1o.
Trabalho
de
Desenvolvimento
I
Título:
Cultura
e
Instituições:
confiança,
preferências
e
múltiplos
equilíbrios
Nome:
Michel
Dummar
Azulai
1. Introdução
Cultura
e
instituições
são
dois
fatores
amplamente
discutidos
como
causas
fundamentais
do
desenvolvimento
econômico
de
diferentes
países.
Diversos
trabalhos
foram
feitos
objetivando
mostrar
os
impactos
desses
dois
fatores
diretamente
sobre
renda
e
bem
estar
econômico
(Acemoglu
et
al.
[2001],[2002],
Guiso
et
al.
[2006],[2009],
Fernández
e
Fogli
[2009]).
Porém,
para
saber
utilizar
os
aprendizados
desses
estudos
em
prol
do
desenvolvimento
econômico
(por
exemplo,
via
ajuda
internacional
condicional,
reformas
institucionais,
políticas
de
integração
cultural,
entre
outras
possibilidades),
é
necessário
também
conhecer
as
inter‐relações
entre
esses
fatores.
Por
exemplo,
se
cultura
for
um
fator
importante
na
determinação
das
instituições
formais
e
informais
que
aparecerão
em
um
país,
é
provável
que
mecanismos
de
ajuda
internacional
condicional
e
reformas
institucionais
radicais
sejam
pouco
capazes
de
consolidar
os
seus
propósitos.
Com
base
nessa
motivação,
o
presente
trabalho
investiga
quais
são
algumas
possíveis
relações
entre
cultura
e
instituições.
Mais
particularmente,
queremos
entender
qual
é
o
papel
de
confiança
entre
pessoas
para
o
desenvolvimento
de
instituições
de
direitos
de
propriedade
e
democracia.
Empiricamente,
a
tese
de
que
confiança
entre
as
pessoas
é
importante
para
o
desenvolvimento
econômico
e
institucional
já
é
antiga,
e
toda
uma
literatura
de
impactos
de
capital
social
sobre
crescimento
e
sobre
qualidade
do
governo
se
desenvolveu
em
cima
dessa
tese.
Porém,
é
uma
questão
pouco
entendida
nessa
literatura,
em
termos
de
relevância
empírica,
quais
são
os
canais
teóricos
pelos
quais
confiança
afetaria
instituições.
Em
termos
de
impactos
teóricos
de
confiança
sobre
instituições,
pode‐se
pensar
em
alguns
canais.
Uma
primeira
possibilidade
é
que,
em
sociedades
com
culturas
coletivistas,
os
conflitos
de
interesses
podem
ser
menores
que
em
sociedades
com
culturas
individualistas.
Isso
naturalmente
implica
que,
em
sociedades
coletivistas
haveria
maior
confiança
entre
as
pessoas.
Ao
mesmo
tempo,
nessas
sociedades,
haveria
menos
proteção
de
direitos
de
propriedade
e
à
democracia
(democracia
pode
ser
compreendida
como
o
sistema
necessário
se
indivíduos
têm
valores
diferentes,
e
por
isso,
valorizam
mais
o
individualismo
que
o
coletivismo).
Porém,
se
conseguíssemos
controlar
para
coletivismo
/
individualismo,
confiança
não
teria,
nessa
teoria,
um
impacto
sobre
instituições.
Da
mesma
forma
que
descrevemos
a
tese
anterior,
podemos
descrever
uma
tese
com
implicações
contrárias
à
do
parágrafo
anterior.
Se
indivíduos
são
naturalmente
egoístas,
sociedades
com
culturas
individualistas,
que
respeitam
mais
a
unicidade
de
cada
indivíduo,
podem
apresentar
maior
confiança
entre
as
pessoas
que
sociedades
com
culturas
coletivistas.
Ao
mesmo
tempo,
essas
sociedades
apresentarão
instituições
mais
democráticas
e
com
maior
proteção
de
direitos
de
propriedade.
