Ano Xix - No. 217 - Janeiro De 1978

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Projeto

PERGUNTE E RESPONDEREMOS ON-LIME

Apostolado Veritatis Spiendor com autorizagáo de

Dom Estéváo Tavares Bettencourt, osb (in memoriam)

APRESErvTTAQÁO

DA EDigÁO ON-LINE Diz Sao

Pedro

que devemos

estar preparados para dar a razáo da nossa esperanga a todo aquele que no-la pedir (1 Pedro 3,15).

Esta

necessidade

de

darmos

conta da nossa esperanga e da nossa fé hoje é mais premente do que outrora,

'.■"

visto que somos bombardeados por numerosas correntes filosóficas e

religiosas contrarias á fé católica. Somos assim incitados a procurar consolidar nossa crenga católica mediante um aprofundamento do nosso estudo. Eis o que neste site Pergunte e Responderemos propoe aos seus leitores: aborda questóes da atualidade controvertidas, elucidando-as do ponto de vista cristáo a fim de que as dúvidas se dissipem e a vivencia católica se fortaleca no Brasil e no mundo. Queira Deus abengoar este trabalho assim como a equipe de Veritatis Splendor que se encarrega do respectivo site.

Rio de Janeiro, 30 de julho de 2003. Pe. Esteváo Bettencourt, OSB

NOTA DO APOSTOLADO VERITATIS SPLENDOR Celebramos convenio com d.

Esteváo

Bettencourt e

passamos a disponibilizar nesta área, o excelente e sempre atual

conteúdo da revista teológico - filosófica "Pergunte e Responderemos", que conta com mais de 40 anos de publicagáo.

A

d.

Esteváo

Bettencourt

agradecemos

a

confiaca

depositada em nosso trabalho, bem como pela generosidade e zelo pastoral assim demonstrados.

r

V

índice p&g.

NATAL E O MISTERIO DA IGREJA

1

Os "Novos Filósofos" franceses: ' ' "DEUS MORREU, MARX MORREU, E EU MESMO NAO ME ESTOU SENTINDO BEM" (Michel Le Bris)

3

No mundo da ficc3o:

AÍNDA UMA VEZ ERICH VON DANIKEN

12

Sensacional:

"AS PROFECÍAS DE NOSTRADAMUS"

22

Comunicacdes do Além ?

E O NOVO CASAMENTO DE GILDA DE ABREU ? LIVROS

EM

36

ESTANTE

3' capa

COM APROVACAO ECLESIÁSTICA

NO

PRÓXIMO

NÚMERO :

Data de Páscoa coraum a todos os cristáos ? — A crenca

Baha'i.

«Cartas da Prisño». — Católicos e comunistas na Itá'ia. — «O mais importante é o amor».

«PERGUNTE

E

RESPONDEREMOS»

Assinatura anual

Cr$

100,00

Número avu'so de qualquer mes

Cr$

10,00

(A partir de Janeiro 1978) RVTtArXO DE PR

REDACAO DCFB Calxo

Postal 2.666 ZC-00 20.000 Rio de Janeiro (RJ)

ADMINISTRAGAO

Uvraria Mlsslonarta Editora Bua México, 168-B (Castclo) 20.000 Rio de Janeiro (RJ) Tel.: 224-0059

NATAL E O MISTERIO DA IGREJA A Igreja está em foco... nos jomáis, ñas revistas, ñas conversas informáis... Muitos a admiram, apontando o seu esforco de atualizagáo concretizado em medidas para trans

mitir hoje de maneira nova as eternas verdades do Evangelho... Outros, porém, a criticam, pois nela véem abusos e deficiencias da parte de ministros e de fiéis que mais deveriam primar pela fé e a dignidade. Em conseqüéncia da sua decepgáo, muitos fiéis católicos sao propensos a abandonar a Igreja, professando um Cristianismo individual, descompro metido de qualquer institucionalizacáo...

Compreendemos o drama íntimo daqueles que, amando o Cristo, sofrem por verificar que nem sempre os discípulos do Senhor Lhe dáo lúcido testemunho.

A tais fiéis católicos

será oportuno lembrar algo que o tempo de Natal — mais urna vez recém-vivido por nos — incute fortemente, a saber:

o misterio da Encarnagáo ou do Deus feíto homem e desfi gurado sob a fragilidade humana é o misterio central da fé crista; com efeito, o cristáo tem seu referencial em Cristo,

que é Deus feito homem,... Deus que quer vir aos homens através do humano, ocultando a Etemidade sob a forma de realidades temporais, encobrindo a riqueza divina com os véus da fragilidade e da pobreza do homem. Ele podia nao

ter procedido assim: ter-se-ia entáo dado aos homens de

maneira direta e fulgurante... Mas, se á Sabedoria Divina aprouve servir-se do que é pequeño e abjeto para transmitir 0 que é grande e divino (cf. ICor l,27s), ao cristáo toca

aceitar este designio com todas as eonseqüéncias que ele acarreta. Isto quer dizer que toda a historia das comunicagóes de Deus aos homens será a continuagáo do misterio da

Encarnacáo.

Certa

vez,

Joáo

Batista,

tendo

mandado

perguntar

a

Jesús se Este era realmente o Messias aguardado, recebeu a seguinte resposta: "Ide contar a Joáo o que estáis ouvindo e vendo: os cegos recuperan

a vista, os coxos andatn, os leprosos sSo purificados, os surdos ouvem, os

mortos ressuscitam e os pobres sSo evangelizados. E bem-aventurado aquele que nSo se escandalizar a meu respeito!" (Mt 11, 4-6).

Com estas palavras, Jesús aludía aos prodigios que Ele 1 a realizando em sinal da sua natureza divina; Ele renovava as criaturas, restaurava os elementos deteriorados pelo pe cado... Mas predizia que Ele seria escandaloso... como? — Sim; havia de ser pregado á cruz,... desafiado para que

desta se desprendesse como havia salvo a tantos durante o seu ministerio público (cf. Mt 27, 39-43). E, nao obstante,

Ele nao se movería, deixando-se morrer como que inepto e vencido sobre o patíbulo. A fraqueza de Cristo, imprevista e surpreendente, desconsertaria a muitos, provocando a fuga dos próprios discípulos, exceto Joáo. Todavia o Senhor cru cificado era o Rei da gloria, voluntariamente desfigurado, mas portador da vida divina que ressuscitaria seu corpo tres días dcpois! Felizes, portanto, aqueles que nao se escandali-

zassem a seu respeito! Ora sorte semelhante toda á Igreja instituida pelo próprio Cristo para ser seu Corpo prolongado (cf. ICor 12). Ele a concebeu segundo o misterio ou a lei da Encarnagáo. Isto significa que Ele haveria de dar á sua Igreja o poder de fazer prodigios,... prodigios de renovagáo dos homens e da historia... Sim; foi a Igreja, entregue a homens rudes, que enfrentou o pujante Imperio Romano, sofreu as perseguigóes deste, mas acabou por vencé-lo, como atestava o Im

perador Juliano o Apóstata (361-363):

«Venceste, Galileu!»

Foi a Igreja que salvou das ruinas os tesouros da cultura greco-romana e os entregou aos povos bárbaros; foi a Igreja que, mediante os seus santos e heróis, bergou as nagóes que

hoje lideram o mundo ocidental ou, simplesmente, o mundo inteiro... A Igreja, mesmo ñas fases de crise mais aguda,

sempre enoontrou em sua vitalidade própria o fermento para revigorar suas forcas.

Todavia da Igreja também se pode e deve dizer aqiiilo que Cristo afirmou de Si:

«Feliz aquele que nao se escan

dalizar a seu respeito!» Recoberta pela fragilidade humana, a

Igreja traz as marcas da deficiencia dos seus filhos, ora mais, ora menos patentes. Todavia a Igreja continua contendo em si a forca de Deus para a santificagáo dos homens (cf. 2Cor

12,10); a fragilidade dos filhos da Igreja ó incapaz de esva-

ziar a riqueza dos meios de santificagáo que Cristo neja depositou e que, passando por máos limpas ou sujas, sao sempre entregues impolutos a quem os procura na fé. Estas verdades sao de importancia fundamental para os

fiéis que sofrem em seu íntimo as repercussóes de episodios

dolorosos... O Natal, recém-celebrado, veto avivar no povo de Deus a consciéncia do grande designio do Pai que se

manifesta tanto no presepio de Belém como na historia da Igreja. Possa esta consciéncia orientar os fiéis católicos durante todo o ano de 1978!

E.B. 2

PERGUNTE

E

RESPONDEREMOS»

Ano XIX — N* 217 — Janeiro de 1978

Os "Novos Filósofos" franceses:

"deus morreu, marx morreu

e eu mesmo nao me estou sentindo bem" (Michel Le Bris) Em sintese: Em meados de 1977, tornou-se corrente dos "Novos Filósofos". Foram marxistas,

notoria na Fringa a maofstas ou mesmo ultra-maolstas, mas hoje se confessam entediados de todo e qualquer totalitarismo, seja de esquerda, seja de direita. A experiencia do mar xismo, comprovada no decorrer do secuto XX pela política de esmagamento do homem, os desiludiu. Embora nao tenham substitutivo exato

para propor em lugar dos totalitarismos, os "Novos Filósofos" se professam seguidores de Sócrates, o pensador que apregoava, antes do mais, os valores éticos. Insinuam, assim, que a renovacáo da sociedade só poderé ser obtida se doravante os homens comecarem a dar atencáo ás qualidades moráis da honestidade, da veracidade, da fideüdade, do peito ao semelhante.

res-

A posigSo dos "Novos Filósofos" é altamente significativa porque transiere o problema da renovacao da sociedade do plano meramente

jurídico e institucional para o plano da consciéncia moral e da ética. Verdade é que os homens nunca poderáo viver em sociedade sem sis tema jurídico e distribuicáo de direitos e deveres; também nunca poderáo deixar de

cultivar a ciencia e a técnica,

que beneficiam

grandemente a

humanidade. Mas é outrossitn verdade que toda organlzacao social e qualquer progresso tecnológico estáo ladados ao fracasso s& nao se oasearem no cultivo dos valores éticos e no despertar da consciéncia moral em cada individuo.

é por lembrarem tais verdades que os "Novos Filósofos" sSo impor tantes. Representan! a alma humana como tal (mesmo sem Religiao) can sada do materialismo e dos ídolos do totalitarismo e posta á procura de outros valores que sao os do Transcendental e Infinito ou os valores de Deus (... Deus procurado aínda ás apalpadelas; cf. At 17, 27).

Comentario: Em meados de 1977 tornou-se notorio na Franga um grupo de intelectuais que, após ter feito a expe

riencia da militáncia marxista, proclamam estar KarI Marx 3

_4

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 217/1978

ultrapassado ou morto; póem-se a denunciar o totalitarismo de Marx e o de Mao como também os abusos do capitalismo, assumindo posigóes de contestagáo radical a todos os extre mismos ... A atitude desses pensadores vem chamando a atencáo do público estudioso, que lhes atribuí o titulo de

«Novo.; Filósofos:»; pnrocom representar o pensamento de numerosos cidadáos tanto do mundo ocidcntal como dos pai-

ses da Cortina de Ferro.

Na realidade, trata-so de um grupo de oito

ou

nove

homens cuja idade vai dos 28 aos 40 anos. Aderiram ao marxismo ou mesmo ao maoísmo no inicio de sua reflexáo filosófica; todavia vleram a desiludir-se, tendo em vista o

comportamento dos países líderes do comunismo (a Rússia e a China).

Os escritos de Alexandre Solzhenitsyn,

como

também a conduta dos marxistas franceses por ocasiáo do

movimento estudantil-operário de 1968, xnuito contribuirán!

para desapontá-los. Hoje em dia nao apregoam modelo algum do Estado político, mas anseiam pela restauragáo do código de honra entre os individuos humanos e os povos. O seu modelo é Sócrates, o filósofo questionador que preconizava entre os ssus contemporáneos urna consciéncia mais profunda dos grandes valores da ética.

Alias, esse grupo de pensadores contrarios as ideologías políticas parece exprimir um estado de espirito que se tem

propagado nos países ocidentais durante os últimos anos. O sociólogo norte-americano Daniel Bell publicou em 1960 o livro «The End of Ideology» (O fim das ideologías), no qual afirmava que as ideologías totalitarias do sáculo XIX foram

esvaziadas pelos graves males que elas produziram no sé-

culo XX, como os campos de concentragáo, a sufocagáo das revoltas húngara e tchccoslovaca, os ensaios de shows mos

covitas, os Estados totalitarios promissores de bem-estar... Embora o comunismo tenha hoje seu peso na Italia e na

Franga, aparece nítida a segtünte verificado: para a «intel-

ligentsia» mais exigente, as ideologías perderam «a sua verdade» e a sua capacidade de persuadir.

Sao poucos os pen

sadores serios que acreditam que, mediante urna «engenharia social», possa ser atingida a utopia da harmonia social. Com outras palavras, os «Novos Filósofos» franceses afirmam a desintegragáo do marxismo precisamente quando ele parece vivo e vibrante no setor da política. Tém a coragem

de denunciar o

socialismo

num

momento

em

que a

OS «NOVOS FILÓSOFOS» FRANCESES

5

alianza socialista-comunista na Franga goza de forte probabilidade de dominar o Parlamento por ocasiáo das eleigóes de margo pf. Estigmatizam os comunistas como ditadores exatamente quando o eurocomunismo, com as suas promes-

sas de pluralismo democrático, está a seduzir intelectuais franceses, italianos e espanhóis. Como filósofos dissidentes, ostüo gnnhando audiencia no mundo polo fato de impugnarem o totaJitarismo sob qualquer das suas formas,

asseve-

rando qus todas as ideologías sao perigosas. Michel Le Bris, um dos menos conhecidos pensadores do grupo, está precisa mente escrevendo um livro que terá o t:tulo desafiador: «Deus está

morto, Marx está morto,

tí eu mesmo

nao me

estou sentando bem». Ora a repórter Sandra Burlón, correspondente da revista norte-americana «Time», foi entrevistar cinco dos «Novos

Filósofos», que lhe expuseram seu modo de pensar. £ o con-

teúdo de tais declaragóes que vamos abaixo apresentar resu midamente, tendo por base a edi?áo de 5/EX/77 da mesma revista «Time».

1.

Alguns representantes dos «Novos Filósofos»

Fussarcmos cm revista o pensamento dv cinco dos mais significativos.

1.1.

Antíré Glucksmann

Figura preeminente do grupo, Giucksmann tem atual-

mente seus quarenta anos de idade. Filho de pais marxistas, teve (iue deixar, com os mesmos, a Alemanha nazista em

1938.

Aos quatorze anos de idade, já era membro do Par

tido Comunista. Mais tarde foi seduzido pelo maoísmo e, ainda, por um tipo de esquerdismo mais avangado. Dos quatro livros de sua autoría que descrevem a sua odisséia polí tica, o mais importante é «The Cook and the Man-Eater» (O cozinheiro e o devorador de homens), 1975, inspirado pelas revelagóes de Solzhenitsyn referentes ao arquipélago Goulag.

