenta a autoridade como
oriunda de Deus Pai e comunicada aos homens por meio de
Jesús Cristo. Com efeito, diz o Senhor:
"Quem vos ouve, a mim ouve; quem vos despreza, a mim despreza. E quem me despreza, despreza aquele que me enviou" (Le 10,16). "Como tu, Pal, mundo" (Jo 17,18).
me
enviaste
ao mundo,
— 162 —
também
eu
os
enviei
ao
IGREJA E DIREITOS HUMANOS
23
2) Existe um patrimonio de verdades de fé que a Igreja recebeu de Jesús Cristo e que deve guardar e transmitir incólume. Nao é, pois, simplesmente o acume da inteligencia nem a riqueza da erudigáo dos teólogos que define a orientagáo doutrinária da Igreja, mas, sim, a fidelidade (fidelidade douta e esclarecida, sem dúvida) á mensagem de Cristo confiada á Igreja. Esta, alias, sabe que Cristo prometeu eos Apostólos e aos scus sucessores a sua assisténcia infalivel, de tal modo que, quando a Igreja ensina oficialmente verdades relativas á fé e á moral como sendo reveladas, Ela se bene ficia de especial assisténcia divina que a preserva de erro.
Estas observagóes relativas á autoridade e ao magisterio
da Igreja nao
significam
nao
haja
erros
por
parte
dos
pastores da Igreja. Seria ilusorio pretendé-lo, visto que tudo o que é humano é falivel. Os erros ocorrentes podem ser
corrigidos pelo diálogo entre os membros da Igreja. Princi palmente após o Concilio do Vaticano n as autoridades da Igreja se dispóem á revisáo de vida e ao ouvir, cientes das suas limitagóes. Todavia o diálogo deve levar em conta os parámetros que nscessariamente o conceito de «Igreja-sacramento» impóe; nao se pode crer que na Igreja sempre deva prevalecer o partido mais numeroso ou a tese mais erudita mente apresentada. Em alguns casos, os criterios do número e da erudicáo poderáo ser decisivos; mas nem sempre o seráo. Sao estas algumas ponderagóes que nos ocorrem após a leitura do livro de H. Lepargneur. Muitas outras observagóes, versando sobre pontos particulares abordados pelo autor, poderiam ser acrescentadas. Todavia o que interessa, é realgar que os fatos históricos háo de ser considerados dentro da moldura do seu contexto cultural próprio e que a Igreja nao
pode ser encarada como qualquer sociedade humana sujeita simplesmente aos louvores e ás críticas que os homens, seus membros, lhe meregam.
163
I
Ñas Missas ditas "comunitarias" :
urna só missa e muitas doacoes ?
Em sfntese: A praxe das espórtulas de Missa comeca na antigüldade crlstfi, quando os fiéis ofereciam no altar a materia do sacrificio (pió e vlnho) asslm como outras dádivas, que serviam ao sustento do culto divino e da comunldade. Esse costume se fol diversificando, passando a- oferta a ser feita em dlnhelro e, por último, mesmo fora da da Missa. Tal é a praxe que hoja se chama "a praxe das espórtulas". Estas sSo justificadas, pols o dlnhelro oferecldo nao é o prego dos bens espirituais que a Igreja entrega aos fiéis, mas é a expressSo da fe e da partlcipacáo dos cristaos na celebracáo da Eucaristía; participando mais intensamente nesta, os fiéis se credenclam também a receber mais copio sos frutos da mesma para si e para as suas IntencSes.
Todavía a Igreja sancionou urna leglslacáo severa que visa a impedir abusos na prátlca das espórtulas. E, por exemplo, o bispo diocesano quem determina as taxas do culto divino. Mais: a Igreja exige que se celebrem tantas Missas quantas sejam as espórtulas oferecidas pelos fiéis...
Eis, porém, que novo costume se val dlfundlndo: o celebrante aplica urna só Missa pelas muitas intencdes que os fiéis formulem ao mesmo tempo que oferecem sua esmola (nao a espórtula diocesana). Este cos tume, pelo fato de nSo significar celebracSo de urna só Missa em corres pondencia a multas espórtulas, nfio pode ser dito Ilegitimo. Todavía é
preciso todo o cuidado para que nao redunde em solapamento do espi rito da leglslacao da Igreja. Se, mediante tal praxe, o sacerdote arrecada mais do que a taxa estipulada pelo blspo diocesano como espórtula de Missa, abra mSo da quantia excedente em favor da paróqula ou da diocese, lsentando-se asslm de qualquer especie de especulacáo comercial.
Comentario: Últimamente tem-se colocado um problema relativo as chamadas «intengóes de Missa», problema que se pode assim formular:
O clássico costume da Igreja manda que cada bispo diocesano estipule urna espórtula ' de intencáo de Missa, ficando o sacerdote obligado a aplicar a S. Eucaristía pela intengáo indicada pelo doador; nao se pode aceitar mais de urna espór tula por urna Missa. 1A
palavra
"espórtula"
vem
do
latlm
"sportula",
que
significa
"gratiíicasSo", n8o, porém, "salarlo"' ou "prego". Os franceses usam, no caso, a palavra "honoraire", que indica "testemunho de honra ou reve
rencia" — o que mais se afasta do concelto de "salario" ou "proco".
— 164 —
UMA SÓ MISSA E MUITAS DOACOES?
25
Eis, porém, que recentemente em algumas igrejas o celebrante nao se atém á espórtula, mas aplica a S. Missa pelas intencóes de todos quantos queiram contribuir com alguma esmola (por menor que seja); há quem chame «comu nitarias» tais Missas. Esse costume, porém, deixa muitas pessoas perplexas, como se pode compreender. Eis por que ñas páginas subseqüentes voltaremos nossa atencáo para a questáo que assim se póe.
1.
Ortgem das esportillas do culto
A atual praxe das esportillas tem seus precedentes, que nao poderiamos deixar de levar em conta. A Religiáo, desde que se afirmou em suas formas princi páis na antigüidade, professou, como norma, que os fiéis devem contribuir materialmente para a celebracáo do culto sagrado. Entre os romanos, por exemplo, estava em vigor o
principio seguinte, enunciado pelo Direito público: os servicos prestados pelas profissóes liberáis (medicina, advocada, ma gisterio, etc.) nao podiam ser objeto de salario propriamente dito; mas quem os recebia era convidado a reconhecer o bene ficio ou munus, remunerando o benfeitor (o médico, o advogado, o mestre, etc.); a remuneracáo era feita pela entrega de um henos ou honorarium (testemunho da honra devida ou de reverencia); este a principio era espontaneo, depois tornou-se obrigatório (dever de justica). Ora o culto reli gioso era pelos romanos aproximado das artes liberáis; me rece atencáo, por exemplo, o fato de que Ulpiano (t 228 d.C.) enumerava as artes liberáis entre as coisas sagradas (res religiosae; cf. Dig. 1. IV, tít. XIV, lex 1, 4, 5). No povo de Israel, o Código de Moisés sancionou a praxe vigente entre as nagóes orientáis: introduziu a lei do dizimo em favor do culto e dos indigentes (cf. Lv 27,30-33; Nm 18, 21-32; Dt 14,22-29). O costume estava em vigor ainda nos tempos de Jesús (cf. Mt 23, 2s). No Novo Testamento, Cristo corroborou o costume segundo
o qual os fiéis sustentávam o servico religioso; lembrava, por
exemplo, que «o operario merece o seu salario»; por isto os
pregadores do Evangelho poderiam entrar ñas casas dos fiéis e comer o que lhes fosse oferecido (cf. Le 10,7; Mt 10,10). Sao Paulo repetiu o mesmo principio em ICor 9,13. — 165 —
J26
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 220/1978
Na historia do Cristianismo variou o modo de se observar tal norma. Nos primeiros tempos, as ofertas geralmente nao eram taxadas nem impostas por lei positiva da autoridade eclesiástica; os documentos, porém, dos sáculos IE-IV, ao mesmo tempo que as recomendavam, atestavam a generosidade dos fiéis.