Por
fim,
podemos
ter
uma
outra
tese
de
que
confiança
opera
na
seleção
de
equilíbrios.
Instituições
são
regras
formais
e
informais
desenvolvidas
para
regular
a
interação
entre
indivíduos.
Pode
ser
que,
em
um
lugar
no
qual
as
pessoas
confiem
mais
umas
nas
outras,
elas
consigam
implementar
regras
(direitos
de
propriedade,
democracia,
sanções)
que
trazem
como
resultado
uma
solução
cooperativa
(que
maximiza
bem
estar
coletivo).
Por
outro
lado,
em
um
lugar
no
qual
as
pessoas
confiam
menos
umas
nas
outras,
regras
que
trazem
a
solução
competitiva/individualista
(basicamente,
lei
da
selva)
aparecerá
com
maiores
chances.
Resumindo
as
possibilidades:
se
confiança
se
relaciona
diretamente
com
valores
coletivistas
ou
individualistas,
esperamos
que
a
correlação
entre
confiança
e
valores
individualistas
tenha
o
mesmo
sinal
da
correlação
entre
confiança
e
direitos
de
propriedade/democracia/instituições
de
facto.
Por
outro
lado,
se
confiança
se
relaciona
com
a
crença
na
implementação
de
soluções
cooperativas,
esperamos
que
a
correlação
entre
confiança
e
valores
individualistas
seja
negativa
(confiança
traz
menor
chance
de
solução
competitiva
–
em
outros
termos,
individualista),
mas
que
por
outro
lado,
a
relação
entre
confiança
e
direitos
de
propriedade,
democracia
e
instituições
de
facto
“melhores”
seja
positiva.
Essas
são
as
relações
que
procuraremos
testar.
2. Dados
Os
dados
utilizados
serão
dados
no
nível
do
indivíduo
e
dados
agregados
da
World
Values
Survey
(WVS),
em
conjunto
com
dados
de
proteção
de
direitos
de
propriedade
(Heritage
Foundation),
democracia
(POLITY
IV)
e
corrupção
(Transparency
International,
2004).
Mais
especificamente,
se
usará
os
dados
da
WVS
no
nível
do
indivíduo
entre
1994‐1999
para
se
obter,
em
primeiro
lugar,
uma
proxy
para
confiança.
Ela
será
a
resposta
de
cada
indivíduo
à
pergunta:
“você
confia
nas
pessoas?”.
O
primeiro
passo
desse
trabalho
é
associar
essa
proxy
de
confiança
à
diversas
proxies
de
valores
coletivistas
e
individualistas
(controlando‐se
para
alguns
fatores
demográficos).
Como
correlatos
de
culturas
coletivistas,
usamos
as
respostas
às
perguntas:
“você
considera
ser
importante
ensinar
os
seus
filhos
a
serem
altruístas?”,
“você
considera
igualdade
entre
as
pessoas
desejável?”,
“você
considera
ser
importante
ajudar
os
outros?”,
“religião
é
importante
na
sua
vida?”
e
“política
é
importante
na
sua
vida?”.
Essas
perguntas
parecem
focar
em
preferências
por
“bens
coletivos”
(igualdade,
por
exemplo,
nada
tem
a
ver
com
um
bem
individual
por
si
só),
olhar
para
ações
em
prol
de
um
“bem
social”,
ou
falar
de
esforços
coletivos.
Por
outro
lado,
considerou‐se
aqui
como
proxies
de
valores
individualistas
as
respostas
às
seguintes
perguntas:
“você
considera
competição
algo
bom?”,
“É
importante
ensinar
tolerância
e
respeito
aos
seus
filhos?”
e
“você
acharia
a
vida
melhor
com
menos
materialismo
e
ênfase
no
dinheiro?”.
Essas
perguntas
parecem
focar
em
posses
do
indivíduo,
respeito
às
diferenças
entre
indivíduos
e
para
o
potencial
de
uma
solução
não
cooperativa
(competição)
ser
boa,
e
por
isso,
foram
consideradas
proxies
de
valores
individualistas.
