Admin

  • June 2020
  • PDF

This document was uploaded by user and they confirmed that they have the permission to share it. If you are author or own the copyright of this book, please report to us by using this DMCA report form. Report DMCA


Overview

Download & View Admin as PDF for free.

More details

  • Words: 18,244
  • Pages: 32
Contratos de Concessão – regime jurídico 6) Regime jurídico dos contratos de concessão de serviços Dadas essas coordenadas, é possível dizer que os contratos de prestação de serviço público são norteados por dois tipos de cláusulas: as clausulas regulamentares, que condicionam a prestação dos serviços assegurando os interesses dos usuários e da Administração e as cláusulas financeiras, que asseguram o equilíbrio econômico financeiro do contrato, mantendo-o com características atraentes à exploração econômica por empresa capitalista. A disciplina jurídica dos contratos de concessão em muito se assemelha à disciplina dos contratos administrativos. Porém, a presença de interesses dos usuários dos serviços vai tornar mais exigentes as cláusulas regulamentares, ao mesmo tempo em que trará uma disciplina de manutenção do equilíbrio econômico financeiro mediada pelo conceito de tarifas que busquem universalizar o serviço, mantendo sempre o respeito ao princípio da igualdade. Portanto, os contratos de concessão de serviços são trilaterais e deverão ter uma disciplina jurídica que respeito os três interesses envolvidos na prestação dos serviços públicos. Assim, as cláusulas regulamentares são as seguintes : 6.1) reconhecimento de poderes especiais à Administração concedente, tais como: 6.1.1) direção e controle sobre a execução do serviço – na medida em que a Administração, com a concessão, delega apenas o exercício do serviço ao particular, continua responsável pela prestação desse serviço, devendo, portanto, controlar diretamente a prestação desse serviço e não apenas supervisionar a sua adequada execução. Isso significa que o administrador deve controlar a prestação do serviço em pelo menos 4 aspectos (Di Pietro. Parcerias..., p. 101): “a) o material, referente à execução da atividade obejto do contrato; b) o técnico, referente à observância dos requisitos estabelecidos nos planos, especificações, regulamentos, cláusulas contratuais; c) o financeiro, indispensável para a fixação das tarifas e verificação do equilíbrio econômico-financeiro; d) o legal, que diz respeito à observância das normas legais e regulamentares.” Os seguintes artigos da Lei 8987/95 podem ser enumerados para ilustrar a previsão legal do controle exercido pela Administração: 3º (previsão genérica do poder de direção, com o destaque para a participação do usuário); 29 I, V e VI; 30 (ressaltando-se que o caput enumera todos os aspectos que podem ser controlados pela administração, que vão desde a administração da empresa concessionária, até sua contabilidade e seus recursos técnicos, econômicos e financeiros; ressalte também que o parágrafo único desse dispositivo menciona a possibilidade de controle por comissão mista, composta por representantes do concedente, da concessionária e dos usuários) 6.1.2) aplicação de sanções – significa a possibilidade da Administração, através de suas próprias competências, revestidas da característica da autoexecutoriedade, aplicar sanções aos concessionários de serviço. Previsão genérica contida no art. 38 da Lei 8987. Importante observar que se a Administração reveste-se de poderes caracterizados pela autoexecutoriedade na aplicação de sanções, isso não significa que o processo administrativo de aplicação de sanções seja arbitrário; é necessário garantir ampla defesa e contraditório a fim de que a aplicação final da sanção seja revestida de legalidade, obedecendo-se atentamente os termos do art. 38. Quanto às sanções que a Administração pode impor, a Lei 8987 é omissa. Assim, a doutrina tem aplicado o art. 87 da Lei 8666/93 de forma supletiva nessas situações. O entendimento doutrinal vai no sentido de que não seria possível, mediante edital, contrato ou regulamento administrativo criar novas sanções além daquelas previstas na Lei de Licitações, sob pena de violação do principio da reserva legal (a Adminstração está adstrita a executar apenas aquilo que foi determinado na ordem jurídica). Portanto, aas sanções

passiveis de serem aplicadas em contrato de concessão são: advertência, multa, suspensão temporária de participar em licitação e impedimento de contratar por até dois anos, declaração de inidoneidade para licitar ou contratar e declaração de caducidade da concessão. 6.1.3) intervenção na empresa concessionária – “a intervenção não tem caráter punitivo; ela nada mais é do que a substituição temporária da concessionária pelo próprio poder concedente, com o objetivo de apurar irregularidades, assegurar a continuidade do serviço e propor, ao final, medidas mais convenientes a serem adotadas.” (Di Pietro, p. 104) Os arts. 32 a 34 da Lei 8987 estabelecem a previsão legal e os procedimentos a serem adotados em caso de intervenção. Apuradas as irregularidades, o prazo máximo para início do processo de intervenção é de 30 dias. Deverá ser garantido o contraditório e a ampla defesa nesse processo que deve durar até 180 dias, pois trata-se de uma medida excepcional que vai além dos normais poderes de controle e fiscalização do contrato de concessão. Em ocorrendo excesso de poder ou abuso por parte da Administração fica assegurado à concessionária o direito de retomar a concessão e reassumir a execução do serviço, mediante processo judicial. Encerrado o processo de intervenção, havendo ou não extinção do contrato de concessão, o interventor nomeado pela Administração deverá prestar contas de sua administração e, em não havendo extinção do contrato e constatando-se algum prejuízo, a concessionária deverá ser ressarcida quantos a esses prejuízos (conforme art. 34 da Lei de Concessão). 6.1.4) uso compulsório de recursos humanos e materiais da concessionária – trata-se de uma medida excepcional de caráter cautelar, destinada a assegurar a continuidade do serviço público nos casos em que a concessionária esteja descumprindo suas obrigações e colocando em risco a normalidade da prestação do serviço. A Lei de Concessões, em seu artigo 35, §§ 2º e 3º prevê a utilização dessa competência apenas depois da extinção da concessão. No entanto, a doutrina entende que o administrador pode lançar mão dessa competência mesmo durante a vigência do contrato, por aplicação subsidiária da norma do art. 58, inciso V da Lei de Licitações. 6.1.5) exigência de garantia; 6.1.6) decretação da caducidade do contrato – “corresponde à rescisão por inadimplemento contratual da por parte da concessionária e só pode ocorrer nas hipóteses indicada no art. 38 da Lei.” (Di Pietro, p. 132) Basicamente, a caducidade deverá ser declarada quando a concessionária deixar de prestar o serviço adequado, conforme exigido pelo art. 6º, ou quando descumprir cláusulas contratuais e/ou o regramento legal e regulamentar da concessão (incisos I a III do art. 38). Mas não só isso. Como já assinalado acima, a concessão exige um certo dinamismo, que compreende constante fiscalização e regulação pelo poder concedente, de tal forma que se a concessionária deixar de cumprir qualquer imposição decorrente da dinâmica do contrato de prestação de serviço, também dará causa à caducidade (incisos V e VI do art. 38). Também será causa de caducidade da concessão a hipótese em que a concessionária venha a perder as condições de habilitação que manteve no processo licitatório, bem como se vier a ser condenada por sonegação de tributo ou contribuição social (incisos IV e VII do art. 38). Importa destacar que a caducidade sempre será precedida de processo administrativo de apuração da inadimplência pelas hipóteses assinaladas no art. 38. Nas hipóteses de caducidade, não há que se falar em indenização a ser paga pela Administração, exceto o custo dos bens que devem permanecer sendo usados no serviço e que ainda não tenham sido amortizados pela exploração econômica efetuada até pela concessionária. Claro que, em havendo apuração de prejuízos para a Administração, superando o custo dos bens a serem incorporados ao serviço, a concessionária deverá por eles se responsabilizar. 6.1.7) encampação da execução dos serviços – trata-se da rescisão unilateral do contrato de concessão pela Administração em razão da superveniência de interesse público

suficientemente fundado para dar causa à descontinuidade do contrato de concessão. Previsão no art. 37 da Lei 8997/95. Exemplo: caso da Petrobras que encampou usinas termoelétricas criadas durante a crise no sistema de geração de energia há alguns anos. Nesse caso, a melhora no sistema de geração e de distribuição de energia, aliada ao questionamento dos termos contratuais extremamente favoráveis ao particular, geraram a superveniência de interesse publico a justificar a encampação das usinas. Neste caso, além do ressarcimento do custo dos bens disponibilizados para o serviço (e que ainda não foram amortizados), a Administração deve ainda arcar com os prejuízos que particular justificadamente tenha sofrido em razão da rescisão do contrato de concessão. 6.1.8) impossibilidade da alegação da clausula do contrato não cumprido pela concessionária – da mesma forma que ocorre com os contratos administrativos aqui também o concessionário está obrigado a prosseguir na execução do contrato, em qualquer circunstância. A paralisação do serviço é até mais grave, pois viola frontalmente o princípio da continuidade do serviço publico e prejudica o fornecimento de utilidades que são fundamentais para a sociedade, afetando diretamente o cidadão usuário. A concessionária só pode paralisar suas atividades nas hipóteses estritas do art. 6º, § 3º - razões de ordem técnica ou segurança das instalações e inadimplemento do usuário (desde que considerado o interesse da coletividade para auferir se esse inadimplemento é ou não aceitável como causa de rompimento no fornecimento do serviço). Atenção, não somente os poderes da Administração nos contratos de prestação de serviço caracterizam aquilo que se pode denominar cláusulas exorbitantes no serviço público. Há também outras exigências do direito público que incidem sobre os contratos de concessão, mudando-lhes o regime em relação ao regime geral dos contratos: 6.2) regime de direito público regulando os bens afetos à prestação do serviço – o contrato de concessão, tal como se disse inicialmente, deve conciliar o interesse do particular em obter lucro com a exploração do serviço e também os interesses da Administração e dos usuários na prestação de um serviço adequado voltado para o atendimento do interesse coletivo. Assim, o regime dos bens da empresa concessionária se submeterá a essa duplicidade de interesses (publico e privado) que envolve a prestação dos serviços públicos. Dessa forma, é possível dizer que uma concessionária de serviço possui bens de dois tipos: aqueles que de que se utiliza enquanto empresa privada e aqueles afetados diretamente à prestação do serviço público. Os primeiros são bens particulares, que estão no comércio, nos termos do art. 98 do Cód. Civil e que, portanto, podem ser objeto de todo tipo de negócio de direito privado. Já os bens diretamente afetados à prestação do serviço são bens públicos, que estão fora do comércio e revestidos da característica da inalienabilidade, pois a simples possibilidade de livre alienação ou de se onerar esses bens colocaria em risco um princípio fundamental da prestação dos serviços públicos, que é o da continuidade. Isso significa então que uma empresa concessionária de serviço não está abrangida pelo regime especial dos precatórios no que diz respeito à responsabilidade civil. Dessa forma, a concessionária se submeterá ao regime normal das execuções, até o limite dos bens privados da empresa. Esse é melhor entendimento que a doutrina extrai do art. 26 da Lei 8987/95. De outro lado, não é porque a concessionária administra ou possui bens inalienáveis, que passa a configurar-se como entidade integrante da Administração Pública. O que se tem aqui é que o regime de bens da empresa é dúplice, mas o regime de exploração econômica do serviço e administração da empresa concessionária permanece sendo um regime de direito privado, sem haver incorporação da empresa privada à estrutura da Administração Pública. (Di Pietro, p. 109) 6.3) reversão – “é a passagem ao poder concedente dos bens do concessionário aplicados ao serviço, uma vez extinta a concessão.” (Celso Antonio Bandeira de Mello citado por Di Pietro, p. 107) é decorrência direta da duplicidade de regime jurídico dos bens da

concessionária de serviço. A reversão trata-se de uma característica imposta principalmente em razão do principio da continuidade do serviço. A reversão vai trazer algumas peculiaridades ao processo licitatório e ao contrato de concessão do serviço. Nos termos do art. 18, incisos X e XI da Lei 8987/95, será necessário indicar no edital da licitação os bens a serem revertidos, bem como suas características, pois essa indicação será fundamental para os competidores formulares suas propostas. Além disso, no art. 23, incisos X e XI, já no contrato de concessão, será necessário estabelecer cláusula onde conste a descrição dos bens reversíveis, bem como a forma de amortização do custo desses bens a indenização que poderá decorrer se o contrato se encerrar sem que o custo desses bens tenha sido amortizados. Tais exigências do regime de reversão dos bens públicos do contrato de concessão são uma decorrência direta da necessidade de se configurar o regime de concessões de forma a atrair e garantir o interesse do particular na exploração econômica do serviço. Afinal, se o custo dos bens reversíveis tivesse que ser aleatoriamente suportado pelo particular, a exploração da concessão poderia não mais ser atraente ao interesse de investidores. Isso sem falar no principio que veda o enriquecimento ilícito que naturalmente ocorreria em favor da Administração caso particular tivesse que arcar com os custos dos bens reversíveis sem a previsão de critério algum de indenização ou amortização. 6.4) responsabilidade civil regida por normas de direito público – a responsabilidade civil da concessionária de serviço público é objetiva, bastando a comprovação de dano e nexo de causalidade, nos termos do art. 37, § 6º da CF/88. Nesse ponto alguns detalhamentos devem ser colocados: a) a responsabilidade da concessionária vai até o limite de seus bens alienáveis e não pode nunca incidir sobre os bens reversíveis, que sempre estarão comprometidos com a continuidade do serviço. Exemplo típico de responsabilidade de concessionária: descarga elétrica transmitida pela rede de energia vem a danificar eletrodomésticos do consumidor. Sendo insuficientes os bens particulares da concessionária, a Administração responde subsidiariamente, apenas naquilo que diga respeito aos prejuízos causados diretamente pela prestação do serviço. Assim, o particular que vende bens secundários (não diretamente relacionados á prestação do serviço e, portanto, não reversíveis) não poderá, descobrindo que a concessionária encontrava-se insolvente, exigir a satisfação de seus créditos contra a Administração em razão de sua responsabilidade subsidiária; b) admite-se, excepcionalmente, responsabilidade solidária da Administração em caso de omissão ou desídia no exercício dos poderes de controle e fiscalização sobre a concessão do serviço. Exemplo: execução de obra de infraestrutura para ampliação do serviço de metrô causa danos aos particulares no entorno.