Aos poucos, os bispos e concilios, seguindo o exemplo da legislagáo do Antigo Tetamento, resolveram estabelecer como quota obrigatória o dizimo ou a décima parte dos rendimentos naturais dos fiéis; no fim do sáculo VI parece que tal lei já era vigente na Gália; tornou-se geral em todos os países cristáos. O poder civil, a partir do sáculo VIII, na Franca corroborou a injungáo eclesiástica, a qual ficou em vigor entre
os franceses até a Revolucáo de 1789; por esta ocasiáo foi oficialmente ab-rogada na maioria das nagóes católicas, permanecendo contudo em uso em algumas regióes. No decorrer dos tempos, implantara-se entre os cristáos outra praxe mediante a qual atendiam as necessidades do culto e das respectivas paróquias; nos primeiro sáculos, os fiéis, por ocasiáo da Liturgia eucarística, levavam ao altar oferendas de dons naturais (pao, vinho, leite, mel, azeite, frutas...), dos quais urna parte de pao e vinho era destinada a ser consagrada na S. Missa, devendo o resto reverter em beneficio do culto, do clero e dos irmáos pobres. Aconteceu, porém, que o rito de celebragáo da S. Missa, por razóes diversas, foi sendo simplificado; entre os meios de simplifi-
cagáo, estava certamente a substituigáo das dádivas naturais
por dinheiro; sendo assim, já no sáculo V levava-se ao altar dinheiro (junto com outras dádivas ou sem estas) por oca siáo do ofertorio da Missa (é o que S. Agostinho atesta na epístola 22, 1, 6). Esta praxe, porém, nao se sustentou diante da necessidade de simplificar mais ainda a Liturgia eucarística;
em conseqüéncia, o dinheiro, expressáo de urna entrega inte rior e do desejo do doador de participar mais intimamente dos frutos da Missa, comegou a ser entregue ao sacerdote fora da Missa e fora da igreja, como hoje ainda se faz, chamando-se tal dinheiro «esportilla» ou «honoraire» (em francés).
A partir do sáculo VIH é que se tornou geral o costume
de se oferecer dinheiro fora do ato litúrgico, em vista da celebragáo da S. Missa por determinada intengáo. — 166 —
UMA SO MISSA E MUITAS DOACOES?
27
Já S. Beda, por volta de 679, narra que os fiéis, fora da Missa, davam aos sacerdotes dinheiro para que celebrassem a S. Missa por alguma intengáo dos doadores («Historia Anglorum» IV 22). No século XI o costume já estava muito propagado, pois até as crianzas o praticavam; Sao Pedro Damiáo, por exemplo, quando crianga, encontrou urna moeda que ele se apressou por levar a um sacerdote a fim de que oferecesse a S. Missa pelo repouso da alma de seu falecido pai («Vita», ed. Migne lat. 144, 117).
2.
As razóes teológicas
1. A Missa é o sacrificio mesmo do Calvario tornado presente sobre os altares para que dele participem os fiéis.
Com mitras palavras: a Missa é a própria imolagáo de Cristo (outrora oferecida cruentamente na Cruz), que é tornada presente de maneira incruenta sobre os altares, sem que se multiplique tal imolagáo, mas também sem que por isto se perca algo da sua plena realidade. A mesma oblagáo de
Cristo, numéricamente a mesma, realizada no passado, deixa de pertencer ao fassado e se faz presente. «Misterio da fé», diz-se logo após a consagragáo eucaristica. Jesús Cristo quis instituir tal rito em vista de seus fiéis, ou seja, a fim de associar ao sacrificio da Cruz a sua Igreja. Com efeito, outrora no Calvario Jesús, como Sacerdote, se ofereceu ao Pai qual Vítima pelos pecados do mundo. Atualmente na S. Missa Jesús oferece com a Igreja, que participa do sacerdocio de Cristo; e oferece-se com a Igreja, que participa da qualidade de Cristo Hostia. Ora a Igreja nao é apenas o clero, mas é o Corpo Místico de Cristo, Corpo Místico do qual todo cristáo é um membro
ou urna célula viva. É,
pois, em cada fiel batizado que a
Igreja repousa, vive e age.
• 2. Deste fato decorre importante conseqüéncia referente aos frutos da S. Missa.
Sendo a Missa o próprio sacrificio da Cruz celebrado de
maneira incruenta, compreende-se que cada S. Missa tem em si valor infinito; com efeito, qualquer dos atos de Cristo possui tal valor, já que procede de urna Pessoa Divina. Por
conseguinte, urna só Missa por si seria suficiente para dar a Deus todo o louvor que as criaturas lhe devem, suficiente também para pagar as culpas de todos os homens, perdoar — 167 —
28
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 220/1978
todas as penas satisfatórias, obter todas as gragas, espirituais e temporais, necessárias á salvagáo, etc.
Na realidade, porém, o valor infinito da Missa nao é aplicado aos homens em grau infinito; os frutos da S. Missa, para as criaturas, sao sempre limitados. Por qué?
— Porque a Missa nao é somente Enquanto, sim, é oferecida por Cristo, velmente produz frutos para o género porém, em que os membros do Cristo, ciados ao oferecimento, esses frutos sao
oferecida por Cristo. toda Missa indubitahumano. Na medida, os cristáos, sao assorestritos. Com efeito,
o Corpo Místico, com o qual Jesús compartilha o seu ato de oblagáo, consta de urna multidáo de homens portadores das conseqüéncias do pecado, por isto coibidos em seu espirito de imolagáo e de entrega total ao Pai. A parte de devotamente
próprio que cada cristáo associa á oblacáo de Cristo, está sujeita as restrigóes que o egoísmo e a covardia ocasionam. Estes empecilhos, como se compreende, tornam os fiéis menos aptos a usufruir os beneficios da Redengáo e, conseqüentemente,
limitam a aplicagáo dos frutos da S. Missa.
Em termos positivos, poder-se-ia dizer com as palavras da Primeira Oragáo Eucarística: é a fé e o devotamento (espi
rito de entrega e de amor) dos cristáos, em uns mais intensa, em outros menos vivida, que os torna capazes de impetrar, em seu favor e em favor de outrem, as gragas decorrentes do sacrificio eucarístico. Ainda em poucas palavras: cada fiel
participa dos frutos da S. Missa na medida em que se identi fica com Cristo... com Cristo Sacerdote e com Cristo Vítima.
É de crer que tal identificacáo ou a fé e o devotamento
dos fiéis se exprimam por sinais concretos. Entre estes, devem ser mencionadas as doagóes que os fiéis, desde remota época, costumavam fazer, e ainda fazem, para participar mais inti mamente da celebracáo da Missa: o pao e o vinho antigamente, o dinheiro (ou as espórtulas) posteriormente, no contexto da S. Missa sao símbolos de atitudes interiores dos fiéis, atitudes que justificam tais símbolos e que vém a ser condigóes de frutuosa participacáo da S. Missa. Deve-se reconhecer que talvez poucos sejam os fiéis que tém consciéncia clara de
tal significado; muitos dos que oferecem a espórtula da Missa, fazem-no rotineiramente ou despreparadamente, confundindo
talvez a espórtula com formalidades necessárias á aquisigáo — 168 —
UMA SÓ MISSA E MUITAS DOAQ3ES?