Com
essa
associação,
conseguimos
medir
uma
primeira
parte
da
estória
contada
na
introdução:
a
correlação
entre
confiança
e
valores
coletivistas/individualistas.
O
segundo
passo
desse
trabalho
será
associar
a
proxy
de
confiança
à
ações
diferentes,
que
podem
representar
regras
de
comportamento
diferentes.
Os
comportamentos
considerados
foram
escolhidos
para
(i)
representar
ações
que
podem
ter
impacto
sobre
instituições
macro
de
direitos
de
propriedade
e
democracia
e
(ii)
representar,
potencialmente,
micro‐instituições
e
instituições
de
facto
locais.
Com
foco
no
primeiro
ponto,
consideramos,
para
montar
a
variável
“indivíduo
é
membro
de
algum
grupo
de
interesse”
as
respostas
às
perguntas:
“você
é
membro
de
sindicatos/grupos
políticos
locais/associações
de
classe/grupos
de
mulheres?”.
Para
montar
uma
variável
de
participação
em
grupos
de
direitos
com
alcance
mais
geral,
consideramos
as
variáveis
“você
é
membro
de
organização
de
direitos
humanos/ambientais/direitos
dos
animais/movimentos
pela
paz?”.
Ainda
consideramos
uma
variável
composta
indicando
a
participação
em
grupos
de
lazer,
educação,
cultura
e
grupos
jovens,
e
por
fim
uma
variável
que
indica
se
o
indivíduo
é
membro
de
algum
partido
político.
Para
representar
o
segundo
ponto,
precisamos
recorrer
à
WVS
de
1989‐1993
(onde
conseguimos
também
uma
medida
da
proxy
de
confiança
descrita
anteriormente).
Com
essa
outra
rodada
da
WVS,
conseguimos
algumas
variáveis
que
mostram
propensão
a
praticar
certas
ações
políticas
(mais
especificamente,
elas
indicam
se
o
indivíduo
já
fez
uma
certa
ação,
se
ele
faria
a
ação
em
alguma
circustância
e
se
ele
nunca
faria
a
ação).
As
variáveis
consideradas
foram,
em
primeiro
lugar,
as
de
“participar
de
abaixo‐assinados”
e
“ir
para
uma
passeata
legal”,
para
montar
uma
variável
de
ação
“pacífica”.
Em
segundo
lugar,
montamos
uma
variável
de
ação
“punitiva”,
a
partir
das
variáveis
“fazer
boicotes”,
“participar
de
greves
não
oficiais”
e
“ocupar
prédios
e
fábricas”.
Por
fim,
consideramos
uma
ação
mais
extremada,
a
resposta
à
pergunta
“existem
situações
nas
quais
violência
por
fins
políticos
é
justificável?”.
Com
esse
segundo
passo,
conseguimos
identificar,
dentre
os
caminhos
teóricos
indicados
na
introdução,
qual
é
o
mais
provável.
Porém,
conseguimos
fazer
isso
com
micro‐instituições/instituições
de
facto
e
com
ações
que
potencialmente
têm
impacto
sobre
macro‐instituições.
Porém,
não
sabemos,
até
aqui
se
esses
canais
são
realmente
relevantes
para
determinar
instituições
macro.
Para
isso,
agregamos
cada
uma
das
proxies
descritas
acima
no
nível
do
país
e
juntamos
elas
com
dados
de
democracia
em
2000‐2005,
direitos
de
propriedade
em
2004,
origens
legais,
renda
per
capita
em
1995
e
um
índice
de
corrupção
percebida
do
Transparency
International
em
2004.
Com
essas
variáveis
em
mãos,
rodamos
algumas
regressões
de
determinação
de
direitos
de
propriedade
e
democracia.
Dessa
descrição
dos
dados,
talvez
duas
coisas
tenham
ficado
claras:
em
primeiro
lugar,
temos
um
problema
sério
de
medição
de
valores
coletivistas/individualistas,
além
de
um
problema
na
medição
de
confiança.