Intervenção do Estado na propriedade I) Noções introdutórias – função social da propriedade e os diferentes tipos de propriedade na ordem constitucional. Quando se fala em propriedade privada, a impressão que se tem é a de que se trata exclusivamente de um direito fundamental a ser tutelado pelo Estado a fim de preservar a plena liberdade de disposição do particular sobre seus bens. Essa concepção inicial é verdadeira apenas num momento inicial de afirmação das modernas constituições, no período dito liberal. Posteriormente, as Constituições foram absorvendo novas gerações de direitos fundamentais e isso acabou provocando uma completa mutação na concepção da propriedade, que deixa de ser um direito subjetivo absoluto e passa a ser uma função do detentor da riqueza de instrumentalizá-la para a realização dos valores constitucionais. Assim, depois de uma evolução que se inicia concebendo a propriedade

como um direito subjetivo, hoje, a propriedade configura-se muito mias como um dever. Interessante observar as fases dessa evolução: Fase liberal – propriedade como direito subjetivo ilimitado – nesse momento da história constitucional, afirmam-se os direitos de personalidade, sendo a propriedade o grande vetor da afirmação dos outros direitos de liberdade. Aqui a propriedade é concebida como o direito de usar, gozar e dispor do bem, de forma absoluta, exclusiva e perpétua. É absoluta porque assegura ao proprietário, “do modo mais amplo, o uso, a ocupação, a modificação e a disponibilidade do bem. É exclusiva, porque não compartilhada por duas pessoas ao mesmo tempo, cabendo somente ao proprietário titular definir os usos do bem. É perpetua porque permanece no patrimônio do proprietário, podendo até mesmo passar aos seus herdeiros por sucessão. (Odete Medauar, p. 343, citando J. Afonso da Silva) Fase de intervencionismo estatal – nesse momento, afirma-se a autoridade do Estado como elemento que, no interesse público e geral de toda a sociedade, pode fundadamente impor restrições ao uso da propriedade, limitando alguma das três características que configuram o uso da propriedade, tal como concebida na fase liberal. A intervenção aqui é um momento excepcional, em que o interesse público comparece como prevalente sobre o interesse particular, apenas para limitar algum aspecto do uso privado da propriedade, possibilitando assim a realização de algum interesse publico especifico. É nesse momento que surgem os institutos do tombamento (Decreto Lei nº 25/37) e da desapropriação (Decreto Lei nº 3365/41). Note-se que a concepção da propriedade continua sendo a mesma aqui. Muda apenas a possibilidade de se impor alguma limitação eventual, em nome do interesse público, na utilização dessa propriedade. Fase de redefinição da propriedade como função social – quando as contemporâneas constituições garantistas começam a albergar direitos difusos, coletivos, transindividuais, a concepção do direito de propriedade teve que mudar. Com tantos direitos sobrepostos a serem realizados ao mesmo tempo numa mesma ordem constitucional, ficou difícil manter a essência do direito subjetivo de propriedade, apenas limitado esporadicamente o seu uso por algum eventual interesse público. Na verdade, na nova ordem constitucional, os direitos subjetivos passaram a ser condicionados na sua essência. O particular define o seu direito não a partir da manifestação livre de sua vontade, mas sim a partir dos condicionamentos impostos pela ordem jurídica. A liberdade contratual é possível se obedecidos os preceitos de ordem pública que regulam os contratos e outorgam ao particular o exercício de sua autonomia de vontade. A liberdade de profissão é possível se atendidas a exigências de qualificação e ética profissional impostos pela Constituição e pela ordem infraconstitucional. O exercício do direito de propriedade é possível se atendida a sua função social. Esse é o mandamento geral contido no art. 5º, incisos XXII e XXIII da Constituição. Com base nesse mandamento geral não possível mais dizer que existe um direito de propriedade, mas sim uma pluralidade de direitos de propriedade, todos condicionados pela ordem constitucional. Nesse sentido pode-se falar em: Propriedade privada dos bens de produção – conforme art. 170, II e III da CF –que significa o exercício da liberdade de iniciativa econômica dentro de parâmetros de moderação que não violem o principio fundamental da livre concorrência. Tal definição permite ao Estado exercer poderes de administração ordenadora (ou poderes de polícia) dentro daquelas funções denominadas de repressão ao abuso do poder econômico previstas no art. 173, § 4º da CF. Aqui surge o CADE (Conselho administrativo de defesa econômica) e seus mecanismos de controle da concorrência; Propriedade urbana – conforme arts. 182 e 183 da CF. Caracterizada como uma função necessária para o atingimento de uma política pública de planejamento e bemestar no meio ambiente das cidades. Daqui decorre todo o Direito do Urbanismo, bem como uma releitura de institutos tradicionais como a desapropriação, a servidão administrativa e o tombamento.

Nos termos da Constituição de 1988, as funções da propriedade urbana devem ser definidas no Plano Diretor do Município, que sempre será uma lei municipal elaborada com ampla participação popular. No contexto do Plano Diretor, o particular que se negar a utilizar sua propriedade em conformidade com suas funções sociais estará sujeito à aplicação de institutos, como o IPTU progressivo no tempo e a desapropriação-sanção, que irão efetivamente induzir a utilização do imóvel em conformidade com o previsto na legislação. Assim, a CF de 88 embasou a criação de uma série de novos institutos (principalmente no Estatuto da Cidade) que possibilitaram o pleno condicionamento da propriedade urbana à sua função social. Mas não é só na área do Direito Público que se manifesta a função social da propriedade. Também o direito privado, notadamente o Direito Civil, sofreu verdadeira revolução com a instituição da função social da propriedade. Assim é que se explicam os diversos parágrafos acrescidos ao art. 1228 do Código Civil. Nesses casos, o objetivo do legislador foi adequar as relações patrimoniais ao conceito de função social da propriedade, tal como previsto na Constituição. Portanto, para o Direito Civil, o uso da propriedade é definido como abusivo não apenas nos casos em que interfere com os direitos dos vizinhos (artigo 1277 e seguintes - CC), mas também nos casos em que interfere em direitos coletivos como o meio ambiente (§1º do art. 1228 - CC) ou a justa distribuição do espaço urbano (§4º do art. 1228 - CC). Para entender esse reflexo da função social da propriedade analise-se o caso do proprietário de imóvel localizado próximo a área residencial, onde instala casa noturna. Não há legislação municipal que vede tal utilização (pois os responsáveis políticos do Município se omitiram de regular a função social da propriedade no Plano Diretor no caso em questão), mas efetivamente, os impactos provocados pelo estabelecimento nas vizinhanças são altamente prejudiciais. Tem-se ai um caso em que a propriedade deixou de ter um uso normal e passou a ter um uso abusivo violando direito coletivo de toda vizinhança. Trata-se de hipótese em que os particulares, apesar de não poderem invocar uma norma de direito público para Impedir o funcionamento do estabelecimento, podem acionar seu proprietário para que adéqüe a propriedade a fim de que não mais prejudique os direitos de toda a coletividade circundante. Propriedade rural – prevista nos arts. 184 a 191 da CF. Conjunto de deveres impostos ao Estado e à Sociedade cuja finalidade é superar as injustiças sociais no campo e promover a justa distribuição de terra no meio rural. Daqui vai decorrer toda a legislação contida no direito agrário e especialmente a legislação referente à reforma agrária contida na Lei 8629/93. II) Modalidades 1) Ocupação temporária – processo administrativo mediante o qual a Administração Pública declara a utilidade pública do bem e o utiliza temporariamente para a realização de obra pública. Trata-se de restrição à característica de exclusividade do direito de propriedade. Para Di Pietro (p. 124) “é forma de limitação do Estado à propriedade privada que se caracteriza pela utilização transitória, gratuita ou remunerada, de imóvel de propriedade particular, para fins de interesse público.” Alguns casos expressamente previstos na legislação: artigo 13 da Lei 3924/61 pelo qual se permite a ocupação temporária e parcial de imóvel particular para escavações e pesquisas de monumentos arqueológicos e da pré-história. Artigo 58, V da Lei 8666/93 que prevê a ocupação de bens e instalações do contratado para apurar culpa do contratado na violação de cláusula do contrato administrativo. No mesmo sentido desse último dispositivo legal, também o art. 80 da Lei 8666/93 e o art. 35, §§ 2º e 3º da Lei 8987/95 sobre o regime dos contratos de concessão de serviços. Note-se da leitura dos casos abaixo que, apesar do conceito do instituto parecer bastante claro, a sua configuração nos casos concretos pode gerar muitos litígios, pois o particular

nunca aceita as exações da Administração e esta, por sua vez, pode exceder-se no uso de suas competências, criando intervenção desproporcional. requisitos: realização de obra pública – necessidade de ocupação de terreno vizinho – inexistência de edificação no terreno a ser ocupado – obrigatoriedade de indenização – prestação de caução previa quando exigida. Previsão legal: art. 36 do De.-lei nº 3365/41 e art. 5º XXV da CF/88 Casos para discussão: TJ/SP – Apelação nº 377.452.5/6-00 – Partes: Prefeitura Municipal de Barra do Turvo e Maria Alice Peixoto Lorenzetti – Comarca de Santa Cruz do Rio Pardo – Relator Des. Reinaldo Miluzzi – julgado em 03/03/2008. No caso a Prefeitura decretou a ocupação temporária de área na fazenda da autora, determinando que esta retirasse as cercas de proteção da propriedade para viabilizar obras nas laterais da rodovia que atravessa a referida fazenda. A autora impetrou mandado de segurança para impedir a retirada das cercas. Em primeira instância decidiu-se que a ocupação era licita, mas a retirada das cercas ficaria a cargo da Administração. Em segunda instância a decisão foi reformada para dar improcedência total ao pedido inicial, ficando determinado à autora também a obrigação de retirar as cercas; TJ/SP - Agravo de instrumento n° 743.946-5/3-00 – Partes: Metro de SP e Saven Comercial e Imóveis – Relator Des. Evaristo dos Santos – julgado em 09/06/2008. Metro pretendia constituir uma servidão no local e também ocupar provisoriamente parte do imóvel da empresa. Ocorre que a ocupação iria se dar na estacionamento do Shopping, inviabilizando assim utilidade significativa do empreendimento. O tribunal entendeu que o estacionamento seria equiparado a construção e que não se poderia constituir a ocupação nessa área, pois isso comprometeria seriamente o funcionamento do negócio do Particular. Caracterizado excesso no uso da competência da Administração de instituir a ocupação provisória. 2) Requisição administrativa – uso da propriedade do particular, assegurando-se ao proprietário indenização ulterior, em situações de iminente perigo público, para garantir a integridade e a segurança de pessoas e bens. Para Di Pietro (p. 127) “pode-se conceituar a requisição como ato administrativo unilateral, auto-executório e oneroso, consistente na utilização de bens ou serviços particulares pela Administração, para atender a necessidades coletivas em tempo de guerra ou em caso de perigo público iminente.” Há necessidade de previsão legal de competência para o Administrador poder utilizar-se dessa modalidade de intervenção na propriedade. Assim, não é qualquer agente público que, em situação de emergência, poderá utilizar-se dessa função. Previsão legal contida no art. 5º XXV da CF/88. Casos mais comumente admitidos são os de emergência de guerra, tal como previstos no Decreto-lei nº 4812/42 (alterado pelo Decreto-lei 5451/43). Mas, mais recentemente tem-se admitido a requisição administrativa em casos de emergência em tempo de paz, tal como previsto pela Lei Delegada nº 4/62 ou no Decreto-lei nº2/66, que são casos que permitem a requisição de bens e serviços essenciais para a população em caso de desabastecimento, dentro das competências da SUNAB (Superintendência Nacional de Abastecimento). Caso para discussão: TJ/SP – Apelação nº 349.267.5/1-00 – Relator Des. Guerrieri Resende – Julgado em 12/12/2005, conforme ementa "Mandado de segurança. Intervenção na propriedade particular. Requisição do imóvel para utilização de serviço funerário de velório, através do Decreto n" 62, de 12 de junho de 2002. Inadmissibilidade. Ausência de iminente perigo público. Ausência do depósito ou de pagamento à impetrante pela requisição do imóvel. Inteligência do art. 5o, inciso XXV da Constituição Federal. Sentença concedeu a segurança. Recursos - voluntário e oficial - improvidos.”