29
de algum bem. Acontece mesmo que nao poucas pessoas encomendam a S. Missa, mas a ela nao assistem, julgando já ter cumprido o seu dever ao oferecer a esportilla respectiva. Voltemos
agora
ao
percurso
histórico
interrompido
ao
finí do subtítulo 1 deste artigo.
3.
Do sáculo XVI aos nossos días
No século XVI, por ocasiáo da Reforma protestante, a Igreja reviu a sua disciplina e houve por bem reconhecer definitivamente a legitimidade da praxe das esportillas. Todavia, a partir do Concilio de Trente (1545-1563), foi necessário fixar com precisáo certos aspectos da referida praxe para evitar abusos. Eis, pois, alguns dos tópicos que caracterizam a legislagáo respectiva do Concilio de Trento até o Código de Direito Canónico (1917) ainda vigente:
a) A espórtula é lícita, pois nao implica simonía. Com outras palavras: a espórtula nao é o prego do sagrado (cele bragáo eucarística ou outro beneficio espiritual), mas é táo somente urna contribuigáo oferecida ao ministro do culto em vista do servigo prestado, a fim de que este possa, de algum modo, sustentar a si ou as obras da Igreja. Depois que os dizimos cairam em desuso, as esportillas, dadas por ocasiáo do servigo religioso, constituem urna fonte comum de sustento do culto, dos sacerdotes e das obras pastorais da Igreja. Diz explícitamente o canon 824 § 1: "De acordó com o costume comum, usual e aprovado pela Igreja, todo sacerdote que celebra e aplica a Missa, pode receber urna esmola ou
espórtula".
b)
Compete á autoridade diocesana (o bispo, o prelado
ordinario ou, se possivel, o Sínodo Diocesano) estipular o teor das esportillas de Missa. Antigamente se estabelecia urna tabela de taxas, que variavam segundo as circunstancias de celebragáo da Missa: hora marcada ou nao, Missa cantada ou nao, altar
determinado ou nao... Hoje em dia estas distingues estáo caindo em desuso. Os bispos e sacerdotes, em muitos lugares,
tém procurado evitar tudo que possa parecer discriminagáo de pessoas ou grupos.
Está claro que a espórtula da ser tal que garanta a subsistencia bragáo da S. Eucaristía nao ocupa relativamente breve da jornada do
Missa nao pode nem deve do celebrante, pois a cele senáo um espago de tempo sacerdote.
— 169 —
30
cPERGUNTE E RESPONDEREMOS» 220/1978
Também se entende que nada se op5e a que o sacerdote
celebre, sem espórtula, pelas intengóes de quem lho pede, ou celebre recebendo mais do que a quota estipulada, desde que os interessados lho queiram dar espontáneamente. Há, sim,
casos em que especial esforgo da parte do celebrante (distancia a percorrer, hora pouco oportuna, condicóes de saúde...) pode sugerir a oferta do que se chama um «pro labore» particular.
c) Ao sacerdote nao é licito receber duas ou mais espor tillas por urna S. Missa, como reza o canon 825 § 3. Alias, o Papa Alexandre VII, aos 24/09/1665 condenou a proposicáo n' 10 de autores laxistas que admitiam a celebrafiáo de urna só Missa em correspondencia a diversas espórtulas (cf. Denzinger-Schonmetzer, Enquirídio n' 2030 [1110]). Tal proibigáo se justifica pelo desejo que a Igreja tem de evitar especulagóes e comercio a propósito dos atos do culto. O Direito Canónico é muito rígido a respeito, defendendo assim, com plena razáo, a pureza e a dignidade do ministerio sacerdotal.
. Há, pois, obrigagüo, para o sacerdote, de celebrar tantas Missas quantas sejam as espórtulas recebidas em vista da celebragáo da Eucaristía.
d) Mais de urna vez a Igreja rejeitou a tese segundo a qual a praxe das espórtulas seria simoniaca. Assim, por exemplo, no Concilio de Constanga (1418) o Papa Martinho V condenou a proposigáo de Wiclef, que dizia: "S3o slmonlacos todos aqueles que se obrlgam a orar pelos outros
em troca de beneficios materiais" ("Fontes luris Canonicl" n? 43).
No sáculo XVIII, o Concilio jansenista de Pistoia (1786) formulou a seguinte proposigáo: "Está difundida entre o povo a falsa opIniSo de que aqueles que dáo esmola a um sacerdote sob a condlc§o de que este celebre urna Missa, sSo especialmente beneficiados por essa cetebracSo".
Ora o Papa Pió VI em 1794 condenou tal proposicáo (cf. Denzinger-Schonmetzer, Enquirídio n* 2630 [1530]). Como foi dito, as espórtulas nao sao, em absoluto, con sideradas como a paga da graga sacramental e dos beneficios espirituais decorrentes das celebragóes litúrgicas. Nem constituem condicáo para que os sacramentos sejam administrados; a Igreja nao os denega a quem nao possa contribuir. Positiva mente a praxe das espórtulas nao é senáo a modalidade segundo
— 170 —
UMA Só MISSA E MUITAS DOACOES?
31
a qual hoje em dia se pratica um costume tradicional no povo de Deus; sim, desde o inicio da historia do Cristianismo os fiéis se interessaram pela oferta de dons materiais sobre o altar do Senhor em sinal de sua fé e participagáo na oferta que Cristo e a Igreja perpetuam sacramentalmente na Euca ristía. Os pastores da Igreja sempre aceitaram essas doagóes, porque, além de ser símbolo válido e muito expressivo, contribuem para o sustento do culto divino e dos seus ministros. Apenas trataram de regulamentar o costume das oferendas, a
fim de evitar abusos e deturpagáo da inspiracáo originaria. Lamenta-se que tal inspiracáo hoje em dia tenha caído no esquecimento de grande parte do povo de Deus, que conseqüentemente se arrisca a ver nessa praxe táo somente o seu lado formal ou jurídico.
Muitos outros principios da teología católica e da legislagáo canónica atinente ás espórtulas de Míssas poderiam ser aínda aduzidos. Todavía os que atrás foram propostos, sao suficientes
para
ilustrar
a
queetáo
que
encabega
o
artigo
presente.
4.
E a nova pratica ?
1. O costume das espórtulas continua vigente em nume rosas dioceses e paróquias. Os bispos vigiam para que sejam observadas as cautelas que o Direito Canónico impóe em vista da preservagáo da dignidade de tal praxe. As tentativas de abolir as esportillas e substitui-las por outro sistema que
signifique a participagáo dos fiéis na vida da Igreja, nem sempre tém sido felizes. Há, porém, dioceses ou, ao menos, paróquias, em que o sistema de dízimos funciona satisfato-
riamente, de modo que ai já nao se estipulam espórtulas; os atos do culto divino e as contribuigóes financeiras dos fiéis já nao estáo associados entre si — o que de antemáo dissipa os
possiveis mal-entendidos que a praxe das espórtulas poderia suscitar.
2.
Eis, porém, que em certas paróquias se vem regis
trando o seguinte:
Os sacerdotes nao propóem o pagamento de espórtulas de Missa. Mas, por ocasiáo de cada celebragáo eucarística (muitas yezes, no Ofertorio), pedem aos fiéis que formulem as suas intengóes e déem urna esmola (de qualquer valor monetario)... A Missa entáo é celebrada em favor das intengóes que sao assim apresentadas; as respectivas esmolas, por mais modestas — 171 —
32
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 220/1978
que sejam isoladamente, perfazem nao raro van total elevado... muito mais elevado do que a taxa oficialmente estabelecida na respectiva diocese. A justificativa de tal praxe é a afirmacáo (verídica, sem dúvida) de que a Missa tem valor infinito; por conseguirte, a sua frutuosidade pode beneficiar a quantos se abram á mesma pela fé e o devotamente. 3.