Na obra «The Master Thinkers» (Os Grandes Pensado res), Giucksmann considera os sistemas filosóficos de Fichte,

:PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 217/1978

Hegel, Marx e Nietzsche (século XIX); julga que estes pen

sadores sao responsáveis pelo conceito de «ciencia humana» era virtude da qual os Estados modernos controlam os seus

cidadáos; critica-os também por haverem concebido a idéia de «revolucáo definitiva», que procura apagar o passado e realiza a «lavagem cerebral» dos súditos em nome de um mundo novo e belo.

Diz ele:

"Esíou preocupado com a crer^a no mito da revolucáo que permite aos Stalins e Brezhnevs cometer crimes em nome da mesma e impedir ao povo que resista a tal

processo".

Mais: "Hoje em dia na Franca, exisiem os novos socialistas que de novo formulam a promessa de transformacao da sociedade. Todavía recusam examinar o que realmente ocorre debaixo dos regimes socia

listas. Somente quando alguém toma consciéncia de que o Estado é tSo perigoso quanto os monopolios particulares, pode perceber que nao tem sentido a nacionalizado das industrias propostas pela esquerda".

Glucksmann, finalmente, sente-se estimulado pelos sinais de crescimento do arquipélago de dissidentes na Franga e em outros países,... dissidentes que protestam contra os planos nucleares e pedem mais aulonomia para as minorías, sam

compromisso com alguma ideología tohiiitária. 1.2.

Bernard-Henri Lóvy

Com vinte e nove anos de idade atualmente, foi jorna-

lista de esquerda, admirador de Fidel Castro e Mao, e cola borador da Editora Grasset de París. O título do seu «bestseller é «Barbarism with a Human Face» (Barbarie com face humana), obra em que descreve o socialismo. Conven cido de que «o marxismo é o opio do povo», sente-se obrigado a apregoar esta conviecáo visto que o socialismo está em avanzo na Europa. Sao suas palavras: "Pela

primeira

vez

na

historia,

o

socialismo

adquiriu

urna hege

monía universal. Mas, paradoxalmente, ao mesmo tempo está em crise no mundo inteiro. Na Italia, os jovens de Bolonha estáo-se rebajando contra o Partido Comunista Italiano, que em toda parte é totalitario ao máximo. O mesmo fenómeno acontece em Ñapóles, Angola, na Europa Oriental, na Suócia, em Grenobie, em Portugal. Nao obstante, na Franga

há quetñ aguarde com grande esperanca a vinda do comunismo".

Lévy mostra-se preocupado pelo fato seguinte: "Muitos jovens nao querem admitir que o capitalismo — que há muito eles conslderam seu inimigo — é a mesma coisa que o socialismo.

— 6 —

OS «NOVOS FILÓSOFOS» FRANCESES Eu costumava levantar protestos contra a Embaixada dos Estados Unidos. Hoje eu preferirla fazer o mesmo contra a UniSo Soviética... Entre a barbarie do capitalismo, que multas vezes censura a si mesmo, e a bar barie do socialismo, que nSo censura a si mesmo, declaro que eu esco mería o capitalismo".

Em outra passagem observa o mesmo autor; "Estamos

tomando

consciéncia

de que

a

grande

invengáo

do

sé*

culo XX vem a ser os campos de concentracao, os quais nada mais s3o do que morticinio generalizado, empreendldo por razSes de Estado. Nao apregoo a tristeza, mas apenas o reconhecimento de que nao se pode institucionalizar a

felicidade".

Em suma, Bernard-Henri Lévy elogia os «novos resis tentes» esparsos pelo mundo inteiro, os quais nao sao fortes

por terem armas ou sistemas filosóficos pretensiosos, mas,

sim, por apregoarem valores pessoais e moráis.

1.3.

Jean-Morie Benoist

Com seus trinta e cinco anos de idade, Benoist julga que

o pensamento filosófico e político tem sido esclerosado por Marx e Mao; é preciso, pois, sacudi-lo e remover estes dois autores, como Galileo Galilei teve a coragem de sacudir o pensamento do sáculo XVII e remover a cosmovisáo de Aris tóteles. Os «Novos Filósofos» seriam precisamente os conti nuadores do papel de Galileu, desta vez, porém, no setor sócio-politk*o, que Mai'x e Mao tém dominado. Sao dizeres de Benoist: "Quer se trate de urna gigantesca Companhia multinacional, quer se trate do Partido Comunista, em toda parte assistimos á reacáo do povo

contra as grandes estruturas

1.4.

que envolvem

ideologías políticas".

Jeon-Paul Dollé

Com trinta e oito anos de idade, Dollé é doutor em Filo sofía e professor de Sociología na Escola das Belas Artes de París. Há cinco anos, publicou a historia de sua rixa com o Marxismo no livro intitulado «Desire for Revolution» (Desejo

de Revolucáo).

É da opiniáo de que atualmente «todas as

nacóes ocidentais estáo atestando,

como Nietzsche predisse,

que Deus morreu. Em lugar do Deus da religiáo, diz ele, colocamos o progresso técnico. Todavía a própria ciencia — 7 —

8

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 217/1978

reconhece nao ter condignos de ser um ídolo. É o que explica que aos poucos tenha comegado ampio movimento em de

manda de nova sensibilidade, Movimento do qual é parte a Nova Filosofía».

Dollé julga que «estamos vivendo em auténtico período socrático. Ponto por ponto, os homens ostáo levantando to das as questóes importantes que se relacionan! com a vida:

Que valor tem um reator nuclear? Qual é a verdadeira identidade da mulher?» Observando os aglomerados de edificios «monstruosos» e os meios de transporte que caracterizam as

cidades, os homens eomecam a rejeitar a ética do progresso perpetuo l. Sao palavras de Dolleé:

"Assim existe um vazio. As pessoas estáo interessadas em multas coisas, desde a música dos trovadores do séc. XIV até a JegalizagSo da marijuana; mas nada há que unifique esses Interesses. A nossa era é dis persiva. Em conseqüéncla, os homens de cúpula — sejam políticos, sejam economistas, sejam os promotores da cultura — acham difícil o exerclcio de suas funedes. O sistema vigente é cada vez menos operante e se acha em pánico. Eis por que os

membros do sistema político francés

reagem

contra os Novos Filósofos perguntando: 'Sao da direita ou da esquerda ?' Na verdade, nos somos o síntoma de algo multo maior ainda, que os polí ticos ainda nSo reconheceram. Todavia o povo simples já o descobriu".

Como se vé, os «Novos Filósofos» pretendem ultrapassar

as categorías políticas hoje em dia vigentes, a fim de propor urna ordem entre os homens baseada na autoeducagño que leve ao respeito mutuo e á colaboracáo sincera.

1.5.

Guy Lardreau

Aos trinta anos de idade, Lardreau é professor no «Lycée d'Auxerre» e autor da obra antimarxista «Monkey of Gold» (Macaco de Ouro), 1974... A sua mensa«em so caracteriza pelos seguintes termos:

cesa

"Atualmente nada de novo pode acontecer no campo da política fran porque o país Intelro está parausado até as eleicSes de 1978...

Todavía, quer vocé vote pela direita. quer pela esquerda, faca-o sem llusoes. t necessário renunciar á idéia de que algum sistema possa ser salvador".

i Ética do progresso perpetuo é aquela que toma como criterio do

bem e do mal a contribuíoslo para o progresso técnico. Éticamente bom seria tudo o que fomentasse o progresso (o que estimularla sem limite a técnica); éticamente mau seria o que retardasse a evolugáo tecnológica.

— 8 —

OS «NOVOS FILÓSOFOS» FRANCESES

Esta declaragáo faz eco fiel as dos filósofos atrás citados.

Importa-nos agora tentar realizar um balanco da posigáo dos «Novos Filósofos», balanco que os próprios pensado res europeus de outras escolas já comegaram a esbogar.

2.

Reflexóes sobre a «Nova Filosofía»

Proporemos os tres seguintes pontos: 1)

Os

«Novos

Filósofos»

fazem

genuino

eco

ao can-

saco e á frustragáo de certas populagóes da Europa e de outras partes do mundo, que o comunismo tem dominado ou ameagado. O eurocomunismo seria a mais recente forma de máscara adotada pelo marxismo para se impor aos povos da Europa Ocidental. Ora os «Novos Filósofos» denunciam toda ideología1 sob qualquer de suas aparéncias ou máscaras. E com muita razáo o fazem... Na verdade, qualquer sistema

totalitario, ou seja, qualquer sistema que se apregoe sufi

ciente para responder a todas as indagagóes do homem e

trazer-lhe a felicidade, é falso, pois é impossível satisfazer ao homem táo somente dentro dos parámetros da ciencia, da economía e da organizagáo social.

Todo ser humano tem

aspiragóes ao Infinito e ao Transcendental, de modo que só urna cosmovisáo religiosa, ou melhor, as proposigóes da fé poderiam responder cabalmente aos anseios do homem; é á fé que compete propor o sentido pleno da vida humana e as

perspectivas definitivas que devem nortear a ordem política e social3. Os «Novos Filósofos» nao falam de Deus; talvez mesmo nao o aceitem. Mas pode-se-lhes reconhecer o mérito de haver explicitado a insatisfagáo dos homens contemporá neos diante das ideologías ou dos ídolos da política e da filo sofía social

vigentes.

i Ideología vem a ser neste contexto o sistema de ¡délas que se "baseia na. observacáo de fatos concretos económicos e sociais e que propoe urna visáo do homem e do mundo destinada a transformar a ordem social e económica vigente. A ideología tem sempre um cunho totalitario e maquiavélico, professando, ao menos implícitamente, que o fim justifica os meios.

■iCom isto nao queremos dizer que a fé ou a teología deva tragar planos de acáo política ou económica — o que seria exorbitante. Mas afir mamos que só a ampia visáo do mundo e do homem proposta pela fé ou pelo Senhor Oeus pode indicar as principáis metas e a escala de valores que urna boa organízacao social

deve observar.

— 9 —

20

xPERGL'NTE E RESPONDEREMOS» 217/19TS

A contestagáo, mesmo destituida de modelo positivo, pode

ser útil no caso, pois há de incitar os cristáos a propor de

novo modo a Grande Resposta que o Evangelho apresenta ao homem sofregó de nossos dias. O homem que se afastou

do Evangelho na expectativa de encontrar algo de melhor, entedia-se dos ídolos que ele criou para si mesmo; assim se constituí o clima propicio para se reconhecer sob nova luz a veracidade das proposigócs da mensagem crista. 2)

Embora nao tenham novo modelo político a propor, os

«Novos Filósofos» se professam seguidores de Sócrates. Este

questionava a ordem de coisas vigente em sua época (séc. VI

a.C), pretendendo assim, antes do mais, renovar as cons-

ciéncias e os valores éticos. Com efeito, reunindo seus concidadáos ñas pragas de Atenas, perguntava-lhes se tinham

nocáo do que vém a ser a justiga, a fortaleza, a prudencia, a temperanga... E aos mais sabios mostrava que nada sabiam. Sócrates quis comecar a reestruturagáo da sociedade do seu tempo chamando a atengáo para a ordem moral e despertando as consciéncias dos homens para novo compor-

tamento ético.

Ora este é realmente o auténtico caminho

para qualquer soerguimento da sociedade, principalmente em nossos dias: muito se fala em mudangas de estruturas, como

se apenas novas disposigóes jurídicas viessem trazer a fehci-

dade dos homens, e cada vez mais se esquecem os valores da

consciéncia, como a honestidade, a retidúo, a veracidade, a fidelidade, a dignidade na vida política, o respeito ao pró

ximo Ora, se nao há serio respeito e cultivo do tais valo res, está de antemáo fadada á ruina qualquer procura de paz e bem-eslar para os individuos e os povos.

Donde se vé que, embora predominantemente contesta

tarios, os «Novos Filósofos» indicam o cerne donde se poderá derivar o projeto de solucáo das crises sociais de nossos dias. 3) Os «Novos Filósofos» parecem rejeitar qualquer sistema ou estrutura política. Fazem-nos talvez mais paralevar os homens a refietir do que para propor urna tese. A propósito observemos que o ideal de urna sociedade regida únicamente por valores éticos sem intervencáo de leis ou de ordem jurídica vem seduzindo os pensadores desde os tem-

pos da «República» de Platáo (f 347 a.C); é também hoje o ideal do marxismo cm sua fase mais evoluída.

Deve-se,

porém, reconhecer que a boa ordem na sociedade exige organizagáo sistemática das tarefas, com distribuigáo de direitos — 10 —

OS «NCVOS FILÓSOFOS» FRANCESES

11

e deveres; as instituigóes civis e políticas sao a garantía de certa ordem e de progresso sadio para a sociedade. Mais: nao so podom rejeitar os avangos da ciencia e da técnica de maneira global. Se, de um lado, o tecnicismo ou a hipertrofia da técnica (com as exigencias de consumo e as conseqüéncias de massificacáo) é nocivo, de outro lado a sociedade e os individuos podem validamente beneficiar-sc

das facilidades e comodidades que os recursos científicos e

técnicos proporcionan! ao género humano no tocante ao trabalho, a saúde, á alimentagáo, á moradia, ao lazer, as comunicagóes, etc. Eis por que nao se pode rejeitar a estruturagáo

jurídica e sistémica da sociedade, nem se pode menosprezar o planejamento do progresso científico e técnico, mas é neces-

sário favorecer tais interesses do género humano. Contudo importa incutir na humanidade a consciéncia (que muitos individuos já conceberam implícitamente) de que os valores do progresso técnico sao relativos ou vém a ser subsidios para a caminhada em demanda dos únicos bens capazes de satisfazer plenamente aos homens,

que sao

os

bens trans-

cendentais.

Eis o que nos convinha dizer a respeito dos «Novos Filó sofos». Estes tém grande significado, principalmente pelo fato de representarem o ser humano como tal (mesmo sem Religiáo) insatisfeito diante dos ídolos do totalitarismo e frente aos paraísos que estes prometem. Constitucm um para lelo aos pensadores soviéticos, que, mesmo sem professar

crencas religiosas, protestam contra o endeusamento do Es

tado e da materia e bradam ao menos implícitamente em demanda do Deus verdadeiro. Em todos esses casos, ó a

alma humana que fala a partir do que tem de mais autentico e representativo. Assim se corroboram mais urna vez os dizeres de S. Agostinho: «Senhor, Tu nos fizeste para Ti, e inquieto é o nosso coragáo enquanto nao repousa em Ti» (Confissócs I,

1).

(Continuacáo da 3? capa)

O autor dá provas de erudigáo e, ao mesmo tempo, equilibrio douirinário, mantendo-se fiel aos ensinamentos oficiáis da Igreja — o que é importante nesta época na qual varios erros cristológicos vao sendo disse minados; cf. PR 174/1974, pp. 223-245. Notem-se especialmente as consideracóes atinentes á consciéncia messiánica de Jesús e á fórmula do Con cilio de Calcedonia, que reconheceu em Jesús urna só Pessoa e duas naturezas; para Duquoc, a definigáo de Calcedonia significa um marco definiivo na historia da Cristologia e tem significado permanente também para o homem do século XX.