3) Tombamento – “procedimento administrativo pelo qual o Poder Público sujeita a restrições parciais os bens de qualquer natureza cuja conservação seja de interesse público, por sua vinculação a fatos memoráveis da história ou por seu excepcional valor arqueológico ou etnológico, bibliográfico ou artístico.” (Di Pietro, p. 129) É uma intervenção estatal que afeta o seu caráter absoluto da propriedade. Trata-se de restrição parcial ao direito de propriedade, eis que não impede o particular de utilizar-se de todas as faculdades (usar, gozar e dispor da coisa) inerentes ao domínio. Daí, o tombamento poderá eventualmente gerar direito à indenização, nos casos em que houver restrições efetivas a essas faculdades. Caso a restrição seja completa, será mais conveniente realizar desapropriação, transferindo o bem para o domínio publico. A restrição pelo tombamento, muitas vezes pode até mesmo afetar positivamente a utilização econômica do bem, gerando vantagem que pode ser explorada economicamente pelo proprietário. Ex.: restaurante instalado em edifício histórico que atrai freqüentadores; grupo econômico interessado em criar imagem de responsabilidade social restaura edifício histórico e nele se instala. Previsão legal: art. 216 da CF/88 (regulação constitucional do instituto); art. 23, III da CF/88 (fixação das competências materiais para preservação a cargo de todas as entidades federativas); art. 24, inciso VII da CF/88 (fixação de competência legislativa concorrente para União e Estados para estabelecer normas gerais sobre o instituto); art. 30, IX da CF/88 (fixação de competência material do município para promover a proteção ao patrimônio histórico e cultural no nível local). Decreto-lei nº 25/37 lei geral que fixa diretrizes e procedimento para o tombamento. Modalidades de tombamento (Di Pietro, p. 130-131): Quanto à constituição do procedimento, pode ser de ofício, voluntário ou compulsório; Quanto à eficácia: provisório ou definitivo; Quanto aos destinatários: geral ou individual. O procedimento de ofício correrá sempre para bens públicos. O procedimento voluntário pode ser iniciado pelo particular ou pela administração, mas, de qualquer forma, sempre haverá anuência do titular do bem. O tombamento compulsório pressupõe a resistência do particular à pretensão da Administração de impor a restrição ao bem. Nesse caso será adotado um procedimento mais amplo, que garanta contraditório e ampla defesa, a fim de configurar a restrição ao bem, tal como se verá no próximo item. Importa observar que o procedimento compulsório pode ser subdividido em provisório e definitivo. O tombamento provisório nada mais é do que a fase inicial, a partir da notificação do particular, do processo de tombamento. E o tombamento definitivo seria a fase final do processo, em que o bem é finalmente inscrito no Livro de Tombo. Como o processo de tombamento sempre se inicia com parecer técnico da Administração, tanto o provisório quanto o definitivo geram o mesmo efeito de impor a restrição ao bem, impedindo o particular a obrigação de modificá-lo, destrui-lo ou fazer qualquer alteração não autorizada. Procedimento (do Decreto-lei 25/37): manifestação do órgão técnico, que deve elaborar parecer indicando de forma fundamentada a relevância do bem para a finalidades de preservação do tombamento; notificação do particular, que deve manifestar-se no prazo de 15 dias, reconhecendo o valor do bem para os fins do tombamento, caso em que se dará o tombamento voluntário, ou impugnando fundadamente o parecer do órgão técnico. No caso de impugnação, estará iniciado o tombamento compulsório, garantindo-se, desde esse momento, a integridade do bem em questão, eis que a fase inicial do tombamento compulsório nada mais é do que o tombamento provisório, que tem os mesmos efeitos práticos do tombamento definitivo; “réplica” do órgão que tomou a iniciativa do tombamento, que deverá manifestar-se em 15 dias sobre as razões da impugnação, mantendo ou não a decisão pelo tombamento; decisão de mérito pelo órgão técnico, o IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), que terá o prazo de 60 dias para analisar todas

as manifestações e proferir decisão contra ou a favor à impugnação do particular. Em caso de decisão contrária ao particular, o parecer do IPHAN conterá determinação de inscrição no Livro de Tombo, que somente se efetivará após homologação; homologação pelo Ministro da Cultura, que revê todos os atos do processo e, em havendo ilegalidade, deverá anular o procedimento. Aprovando o parecer do órgão técnico, haverá ato homologatório que implicará na finalização do tombamento definitivo, registrando-se finalmente o bem no Livro de Tombo; inscrição no Livro de Tombo, que poderá ser de 4 tipos: arqueológico, etnográfico e paisagístico; das belas artes; das artes aplicadas; e histórico. No Estado de SP há ainda o Livro de Tombo de Artes Populares; cancelamento do tombamento. Possibilidade aberta pela inovação trazida no Decreto-lei nº 3866/41, que revogou o art. 10 do Decreto-lei nº 25/37. Trata-se de autorização dada ao Presidente da República para, de oficio ou mediante recurso e por motivo de interesse público, cancelar o tombamento. Efeitos (Di Pietro, p. 134 e seguintes) nos termos do Decreto-lei nº 25/37 (para a União): para o proprietário – a.1) obrigação positiva de conservar o bem ou, em não havendo recursos para tanto, notificar o órgão competente sobre a necessidade de reparos no bem, para que este promova os reparos, sob pena de multa. Em caso de alienação, deve assegurar o direito de preferência na aquisição para a União, Estado ou Município, sob pena de multa (arts. 19 e 22 do Decreto-lei nº 25/37); a.2) proibição de destruir, demolir ou mutilar o bem tombado ou mesmo reformá-lo sem prévia autorização do órgão responsável, sob pena de multa (arts. 14, 15 e 17 do Decreto-lei nº 25/37) ; a.3) obrigação de suportar a fiscalização quanto às condições de preservação do bem pelo órgão responsável; para os proprietários de imóveis vizinhos – conforme art. 18 do Decreto-lei nº25/37 – proibição de construir ou fixar anúncios e cartazes que venham a afetar a visibilidade do bem tombado. Trata-se de servidão administrativa, constituída automaticamente com o tombamento, que submete os imóveis vizinhos ao imovel tombado. para o IPHAN – executar as obras necessárias para a conservação do imóvel quando o particular não puder arcar com os custos das mesmas, havendo até mesmo a previsão de cancelamento do tombamento, quando o órgão responsável não executar tais obras (art. 19 do Decreto-lei nº 25/37); exercer a vigilância sobre a coisa tombada (art. 20); providenciar o registro do tombamento no registro de imóveis (além do registro já efetuado no Livro de Tombo) na matricula do imóvel, a fim de assegurar o direito de preferência dos entes públicos na aquisição do imóvel, em caso de alienação pelo proprietário (arts. 13 e 22). Por fim, importa observar que o tombamento não é a única forma de preservar o patrimônio histórico ou cultural. A ação popular e a ação civil pública também são instrumentos de preservação da memória e da cultura e podem ser utilizados independentemente de prévio tombamento. Esse entendimento decorre do §1º do art. 216 da CF/88, em conjugação com os dispositivos constitucionais referentes às ações mencionadas. 4) Servidão administrativa – “é direito real de gozo, de natureza pública, instituído sobre imóvel de propriedade alheia, com base em lei, por entidade pública ou por seus delegados, em favor de um serviço público ou de um bem afetado a fim de utilidade pública.” (Di Pietro, p. 140) Noção - Na servidão, algum aspecto do domínio sobre um bem é separado (A)e transferido a terceiro, convertendo-se num direito real autônomo (B) em nome de outro titular que não o próprio titular do domínio. Nesse caso sempre vai existir uma situação de sujeição (C) em que a coisa dominante, em benefício da qual se cria a servidão, subordina a coisa serviente, que fica onerada pela servidão. Exemplo típico de servidão no direito civil é a servidão de passagem, que consiste na separação de parcela de área de imóvel (coisa serviente) para possibilitar que outro imóvel (coisa dominante) tenha acesso mais facilitado à via pública. No caso do Direito Administrativo, a coisa dominante será um serviço público ou um bem público afetado por uma finalidade de interesse público. Caso clássico de servidão administrativa é a servidão de energia elétrica, pela qual o serviço público de transmissão e

distribuição de energia obriga à imposição de restrição à propriedade particular consistente em permitir que as redes de eletricidade ocupem parcela da área privada. Os atos pelos quais se impõe a servidão são auto-executórios, mas o processo administração de constituição da exação administrativa deve ser todo fundamentado e conforme parâmetros estritos de legalidade. O Judiciário poderá rever as ilegalidades cometidas pelo administrador, mas está impedido de interferir na conveniência e oportunidade da decisão que levou à constituição da servidão (vide o caso para discussão contido na jurisprudência indicada). Distinção (de outras modalidades de intervenção) O que particulariza a servidão administrativa é o fato do interesse público estar corporificado num bem ou serviço público específico. Isso faz com que essa modalidade de intervenção administrativa seja específica, incidindo sobre um bem (ou conjunto de bens) individualizado. Para Di Pietro (p. 140), “existe uma coisa palpável, concreta, a usufruir a vantagem prestada pelo prédio serviente.” No caso das limitações administrativas (outra modalidade de intervenção), existe lei a estabelecer genericamente uma limitação ao uso da propriedade para qualquer particular que se enquadre na hipótese da norma. É o caso, por exemplo da outorga onerosa do direito de construir, que se trata de imposição genérica, mediante a qual se permitem construções acima de um determinado limite, somente através da obtenção de licença onerosa. Portanto, enquanto a servidão administrativa impõe restrição especifica em proveito de bem ou interesse público especifico, as limitações têm caráter geral, decorrem de lei e tutelam interesses públicos genéricos. Formas de constituição (Di Pietro, p. 141) Mediante lei, como no caso das restrições à construção nos entornos de aeroportos, em que a própria legislação já estabelece, independente de qualquer ato administrativo, a restrição em proveito do serviço de navegação aérea (que seria o bem dominante); Mediante acordo – nesse caso, a Administração declara o interesse público em ato declaratório publicado no órgão oficial e o particular aceita a restrição, como no caso da servidão de energia elétrica, que deve ser constituída prioritariamente mediante acordo, recorrendo-se às vias judiciais somente no caso em que o particular contestar a constituição da servidão, tudo conforme regulação estabelecida no art. 151 do Código de Águas (Decreto nº24643/34) regulamentado pelo Decreto nº 35851/54; Mediante sentença judicial, nos casos em que o particular contestar os valores pagos pela Administração, recorrendo-se ao Judiciário para que profira o justo valor da indenização em decorrência da restrição administrativa imposta à propriedade. Nesse caso, a servidão já se constitui mediante procedimento administrativo com base no art. 40 do Decreto-lei nº 3365/41, havendo interferência do Judiciário apenas para confirmar a legalidade do ato constitutivo da servidão, bem como o valor pago a título de indenização. Indenização - Como se trata de sacrifício de direito do particular, a instituição de servidão administrativa é, em regra, indenizada. O particular não pode suportar sozinho os custos de uma restrição administrativa que visa favorecer toda a sociedade. Obviamente, como a servidão não implica em completa privação da propriedade, indenização será dimensionada conforme as restrições impostas ao particular. Nesse sentido, conforme noticia Di Pietro (p. 143), “no caso de servidão de energia elétrica, que é a mais freqüente, a jurisprudência fixa a indenização em valor que varia entre 20% e 30% sobre o valor da terra nua.” Em hipóteses em que a servidão engloba grande parte da área do particular e acaba por quase suprimir o direito de propriedade, haverá uma confusão com a desapropriação, pois nesse caso, a restrição é tamanha de tal ordem que praticamente equivale à transferência da propriedade ao domínio público. Em tal hipótese será melhor promover logo uma desapropriação, que possibilitará uma indenização mais justa tendo em vista a dimensão do sacrifício do direito sofrido pelo pela particular. No caso das servidões instituídas mediante lei, como a do entorno dos aeroportos, não haverá necessidade de indenização, caso a instituição da servidão preceda a utilização pretendida pelo particular (caso o particular já tivesse construção incompatível com a restrição posteriormente imposta, haverá necessidade de indenização).

Casos para discussão: APELAÇÃO CÍVEL nº 301,825-5/1 COMARCA: SOROCABA RECORRENTE: JUÍZO EX OFFiCiO APELANTES E APELADOS: EPOF EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES IMOBILIÁRIAS LTDA E PETROBRAS GAS S/A GASPETRO Vistos Servidão administrativa - Gasoduto Bolívia-Brasil - indenização apenas do prejuízo efetivo sofrido pelo proprietário e que diz respeito às restrições existentes na faixa ocupada • Inviabilidade de indenizar hipotético loteamento que seria implantado na área — Conversão do julgamento em diligência para realização de nova perícia. 10 APELAÇÃO CÍVEL n° 301.825-5/8-00 COMARCA: SOROCABA APELANTES: PETROBRAS GÁS S/A - GASPETRO E EPOF EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES IMOBILIÁRIAS LTDA. APELADOS: OS MESMOS Vistos. Servidão de passagem - Gasoduto Bolivia-Brasil - Indenização apenas do prejuízo efetivo sofrido pelo proprietário e que diz respeito às restrições existentes na faixa ocupada Inviabilidade de indenizar hipotético loteamento que seria implantado na área - Inexistência de desvalorização do remanescente - Diligência que apontou o justo valor da indenização, acolhido o montante sugerido pelo perito ~ Verba honorária a ser calculada sobre a diferença entre oferta e indenização – Provimento parcial aos recursos. 5) Desapropriação – em definição sintética é transferência compulsória da propriedade particular para o domínio público. Trata-se de manifestação do poder de polícia da Administração que, em nome da utilidade pública, necessidade pública ou interesse social, transfere o domínio da propriedade do bem ao poder público, mediante justa e prévia indenização. Para Di Pietro (p. 149) “é o procedimento administrativo pelo qual o Poder Público ou seus delegados, mediante prévia declaração de necessidade pública, Utilidade pública ou interesse social, impõe ao proprietário a perda de um bem, substituindo-o em seu patrimônio por justa indenização.” Requisitos fundamentais São dois os requisitos fundamentais da desapropriação: de um lado utilidade pública, necessidade pública ou interesse social; de outro lado justa e prévia indenização. Os casos de utilidade pública ligam-se à idéia de um interesse coletivo não emergencial, mas cuja realização pela administração é vantajosa e conveniente, como no caso da exploração ou conservação de serviços públicos (alínea h do art. 5º), por exemplo. Os casos de necessidade pública foram equiparados aos de utilidade pública quanto aos efeitos legais que geram e ligam-se à idéia de um interesse coletivo cuja satisfação é inadiável, como nos casos de defesa do Estado ou de ocorrência de calamidade pública (alíneas b – c). Ambos os caso estão previstos de forma taxativa no art.5º do Decreto-lei 3365/41. Já os casos de interesse social estão previstos no Decreto-lei nº 4132/62, art. 2º e referem-se a hipóteses em que a propriedade particular será usada para resolver problemas relativos à desigualdade social ou à distribuição de renda, como a construção de casas populares (inciso V do art. 2º). A indenização se faz necessária para impedir o enriquecimento sem causa do Estado, bem como para tornar a desapropriação um procedimento em que o Estado não age com arbítrio, suprimindo direito do cidadão, sem uma compensação justa. Distinções Vários institutos de natureza diversa podem ser confundidos com a desapropriação intervenção que hora se analisa:

Desapropriação sanção – Também é transferência compulsória da propriedade privada para o domínio público, mas que tem um caráter de penalidade dirigida ao particular que não utiliza a sua propriedade em conformidade com a função social definida no plano diretor. A indenização será em títulos da dívida pública resgatáveis em até dez anos e o instituto poderá ser aplicado depois que a majoração das alíquotas de IPTU progressivo no tempo não foi capaz de induzir o particular ao aproveitamento de sua propriedade. Trata-se também de uma das modalidades de intervenção estatal na propriedade. Porém, é instrumento específico de planejamento urbano destinado a promover diretamente a função social da propriedade; Desapropriação indireta – nada mais é do que esbulho cometido pela Administração, que incorpora o bem ao domínio público sem indenização prévia e sem o procedimento de desapropriação. Pode ocorrer das mais variadas formas: pela instituição de servidão administrativa que engloba a maior parte da propriedade do particular, tornando inviável a sua utilização; pela incorporação de imóvel vizinho à obra pública, quando da ocupação temporária; ou mesmo pela simples realização de benfeitorias publicas (por exemplo, a construção de uma praça) que tornem inviável o uso da propriedade pelo particular. Nesses casos, o particular poderá inicialmente se opor mediante ações possessórias, mas se o bem já estiver incorporado definitivamente ao domínio, não restará alternativa senão a ação de indenização. Confisco – trata-se de penalidade ao particular que uso de forma nociva a sua propriedade para o cometimento de delitos de caráter penal, como o plantio de plantas psicotrópicas. Previsto no art. 243 da Cosntituição, não prevê indenização para a perda da propriedade. Desapropriação para fins de reforma agrária – Também é uma medida de sanção aplicada ao particular que não utiliza a propriedade em acordo com sua função social (definida conforme critérios específicos para o meio rural). Trata-se também de ato de transferência compulsória da propriedade para o domínio público. Mas, aqui a finalidade é especificamente voltada para a reforma agrária e o bem desapropriado encontra-se necessariamente no meio rural. Previsão está nos arts. 184 e seguintes da Constituição, regulamentado pela Lei Complementar 76/93 e pela Lei 8629/93. Objeto: Quaisquer bens, corpóreos ou incorpóreos, móveis ou imóveis, públicos ou privados, conforme art. 2º do Decreto-lei nº 3365/41. Neste aspecto, deve-se observar que há uma ordem que possibilita a desapropriação de bens públicos, de maneira que a entidade maior (União) sempre poderá desapropriar bens da entidade menor (Estados e Municípios), mediante autorização legislativa (do Poder Legislativo da entidade maior). Com relação aos bens das entidades da Administração Indireta, são bens afetos a uma finalidade pública específica e não poderão ser desapropriados senão mediante autorização do Chefe do Poder Executivo responsável pelo poder de tutela sobre a entidade descentralizada. Assim, os bens de concessionária de serviço público federal só poderão ser desapropriados por Estados e Municípios havendo autorização do Presidente. Segue-se aqui o mesmo regramento trazido pelo art. 2º do Decreto-lei nº 336/41, bem como a súmula STF nº 157. Competência: Legislativa – privativa da União, conforme art. 22, II da CF/88. Material – trata-se da competência para promover o processo expropriatório, ficando a cargo das pessoas coletivas públicas, conforme arts. 2º e 6º do Decreto-lei nº 3365/41 e art. 5º do Lei nº 4132/62. Sendo a desapropriação processo de intervenção na propriedade e significando o uso de poderes de administração, seu exercício só pode ficar a cargo das pessoas coletivas públicas. As únicas exceções previstas são a ANEEL (conforme art. 10 da Lei 9074/95) e o DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura e Transporte, conforme art. 82, IX, da Lei 10233/01).

Mas a desapropriação ocorre não só na fase declaratória, que carrega toda a carga impositiva dos poderes estatais; ela possui também uma fase executória, quando se discute o valor da justa indenização. Para a fase executória, é possível que outras entidades, inclusive de direito privado, promovam a desapropriação. É o caso, por exemplo, da concessionária de rodovia que, após declaração de utilidade pública do bem para fins de desapropriação, promove a desapropriação propriamente dita em sua fase executória, nos termos do art. 3º do Decreto-lei nº 3365/41. Importante, então, observar que a fase declaratória da desapropriação é de competência exclusiva do chefe do poder executivo, conforme disposição expressa do art. 6º do Decreto-lei nº 3365/41. Procedimento – fases a)Fase declaratória O processo de desapropriação se inicia com um decreto do chefe do poder executivo (art. 6º do Decreto-lei nº 3365/41) declarando a utilidade pública, a necessidade pública ou o interesse social. É nesse momento que se concentra o uso da força coercitiva do Estado, pois, uma vez declarada a utilidade do bem, este passa a estar vinculado ao processo expropriatório mesmo contra a vontade do particular, que só poderá impugnar o ato administrativo em caso de vício de legalidade. O decreto expropriatório é ato unilateral e auto-executório, portanto. Nesse sentido, é importante destacar então que o ato que declara a utilidade pública do bem deverá ser muito bem fundamentado e conter a destinação que o administrador pretende dar ao bem no futuro. Assim, se o administrador invade a esfera do particular e lhe toma um bem, suprimindo a propriedade, isso deverá ser feito por uma boa razão, de maneira que se expresse claramente o interesse público motivador do ato administrativo. Havendo vício no ato e dependendo do interesse a ser tutelado em juízo, será possível impugnar o ato expropriatório mediante mandado de segurança (quando houver arbítrio evidente, necessitando-se de rápida correção judicial), ação popular (quando qualquer cidadão, mesmo não sendo o particular expropriado quiser contestar a legalidade do ato em defesa da moralidade e do interesse público) ou ordinária declaratória de ilegalidade do ato (quando o particular perde o prazo do mandado de segurança ou depende de rito probatório parra provar a ilegalidade cometida pelo administrador). Conforme o art. 8º do Decreto-lei nº 3365/41, excepcionalmente, o Legislativo, mediante uma lei de efeitos concretos, poderá declarar a utilidade pública do bem para fins de desapropriação. Alguns atores apontam a inconstitucionalidade do texto legal nesse aspecto, por razões obvias (confusão inconstitucional de competências entre os poderes do Estado). De qualquer forma, o ato deverá conter os seguintes requisitos: - sujeito passivo (quem será desapropriado); - descrição do bem (para se poder avaliar o quanto deverá ser pago a título de indenização); - declaração propriamente dita (de utilidade pública, necessidade pública ou interesse social – para demonstrar que o ato expropriatório deverá ser sempre motivado); - destinação do bem (para se poder verificar se os motivos indicados pelo administrador são realmente enquadráveis em alguma das hipóteses previstas em lei); - fundamento legal (pois o caso concreto deve ser enquadrável em alguma das hipóteses de desapropriação expressamente previstas na legislação) e; - recursos orçamentários (pois a indenização sempre será prévia e em dinheiro). Os efeitos do ato declaratório, por sua vez, são os seguintes: - submete o bem à força expropriatória do Estado, mas ainda não transfere a propriedade do bem, que só vai ocorrer após o pagamento da indenização; - fixa o estado do bem para fins de indenização, pois o Estado não indenizará benfeitorias realizadas posteriormente, exceto se se tratarem de benfeitorias necessárias ou úteis expressamente autorizadas, sendo certo que as voluptuárias não serão indenizadas. Importante destacar que o particular não fica impedido de realizar construções em imóveis objeto de desapropriação. Isso significa que a Administração não poderá deixar de emitir

licenças para construção se atendidos os requisitos legais, mas, as construções efetuadas não serão indenizadas, pois modificam o estado inicial do bem; - fixa o início do prazo de caducidade de 5 anos (art. 10 do Decreto-lei 3365/41) dentro do qual a fase executória deverá ser iniciada para os casos de utilidade pública. Nos casos de interesse social, a caducidade será de 2 anos para que a administração conclua o processo expropriatório e dê uma utilidade efetiva ao bem (art. 3º da Lei 4132/62). b) Fase executória: A fase executória destina-se a apurar o valor da justa indenização e promover o seu pagamento ao particular, possibilitando assim a transferência definitiva do bem ao domínio público. Como a carga decisória do processo expropriatório já se deu na fase declaratória, conforme o art. 3º do Decreto-lei 3365/41, varias outras entidades públicas ou privadas poderão promover a desapropriação a partir desta fase. Subdivide-se em administrativa, quando houver acordo entre expropriante e expropriado quanto ao valor da indenização; e judicial, quando não houver acordo na fase administrativa ou não se conhecer quem é o titular do bem. Conforme disposição dos arts. 9º e 20 do Decreto-lei 3365/41, na fase judicial só se discute o valor da indenização ou eventual vício no processo judicial, ficando o questionamento quanto à regularidade da desapropriação na fase declaratória por conta de ação autônoma, conforme mencionado anteriormente. Veja-se abaixo o quadro esquemático do procedimento na fase judicial da desapropriação:

Será composto por vários fatores: a) O valor do bem expropriado, com as benfeitorias existentes no imóvel na época da declaração expropriatória, excluindo-se as construções benfeitorias feitas posteriormente, exceto as necessárias e as úteis expressamente autorizadas. Quanto às novas construções realizadas, também não são indenizáveis, conforme entendimento da Súmula nº 23 do STF. Esse entendimento decorre do art. 26, §1º do Decreto-lei nº 3365/41. Importante destacar que os direitos reais (como a hipoteca, usufruto, penhor) que incidem sobre o bem serão compensados no valor final da indenização paga pela Administração. Isso quer dizer que o terceiro titular desses direitos reais deverá satisfazer seus créditos contra o particular

desapropriado sobre o valor que este receber da Administração Pública (conforme art. 31 do Decreto-lei nº 3365/41). Já os direitos obrigacionais, como a locação ou o funda de comércio que terceiros tenham sobre o bem deverão ser indenizados mediante ação autônoma movida pelo terceiro contra a Administração (conforme art. 26 do Decreto-lei nº 3365/41). b) Lucros cessantes e danos emergentes – significando se houvesse alguma exploração econômica sobre o bem, que gerasse rendimentos para particular, isso também será um custo a ser incluído no valor da justa indenização. Por exemplo, o fundo de comércio de propriedade do próprio desapropriado deverá integrar o valor da indenização. Atenção, caso o fundo de comercio pertencer a terceiro, este deverá ingressar contra a Administração para ressarcimento de seus prejuízos em ação autônoma em relação ao processo judicial de desapropriação. c) Juros compensatórios – pagos como compensação em decorrência do particular ter ficado privado do bem desde a imissão provisória na posse, calculados na base de 12% ao ano sobre a diferença entre o valor provisório depositado na imissão provisória na posse e o valor final arbitrado em sentença, conforme entendimento que decorre das súmulas do STF nº 164 e 618. d) Juros moratórios – pagos na razão de 6% ao ano também sobre a diferença entre o valor provisório e o valor final da sentença, acrescido dos juros compensatórios, a partir do ano fiscal seguinte àquele em que a indenização deveria ter sido paga. 6) Limitações administrativas – “é toda imposição geral, gratuita, unilateral e de ordem pública condicionadora do exercício de direitos ou de atividades particulares às exigências do bem estar social.” (Helly Lopes Meirelles. Direito Administrativo Brasileiro. p. 85, 29 ª edição) “Medidas de caráter geral, previstas em lei com fundamento no poder de policia do Estado, gerando para os proprietários obrigações positivas ou negativas, com o fim de condicionar o exercício do direito de propriedade ao bem-estar social.” (Di Pietro, p. 123) É modalidade parcial de intervenção, porque não suprime a propriedade, mas condiciona a sua utilização a alguma finalidade pública. É permanente, pois não se encerra enquanto permanecer existindo a finalidade pública que visa satisfazer. É genérica, pois não visa a satisfazer a um interesse público específico, mas sim a realizar um interesse público genérico, incidindo, portanto, sobre a generalidade de bens que afetam tal interesse. É o caso, por exemplo, do alinhamento das construções em relação à via pública; aqui é necessário que todas as construções tenham um limite mínimo padronizado de recuo em relação ao espaço público, a fim de que se preserve a circulação das pessoas na via pública, bem como a estética e a organização física da cidade. Outro exemplo é a obrigação de implantar infra-estrutura mínima em novos loteamentos. A regulamentação da estética das fachadas de estabelecimentos comerciais também é exemplo. E o zoneamento dos usos permitidos nas várias áreas da cidade também pode ser citado como exemplo. Para fins do presente estudo (que se pretende resumido), no que diz respeito à limitações administrativas, o foco será dado apenas para alguns institutos relativos às limitações urbanísticas. Assim, estas serão divididas em dois grupos: a) limitações urbanísticas tradicionais (que se preocupam prioritariamente com o aspecto físico das edificações e dos parcelamentos de terra); e b) limitações urbanísticas decorrentes do Estatuto da Cidade (que são dirigidas prioritariamente para regular as dimensões econômica e social da propriedade, contribuindo para a definição da função social da propriedade no meio urbano). a) Limitações urbanísticas tradicionais: “todas as imposições do Poder Público destinadas a organizar os espaços habitáveis, de modo a propiciar ao homem as melhores condições de vida na comunidade.” (Helly Lopes Meirelles. Direito de Construir. P. 107, 9ª edição) Como se disse acima, voltam-se prioritariamente ao aspecto físico da organização das cidades e das