Que dizer a propósito?
a) Na verdade, deve-se afirmar que a frutuosidade de urna S. Missa pode beneficiar mais de urna intengáo. Nem se creia que a multiplicagáo das intengóes diminua o fluxo de grasas destinadas a cada urna das mesmas intengóes. O que condiciona a frutuosidade da Missa (diminuindo-a, por vezes), nao é o número de participantes e de intengóes apresentadas, mas, sim, sao as disposigóes íntimas desses participantes e a sua capacidade (maior ou menor) de se identificarem com Cristo Sacerdote e Hostia.l
b) O fato de que o sacerdote nao exige, nos casos citados, a taxa da espórtula diocesana, mas deixa a criterio dos fiéis contribuirem como queiram, isenta o sacerdote da suspeita de estar celebrando urna só Missa em correspondencia a varias espórtulas — o que seria infragáo do Direito Canónico. A rigor, pode acontecer que a soma total das esmolas nao equivalha á cota da espórtula de Missa estipulada pelo bispo diocesano.
c) Acontece, porém, que em nao poucos caos o sacerdote, aplicando o novo sistema, arrecada mais do que a taxa estipu lada para a celebragáo da S. Missa na diocese respectiva. Neste caso, nao lhe é licito guardar a quantia que ultrapasse tal taxa, pois, se a conservasse para si, estaría contradizendo ao espirito da legislagáo da Igreja, que visa precisamente a evitar 1 Diz o apostólo Sao Paulo: "Irmáos, tende em vos o mesmo sentlmento de Cristo Jesús: Ele tinha a condicio divina, mas nao considerou o ser Igual a Deus como algo a que se apegar ciosamente. Antes, esvaziou-se a si mesmo,... humilhou-se e fo! obediente até a morte, e morte de cruz!" (Fl 2,5-8). Ora pergunta-se: até que ponto tais sentlmentos do Cristo Jesús, implicando autodespojamento e entrega ao Pal, sio também os do sacer dote celebrante e os da assembléia presente á celebracáo? Até que
ponto o Intimo de Cristo Jesús — Sacerdote e Hostia — se prolonga no Intimo
daqueles que representam
a
Igreja
universal
em cada
celebracSo
eucarlstlca? É justamente a possibllldade de haver maior ou menor identiflcacáo do sacerdote e dos fiéis com Cristo que condiciona a frutuosi dade de
cada S.
Missa.
— 172 —
UMA S6 MISSA E MUITAS DOACOES?
33
especulagáo comercial em torno da S. Missa. Em algumas dioceses, o bispo determina que a cota excedente (ácima da taxa diocesana) reverta em beneficio das obras da paróquia (e nao da pessoa do sacerdote) ou em prol do Seminario
diocesano; tais intervengóes do pastor diocesano sao sabias. É necessário que o bispo se interesse por tais casos e defina o que fazer com a quantia «extra* arrecadada pelo celebrante, contribuindo para evitar qualquer desvirtuamento das aspiragóes da Igreja á pureza e á santidade do culto divino.
Sao estas as ponderagóes que parecem oportunas diante da questáo proposta no cabegalho deste artigo. A nova praxe,
a rigor, nao pode ser tida como ilícita, pois evita ser cobranga de esportilla... Todavia de maneira sutil poderia solapar o
espirito da legislagáo da Igreja, introduzindo por via nova o
que esta quer banir: especulagáo e comercio sagrado.
em
torno do
Caso algum sacerdote julgue conveniente seguir o novo oostume (por parecer fomentar o espirito comunitario), tomará as cautelas para profligar o desvirtuamento da sua praxe. Caso arrecade mais do que a espórtula fixada pelo bispo dioce sano, aplique o dinheiro excedente aos interesses da paróquia e da diocese, com absoluta isengáo de seus interesses parti culares ou meramente pessoais. Além disto, exponha lucida mente aos fiéis os principios teológicos que justificam as intengóes de Missa e as espórtulas, aproveitando assim a
ocasiáo para desenvolver a catequese eucarística; frisé bem a
diferenga entre espórtula e prego ou salario, afastando qual quer suspeita de comercio sagrado. E, para completar, diga o que é feito com a quantia que exceda a taxa diocesana de intengóes de Missa. Bibliografía :
L. Godefroy, "Fruits de la Messe", em "Dictlonnaire de Théologie Cathollque", vol. VI/1. Paris 1947, cois. 933-943. cois.
T. Oríolan, 69-91.
"Honoralres
de Messes",
Ib.,
vol.
VII/1.
R. Naz, "Honoraires de Messes", em "Dictlonnaire de nlque", vol. V. Paris 1953, cois. 1203-1210.
París
1927,
Droit Cano-
A. A. Lobo, L. M. Domínguez, S. A. Moran, "Comentarios Código de Derecho Canónico", vol. II. Madrid 1963, pp. 232-245. pp.
M.
Schmaus,
81-87.
"Der
Glaube
der Kirche",
PR 2/1958, pp. 73-76.
PR 3/1958, pp. 100-102.
— 173 —
vol.
II.
München
al
1970,
O menino sabio:
um caso de reencarnado ?
Em siniese: O menino brasilelro Eduardo de Moura Castro faleceu de leucemia aos sete anos e meló de idade nos Estados Unidos após
ter assumldo atftude serena diante da morte e manifestado a esperarla de se reencarnar no Brasil. Multos dos que acompanharam o caso, julgaram ter sido Eduardo a reencarnacáo de grande sabio ou monae oriental.
Ora tal interpretacSo se dissipa desde que se leve em conta o que
nem todos os jomáis noticlaram: aos tres anos e meló de idade, Eduardo comecou a freqüentar urna Socfedade de adeptos do Vedanta, onde terá sido doutrinado no sentido da reencarnado e imbuido dos principios hindú Istas referentes á vida presente, ao corpo, á serenidade de ánimo e á vida postuma. Este fato é suficiente para explicar a atitude tranquila de Eduardo diante da morte e a sua crenca na reencarnado. Nio há necessidade, aos olhos da psicología e do bom senso, de recorrer á h ¡pótese de urna encarnacáo anterior.
Comentan»: A imprensa noticiou em Janeiro pp. o caso do menino Eduardo de Moura Castro, que, aos sete anos e meio de idade, faleceu nos Estados Unidos da América, deixando mensagem que impressionou o público e que, entre
outras coisas, professava a crenca na reencarnacáo.
Em vista do impacto causado pelo assunto, vamos abaixo
deter-nos no ámago da questáo. 1.
O caso de Eduardo
Eduardo de Moura Castro era filho do diplomata brasileiro Claudio de Moura Castro e da senhora Bárbara, americana,
que, depois de separar-se do marido, foi com o menino para os Estados Unidos. Vítima de leucemia, Eduardo faleceu na
eidade de Santa Bárbara (U.S.A.) aos 10/01/78, antes de
completar oito anos de idade, e após ter feito declaracóes em fita magnética e haver pedido aos médicos, com toda a sere
nidade, que o deixassem morrer de morte natural, desligando o respectivo equipamento de oxigénio; este so lhe trazia mais sofrimento. Eduardo faleceu após dispor a respeito dos por menores dos seus funerais e do lugar do seu sepultamento. — 174 —
UM CASO DE REERCARNACAO?