— 11 —

No mundo da fícgáo :

aínda urna vez erich von dániken

Em sinleso : Erich von Oüniken, estando no Brasil em julho pp., deu entrevistas á imprensa, que abordaram temas relacionados com a Religiáo. No tocante ao nome Elohim, com que a Biblia designa Deus, julga que deveria ser traduzido por deuses; tratar-se-ia de um plural que lembraria os astronautas vindcs á térra nos primordios da historia da humanidade. — Na verdade, embora a forma gramatical de Elohim seja a de plural, este substantiva na Biblia costuma ter o seu verbo no singular; designa o único Deus, realzando, pela forma de plural, a majestade e o poder desse único Senhor. Quanío ás pirámides do Egito, é gratuita e fantasista a hipótese de que hajam sido construidas após intervencáo de astronautas na térra. Elas se explicam suficientemente pelo trabatho de numerosas legióes de escravos duramente tratados pelo chicote do capataz. — A "ciencia secreta dos taraos" que, segundo alguns estudiosos, seria atestada pela grande Pirámide de Oueops, nao passa de produto da fiecáo de alguns estudiosos dos séeulos XIX e XX. Considerando serenamente os monumentos dos egip cios, verifica-se que tiveram conhecimentos de ciencia ainda rudimentares; todavia o que enaltece esse povo, é o seu desejo de precisio, de eficiencia e de perfeigáo; nao há dúvida de que tais qualidades sao atestadas pelas pirámides, os templos e as pinturas do Egito. No tocante á existencia de seres inteligentes em outros planetas, a fé crista nada tem a Irte opor. Se a RevelacSo bíblica nao a menciona,

ela também

nao a excluí.

Comentario:

Em julho pp. esteve no Brasil o escritor

suígo Erich von Dániken, autor de famosos livros como «Eram os deuses astronautas?», «Volta as Estrelas», «Aparigóes»,

tendo já sido comentados os dois primeiros em PR 126/1970/ pp. 257-265, e o terceiro em PR 210/1977, pp. 256-268. Interessa-nos hoje considerar urna entrevista dada por E. von Dániken a imprensa por ocasiáo dessa visita ao Brasil. Foi publicada com exclusividade regional pelo «Jornal de Jundiaí» aos 13 de julho de 1977, p. 5. Visto que aborda temas de atualidade, propomo-nos levar em conta tres dos principáis tópicos desse diálogo com os repórteres: o nome de Deus El-Elohim, a origem das pirámides do Egito e a questáo de seres humanos extra-terrestres. — 12 —

AÍNDA ERICH VON DANIKEN

1.

13

O nome de Deus «Elohím»

Eis palavras de E. von Daniken na citada entrevista: "Moisés, no Génesis, usa a palavra Eloftim quando se refere a Deus. Elohim, entretanto, é plural — o que me deixou curioso... Por exemplo, Moisés diz: 'E os deuses (Elohim) disseram : Fagamos á nossa ¡magem e semelhanga1. Deduzi assim que a traducáo 'Deus fez o Momem á sua ¡magem e semelhanga'

é

¡ncorreta...

Todas

as

civilizacóes

falavam

de

deuses, Elohim, nunca de um só Deus. Diziam : 'E os deuses vieram do céu, precedidos por fortes trovoadas', e assim por diante. Portanto todas as questóes que eu passei a formular, comecaram a recao das Iraducóes bíblicas".

partir de urna incor-

Em suma, afirma von Dániken que a

Elohim deve ser traduzida por deuses.

palavra

Assim,

bíblica

conforme o

autor de «Eram os deuses astronautas?», a Biblia se refere aos astronautas vindos de outros planetas e endeusados pelos homens primitivos. A Biblia estaría, pois, em consonancia

com a tese defendida por aquele livro de E. von Dániken. A propósito faremos duas observacóes:

1.1.

Os nomes El, Eloah, Elohim

As línguas semitas designam Deus pelo vocábulo El em hebraico, ilah em árabe, Un em acádico. Tais vocábulos pertencem á mais antiga linguagem religiosa; estáo associados

á idéia de poder ou potencia, de modo que El significa origi nariamente o poder ao qual o homem está sujeito e que enche a consciéncia religiosa do mesmo. Assim pode-se d:zer que, para os semitas, o conceito de poder era fundamental na sua maneira de encarar a Divindade. A palavra Eloah parece ser urna forma dr vocativo ou

apelativo (caso da interpelacáo) de El; esse vocativo se terá tomado um nominativo, como se tem verificado ñas línguas semitas.

Quanto a Elohim é, morfológicamente falando, a forma plural de El, Eioah, como afirmam geralmente os filólogos'. 1 É de notar, porém, que, segundo alguns lingüistas, a forma Elohim

originariamente nao foi plural; a desinencia im seria apenas urna maneira de determinar melhor a palavra, como certamente acontece em textos árabes, ugariticos e fenicios.

— 13 —

14

PERPUNTE E RESPONDEREMOS^ 217/1978

Neste caso, o plural Eiohim vem a ser a expressáo da mentalidade politeísta ou idólatra de muitos povos antigos. — De

passagem, note-se: os estudiosos indagam se a forma inicial de religiáo era politeísta ou monoteísta. A escola antropoló gica c etnológica de Viena, fundada por Wilhelm Schmidt, apcs liavcr osiudado ;¡s expressóes religiosas dos povos mais primitivos do globo, afirma quo o monoteísmo é a forma ori

ginaria de religiáo; o lento progresso da civilizacáo, que tornou o homem consciente de sua dependencia em relagáo ao

sol, a lúa, ao fogo, á térra..., o terá levado a endeusar tais elementos, ocasionando assim o surto do politeísmo, da ido latría, do fetichismo, etc. Esta tese é fundamentada pela

escola de Viena sobre pesquisas variadas e criteriosas reali

zadas entre povos arcaicos ainda hoje existentes — o que

lhe merece a consideragáo atenta dos estudiosos. É necessário agora investigar o significado Eloah e Elohini nos textos bíblicos. a)

A palavra Eloah é relativamente rara.

do uso de

Aparece em

textos poéticos como designativo do único Deus {cf. Dt 32, 15-7; SI 17, 32; 49, 22...); no livro de Jó, posterior ao exilio, ocorre 41 vezes, sempre para significar o único Deus de

Israel.

b) O vocábulo Eiohim ocorre mais de duas mil vezes no Antigo Testamento. Que significados tem? — Raramente significa pluralidade de deuses, como acon tece, por exemplo, em

Ex

15,11:

«Qucm

ó

semelhante

a

ti

entre

os

deuses

(BaVlim)?»

Jz 9,13:

«...

Ex 18,11: «...

deuses e homens» todos os deuses»

(elohim

wa'anashim)

(kol-ha'elohim)

Cf. Dt 10,17; Ex 12,12. — Por vezes, Elohim significa os anjos ou «os membros da corte celeste»; cf. SI 8,6; Jó 1,6; 2,1; 38,7. Por extensáo,

pode também designar os príncipes e os juizes, assemelhados

aos coríesáos celestiais, cf. SI 81, 6 (os juizes);... o rei (SI 44, 7);... homens dotados de poder extraordinario, como Moisés (Ex 4,16; 7,1)... — 14 —

AÍNDA ERICH VON DANIKEN

15

-*- Na grande maioria dos casos, porém, Elohim, embora conserve a sua forma plural, tem significado singular; é geralmente usado com predicado ou com forma verbal no singular e designa Deus: ou o Deus único e verdadeiro ou um ídolo como Camós, o deus dos moabitas (Jz 11, 24), Astarté, a deusa dos sidónios (IRs 11,5), Baal-Zebub, o deus de Acarom

(2Rs 1,2).

Alias, o uso do nome de Deus em forma de plural com verbo ou predicado no singular nao é fenómeno exclusivo da

língua hebraica; tem seus paralelos nos idiomas dos povos

vizinhos a Israel, como se depreende dos seguintes exemplos:

Os babilonios designavam Sin, o deus lunar, pela fórmula «deuses dos deuses». No sáculo XV a.C. os príncipes cananeus homenagearam o rei divinizado do Egito pela expressáo «meus deuses» (ilania, termo ocorrente ñas cartas de Armana 141, 2. 10.16. 32. 37; 144, 2.6.8...). Em fenicio, a expres sáo plural 'lm significava o deus Nergal, 'lm nrgl, como tam-

bém a deusa Istar, 'lm 'strt. Em acádico, o vocábulo nu ilami, que designava a totalidade dos deuses, podia, significar deter minada pessoa divina ou um homem endeusado.

Pergunta-se entáo: por que os israelitas designavam o único Deus por um substantivo de forma plural? A resposta será dada a seguir: 1.2.

Por que Elohim e nao El ?

A forma Elohim, dentro das concepcóes monoteístas dos hcbreus, pode ser entendida segundo as modalidades seguintes: 1.2.1.

Plural de eminencia

Como em outros povos, também em Israel a devocáo po pular sentia a necessidade de exprimir a grandeza de Deus me diante forma plural (plural de eminencia, sublimidade ou gran deza). Por conseguinte, Elohim exprime, de maneira enfá tica, tudo aquilo que é El, Deus, ou todos os predicados do único Deus. Este é assim exaltado em sua perfeigáo e unicidade. Esta énfase aparece muito claramente em textos como Is 46,9: "Lembrai-vos das realidades passadas há muito, pois eu sou Deus (Elohim) e nao há outro Deus, e ninguém é semelhante a mim".

— 15 —

J16

cPERGUNTE E RESPONDEREMOS» 217/1978

Dt 4, 35: "A t¡ foi dado ver isto tudo, para que saibas que Javé é o verdadeiro Deus (Elohrm) e que nao há outro". Is 45, 5:

"Eu sou Javé, e nSo há outro. Fora de mim, nSo há Deus

(Elohim)".

Por conseguinte, a palavra Eloftim c, de certo modo, um plural comparávcl ao que se usa na linguagem moderna, quando se exprime a majestade de quem fala. 1.2.2.

Plural

deliberativo

Em dois casos na Biblia, Deus, designado como Elohim, fala usando o verbo na primeira pessoa do plural: Gn 1, 26:

"Disse Deus : 'Pasamos o homem á noasa imagem, como

nossa semelhanga' ".

Gn 3, 22: "Javé Oeus (Elohim) disse : 'Eis que o homem se tornou como um de nos, para conhecer o bem e o mal'".

Entendem-se tais casos como sendo de plural delibera Este uso supóe o fato psicológico de que, ao tomar urna decisáo, a mesma pessoa dialoga consigo, ditando a si mesma o alvitre que mais recomendável pareea. tivo.

Alias, o plural deliberativo ocorre também com o nome Javé, que nao Iraz vestigio algum do plural. Assim, por exemplo, em Gn 11,

7:

"Disse

Javé :

'Vamos, desgamos!

Confundamos a

sua

linguagem !' "

Is 6,8:

"Entáo ouvi a

voz de Javé, que dizia : 'Quem

mandarei ?

Quem irá para nos ?' "

O cristüo, ao Icr (ais lextos, é propenso a ver ai uma

insinuacáo do misterio da SS. Trindade, pois na verdado em Deus existem tres pessoas, que nao dividem nem multiplicam a esséncia divina. Todavía nao se pode atribuir ao escritor judeu

a intuicáo

de

misterio

que só

no

Novo

Testamento

seria devidamente revelado; a inspiracáo bíblica nao signi fica revelacáo. Em conseqüéncia, a exegese católica propóe a seguinte distincáo: — em sentido literal imediato, os textos em que o verbo é usado no plural tendo por sujeito Elohim, designam a Ma jestade de Deus ou também uma forma de deliberagáo, compreensível na psicología humana; — 16 —

aínda erich von daniken

17

— em sentido pleno, sim, ou seja, á luz da revelagáo do

Novo Testamento, pode-se dizer que o misterio da SS. Trindade transparece através de tais textos. Leve-se em conta aínda

1.2.3.

Plural de diálogo

Ao eomentarem Gn 1,26; 11, 7, Gerard von Rad e outros exegetas julgam que, em tais casos, Deus dialoga com os anjos, propondo-lhes: «Fagamos o homem...» ou «Vamos! Deseamos!. ..»

Tal sentenga é inadequada, pois, em última análise, nivela Deus e os anjos e supóe o homem criado á imagem nao só de Deus, mas também dos anjos. Por isto nao é aceita na exegese católica.

Vé-se, pois, que nao tem autoridade a afirmagáo de E. von Daniken segundo a qual se deveria, sem mais, traduzir na Biblia EIohim por deuses. Embora a palavra, con siderada do ponto de vista morfológico, tenha a desinencia

de plural, no contexto bíblico e no ambiente do escritor isae-

lita que a utilizou, tal vocábulo designa geralmente um sujeito singular ou, mais precisamente, o Deus único, excetuando-se os poucos textos em que o vocábulo designa os deuses do paganismo, os seres celestes (anjos, tidos como filhos de Deus) ou homens relevantes.

Verdade é que o povo de Israel descende do patriarca Abraáo, que no séc. XDC a.C. emigrou de Ur da Caldéia para Canaá; as primeiras geragóes de israelitas podem ter

professado e vivido um certo sincretismo religioso (cf. Gn 31, 19; ISm 15,23). Este, porém, foi-se dissipando mais e mais, embora o povo de Israel sempre tenha sido tentado a cair na idolatría ou no culto dos deuses dos povos vizinhos. Quando os escritores de Israel se dispuseram a escrever pegas

literarias que hoje integram a Biblia Sagrada, professaram a fé oficial de Israel, ou seja, a crenga em um só Deus, a inda que usassem o nome EIohim.

Compreende-se outrossim que gratuita é a hipótese de E. von Daniken segundo a qual o nome EIohim (que von

Daniken quer traduzir por deuses) tem sua origem em visi

tas de astronautas á térra: os homens terrestres primitivos, espantados pela presenga de táo sabios e poderosos visitantes, té-los-iam chamado deuses. Em conseqüéncia, o vocábulo — 17 —

^8

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 217/1978

deuses se teria transmitido á literatura de todos os povos antigos, inclusive á dos hebreus, em recordagáo da surpresa causada outrora pelos cosmonautas visitantes. — Percebe-se que tal afirmado é nao somente fantasiosa, mas carente de qualquer prova ou fundamentacáo. Nao obstante, von Dániken tem-nu como certa e dai deduz as mais estranhas conclusóes:..., o que revela certa leviandade e desprestigia o autor.

2.

As pirámides do Egito

Erich von Daniken sustenta que as pirámides do Egito tém muito mais de 4.500 anos de existencia (idade que geralmente lhes é atribuida), e foram construidas mediante recur sos de arquitetura que astronautas de outros planetas ensinaram aos homens da térra em época muito remota.

Ora na verdade as pirámides do Egíto tém sido objeto nao só de serios estudos científicos, mas também de ampios devaneios da fantasía. De modo especial, a pirámide de Queops, que fica ao lado das de Quefren e Miquerinos, em

Gizah, vem chamando a ateneáo dos estudiosos; é chamada «a Grande Pirámide». Ora, ao lado de autores que se comprazem extraordinaria ciencia dos egipcios, há aqueles tram reservados e alheios a qualquer tentativa existencia de avancada civilizacáo egipcia que se

em exaltar a que se mosde admitir a teria perdido.