construções. Serão analisadas as seguintes limitações: loteamento, estética urbana, controle das edificações e zoneamento. a.1. Loteamento – “divisão voluntária do solo em unidades edificáveis (lotes) com abertura de vias de logradouros públicos, na forma da legislação pertinente.” (Helly, p. 133) A Lei nº 6766/79 é o instrumento fundamental de regulação dos loteamentos, pois traça as diretrizes gerais de regulação dessa modalidade de limitação administrativa. A lei federal abre a possibilidade para os Municípios suplementarem a regulação, estabelecendo mais limitações ou mesmo adequando a regulação geral trazida pela lei federal ao interesse local. São os seguintes os requisitos mínimos exigidos pela lei federal para os loteamentos: - sistema de circulação (art. 4º, inciso I); - equipamentos urbanos (art. 5º, par. único), como abastecimento de água, serviços de esgoto, energia elétrica, coleta de água pluvial, rede telefônica, gás canalizado; - equipamentos comunitários (art. 4º, § 2º), como praças, áreas verdes e áreas para preservação ambiental; - espaços livres de uso público (art. 4º. inciso I), como áreas livres para instalação de edifícios públicos (escolas, creches, postos de saúdes, etc.); - área total de 125 m2 e 5 m de frente, pelo menos, para os lotes (art. 4º, inciso II); - articulação das vias internas com as vias oficiais, bem como harmonização delas com a topografia do terreno (art. 4º, inciso IV). - importa destacar que todos esses itens deverão estar dimensionados em acordo com a densidade de ocupação que se pretende para o loteamento. O loteamento é uma das modalidades de parcelamento do solo urbano, ao lado do desmembramento. O loteamento é voltado para ocupação urbana e deve resultar em unidades edificáveis, com toda a infraestrutura necessária para uma cidade. O desmembramento voltase para a constituição de unidades que não se enquadrarão como novos espaços a serem integrados na malha urbana; visam fundamentalmente à subdivisão de uma área privada maior em áreas menores, que continuam detidas por particulares para uso privativo. Intervenção do Estado na propriedade 2 b) limitações urbanísticas do Estatuto da Cidade No capitulo anterior foram estudadas limitações administrativas tradicionais, que corresponde à 2ª fase do histórico de evolução dos mecanismos de intervenção na propriedade, descrito no início do capítulo. Agora é hora de falar sobre as limitações urbanísticas contidas no Estatuto da Cidade, que correspondem a um conjunto de institutos que realizam valores maiores, de caráter social e econômico, além do simples planejamento físico viabilizado pelos institutos tradicionais de intervenção na propriedade, como a desapropriação ou o zoneamento. b.1) Plano Diretor: “é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de planejamento urbano.” Trata-se do conjunto de normas que define a função social da propriedade urbana, realizando concretamente as diretrizes da política urbana contida na Constituição Federal, artigos 182 e 183. Por essa razão, “cabe às normas do plano diretor estabelecer os limites, as faculdades, as obrigações e as atividades que devem ser cumpridas pelos particulares referentes ao direito de propriedade.” Assim, pela Constituição Federal é possível dizer que o direito de propriedade não é mais a manifestação da vontade subjetiva do particular, mas sim o dever do detentor da riqueza. O direito de propriedade, portanto, é um direito conformado pela ordem jurídica; seu desenho, sua configuração jurídica não resulta da vontade do particular, mas sim de um conjunto de normas que vão configurando as suas linhas características. Mas, não é pela simples enunciação genérica da função social na Constituição que se poderá ter uma idéia precisa sobre os contornos jurídicos do direito de propriedade. Ora, somente quando se tem um instrumento especifico, como o plano diretor, que define com exatidão os

deveres do particular no exercício de sua propriedade-função, é que se poderá precisar melhor a função social da propriedade. Diretrizes (art. 39 do Estatuto da Cidade) Direito a cidades sustentáveis – significando que todos devem ter pleno acesso (segundo parâmetros de igualdade) aos benefícios da urbanização, ou seja, “direito à terra urbana, moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao transporte e serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações.” Gestão democrática – significando que as atuais práticas de centralização das decisões sobre a cidade apenas nas mãos de prefeitos e vereadores devem superadas. Trata-se de dar plena aplicação ao princípio constitucional da democracia participativa, segundo o qual o cidadão deve participar dos processos de decisão tanto no momento de elaboração do Plano, como na hora da sua aplicação. Isso vai se dar através da realização de audiências públicas, bem como pela criação de Conselhos de Planejamento e Desenvolvimento Urbano, que sempre deverão ter funções deliberativas e não meramente consultivas. Importante destacar que as audiências públicas devem ter um nível de qualidade que garanta efetiva participação, evitando-se as audiências pró-forma, ou seja, eventos mal estruturados, chamados de ultima hora, sem participação efetiva, realizados apenas para não se dizer que o requisito participação popular não foi cumprido. Ordenação e controle do uso do solo – determinar como deve ser o crescimento de uma cidade é função pública, ou seja, determinar como deverá ser o uso solo (e portanto da propriedade urbana) é tarefa que não pode ser deixada a cargo do proprietário e do mercado. Na ordem urbanística brasileira não se permite mais a existência da retenção especulativa de imóveis urbanos, ou seja, não pode mais ser tolerado o fenômeno da especulação imobiliária, com a reserva de terrenos ou propriedades ociosos em meio a áreas densamente ocupadas. Justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do processo de urbanização – urbanizar uma cidade, criar infra-estrutura de serviços públicos, levar redes de tecnologia são tarefas que exigem altíssimos investimentos, que devem ser suportados por todos. De outro lado, a valorização gerada nos imóveis próximos a obras de infra-estrutura não pode ser apropriada por uma pessoa só. Assim como o custo da preservação do patrimônio histórico não pode ser suportado exclusivamente por seu proprietário, a valorização gerada pela instalação de um edifício público não pode ser apropriada exclusivamente pelos proprietários vizinhos. O Plano deve criar mecanismos para que esses ônus e benefícios se compensem, possibilitando assim uma maior capacidade da Administração para investir em cidades sustentáveis. Regularização fundiária e urbanização de áreas ocupadas – as cidades brasileiras são caracterizadas por um enorme contingente populacional que vive em condições desumanas em áreas degradadas. Também é enorme o número de pessoas que vivem sem garantia nenhuma de posse sobre o solo que representa a moradia. Tal situação é a origem de grande parte dos conflitos no meio urbano, gerando uma escalada de violência sem precedentes nas cidades brasileiras. É necessário que os Plano Diretores enfrentem essa realidade e criem mecanismos para sanar essa enorme carência da sociedade brasileira. Procedimento (art. 40 do Estatuto da Cidade) - O Plano diretor é instrumento de intervenção estatal na propriedade. Trata-se de legislação que cria rigorosas limitações ao direito de propriedade, condicionando até mesmo a própria essência desse direito ao determinar as finalidades que uma propriedade deve atingir para que cumpra as suas funções sociais. Quando o plano diretor determina que o terreno vazio em plena avenida marginal deve ser edificado, isso é muito mais que uma simples limitação ao exercício do direito, pois trata-se de definição da destinação última que o imóvel deverá ter, se o particular em questão quiser ter o seu deito de propriedade tutelado pela ordem jurídica. Em sendo assim, o plano diretor deve atender a alguns requisitos no seu processo de elaboração: - deve ser instituído mediante lei municipal (art. 40 caput do Estatuto da Cidade) – somente a lei pode criar restrições a direito fundamental. Assim, quando a Constituição determinou que

a propriedade será um direito fundamental limitado (art. 5º, incisos XXII e XXIII) e estabeleceu que sua função social será definida no plano diretor (art. 182), criou todas as condições para compelir as municipalidades a regularem esse direito, plasmando a sua conformação básica conforme as necessidades locais. Importante destacar que a legislação municipal mal elaborada levará à impossibilidade de imposição de qualquer medida de intervenção na propriedade particular, pois os requisitos constitucionais necessários para dar plena eficácia à norma constitucional limitadora não foram cumpridos, não se podendo assim impor restrição ao direito fundamental do particular. Portanto, uma legislação municipal omissa ou mal elaborada só favorece aos interesses de especuladores e gera insegurança jurídica, pois tal legislação não possibilitará a definição de parâmetros lícitos para a intervenção estatal na propriedade, gerando assim enormes e intermináveis demandas judiciais. - suas disposições são impositivas para a legislação municipal de planejamento (§1º do art. 40 do Estatuto da Cidade) – ou seja, não há como conceber plano plurianual ou orçamento anual, ou qualquer outro dispositivo legislativo que envolva planejamento, sem atenção ao disposto no plano diretor. Por força desse dispositivo, deve-se entender que até mesmo a Planta de Valores dos Imóveis no Município também deve respeitar as disposições do plano diretor. Exemplo é o caso da pessoa que possui imóvel residencial próximo a Avenida de grande valorização comercial. Nesse caso, não pode o valor do imóvel ser majorado excessivamente, eis que o plano diretor define tal imóvel como residencial não cabendo à legislação especifica sobre a plana genérica de valores desnaturar essa função atribuindo valor venal excessivo compatível apenas com a realidade do mercado imobiliário da vizinhança. - as diretrizes de planejamento do plano diretor abrangem toda a extensão da cidade, englobando zona urbana e zona rural, conforme §2º do art. 40 do Estatuto da Cidade. - o plano deve ser revisto a cada 10 anos pelo menos (§3º do art. 40 do Estatuto da Cidade) – o planejamento é um processo dinâmico, que vai mudando de diretriz conforme vai sendo implementado, pois fatores imponderáveis da Sociedade e da Economia atuam na sua implementação, gerando assim a necessidade de constante revisão de suas diretrizes. - participação democrática e plenitude de informação no processo de elaboração do plano (§4º do art. 40 do Estatuto da Cidade) – como o plano diretor reflete a convicção da sociedade sobre a função de cada espaço urbano, é necessário garantir a participação direta dos cidadãos na sua elaboração, não bastando aqui os procedimentos da democracia representativa. Assim, para subsidiar a elaboração do plano diretor é necessário realizar audiências públicas, debates, pesquisas de opinião, propaganda nos meios de comunicação e toda ordem de mecanismo que gere uma participação efetiva do cidadão na laboração do plano. Também é necessário garantir que todas as informações geradas nesse processo de elaboração do plano sejam de amplo conhecimento de todos. Obrigatoriedade (art. 41 do Estatuto da Cidade): O planejamento não é uma faculdade dos Municípios, diante da imposição constitucional contida no art. 182. Assim, municípios com mais de 20 mil habitantes, ou integrantes de regiões metropolitanas ou de áreas de especial interesse turístico devem promover seu planejamento urbano. Nesses casos, o planejamento é definido pela lei e pela constituição como condição para que seja possível a urbanização nesses municípios. A regra expressa sobre a obrigatoriedade do plano diretor está contida no art. 41 do Estatuto da Cidade. Conteúdo (art. 42 do Estatuto da Cidade): O principal objetivo do plano diretor é definir a função social da propriedade, ou seja, a utilidade que a sociedade quer dar para cada área do município. Nesse sentido, para a definição da função social da propriedade, é necessário garantir a participação popular na elaboração do plano, pois é através dela que se identificará a demanda para utilização de cada área na cidade.

No entanto, não é somente pela definição da demanda para utilização da área que se define a função social da propriedade. Há limites determinados pela infraestrutura urbana à definição da função social da propriedade. Deve haver uma relação de proporcionalidade entre a demanda por utilização das áreas e o potencial de desenvolvimento e ocupação que a infraestrutura dessas áreas gera. Assim, a capacidade da infra-estrutura urbana, ao lado da demanda por utilização, será outro critério para definição da função social da propriedade no plano diretor. Exemplo de como a limitação de infra-estrutura pode condicionar a demanda por utilização está na área de preservação de manancial, que não poderá ser ocupada pela implantação de loteamentos de qualquer natureza (industrial, residencial, de chácaras, etc.), pois o adensamento nessas áreas levaria ao exaurimento dos mananciais. Nelson Saule Junior (p. 280-281) cita exemplo bastante aclarador de como seria a definição da função social da propriedade num plano diretor: “vamos supor outro exemplo, em que uma área urbana situada na região do centro da cidade de São Paulo, que tenha grande concentração de imóveis destinados para estacionamentos, prédios, armazéns e galpões fechados ou abandonados. Por outro lado, existe uma demanda social para usar esta área para habitação social destinada à população moradora de cortiços e de rua, bem como uma demanda cultural para destinar parte desses imóveis em centros e espaços culturais, de lazer e de esportes para as crianças, adolescentes e idosos que vivem, trabalham ou freqüentam a região central. Em razão da comprovação desta demanda social e cultural, o plano diretor poderá delimitar esta área urbana como subutilizada, em razão de concentrar prédios, galpões e armazéns fechados, visando destiná-los primordialmente para fins de habitação de interesse social.” Ocorre, no entanto, que a fixação da função social da propriedade não passa apenas pela definição no plano diretor das demandas sociais desejadas para cada área do município. Para que tal definição seja efetiva é necessário indicar também os instrumentos de intervenção que serão utilizados para atingir as finalidades desejadas pela sociedade. Alguns exemplos ajudarão a entender esse ponto: - numa área de grande demanda por adensamento (como nas regiões centrais) em que há muitos imóveis desocupados (como antigas fábricas desativadas, terrenos vazios com estacionamento, antigos hotéis desativados, etc.), será recomendável a utilização de instrumento como a outorga onerosa do direito de construir, as operações urbanas consorciadas, a ordem de parcelamento ou edificação compulsórios, o IPTU Progressivo no tempo e a desapropriação-sanção; - em área de preservação ambiental, a recomendação será pela utilização de instrumentos como a instituição de zonas especiais de interesse ambiental, direito de preempção e a transferência do direito de construir, além das operações urbanas consorciadas. Uma análise rápida da significação de cada um desses instrumentos nos itens a seguir tornará mais simplificado o entendimento desse ponto. b.2) Parcelamento, edificação ou utilização compulsórios (art. 182, § 4º da CF; arts. 5º e 6º do Estatuto da Cidade) – instrumento de planejamento urbano através do qual a Admisnitração constata a não utilização da propriedade em acordo com sua função social e expede ordem determinando prazo para que o particular dê uma destinação ao bem em acordo com o plano diretor. b.3) IPTU progressivo no tempo (art. 182, § 4º da CF; art. 7º do Estatuto da Cidade) – majoração progressiva da alíquota do IPTU com o objetivo de combater a retenção especulativa e a ociosidade do imóvel urbano – regras básicas: o imposto poderá ser majorado durante cinco anos consecutivos; o valor final do imposto majorado não poderá ultrapassar 15% do valor do imóvel. b.4) Desapropriação-sanção (art. 182, § 4º da CF; art. 8º do Estatuto da Cidade) – trata-se de sanção imposta ao particular que insiste em não utilizar sua propriedade em acordo com a função social (mesmo depois da aplicação dos dois institutos anteriores) e que consiste na transferência compulsória do bem ao domínio público, mediante o pagamento em títulos da dívida pública, resgatáveis em até 10 anos.