Não
só
é
difícil
associar
as
perguntas
de
forma
certeira
aos
valores
teóricos
que
temos
em
mente,
como
também
não
sabemos
bem
o
que
as
pessoas
entendem
ao
ouvir
essas
perguntas
nas
pesquisas
do
WVS
(por
exemplo,
Glaeser
et
al.
[2000]
mostram
que
as
pessoas
tendem
a
interpretar
a
pergunta
“pessoas
são
confiáveis?”
como
“você
é
confiável?”).
De
qualquer
forma,
a
partir
da
análise
abaixo,
é
possível
ter
alguma
noção
vaga
da
associação
entre
as
perguntas
e
os
valores
teóricos.
Em
segundo
lugar,
para
fazer
a
associação
das
regressões
com
dados
micro
com
as
regressões
com
dados
macro,
temos
um
problema
de
poucas
observações.
A
WVS
em
1989‐1993
nos
dá
dados
de
confiança
para
54
países,
enquanto
que
a
WVS
em
1994‐1999
nos
dá
dados
de
confiança
para
42
países.
Para
tentar
melhorar
um
pouco
a
amostra,
usamos
uma
média
da
confiança
nos
dois
anos
para
os
países
que
estão
em
ambas
as
amostras,
e
usamos
o
nível
de
confiança
de
somente
um
dos
anos
quando
temos
dados
somente
para
um
ano.
Ficamos,
assim,
com
68
países
na
nossa
amostra
final.
Por
fim,
as
escolhas
dos
períodos
tiveram
como
motivos:
(i)
ter
um
bom
tamanho
de
amostra
nas
análises
micro,
(ii)
nas
análises
macro,
se
considerou
todas
as
variáveis
explicativas
na
década
de
90
e
as
variáveis
dependentes
na
década
de
2000
na
tentativa
de
garantir
maior
exogeneidade
de
confiança.
Por
fim,
se
utilizou
corrupção
como
variável
explicativa
na
equação
de
democracia
para
controlar
para
o
fato
de
que
democracias
são
mais
transparentes,
a
maior
transparência
pode
deixar
corrupção
mais
à
mostra
e
com
isso,
reduzir
a
confiança
das
pessoas
no
governo
(e,
potencialmente,
reduzir
a
confiança
nos
outros).
O
índice
de
percepções
de
corrupção,
porém,
não
foi
achado
para
antes
de
2004,
sendo
utilizando,
portanto,
corrupção
percebida
em
2004.
3. Resultados
A
primeira
tabela
mostra
os
resultados
das
regressões
de
valores
em
confiança.
Foram
usados
como
controles
a
idade,
o
sexo,
a
renda,
a
educação
do
indivíduo,
além
de
efeitos
fixos
de
região
no
nível
sub‐nacional.
Aqui,
estamos
usando
(por
tamanho
de
amostra),
a
WVS
de
1994‐1999.
A
tabela
(1)
indica
que
mais
confiança
está
associada
à
valores
mais
coletivistas
e
menos
individualistas.
Sendo
assim,
pessoas
que
confiam
mais
nos
outros
tendem
a
achar
mais
importante
ensinar
valores
altruístas
aos
filhos,
tendem
a
achar
menos
que
igualdade
é
ruim,
acham
que
ajudar
os
outros
é
importante,
e
que
política
é
importante
(confiança
não
parece
covariar
de
forma
estatisticamente
significante
com
a
importância
atribuída
à
religião
e
com
a
importância
de
ensinar
tolerância
e
respeito
aos
filhos).
Esses
resultados
parecem
já
descartar
uma
das
teses:
confiança
não
está
associada
a
valores
individualistas,
mas
sim,
coletivistas.
Ainda
não
foi
mostrado,
porém,
nada
para
escolher
entre
(i)
confiança
e
coletivismo
gerando
instituições
com
menos
proteção
a
propriedade/menos
democracia
(que
argüimos
serem
instituições
mais
coletivistas)
e
(ii)
confiança
servindo
como
mecanismo
de
seleção
de
equilíbrios.