É interessante confrontar o testemunho de uns e outros.

a) Assim, por exemplo, em favor da maravilhosa cien cia dos egipcios, escrevem Louis Pauwels e Jacques Bergier no seu livro «O Despertar dos mágicos» (que tem por subtí tulo «Introducáo ao realismo fantástico»): "Hoje sabemos que os Faraós depositaran! ñas pirámides os resulta dos de urna ciencia da qual ignoramos a origem e os métodos. Ali se volta a encontrar o número pi, o cálculo exato da duracio de urn ano solar, do raio e do peso da Térra, a lei de precessáo dos equinócios, o valor do grau de longitude, a diregáo real do Norte, e talvez muitos outros dados ainda por decifrar" (p. 168).

b) Enquanto os dois autores atrás citados procuram explicar a portentosa estrutura das pirámides, C. W. Ceram escreve na sua obra «Deuses, túmulos e sabios»: "A Grande Pirámide foi muitas vezes designada como 'Biblia em pedra'. Nos conhecemos as 'interpretares' da Biblia. As inlerpretagóes da

— 18 —

_

AIXDA ERICH VON DÁNIKEN

19

Grande Pirámide montam a quase outro tanto. Pela planta, pela situacáo das portas, dos corredores, dos compartimentos, da cámara mortuária, tem-se lido toda a historia da especie humana! Baseado nessa 'historia' gravada na pirámide, um pesquisador predisse o cometo da Primeira Guerra Mundial para num ano'.

o

ano

de

1313,

e

os

érenles

notaram

que

ele

'só

errou

E contudo os místicos dos números tém á máo material que nos deíxará perplexos se nao o reduzirmos ¡mediatamente á sua proporcao normal... A maior parte das afiímscóes em torno da Grande Pirámide baseia-se em medicces incorretas ou em exageros e numa escandalosa amplificacáo das possíbiüdades que toda grande obra de arquitetura oferece se for medida com unidades métricas muito pequeñas, cnlrementes — depois das primeiras medidas tomadas por Flinders Petrie — (oram tomadas medidas relativamente exatas da Grande Pirámide. Devemos esclarecer, entretanto, que até mesmo as medidas modernas seo apenas aproximadas, porque o revestimento da pirámide nao existe mais, e o vértice está des truido. Todo místico dos números que quiser, pois, basear a sua demonstragáo em unidades centimétricas ou em polegadas, estará desde logo desacreditado... Nao acreditamos que os egipcios possuissem urna unidade de medida como, por exemplo, o metro padrio de Paris (para compreender toda a heterogeneidade do mundo do pensamento que, ao contrario do nosso, nao está voltado para a precis§o, lembraremos aquí, por exemplo, a falta do senso histórico do lempo). Nao é difícil, medindo urna obra muilo grande com padrees de medida

muito pequeños,

chegar a relscóes ¡mpressionantes. É bem provável que,

se avaliássemos a catedral de Chartres ou o domo de Colonia em centí metros, chegariamos pelas convenientes adicóes, subtragoes e multiplicacóes ás mais inesperadas comparacóes com valores numéricos cósmicos. Neste plano é muito provável que se encontré também a prova de que o valor p¡ nao deve ser mais considerado o 'número de LudolC, porquanto já era conhecido dos conslrutores das pirámides. Ainda que se demonstrasse terem os egipcios empregado realmente conhecimentos astronómicos até certo grau ñas medidas da Grande Pirá mide (conhecimentos equivalentes aos que a ciencia moderna só descobriu nos séculos XIX e XX — como, por exemplo, a distancia exata do Sol), isso nao seria razáo para supor existir nesses valores numéricos qualquer relacáo mística ou base para fazer profecías. No ano de 1922, o egiptólogo alemáo Ludwig Borchardt publicou. após

apurado estudo, um livro intitulado 'Contra a Mística Numérica da Grande Pirámide de Gizé'. Ai encontramos argumentos que mandam por agua abaixo toda a torrente da mística" ("Deuses, túmulos e sabios". Ed. Melhoramentos, SSo Paulo 1971, p. 136s).

c) Ainda merece atengáo a coleeáo intitulada «Histoire Genérale des Sciences» (Historia Geral das Ciencias) publi cada sob a direcáo de Rene Taton («Presses Universilaires de France, Paris). Em scu primeiro volume, que versa sobre a Ciencia Antiga e Medieval, observa o autor á p. 49: "é mister dizer urna palavra sobre aquilo que em diversas obras ainda

é chamado

'a

ciencia secreta dos faraós'.

— 19 —

Nao é inútil

lembrar que

nada

20

PERPUNTE I-; RESPONDEREMOS* 217/1978

sabemos de urna tal ciencia e que é extremamente duvidoso tenha ela ¡amáis existido. Todas as especulares feitas sobre os 'números' da Grande Pirámide, entre outras, sao puros devaneios infantis; seriam tais mesmo se os autores respectivos tivessem utilizado medidas e números exatos — o que na verdade nao se deu. De resto, por que só a Grande Pirámide nos teria transmitido, de maneira obscura e, numa palavra, impenetrável, urna ciencia táo evoiuída que ultrapassava a ciencia grega e se assemelhava á ciencia moderna ? Há, no vale do Nilo, desde o delta até o Suda,

mais de cento e cinqüenta pirámides ; ora somente a de Queops nos teria fornecido o verdadeiro valor de pi, a dimensáo do raio da Térra e a medida exata de um arco do meridiano terrestre? Vé-se o absurdo dessa posic§o, fundada sobre medidas ¡nexatas".

Deprecnde-se nssim que nao é unánime a tese da extraor dinaria cultura dos egipcios antigos. O que estes deixaram á posteridade, pode ser entendido dentro dos parámetros de urna civilizacáo que tinha, sem dúvida, seus valores positi

vos, mas que estava baseada em matemática e astronomía elementares. Estas Ihe forneciam dados aproximativos para a sua vida cotidiana; os egipcios nunca tiveram, por exemplo, unía era continua, comparável á crista ou á mulgumana

(hegira); as suas datas eram determinadas pelo ano do rei nado do faraó que governava. Embora adotassem o ano de 365 dias, nunca intercalaran! dia suplementar para restabelecer a concordancia entre o ano civil c o ano astronómico, tal como ocorre nos anos bissextos. O valor ds pi (razáo constante entre o comprimcnio da circunferencia e o do seu diámetro) fia, para eles, :í,H>Of>; esle resulfiído, obtido [««■ empirismo, vinha a u;.t mais próximo da realidade do que o valor 3 atribuido a pi pola maioria dos outros povos antigos; todavía nao era exato...

Em sáltese, deve-se dizer que, embora ainda imprecisos em seus conhecimentos científicos, os egipcios se preocuparam seriamente com eficiencia e perfeic.no; procuraram apro-

ximar-se da exatidáo.

É o que atestam as obras por eles

dcixadus, com as pirámides, os templos, as pinturas o outros

produtos de seus artistas...

Sob este aspecto,

os egipcios

foram muito superiores a outras civilizaeóes antigás, contem

poráneas ou mais jovens, merecendo assim a admiracáo que os gregos por eles tiveram.

Quanto á maneira como foram construidas as pirámides, nao há necessidade de recorrer á ciencia comunicada por astronautas vindos de outros planetas. Basta supor as negóes gerais da civilizacáo egipcia e o trabalho de numerosas tro pas de escravos, sujeitos ao chicote do capataz durante anos ti fio; rr.ilhares de vidas foram assim sacrificadas para cons-

— 20 —

AÍNDA EUICH_VON DaXIKEN

_

21

Iruir as mansóes postumas dos faracs. É gratuita e fantasista qualquer hipótese que admita interferencia de seres extra-terrestres neste particular. Pergunta-se,

3.

porém:

que

dizer sobre. . .

... A possibilidade de outros mundos habitados ?

Em verdade, esta questáo há de ser estudada á luz dos

resultados das pesquisas científicas. É á ciencia empírica que toca responder. A fé nada tem a opor a hipótese de haver outros mundos habitados. Apenas se registra que a Revelagáo crista nada menciona a respeito — o que nao significa recusa da possibilidade. Caso existam realmente seres inte

ligentes em outros planetas, seráo criaturas do mesmo e único

Deus, que terá seu plano de amor e misericordia para com eles. É inútil ceder a conjeturas pormenorizadas a tal res peito, pois carecemos de todo e qualquer fundamento para construir teorías a propósito. Se Erich von Dániken se compraz em divagar sobre este tema, ele o faz a título de roman cista e ficcionista, alias assaz arbitrario e fantasista.

Estas ponderaeóes sao oferecidas ao leitor a fim de que

tenha elementos para julgar as declaracóes «impressionantes» do escritor suíco. Bibliografía:

L.

Pauwells

e J.

Bergier, "O despertar dos mágicos". Sao

Paulo,

3? ed. 1968.

C. W. Ceram, "Deuses, túmulos e sabios''. Sao Paulo 1971.

Histoire Genérale des Sciences, publiée sous la direction de Rene Taton. Pressés Universitaires de France. París 1958. A. van den Born, "Dicionário Enciclopédico da Biblia"', verbetes El, Elohim. Petrópolis

1971.

Grande Lessico del Nuovo Testamento, da Gerhard Kittel e Gerhard Friedrich. Ed. italiana a cura di F. Montagnini, G. Scarpat, O. Sorfrirti, vol. IV, verbete Théos. Brescia 1968.

P.

van

Imschoot,

"Théologie de

l'Ancfen

Testament".

Paris

1954,

pp. 8-14.

M.-J.

Lagrange,

"Etudes

sur les

religión

des

religions

sémitiques".

Paris,

2e.

éd., 1905.

E.

Dhorme,

"La

hébreux

pp. 333-349.

— 21 —

nómades".

Bruxeller

1937,

Sensacional:

"as profecías de nostradamus"

Em Sintese : "As Profecias de Nostradamus", recém-editadas por Erika Cheetham, movem o interesse do público. Na verdade, Miguel de Nostrada mus (1203-1566) foi um médico que sa deu intensamente aos estudos da astrologia, segundo a praxe vigente em sua época, e granjeou grande fama, principalmente por ter sido consultado peía supersticiosa rainha Catarina de Medici. Deixou vaticinios editados sob a foima de "Centurias" (colecóes de cem estrofes de quatro versos cada urna) em provengal do secuto XVI,

mesclado de francés, italiano, latim e grego. Tais oráculos sao obscuros; os intérpretes que afirmam o seu caráter profetice so convencen» a quem está predisposto: nao raro manipulam o texto e impóem-lhs interpretacoes

artificiáis. As profecias que realmente podem ter-se cumprido, predizem revolucdes, guerras,

invasóes,

calamidades

tais

como

soem

acontecer

na

historia e semelhantes áqueias que Nostradamus pode conhecer através de seus estudos de historia antiga. É possível também que em sua época Nostradamus tenha impressionado os contemporáneos por suas faculdades parapsicológicas (ou sua percepgao extra-sensctial).

O sucesso que Nostradamus teve e tem ainda hoje, deve-se á sede que o homem sempre experimentou em relacáo ao maravilhoso e trans cendental; acontece, porém, que essa sede deve ser orientada pela inteli gencia e o estudo; em caso contrario, cede a devaneios e paixdes, como aconteceu a Napoleáo I, Adolf Hiller e outros adeptos dos oráculos da astrologia cujo fim foi trágico. ,

Comentario:

A

Editora

Nova

Fronteira

recentemente

lancou o livro do Erika Cheothnm inlitulado «As Profecías do Nostradamus» (1.977, 418 pp., 140 X 210 mm). Erika

Cheetham estudou o provencal (língua falada na Proven,a, Sul da Franca) — o que lhe possibilitou o contato direto com o texto das «Centurias» de Nostradamus. Apresenta, pois, um esboco biográfico deste «vidente», seguido do texto das suas «profecias» no original provencal e em tradugáo verná cula, acompanhando grande número de quadras de breve

comentario; este tende a mostrar o cumprimento dos orá

culos até os nossos dias, insinuando que se realizaráo os sub-

seqüentes, que prevéem o fim do mundo para outubro de 1999.

Assim o livro desperta a atencáo do leitor e impressiona..., — 22 —

«AS PROFECÍAS DE NOSTRADAMUS»

23

pois parece dizer-lhe que será testemunha da consumagáo da historia. A repercussáo que as Centurias de Nostradamus tiveram em seus quatro sáculos e mais de existencia, assim como o interesse do público de nossos dias, justificam urna

apreciacáo nao só do livro de Erika Cheetham, mas também da pessoa e dos oráculos do «profeta» ñas páginas de PR.

1.

Quem fo¡ Nostradamus?

As biografías de Nostradamus mesclam histeria e lenda (como, alias, sói acontecer com os grandes adivinhos do passado).

Procuraremos abaixo

apresentar

o

que se

possa

dizer de seguro a respeito. Miguel Nostradamus nasceu de familia judia, da tribo de Issacar, em Saint-Rémy (Provenga, Franga) na quinta-feira 14 de dezembro de 1503, aproximadamente as 12 ho ras 1. Os seus ancestrais, bons conhecedores de medicina e

matemática, se haviam tornado cristáos por efeito de um decreto do rei Luís XI (1461-83), que ameagava os judeus nao batizados de confiscagáo dos bens; em conseqüéncia, os avós paternos tomaram o sobrenome «Nostre-Dame» - (Nos tradamus, em latim vulgar), enquanto os avós maternos ado-

taram o apelativo de «Saint-Rémy», nome do lugar em que

habitavam.

O jovem Miguel foi primeramente formado por seus avós, que lhe ensinaram a matemática (naquela época, inse-

parável da astrologia), como também a medicina e a farma céutica. Muito jovem, pois, aprendeu a manejar o astrolábio:l, a contemplar as estrelas e a ler os «destinos» dos 1 O primeiro biógrafo de Nostradamus foi seu discípulo Jean-Aimes da

Chavigny, que publicou a biografía do vidente em 1954. — Note-se a indi-

cacio precisa do dia e da hora em que nasceu Nostradamus; era necessária para que se pudesse definir o horóscopo do "profeta". - Nossa Senhora.

3 O astrolábio era um recipiente cheio de agua, que o observador ficava olhando até que a agua se tomasse turva e as perspectivas do futuro ali se desenhassem. Nostradamus se colocava, com uma vara na mSo, no

meio de um circulo mágico, chamado limbo, junto ao astrolábio; falava-lhe entáo a voz de Branco, filho de Apolo, que aparecía em meio ao fogo, como julgava o "profeta".

— 23 —

24

v-PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 217/197S

homens ñas conjun;6es dos astros. Após a iniciagáo, o jovcni

íoi para Montpellier, onde se doutorou em medicina aos 26 anes de idade.

Terminados os estudos, viajou pela Provenga e o Languedoc; esteve na Italia (Miláo, Genova, Veneza). Entrou em contato com Julio Scaliger, filósofo e humanista famoso, que

o convidou para morar em sua casa, na cidade de Agen. Ali casou-se e leve dois filhos. Praticava a medicina corn grande éxito — o que lhe granjeou fama e numerosa clientela. So-

breveio, porém, a peste, que, entre outras vítimas, fez perecer a sua mulher e seus filhos — o que prejudicou enormemente a sua reputagáo.

Deixou Agen, e, triste, retirou-se para a

Abadía de Orval no Luxemburgo, onde escreveu as primeiras «profecías».