b.5) Direito de superfície (arts. 21 a 24 do Estatuto da Cidade) – “permite que o proprietário conceda a outra pessoa o direito de utilizar o solo, o subsolo ou o espaço aéreo, por tempo determinado ou indeterminado, respeitada a legislação urbanística.” (Mattos, Liana Portilho. A efetividade..., p. 78) - característica fundamental – separa a nua propriedade do domínio útil, autonomizando-se este último e transformando-o num direito real, que pode ser alienado a terceiros. b.6) Outorga onerosa do direito de construir (arts. 28 a 31 do Estatuto da Cidade) – “também denominado “solo criado”, é o instrumento que permite que o Plano Diretor estabeleça áreas nas quais o direito de construir poderá ser exercido acima do coeficiente de aproveitamento básico, mediante contra6 partida para o Poder Público.” (Mattos, Liana Portilho. p. 79 e 80) Existe um coeficiente de aproveitamento básico, que geralmente é 1 vez a área do terreno, e um limite máximo de construção (variável de acordo com o plano diretor e a infra-estrutura do local) suportável pela infra-estrutura urbana na área onde se situa o imóvel. A outorga vai se dar quando o particular quiser construir mais do que o coeficiente básico de aproveitamento, nunca podendo ultrapassar o limite máximo de construção para a área. b.7) Transferência do direito de construir (art. 35 do Estatuto da Cidade) – “permite que o proprietário de um imóvel urbano, privado ou público, exerça em outro local – ou aliene, se preferir – o seu direito de construir previsto no plano diretor ou em legislação urbanística dele decorrente.” b.8) Direito de preempção ( arts. 25 a 27 do Estatuto da Cidade) – direito de preferência que o Município “para a compra de imóvel urbano, objeto de alienação onerosa entre particulares, desde que situado em área previamente delimitada por lei municipal, assegurado o valor de mercado.” (Liana, p. 79) b.9) Operações urbanas consorciadas (arts. 32 a 34 do Estatuto da Cidade) – “conjuntos de intervenções e medidas coordenadas pelo Município, com vistas a alcançar transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e valorização ambiental em determinada área da cidade.” (Liana, p. 80) b.10) Estudo de impacto de vizinhança (arts. 36 a 38 do Estatuto da Cidade) – instrumento de planejamento urbano pelo qual se prevê que os aspectos positivos e negativos de qualquer novo empreendimento serão contemplados e avaliados mediante elaboração de estudo prévio que servirá como requisito para o proprietário obter licenças ou autorizações de construção, ampliação ou funcionamento. (Liana, p. 81) Os principais aspectos analisados num estudo de impacto de vizinhança são os seguintes: adensamento populacional, equipamentos urbanos e comunitários, valorização imobiliária, geração de tráfego, demanda por transporte, impacto sobre a paisagem e o patrimônio natural e ambiental. Assim, dependendo dos resultados do estudo, determinados empreendimentos poderão ser vetados para uma determinada área da cidade. O plano diretor tem diretrizes sobre a melhor forma de utilizar a propriedade (função social da propriedade) e, quando existe a possibilidade de implementar um empreendimento ou obra de maior impacto numa determinada região, é necessário verificar se esse empreendimento se adéqua às diretrizes do plano diretor. O Estudo de Impacto é utilizado justamente para fazer essa verificação. Para Liana Portilho Mattos (Estatuto da Cidade Comentado, p. 199) o objetivo do Estudo de Impacto de Vizinhança é “democratizar o sistema de tomada de decisões sobre os grandes empreendimentos a serem realizados, consagrando o direito de vizinhança como parte integrante da política urbana e condicionante do direito de propriedade.” b.11) Conselho de desenvolvimento urbano (art. 43, I e art. 2º, II, do Estatuto da Cidade) – órgão administrativo colegiado, com representantes da sociedade civil e do poder público, que tem por função formular e coordenar a implantação de políticas públicas de desenvolvimento urbano. Trata-se de órgão com funções deliberativas e consultivas. Características:

- deve ser criado mediante lei; - tem composição paritária, com membros da Administração e da Sociedade Civil; - é independente do governo, pois não se subordina a ordens dos chefes do Executivo e do Legislativo; - é canal institucional de participação popular, pois suas decisões vinculam a Administração; - deve estar integrado à estrutura da Administração tão somente para fins de suporte material (papéis, equipamentos, arquivos, servidores preparados para assessorar reuniões, etc.); - deve estar ligado a um fundo de planejamento, sobre o qual deverá exercer a direção, bem como supervisionar e fiscalizar os gastos realizados. b.12) ZEIS – Zonas especiais de interesse social (Art. 4º, inciso V, aliena f, do Estatuto da Cidade) – trata-se da delimitação de áreas na cidade, sobre as quais incide um especial interesse público em promover a urbanização, o parcelamento do solo e/ou a regularização jurídica da posse da terra. Nessas zonas, delimitadas pelo Plano Diretor, o Poder Público deverá criar um plano específico de urbanização e estabelecer um padrão urbanístico próprio (adequado ao contexto físico e social da área) para o assentamento. Para entender as zonas especiais de interesse social, é necessária a compreensão de dois outros conceitos correlatos: Plano de urbanização – visa articular investimentos públicos e privados na construção de habitação popular e infra-estrutura urbana. Também é função do plano de urbanização a criação de mecanismos de regularização fundiária e de participação popular no planejamento e implementação da zona especial; Padrão urbanístico próprio – significa que as regras sobre planejamento e uso do solo são diferentes nessas zonas. Dessa forma, a ocupação da área se adéqua à realidade da população e impede a apropriação da área pelo capital econômico do setor imobiliário. SERVIDORES PÚBLICOS 1) Noção geral e classificação dos agentes públicos O Estado não tem uma existência concreta, pois trata-se de uma criação jurídica abstrata, necessitando de processos, pessoas e estruturas que possam criar e desencadear sua “vontade” concretamente. As pessoas físicas que falam em nome do Estado, manifestando concretamente a sua “vontade” são os agentes públicos. Esses agentes públicos, como falam em nome do Estado, não podem deixar que sua vontade particular interfira no múnus publico que desempenham em nome de toda a Sociedade. Dessa forma, para garantir isenção na atuação desses agentes, suas relações de trabalho com o Estado devem ser reguladas de maneira especial, diferente da regulação estabelecida para as relações que qualquer trabalhador da iniciativa privada mantém com seus empregadores. Obviamente, as funções que o Estado assume são muitas. Há funções políticas, diplomáticas, técnico-administrativas, de prestação de serviços, de intervenção no domínio econômico, etc. Assim, o regime funcional dos agentes públicos não pode ser o mesmo para todos aqueles que desempenham tão variadas funções. Daí, a doutrina criou uma classificação dos agentes públicos em várias categorias, conforme os diferentes regimes jurídicos de suas funções públicas. Veja-se o quadro:

Agentes públicos – toda pessoa física que presta serviços ao Estado e às pessoas jurídicas da Administração Indireta, manifestando concretamente a vontade do Estado quer integre ou não a burocracia estatal. Agentes políticos – são os formadores da vontade superior do Estado, pois determinam os fins da ação estatal e fixam diretrizes de ação para o s ocupantes das outras funções públicas. Para Helly Lopes Meirelles (p. 75) “são os componentes do governo nos seus primeiros escalões, investidos em cargos, funções, mandatos ou comissões por nomeação, eleição, designação ou delegação para o exercício de atribuições constitucionais.” Trata-se, portanto, de conceito amplo, que engloba toda a autoridade que atua com independência funcional no desempenho de funções definidas diretamente na Constituição. Nessa definição ampla ficam englobados os magistrados, porque exercem uma das funções de Soberania do Estado e também os membros do Ministério Público, porque exercem funções de controle sobre o governo e a Administração, conforme definição constitucional. Para Celso Antonio Bandeira de Mello (p. 229, edição 2004) “são os titulares dos cargos estruturais à organização política do País, isto é, são os ocupantes dos cargos que compõem o arcabouço constitucional do Estado e, portanto, o esquema fundamental do poder.” Já esse conceito é mais restrito, englobando somente os mandatários da soberania popular no regime democrático-representativo – Presidente e ministros, governador e secretários, prefeito e secretários, deputados, senadores e vereadores. Servidores públicos ou servidores estatais (em sentido amplo) – “pessoas físicas que prestam serviços técnico profissionais ao Estado e às entidades da Administração Indireta, com vínculo empregatício e mediante remuneração paga peloscofres públicos.” Dividem-se em e 3 sub grupos: a) Servidores estatutários – são os ocupantes de cargos públicos, que mantém uma relação institucional (ou estatutária) com a Administração, tal como prevista em lei própria, não podendo, portanto, haver alteração do regime jurídico desses servidores por manifestação de vontade (quer da Adminstração, quer do próprio servidor). Algumas notas importantes e mais gerais sobre os servidores estatutários: - Importante destacar aqui que cada pessoa coletiva (União, Estados, Municípios, autarquias) podem ter seu próprio quadro de servidores, com estatuto (ou regulação) próprio, bastando

para tanto obedecer a ordenação constitucional sobre a matéria. Não há uma norma geral sobre servidores públicos, como ocorre com o tema das licitações e contratos. - Nos termos do art. 247 da CF, devem submeter-se obrigatoriamente ao regime estatutário todos os servidores que desenvolvam atividades exclusivas de Estado, o que abrange os seguintes quadros de servidores: magistratura, ministério público, tribunais de contas, advocacia pública, defensoria pública, polícias civil e militar, atividades administrativas de controle, fiscalização, diplomacia e regulação. b) Empregados públicos (ou servidores empregados) – servidores cuja relação funcional com a Administração é regulada pela CLT, com as alterações determinadas nos arts. 37 e seguintes da CF, principalmente no que tange a requisitos para investidura (concurso), acumulação de cargos e vencimentos, estabilidade, etc. Não é permitido a Estados e Municípios criarem regimes diferenciados de emprego público para seus servidores, pois a legislação em matéria de dir. do trabalho é de competência exclusiva da União (art. 22, I da CF). Para a União algumas regras especiais foram criadas para seus servidores empregados, no âmbito da Lei nº 9962/2000. c) Servidores temporários – pessoas contratadas por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público, nos termos do art. 37, IX da CF e desde que haja legislação especifica no âmbito da pessoa coletiva pública. Na União são regulados pela Lei nº 8745/93, alterada pelas Leis 9849/1999 e 10667/2003. Esses servidores exercem funções não aglutinadas em qualquer espécie de cargo ou emprego. Particulares em colaboração com a Administração – “pessoas físicas que prestam serviços ao Estado, sem vínculo empregatício, com ou sem remuneração.” (Di Pietro, p. 449) Necessário esclarecer aqui que o termo “vínculo empregatício” usado na definição da autora não é no sentido de vinculo celetista, mas sim no sentido de vínculo funcional com a Administração, significando ai que a pessoa não se subordina ao comando direto da administração para desempenha suas atividades a serviço da Administração. A colaboração com a Administração pode se dar por delegação do poder público, nos casos dos empregados das concessionárias e permissionárias de serviços, dos serviços notariais e de registros, dos leiloeiros, dos tradutores e interpretes. Também pode se dar colaboração mediante requisição, nomeação ou designação, como nos casos dos jurados, convocados para prestar serviço militar ou eleitoral, integrantes de comissões e grupos de trabalhos. Militares – pessoas físicas que prestam serviços às forças armadas e às polícias militares e corpos de bombeiros dos Estados, sob vínculo estatutário, com regime jurídico distinto dos servidores, especialmente no que diz respeito ao estatuto disciplinar mais rigoroso. Previsão constitucional nos arts. 42 e 142. Servidores (das) estatais – pessoas que prestam serviços para entidades da Administração Indireta. Podem ser subdivididos em empregados públicos, que se vinculam a autarquias e fundações de direito público e em empregados governamentais, vinculados a sociedades de economia mista, empresas públicas, fundações privadas instituídas pelo Poder Público e agências reguladoras. 2) Regime jurídico dos servidores públicos Tal como visto na classificação acima, é possível identificar para os servidores públicos 3 tipos de vínculos que os relacionam com a Administração: o vínculo de cargo, o de emprego e o de função sem cargo (para os temporários e ocupantes de funções comissionadas). Antes de ingressar no exame do regime estatutário dos ocupantes de cargos públicos, que o principal objetivo do presente capitulo, necessário se faz estabelecer uma breve distinção entre esses 3 tipos de vínculos entre os servidores e a Administração Pública. CARGO – “é o conjunto de atribuições e responsabilidades cometidas a um servidor, criado por lei, em número certo, com denominação própria e remunerado pelos cofres públicos.” São características fundamentais desse conceito de cargo: a)denominação própria,