35
Durante os breves anos de sua vida, surpreendeu a quantos com ele conviveram, em vista do que fazia e dizia. Tais impressóes levaram a crer que ele era a reencarnagáo de um sabio
ou de um monge oriental. Alias, o próprio menino, na mensagem que deixou gravada, professou a esperanca de reencarnar-se no Brasil e em corpo sadio. Morrer, para ele, era o
mesmo que dormir; «quando morremos, ai, sim, somos real
mente nos mesmos».
A titulo de ilustracáo, transcrevemos aqui parte do diálogo ocorrido entre a Sra. Williams Donwey, representante da organizacáo «Hospice» (que se dedica a confortar as pessoas que váo morrer), e o menino, poucos dias antes de falecer: D — Por que
vocé decldiu
morrer
dessa
manelra?
E — Por causa do meu corpo doente. S¡nto-me doente. Gostaria morrer e depois no céu vocé nao tem essas dores mals. E, se
de alguma vez gostar de voltar á vida novamente, vocé nao terá mais dores.
As vezes a gente pode voltar sem sofrer. D — Vocé
acha entSo que
reencarnará?
E — Sim.
D — Vocd gostaria de explicar para nos seus sentimentos sobre a
reencarnado?
E — Sim. saudável.
Quando
eu
morrer,
gostaria
de
vottar parar urna
vfda
O — Vocd tem alguma idéia sobre o que vocé será na outra vida? E — Um
menino saudável.
Ou,
quetn
sabe,
melhor
do
que
sou
agora.
D — Vocé pensa E — Nao. Acho voltar novamente. D — Vocé sem saúde?
sabe
que voltará e ficará doente que voltarel por
que
vocé
como
um
escolheu
novamente?
menino nesta
saudável, vida ter
quando
urna
vida
E — Nao. N9o se¡. Quando vocé escolhe a vida no céu, voltamos á vida na Térra com saúde ou sem saúde. Nao é bem vocé quem decide. Eu talvez tenha decidido por urna vida saudável, mas nao sel por que nao aconteceu assim. Pode ser que vocé escolha ter saúde e nao a tenha depois; vocé me entende?
D — Se vocé voltar á Térra, pessoa, um bichinho, urna flor...? E — D — máe, seus E — D —
vocé
acha
que
voltará
como
urna
Um menino. Vocé acha que, quando voltar, vocé voltará a conhecer sua amigos, ou irá para outro país ? Eu acho que voltarel para onde eu viví antes... no Brasil. Vocé tem alguma razfio para amar o Brasil tanto?
E — Sim. Meus primos estSo lá e meu pai. D — Há quantos anos vocé está, fíente ? E — Desde
que
eu tinha tres anos".
(Extraído de "O Globo", 29/01/78, 1? cad., p. 25).
— 175 —
36
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 220/1978
2.
Refletindo um pouco...
A explicagáo do fenómeno por recurso á tese da reencar nagáo baseia-se no fato de que
1) o menino se mostrou dotado de notável serenidade e lucidez de ánimo; 2) professou nascer no Brasil.
crer na reencarnagáo e esperar voltar a
Ora quem conhece os precedentes biográficos de Eduardo de Moura Castro encontra nos mesmos as razóes tanto da tranqüilidade de espirito do menino quanto das suas referencias
á reencarnagáo, evidenciando-se assim supérflua, se nao mesmo fantasista, a elucidagáo do caso por recurso á tese
da reencarnagáo.
Com efeito. Alguns jornais, embora nem todos, noticiaram que Eduardo, aos tres anos e meio de idade, comegou a freqüentar um grupo de seguidores da antiga religiáo oriental Vedanta. Como se compreende, ñas reunióes dessa Sociedade foi doutrinado no sentido da reencarnagáo e imbuiu-se das idéias hinduistas relativas ao sofrimento, ao sentido da vida, á morte, etc. Em conseqüéncia, tornou-se apto a encarar a morte com serenidade e esperar a sua próxima reencarnagáo... Vé-se, pois, que a mensagem de Eduardo foi aprendida nesta
vida mesma: é a expressáo do psiquismo do próprio menino que, durante aproximadamente quatro anos de sua infancia (receptiva como é toda infancia), foi impregnado de conceitos e teses hinduistas e reencarnacionistas. Louve-se a serenidade de Eduardo diante da morte — o que é coisa rara; mas nem por isto se diga que se trata de genio reencarnado. Eduardo foi simplesmente um menino que recebeu educagáo religiosa
numa escola oriental e absorveu dócilmente os ensinamentos ai ministrados, como teria absorvido ensinamentos diversos ou mesmo contrarios, se estes lhe tivessem sido oferecidos; a
idade do menino nao lhe permitía discernir entre as diversas proposigóes doutrinárias que lhe iam sendo ministradas. Assim se dissipa aos olhos do bom senso e da psicología a «mística» que o caso possa ter inspirado a parte do público. — 176 —
Valioso depolmento:
fala werner von braun
A onda de materialismo que marca os nossos tempos, poderia sugerir ao observador que o materialismo decorre precisamente do avango da ciencia, correspondendo a urna atitude mais esclarecida e evoluída do ser humano. A crenca em Deus e nos valores transcendentais seria resquicio do obscurantismo ou da cultura infantil e supersticiosa ou amedrontada de épocas passadas. Ao menos é o que apregoa o materialismo dialético de Karl Marx e o que muitos intelectuais aceitam acriticamente. Ora, para dissipar táo errónea concepgáo, nada há de mais eficaz do que o testemunho dos den tistas mais eminentes de nossos tempos, pois estes falam por experiencia própria. Citaremos, pois, a seguir, Werner von Braun, o inventor da bomba V-2, o pai da astronáutica e o realizador do gigantesco Saturno V.
Werner von Braun faleceu aos 65 anos de idade, perto de Washington (U.S.A.). Alemáo de origem e naturalizado norte- americano, von Braun foi um dos maiores dentistas da nossa época. Eis a sua profissáo de fé: "Hoje, mais do que nunca, a sobrevivencia — a sua, a minha, a de nossos filhos — depende da nossa adesáo aos
principios éticos. Só a ética decidirá se a energia atómica vai
ser urna béncáo ou a origem da destruicáo total da humanidade.
Donde vem o desejo de agir conforme os principios da ética ? O que nos faz ser moráis? Creio que há duas torgas que nos ¡mpulsionam. Urna délas é a crenga no Juízo Final, em que teremos de prestar contas do que fizemos com o grande dom que Deus nos concedeu: a vida terrena. A outra é a crenga numa alma ¡mortal, urna alma que desfrutará da recompensa ou sotrera o castigo decretado no Juízo Final. A crenga em Deus e na imortalidade da alma é o que nos
dá a torga moral e a orientagáo ética de que necessitamos praticamente para todas as agóes de nossa vida cotidiana. — 177 —
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«PERGUNTE E RESPONDEREMOS? 220/1978
Em nosso mundo moderno, muita gente parece experi mentar a sensacáo de que, de certo modo, a ciencia tornou antiquadas ou pos fora de lugar as idéias religiosas. Mas creio que a ciencia reserva urna verdadeira surpresa aos céticos. A ciencia nos diz, por exemplo, que nada' na natureza, nem a mais ínfima partícula, pode desaparecer sem deixar rastro.
Temos que pensar nisto. Se o fazemos assim, os pensamentos sobre a vida já nao voltario a ser os mesmos. A ciencia descobriu que nada pode desaparecer sem deixar rastro. A natureza nao conhece a extincao. Sabe apenas da transformacáo. Entáo, se Deus aplica este principio fundamental ás partes diminutas e insignificantes do seu universo, nao é lógico supor que o aplique também á obra prima da sua criacáo: a alma humana?