Por volta de 1554, reaparece em Marselha, onda contri buí para debelar urna epidemia. Pouco depois, faz o mesmo em Lyon, recuperando assim o seu prestigio. Estabeleceu-se finalmente em Salon-de-Crau, onde se casou de novo, vindo a ter seto filhos. Passou todo o resto da vida a estudar e cscrever, interessando-se grandemente

pelo ocultismo. Em 1550, comegou a redigir um conjunto de «profecías», que, agrupadas em cem estrofes de quatro ver sos cada urna, foram chamadas «Centurias». Deixou dez Cen

turias; nao se sabe por que a Centuria VII nao foi comple tada. Os versos estáo redigidos em linguagem obscura e her mética, que resulta da mésela de francés, provencal, italiano, grego e latim. A fama de «profeta»

foi crescendo a

tal

ponto que a

supersticiosa rainha Catarina de Médici o chamou a París, onde o acolheu com grandes honrarías. Catarina enviou-o a Blois, para lá elaborar o horóscopo dos quatro jovens prín

cipes, o que Ihe valeu, em troca, ricos presentes; predisse a Catarina que todos os seus filhos seriam reís, o que na ver-

dade nao aconteceu, pois um deles, Luís, morreu antes que

chegasse á realeza. Por sua vez, o preprio rei Henrique n, preocupado com a profecía, devida a Lucas Gaurico em 1553,

' de que morreria em duelo, consultou a respeito Nostradamus;

este parece ter-lhe confirmado a previsáo. O fato é que Henrique II realmente morreu em duelo no ano de 1519. Após o acontecimento, foi encontrada na primeira Centuria a estrofe 35, que assim reza: — 24 —

v.AS PROFECÍAS DE NOSTRADAMUS-

25

"O leáo jovem vencerá ao velho num singular duelo era campo aberto.

Perfurar-lhe-á os olhos num a jaula de ouro. De duas classes, urna. Depois morrer, morte cruel".

Os comentadores julgam que estes versos se rcfcrem ao torneio público de Henrique II com o Conde Montgomery,

lugar-tenente da guarda escocesa na corte de Franja, torneio que foi mortal para Henrique II em 1159. Dos dois leóes um significaría o rei Henrique II (mais idoso), visto que o leáo 6 o signo astrológico da Franga e do seu rei; o outro leáo designaría o conde (mais jovem), pois o brasáo da Escocia é portador da figura de um leáo!

O jovem rei Carlos ES, que em 1563 foi declarado de maior idade, em 1564 nomeou Nostradamus médico e conselheiro seu. Isto teve pouca significaeáo, pois nessa época o «profeta» estava já idoso e cansado.

Por fim, Nostradamus faleceu aos 2 de julho de 1566. Terá predito o dia da sua morte, quando já consumido por artrite e gota. Foi sepultado na igreja dos Cordeliers e depois trasladado para a de S. LourenQO, em Salón, onde ainda se pode ver o soguinte epitafio: "Aquí repousam os restos de Miguel de Nostradamus, o único, na opiniao de todos os moríais, cuja pena, quase divina, ioi digna de trans mitir, conforme o movimento dos astros, os acontecimentos futuros que se da rao no mundo inteiro".

O povo,

porém,

recusou-se

a

crer que

o

profeta mor

iera. Antes passou a afirmar que se encerrara mulo com urna lámpada, papel, tinta e livros, e gara de morte quem tivesse a ousadia de abrir Esta crenca supersticiosa parece ter aproveitado

em seu tú que ameao sepulcro. aos explo

radores, que publicaram subseqüentes edigóes das Centurias contendo «profecías» adaptadas aos acontecimentos posterio res á morte de Nostradamus.

Tal era a fama de que gozava Nostradamus que, após

a sua morte, muitas lendas se foram acumulando em torno de sua pessoa, a fim de mais o aureolar. Entre outras, é particularmente interessante a seguinte: Catarina de Médici permaneceu estéril durante onze anos após o casamento com Henrique de Orléans, o que lhe causava enorme pesar, fazendo-lhe temer o repudio por parte do marido; Nostradamus teria posto termo a essa situagáo angustiosa, receitando para — 25 —

2Q

■ PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 217/1978

a rainha o remedio apto a comtaater a esterilidade: «Urina

de carneiro misturada com sangue de lebre; pata esquerda de doninha temperada com vinagre forte; chifre de veado pulverizado e misturado com estéreo de vaca e leite de jumento». Por efeito desta medicagáo, Catarina teria tido dez filhos! Acontece, porém, que neste relato há evidente anacronismo, que depSe contra a sua veracidade: Catarina casou-se com Henrique em 1533 e leve seu primeiro filho, o futuro rei Francisco II, em 1544. Ora nesta data Nostradamus ainda nao era conhecido nem se instalara em Salón. Vejamos agora algo sobre os escritos que Nostradamus legou á humanidade.

2.

Os escritos

Além das Centurias, sao atribuidos a Nostradamus os

«Presságios» e as «Predigóes».

Os «Presságios» constam de

141 quartetos, dos quais cada um corresponde a um mes, desde 1555 a 1567. O quarteto da morte de Nostradamus

corresponde a novembro de 1567, embora o desenlace se tenha dado a 2 de julho de 1566. Nao se sabe exatamente quando foram escritos; apareceram pela primeira vez em 1568.

Quanto as «Predigóes», há serias dúvidas sobre a auto

ría das mesmas; constam de comentam, corresponden! ao compiladas das memorias de Vincent Seus de Beaucaire e

58 sextilhas, que, como alguns séc. XVII; parecem ter sido Nostradamus por seu discípulo publicadas em 1605.

As Centurias tornaram-se instrumento utilizado por mui-

tos peritos para orientar e dirigir os acontecimentos da his

toria em momentos difíceis. Assim em 1649 os inimigos do Cardeal Mazarino, na Franga, achando que este exercia dema siada influencia na corte francesa, publicaram urna edigáo das Centurias, que dataram de 1568 e na qual inseriram evi dentes referencias ao Cardeal. Como quer que seja, os críticos em nossos días julgam poder apresentar ao público urna edicáo auténtica das Cen turias de Nostradamus. A estudiosa Erika Cheetham reconhece que «as profecías de Nostradamus sao falhas as vezes» (p. 12), «noventa e cinco por cento das profecías de Nos tradamus podem ser consideradas coincidencias históricas»

— 26 —

«AS PROFECÍAS DE NOSTRADAMUS»

27

(p. 13); todavía julga que ao menos cinco por cento dos res tantes vaticinios nao podem ser explicados por simples coin cidencia; sao auténticas previsóes de acontecimentos que ocorreriam ou ainda ocorreráo...

A autora afirma que as

profecías de Nostradamus se estendem até 1999, o que signi

fica que o fim do mundo está para ocorrer naquele ano ou quigá no ano seguinte.

Neste particular, outros comentadores discordam, admitindo que as profecías de Nostradamus tentam prever a his toria até 3797, como o próprio «profeta» assevera no seguinte texto: "J'ai composé livres de prophéties, lesquelles contenant chacun cent quatrains astronomiques de prophéties, lesquelles j'ai un peu voulu rabouter obscurément, et son perpétuelles vaticinations pour d'ici á l'année 3797".

Este texto, citado por Christiani no segundo estudo men

cionado na bibliografía destas páginas, p. 110, pode ser assim traduzido: "Compus livros de profecías, cada um dos quais contém cem quadras astronómicas de profecías, que eu quis elaborar obscuramente um pouco; sao vaticinios perpetuos para daqui até o ano 3737".

Na verdade, a própria Erika Cheetham admite que Nos tradamus tenha profetizado para o mes de fevereiro de 2769;

veja-se a interpretagáo da quadra 48 da 8* Centuria (p. 319).

Donde se vé quanto pode ser subjetiva a interpretagáo das profecías de Nostradamus.

Trata-se agora de pesquisar se realmente os «oráculos» de Nostradamus prevéem o futuro, de modo que possam ser tidos como auténticas profecías.

3.

Auténticas profecías ?

Quem percorre o livro de Erika Cheetham, tem a impressáo de que quase todas as estrofes de Nostradamus correspondem a genuínos acontecimentos históricos dos sáculos XVI

a XX: os reís de Franca Luís XIV, Luis XV, Luís XVI, a Revolugáo Francesa, Napoleáo Bonaparte, a primeira guerra mundial (1914-18), a segunda guerra mundial (1939-45), o assassinato de John Kennedy, o declínio do comunismo, o — 27 —

28

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS^217/1978

futuro bombardeio de Nova Iorque, o terceiro Anticristo, o envenenamento da agua de Nova Iorque... Todavia a leituva atenta dos textos de Nostradamus da a ver que se trata de «profecías» extremamente obscuras,

suscetíveis de mais de urna interpretacáo em virtude do seu estilo lacónico e por estarem redigidas em provengal do séc. XVI enxertado de outras línguas. Além disto, os comen tadores, para descobrir o sentido de certas palavras do texto, tém que deslocar as respectivas letras, de modo que Kapis significaría París, Nercaí designaría a Franca, Chypre equivaleria a Henryc... Quanto aos comentarios da Sra. Erika, nao raro violentam o texto do «profeta», ou, se nao o violentam, parecem arbitrarios, podendo ser substituidos por

outros táo «válidos» quanto os da comentarista. Ademáis é de notar que os comentadores de Nostradamus, desejando ler nos seus textos acontecimentos da historia mundial, combi-

nam entre si as quadras tiradas de diversas Centurias, como se, distantes urnas das outras, descrevessem todas o mesmo evento (alias, dizem, os comentadores que Nostradamus mesmo espalhou suas profecías sem ordem cronológica nem

lógica para que a censura do século XVI nao o punisse).

Vejamos, pois, alguns exemplos do estilo e da exegese de Nostradamus.

a)

A

respeito

de

Napoleáo

(supostamente),

lé-se

o

seguinte: "De simples soldado ele atingirá o imperio, da roupa curta ele chegará á longa. Bravo ñas armas, muito pior na Igreja, ele numilha os padres como a agua encharca urna esponja" {Cent. VIII, qu. 57).

Se esta quadra tem em mira um imperador bem suce

dido ñas guerras, mas perseguidor da Igreja, pode aplicar-se tanto a Napoleáo I como a Setímio Severo (193-211) ou a Maximino Trácio (307-313) ou aínda outros monarcas...

Nostradamus, conhecedor da historia, descreveu o prototipo do militar perseguidor.

b)

A respeito de Napoleáo ou de Hitler (supostamente),

íé-se a s>eguinte estrofe: "Da parte mais profunda da Europa Ocidental nascerá urna crianza de familia pobre, que por sua (ala seduzirá muitos povos. Sua reputagio cresoerá aínda mais no reino do teste" (Cent. III, qu. 35).

— 28 —

*AS PROFECÍAS DE NOSTRADAMUS.»

28

Realmente, se o texto nao se aplica a Napoleáo, aplica-se a Hrtler como também a outro grande líder de massas... O reino do Leste seria o Egito, no caso de Napoleáo, que empreendeu a campanha do Egito, ou, no caso de Hitler, o Japáo, que se aliou aos nacional-socialistas. — Na verdade, Egito e Japáo nao sao muito próximos um do outro í

c)

A estrofe abaixo deveria ser um compendio da his

toria da Inglaterra durante duzentos e noventa anos:

"Sete vezes se verá modificar a nagáo británica, fingida de sangue por duzentos e noventa anos. Aprisionada pelo apoio alemSo, Aries teme pelo protetorado da Polonia" (Cent. III, qu. 57).

No caso, Aries significa a Inglaterra, pois é o primeiro signo do Zodíaco e governa o Leste. Os comentadores tém-se esforgado por encontrar a data-base a partir da qual contem

os 290 anos e as sete grandes mudangas que afetariam a Grá-Bretanha. Julgam atualmente .que o ano inicial é o de 1603, de modo que o periodo indicado se fecha em 1939. Real mente é necessária forte dose de boa vontade para aceitar tal «profecía»!

d)

A estrofe ácima deverá, segundo os comentaristas,

ser completada pela seguinte: "O grande imperio será para a Inglaterra, a toda-poderosa por mals

de 300 anos. Grandes forgas cruzaráo por térra e por mar. Os portugueses n3o ficaráo contentes" (Cent. X, qu. 100).

A própria Sra. Erika observa a propósito: "Nostradamus prevé um grande futuro para a Bretanha, que se pro

longará por tres séculos. Toma-se este periodo como comegando com o

reinado de Elisabeth I (1558-1603) ató o da rainha Vitoria (1837-1901), cln-

qüenta anos mais do que diz a profecía. N8o fica explicado o caso dos portugueses; a terceira linha é dúbla, nao se sabe se se trata de torcas inglesas ou daqueles que terminaram com o poder Ingles. Urna frase am

bigua, para nSo quebrar a tradicSo de Nostradamus" (p. 419).

e)

Aínda

a

respeito

da

Inglaterra,

os comentadores

citam Cent. X, qu. 22: "Por nao desojar consentir no divorcio, que entio logo em seguida será reconhecido como invalidado (ou Indigno), o rei das Unas será forgado a lugir, e o que foi posto em seu lugar nSo terá signo de rei".

— 29 —

J30

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 217/1978

Os

comentadores hesitam

quanto

ao significado

desta

quadra: alguns nela véem a abdicagáo do rei Eduardo VII da Inglaterra aos 10/12/1936; no caso, Jorge VI, que nao

estava na linha de heran^a do trono, assumiu a realeza, como «quem nao ünha signo de rei». — Outros referem a

estrofe ao séc. XVII e véem Oliver Cromwell (t 1658) desig

nado como «aquele que nao tinha signo de rei»!

f) A execugáo do rei Luis XVI, vítima da Revolugáo Francesa aos 21/01/1793, estaria predita na quadra seguinte: "Por um grande desacordó soaráo os clarins. Um acordó rompido levanta a face para o céu; a boca sangrenta nadará em sangue; o rosto

untado de leite e mel jazerá no chao" (Cent. I, qu. 57).

«Acordó rompido» seria a aceitagáo da Constituigáo Re volucionaria por parte de Luis XVI.

«Levanta a face para o céu»... seria alusáo ao fato (?) de que, ao se dirigir para o local da execugáo, Luís XVI recitou o salmo 3, que diz: «Exaltas a minha cabega»! «Untado de leite e mel»... seria alusáo á ungáo com óleo feita sobre a cabega do rei antes da sua execugáo!

Como se vé, os artificios sao muitos!

g)

A estrofe seguinte deveria aludir ao Papa Joáo XXIII

(1958-1963): "Por quatro anos o trono será dominado por alguém de pouco bem. Alguém subirá que é libidinoso na vida. Ravena e Pisa, Verona o apoiaráo, desejosas de elevar a cruz papal" (Cent. XVI, qu. 27).

A estrofe, segundo Erika, designa primeiramente o Papa

Joáo XXIII

(«alguém de pouco bem»).

Depois refere-se

a

Paulo VI («libidinoso na vida»). — Ora nao há quem nao perceba o absurdo: Joáo XXIII foi um pastor de «grande bem» (o Papa bom, por excelencia), e Paulo VI é de vida austera e ilibada. h)

A respeito do túmulo de Sao Pedro teria Nostra-

damus dito o seguinte: "O rei descoberto completará a chacina, tao cedo tenha descoberto sua origem: a torrente que abrirá a tumba de mármore e chumbo, de um

grande romano, com o símbolo de Medusina»" (Cent. IX, qu. 84). Em

provencal:

Medusine.

— 30 —

«AS PROFECÍAS DE NOSTRADAMUS»

31.