b)atribuição de funções públicas específicas, c)padrão de vencimento e d)organização em sistema de classes e carreiras. Todas essas características são definidas na lei que cria o cargo. Dessa forma, o regime de cargos é bastante estático e burocratizado. Assim deve ser, pois a principal função desse regime é garantir estabilidade funcional e isenção para os que desempenham funções públicas. Portanto, o regime que regula a relação entre o titular de cargo e o Estado é denominado regime estatutário ou institucional. Trata-se de regime jurídico que não depende da vontade das partes envolvidas na relação jurídica, mas sim de disposições legais e constitucionais que conformam de fora a forma como se dará a prestação de serviços para a Administração. Nesse regime são criadas proteções e garantias necessárias para o desempenho técnico, imparcial e obediente à diretrizes político-administratrivas superiores da Administração. A finalidade desse regime é garantir uma ação impessoal do Estado, contra as contingências do regime republicano de governos transitórios. Para os servidores da União, o Estatuto é a Lei nº 8112/90. A estrutura de organização dos cargos dentro da Administração ajuda a elucidar esse caráter estatutário do regime de cargos. Como já se disse logo acima, os cargos se organizam em classes e carreiras. Carreira é o “conjunto de classes da mesma natureza de trabalho, escalonadas segundo a responsabilidade e a complexidade de atribuições”. Classe é o “agrupamento de cargos da mesma denominação e idênticas referencias de vencimentos” (Odete Medauar, p. 266) Exemplo: art. 20 da Lei Complementar nº 73/93 Carreira de Advogado da União. Classes: Inicial – composta pelos cargos de Advogado da União de 2ª Categoria; Intermediária – cargos de Advogado da União de 1ª Categoria; Final – cargos de Advogado da União de Categoria Especial As atribuições do cargo estão elencadas no art. 11 e consistem basicamente em assessorar e elaborar estudos jurídicos para autoridades da Administração Pública. EMPREGO PÚBLICO – unidade de atribuições exercidas pelo agente em nome do Estado, através de vinculo contratual sob regência da CLT. No regime de emprego não há a hierarquização característica da estrutura de carreira. Dessa forma, o regime de emprego público é mais dinâmico e se adéqua ao exercício de funções subalternas e instrumentais da Administração, que não se revestem de carga coercitiva típica dos poderes do Estado. FUNÇÃO – conjunto de atribuições públicas exercidas sem vínculo de cargo ou emprego com a Administração. Trata-se de conceito residual, que decorre dos incisos IX e V do art. 37 da CF. No regime da Constituição de 1998, há dois tipos de funções sem cargo que podem ser exercidas por um servidor: a) as funções exercidas pelos servidores temporários, nos termos do art. 37, IX da CF, para tratar de necessidades urgentes da Administração; b) as funções de confiança para direção, chefia e assessoramento, nos termos do art. 37, V da CF, exercidas por servidores ocupantes de cargos efetivos. Neste caso, o servidor que exerce estas funções já é servidor de carreira e assume algumas funções destacadas de seu cargo, consistentes em dirigir uma seção da Administração, chefiar um conjunto de servidores ocupantes de cargos assemelhados ou mesmo assessorar a direção superior da Administração. Importante não confundir função de confiança (ou comissionada) com cargo de confiança (ou em comissão). A função comissionada reúne as tarefas de coordenação, direção ou chefia, que alguns servidores devem assumir para organizar de forma mais racional o trabalho de seus pares na estrutura administrativa (previsão constitucional no inciso V do art. 37). Já o cargo em comissão tem uma individualidade própria, configurando um conjunto de

atribuições diferenciadas que podem ser exercidas por pessoas não integrantes dos quadros da administração (previsão constitucional no inciso II, do art. 37). Para distinguir claramente essas duas categorias, seguem os exemplos de cargos em comissão: assessores parlamentares (vereadores, deputados, senadores), diretores do Banco Central, diretores de Agencias Reguladores. Enfim, agora, passa-se às características mais fundamentais do regime jurídico dos servidores estatutários na ordem jurídica brasileira. a) Condições para ingresso Concurso público (conforme art. 37, II, da CF) é a regra para ingresso de qualquer servidor na administração, não só para os ocupantes de cargo, mas também para os celetistas. Trata-se de regra diretamente vinculada ao princípio republicano, que exige transparência e impessoalidade no comando da Administração Pública, daí explicando-se a sua abrangência também para os servidores empregados. Assim, o concurso não é uma particularidade do regime de cargos públicos; é uma exigência de impessoalidade na seleção daqueles que prestarão serviços para a Administração, sob qualquer regime funcional que venham a assumir. Exceções à regra do concurso: servidores temporários (art. 37, IX da CF); cargos em comissão (art. 37, II da CF) e membros dos Tribunais no preenchimento do quinto constitucional. Forma de ingresso dos servidores – Provimento, que significa ato administrativo através do qual a pessoa é investida no exercício de cargo, emprego ou função. O provimento de servidores estatutários assume algumas peculiaridades que permitem classificá-lo em alguns tipos especiais de provimento, conforme a tabela abaixo:

O provimento originário é o ato administrativo que vincula inicialmente o servidor ao cargo, emprego ou função. Será uma nomeação para os cargos efetivos e para os comissionados. Será uma contratação para os casos de empregos público. Provimento derivado é ato administrativo de investidura em cargo, que depende de vínculo anterior do servidor com a Administração. Poderá ser: Promoção (ou acesso) “que é a forma de provimento pela qual o servidor passa para cargo de maior grau de responsabilidade e maior complexidade de atribuições, dentro da carreira a que pertence.” (Di Pietro, p. 570) Reintegração (ou recondução) – caso em que sentença judicial o ato administrativo constata nulidade de ato de demissão de servidor e determina que este seja reinvestido no cargo que ocupava anteriormente. Trata-se de demissão ilegal do servidor, que gera para a administração a obrigação de recompor integralmente o patrimônio deste. Aproveitamento – caso do servidor efetivo colocado em disponibilidade por extinção do cargo é reinvestido em outro cargo de atribuições semelhantes ou equivalentes.

Reversão – hipótese em que o servidor aposentado retorna à ativa, em razão de ter cessado a sua aposentadoria. Um caso comum de utilização da reversão é a hipótese de servidor que cometeu ilícito e se aposenta para escapar da punição. Nesse caso, assim que o ilícito é apurado, a aposentadoria é revertida e o servidor volta à ativa para sofrer a pena cominada. Importante destacar que algumas figuras não existem mais; é o casos da transposição (ou ascensão), hipótese em que o servidor passa de um cargo a outro de conteúdo diverso, mediante concurso interno não aberto ao público em geral (ex. oficial de justiça que presta concurso interno para juiz); e também o caso da readmissão, que é ato discricionário pelo qual o servidor exonerado ou demitido é reinvestido no serviço público. Mas o provimento também pode ser classificado quanto ao tipo de estabilidade que gera para o servidor em: Efetivo “é o que se faz para investidura em cargo público, mediante concurso, assegurando ao servidor direito à permanência no cargo após estágio probatório. Nesse caso, destituição só ocorre mediante sentença judicial, processo disciplinar revestido de ampla defesa ou reprovação em procedimento de avaliação periódica de desempenho.” (Di Pietro, p. 573) Vitalício “é o que se faz para investidura em cargo público constitucionalmente definido como vitalício, assegurando-se ao servidor direito à permanência no cargo, do qual só poderá ser destituído mediante sentença judicial.” (Di Pietro, p. 573) A estabilidade no regime de provimento vitalício é maior do que no do efetivo. O provimento vitalício não é perpétuo, pois admite aposentadoria, inclusive a compulsória aos 70 anos. Outra diferença está em que o provimento vitalício admite nomeação sem concurso prévio, como nos casos de ingresso de membros da magistratura no quinto constitucional (esse entendimento decorre da inteligência do art. 84, XIV e XVI da CF). Em Comissão – “é o que se faz mediante nomeação para cargo público, independentemente de concurso e em caráter transitório. Somente é possível com relação aos cargos que a lei declara de provimento em comissão.” (Di Pietro, p. 573- 574) b) Estabilidade (caput do art. 41 da CF) “Garantia de permanência no serviço público assegurada após 3 anos de exercício, ao servidor nomeado por concurso, que somente pode perder o cargo em virtude de sentença judicial transitada em julgado ou mediante processo administrativo em que lhe seja assegurada ampla defesa.” (Di Pietro, p. 561) Características: - privativa para servidores ocupantes de cargos em provimento efetivo; - adquirida após 3 anos de exercício do cargo; - estágio probatório é o período de 3 anos no qual o servidor é submetido a avaliação de desempenho e após o qual adquire o direito à estabilidade; - nos termos do art. 41, §§ 2º e 3º da CF, a estabilidade confere os seguintes direitos: reintegração (reingresso do servidor demitido, em caso de nulidade do ato de demissão, invalidade por sentença judicial), disponibilidade (garantia de inatividade remunerada em caso de extinção do cargo) e aproveitamento (forma de nomeação derivada, tal como visto acima). Mas, a estabilidade não é uma garantia absoluta, pois admite casos de perda do cargo, mesmo estando o servidor estabilizado: a) Sentença judicial transitada em julgado, na qual se apura falta grave punível com demissão (art. 41, § 1º, I da CF); b) Processo administrativo disciplinar em que se garanta ampla defesa ao servidor (art. 41, § 1º, II da CF); c) Procedimento administrativo de avaliação de desempenho, conforme estabelecido em lei (do ente publico em questão, União, Estado ou Município), que deve fixar os critérios de produtividade, avaliação de desempenho e assegurar ao servidor ampla defesa nesse processo de avaliação (art. 41, § 1º, III da CF);

d) Descumprimento do limite de despesa com pessoal da Administração, conforme disposto no art. 169, § 4º da CF. Nos termos do art. 19 da Lei Complementar nº 101/2000 (Responsabilidade Fiscal), o limite, sobre a receita líquida, é de 50% para a União e 60% para Estados e Municípios. Importante destacar que a estabilidade pode ser ordinária, tal como vista neste item, ou extraordinária, tal como prevista no art. 19 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. A estabilidade extraordinária é prevista para os servidores que, quando da promulgação da constituição de 1988, prestavam serviço para administração há pelo menos 5 anos sem terem ingressado mediante concurso público. O fato de esses servidores possuírem estabilidade extraordinária não significa que tenham sido convertidos em servidores efetivos. Assim, se esses servidores já trabalhavam sob regime celetista, vão continuar sendo regidos pela CLT, porém com a estabilidade trazida pela Constituição. c) Sistema remuneratório - Atualmente, na ordem jurídica brasileira vigoram dois regimes de estipêndio dos servidores públicos: o regime de remuneração/vencimento e o regime de subsídio. O regime de remuneração ou vencimento é “definido por uma parte fixa, representada pelo padrão fixado em lei e uma parte variável de um servidor para outro em função de condições especiais de prestação de serviço, em razão de tempo de serviço e outras circunstâncias denominadas vantagens pecuniárias.” (Di Pietro, p. 503-504) A parte fixa é mais propriamente denominada vencimento e corresponde ao padrão fixado em lei para retribuição efetiva do exercício do cargo. Nesse sistema de estipêndio, a remuneração vai corresponder ao vencimento acrescido de todas as vantagens pecuniárias que, por sua vez, são a parte variável do estipêndio do servidor. As vantagens pecuniárias podem assim classificadas:

Adicionais por tempo de serviço são acréscimos aos vencimentos básicos que decorrem do tempo de exercício do cargo. Os exemplos mais comumente encontrados são (conforme art. 129 da Constituição de SP): qüinqüênio (adquirido a cada 5 anos de efetivo exercício do cargo) e a sexta parte (que corresponde à sexta parte dos vencimentos integrais para cada 20 anos de exercício do cago). Adicionais de função são vantagens que decorrem da natureza especial da função exercida ou de regime especial de trabalho. Exemplos: adicional pelo magistério em nível superior; adicional por dedicação integral à docência e pesquisa nas universidades públicas; adicional pelo exercício de função perigosa. Gratificações de serviço são vantagens pecuniárias pagas em razão de condições anormais temporárias em que o serviço é prestado. Exemplos: gratificação por função de representação; gratificação de insalubridade, risco de vida ou saúde.

Gratificações pessoais são vantagens que decorrem de situações pessoais eventuais e/ou ocasionais relacionadas ao servidor, como, por exemplo, o salário esposa ou salário família. Em regra, as gratificações não se incorporam à remuneração do servidor e são devidas somente enquanto duram as condições especiais que lhes deram causa. Os adicionais, por sua vez tendem a incorporar-se à remuneração, pois referem-se a circunstâncias permanentes que envolvem o trabalho do servidor. No entanto, pode haver estatutos que prevejam a incorporação permanente das gratificações, conforme atendidas determinadas circunstâncias. Isso vai depender de disposição expressa do regime do servidor de cada ente público. Uma última informação quanto ao regime de vencimentos: nos termos do art. 100, § 1º A da Constituição, os vencimentos do servidor público têm caráter alimentar e não são, portanto, suscetíveis de penhora, arresto ou seqüestro, nos termos do CPC arts. 649, IV; 821 e 823. Já o regime de subsídio estabelece que os estipêndios do servidor serão “importância paga em parcela única pelo Estado a determinadas categorias de agentes públicos como retribuição pelos serviços prestados.” (Di Pietro, p. 508) Características: - previsão no art. 39, § 4º da CF; - o estipêndio do servidor é composto de parcela única, o que impede o acréscimo de qualquer espécie de vantagem pecuniária, como adicionais, gratificações, abonos ou prêmios; - o sistema de subsídio admite o pagamento de retribuições de caráter indenizatório como as diárias e ajudas de custo; - para o sistema de subsídio ser implantado em determinado ente público, dependerá de lei específica da pessoa coletiva em questão, mas será obrigatório desde a promulgação da Constituição para os agentes elencados no seu art. 39, § 4º; - assim, o subsídio será obrigatório para os seguintes agentes públicos: membro de Poder; detentor de mandato eletivo; Ministros e Secretários (estaduais e municipais); membros do Ministério Público (art. 128, § 5º, I, c, da CF); integrantes da Advocacia Geral da União, Procuradores de estado e Defensores Públicos (art. 135 da CF); Ministros do Tribunal de Contas da União (art. 73, § 3º da CF); servidores policiais (art. 144, § 9º da CF); - cada classe de cargos terá um subsídio diferente fixado em lei, conforme os parâmetros do art. 39, § 1º da CF. d) Regras constitucionais básicas para fixação dos estipêndios dos servidores - não há mais isonomia entre servidores de diferentes poderes do Estado com atribuições iguais ou assemelhadas, tal como previa a redação original do art. 39, § 1º da Constituição; - também não há mais isonomia entre proventos e pensões e os estipêndios dos servidores na ativa (exceto os casos de direito adquirido, conforme alteração trazida pela Emenda Constitucional nº 41 aos §§ 7º e 8º do art. 40 da Constituição); - nos termos do inciso X do art. 37 da CF, os valores de vencimentos e subsídios só podem ser alterados mediante lei; - também nos termos do inciso X do art. 37 da CF, os servidores têm direito a revisão anual de seus estipêndios, segundo um mesmo índice, na excluindo-se a possibilidade de alteração, que só poderá se efetivar mediante lei, conforme esclarecido no item anterior; - é vedada a vinculação ou equiparação de quaisquer espécies remuneratórios entre si ou em relação a salário mínimo ou qualquer outro índice, exceto os casos taxativamente previstos no texto constitucional, como o art. 37, inciso XI. Previsão dessa regra contida no art. 37, XIII da CF; - o teto máximo de remuneração é o subsídio mensal do ministro do STF (para todo o Brasil, não importando se o regime é estatutário ou celetista ou se o servidor está ligado a autarquia ou fundação). Regra contida no inciso XI do art. 37 da CF. A competência para fixação do