Creio que é assim. E tudo o que a ciencia me ensinou e continua ensinando, reforca a minha crenca na continuidade de nossa existencia espiritual depois da morte do corpo. Nada desaparece sem deixar rastro". Como se compreende, o argumento de Werner von Braun
em favor da sobrevivencia da alma humana é expresso segundo as categorías de pensamento e linguagem de um físico. Outros argumentos, passando por outras vias, chegam á mesma conclusáo: no ser humano existe algo que transcende a mate
ria e, por isto, nao é oriundo da materia nem perece com a materia: chama-se «alma humana», cuja natureza é imaterial ou espiritual. É chamada a ver a Deus, a Beleza Infinita, face-a-face por todo o sempre.
A respeito publicaremos oportunamente um artigo em PR.
— 178
O V ENCONTRÓ NACIONAL DA ABESC Teve lugar em Petrópolis (RJ) de 21 a 24 de Janeiro pp. o V Encontró Nacional da Associagáo Brasileira de Escolas Superiores Católicas (ABESC), que reúne em intercambio fraterno e salutar as treze Universidades Católicas do Brasil e 53 Faculdades Isoladas católicas. Estavam presentes 34 representantes de um total de 25 dessas instituigóes, tendo algumas das demais justificado a sua ausencia. O Encontró teve duas partes. A primeira versou sobre a XII Assembléia Geral da Federado Internacional das Uni versidades Católicas (FIUC) a se realizar em Porto Ale gre (RS) de 16 a 24 de agosto pf., enguanto a segunda parte teve por objeto de estudo a situagáo presente e futura das Escolas Superiores isoladas no Brasil.
1. A XII Assembléia da FIUC tem merecido especial atengáo por parte da ABESC, que julga tratar-se de certame de grande relevo para a orientagáo do ensino universitario católico.
O tema a ser entáo abordado tem por titulo «A
Universidade Católica, caminho de pluralismo cultural a ser-
vigo da sociedade e da Igreja». Cada continente geográfico apresentará um documento referente ao assunto, sendo que o Brasil, como país anfitriáo, apresentará o seu próprio. Foi, portante, discutido em Petrópolis um estudo básico sobre o tema, elaborado pelo Pe. Alberto Antoniazzi (Belo Horizonte); tal estudo deverá receber alteragóes diversas para que repre sente o pensamento exato das instituigóes de ensino superior católico do Brasil. Entre outras notas desse documento, me rece registro a seguinte:
A expressáo «pluralismo cultural»,
por mais usual que
seja na linguagem de nossos dias, é inadequada do ponto de vista teológico, para exprimir o fenómeno, da diversidade das culturas que marca a sociedade contemporánea; com efeito, o vocábulo «pluralismo» pode sugerir o relativismo ou a relativizagáo das culturas. Deixa-se assim de por em relevo o
fato de que o Cristianismo se baseia na pessoa e no aconte-
cimento «Jesús Cristo», que deixou ao mundo urna mensa-
gem inconfundivel; esta possui valor que nao é lícito nivelar com os demais nem permitir sofra o risco da relativizagáo.
Daí se segué que o documento brasileiro proporá a substituigáo da locugáo «pluralismo cultural» por «pluralidade cultu
ral» — o que evitará o possivel mal-entendido atrás mencio nado. Ademáis esse mesmo documento preconiza o diálogo — 179 —
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tPERGUNTE E RESPONDEREM0S> 220/1978
entre a teología, a filosofía e as ciencias no intuito de pro mover a síntese harmoniosa das mesmas numa hora em que muitos intelectuais tendem a valorizar unilateralmente a cien cia e a técnica, cultivando o cientificismo e o tecnicismo. Mais: o documento brasileiro prevé a prestagáo de servicos diversos a cada comunidade local em cujo meio esteja inse rida urna Universidade Católica (tais servigos traduzir-se-áo em cursos de extensáo universitaria, como também na promo-
Cáo da fraternidade, da justiga e da paz entre os homens...).
2.
A temática das Facilidades
Católicas
isoladas foi
ilustrada primeiramente por um painel, em que deram seu depoimento a Faculdade de Filosofia de Fortaleza (CE), a
Faculdade de Filosofia «Medianeira» de Sao Paulo (SP) e a de Filosofia «Dom Bosco» de Santa Rosa (RS). Assim tres regióes bem diversas do Brasil foram apresentadas á assem-
bléia, com as facilidades e os obstáculos que possam oferecer á escola isolada católica. Na verdade, sabe-se que o Conselho Federal de Educagáo está voltado para o problema da multiplicagáo das Escolas isoladas e da baixa do nivel do ensino que se tem verificado em conseqüéncia. Em vista disto, tem
promulgado exigencias diversas, que póem em perigo a sub sistencia das Escolas isoladas atuais, por mais que se esforcem por aprimorar a qualidade do ensino respectivo. Espe cialmente as Facilidades de Filosofia se véem fadadas a ter clientela cada vez mais reduzida, visto que o mercado de trabalho, para os diplomados em Filosofia, foi limitado ao ensino da Filosofia no segundo grau (o que na realidade nao ocorre). Justamente a fim de elucidar a problemática daí decorrente para muitas instituigóes católicas, o Pe. José Vieira de Vasconcelos, salesiano, entáo presidente do Conse lho Federal de Educagáo, foi a Petrópolis no dia 21/01 e
fez interessante palestra aos participantes do Encontró: mostrou-lhes os porqués das severas medidas adotadas por aquele
Colegiado, citando fatos concretos que exigem consideragáo
das autoridades governamentais, e abrindo como perspectiva a integragáo das Escolas isoladas em Universidades já cons tituidas ou em Universidades novas a serem constituidas por Escolas isoladas existentes na mesma regiáo geo-educativa. O conferencista lembrou oportunamente que Universidade nao significa justaposigáo de Escolas vinculadas entre si táo somente por estatutos ou aspectos jurídicos, mas exige espi rito novo, aprimoramento de tarefas e servigos dentro da comunidade nacional. Em oposigáo á tendencia a alargar o funil que leva o estudante á Universidade, e «democratizar»
— 180 —
V ENCONTRÓ NACIONAL DA ABESC
41
o ensino do terceiro grau, o entáo presidente do Conselho Fe deral de Educacáo afirmou que o ensino universitario, para poder ser o que dele se espera, manter alto nivel e formar profissionais á altura do seu nome, deve ficar reservado a urna élite. Tal élite nao há de ser aristocrática ou a dos filhos de familias abastadas, mas há de ser élite intelectual, podendo incluir em seu seio os filhos das familias mais modestas da sociedade merecidamente aquinhoados por bolsas de estudos. Mesmo nos Estados Unidos da América a proporgáo dos que chegam á Universidade nao ultrapassa os 5%. — Por fim, o Pe. Vasconcelos sugeriu á ABESC que no decorrer de 1978 examine a situagáo académica e financeira de cada Escola isolada católica que aceite tal servico, a fim de ajudá-la a poder encaminhar-se para o respectivo futuro. A proposta foi imediatamente aceita pela presidencia da ABESC. Em suma, o Encontró foi de grande proveito para os participantes, que todos compartilhavam as preocupagóes das mantenedoras e dos diretores das Escolas isoladas; a respeito os horizontes se clarearam e tragaram-se pistas para garantir a agáo pedagogico-pastoral da Escola Católica dentro da nova legislagáo escolar brasileira. Desta forma o Encontró contribuiu para corroborar nos presentes a consciéncia do valor da Escola Católica. A propósito dizia D. Serafim Fernandes, presidente da ABESC e Magnifico Reitor da Universidade Católica de Minas Gerais, em tom muito convicto: «Em educagáo, tudo o que plantarmos, nos o colheremos, nem sempre de imediato, mas, em alguns casos, longos anos após a semeadura!» A experiencia comprova estes dizeres e abona o trabalho dos educadores, máxime se estes aceitam ser ins trumentos de Cristo. Estévao Rettencourt O.S.B.