Em
outras
palavras,
ainda
não
apresentamos
nada
que
mostre
influência
direta
de
uma
“preferência
por
coletivismo”
gerando
instituições
piores,
ou
somente
de
confiança
ajudando
a
selecionar
entre
um
equilíbrio
cooperativo
ou
um
equilíbrio
competitivo.
Para
isso,
rodamos
as
regressões
do
segundo
passo,
mostradas
na
tabela
(2).
A
tabela
(2)
favorece
o
resultado
de
confiança
como
seleção
de
múltiplos
equilíbrios
(de
novo,
dadas
medidas
certas).
De
novo,
controlando
para
os
mesmos
fatores
demográficos
e
para
efeitos
fixos
de
região
sub‐nacional,
pessoas
que
confiam
mais
nos
outros
tendem
a
participar
mais
de
grupos
“de
interesses”,
de
ações
políticas
locais
e
de
partidos
políticos.
Por
outro
lado,
a
participação
em
grupos
de
defesa
de
interesses
amplos
(tais
como
defesa
de
direitos
humanos,
ambientalistas,
entre
outros)
parece
não
ser
muito
afetada
pela
confiança
do
indivíduo
nos
outros.
Isso
é
coerente
com
a
tese
de
seleção
de
equilíbrios
múltiplos:
é
mais
difícil,
em
um
jogo
com
equilíbrios
múltiplos,
garantir
a
cooperação
de
muitos
que
garantir
a
cooperação
de
poucos.
Por
outro
lado,
esperaríamos
que
preferências
por
“coletivismo”
fossem
coerentes
com
lutas
por
valores
tanto
de
interesses
locais
quanto
de
interesses
amplos.
Porém,
ainda
não
podemos
tirar
dessas
regressões
uma
conclusão
definitiva:
pode
ser
que
a
nossa
medida
de
confiança
esteja
capturando
somente
confiança
local
(em
outras
palavras,
ao
perguntar
para
alguém
morando
no
Rio
de
Janeiro
se
ele
confia
em
outras
pessoas,
é
difícil
acreditar
que
esse
morador
do
Rio
estará
pensando
em
pessoas
de
Salvador
como
as
“outras
pessoas”
citadas
na
pergunta).
Para
fortalecer
as
conclusões,
se
considera,
ainda
na
Tabela
(2),
os
tipos
de
ações
políticas/coletivas
tomadas
pelos
indivíduos.
Os
resultados
indicam
que
confiança
nos
outros
aumenta
não
somente
a
probabilidade
de
executar
ações
pacíficas
(participar
de
abaixo‐assinados,
ir
à
uma
demonstração
legal),
como
também
aumenta
as
chances
de
tomadas
de
ações
coletivas
punitivas
(fazer
boicotes,
invadir
fábricas
e
prédios,
participar
de
greves
não
oficiais)
e
faz
crescer
o
uso
de
ações
políticas
violentas.
Se
o
canal
relevante
que
leva
de
confiança
em
instituições
fosse
de
preferências
maiores
por
coletivismo,
a
tomada
de
ações
punitivas
não
se
faria
necessária
em
lugares
em
que
as
pessoas
confiam
mais
umas
nas
outras.
Por
outro
lado,
as
estratégias
necessárias
para
sustentar
equilíbrios
cooperativos
com
pessoas
egoístas
são
estratégias
de
punição
de
desvios
do
equilíbrio
cooperativo.
Se
maior
confiança
está
ajudando
a
selecionar
um
equilíbrio
cooperativo,
no
qual
as
pessoas
participam
de
ações
coletivas
e
políticas,
a
maior
confiança,
necessariamente,
deve
aumentar
a
disposição
a
adotar
estratégias
tais
como
boicotes,
invasão
de
prédios
e
ações
políticas
violentas.
Devemos
notar
duas
coisas
das
análises
até
agora.