subsídio do Ministro do STF é do Congresso Nacional, com sanção do Presidente, conforme disposto no art. 48, XV da CF; - Senadores, Deputados Federais, Presidente, Vice-Presidente e Ministros terão seus subsídios fixados em lei pelo Congresso, sem sanção do Presidente (art. 49 da CF); - nos Estados o teto remuneratório é o subsidio do Governador do Estado, para os servidores integrantes do Poder Executivo, conforme disposição conjugada do art. 28, § 2º com o art. 37, XI, ambos da CF; - para os poderes legislativos estaduais, o teto será o subsídio do Deputado Estadual, limitado a 75% do subsidio do Deputado Federal, conforme disposição conjugada do art. 27, § 2º com o art. 37, XI, ambos da CF; - para o judiciário estadual (e também Min. Público, Procuradores e Defensores), o teto é o subsídio do Desembargador, que por sua vez será fixado entre 90% e 95% do subsidio de Ministro dos Tribunais Superiores. Conforme interpretação conjugada do art. 93, V com o art. 37, XI, ambos da CF; - nos municípios, o subsídio do Prefeito é o teto dos estipêndios do Executivo, devendo ser fixado pela Câmara Legislativa Municipal, nos termos do art. 29, V, em conjugação com o art. 37, XI, ambos da CF. Para o Legislativo municipal, o teto é o subsídio do vereador, que varia conforme a dimensão do Município, nos termos do art. 29, VI, conjugado com o art. 37, XI, ambos da CF. - conforme disposição do art. 37, § 9º, as regras sobre teto de estipêndios também são válidas para Sociedades de Economia Mista e Empresas Públicas, desde que recebam recursos públicos. e) Acumulação de cargos. Nesse caso a regra é a proibição da acumulação remunerada, nos termos do art. 37, inciso XVI da CF, que excepciona apenas três casos: a) dois cargos de professor; b) um cargo de professor e um cargo técnico ou científico; c) dois cargos ou empregos de profissionais da saúde, quando se tratar de profissão regulamentada. Mesmo nos casos de acumulação permitida, deverá haver compatibilidade de horários. O dispositivo incide sobre qualquer espécie de acumulação, quer se trate de cargo, ou de emprego ou ainda de função não enucleada em cargo ou emprego. A proibição de acumulação também se estende aos casos de servidores que acumulam vencimentos da ativa com proventos de aposentadoria, conforme disposto no § 10º do art. 37 da CF. As exceções a essa regra estão contidas no mesmo § 10º do art. 37 e são seguintes: casos de acumulação permitida contidos nas letras do inciso XVI do art. 37; o cargos eletivos; e os cargos em comissão. Mesmo havendo acumulação permitida, o teto do art. 37, XI, da CF deverá ser respeitado da mesma forma. f) Direitos trabalhistas estendidos aos servidores (art. 39, § 3º da CF) Alguns direitos previstos no art. 7º da CF foram incorporados ao regime estatutário de todos os servidores públicos, conforme disposição do art. 39, § 3º da CF. São eles: salário mínimo; 13º salário; remuneração superior do trabalho noturno; salário-família; jornada semanal de, no máximo, 44 hs; repouso semanal remunerado; remuneração do serviço extraordinário superior em 50%; férias anuais com 1/3 a mais de remuneração; licença gestante; licença paternidade; prevenção de acidentes de trabalho e proibição de toda espécie de discriminação, quer no exercício de função, quer na admissão. Quanto ao direito assinalado por último, necessário esclarecer que a Constituição estabelece a regra da não discriminação, mas restringe expressamente esse direito, ao consentir limitações nos critérios de admissão de servidores conforme a natureza do cargo o exigir (final do §3º do art. 39 da CF). g) Responsabilidade dos servidores O servidor público está adstrito a um regime disciplinar mais rigoroso que lhe acarreta deveres mais exigentes do que aqueles previstos para os

trabalhadores da iniciativa privada. A razão da existência desses deveres diferenciados é obvia e decorre do fato do servidor estar encarregado de atuar em proveito do interesse público. A doutrina enumera os deveres mais comuns a corgo do servidor: a) desempenhar as atribuições do cargo ou função, que são deveres (muito mais do que poderes), relacionados a princípios fundamentais como continuidade do serviço ou a supremacia do interesse público sobre o privado; b) honestidade ou probidade; c)lealdade ou fidelidade; d) dever de obediência; e) dever de sigilo profissional; f) dever de assiduidade; g) dever de urbanidade. Em sendo assim, quando o servidor cometer condutas desviantes dos deveres assinalados em seus estatutos e na legislação será submetido a responsabilização em pelo menos 4 áreas distintas: penal, civil, administrativa e fiscal. A responsabilidade penal é ofensa mais grave, que afeta interesses da sociedade como um todo, sendo tais interesses qualificados pela legislação com penalmente relevantes. Nesse caso, a conduta ofensiva do servidor será denominada crime funcional. Alguns ilícitos penais são bastante peculiares à atividade da Administração Pública, como por exemplo: o abuso de autoridade, conforme condutas tipificadas na Lei 4898/65; os crimes funcionais tradicionalmente previstos nos arts. 312 a 326 do Código Penal e os crimes contra as finanças públicas previstos nos arts. 359-A a 359-H do Código Penal, acrescidos pela Lei 10028/2000; os crimes em matéria de licitações e contratos, tal como previstos na Lei 8666/93; os crimes de responsabilidade dos agentes políticos, tal como previstos na Lei 1079/50. A responsabilidade civil diz respeito aos danos (de ordem patrimonial, em regra) que o servidor tenha causado à Administração. Nesse caso será necessário que a Administração comprove a conduta dolosa ou culposa do servidor e o nexo de causalidade em relação ao dano apurado. A responsabilização poderá decorrer tanto dos danos causados diretamente à Administração, quanto daqueles causados a terceiros, que a Administração tenha reparado em razão de sua responsabilidade objetiva. Uma das principais fontes de responsabilidade civil do servidor são os delitos de improbidade administrativa, conforme previstos na Lei 8429/92, arts. 9º a 11. Claro que a improbidade administrativa na se resume à responsabilidade de ordem civil, pois abrange conseqüência também nas esferas penal e administrativa. De qualquer forma, na esfera civil, as conseqüências para o agente público ímprobo poderão ser da seguinte ordem: em sede cautelar, o seqüestro de bens, o bloqueio de bens, contas bancários e aplicações financeiras no exterior; e em sede de decisão de mérito, a reparação do dano, a perda de bens e a reversão de bens em proveito da Administração prejudicada. A responsabilidade administrativa “expressa as conseqüências acarretadas ao servidor pelo descumprimento dos deveres e inobservância das proibições, de caráter funcional, estabelecidas nos estatutos ou em outras leis.” (Odete Medauar, p. 301) Tal como já dito anteriormente, cada ente público pode ter um estatuto próprio de seus servidores. Quando o servidor descumpre o regramento desse estatuto, do código de ética da administração em questão ou compromete o interesse público a seu cargo, violando qualquer disposição legal, estará praticando falta funcional (ou infração disciplinar ou infração funcional). Nesse caso, a justa expectativa do cidadão de que a Administração está cuidando bem do interesse público será frustrada, caracterizandose assim a responsabilização na esfera administrativa. Neste caso, os servidores deverão submeter-se a sanções disciplinares, tais como advertência, suspensão, demissão e cassação de aposentadoria ou disponibilidade.

A responsabilidade fiscal define-se a partir da necessidade de se obter um rigoroso equilíbrio nas contas públicas, de maneira que haja sempre um completo e transparente planejamento das despesas da Administração. Trata-se de uma decorrência da Lei Complementar nº 101/200, a Lei de Responsabilidade Fiscal. A responsabilidade fiscal não é propriamente autonomizada em relação aos outros tipos de responsabilidade do agente público; ela traz exigências a mais (o equilíbrio fiscal), que fomentam os outros tipos de responsabilidade. Nesse sentido, a Lei 10028/2000, em seu art. 5º introduziu novos deveres (aos quais se ligam infrações) administrativos, unicamente relacionadas à matéria fiscal, tal como se segue: “I – deixar de divulgar ou de enviar ao Poder Legislativo e ao Tribunal de Contas o relatório de gestão fiscal, nos prazos e condições estabelecidos em lei; II – propor lei de diretrizes orçamentárias anual que não contenha as metas fiscais na forma da lei; III – deixar de expedir ato determinando limitação de empenho e movimentação financeira, nos casos e condições estabelecidos em lei; IV – deixar de ordenar ou de promover, na forma e nos prazos da lei, a execução de medida para a redução do montante da despesa total com pessoal que houver excedido a repartição por Poder do limite máximo.” h) Regime disciplinar e processo disciplinar Prioritariamente, o que interessa aqui é enfocar a responsabilidade de caráter administrativo, que será apurada mediante a constatação de violação ao regime disciplinar do servidor, apurada através de processo administrativo disciplinar. Para Odete Medauar, tem-se aí o exercício de um poder disciplinar pela Administração, definido como “atividade administrativa, regida pelo direito administrativo, segundo normas do processo administrativo; visa à punição de condutas qualificadas em estatutos e lei, como infrações funcionais; tem a finalidade de preservar, de modo imediato, a ordem interna do serviço, para que as atividades do órgão possam ser exercidas sem perturbação e sem desvirtuamentos, dentro da legalidade e da lisura.” (p. 302) Como se viu acima, os deveres a que o servidor público está adstrito são bastante genéricos. As condutas que podem violar esses deveres e causar enormes prejuízos ao interesse público são infinitas. Independentemente desse contexto de dificuldades, o poder disciplinar deve coibir com eficiência a conduta infracional do servidor. Dessa forma, fica aqui uma questão: como poderia o poder disciplinar ser exercido de forma eficiente dentro dos parâmetros rigorosos da legalidade para a Administração? Seria possível “importar” os princípios do direito penal para a seara disciplinar da Administração Pública? A resposta a essas questões está na superação da visa o tradicional de processos disciplinares com grande dose de discricionariedade, o que acaba por resultar em processos disciplinares arbitrários, com liberdade plena para o administrador fazer o que bem entende. De um lado, é necessário que se garanta nos processos disciplinares a ampla defesa como garantia fundamental do servidor. De outro lado, também é necessário que as decisões do administrador processante sejam sempre fundamentadas e pautadas em juízo verificável de forma objetiva. Para Odete Medauar (p. 304), “ante esse contexto, ainda que o operador do poder disciplinar se defronte com fórmulas vagas, inseridas em estatuto ou lei orgânica, deve pautar sue juízo por parâmetros objetivos para enquadrar a conduta do agente em tais fórmulas, dentre os quais: vínculo com a função, adequada qualificação jurídica dos fatos, repercussão da conduta na prestação do serviço, o conjunto do comportamento funcional do agente.” Portanto a chave para solução do problema está na procedimentalização da atividade disciplinar, de maneira a garantir ampla defesa do servidor e ao mesmo tempo dirigir a discricionariedade do administrador fazendo com esta deixe de ser arbítrio e passe a ser decisão fundamentada em razões objetivamente verificáveis. Quanto às sanções a serem aplicadas pelo administrador, haverá necessidade de previsão expressa no estatuto disciplinar, sendo imprescindível que a lei relacione a sanção à conduta tipificada. O administrador, portanto não pode criar modalidades punitivas novas, nem

relacionar entre si as modalidades existentes. As principais sanções disciplinares previstas nos estatutos são as seguintes 1) Advertência ou repreensão – “previstas para faltas leves, são aplicadas por escrito; podem repercutir na avaliação de desempenho para fins de promoção;” 2) Suspensão – “significa o não exercício das atribuições funcionais por um certo tempo, sem percepção de vencimentos;” 3) Demissão – “consiste na perda do cargo ou função em virtude de infração funcional grave; é a pena aplicado nos casos de: abandono de cargo, por faltas consecutivas por 30 ou mais dias; inassiduidade habitual por faltas interpoladas, em geral 60 por ano; corrupção; aplicação irregular de dinheiros públicos; acumulação ilegal de cargos, funções ou empregos públicos; alguns estatutos prevêem a demissão a bem do serviço público, para algumas infrações a que outros cominam a demissão;” 4) Cassação de aposentadoria ou disponibilidade – “é a extinção da aposentadoria ou da disponibilidade, acarretando o retorno (reversão) do servidor à atividade, para que posse ser aplicada a pena de demissão; tal ocorre quando, em atividade, o servidor cometeu falta grave, verificada depois de ato de aposentadoria ou disponibilidade.”

Related Documents

Admin
June 2020 30
Admin
November 2019 57
Admin
May 2020 49
Admin
December 2019 59
Admin
May 2020 26
Admin
April 2020 42