ESTADO DE MINAS - DOMINGO, 14 DE MARÇO DE 2004
PÁGINA 27
GERAIS
❚ AVANÇO DO CRIME
❚ DRAMA
Promotora cobra Adolescente ferido ação do Judiciário BOMBEIRO TAMBÉM É BALEADO E MORRE EM CASA DE SHOWS, DURANTE UMA BRIGA
Diante de um cenário de violância, onde a população demonstra estar cada vez mais atemorizada e a polícia despreparada, a promotora carioca Flávia Ferrer parece ter encontrado uma solução para envolver outros segmentos da sociedade no combate à violência. Ela acaba de defender uma tese de mestrado na Universidade Estácio de Sá, lembrando que a segurança é direito fundamental do cidadão e indicando o Judiciário como o responsável por intervir quando necessário. Isso significa que, quando falta policial ou quando uma área está mal iluminada, os juízes precisam obrigar prefeitos e governadores resolver o problema, assim como fazem para garantir vagas em escolas e medicamentos em hospitais. Flávia Ferrer destaca que, nas pesquisas de opinião pública, a falta
de segurança aparece sempre entre os três maiores problemas nacionais, ao lado do desemprego e da precariedade dos serviços de saúde. Contudo, o Judiciário, na opinião da promotora, não tem dado a devida atenção para a questão se comparado às decisões nas áreas de educação e saúde. “Os juízes e o Ministério Público não estão abertos para resolver os problemas de segurança. Preferem não interferir no que chamam de escolha de políticas públicas, deixando nas mãos de prefeitos e governadores a escolha das prioridades para se investir”, observa a promotora, ponderando que a administração é se submeter às decisões judicais. Nas pesquisas para finalizar seu mestrado, Flávia Ferrer diz ter encontrado apenas uma ação na qual o MP acionou a Justiça para o Estado não comprome-
ter sua segurança. Promotores do Rio Grande do Sul impetraram uma ação civil pública contra do Estado impedindo a remoção de policiais da comarca de Uruguaiana, a sexta mais violenta do Sul. Em primeira instância, os promotores venceram com a conquista de uma liminar que proibia a transferência. Mas desembargadores do Tribunal de Justiça gaúcho caçaram o documento e, apesar de a ação ainda não ter sido julgada, os policiais não permaneceram em Uruguaiana. Agora, Flávia Ferrer está disposta a incentivar seus colegas de profissão a avaliar as necessidades de suas comarcas e intervir para garantir o direito de uma vida tranqüila. “Não dá para ser uma ação genérica, já que cada lugar tem um problema”, observa. (FO)
por bala perdida O estudante F.N.C.S., de 13 anos, está em estado grave, depois de ser atingido por uma bala perdida, durante brincadeira de criminosos com armas na vila Cabana do Pai Tomaz, Vista Alegre, Oeste da capital. Ele deu entrada ontem à tarde no Hospital de Prontosocorro João XXIII com um tiro na cabeça. Em Belo Horizonte e sua região metropolitana foram registrados, até o começo da noite, dez assassinatos, desde a sexta-feira, entre os quais o do soldado do Corpo de Bombeiros Paulo César Santana Teixeira, de 29. O militar também foi baleado na cabeça e morreu durante uma festa na Boite Street, casa de shows na avenida Amazonas, no Barro Preto, Centro-Sul de Belo Horizonte. De acordo com a Polícia Militar (PM), cerca de 4h, discussão iniciou uma briga no local, com várias pessoas. Durante o tumulto, Paulo César, lotado no 1º Batalhão dos Bombeiros, foi atingido com um tiro de pistola. A PM informou que os suspeitos fugiram num Fiat Palio cinza, placa GZH 1154, da capital, roubado horas antes, naquela região. No início da tarde de ontem, dois suspeitos fo-
ram presos com a arma usada no crime. O Corpo de Bombeiros contou que o soldado estava à paisana e não estava trabalhando como segurança da festa, hipótese investigada pela polícia. Segundo testemunhas, ele estaria com uma mulher que, ao perceber a saída dos assaltantes, teria anotado a placa do veículo. Em represália, um deles voltou à casa noturna e atirou contra Paulo César, que morreu na hora. Por volta de 14h, Paulo Henrique Ciriaco, de 18, e um menor foram presos no Morro das Pedras, com a pistola usada para matar o bombeiro. Segundo os policiais, os dois suspeitos disseram que Rafael, o “Pitinho”, ainda foragido, é o autor dos disparos contra Paulo César. A dupla foi reconhecida por testemunhas, que disseram ter visto os jovens na boate e no interior do carro roubado acompanhados de Pitinho. No entanto, o menor alegou que não estava no local e que só recebeu a arma para guardá-la. Paulo Henrique e o menor foram levados para a Divisão de Orientação e Proteção à Criança e ao Adolescente (Dopcad).