Em
primeiro
lugar,
estamos
controlando
para
dummies
de
regiões
no
nível
sub‐nacional.
Isso
pode
levar
a
crer
que
não
estamos
analisando
o
impacto
de
confiança
sobre
instituições.
Porém,
observamos
muito
mais
variação
em
regras
de
comportamento
que
a
variação
entre
regiões:
observamos
aqui
as
regras
de
escolha
de
cada
pessoa,
e
podemos
associá‐la
à
confiança
que
cada
pessoa
tem
nos
outros.
Sendo
assim,
a
análise
até
agora
é
capaz
de
capturar
instituições
de
facto
(no
sentido
de
regras
de
comportamento)
em
um
nível
muito
desagregado,
o
que
pode
ser
bastante
útil
para
a
determinação
de
instituições
macro.
Em
segundo
lugar,
em
nenhuma
das
regressões
até
agora
apresentadas
(e
em
nenhuma
das
regressões
que
serão
apresentadas)
sabemos
o
sentido
de
causalidade.
Porém,
as
duas
teorias
que
estamos
comparando
dão
sinais
das
correlações,
e
pouca
direção
em
termos
de
direção
da
causalidade.
Tudo
que
precisamos
para
chegar
nessas
conclusões
(além
de
dados
melhores
e
mais
precisos)
é
a
hipótese
de
que
preferências
por
coletivismo
estão
correlacionadas
com
ações
coletivas
de
interesses
amplos
e
sem
necessidade
de
estratégias
de
punição,
enquanto
que
a
parcela
de
confiança
usada
somente
como
instrumento
de
seleção
de
equilíbrio
deve
estar
mais
correlacionada
com
cooperação
por
interesses
mais
locais
e
com
a
necessidade
de
estratégias
de
punição.
Como
já
foi
argumentado,
essas
regressões
nos
indicam
que
confiança
nas
pessoas
afeta
instituições
de
facto
locais
e
ação
política.
Mais
ainda,
as
regressões
nos
indicam
que
o
canal
é
via
seleção
de
equilíbrios
múltiplos.
Porém,
ainda
não
temos
nada
que
mostre
o
quão
relevantes
são
essas
instituições
locais
e
essa
ação
política.
Alguma
estimativa
dos
impactos
de
confiança
sobre
macro‐ instituições
seria
informativo
nesse
sentido.
Foram
feitas
regressões
no
nível
macro
para
duas
variáveis
institucionais:
direitos
de
propriedade
em
2004
e
democracia
média
entre
2000
e
2005.
As
regressões
consideraram
somente
variações
cross‐section
entre
países,
para
captar
impactos
de
confiança
sobre
instituições
no
longo
prazo.
A
estratégia
adotada
foi
fazer
(i)
uma
regressão
simples
de
confiança
na
instituição,
(ii)
controlar
para
valores
coletivistas/individualistas
(para
saber
se
os
canais
acima
supostos
são
coerentes),
(iii)
controlar,
sem
valores,
para
ações
(com
isso,
tomamos
o
equilíbrio
como
dado,
e
não
estamos
mais
olhando
para
o
impacto
de
confiança
sobre
seleção
de
equilíbrios),
(iv)
controlamos
para
renda
e
origens
legais
(no
mesmo
espírito
de
(iii))
e
(v)
fazemos
uma
regressão
com
todos
os
conjuntos
de
variáveis.
Vale
notar,
logo
antes
de
discutir
as
regressões,
que
o
número
de
países
na
amostra
é
pequeno,
tornando
a
precisão
das
estimativas
menor.
A
tabela
(3)
apresenta
os
resultados
para
direitos
de
propriedade.
Para
direitos
de
propriedade,
não
conseguimos
achar
na
WVS
nenhuma
variável
que
especificasse
ações
contra/a
favor
de
direitos
de
propriedade
(por
exemplo,
não
temos
variáveis
dizendo
se
alguém
rouba
os
vizinhos,
ou
de
ação
coletiva
para
proteger
as
propriedades
da
vizinhança).