Eis o comentario de Erika: "Aínda outro verso sobre a descoberta de um túmulo. A chave é a palavra Medusine. É um anagrama para Deus in me, o que provarla ser a verdadelra tumba de Sao Pedro, já que este era seu moto. O túmulo que foi encontrado anos atrás era de outro Papa, embora fosse dos primelros" (p. 374).

A comentarista identifica Sao Pedro pela palavra Medu sine, como se fosse o anagrama de Deus in me, pretenso

moto de Sao Pedro. Ora nao se sabe que Pedro tenha tido

tal moto, de mais a mais que a lingua usual dos romanos

no tempp de Sao Pedro (séc. I) era o grego e nao o latim. As escavacóes realizadas na basílica de S. Pedro sob Pió XII comprovaram a presenga dé Pedro na respectiva sepultura, e nao a de outro Papa, como afirma Erika.

i)

Ainda a propósito de S. Pedro haveria a seguinte

estrofe:

"Quando o sepulcro do grande romano for encontrado, um papa será

eleito no día seguinte; ele nao será aprovado pelo Senado, seu sartgue envenenado no cálice sagrado" (Cent. III, qu. 65).

Eis o comentario de Erika: "Depois de um túmulo ser encontrado, provavelmente o de Sao Pedro,

um novo papa será eleito, e se tornará extremamente inconveniente, lnimi-

zado pelo sínodo, e possivelmente bastante corrupto, considerando-se que

seu sangue será venenoso para o cálice sagrado. Esta linha pode indicar também que este papa será envenenado. Podemos duvldar de que a tumba recentemente encontrada saja realmente a de Sao Pedro" (p. 145s).

Na realidade, como a estrofe é obscura, também o comen

tario nada diz. Para poder encontrar algum significado ñas palavras do profeta, Erika se vé obrigada a dizer que o túmulo de Sao Pedro ainda nao foi encontrado — o que é falso.

j)

No tocante ao futuro do Vaticano e ao fim do mundo,

lé-se o seguinte: "Depois de See ter sido dominada durante dezessete anos, cinco

mudarlo no mesmo periodo de tempo. EntSo um deles será eleito na mesma

época e nSo agradará demals aos romanos" (Cent. V, qu. 92).

Eis o comentario de Erika: "Nostradamus diz que, após o governo de um papa, que durará de zessete anos, serSo eleitos outros cinco durante os dezessete anos seguintes. Se aceitarmos que ele errou um pouco seus cálculos, esta quadra pode-se referir a Pío XII, que reinou por dezenove anos, é interessante observar que

— 31 —

32

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 217/1978

o profeta irlandés Malachias, com quem Nostradamus parece concordar, dá como somente outros cinco papas que governariam antes do final do mundo. Joáo XXIII relnou por cinco anos, e o papa atual, Paulo VI, está no Vaticano desde 1963 e tem 75 anos. Isto deixa aos próximos papas pouco tempo de vida para cada um, e, desde que a maioria deles é eleita já em idade avancada, isto pode-se tornar urna realidade" (p. 236).

Ora, como se vé, o comentarlo é forgado, pois atribuí a Pió XII dezessete anos de governo apenas. Paulo VI já tem mais de oitenta anos. Quanto a profecía de S. Malaquias, está evidenciado que é espuria; foi forjada no século XVI e

atribuida

a

S.

Malaquias,

bispo

de

Armagh

na

Irlanda

(í 1148); teve origem durante o conclave de dois meses, que ocorreu entre a morte de Urbano VII (setembro de 1590) e a eleigáo de Gregorio XVI (dezembro de 1590); o falso documento, apresentando disticos de Papas, deveria orientar os eleitores em favor de determinada candidatura! Note-se que Erika Cheetham pretende elucidar Nostra

damus recorrendo de novo'á profecía de S. Malaquias, por ocasiáo de Cent. VI, qu. 6 (p. 245) — o que é desproposi tado ou acrítico

k)

(anticientífico).

Nao raro fala Erika do «Terceiro Anticristo»

pp. 254. 109. 44. 330. 410).

(cf.

O primeiro teria sido Napo-

leáo I; o segundo, Hitler; o terceiro estaría para yir.

Ora o

tipo do Anticristo no Apocalipse e na antiga Tradigáo crista foi o Imperador Ñero (54-68), que, no contexto, nao poderia ser silenciado.

1)

Ainda merece atengáo o texto seguinte:

"Ao nascer do sol pelo segundo canto do galo, aqueles de Tunísia,

de Fez, e de Bougie, os árabes capturados pelo re) de Marrocos, no ano

mil seíscentos e sete, pela liturgia" (Cent. VI. qu. 54).

Tal é o comentario de Erika: "Esta quadra parece ser daquelas em que Nostradamus erra comple

tamente. Ele parece prever a queda do imperio otomano da Europa pela

ascensSo de um novo rei europeu, e da Asia pela criacSo de um novo imperio peraa e de um novo imperio árabe, por volta de 1607. O único ponto a favor de Nostradamus é que nenhum pesquisador consegue decifrar o que ele quer dizer com 'liturgia'. Isto pode alterar a data, embora nao

se saiba como. Ele poderia estar slmpiesmente querendo dizer Anno Dominl, mas Nostradamus nao gostava de tornar facéis as coisas" (pp. 261 s).

O comentario de Erika no caso é sincero.

Nao poucos

sao os trechos que a autora confcssa nao poder interpretar, deixando-os sob interrogacjio. — 32 —

«AS PROFECÍAS DE NOSTRADAMUS»

33

Ainda poderíamos citar varias passagens das Centurias de Nostradamus para evidenciar quáo subjetivas sao as interpretag5es que se Ihes dáo.

Para explicar um ou outro caso em que o «profeta* parece ter acertado (note-se bem:... parece), duas hipóteses vém em consideragáo:

1) Nostradamus conhecia a historia antiga, principal mente de Roma; cíente do que se dera ñas grandes monarquias do passado, nao lhe era difícil prever, no futuro, a repeticáo de certos casos típicos da historia: guerras, revo-

lugóes, invasóes de países, calamidades naturais... Até o fim dos tempos tais coisas aconteceráo; quem as queira predizer em estilo ambiguo, terá sempre razáo.

2) Bruno Fantoni julga que «Nostradamus, mais do que astrólogo, era realmente um dotado de faculdades parapsicológicas: telepatía, clarividencia, percepcáo extra-sensorial.

As predigóes feitas ao futuro Papa (Sixto V, 1585-90) ou a Catarina foram formuladas á simples vista das pessoas, sem

nenhum estudo astrológico previo»

(«Magia e parapsicolo

gía», Sao Paulo, p. 196).

Esta hipótese admite que pela percepgáo extra-sensorial

Nostradamus tenha podido prever o futuro de pessoas que lhe eram contemporáneas. Ora discute-se tal teoría: a per cepgáo extra-sensorial pode intuir realidades ocultas presentes

ao percipiente, mas nao se pode assegurar que atinja também o futuro, pois este depende de agentes livres (seres humanos) e contingentes. Convém agora dizer breves palavras sobre

4.

Astrologia

Os oráculos de Nostradamus referem-se nao raro a sím bolos da astrologia (Aquário, Cáncer, Aries...), de modo que sao interpretados na base da significagáo de tais símbolos na astrologia. Eis por que interessa examinar o valor científico c objetivo que possa ter a astrologia. A astrologia e o horóscopo sao a arte de definir caracte

rísticas da personalidade e principalmente da vida de alguém — 33 —

34

¿PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 217/1978

a partir da posigáo que os astros tenham tido por ocasiáo do seu nascimento.

Acontece,

porém,

que

o

sistema

astronómico

suposto

pelos cultores da astrologia está totalmente ultrapasado: é o sistema do astrónomo e geómetra Claudio Ptolomeu (séc. II

d.C), que admite a térra no centro do sistema planetario;

sete planetas a cercam: o Sol, a Lúa, Júpiter, Venus (plane tas benéficos); Saturno e Marte (planetas maléficos).

Dos planetas alguns sao quentes, outros frios; alguns secos, outros úmidos; alguns masculinos, outros femininos. Cada qual exerce sobre os homens determinada influencia física, fisiológica ou mesmo psicológica. Todavía a influencia de um planeta pode ser modificada ou mesmo anulada pelos sinais do Zodíaco.

O Zodiaco é urna faixa ou um anel que cerca a térra.

Estende-se 8°,5 ácima e 8*,5 abaixo da eclíptica. Nessa faixa movem-se o Sol, a Lúa e os planetas. A circunferencia desse anel imaginario (360°) é dividida em doze segmentos (cada qual de 30°). Em cada um desses segmentos existe um com

partimento chamado «casa do horóscopo».

Tais comparti

mentos tém, cada um, seu símbolo: Carneiro, Touro, Gémeos, Leáo, Virgem, Balanca, Escorpiáo, Arqueiro, Capricornio, Aquário, Peixes.

Cada um dos sinais do Zodíaco significa, por sua vez, um

aspecto ou urna situagáo de vida da pessoa. Imaginem-se agora as múltiplas combinacóes possiveis dos sete planetas com os doze sinais do Zodíaco; cada urna dessas combmagóes vem a ser um oráculo do destino, que marca decisiva

mente o temperamento e o currículo de vida da pessoa que nasce sob a sua hégide.

Basta ter exposto sumariamente o que é a astrologia

para se evidenciar quanto é despropositada a crenca nos seus

vaticinios. Hoje sabemos que o nosso sistema planetario é heliocéntrico e nao geocéntrico; a existencia das casas do

horóscopo é algo de totalmente arbitrario e irreal. Sabemos também que os astros existentes no cosmos sao quase inumeráveis, produzindo interferencias no espago e nos planetas

q-ue outrora se ignoravam. Alias, a própria experiencia ensina que os astrólogos caem, nao raro, em contradigáo.

Os con-

selhos válidos que possam dar, sao válidos por serem deri vados do bom senso.

— 34 —

«AS PROFECÍAS DE NOSTRADAMUS»

35

Mais: as profecías dos astrólogos podem ter certa influen cia na vida dos consulentes, na medida em que os sugestio-

nem e levem a assumir consciente ou inconscientemente com-

portamentos condizentes com tais «profecías».

É de notar, por último, que varios dos grandes líderes

militares e civis da humanidade, sendo anticristáos, eram ao mesmo tempo adeptos e crentes da astrologia. Os expoentes do nacional-socialismo (1933-1945), por exemplo, eram per

seguidores da Igreja, mas fervorosos clientes dos astrólogos,

que os orientavam e até mesmo incitavam a novas faganhas

na certeza de que seriam bem sucedidos. É notorio o resul

tado de tais horóscopos: suicidios, enforcamentos, miseria para o povo alemáo, que até hoje traz as marcas da aven tura, dividido em Alemanha Ocidental e Alemanha Oriental!

Realmente aceitar o horóscopo significa renunciar á sá razáo e a reflexáo. Algo de semelhante se diga em relacáo a aceitacjio dos oráculos de Nostradamus. Bibliografía:

Erika Cheetham, "As profecías de Nostradamus". Rio de Janeiro 1977. Bruno Fantoni, "Magia e Parapsicología". Ed. Loyola, SSo Paulo 1977. PR 6/1958, pp. 260-263 (Nostradamus). PR 16/1959, pp. 146-153 (Horóscopo). PR 116/1969,

pp. 329-341

(Crendices).

Ch. Cristian!, "Nostradamus, Malachie et Cié". Ed. Centurión, Paris 1955.

Ídem. "Un

curieux

homme: Nostradamus",

em "Ecclesia"

n? 78

(septembre 1955), pp. 39-48.

ídem, "Los prophéties de Nostradamus ont-elles été vérifiées par les faits?", em "Ecclesia" n? 79 (octobre 1955), pp. 109-118. Dezobry-Bachelet. "Dictionnaire de Biographie, histoire. mythologie et góographie", verbets "Nostradamus", p. 1935, Paris 1857.

Michaud, "Biographie universelle ancienne et moderne", verbete "Nostredame", pp. 65-67. Paris-Leipzig.

Revista

"Weltbild".

20/08/1977,

"Wunderwaffe

pp. 18-21.

— 35 —

Schwarze

Magie",

Comunicado do Aiém?

e o novo casamento de gilda de abreu ?

Em slntese: Os artistas Gilda de Abreu e José Espino casaram-se recentemente, apesar da grande dlferenga de idade existente entre um e outro. Qulseram os nubentes explicar ao público o seu enlace como se

tlvesse sido provocado por Intervencfies do cantor Vicente Celestino, faleeldo esposo de Gilda. José Espino, dlzem os espiritas (inclusive os próprios nubentes), terá sido ftlho de Vicente e Gilda em encarnacfio anterior; fol, poróm, fllho rebelde, de modo que devia casar-se eom Gilda nesta encar-

nacSo, a flm de Ihe prestar os servicos que outrora nao Ihe exibiu. Assim

fol o casamento de ambos explicado ao público em programa de televisao de 10/11/77.

Quem reflete sobre tal explicacáo, verifica fácilmente que é subjetiva e Imaginosa. A psicología das profundidades, dispensando recursos arbitrarios ao Além, entende o caso de outro modo: pode-se crer que Gilda e José tenham experimentado a necessldade de justificar aos seus próprios olhos

e aos do público o seu enlace ocorrido em condicoes de idade táo sin

gulares ; ora em seu subconsciente (de formacfio espirita) encontraram a desojada justificativa, que acabaram propondo á sociedade. O artigo considera

os fenómenos

espiritas mencionados pela

tese

de Gilda e José, mostrando que n8o há necessidade de os atribuir a ¡ntervengOes do Além. De modo especial, é levada em conta a tese da reencarnacSo.

,

Comentario: Aos 10 de novembro pp., a artista de cinema

Gilda de Abreu (com mais de setenta anos de idade), viúva do cantor Vicente Celestino, compareceu com seu novo ma

rido, José Espino (de trinta e poucos anos de idade), a um programa de televisao (TV-Tupi, Rio) para explicar como se dera esse segundo enlace. Entrevistados pelo repórter do programa «Acredito no incrivel», deram a conhecer ao público urna historia portentosa, que correspondía as mais típicas tradigóes do espiritismo. Vamos, pois, abaixo referir algumas das principáis etapas dessa historia maravilhosa, á qual acrescentaremos um comentario. — 36 —

O NOVO CASAMENTO DE GILDA DE ABREU

1.

37

A nárraselo

Aos oito anos de idade, o menino José Espino comégou a ouvir a voz do cantor Vicente Celestino, que lhe despertou sentimentos singulares; parecia-lhe já ter ouvido tal voz, como se se tratasse da voz de um familiar.

No decorrer do tempo, José foi-se aproximando de Vi cente e de Gilda, pois que escolheu também ele a carreira de cantor de teatro. Os tragos de afinidade existentes entre José

e o casal de cantores foram-se evidenciando e acentuando

aos

poucos...

Certo dia, já após a morte de Vicente, José estava em casa de Gilda, quando, de repente, esta lhe perguntou o que

fizera... O jovem achou estranha a perguntaj Gilda entáo lhe assegurou que ele acabara de assoviar a melodia que era o próprio código musical de Vicente Celestino, código que somente Gilda conhecia! Este fato e outros contribuiram para mais e mais aproximar afetivamente GUda e José Espino.

De outra feita, urna pessoa desconhecida, tida como

«vidente», assegurou a José Espino que ele fora füho de Vi cente Celestino e Gilda de Abreu em outra encarnagáo; fora, porém, filho rebelde... Na presente encarnagáo, pois, tinha ele a missáo de reparar os dissabores causados á sua máe na anterior encarnagáo.