181
42
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 220/1978
CRISTIANISMO E FILOSOFÍA NA AMÉRICA LATINA UM
CURSO
INTENSIVO
DE
ALTA
PARA DOUTORES E LICENCIADOS
HOJE
ATUALIZAQÁO
EM FILOSOFÍA
DE 16 A 30 DE JULHO DE 1978 ARTICULACÓES DO TEMA GERAL
1? — |jm esclarecimento ¡ntrodutórlo sobre o tema do curso-pesquisa de 1978 e sobre os processos metodológicos deste novo coloquio filo sófico, quinto da serie Iniciada em 1974: 16 de julho as 16 h. 2? — a distlncfio entre o saber filosófico e o teológico, suas relagSes mutuas e sua conjuncSo realista na perspectiva da elaboragfio de urna sfntese crista atualIzada para a América Latina de hoje. Días 17, 18 e 19 de ]ulho
— Dr. Urbano Zules, Diretor e Professor do Instituto de Teología e Ciencias Religiosas da Pontificia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS. 3? — A figura do cristáo hoje e a filosofía na sua autentlcidade •americana. — Días 20, 21, 24, 25 e 26 de julho.
— Dr. Alberto Caturelll, Professor de Filosofía da
latino-
Universidade de
Córdoba, 1? Vice-Presidente da AssociacSo Latino-Americana de Filósofos Católicos.
4? — A funcSo da filosofía no diálogo cristáo com o secularismo hodierno na América Latina. — Días 27, 28 e 29 de julho.
— Dr. Henrique de Lima Vaz S.I., Reltor do Instituto Alolslano do Rio de Janeiro e Professor Universitario de Filosofía em Belo Horizonte, MG. 5? — As conclusOes fináis,
ressaltando principalmente :
a) — o significado positlvo-construtlvo e critico da filosofía na vida e cultura dos povos latino-americanos hoje:
b) — a exigencia atual da pesquisa científica e da crlatlvidade filo sófica na América Latina;
c) — a filosofía como interdlsclpllna dentro de um conjunto de va lores ;
d)
o sentido auténtico do pluralismo filosófico sob o signo pro pulsor do cristianismo na América Latina hoje. Ola 30 de Julho, ás 9 h
Prof. Dr. Stanlslavs Ladusans S.I., Diretor do Conjunto d» Pesquisa Filosófica e Presidente da AssocíacSo Latino-Ameri cana de Filósofos Católicos.
— 182 —
43 OBJETIVO
Contribuir, através dos processos de Indagacfies monográficas, mesas redondas (organizadas pelos Professores Jofio Evangelista Térra S.I., Eduardo Abranches de Soveral, José Antonio Tobías), debates e dlssertac6es pessoals, para a aluallzacao dos professores das Universidades latlno-amerlcanas e de outros cultores da filosofía em nivel superior, bem como para o desenvolvlmenlo filosófica latino-americano, conforme as exigencias da realldade do hemisferio. Em consonancia com este objetivo, o curso tem também como flm proporcionar urna preparacao científica em 1978 para comemorar em 1979 o centenario da Encíclica de LeSo XIII sobre a filosofía crlstfi "Aeternl Patris" (4.VIII.1879 — 4.VIII.1979), que evoca a llgacfio do nosso filosofar ás rafzes cristas, e contribuir para dlnamlzar a nossa crlatlvldade no campo do pensamento profundo, conforme o lema contldo na dita Encíclica: "incrementar e aperfeicoar o antigo pelo novo — vetera novls augere et perftcere".
CONDICdES DE INSCRICAO 1? — Licenciatura em Filosofía, pelo menos; outro diploma equivalente; 2? — pagamento da taxa de inscribo e freqüéncla; efetuagño da inscrlcáo conforme o regimentó do curso-pesquisa.
INSCRICÓES Nos días úteis, das 8 ás 12 h e das 14 ás 17 h, na sede do Conjunto de Pesquisa Filosófica (CONPEFIL), situado no Km 26 da Vía Anhanguera, Sao Paulo, Capital, Brasil. BOLSA DE PESQUISA
Comprovada a necessidade, haverá posslbilldade de bolsas de pesquisa
para quem nao resida na cldade de Sao Paulo. LOCAL DO CURSO
O curso-pesquisa será realizado, em nivel de pós-graduacfio, no Con junto de Pesquisa Filosófica, "campus" universitario das Faculdades Anchleta, dos Padres Jesuítas, local tranquilo e atraente, fora da regido de polulpao, onde os inscritos poderáo ter também a hospedagem durante o curso e utilizar urna biblioteca especializada em filosofía. PROMOCÁO
O curso-pesquisa é promovido pelo Conjunto de Pesquisa Filosófica, entldade da Companhla de Jesús, tendo urna colaboracao efetiva da Assoclacao Latino-Americana de Filósofos Católicos, destinada a pensadores de
20 nac5es do hemisferio, que lem a sua sede central no mencionado Con junto.
INF0RMAC6ES
As InformacOes mals detalhadas podem ser obtldas visitando pessoalmente o Conjunto de Pesquisa Filosófica, Km 26 da Via Anhanguera, Sao Paulo, Capital; telefonando para tel. 260-7680 ou escrevendo á Diretorla do Curso (Caixa Postal 11.587 — 05049 S8o Paulo, S.P. — Brasil).
— 183 —
livros em estante Introducto á Biblia, com antología exegétlca, sob a direcáo geral de P. Teodorlco Bailarín!. Vol. U/3: Profetlsmo e Profetas em geral — Isaías — Jeremías — Lamentacfies — Baruc — Carla de Jeremías — Ezequlel. TraducSo de Freí Oswaldo Antonio Fu rían; revlsio de Pe. Ney Brasil Perelra. — Ed. Vozes, Petrópolis 1977, 431 pp., 165 x 235 mm.
Este tomo faz parte de urna colecfio, de cinco volumes de iniciacáo á
S. Escritura, á obra dos melhores exegetas Italianos, que representam fiel
mente a orientacáo da Igreja no tocante aos estudos bíblicos. Como se vé, o tomo U/3 nao abrange toda a literatura profética, ficando para o tomo II/4 (a ser publicado) os estudos dos livros nao abordados em II/3. O que chama a atencáo no lomo U/3, é o sabio título do capitulo II: Isaías e os
seus continuadores, ficando asslm compreendidos o profeta Isaías (Is 1-39), o Déutero-lsafas (Is 40-55) e o Trlto-lsatas (Is 56-66); enquanto o primeiro
é atribuido ao séc. VIII a. C, o segundo é situado no periodo do exilio (587-539, sendo provável o decenio final desta fase) e o terceiro Isaías é colocado em meados do séc. V a. C. O livro de Daniel, cuja redacSo final data do secuto II, ou seja, do lempo da resistencia macabaica aos sirios, é estudado no tomo U/4, ocupando o último lugar na serle dos livros profétlcos; esta colocagáo, embora quebré a ordem do canon bíblico, é fiel á cronología; ademáis sabe-se que On é mais apocaiipse do que obra profética.