Sendo
assim,
pulamos
aqui
o
passo
(iii).
De
fato,
a
tabela
(3)
mostra
evidências
coerentes
com
os
argumentos
acima.
Confiança
tem
impacto
grande
sobre
proteção
de
direitos
de
propriedade.
Pela
coluna
(2),
isso
ocorre
via
a
transmissão
de
valores
coletivistas/individualistas
(no
caso,
usamos
a
proxy
de
valores
a
ensinar
para
os
filhos).
Uma
vez
que
se
controla
para
origens
legais
e
renda
per
capita,
estamos,
de
alguma
forma,
pré‐ selecionando
o
equilíbrio
institucional
do
país.
De
forma
coerente
com
a
análise
acima,
uma
vez
que
controlamos
para
esses
fatores,
confiança
perde
significância
(coluna
(3))
e
valores
também
perdem
significância
(coluna
(4)).
Vale,
de
novo,
mencionar:
apesar
de
tudo
isso,
não
sabemos
se
isso
ocorre
por
coerência
com
a
teoria
acima,
ou
pelo
tamanho
limitado
da
amostra.
Por
fim,
a
tabela
(4)
apresenta
os
resultados
para
democracia.
Nessas
regressões,
em
todas
as
colunas,
controlamos
para
o
número
de
anos
sob
transição
de
regime
e
para
número
de
anos
de
existência
do
país
entre
2000
e
2005
(alguns
países
não
existiam
como
países
em
2000,
e
passaram
a
existir
entre
2000
e
2005).
Mais
ainda,
para
controlar
para
o
fato
de
que
países
mais
democráticos
podem
ser
mais
transparentes,
mostrar
mais
a
corrupção
ao
público
e,
daí,
gerar
desconfiança
no
Estado
e
nas
pessoas,
controlamos
para
um
índice
de
percepção
de
corrupção
em
2004
em
todas
as
regressões
de
democracia.
O
resultado
da
regressão
mais
simples
diz
que
confiança
não
tem
correlação
significante
estatisticamente
sobre
democracia.
Ao
controlar
para
a
importância
que
os
indivíduos,
em
média,
dão
à
política
no
pais
(ou
seja,
controlando
para
valores
coletivistas,
mais
especificamente,
valores
democráticos)
perdemos
ainda
mais
significância
no
coeficiente
de
“confiança
nos
outros”.
Surpreendentemente,
ao
controlar
para
ações
políticas
(tanto
pacíficas
quanto
punitivas),
o
coeficiente
de
confiança
se
torna
negativo
e
estatisticamente
significante
ao
nível
de
10%,
apesar
da
redução
do
tamanho
da
amostra
relativo
à
coluna
(1).
O
coeficiente
de
confiança
também
permanece
estatisticamente
significante
na
regressão
da
coluna
(4)
(com
controles
para
origens
legais).
Porém,
o
coeficiente
de
confiança
na
regressão
de
democracia
volta
a
ser
insignificante
na
regressão
completa.
Isso
pode
influenciar
a
conclusão
de
antes:
se
temos
ação
coletiva
correlacionada
com
confiança
e
confiança
correlacionada
negativamente
com
democracia,
talvez,
a
tese
certa
para
democracia
é
a
de
que
confiança
tem
um
impacto
sobre
democracia
via
“valores
e
preferências”,
e
não
via
múltiplos
equilíbrios.
Porém,
a
sensibilidade
à
especificação
nos
resultados
da
tabela
(4),
em
conjunto
com
a
amostra
limitada,
reduz
muito
o
escopo
para
a
análise
dessas
regressões.
4. Conclusão
Nesse
trabalho,
tentou‐se
desenvolver
um
teste
preliminar
do
meio
pelo
qual
cultura
pode
afetar
instituições,
mais
especificamente,
pelo
canal
de
confiança.