Ora após tais episodios tudo estava preparado para jus

tificar o amor que Gilda e José sentiam um pelo outro, chegando mesmo ao casamento... Este se efetuou realmente;

Ss dois cónjuges o atribuem a intervencáo do falecido Vicente Celestino, que ambos sentem estar sempre invisivelmente pre sente ao casal.

No programa de televisáo «Acredito no incrível» tomavam parte da mesa do júri o Presidente da Federagáo Espi

rita do Rio de Janeiro, Dr. Paiva Mello, assim como um

médico espirita, que mediante exposigáo doutrinária confirmaram a pretensa veracidade dos dizeres do casal. Pergunta-se agora:

— 37 —

3S

«PERGUNTK E RESPONDEREMOS;» 21T/19TS

2.

,

Que pensar a propósito ?

O próprio titulo do programa «Acredito no incrivel» era urna insinuagáo que sugestionava o público em favor da autenticidade do «incrivel» portento. — Leve-se em conta

também que as narragóes espmtas, excitando a fantasía e explicando imaginosamente os fatos da vida, gozara de poder de persuasáo assaz forte. Elas tém caráter irracional (isto é, nao controlável pela razáo) e se dirigem ao grande público, que em nossos dias toma freqüentemente atitudes irracionais e fantasistas; nao raro as emocóes e as paixóés predominam sobre a lógica; em certos casos; custa ao homem moderno concentrar-se e raciocinar.

Ora urna reflexáo serena sobre o enredo amoroso de

Gilda de Abreu e José Espino mostra outro lado da realidade, baseado em explicagóes científicas e objetivas. É pre ciso que o ser humano, diante de toda e qualquer situacáo, se deixe orientar por criterios racionáis e científicos; a fan

tasía deve ser iluminada por tais criterios, e jamáis há de prevalecer sobre estes.

Urna vez establecidas estas premissas, sejam propostas as seguintes observacóes:

2.1.

Procura de justificativa

Surgiu um amor legítimo entre a viúva Gilda de Abreu e o jovem.José Espino. Esse amor, digno de todo respeito, teve entre os fatores que o fomentaram, o fato de se tratar

de duas pessoas vinculadas as áreas da arte e do canto; a afinidade assim existente entre ambos explica a mutua apro-

ximagáo afetiva. Pode-se mesmo admitir que o interesse, ali mentado em ambos, pela produgáo musical de Vicente Celes tino, tenha contribuido para estreitar os lagos afetivos exis tentes entre Gilda e José.

Todavia compreentie-se que tanto a viúva como o jovem

tenham experimentado a necessidade de justificar táo singu lar e estranho amor aos seus próprios olhos e aos olhos do grande público. Este é sempre impressionado por enlaces

ocorrentes entre pessoas

distanciadas

urna

da

outra pela

idade. É de crer também que o jovem José, até encontrar-se — 3S —

O NOVO CASAMENTO DE GILDA DE ABREU

39

com Gilda, tivesse pensado em esposar urna jovem de sua idade; o amor por Gilda deve té-lo surpreendido estranhamente.

Ora

dizia muito

sabiamente

Pascal:

«O coragáo

tem

razóes que a razáo ignora». Em conseqüéncia, Gilda e José

comecaram a sentir a necessidade de racionalizar tal amor

ou, em outros termos,... a necessidade de urna justificativa racional e satisfatória (aos olhos do bom senso e do público) para táo singular afeto.

E, com o tempo, sem tor consciéncia de que estavam

atendendo a esse imperativo, descobriram tal razáo ou justi ficativa. Com efeito, sabe-se hoje em día que o poder do subconsciente (ou também inconsciente) l é enorme: percebe objetos e inspira, move o sujgito sem que este o saiba, com rapidez e eficacia que ultrapassam muitas vezes as do cons ciente. Por isto muitos dentistas e artistas (nao dizemos

que seja o caso de Gilda e José) procuram aumentar a sua

capacidade do trabalho c a sua criatividade, colocando-se voluntariamente em estado de hipnose ou quase hipnose; esta

se lhes torna propicia. Tal era, por exemplo, o caso de Newton (11728), o grande físico e matemático, que recorría ao sonó,

recomendando ao subconsciente

que

«ruminasse»

determinado problema; assim conseguiu entrar na pista da solugáo ou na própria solugáo de espinhosos problemas de cálculo enquanto dormia. Goethe (tl832), o poeta alemáo, afirmou que grande número de seus melhores poemas foram escritos em estado de sonambulismo; Mozart (f 1791) declarou que as suas inspiragóes musicais lhe vinham á semelhanga de sonhos, independentemente da sua vontade. Ora, se o subconsciente funciona naturalmente sem que

o saibamos, compreendemos que muitas pessoas se maravi-

lhem com certas intuicóes e percepcóes nao conscientemente

preparadas pelo paciente; nao sabendo como chegaram a tais resultados, supóem ter recebido comunicagáo do Além, quando na verdade o seu próprio subconsciente elaborou a intuigáo «maravilhosa».

i Os limites entre Inconsciente e subconsciente nao se podem assinalar rigorosamente. Por isto também a terminología é oscilante entre os autores: enquanto alguns usam a palavra Inconsciente, outros preferem subcons ciente para designar os mesmos fenómenos.

— 39 —

40

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 217/1978

Ora é o que se presume tenha ocorrido no caso de Gilda

de Abreu e José Espino; encontraram a justificativa para o

seu amor quando descobriram que o próprio Vicente Celes tino os aproximara e lhes indicava o casamento. Na verdade,

náó foi o espirito de Vicente que se lhes manifestou (esta afirmacáo seria gratuita e desnecessária, do ponto de vista objetivo e científico), mas, como ensina a psicología das pro fundidades, foi o subconsciente de ambos que acabou projetando os sinais, a voz e a intervencáo de Vicente Celestino. Urna vez admitida a manifestagáo de Vicente, nem a viúva

teria escrúpulo em se casar de novo, nem o jovem teria hesitagáo em ocupar o lugar de Vicente junto a Gilda.

Vé-se, pois, que a explicacáo espirita, no caso, é total mente despropositada.

Resta analisar ainda certos pormenores da historia nar rada.

2.2.

A vidente com a sua mensagem maravilhosa

A vidente que José encontrou e que Ihe revelou ter sido

ele filho de Gilda e Vicente em outra encarnacáo, veio com

pletar a justificativa do casamento aos olhos de ambos, prin cipalmente aos de José. Com efeito, se José fora filho rebelde, compreende-se que tinha a obrigacáo de reparar os aborrecimentos ocasionados a sua máe, prestando-lhe, em nova encarnagáo, os servigos que um rapaz de trinta e poucos anos possa prestar a urna anciá.

Pergunta-se, porém: donde a vidente recebeu tal noticia,

táo alvissareira para o futuro casal? — Mais urna vez, o

recurso a revelagóes do Além é gratuito e fantasioso ou anti científico. Sim; é notorio que o subconsciente de determi nada pessoa pode intuir ou ler as noticias, os anseios e as expectativas que estejam no subconsciente de outra pessoa;

intui-as ou le-as sem que a pessoa percipiente saiba onde as está lendo; conseqüentemente a vidente propóe tais noticias ou tais anseios como se Ihe tivessem sido comunicados pelo Além... Ora foi este o caso da vidente que prestou a bela informacáo a José: terá lido no subconsciente (ou incons ciente) deste o desejo que o mesmo alimentava de entrar na — 40 —

O NOVO CASAMENTO DE GILDA DE ABREU

41

intimidade de Gilda e Vicente sem ser importuno ou intruso. Na base dessa leitura, terá proferido a luminosa noticia que justificaría plenamente o enlace.

Esta

explicagáo se

baseia

em

numerosas

experiencias

feitas em laboratorio, que comprovam o poder de comunicacáo existente entre os subconscientes de diferentes pessoas.

2.3.

Reencarnase»

O assunto já foi abordado em PR 26/1960, pp. 57-61; 49/1962; pp. 3-10. Como quer que seja, voltamos a considerá-lo.

Por «reencarnacao» entende-se a volta da mesma alma humana (também chamada «espirito») a este mundo, onde vai assumindo corpos sucessivos, a fim de evoluir e progredir cspiritualmente até chegar a perfeisáo.

Os fautores desta doutrina nao sao unánimes entre si ao

explicá-la: uns dizem que o ser humano se reencarna cons

tantemente com o mesmo sexo, outros afirmam variacáo alternativa; alguns asseveram que a reencarnagáo tem lugar apenas na térra, outros a admitem também em outros pla netas; uns julgam que é lei geral para todos os espirites, outros a aceitam apenas para os espiritas muito atrasados ou para os perfeitos, que devem cumprir especial missáo na térra, etc.

Deve.se mesmo registrar que somente os espiritas dos

países latinos, como sao os do Brasil, aceitam a reencarna-

eáo; os anglo-saxóes a rejeitam peremptoriamente. Assim o conhecido espirita Stainton Moses, que foi para o espiritismo inglés o que Alian Kardec foi para o francés, guiado pelos dois espirites KabiHa e Imporator, pronunciou-se decidida mente contra a reencarnacáo. A razáo pela qual os mestres anglo-saxóes rejeitam tal tese, é o racismo; com efeito, o

espirito de um homem branco poderia. encarnar-se em corpo

de raga negra — o que é inconcebível aos olhos dos racistas. Alias, o próprio Alian Kardec recebeu mensagens con

trarias á

reencarnacáo,

como

se

seguintes de sua lavra: — 41 —

depreende das passagens

42

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 217/1978

"De todas as contradices que se notam ñas comunicacSes dos espiritos, urna das mais frisantes é a que diz respeito a reencarnacfio. Se a reencarna?áo ó urna necessidade da vida espirita, como se explica que nem todos os espirites a ensinam ?" ("O livro dos Médiuns" c. 27, rfl 8, p. 336).

I

Ao falar da pluralidade das existencias em «O Livro dos Espiritas», observa Kardec: "Talvez fosse aquí o caso de examinamos por que os esplritos nio parecem todos estar de acordó sobre esta questáo" (cap. V, n
Consideremos agora alguns dos argumentos com que os reencarnacionistas pretendem provar a sua tese:

2.3.1.

As desigualdades

O mais utilizado dos argumentos é o das desigualdades.

Se uns nascem aquinhoados física ou psíquicamente, ao passo que outros vém ao mundo com menos prendas, isto so se pode explicar pelo fato de que uns e outros viveram encarnagóes anteriores, ñas quais conseguiram tal ou tal sorte...

— Respondemos que é gratuito e váo o pressuposto _de que todos devem ter comegado a existir em iguais condicóes físicas e psíquicas. Deus é soberanamente livre para criar quem Ele queira e como o queira. O que a justiga divina implica, é que cada criatura receba as gracas necessárias para chegar á plenitude da perfeícáo; ora o Senhor, de fato, chama cada um dos seres humanos á perfeicjío e lhe oferece os subsidios para atingi-la, conforme a doutrina crista. O mundo inteiro está cheio de criaturas variegadas entre si; nao há duas folhas absolutamente iguais. "É

precisamente

esta variedade que faz a beleza e a harmonía do universo.

2.3.2.

E o sofrimento?

Insistem, porém, dizendo: Se aínda se podem entender desigualdades físicas e psíquicas, nao se pode admitir que

Deus seja autor da infelicidade de muitas criaturas: alguns nascem cegos, outros aleijados, outros mentecaptos, uns ricos,

outros pobres...

Ora a desgraca só pode ser explicada pelo — 42 —

O NOVO CASAMENTO DE GILDA DE ABREU

«

fato de que cada criatura nesta vida expia os males que cometeu em outra vida; a lei do karma ensina que «todo ato niau cometido é urna divida contraída que deverá ser paga;

se nao o for nesta existencia mesma, será paga na seguinte

ou ñas seguintes».

A esta argumentagáo respondemos:

— A justiga humana exige que o réu castigado saiba

por que é punido; o bom senso se revolta contra urna punicjáo que nao tenha explicacáo.

Para que eu me possa emen

dar dos erros pelos quais sou punido, devo saber quais foram. Até mesmo o cao que é castigado por ter sujado a casa, é instruido a respeito da falta que cometeu. Notem-se as sabias palavras de Enéias de Gaza

(f520 aproximadamente):

"Quando tenho de castigar meu lilho ou meu servo,...

comeco por

admoestá-tos a flm de se lembrarem bem para o futuro e asslm poderem evitar recalr no mesmo erro. Nao deveria Deus, quando envía as mais terrivels punieses, Instruir aqueles que as sofrem, a respelto do motivo desses castigos? Poderla Ele tirar-nos de todo a recordacao de nossos crimea?... Que proveito se hé de esperar da punlQ&o se ninguém nos mostrar qual foi a nossa culpa? Em verdade, semelhante castigo vai contra o que pre

tende : irrita e leva á revolta" ("Theophrastes", Ed. Migne grega t. 85, 302). — Observamos também que a lei do karma reduz o conceito de Deus ao de um juiz ou tirano inexorável; na ver

dade, Deus é Pai..., o Pai que, conforme a parábola do filho pródigo (Le 15,11-32), perdoa imediatamente ao filho que se mostré arrependido. A lei do karma induz o fatalismo e o mecanicismo físico no plano moral.

— A respeito do sofrimento, a doutrina católica nao pode

apontar a causa precisa pela qual cada criatura sofre... e

sofre tais e tais males; alias, nenhuma outra crenga o pode explicar de maneira cabal. Apenas podemos afirmar, segundo a

doutrina

católica,

que

Deus,

em

seu plano

sumamente

sabio, nao se engaña nem comete injustiga; um dia, todos saberemos o porque dos designios do Senhor. Entrementes

pode-se dizer que o sofrimento nem sempre é punigáo de

pecados pessoais, mas é sempre providencial; vem a ser a ocasiáo de crescimento interior, de tal modo que quem nao

sofre, se amesquinha ou se fecha no egoísmo; a natureza

humana é tal que ela se beneficia enormemente na escola do sofrimento. A justiga de Deus consiste em ministrar a todo homem

os subsidios

necessários

para

— 43 —

carregar a

sua cruz

44

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS? 217/1978

com grandeza dalma e generosidade, de modo que adquira méritos.

2.3.3.

E m narrajSes feitos em sonó hipnótico?

Dizem que varias pessoas, postas em sonó hipnótico, relatam fatos de sua vida passada e, comandadas pelo hipnotiza dor, chegam mesmo a referir a trama de urna ou mais encarnagóes anteriores.

Todos os relatos obtidos em transe hipnótico como

sendo de existencias pregressas até hoje foram reduzidos á qualidade de narragóes de fatos vividos pelo próprio narra dor na vida presente.

Sim; é notorio que temos na nossa

consciéncia psicológica apenas

1/8 dos conhecimentos

adquirimos desde a infancia; 7/8

ficam

latentes

no

que

nosso

subconsciente ou inconsciente. Ora, colocados em nosso hip nótico, perdemos o controle sobre as nossas faculdades e dispomo-nos a obedecer cegamente ao operador.