A colecSo de Ballarini e seus colaboradores segué estilo estritamente didátlco e claro; é enriquecida pela exegese das principáis passagens de cada llvro analisado. € de notar também que as listas bibliográficas (de livros estrangeiros) sao completadas pelo tradutor mediante a Indicacáo de estudos ou artlgos publicados no Brasil; assim a obra de Ballarini é adaptada aos Interesses do leitor braslleiro. Tais títulos a recomendam aos estudiosos de S. Escritura como sendo urna das melhores coletaneas de que dlspomos no Brasil. Observamos aínda que da "IntroducSo á Biblia" a cargo de Ballarini e sua equipe já foram publicados: vol. I (Introducao Geral), vol. U/1 (O Pentateuco), vol. II/2 (Josué, Julzes, Rute, 1/2 Samuel,
1/2 Reís), vol. U/3 (conteúdo ácima enunciado), vol. IV (Os Evangelhos), vol. V/1 (Atos dos Apostólos, Sao Paulo e as epístolas aos Tessalonicenses, 1/2 Corintios, Gálatas, Romanos), vol. V/2 (Epístolas do catlvelro, Pastorais, Hebreus, Católicas, Apocaiipse). ,
Aguardamos o vol. U/4 (restantes livros proféticos) e o vol. III, que, como anunclam os editores, versará sobre os livros saplenclais. Pergunta-
mo-nos, porém: onde será Inserido o estudo de Tobías, Judlte, Ester, 1/2 Crónicas, Esdras e Neemlas ? Como quer que seja, qualquer dos volumes já publicados pode ser utilizado com proveito Independentemente dos demais.
O desafio de ser crlstáo, por Karl Rahner. TraducSo de Frei Alvaro Machado da Silva. — Ed. Vozes, Petrópolis 1978, 167 pp., 138 x 210 mm.
Temos aqui um conjunto de "textos espirituais" (como diz o subtftulo do livro) ou de reflexdes teológicas acerca de temas atinentes á vida espi ritual. A prfmelra e a segunda partes do livro versam sobre assuntos de interesse geral, como o homem, a verdade, a evangelizacSo, a fé, a oracáo, a penitencia, ao passo que a tercelra parte diz respeito diretamente á Vida Religiosa regular. O autor é teólogo notável nao só pela profundidade de sua doutrina, mas também pelo seu interesse por questQes de ascese e mística; estes predicados de Rahner transparecem claramente através das páginas do llvro, embora o estilo do autor seja denso e carregado.
— 184 —
Chama-nos a atencSo a p. 101 da obra, em que Rahner, abordando a
questáo da morte, se mostra desfavorável á "mlstlflcacáp" (slc I) da mesma,... mistificarlo que consistiría no segulnte: no momento exáto da morte,
o ser humano serla sempre Iluminado por especial claráo de Deus, a fim de poder proferir, com nitidez nunca dantes alcanzada, o seu último Slm ou NSo frente a Deus. Karl Rahner julga que esta hipótese, sustentada por
L. Boros e outros teólogos, é gratuita, bremos que Rahner tem razáo. Com
efeito,' existem casos de morte lenta precedida de esclerosa dos tecldos, de tal modo que a mencionada lucidez se tornarla entSo algo de antinatural. — Urna vez que n3o se admita a ilumlnacáo postulada por Boros, verlflca-se aínda mais nítidamente quanto é necessário avivarmos todos os dias a nossa consciéncia da importancia de cada urna de nossas pequeñas opcSes;
sejam.sempre coerentes, ao máximo, com a nossa opcáo fundamental e
o nosso fim supremo.
Em suma, o livro de K. Rahner será proficuo a quantos procuram fun damentar sólidamente a sua vida de ascese e oracáo. ^
...
Revista "Parapsicología
e
Pslcolrónlca". Ano 2,
Científica Aura Ltda., Sfio Paulo, 48 pp., 210 x 275 mm.
fí°
3.
— Editora
A parapsicología estuda as manlfesta$6es do pslquismo humano que se realizam para, isto é, ao lado do ordinario ou habitual; trata de fenómenos
naturals (explicáveis pela própria natureza da psique) qué ocorrem em determinadas circunstancias (forte sugestionamento em estado lúcido ou em hipnose, transe...).
A parapsicología tem sido cultivada com rigor científico por Joseph Rhlne na Duke Unlversity (U.S.A.), Robert Amadou (París) e outros sabios. Ela explana, entre outras coisas, as potencialidades do subconsciente humano.
Ao lado, porém, da ciencia parapsicología, existem falsas ciencias que usurpara ¡ndevidamente o nome de parapsicología ou outro congénere. Tal é o caso da Psicotronlca... A revista ácima anunciada se Interessa pelas enerqlas cósmicas e pela pretensa concentracSo das mesmas nos
objetos que tenham forma de pirámide; ao enunciar isto, o editor aproveita a ocasiSo para oferecer ao leitor varios tipos de pirámide de aluminio, de cobre, de madelra, de plástico, etc,
Mais de um artigo da revista abordam as pirámides do Egito, men
cionando os apregoadós segredos das mesmas — o que cortamente con tribuí para recomendar ao leitor o uso de urna réplica de pirámide, a fim
de perfazer exercicios físicos ou mentáis a domicilio. Ora sabe-se que há numerosas mistificacQes e lendas em torno das pirámides, cuja realldade é bem mais simples do que a descrevem. Cf. PR 217/1978, pp. 18-20.
Outros artlgos falam da aura e sugerem aparelhos para medir a aura do corpo humano.
Ora tudo Isto tem o caráter de proposigóes nio comprovadas pela
ciencia, mas, sim, resultantes da fantasía. Os articulistas da revista supfiem que de todos os corpos emanem ondas energéticas e vibratorias — o que é hipótese arbitraria. Além do que, a doutrlna da aura ou da forca ódlca (gratuita ou Infundada) ó particularmente cara aos espiritas, que sobre ela
constroem suas teorías. De resto, é surpreendente a quantidade de minucias relativas á aura propostas ao leitor ñas pp. 24-26 do fascículo em quest&o; só servem para impressionar o leitor Incauto. Em se tratando de fenómenos portentosos, é preciso, especialmente em nossos dias, que a lógica e o bom senso exercam a sua funcSo critica I E. B.
QUEM SAO OS CEGOS? "NO CAIRO, HAVIA UM VELHO TRAPEIRO SENTADO A CALCADA DE UMA RUAZINHA, PA RALITICO E CEGÓ.
QUANDO LHE PERGUNTAVAM : 'Ó VELHO PAI, QUE FAZES Af ? NAO TE ABORRECES?1, LEVANTAVA O SEMBLANTE DESCARNADO, MAS
RESPLANDECENTE QUAL MISTERIOSA AURORA. E RESPONDÍA:
'NAO, MEU FILHO, NAO ME ABORREGO JAMÁIS, MAS DOU GRACAS A DEUS1. 'GRAQAS A DEUS? POR QUE, Ó VELHO PAI?1
'AGRADEQO A DEUS PELO RAIO DE SOL
QUE ACARICIA, PELO PÁSSARO QUE OUCO CAN TAR AO LONGE, PELA GALINHA QUE ACABA DE POR SEU OVO E PELO CEU AZUL QUE OS OUTROS
CONTEMPLAM.
VIVO
NA
ALEGRÍA,
HAMDULILLAH, LOUVADO SEJA DEUS! ELE ESTA PERTINHO DE MIM'.
AFINAL
DE
CONTAS,
QUEM
SAO
OS
CEGOS ?"
EMMANUELLE CINQUIN
"CHIFFONNIÉRE AVEC LES CHIFFONNIERS" (ED. OUVRIÉRES)
(Texto transcrito de "Informations Catholiques Internationales" n 516, 15/07/1977, 4 capa; neste fascículo alude ao Editorial, pp. 141 s).