Foram
consideradas
duas
possibilidades:
em
uma
primeira,
confiança
entre
as
pessoas
tem
a
ver
com
preferências
coletivistas
ou
individualistas,
e
essas
preferências
afetam
instituições.
A
segunda
possibilidade
considerou
a
possibilidade
de
confiança
permitir
coordenação
em
equilíbrios
cooperativos,
ao
invés
de
coordenação
em
equilíbrios
competitivos.
O
que
se
considerou
como
teste
preliminar
foi,
em
primeiro
lugar,
ver
quais
valores
estão
associados
à
confiança
(coletivistas
ou
individualistas).
Achamos
uma
associação
entre
confiança
e
valores
mais
coletivistas:
pessoas
que
confiam
mais
nos
outros
tendem
a
achar
dar
mais
importância
à
ensinar
valores
altruístas
para
os
filhos,
valorizar
mais
religião
e
política
–
que
podem
ser
considerados
fenômenos
de
grupos
–
e
dar
menos
valor
à
um
“modo
de
vida
materialista”
e
à
competição.
A
partir
disso,
procurou‐se
compreender
se
confiança
leva
à
ações
coletivistas
sendo
efetivamente
tomadas
(no
sentido
de
serem
em
prol
de
causas
“amplas”
e
de
não
necessitarem
de
estratégias
de
punição)
ou
se
confiança
traz
a
adoção
de
estratégias
de
punição
–
necessárias
à
implementação
de
equilíbrios
cooperativos
–
e
a
ações
com
escopo
mais
local
(ou
seja,
se
confiança
tem
a
ver
com
seleção
de
equilíbrios).
Os
resultados
indicam
que
pessoas
que
confiam
mais
nos
outros
escolhem
participar
mais
de
grupos
de
interesses,
de
grupos
locais
e
partidos
políticos,
mas
não
escolhem
participar
mais
de
grupos
de
direitos
humanos
e
direitos
ambientais.
Além
disso,
os
resultados
indicam
que
mais
confiança
entre
as
pessoas
favorecem
tanto
ação
coletiva
pacífica
quanto
ação
coletiva
punitiva
e
violenta.
Por
essa
evidência
(em
conjunto
com
a
evidência
de
que
os
valores
de
fato
são
mais
coletivistas),
interpretamos
que
mais
confiança
entre
as
pessoas
permite
melhor
coordenação
entre
elas,
e
isso
favorece
a
seleção
de
um
equilíbrio
cooperativo
ao
invés
de
um
equilíbrio
competitivo.
Ou
seja,
esses
resultados
nos
dão
uma
evidência
(bastante
fraca)
de
que
confiança
melhora
instituições
de
facto
locais,
selecionando
equilíbrios
institucionais
–
institucionais
de
facto
–
melhores.
Por
fim,
também
mostramos
que
esse
canal
parece
ter
algum
poder
preditivo
de
direitos
de
propriedade
no
nível
do
pais,
enquanto
que
o
poder
preditivo
desse
canal
para
democracia
no
nível
do
país
parece
ser
fraco
e
pouco
robusto.
Apesar
de
todas
essas
conclusões,
devemos
ressaltar
que
nada
garante
que
essas
correlações
não
estejam
simplesmente
mostrando
como
pessoas
relatam
valores
em
pesquisas
de
forma
diferente
da
forma
pela
qual
elas
agem.
Ainda
mais,
não
entendemos
bem
como
as
pessoas
interpretam
as
perguntas
feitas
nas
pesquisas.
Por
fim,
nas
análises
de
instituições
macro,
o
pequeno
número
de
observações
limita
em
muito
o
escopo
para
inferências
de
qual
teoria
é
mais
relevante.
Ou
seja,
dada
as
qualidades
dos
dados,
nada
garante
que
as
interpretações
desse
trabalho
não
estejam
sobre‐analisando
algumas
correlações
que
podem
ser
fatos
estilizados
interessantes
por
si
só.
5. Referências
[1]
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Daron;
Simon
Johnson;
James
A.
Robinson,
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5.
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