CAPOTAMENTO
MÚSICA É UM RECURSO USADO PELA PM PARA TIRAR CRIANÇAS DA ROTA DA VIOLÊNCIA NO MORRO DAS PEDRAS
Pausa na batalha para ajudar a quem precisa
FOTOS BETO MAGALHÃES
“PARA NÃO FICAR EM CASA À TOA, VIM APRENDER A TOCAR VIOLÃO. FIQUEI COM MEDO QUANDO VI QUE A POLÍCIA IRIA ENSINAR A GENTE. EU SEMPRE ACHEI QUE ELES MATAVAM AS PESSOAS, FALARAM QUE MATARAM MEU AMIGO E QUE VIVIAM BATENDO NO PESSOAL AQUI. MAS AGORA JÁ NÃO ACHO QUE A POLÍCIA SEJA TÃO MÁ. AQUI, ELES BRINCAM COM A GENTE” ■ Erick Jesus, de 10 anos, morador do Morro das Pedras
“É BEM MELHOR VER A POLÍCIA COM PANELA DE COMIDA DO QUE COM ARMA NA MÃO. QUANDO ELES NÃO TRAZEM COMIDA, A GENTE SENTE A MAIOR FALTA. ESTOU DESEMPREGADA E, DE SEGUNDA A SEXTA, VENHO COM MINHA VASILHA PARA GARANTIR A JANTA E O ALMOÇO DA FAMÍLIA. OS POLICIAIS DISTRIBUEM TAMBÉM PÃO, ROUPA E BRINQUEDO” ■ Ingrid Santos, de 43, moradora do Morro das Pedras
No meio do fogo cruzado da batalha contra o crime, um batalhão da Polícia Militar, em Belo Horizonte, se transformou em referência quando assunto é estratégia para reduzir as estatísticas da violência. Ao contrário do resto da cidade, os 802 militares sob o comando do tenente-coronel Josué Soares, do 22º BPM, estão conseguindo manter sob controle uma área complicada, que mistura cinco aglomerados – Cafezal, Taquaril, Vera Cruz, Barragem Santa Lúcia e Morro das Pedras –, e bairros nobres como Belvedere, Santa Lúcia e a Serra. Além do policiamento ostensivo, promovem ações sociais. “O clima não é de paz total. Temos enfrentamentos quase que diários, mas estamos, aos poucos, nos aproximando da comunidade”, afirma Josué. Ele não esconde os segredos do trabalho, que já está sendo adotado por outras unidades da Polícia Militar. Ele montou, por causa do programa Fica Vivo, no Morro das Pedras, região Oeste, o Grupo de Policiamento de Áreas de Risco (Gepar), onde policiais ficam o dia todo rodando as favelas, conversando com moradores e comerciantes. As operações nos aglomerados também ganharam um caráter inovador. Ao invés de ocupar um morro e dar batidas em todos os que estão nas ruas e becos, os policiais agem em dois tempos. “Fazemos uma operação durante duas horas cumprindo mandados de busca e apreensão em um aglomerado e nos bairros próximos, saímos para outra favela, e depois voltamos para o local de origem. Assim, pegamos muita gente de surpresa”, explica, certo de que é preciso usar a criatividade para combater a violência.