Por conse-

guinte, se este manda que alguém narre a trama da sua pre tensa vida pregressa, tal pessoa associará, de maneiera mais ou menos livre e arbitraria, as reminiscencias e imagens que guarda em seu subconsciente; constituirá assim um enredo que

surpreenderá os ornantes e o próprio paciente, mas que nada de novo apresentará; submetido a controle, tal enredo será identificado como a soma de experiencias vividas pelo paciente no deeorrer mesmo desta vida.

O mais -famoso caso que a propósito se conhece, é o de

Bridey Murphy, do qual tratamos em PR 49/1962, pp. 3-10. 2.3.4.

E os genios?

As pessoas geniais,

segundo

os reencarnacionistas,

se-

riam espíritos que se aperfeigoaram em numerosas encarnacóes anteriores.

verifica

Tal explicagáo é gratuita. que

Quem observa os genios,

nao nasceram sabendo,

mas

sao

pessoas

que

estudam e pesquisam concentradamente ou sem dispersáo.

Ora isto supóe inteligencias perspicaz e vontade decidida,

mas nao supóe encarnagñes anteriores. — 44 —

O NOVO CASAMENTO DE GILDA DE ABREU

45

Quanto ás criangas-prodigio, pode-se observar o seguinte: Muitas vezes as criangas-prodigio sao as que aprendem com rapidez e facilidade. Todavía estes predicados se devem

á constituigáo nervosa de tais criangas, de tal modo que rara

mente elas se tornam pessoas talentosas. Ao contrario, as criangas aparentemente nao talentosas, mas dotadas de natureza calma, aprendem de maneira mais continua, podendo chegar a ser pessoas de importancia ou mesmo geniais. Deve-se também observar que as criangas tidas como

prodigios em matemática ou em música sao como as demais criangas em outros setores de atividade intelectual. Ora veri-

fica-se que os prodigios do cálculo sao os mais mecánicos que há, pois as máquinas calculadoras os podem reproduzir (sem ter inteligencia); ás vezes, pessoas pouco prendadas tém extraordinaria facilidade para o cálculo — o que mostra que este nao é sinal de prodigio nem genialidade. Algo

de semelhante se diga em relacáo aos prodigios musicais.

2.3.5.

O fendmeno da paramnesia

Muitas pessoas que váo pela primeira vez a determinado lugar, tém a impressáo de já haver estado ai, reconhecendo o ambiente com as suas características.

Pergunta-se: como

explicar tal fenómeno, dito de paramnesia, senáo pela reencarnagáo? Em vida pregressa, a pessoa já teria visitado tal lugar.

A propósito podem-se fazer quatro ponderacóes, que dispensam a reencarnagáo:

a)

As vezes, a pessoa nao esteve conscientemente no

lugar, mas lá esteve inconscientemente; ora o inconsciente (mesmo o de urna crianca de coló) colhe impressóes e as guarda latentes. Digamos, pois, que urna crianca seja levada a urna praga pública ou a um cemitério; trinta anos mais tarde supostamente, essa pessoa volta a tal ambiente; compreende-se que o reconheja imediatamentc... Afirmará cons

cientemente já ter visitado o lugar — o que será verdade,

nao, porém, numa encarnacáo anterior. — 45 —

46

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS!- 217/1978

b) Pode acontecer também que a pessoa tenha visto imagens do lugar em fotografías de livros ou filmes — o que leva a crer que já tenha estado no lugar. c)

Existe também a explicagáo

pela

hiperestesia. Ha

pessoas cujo inconsciente é capaz de ler o inconsceinte de outrem, como dito. Ora, se vou ao Japáo pela primeira vez e tenho a impressáo de já ter estado lá, posso perguntar-me

se nunca me achei ao lado de uma pessoa que já tivesse estado no Japáo. Caso positivo (o que é plausivel), eu terei percebido inconscientemente o que o amigo vira consciente mente e trazia no seu inconsciente. d)

Acontece também que há muitos objetos semelhan-

tes, de modo que, ao dizermos que já vimos algo, podemos estar confundindo esse algo com algum semelhante. Em suma, há varias explicacóes para

o fenómeno da

paramnesia dotadas de base científica; a única destituida de fundamento seria o recurso á reencarnacáo.

2.3.6.

Aprender é recordar

Há pessoas que aprendem com tanta facilidade que dác a impressáo de estar apenas avivando conhecimentos já adqui ridos (no caso:... adquiridos em vida pregressa).

— A respeito observe-se que a arte de estudar e apren der é uma atívidade psicossomática; está em relacáo nao só com o psíquico do estudioso, mas também com as suas disposicóes físicas ou corporais; a imbecilidade, a debilidade men tal ou idiotice... sao conseqüéncias de lesóes do organismo e, em especial, do cerebro. De outro lado, os espirites ditos «mais evoluidos» beneficiam-^e de disposiejóes orgánicas e

fisiológicas que tornam a aprendizagem mais fácil, ¡mediata e intuitiva. Uma alma bem dotada, num corpo sadio, é natu ralmente propensa a célere e perspicaz apreensáo da verdade. Os reencamacionistas valem-se ainda de outros argumen tos para tentar provar a reencarnacáo. Desses, que menos peso tém do que os anteriores, consideraremos apenas os que se referem á Escritura Sagrada.

— 46 —

O NOVO CASAMENTO DE GILDA PE ABREU

2.3.7.

47

E a Escritura Sagrada ?

Dois tópicos vém especialmente ao caso:

a)

Elias e Joáo Batista. Há quem cite os seguintes tex

tos do Evangelho: Le 1, 17:

Diz o anjo Gabriel: "(Jofio

(o Mésalas) no espirito e na virtude de Ellas".

Mt 11, 14s:

Batista) seguirá diante dele

"Se quiserdes compreender, ele mesmo (Jofio Batista)

é Elias, que deve vir", diz Jesús.

Estes textos parecem insinuar que Joáo Batista era a

reencarnagáo de Elias. Todavía é de se notar que Joáo Ba tista declarou peremptoriamente a urna comissáo de judeus que o interrogavam a respeito: «Nao sou Elias» (Jo 1,21). Mais: no monte da Transfiguracáo apareceram a Jesús

Moisés e Ellas (cf. Mt 17,3). Ora naquele tempo Joáo já fora executado por Heredes ou já morrera. Por conseguinte, deveria aparecer a Jesús Joáo Batista e nao Elias, conforme a doutrina da reencarnagáo, pois esta ensina que, quando o espirito se materializa, sempre se apresenta na forma da úl

tima encarnasáo. — Donde se vé que Joáo Batista nao era a reencarnacáo de Elias.

Os textos do Evangelho devem ser explicados no sentido

de que Joáo Batista havia de desenvolver um papel seme-

lhante ao de Elias: seria destemido e corajoso ao incitar os homens á conversáo.

b)

O renascer em Jo 3.

Os reencarnacionistas citam

outrossim a seguinte afirmativa de Jesús: "Se alguém nSo nascer ánoolhen, nao

poderá entrar no Reino de

Deus" (Jo 3,3).

A palavra ánoothen pode significar de novo como também

do alto. Os espiritas a traduzem por de novo, e assim tentam.provar que Jesús ensinou o nascer de novo (em nova encarnagáo). Todavia o contexto de Jo 3 mostra bem que o sentido de ánoothen, no caso, é do alto: Jesús incutiu o nascer do alto. Com efeito, Nicodemos, confuso pelo que Jesús dissera, perguntou-lhe logo a seguir: «Como pode nas cer um homem sendo velho? Poderá entrar segunda vez no — 47 —

48

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 217/1978

seio de sua máe e voltar a nascer?» — Jesús logo dissipou a dúvida, explicando que nao se tratava de renascer no sen

tido biológico, mas, sim, de nascer de outro modo, ou seja, pela agua e pelo Espirito:

"Em vordado, em verdade te digo: quem nao nascer da agua e do Espirito, nao podará entrar no Reino de Deus" (Jo 3,5).

Donde se vé que também esta passagem bíblica nao

prava a reencarnacáo. Levem-se em conta outrossim os dizeres de Hb 9,27:

"É um tato que os homens devem morrer urna so vez; depois do que, ven» o julgamento".

É, pois, inadequada a argumentagáo bíblica aduzida em favor da reencarnagáo.

3.

Conclusoo

As ponderagóes apresentadas evidenciam que a explicacáo espirita para o casamento de Gilda de Abreu e José Es

pino é subjetiva; a ciencia de hoje elucida a fenomenología aduzida como sendo a expressáo de urna reacáo psicológica, que procurou na religiáo e na mística um apoio para justi ficar plenamente um comportamento que podena parecer estranho tanto aos dois interessados como ao grande publico. O enlace de Gilda e José merece respeito, indepentemente da explioagáo dos antecedentes respectivos. É esse res-

"peito que desejamos aquí consignar, ao mesmo tempo que evidenciamos o vazio e a inepcia das teorías espiritas que pretensamente justificariam esse enlace. Bibliografía:

B. Kloppenburg, "O Espiritismo no Brasil". Petrópolls 1960. ídem, "O reencarnaclonismo no Brasil". Petrópolls 1961.

O. Gonzalez-Quevedo, "A face oculta da mente". SSo Paulo, 25? ed. 1976.

ídem. "As torcas físicas da mente". 2 vols. SSo Paulo 1974. ídem, "O que é parapsicología". S3o Paulo 1974.

Estévao Bettencourt O.S.B. — 48 —

livros em estante A Fé da Igreja. Vol. 111: Crislologla. SeccSo 2: Jeoua Cristo, por Mlchael Schmaus. TraducSo de Marcal Verslanl. — Ed. Vozes, Petrópolls 1977, 160 x 230 mm, 214 pp.

Em PR 199/1976, p. 324, analisamos o volume I do Manual de Teo

logía Dogmática de Schmaus Intitulado "A Fé da Igreja", o qual devora abranger em traducáo brasllelra seis volumes. O autor é dos

memores

teólogos católicos da atualldade: rico em conhecimentos teológicos, bíblicos, patrlstlcos, filosóficos e auténtico porta-voz do pensamento ou da Fé da Igreja, de tal modo que seus escritos podem ser realmente utilizados á guisa de Manual para as escolas de nivel superior.

O volume I da colecáo versava sobre os fundamentos da fe. O vo lume II considerou os pressupostos da Crlstologia, ou seja, 1) A Imagem de Oeus no Antigo Testamento, 2) A Crlacáo, 3) O Pecado Original e o Pecado Hereditario, 4) Os Anjos. — Neste volume III, Schmaus aborda 1) O Evento Cristo (os feltos de Jesús, com énfase especial na Páscoa do Senhor) e

2) O Ser de Cristo (o misterio do Homem-Deus); asslm o autor

passa do agir ou das manlfestacees do Senhor Jesús através da sua vida pública ao ser ou á realldade Intima daquele que os Evangelhos apresentam em sua humanldade. Entre os feltos de Jesús Cristo, Schmaus récensela "A Palavra Salvffica de Jesús", colocando sob este titulo a revelacao que

Jesús fez do misterio da SS. Trlndade; na verdade, fol através da pregacáo de Jesús que os homens passaram a conhecer a vida Intima de Deus, que

nfio se esgota na unicidade de urna só pessoa, mas se afirma na trlndade

de Pessoas.

As páginas de Schmaus referentes á Infancia de Jesús e aos seus

milaares como acoes histórico-salvlficas sao particularmente belas e equili bradas Além do que, o volume ¡nteiro está redigido em estilo que leva o estudioso a perceber na Teología nSo somonte urna ciencia, mas também urna fonte de vida espiritual e de unifio com Deus. Eis por que nos congra

tulamos com a Editora Vozes pela publicacáo da obra de Schmaus, que fazemos votos chegue quanto antes ao seu sexto volume em llngua por tuguesa.

Cristologla: ensaio dogmático. Vol. I: O homem Jesús, por Chrlstian Duquoc. Traducño de Ático Fassini. — Ed. Loyola, S6o Paulo 1977. 140 x 210 mm, 302 pp.

O autor ó dominicano, doutor em Teología e diplomado pela Escola

Bíblica de Jerusalém; leclona Teología Sistemática ñas Faculdades Católicas de Lyon (Franca). A obra que Duquoc oferece ao público em traducáo brasilelra, segué o método indutivo, o qual compreende dois momentos princi páis- um fenomenológico (observacSo dos fatos concernentes a Jesús Cristo no Evangelho) e outro, que é a procura de compreensáo desses fatos O primelro volume (único publicado em portugués ató agora) aborda os misterios da vida de Jesús desde o nasclmento até o Inicio da Paixfio; estuda os títulos de Cristo e a condicáo divlno-humana do Senhor Jesús definida pelo Concilio de Calcedonia (451). O segundo volume será con sagrado ás varias fases do misterio pascal: Paixfio, Morte, RessurrelcSo

e segunda vinda do Senhor Jesús.

(Continua na pág. 11)

TEMPO E ETERNIDÁDE «MEU DEUS; .FAZER',

PROTEGEI-ME DO

'DEIXA-CORRER',

DO 'DEIXA-

DO 'DEIXA-VIVER', DO 'DEIXA-MATAR*. . .

E DESSA PASSIVIDADE QUE PERMANECE PASSIVA

POR MEDO

DE AGIR E SOFRER.

É TÁO FÁCIL DEIXAR TUDO CORRER. . . DEIXAR CORRER A VIDA COMO AREIA, E ACUSAR AS CIRCUNS TANCIAS, E MALDIZER OS FATOS, E ACUSAR OS OUTROS. . .

É MUITO MAIS FÁCIL SENTlR-SE SEMPRE CANSADO: CANSADO

DE TUDÓ, CANSADO DE NADA... A VIDA NAO PASSA DE UMA SUCESSÁO DE GESTOS ÍNFIMOS, MAS QUE, DIVINIZADOS, NOS MOLDAM A ETERNIDÁDE.

MATERIALMENTE, UMA OBRA DE ARTE — QUADRO OU ESTA TUA — NAO É MAIS QUE O RESULTADO DE UMA SERIE DE PINCE

LADAS OU DE CINZELADAS. O VALOR IMATERIAl, O ÜNICO QUE CONTA,

É O

PENSAMENTO

DO

GESTO E FEZ DESSA SlNTESE SORRISO.

CRIAMOS

ARTISTA QUE

INFORMOU

A REALIZACÁO DO SEU

ETERNIDÁDE

COM

QUALQUER

ATO

CADA

PROPRIO NOSSO.

ESTE E O PODER MARAVILHOSO DO HOMEM : A CADA SEGUNDO

CONSTRUIMOS O UM ATO,

NOSSO REINO.

UMA

VEZ REALIZADO,

NAO PODE SER DESFEITO.

SUA REPERCUSSÁO E SEUS REFLEXOS SE PROLONGAM POR ESPACOS INACESSlVEIS.

CRIAMOS O DEFINITIVO

DAS MENORES ACOES ATÉ A GRANDEZA

DE

E ESSE PROIONGAMENTO

ETERNIDÁDE É QUE FAZ A NOSSA

HOMENS.

NAO COMPREENDEMOS NADA DE NADA. HÁ TANTO MISTERIO NO CRESCIMENTO DE UM GRAO DE TRIGO

QUANTO NO MOVI-

MENTO DAS ESTRELAS. NOS BEM SABEMOS QUE SOMOS OS ÚNICOS CAPAZES DE AMAR, E É POR

ISSO QUE O MENOR DOS HOMENS

É MAIOR DO QUE TODOS OS MUNDOS REUNIDOS. GUY DE LARIGAUDIE

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