COMIDA E MÚSICA Ele faz questão de dizer que o geoprocessamento – ferramenta que identifica, via computador, os lugares e os horários de maior incidência criminal – tem sido importante para combater ocorrências de assalto a veículos e roubos a padaria. “Conseguimos reduzir em 70% o número de veículos tomados de assalto porque prendemos uma quadrilha que roubava o carro, o guardava num caminhão-baú para abandoná-lo longe do local do crime. Foi preciso espalhar policiais à paisana para identificar os bandidos e policiais fardados pa-
ra inibir a ação de outros criminosos nas ruas do Sion e do Belvedere”, explica o comandante. Mas o que o tenente-coronel Josué mais gosta de destacar são as ações comunitárias. que seus homens assumiram com a ajuda de voluntários e patrocinadores. Apesar de não ser função de polícia, os militares do 22º distribuem comida doada por restaurantes, ensinam música e supervisionam um instrutor de tae kwon-do aos moradores do Morro das Pedras, aglomerado que ainda desponta entre os mais violentos de Belo Horizonte. “Mas que registrou o último homicídio em 28 de dezembro”, comemora o comandante, certo de que está no caminho certo. Essas ações sociais são criticadas pelo secretário executivo do Crisp, Robson Sávio. “A Polícia Militar tem muito mais a fazer que distribuir comida ou ensinar música. Esse tipo de atividade poderia ser assumida por outra entidade”, avalia. Mas o tenente-coronel Josué acredita que se a PM não fizer nada, ninguém vai fazer, pelo menos por hora. (FO)
“A DISCIPLINA É O MAIOR PROBLEMA DESSES MENINOS. NÃO RESPEITAM NINGUÉM E BRIGAM ENTRE SI COM UMA FACILIDADE ABSURDA. A PRIMEIRA COISA QUE FIZ QUANDO COMECEI A DAR AULAS PARA ESSES 33 ADOLESCENTES FOI ABOLIR OS PALAVRÕES. ACHO QUE O TAE KWONDO PODE TRANSFORMÁ-LOS EM PESSOAS MELHORES” ■ Edvaldo Queiroz, de 29, faixa preta e instrutor de tae kwon-do
BETO MAGALHÃES
Seis pessoas de uma mesma família ficaram feridas no capotamento do Uno placa GTZ 3521, dirigido por Elaine Cristina Gomes, de 27 anos. O acidente aconteceu ontem à tarde, no quilômetro 586 da BR 040, em Itabirito, região metropolitana. Além da motorista, o marido dela Marcos Gomes, de 26, a filha do casal Yasmin, de cinco meses, além da irmã de Elaine, Lenice Ribeiro, de 34, e as filhas dela Milene, de 8, e Claudia de 15, foram socorridos e levados para o Hospital de Pronto-socorro João XXIII (HPS). Pela manhã, a queda do Palio placa GUH 3374 numa ribanceira, no Km 51 da BR 381, saída para Vitória, próximo ao trevo de Ravena, em Sabará, deixou quatro pessoas feridas, entre elas uma menina de 6 anos, que está em estado
❚ CASO FADEL
Juiz investigado pede afastamento O juiz-corregedor José Antônio Braga assume amanhã a direção do foro de Belo Horizonte, em substituição a Wanderley Salgado de Paiva, que pediu afastamento do cargo por 30 dias por questões de saúde. Nos últimos dias, Wanderley Paiva, que também é juiz-corregedor, teve seu nome envolvido com o do delegado Marco Túlio Fadel Andrade, acusado de tortura e coação de testemunhas, conforme escuta telefônica autorizada pela Justiça. Na noite da quinta-feira, o juiz foi alvo de um segundo atentado, desta vez, a bala. O delegado Fadel está foragido. Em nota da assessoria do Tribunal de Justiça, foi informado que o Judiciário de Minas Gerais vai julgar, com im-
parcialidade e isenção, todos os incidentes processuais apresentados sobre o caso do monitoramento telefônico de Fadel, no período em que ele esteve preso no Departamento Estadual de Operações Especiais (Deoesp). A nota, porém, destaca que a divulgação das transcrições das fitas gravadas “não comprovam a realidade dos fatos, que precisam ser melhor apurados”. Além de diálogos entre Fadel e Wanderley, nas gravações telefônicas, são mencionados nomes de outros integrantes do Judiciário, de políticos e policiais civis. Na nota, o TJ e a Associação dos Magistrados Mineiros (Amagis) “repudiam as insinuações feitas contra seus membros, antes do esclarecimento final do caso”.